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2020 NEF 4 - Insuficiência Renal Aguda, Insuficiência Renal Crônica, Terapia de Substituição Renal_linearized

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intro_22377
Cap.
1
AS FUNÇÕES DO RIM
VIDEO_02_NEF4
Para definir e compreender a injúria renal é fundamental um
entendimento preciso das funções do rim. Das três principais, duas podem
ameaçar a vida de maneira imediata se forem perdidas. São elas: (1) função
de filtro, ou função excretória, e (2) regulação do equilíbrio hidroeletrolítico
e acidobásico. A terceira função renal é a função endócrina, mediada
basicamente através da produção de dois hormônios principais: a
eritropoetina e o calcitriol (forma ativa da vitamina D). Comentaremos
sobre a função endócrina mais tarde, no capítulo de insuficiência renal
crônica.
A FUNÇÃO DE FILTRO: EXCREÇÃO DE
TOXINAS
O rim tem a função de eliminar do organismo a maior parte das
substâncias tóxicas derivadas do metabolismo. As principais toxinas,
formadas diariamente, são derivadas do metabolismo proteico. Essas
substâncias contêm nitrogênio em suas moléculas, pois se originam da
quebra dos aminoácidos e por isso são chamadas de "escórias
nitrogenadas" ou "compostos azotêmicos" ("azoto" = "nitrogênio"). Até
hoje, a maior parte destas moléculas ainda não é bem conhecida, mas
sabe-se que seu acúmulo em grandes quantidades tem forte participação
no desenvolvimento de uma síndrome clínica grave e potencialmente fatal:
a síndrome urêmica (ou UREMIA), que descreveremos mais tarde.
Algumas dessas toxinas têm demonstrado toxicidade in vitro e in vivo, tais
como os compostos guanidínicos derivados da arginina, as aminas
alifáticas ou aromáticas (derivadas do triptofano), os fenóis, os indóis,
entre outros... A ureia, quando em concentrações muito elevadas (> 380
mg/dl), também apresenta efeitos tóxicos, como anorexia, náuseas,
vômitos e sangramento.
QUADRO DE CONCEITOS I Azotemia x uremia.
A Taxa de Filtração Glomerular (TFG) é o parâmetro que quantifica a
função renal. Seu valor normal depende da idade, do sexo e do tamanho
do indivíduo, mas gira em torno de 120 ml/min. Assim, cerca de 170 litros
de plasma são filtrados por dia nos glomérulos, e desses, cerca de 168 litros
retornam ao intravascular através do processo de reabsorção tubular. Os
dois litros restantes são eliminados como urina (que contém TODAS as
toxinas que precisam ser excretadas).
Algumas substâncias, além de filtradas no glomérulo, ainda podem ser
eliminadas na urina pelo processo de secreção tubular. Um exemplo de
secreção tubular é o que ocorre com as penicilinas e com o ácido úrico: a
maior parte de sua eliminação não ocorre pela filtração glomerular, mas
PRINCIPAIS FUNÇÕES DO RIM
Excreção de toxinas do metabolismo.
Regulação do equilíbrio hidroeletrolítico.
Função endócrina – eritropoetina e calcitriol.
Azotemia é o aumento das "escórias nitrogenadas", detectado pela
elevação de ureia e creatinina no sangue – diversas outras
substâncias nitrogenadas, que também se elevam nos quadros
azotêmicos, não são habitualmente mensuradas.
Uremia é um termo sindrômico (síndrome urêmica), e faz
referência aos sinais e sintomas que resultam da injúria renal
grave – não deve ser usado para indicar o aumento da ureia! A
uremia costuma ocorrer com TFG < 15-30 ml/min...
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sim pela secreção tubular, através de um carreador de ácidos orgânicos
presente nas células do túbulo proximal.
A MEDIDA DA FUNÇÃO (EXCRETÓRIA) RENAL
A única maneira de se medir a função excretória renal é pela quantificação
da filtração glomerular. A síndrome urêmica costuma ocorrer com uma
Taxa de Filtração Glomerular (TFG) abaixo de 15-30 ml/min, o que
corresponde, em geral, a uma concentração sérica de ureia e creatinina
acima de 120 mg/dl e 4,0 mg/dl, respectivamente, em um homem de 40
anos pesando 70 kg.
Os principais métodos de avaliação da função renal são: (1) ureia sérica;
(2) creatinina sérica; (3) clearance de creatinina, que pode ser diretamente
medido (urina de 24h), ou estimado através de fórmulas matemáticas; (4)
clearance de radiotraçadores e (5) clearance de inulina. Novos marcadores
séricos também vêm sendo incorporados à prática (ex.: cistatina C – ver
adiante). Cada um desses métodos possui vantagens e desvantagens, que
devem sempre ser levadas em conta na hora de interpretar seus resultados.
Vale ressaltar que aquele considerado o "padrão-ouro" (clearance de
inulina), na verdade, só é empregado no âmbito da pesquisa científica,
devido à alta complexidade (e custo) de sua realização...
UREIA SÉRICA
A ureia é formada no fígado a partir da molécula de amônia (NH3), esta
última produzida pelo metabolismo proteico endógeno e pelas bactérias
da microbiota intestinal. Enquanto a amônia é extremamente tóxica para
o organismo, sendo uma das substâncias causadoras da encefalopatia
hepática (mais detalhes no bloco de Hepatologia), a toxicidade da ureia é
menos importante... Tanto é assim que a ureia só consegue produzir
efeitos adversos quando em concentrações muito elevadas (> 380 mg/dl),
afetando o trato gastrointestinal (anorexia, náuseas e vômitos) e a
hemostasia primária (disfunção das plaquetas). Como a ureia é eliminada
quase que exclusivamente pelo rim, e é de fácil dosagem, podemos utilizar
seus níveis séricos para uma estimativa grosseira da função excretória
renal. De uma forma geral, os níveis de ureia se elevam acima dos valores
de referência quando a TFG está menor que 50 ml/min. O valor normal
da ureia é 20-40 mg/dl.
