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GNDA Pós estreptocócica PD

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A glomerulonefrite difusa aguda pós-
estreptocócica (GNDA) caracteriza-se 
fundamentalmente por processo inflamatório de 
origem imunológica que acomete todos os 
glomérulos de ambos os rins. É considerada, 
juntamente com a febre reumática, sequela tardia 
e não supurativa de estreptococcia. É a mais 
comum das glomerulopatias da infância. 
Epidemiologia 97% dos casos ocorrem nos países 
em desenvolvimento, em virtude das péssimas 
condições higiênico-sanitárias das moradias e 
coabitação da população de baixa renda 
determinando uma maior frequência de infecções 
bacterianas, principalmente pelos estreptococos 
beta-hemolíticos do grupo A (EBHGA). Nos últimos 
20 a 30 anos, a prevalência de GNDA tem 
diminuído nos países desenvolvidos por conta do 
tratamento mais efetivo e precoce das infecções e 
melhorias das condições de vida e nutrição dessas 
populações. A GNDA pode incidir de forma 
endêmica ou epidêmica. É rara em menores de 2 
anos, sendo mais frequente no período pré-
escolar e escolar, com pico de incidência ao redor 
dos 7 anos. A incidência no sexo masculino em 
relação ao feminino é de 2:1. 
Etiologia Em geral, a doença manifesta-se após 
infecção por EBHGA. Somente algumas cepas, 
denominadas nefritogênicas, são capazes de 
causar a glomerulonefrite. Essas cepas são 
identificadas pela presença de uma proteína 
localizada na parede de suas células, chamada 
proteína M. Entre as mais frequentes pós-
faringites, destacam-se os sorotipos M 1, 3, 4, 12, 
18, 25 e 49, e pós-impetigo, M 2, 49, 55, 57 e 60. 
Fisiopatogenia e fisiopatologia A GNDA é uma 
doença imunologicamente mediada e sua relação 
com infecção estreptocócica precoce está bem 
estabelecida, existindo fortes evidências de que o 
antígeno desencadeante da nefropatia 
correlaciona-se com raças nefritogênicas do 
EBHGA. No entanto, a fisiopatogenia da GNDA não 
está totalmente definida e há, na literatura, várias 
teorias que objetivam explicá-la. É provável a 
existência de um antígeno estreptocócico capaz 
de desencadear um processo imunológico que 
levaria à produção de anticorpos e, 
consequentemente, à formação de 
imunocomplexos nos glomérulos. 
(Imunocomplexos = antígeno + anticorpo) 
Considerando a formação de imunocomplexos in 
situ, 2 teorias são as mais aceitas: 
• teoria heteróloga (teoria catiônica de Vogt): os 
estreptococos têm proteínas catiônicas (+) capazes 
de se ligar à membrana basal glomerular (MBG), 
que possui carga elétrica contrária (-) facilitando a 
afinidade (proteínas estreptocócicas-MBG), 
formando os imunocomplexos; Resumindo, o 
antígeno é positivo e a MBG é negativa, de modo 
que eles se atraem. A teoria é heteróloga, porque 
diz respeito a algo diferente (antígeno da bactéria), 