Entretanto, a ureia não é o melhor "termômetro" para se medir a TFG...
Boa parte da ureia filtrada pelo glomérulo é naturalmente reabsorvida no
túbulo proximal (cerca de 40-50%)! Desse modo, condições que aumentam
a reabsorção tubular – como a hipovolemia – aumentam os níveis séricos
de ureia de forma desproporcional à queda na TFG... Além disso, a
grande produção de amônia após uma hemorragia digestiva alta, quando
as bactérias intestinais catabolizam intensamente a hemoglobina liberada,
leva a um aumento na produção hepática de ureia, novamente elevando
seus níveis séricos sem que haja uma correlação precisa com a TFG. Um
aumento no catabolismo proteico, como ocorre na sepse e no uso de
corticosteroides, eleva a ureia sanguínea de maneira independente da
função renal. Uma dieta hiperproteica também pode elevar os níveis de
ureia. Em contrapartida, a ureia pode estar reduzida na insuficiência
hepática e na desnutrição... Logo, a utilização da ureia plasmática como
marcador de função renal deve levar em conta a presença de condições
não renais, capazes de interferir em seus níveis (Tabela 1)!
Tab. 1: Causas de aumento da ureia sérica.
CREATININA SÉRICA
É uma substância atóxica produzida pelo tecido muscular, derivada da
creatina, molécula armazenadora de energia no miócito. Possui algumas
vantagens em relação à ureia como medida da função excretória renal: (1)
sua produção diária é relativamente constante, desde que o peso e a dieta
também se mantenham estáveis; (2) ao contrário do que ocorre com a
ureia, a creatinina não é reabsorvida pelo túbulo.
Os níveis normais de creatinina dependem da massa muscular e da ingesta
de carne, o que provavelmente justifica suas variações étnicas, etárias, de
gênero e geográficas (Tabela 2). Em um indivíduo musculoso, uma
creatinina de 1,2 mg/dl pode ser normal, enquanto em um desnutrido
magro esse valor já pode indicar injúria renal grave... O valor normal da
creatinina é:
Homens < 1,5 mg/dl;
Mulheres < 1,3 mg/dl.
Tab. 2: Variações na creatinina sérica basal.
A grande desvantagem da creatinina sérica como marcador de função
renal é que, para que seus níveis ultrapassem o limite superior da
Insuficiência renal.
Hipovolemia.
Sangramento digestivo.
Estados hipercatabólicos.
Corticosteroide/tetraciclinas.
Dieta hiperproteica.
I - AUMENTO FISIOLÓGICO DA CREATININA SÉRICA BASAL
Jovem.
Raça negra.
Grande massa muscular.
Grande ingesta de carne.
II - REDUÇÃO FISIOLÓGICA DACREATININA SÉRICA BASAL
Idoso.
Hispânicos ou asiáticos.
Amputado (principalmente de membro inferior).
Doença crônica (desnutridos, estados inflamatórios crônicos).
Vegetarianos.
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normalidade, pode ser necessária uma queda relativamente acentuada da
TFG, às vezes para menos de 50% do normal... Veja bem: a creatinina
sérica é inversamente proporcional à TFG. Se a TFG diminui para a
metade, a creatinina sérica tem que aumentar o dobro. Neste caso, se, por
exemplo, o nível de creatinina basal for de 0,6 mg/dl (paciente magro), o
aumento será para 1,2 mg/dl, ainda dentro dos valores de referência.
Portanto, os estágios iniciais da disfunção renal podem não ser detectados
pela dosagem de creatinina sérica. Lembre-se que atualmente dispomos de
terapias que retardam a progressão da insuficiência renal crônica (IECA e
ant. angio II). Deixar pra começar o tratamento somente quando houver
azotemia pode significar a perda de uma grande "janela de
oportunidade"...
É válido lembrar que algumas drogas e substâncias podem aumentar a
creatinina sérica sem que haja queda na TFG. Certos medicamentos
competem com a creatinina pela secreção no túbulo proximal (os
principais são: penicilina, probenecida, cimetidina e trimetoprim), o que faz
seus níveis aumentarem. Por exemplo: o uso regular de cimetidina pode
elevar a creatinina sérica em até 0,4-0,5 mg/dl! O acetoacetato (presente
em altas concentrações na cetoacidose diabética) interfere com os ensaios
de mensuração da creatinina sérica, dando um resultado falsamente alto
(aumento de 0,5 mg/dl até > 2 mg/dl). Nestes casos, a insulinoterapia traz
os níveis de creatinina de volta ao normal... Drogas como a cefoxitina
(antimicrobiano) e a flucitocina (antineoplásico) também geram artefatos
nos exames bioquímicos, elevando falsamente o valor da creatinina sérica.
Lembre-se que na rabdomiólise a creatinina pode estar
desproporcionalmente alta em relação ao grau de injúria renal, por
aumento de sua liberação a partir do músculo lesado!
QUADRO DE CONCEITOS II
CLEARANCE DE CREATININA
Clearance, em inglês, significa depuração. Por definição, é o volume de
plasma que fica "livre" da substância a ser eliminada a cada minuto. Por
exemplo, o clearance da ureia é de apenas 50-70 ml/min. Como uma parte
da ureia é reabsorvida e retorna ao plasma, seu clearance acaba ficando
menor que a taxa de filtração glomerular. A creatinina, por sua vez, não é
reabsorvida – tudo o que é filtrado no glomérulo é excretado na urina e,
portanto, depurado do plasma. Podemos dizer que o clearance de
creatinina (ClCr) é uma razoável estimativa da TFG, apesar de
superestimá-la um pouco (costuma ser 10-15% maior que a TFG real). O
valor normal do clearance de creatinina é de 91-130 ml/min.
O motivo da discreta superestimativa da TFG pelo ClCr é o fato de
cerca de 10-15% da creatinina ser eliminada por secreção tubular, e
não pela filtração glomerular.
Como medir o ClCr na prática médica?
O paciente deve coletar TODA a urina durante 24h e levá-la ao
laboratório. Determina-se a concentração urinária de creatinina (Cru) e o
volume urinário em 24h (V, em ml). Sabendo-se a concentração de
creatinina sérica (Cr), calcula-se o clearance de creatinina (ClCr) pela
fórmula a seguir:
Obs.: 1.440 é o número de minutos em 24h.
O clearance de creatinina é o exame mais utilizado para diagnosticar o
estágio inicial da injúria renal, particularmente quando a creatinina sérica
ainda não se elevou acima dos valores de referência (não há azotemia). Na
injúria renal avançada, isto é, quando a TFG se encontra muito reduzida,
o clearance de creatinina progressivamente perde sua precisão, pois passa a
superestimar a TFG de uma forma exagerada, uma vez que até 35% da
creatinina pode estar sendo eliminada por secreção tubular! Alguns
estudos mostraram que o Clcr mensurado na vigência de franca
insuficiência renal pode representar, falsamente, o DOBRO da verdadeira
TFG, conforme medido por métodos mais fidedignos (ex.: clearance de
inulina)...
Teoricamente, este problema poderia ser amenizado administrando-se
cimetidina (um inibidor da secreção tubular de creatinina). O protocolo
clássico utiliza doses de 1.200 mg (dia 1) e 400 mg/dia (dias 2, 3 e 4) antes
da coleta urinária... Contudo, pelo fato de algumas evidências terem
sugerido que o bloqueio na secreção de creatinina pela cimetidina seja, na
verdade, inconstante – pois varia de um paciente a outro, dificultando a
padronização do teste – tal método não é mais preconizado...
Nas últimas décadas, diversos trabalhos desenvolveram fórmulas
matemáticas para estimar o clearance de creatinina sem necessitar da urina
de 24h (que é sujeita a erros de coleta). Dentre as várias fórmulas que
foram desenvolvidas, daremos destaque a somente três: (1) fórmula de
Cockcroft-Gault; (2) fórmula do estudo MDRD; (3) fórmula do CKD-EPI.
Uma creatinina sérica de 1,3 mg/dl pode ser normal para um
paciente jovem e musculoso, mas pode representar uma grave
redução da função renal em uma paciente idosa e magra.
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Tais fórmulas nos dão um ótimo exemplo de como a concentração sérica
de creatinina deve sempre ser interpretada à luz de outras variáveis clínicas
(idade, sexo, peso)... Como você acabou de ver, um mesmo valor de
creatinina (1,2 mg/dl) corresponde a uma função renal reduzida numa
senhora de 70 anos pesando 60 kg, mas se relaciona a uma função renal
normal em um homem jovem com 70 kg...
A fórmula mais utilizada nas provas de residência é a de Cockcroft-Gault,
por ser a mais fácil de memorizar e calcular... Contudo, é importante
conhecer suas limitações: (1) ela superestima a TFG em pessoas
extremamente obesas, já que parte considerável do peso desses indivíduos
não é de massa muscular, e sim tecido adiposo (que não secreta
creatinina); (2) desnutridos, amputados, paraplégicos e tetraplégicos, além
de pacientes muito idosos, crianças e gestantes também apresentam maior
chance de resultados irreais com o uso desta fórmula, devido às variações
na proporção de massa muscular em relação ao peso corpóreo total... Em
todos estes casos, recomenda-se lançar mão de métodos DIRETOS de
aferição da TFG, como o clearance de creatinina na urina de 24h, ou
mesmo o clearance de radiotraçadores (ver adiante).
Na prática médica, graças ao advento de calculadoras online e aplicativos
para dispositivos móveis eletrônicos, a fórmula de Cockcroft-Gault é
menos utilizada... De acordo com a literatura, a de escolha na atualidade é
a fórmula CKD-EPI, que se mostrou mais acurada que as demais.
MAS AGORA CUIDADO: nenhuma dessas fórmulas deve ser
utilizada nos casos de injúria renal aguda!!! Elas foram
desenvolvidas somente para pacientes com função renal estável...
Na IRA, a creatinina sérica leva de 48-72h para se elevar por
completo após uma queda na TFG. Desse modo, estimar o
clearance de creatinina através de fórmulas, num momento em que
a creatinina sérica ainda não tenha atingido seu valor máximo,
inevitavelmente resulta numa superestimativa da TFG...
OUTROS MARCADORES DA FUNÇÃO
EXCRETÓRIA RENAL
Protocolos utilizando radiotraçadores como o Cr51-EDTA, o I125-
Iotalamato, o Tc99m-DTPA ou o iohexol costumam ser utilizados em
estudos científicos para avaliar a TFG com grande precisão, sendo,
entretanto, raramente empregados na prática clínica (são métodos caros e
pouco disponíveis).
Já o clearance de inulina é considerado o "padrão-ouro" para a
mensuração exata da TFG, uma vez que esta molécula (polímero da
frutose) é um "marcador ideal de filtração glomerular": a inulina é inerte
(ou seja, não é sintetizada nem metabolizada no organismo), não se liga a
nenhuma proteína plasmática e é inteiramente filtrada nos glomérulos,
sem ser reabsorvida, secretada ou modificada pelas células tubulares,
apenas filtradas... Entretanto, o clearance de inulina também não é feito de
rotina! São dois os principais empecilhos: (1)baixa disponibilidade da
molécula (o que torna seu custo muito elevado); (2) técnica extremamente
complexa para sua realização... Para medir o clearance de inulina é
necessário administrá-la em infusão contínua, realizar coletas seriadas de
sangue e cateterizar a bexiga do paciente para quantificação precisa do
fluxo urinário! Logo, não é um exame muito prático...