isto é, que veio de fora do hospedeiro que, por sua 
vez, reconheceu essa estrutura. 
• teoria autóloga (teoria das neuraminidases): 
pesquisa demonstrou que a neuraminidase 
produzida pelo estreptococo nefritogênico atuaria 
sobre a imunoglobulina G (IgG) autóloga 
removendo o ácido siálico e tornando-a 
antigênica. Essa IgG modificada se depositaria 
inicialmente na região subendotelial da MBG. O 
imunocomplexo depositado na região 
subendotelial do capilar ativa o sistema de 
complemento pela via clássica ou, mais 
frequentemente, pela via alternativa. Uma vez 
ativado o sistema de complemento, há liberação 
de substâncias quimiotáxicas por meio de 
neutrófilos e secreção de proteases e/ou 
substâncias oxidantes, que determinarão 
alterações na MBG. Diferentemente da teoria 
heteróloga, a autóloga prega que algo de fora, em 
vez de introduzir uma estrutura no hospedeiro 
(antígeno), pegou algo que já é/está no hospedeiro 
e transformou-o, modificando-o, de modo que 
essa estrutura se tornasse o próprio antígeno. 
Em termos fisiopatológicos, o processo 
inflamatório que ocorre nos capilares glomerulares 
determina perda da sua integridade e, 
consequentemente, a passagem de elementos que 
normalmente não são filtrados: hemácias, 
leucócitos e proteínas. Esse intenso processo 
inflamatório endocapilar glomerular reduz a luz 
desses capilares, causando diminuição do ritmo de 
filtração glomerular (RFG) pela redução do 
GNDA PÓS-ESTREPTOCÓCICA 
coeficiente de ultrafiltração, com consequente 
retenção de alguns compostos (creatinina, ureia, 
potássio) que pode determinar lesão renal aguda. 
Esse evento agudo resulta em diminuição da oferta 
de água e sódio aos túbulos renais. Esses 
segmentos geralmente se encontram com sua 
função preservada e, portanto, promoverão 
reabsorção de água e sódio com desajuste do 
balanço glomerulotubular provocando oligúria, 
aumento do volume extracelular circulante 
(supressão do sistema renina-angiotensina-
aldosterona), edema, hipertensão arterial e 
congestão circulatória. Além do aumento do 
volume circulante, acredita-se que, nos capilares 
sistêmicos, ocorram alterações das forças 
determinantes da lei de Starling, contribuindo para 
o aparecimento do edema. 
É como se o glomérulo renal se transformasse 
numa peneira menor com buracos maiores, pois, 
apesar de passar estruturas maiores que antes não 
passavam (hemácias, proteínas), “o líquido/a 
urina” passa em menor quantidade, visto que 
como o espaço disponível diminuiu, também 
diminuiu o tamanho da peneira (filtração 
glomerular). 
Patologia Na macroscopia, os rins encontram-se 
moderadamente aumentados de volume, e pontos 
hemorrágicos podem ser observados na cápsula. O 
tufo glomerular apresenta-se aumentado, o 
espaço de Bowman está reduzido, e os capilares, 
obliterados pela tumefação e proliferação das 
células mesangiais ou endoteliais. 
GLOMÉRULO RENAL NORMAL 
 