A cistatina C é uma proteína de baixo peso molecular (13 kDa) produzida
por todas as células nucleadas do organismo. Ela é livremente filtrada pelo
glomérulo, não sendo reabsorvida pelos túbulos. Sabemos que sua
secreção tecidual sofre influência de fatores como idade, sexo, raça e
variáveis antropométricas (peso, altura, quantidade de tecido adiposo),
entre outros. Logo, a cistatina C NÃO é superior à creatinina como
marcador de função renal! Além do mais, a cistatina C é parcialmente
metabolizada pelo rim, o que invalida a medida direta de seu clearance
urinário. Não obstante, estudos recentes demonstram que a combinação
SAIBA MAIS...
Estimativa do clearance de creatinina em CRIANÇAS!
Para a população pediátrica existe uma fórmula especial para
estimativa do Clcr: trata-se da fórmula de Schwartz.
TFG = K x altura (em cm)/Cr
K é uma constante que varia conforme a faixa etária. Representa uma
"correção" para as diferentes proporções de massa muscular em
relação ao peso corpóreo total, de acordo com a idade... Seus valores
são: (1) bebês prematuros = 0.33; (2) bebês normais = 0.45; (3)
crianças > 1 ano e adolescentes do sexo feminino = 0.55; (4)
adolescentes masculinos = 0.7.
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de ambas (creatinina + cistatina C) permite uma estimativa mais acurada
da TFG do que a utilização de cada uma delas isoladamente... Existe uma
variante da fórmula CKD-EPI que combina as dosagens séricas de
creatinina e cistatina C, sendo esta fórmula bastante precisa em
comparação com métodos diretos de aferição da TFG (ex.: clearance de
iotamalato). Até o momento, porém, não há comprovação de que seu uso
leve a melhores desfechos clínicos no manejo dos pacientes nefropatas, em
comparação com as fórmulas que utilizam apenas a dosagem de
creatinina. Por este motivo, apesar de precisa, tal fórmula não é
considerada a "de escolha" para estimativa da TFG na prática! Seu
emprego, inclusive, é limitado pelo maior custo e menor disponibilidade
da dosagem de cistatina C...
REGULAÇÃO HIDRO ELETRO LÍTICA E
ACIDOBÁSICA
Os níveis séricos de potássio, sódio, a osmolaridade e o pH extracelular
necessitam de uma precisa regulação renal. Este controle é feito através da
reabsorção e secreção tubular, porém, depende de uma filtração
glomerular mínima para garantir a eliminação dos eletrólitos
administrados e do H+ produzido. Por esta razão, a injúria renal leva a
uma série de distúrbios hidroeletrolíticos e acidobásicos, tais como
hipervolemia, hipercalemia, hiponatremia, acidose metabólica,
hipocalcemia, hiperfosfatemia e hipermagnesemia. Este assunto será
abordado com detalhes adiante.
VIDEO_03_NEF4
Cap.
2
INJÚRIA RENAL AGUDA
VIDEO_01_NEF4
Um quadro de insuficiência renal é dito agudo (IRA) quando sua
evolução é rápida, ao longo de horas ou dias. Na maioria das vezes este é
um diagnóstico puramente laboratorial, feito pelo reconhecimento da
elevação da ureia e creatinina plasmáticas (azotemia), na ausência de
sintomas. Contudo, quando a disfunção renal for grave (Crpl > 4,0 mg/dl,
geralmente com TFG < 15-30 ml/min), os sinais e sintomas da síndrome
urêmica já podem aparecer. Estima-se que cerca de 5-7% das admissões
hospitalares, e 30-70% das internações em UTI, cursem com algum grau
de insuficiência renal aguda!
Por definição, insuficiência renal é a queda na Taxa de Filtração
Glomerular (TFG). Entretanto, a azotemia (Crpl ≥ 1,5 mg/dl em homens e
≥ 1,3 mg/dl em mulheres) costuma aparecer somente quando a TFG está
pelo menos 50% abaixo do valor normal. Logo, podemos deduzir que
mesmo um paciente SEM AZOTEMIA já pode apresentar perda
significativa da função renal (veremos isso com calma adiante).
Nos dias de hoje, o termo "injúria renal aguda" tem sido preferido por
representar melhor o amplo espectro de apresentação da doença, uma vez
que a terminologia antiga descreve bem somente um subgrupo desses
pacientes, que são aqueles que necessitam de suporte dialítico de
emergência... Há muito se tenta padronizar a definição de IRA, mas ainda
não há consenso absoluto na literatura! Uma das definições mais
utilizadas na atualidade é aquela proposta pela KDIGO (Kidney Disease
Improving Global Outcomes) – Tabela 1.
Tab. 1
Na Tabela 2, colocamos o estadiamento da injúria renal aguda conforme
proposto pela mesma referência.
Tab. 2
DEFINIÇÕES DE INJÚRIA RENAL AGUDA (KDIGO – 2012)
● Aumento da creatinina sérica ≥ 0,3 mg/dl dentro de 48h; OU
● Aumento da creatinina sérica ≥ 1,5x o valor de base, ocorrendo
nos últimos sete dias; OU
● Débito urinário < 0,5 ml/kg/h por mais do que 6h.
ESTADIAMENTO DE GRAVIDADE DA IRA (KDIGO – 2012)
ESTÁGIO 1 ● Aumento da creatinina sérica ≥ 0,3 mg/dl;
OU
● Aumento da creatinina 1,5 a 1,9 vezes o
valor de base; OU
●
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Note que, apesar do destaque dado à OLIGÚRIA na definição acima, na
verdade a IRA pode ser dividida em três subtipos, de acordo com o débito
urinário: (1) IRA oligúrica, quando o débito urinário for inferior a 500
ml/24h, ou 400 ml/24h, dependendo da referência; (2) IRA não oligúrica,
quando a diurese for maior que 400-500 ml/24h; e (3) IRA anúrica, para
débitos urinários inferiores a 50 ml/24h ou 100 ml/24h (novamente existe
divergência na literatura)... O fato é que mais de 50% das IRA cursa com
a forma não oligúrica, com volume urinário normal em torno de 1 a 2
L/dia! Eventualmente, um débito urinário acima do normal (poliúria =
mais de 3 L/dia), pode ser observado em pacientes com injúria renal
aguda...