 
 
GLOMÉRULO RENAL - GNDA PÓS ESTREPTOCÓCICA 
 
Essas fotos são pra ilustrar e tentar explicar o 
motivo de, apesar de passarem hemácias e 
proteínas (porque “os buracos da peneira estão 
maior”), a quantidade de líquido/urina que passa é 
menor, porque o espaço (de Bowman) está 
reduzido. 
 
Quadro clínico Os sintomas clínicos clássicos – 
edema, hipertensão e hematúria – manifestam-se 
10 a 20 dias (no máximo 6 semanas) após a 
infecção estreptocócica de vias aéreas superiores 
ou de pele. 
Geralmente, se a infecção prévia for faringite, 
aparecem 2 semanas após a doença, caso tenha 
sido impetigo, são 3 semanas. 
Na maior parte dos casos, o estado geral da criança 
está pouco comprometido e as queixas são vagas, 
como indisposição, inapetência, cefaleia e edema 
periorbital. 
O edema tem intensidade variável e, muitas vezes, 
é evidenciado apenas por queixas indiretas, como 
aumento brusco de peso e/ou observação de 
roupas ou calçados apertados. Habitualmente, o 
edema antecede o aparecimento da hematúria 
que, em dois terços dos casos, é macroscópica. No 
restante dos casos, pode haver apenas micro-
hematúria diagnosticada laboratorialmente. A 
hipertensão arterial é, em geral, moderada, 
depende da intensidade da hipervolemia e pode 
ser agravada pela ingestão de alimentos com 
elevado teor de sódio. 
Sintomas menos frequentes, como cólicas 
abdominais, hipertermia e vômitos alimentares, 
podem acompanhar o quadro. Na evolução natural 
dos casos não complicados, observa-se, em média 
de 7 a 15 dias após o início da doença, 
desaparecimento do edema, acompanhado por 
aumento da diurese e, 2 a 3 dias após, 
normalização dos níveis tensionais. Ao redor da 3ª 
ou 4ª semana após o início da sintomatologia, 
ocorre o restabelecimento clínico geral da criança. 
Deve-se salientar que alguns doentes podem 
desenvolver quadros subclínicosde GNDA 
caracterizados apenas por edema subclínico, 
hipertensão e diminuição do complemento. 
Complicações Podem manifestar-se isoladamente 
ou associadas. 
Congestão circulatória é mais frequente. 
Caracteriza-se por sinais clínicos de hipervolemia, 
como taquicardia, dispneia, tosse, estertores 
subcrepitantes em bases pulmonares e 
hepatomegalia. Pode ser agravada por hipertensão 
e levar a insuficiência cardíaca congestiva e edema 
agudo de pulmão. 
Encefalopatia hipertensiva Deve-se 
essencialmente à hipertensão e apresenta quadro 
clínico variável, podendo ocorrer cefaleia, vômitos, 
alterações visuais (diplopia ou amaurose 
transitória), irritabilidade, agitação, sonolência, 
crise convulsiva ou coma. 
Insuficiência renal aguda (IRA) É a menos comum. 
Estabelece-se oligoanúria intensa, retenção de 
escórias proteicas no plasma e distúrbios 
hidreletrolíticos graves, com tendência à 
hiperpotassemia. 
Exames complementares Dentre as principais 
alterações urinárias, destacam-se: 
• densidade urinária conservada, pela 
preservação da capacidade de concentração 
urinária relacionada à integridade tubular; 
• hematúria macroscópica ou microscópica; 
• cilindros hemáticos, hialinos, granulosos e 
leucocitários, sendo os hemáticos sugestivos de 
hematúria glomerular; 
• proteinúria, que, na fase aguda, não se 
correlaciona com gravidade da nefropatia. 
A maioria das alterações urinárias regride em 4 a 8 
semanas, embora possa persistir com hematúria 
residual por vários meses. 
A dosagem do complemento sérico é obrigatória 
para o diagnóstico de GNDA. Seus valores 
encontram-se diminuídos e a normalização de seus 
níveis ocorre em 4 a 8 semanas e é um marcador 
importante de prognóstico e diagnóstico 
diferencial. 
Os níveis de ureia e creatinina podem estar 
elevados em grau discreto ou moderado. Se a 
elevação for significativa, podem traduzir doença 
renal prévia ou glomerulonefrite rapidamente 
progressiva. 
As alterações no sódio, potássio e bicarbonato 
dependem do grau de déficit da função renal. 
Geralmente, observa-se discreta anemia 
dilucional, decorrente da hipervolemia. 
O título de antiestreptolisina O (ASO) pode estar 
elevado, dependendo do local da infecção e do 
sorotipo infectante. Nas amigdalites, os níveis são 
elevados, o que habitualmente não acontece nas 
piodermites. Além disso, quanto mais precoce a 
antibioticoterapia, menor a elevação; quanto 
maior o tempo entre o início da doença e a coleta 
do sangue, maior será a cifra da ASO. 
Em relação à bacteriologia, as culturas de secreção 
de orofaringe e da pele têm pouca importância, 
porque a infecção antecede em 1 a 3 semanas o 
aparecimento do quadro clínico da GNDA. 
Diagnóstico diferencial Algumas glomerulopatias 
podem apresentar, no início, quadro semelhante: 
• glomerulonefrite membranoproliferativa; 
• glomerulonefrite rapidamente progressiva; 
• doença de Berger, que apresenta, hematúria 
recorrente, sem os demais sinais clínicos que 
caracterizam a GNDA, com complemento sérico 
normal. 
 
Biópsia renal Como a GNDA é nefropatia de 
evolução favorável, a biópsia renal só está indicada 
em certas situações. 
 
TRATADO DE PEDIATRIA 4ª ED- 
São indicadores de biópsia renal: hematúria 
macroscópica com duração superior a 4 semanas, 
função renal persistentemente alterada por 
período maior de 4 semanas, hipertensão arterial 
prolongada por mais de 4 semanas, complemento 
sérico persistentemente baixo por mais de 8 
semanas, associação com síndrome nefrótica de 
duração superior a 4 semanas. 
TRATADO DE PEDIATRIA 3ª ED + AULA - 
Biópsia renal Deve ser realizada apenas em casos 
atípicos, como: 
 anúria ou oligúria importante por mais de 72 
horas; 
 proteinúrianefrótica por mais de 4 semanas; 
 hipertensão ou hematúria macroscópica por 
mais de 6 semanas; 
 C3 baixo por mais de 8 semanas; 
 azotemia acentuada ou prolongada. 
Tratamento Deve ser individualizado de acordo 
com o quadro clínico (presença ou não de 
complicações), condição socioeconômica e 
cultural. Deve-se dar preferência ao tratamento 
ambulatorial e, a princípio, restringir a 
hospitalização aos casos de oligúria intensa, de 
insuficiência cardíaca ou de encefalopatia 
hipertensiva. 
O repouso deve ser limitado pelo próprio paciente 
e recomendado enquanto persistirem edema e 
hipertensão ou na vigência de complicações. 
A restrição dietética é importante para o 
restabelecimento clínico (diminuição do edema e 
dos níveis tensionais) e a prevenção e/ou a 
atenuação das complicações da insuficiência renal 
transitória (hipervolemia e azotemia). 
A cota hídrica deve ser restrita a 20 mL/kg/dia. 
Quando houver regressão do edema, devem-se 
acrescentar as perdas do dia anterior (diurese e/ou 
vômitos). Inicialmente, recomenda-se dieta de 
arroz e frutas, a qual contém 300 mg de NaCl. A 
ingestão de sódio deve ser diminuída (menos que 
2 g de NaCl/m2 /dia) também durante a fase de 
edema, hipertensão e oligúria. A restrição proteica 
é necessária quando houver IRA. A restrição de 
potássio está indicada apenas nos casos de oligúria 
importante (diurese < 240 mL/m2 SC/dia). 
Tratamento medicamentoso 
Infecção estreptocócica O tratamento da GNDA 
requer erradicação da infecção com administração 
de penicilina V na dose de 25.000 a 50.000 UI/ 
kg/dia, por via oral (VO), a cada 6 horas, durante 8 
a 10 dias, ou penicilina G benzatina (droga de 
escolha) em dose única de 600.000 U para crianças 
com menos de 25 kg e 1.200.000 U para crianças 
com mais de 25 kg. Nos casos de alérgicos a 
penicilina, deve-se prescrever eritromicina na dose 
de 30 mg/kg/dia durante 10 dias. 
Diuréticos A furosemida, na dose de 1 a 5 
mg/kg/dia, está indicada nos casos de congestão 
cardiocirculatória importante, oligoanúria e 
hipertensão sintomática. 
Hipotensores Devem ser utilizados somente nos 
casos em que a hipertensão persiste apesar do 
ATENÇÃO! DIVERGÊNCIA ENTRE AS LITERATURAS 
ÊNCIA ENTRE AS LITERATURAS 
 
desaparecimento do edema e da oligúria, ou nos 
casos de hipertensão sintomática. As drogas mais 
utilizadas são hidralazina, nifedipina (por causa do 
risco de hipotensão, recomenda-se monitoração 
rigorosa de frequência cardíaca, pressão arterial e 
reflexo pupilar). Alternativas  anlodipina (> 6 
anos), enalapril/captopril e losartana podem ser 
utilizados com especial atenção, pelo risco de 
provocar aumento dos níveis de potássio e/ou 
creatinina. O nitroprussiato de sódio deve ser 
restrito à unidade de terapia intensiva para os 
casos de encefalopatia hipertensiva. 
Resumindo, não fazer logo de início, porque o 
diurético pode ajudar ao diminuir o edema e a 
oligúria. Caso permaneça com a pressão elevada, 
administramos medicamentos. 
Tratamento das complicações 
Congestão circulatória Além das medidas já 
citadas, objetiva-se reduzir a hipervolemia com 
administração de furosemida, restrição hídrica, 
assistência ventilatória (oxigenoterapia e/ou 
ventilação mecânica) e sedação. Nos casos 
refratários a essas medidas, recomenda-se 
instalação de diálise peritoneal. 
Encefalopatia hipertensiva Caracterizada como 
urgência hipertensiva, recomenda-se nifedipina 
sublingual, repetida, se necessário, em 4 a 6 horas, 
com monitoração contínua do paciente e dos seus 
níveis tensionais. Em situações de emergência 
hipertensiva, utiliza-se nitroprussiato de sódio EV, 
por período não superior a 72 horas, dado o risco 
de intoxicação por tiocianato, um de seus 
metabólitos. Os anticonvulsivantes podem ser 
utilizados nos casos de convulsões associadas aencefalopatia hipertensiva ou distúrbios 
metabólicos (diazepam EV, lentamente). 
Evolução e prognóstico O primeiro sinal de 
melhora é o aumento da diurese com consequente 
diminuição do edema e a normalização dos níveis 
da pressão arterial. A hematúria macroscópica 
desaparece entre a 1ª e a 2ª semana, enquanto a 
microscópica pode permanecer até 18 meses, sem 
indicar um mau prognóstico. A proteinúria 
nefrótica desaparece em até 4 semanas, e 
proteinúria discreta pode persistir por alguns 
meses. O prognóstico da GNDA é bom.

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