A ocorrência de injúria renal aguda (em qualquer grau) está associada a
um importante aumento da morbimortalidade intra-hospitalar.
Dependendo do contexto clínico (ex.: idade avançada, presença de outras
disfunções orgânicas) a mortalidade da IRA pode variar entre 30-86%.
ETIOPATOGENIA
A injúria renal aguda pode ser causada por três mecanismos básicos: (1)
hipofluxo renal (azotemia pré-renal); (2) lesão no próprio parênquima
renal (azotemia renal intrínseca) e (3) obstrução do sistema uroexcretor
(azotemia pós-renal). A causa de azotemia renal intrínseca mais comum é
a NTA (Necrose Tubular Aguda), responsável por cerca de 90% dos casos
neste grupo etiopatogênico. Mas considerando todos os mecanismos, o
mais comum parece ser o pré-renal, e o menos comum, o pós-renal. Veja
os percentuais:
1. Pré-renal (hipofluxo) – 55-60%;
2. NTA (Necrose Tubular Aguda) – 35-40%;
3. Pós-renal (obstrutiva) – 5-10%.
Analisando especificamente a população de doentes críticos (isto é,
aqueles internados no CTI), observa-se uma proporção diferente, com a
NTA sendo responsável por 50% dos casos de insuficiência renal aguda,
seguida pela pré-renal (35%) e pós-renal (10%). Outras causas de injúria
renal intrínseca correspondem a menos de 10% do total de casos.
AZOTEMIA PRÉ-RENAL
Azotemia pré-renal é a elevação das "escórias nitrogenadas" causada pela
redução do fluxo sanguíneo renal. É o tipo mais comum de injúria renal
aguda (55-60% dos casos). Caracteriza-se clinicamente pela
reversibilidade, uma vez restaurado o fluxo renal. As principais causas são:
(1) hipovolemia; (2) estados de choque; (3) insuficiência cardíaca; (4)
cirrose hepática com ascite.
O que todas estas entidades possuem em comum é a queda do chamado
volume circulante efetivo, ou seja, aquele que preenche o leito arterial e
perfunde nossos órgãos. Em situações normais, este volume corresponde a
30% do volume sanguíneo total. Na insuficiência cardíaca e na cirrose
com ascite, esta proporção pode cair para menos de 10%, pois ocorre
represamento do fluido intravascular, respectivamente, no territóriovenoso e esplâncnico.
FISIOPATOLOGIA
Felizmente, os vasos renais possuem um mecanismo de proteção contra
alterações deletérias do fluxo renal e da taxa de filtração glomerular, o que
denominamos autorregulação do fluxo renal e da filtração glomerular.
Quando a Pressão Arterial Média (PAM) cai, as arteríolas aferentes
vasodilatam, reduzindo a resistência vascular do rim, evitando o hipofluxo
renal. Em condições normais, o fluxo sanguíneo renal é preservado até
uma PA sistólica de 80 mmHg. Caso a pressão caia abaixo desse limite, a
autorregulação não será mais capaz de evitar o hipofluxo, pois as
arteríolas já estarão em seu máximo de vasodilatação!!! Neste ponto,
instala-se a azotemia pré-renal. É importante ressaltar que indivíduos com
um "desajuste" da autorregulação renal podem desenvolver azotemia pré-
renal mesmo quando a PA sistólica está um pouco acima de 80 mmHg. É o
caso dos idosos, hipertensos crônicos e diabéticos de longa data (condições
que comumente lesam a arteríola aferente).
O mecanismo de vasodilatação aferente depende de dois fatores: (1)
estímulo direto de barorreceptores de estiramento da própria musculatura
lisa arteriolar (reflexo miogênico) e (2) liberação intrarrenal de
vasodilatadores endógenos (prostaglandina E2, sistema calicreína-cinina,
óxido nítrico) que agem predominantemente na arteríola aferente.
A TFG ainda pode ser regulada de forma independente do fluxo renal,
por ação da angiotensina II, um potente vasoconstritor da arteríola
eferente. Ao agir sobre esta arteríola, a angiotensina II promove um
aumento da pressão de filtração glomerular, contribuindo para a
manutenção da TFG.
Veja a importância desses conceitos... Os AINE (inibidores da formação
de prostaglandinas), os inibidores da ECA e os antagonistas do receptor de
angiotensina II prejudicam a autorregulação do fluxo renal e da TFG!!!
Estes fármacos podem precipitar azotemia pré-renal em pacientes com
baixo fluxo renal, como aqueles com hipovolemia moderada a grave, ICC
descompensada, nefropatia crônica ou estenose bilateral de artéria renal.
A redução do volume circulante efetivo é um forte estímulo para a
ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona, do sistema
adrenérgico e para a liberação de ADH (vasopressina). A angiotensina II,
as catecolaminas e a vasopressina promovem vasoconstrição periférica de
Débito urinário < 0,5 ml/kg/h por 6-12h.
ESTÁGIO 2 ● Aumento da creatinina 2,0 a 2,9 vezes o
valor de base; OU
● Débito urinário < 0,5 ml/kg/h por ≥ 12h.
ESTÁGIO 3 ● Aumento da creatinina para um valor ≥
4,0 mg/dl; OU
● Aumento da creatinina 3,0 vezes o valor
de base; OU
● Débito urinário < 0,3 ml/kg/h por ≥ 24h;
OU
● Anúria ≥ 12h; OU
● Início da terapia de substituição renal; OU
● (Pacientes com < 18 anos): queda na
TFG estimada para < 35 ml/min/1.73 m² .
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modo a desviar o fluxo sanguíneo para os órgãos "nobres". Quando o
estímulo é intenso, a vasoconstrição acomete também os vasos renais,
contribuindo para a azotemia prérenal. O uso de drogas com efeito
vasoconstritor renal, tais como a noradrenalina, adrenalina, dopamina (em
dose alfa), ergotamina, ciclosporina e contraste iodado, pode também
precipitar uma azotemia pré-renal.
Na tentativa de conservação hidrossalina, a angiotensina II aumenta a
reabsorção de sódio e água pelo néfron proximal, enquanto a aldosterona
aumenta a reabsorção de sódio e água no néfron distal. A vasopressina
aumenta a reabsorção de água livre no néfron distal. Resultado final:
oligúria, urina hiperconcentrada e pobre em sódio.
ETIOLOGIA
A Tabela 3 reúne as principais causas de injúria pré-renal.
Tab. 3: Causas de azotemia pré-renal.
A redução do volume circulante efetivo é a causa mais comum de injúria
pré-renal e, portanto, de injúria renal aguda. Pode ser devida à hemorragia
externa ou interna, diarreia, vômitos, fístulas digestivas, poliúria, sudorese
intensa ou perda para o terceiro espaço (retroperitôneo – pancreatite;
peritôneo – ascite; luz intestinal – obstrução intestinal aguda, isquemia
intestinal, íleo paralítico; tecido muscular – rabdomiólise). Devemos estar
atentos para não "deixar passar" o diagnóstico de hemorragias internas,
como hemotórax, hemoperitôneo e hematoma muscular da coxa, todos
consequentes a trauma. A musculatura da coxa traumatizada pode
armazenar até 12 L de líquido, só de edema...
O estado de choque é acompanhado pela redução generalizada do fluxo
orgânico. Um dos órgãos mais afetados é o rim. Os choques
hipovolêmicos, cardiogênico, séptico e obstrutivo, são os tipos descritos. A
causa mais comum de choque cardiogênico é o infarto agudo do
miocárdio.
A insuficiência cardíaca descompensada pode causar redução importante
do fluxo renal, pelo baixo débito cardíaco. Na insuficiência cardíaca, a
ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona promove retenção
hidrossalina que inicialmente é benéfica, por aumentar o retorno venoso e
manter, até certo ponto, um débito cardíaco satisfatório. Contudo, no
estado mais avançado da cardiopatia, a retenção de sódio e água pelo rim
torna-se excessiva, sobrecarregando o ventrículo doente e levando a
congestão pulmonar e sistêmica.
A cirrose hepática com ascite é um estado de hipovolemia relativa, pois
estes pacientes apresentam uma intensa vasodilatação esplâncnica,
reduzindo a quantidade de fluido no leito arterial. A hipertensão porta,
em associação com a disfunção hepatocelular, prejudica a depuração do
óxido nítrico (NO) produzido pelo endotélio da circulação mesentérica. O
óxido nítrico é um potente vasodilatador local.
A nefropatia isquêmica é uma situação especial de azotemia pré-renal.
Ocorre na estenose bilateral de artéria renal (ou estenose arterial em rim
único). Geralmente são pacientes previamente hipertensos e com
aterosclerose em vários territórios vasculares. O mecanismo da isquemia
aguda pode ser trombose sobre a placa de ateroma, hipovolemia ou uso de
inibidores da ECA/AINE em pacientes com estenose bilateral grave. No
caso dos inibidores da ECA e AINE, a IRA geralmente é reversível após a
retirada da droga.
QUADRO DE CONCEITOS I IRA pré-renal.
SÍNDROME HEPATORRENAL
A síndrome hepatorrenal (SHR) é uma forma peculiar de IRA pré-renal
que acomete cerca de 20-40% dos portadores de cirrose hepática
avançada, mas também pode surgir no contexto da insuficiência hepática
fulminante (particularmente na hepatite alcoólica). Apesar de ser uma
IRA "pré-renal", a SHR não pode ser resolvida apenas com a
normalização da volemia...
Em termos histológicos, caracteriza-se pela ausência de alterações
estruturais no parênquima renal, sendo o mecanismo da IRA uma intensa
vasoconstrição nas artérias e arteríolas pré-glomerulares (isquemia do
córtex), o que configura um tipo de IRA "funcional" potencialmente
reversível. Acontece que essa reversibilidade depende única e
exclusivamente da normalização da função hepática, seja de maneira
espontânea (ex.: cura da hepatite aguda), ou após transplante de fígado
(ex.: cirrose avançada)... Um curioso fato nos ajuda a entender que o
problema da SHR "não está nos rins do paciente": se o rim de um
portador de SHR for transplantado num indivíduo não hepatopata, a
vasoconstrição se desfaz espontaneamente, e a função renal se restabelece
de maneira paulatina...
Mas por qual motivo ocorre essa vasoconstrição renal tão intensa?
A SHR representa, na verdade, o evento terminal de um continuum de
alterações hemodinâmicas induzidas pela disfunção hepática! Nas fases
iniciais de qualquer hepatopatia grave podemos notar uma progressiva
VASODILATAÇÃO ESPLÂNCNICA, cuja principal consequência é a
redução da resistência vascular sistêmica (tendência à hipotensão).
Todavia, inicialmente não ocorre hipotensão arterial, pois o volume
circulante efetivo consegue ser mantido à custa de aumentos no débito
cardíaco, na vasoconstrição periférica (desvio de sangue de órgãos "menos
nobres", como pele e musculatura esquelética)e retenção renal de sódio e
Redução do volume circulante efetivo.
Estados de choque.
Insuficiência cardíaca descompensada.
Cirrose hepática com ascite.
Nefropatia isquêmica.
AINE.
Inibidores da ECA/antagonistas de angio II.
A injúria pré-renal geralmente se instala assim que a pressão
arterial média cai abaixo de 80 mmHg, porém, em alguns idosos,
hipertensos crônicos e diabéticos de longa data, o hipofluxo renal
poderá se instalar com uma PAM um pouco acima deste valor,
devido à disfunção crônica da arteríola aferente (menor capacidade
de vasodilatação).
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água. Tais respostas são mediadas pela ativação de dois importantes
sistemas: (1) adrenérgico e (2) renina-angiotensina-aldosterona.
Entretanto, a piora da função hepática leva a um aumento absurdo da
vasodilatação esplâncnica, promovendo uma queda tão acentuada da
resistência vascular sistêmica que os mecanismos compensatórios não
conseguem mais manter a homeostase circulatória e, por fim, acabam se
tornando eles mesmos deletérios. Vamos entender isso com calma... Olha
só: o aumento do tônus adrenérgico promove vasoconstrição inicialmente
periférica, mas quando exagerado também promove vasoconstrição renal
direta! Já o excesso de angiotensina II, além de contribuir para o estímulo
vasoconstritor, também induz hipersecreção de aldosterona, o que por sua
vez faz os rins reabsorverem sódio com uma avidez extrema (justificando o
clássico achado de Nau < 10 mEq/L na SHR). O aumento do sódio
corporal total leva ao estado hipervolêmico (aumento do volume de fluido
extracelular), que neste caso se expressa como edema periférico e,
principalmente, ascite volumosa, não raro refratária ao tratamento clínico.
Existe ainda um terceiro mecanismo compensatório que será ativado nos
casos extremos, numa última tentativa de normalizar o volume circulante
efetivo: a secreção "não osmótica" de vasopressina (AVP ou ADH). Este
hormônio aumenta a retenção renal de água livre (causando hiponatremia
dilucional) e possui efeito vasoconstritor direto (mais um fator
aumentando a vasoconstrição renal). Lembre-se que a hiponatremia é um
marcador de péssimo prognóstico na cirrose hepática justamente por
traduzir a existência de doença muito avançada...
Enfim, como você já deve ter percebido, tanto a queda inexorável do
volume circulante efetivo (por "roubo" da circulação esplâncnica) quanto
os fenômenos compensatórios exageradamente intensos (causando
vasoconstrição renal) levam a uma profunda redução na taxa de filtração
glomerular e no ritmo de produção de urina, o que resulta em oligúria
(débito urinário < 500 ml/dia ou < 400 ml/dia, dependendo da referência) e
azotemia (Cr > 1,5 mg/dl), ou seja, um quadro de injúria renal grave!!!
Mas o que explica a vasodilatação esplâncnica?
Tudo leva a crer que a vasodilatação no território esplâncnico é
secundária ao fenômeno da translocação bacteriana, isto é, bactérias
presentes no lúmen intestinal conseguem ultrapassar a mucosa (danificada
pela hipertensão porta) e alcançar os linfonodos mesentéricos. Neste local,
leucócitos mononucleares iniciam a produção de citocinas pró-
inflamatórias – como TNF-alfa e IL-6 – induzindo hipersecreção pelo
endotélio de mediadores como óxido nítrico, monóxido de carbono e
canabinoides endógenos, que promovem vasodilatação local e "roubo de
sangue" para a circulação esplâncnica!
E como se diagnostica a SHR?
Em primeiro lugar, precisamos reconhecer que a síndrome pode cursar
com dois padrões evolutivos:
● Tipo 1 – a creatinina sérica dobra de valor (ficando > 2,5 mg/dl) em
menos de duas semanas. Apesar de poder surgir de maneira espontânea,
em geral se identifica um evento deflagrador (o mais comum é a
peritonite bacteriana espontânea). O prognóstico é péssimo (mortalidade
> 90%) caso a disfunção hepática não possa ser corrigida (o melhor
tratamento é o transplante ortotópico de fígado). O quadro clínico é de
IRA oligúrica;
● Tipo 2 – a creatinina sérica aumenta de maneira lenta e gradual, levando
mais do que duas semanas para dobrar e ultrapassar o valor de 2,5
mg/dl. Geralmente não há fatores agudos desencadeantes (trata-se de
uma evolução natural da doença de base). O prognóstico de curto prazo
é um pouco melhor que o da SHR tipo 1, porém o tratamento definitivo
é o mesmo. O quadro clínico é de ascite refratária.
Em segundo lugar, precisamos reconhecer que a SHR é um diagnóstico de
exclusão! Por conta das alterações hemodinâmicas próprias das
hepatopatias graves (já descritas), os hepatopatas são naturalmente
propensos ao desenvolvimento de injúria renal aguda, em face de qualquer
insulto que altere sua homeostase circulatória... Infelizmente, tais insultos
são comuns nesse tipo de paciente (ex.: hemorragia digestiva alta,
peritonite bacteriana espontânea, uso excessivo de diuréticos de alça), o
que faz a IRA ser um problema bastante frequente. É preciso identificar
todos os fatores que possam contribuir para a IRA, e tratá-los de forma
direcionada.
Antes de prosseguir, devemos esclarecer um ponto que sempre gera
confusão... Como você deve ter reparado, ainda há pouco dizíamos que
um dos principais deflagradores da SHR tipo 1 é a Peritonite Bacteriana
Espontânea (PBE), mas agora acabamos de afirmar que a SHR é um
diagnóstico de exclusão... Isso não é contraditório??? Não se você
entender o seguinte: já vimos que na vigência de uma infecção grave
(como a PBE), o cirrótico tem grande chance de desenvolver injúria renal
aguda. Neste caso, num momento inicial não temos como dizer se ele
entrou ou não em SHR (ainda que o quadro clínico seja de IRA
oligúrica)... Como a PBE é um "deflagrador" da SHR, mesmo após a cura
dessa infecção o doente pode permanecer com oligúria e piora progressiva
da azotemia, quando então teremos certeza de que ele realmente entrou
em SHR...
Assim, fica fácil compreendermos os critérios diagnósticos da SHR,
propostos pelo International Ascites Club:
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CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DA SÍNDROME HEPATORRENAL
● Hepatopatia grave, aguda ou crônica, com hipertensão porta.
● Cr > 1,5 mg/dl.
● Ausência de melhora da creatinina sérica após expansão
volêmica com albumina IV (1 g/kg), passados pelo menos dois
dias sem administrar diuréticos.
● Ausência de choque circulatório.
● Ausência de uso atual ou recente de drogas nefrotóxicas (ex.:
aminoglicosídeos, AINE).
● Ausência de sinais de doença parenquimatosa renal,
particularmente: (1) proteinúria < 500 mg/dia; (2) presença de < 50
hemácias por campo de grande aumento no sedimento urinário;
(3) USG de rins e vias urinárias normal (descartando lesões no
parênquima e obstrução do trato urinário).
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Mais detalhes serão vistos no módulo de Hepatologia.
AZOTEMIA RENAL INTRÍNSECA
A azotemia renal intrínseca, ou IRA por lesão intrínseca, é a disfunção
renal aguda causada por lesão no próprio parênquima renal. É
responsável por 35-40% dos casos de injúria renal aguda. Pode cursar com
oligúria (necrose tubular aguda isquêmica, rabdomiólise,
glomerulonefrites ou nefropatias microvasculares), anúria (necrose cortical
aguda, algumas glomerulonefrites) ou não oligúria/poliúria (necrose
tubular aguda por aminoglicosídeos).
A injúria renal aguda por lesão renal intrínseca é uma entidade comum
entre os pacientes com patologias graves internados em CTI. Nessas
circunstâncias, está associada a uma alta letalidade (até 80%), mas não
por causa da insuficiência renal propriamente dita, e sim devido à
gravidade da doença de base (ex.: sepse com falência orgânica múltipla).
Enquanto o comprometimento glomerular (glomerulopatias) predomina
entre as causas de lesão renal intrínseca crônica, a causa mais comum de
lesão renal intrínseca aguda é o comprometimento tubular! O tipo mais
comum de IRA intrínseca é a Necrose Tubular Aguda (NTA) que responde
por cerca de 90% dos casos. A Tabela 4 mostra as principais causas de
injúria renal aguda intrínseca.Vamos aproveitar para rever os pontos mais
importantes de cada uma delas...
Tab. 4: Causas de IRA por lesão intrínseca.
NECROSE TUBULAR AGUDA ISQUÊMICA
A Necrose Tubular Aguda (NTA) isquêmica é uma causa frequente
de IRA oligúrica em pacientes internados, especialmente na UTI.
Em geral são pacientes em estado crítico (choque, sepse,
pancreatite aguda necrosante, politrauma, grande queimado, pós-
operatório). As cirurgias mais associadas à NTA isquêmica são: (1)
cirurgia cardíaca com circulação extracorpórea > 2h; (2) correção
de aneurisma de aorta abdominal com clampeamento aórtico acima
das renais > 60min; e (3) cirurgia biliar em pacientes ictéricos.
O sistema tubular é mais sensível à lesão isquêmica ou hipóxica do
que o glomérulo, pois (1) tem um gasto energético maior e (2)
recebe menor vascularização. A parte reta do túbulo proximal e a
porção ascendente espessa da alça de Henle são especialmente
suscetíveis (são os segmentos que gastam mais energia).
Para levar à NTA, a isquemia renal deve ser grave ou prolongada,
mas se o paciente for nefropata crônico ou estiver tomando
medicamentos nefrotóxicos, a NTA pode ocorrer com graus menos
severos de isquemia... No caso da sepse, o principal mecanismo é
a combinação de vasoconstrição renal + vasodilatação sistêmica,
com a endotoxina também exercendo um efeito tóxico direto sobre
os túbulos renais.
A NTA isquêmica, na verdade, faz parte de um continuum: o
paciente com isquemia renal evolui de imediato com azotemia pré-
renal. Se esta não for corrigida precocemente (ex.: reposição de
fluidos), a tendência será a evolução para NTA isquêmica. Se isso
acontecer, a azotemia e a oligúria não mais responderão à
reposição volêmica!
Por que a NTA cursa com IRA (queda na TFG)? (1) feedback
tubuloglomerular – a mácula densa recebe mais sódio e cloreto,
pela menor reabsorção no túbulo proximal, o que induz
vasoconstrição da arteríola aferente; (2) obstrução do sistema
tubular por plugs epiteliais; (3) vazamento de escórias nitrogenadas
pela parede tubular desnuda, com retorno das mesmas ao plasma.
A lesão do epitélio tubular prejudica a reabsorção, levando à
formação de uma urina rica em sódio e água (diluída). As células
epiteliais se desprendem para o lúmen, aderindo-se à proteína de
Tamm-Horsfall e formando os cilindros epiteliais. Ao se
degenerarem, tais células acumulam pigmentos, formando cilindros
granulosos pigmentares ("cilindros marrons").
O prognóstico da NTA isquêmica é ruim... O paciente não morre da
IRA (pois deverá ser dialisado), e sim da disfunção orgânica
múltipla subjacente! Quando o paciente sobrevive à fase aguda, a
evolução natural é a regeneração do epitélio tubular dentro de 7-21
dias, sobrevindo uma fase poliúrica e paulatina recuperação da
TFG.
Necrose Tubular Aguda
● Isquêmica (choque, sepse, SIRS, pós-operatório).
● Rabdomiólise.
● Hemólise intravascular.
● Medicamentos (aminoglicosídeos, anfotericina B, contraste
iodado, ciclosporina, aciclovir, foscarnet, pentamidina, cisplatina,
ifosfamida).
● Venenos: etilenoglicol, Bothrops (jararaca), Loxosceles sp.
(aranha marrom).
● Síndrome da lise tumoral (ácido úrico).
Leptospirose
Nefrite intersticial aguda "alérgica"
● Penicilinas, cefalosporinas, sulfas, tetraciclinas, rifampicina,
etambutol, diuréticos, alopurinol, AINE, ranitidina, captopril.
Glomerulonefrite difusa aguda
Glomerulonefrite rapidamente progressiva
Nefroesclerose hipertensiva maligna
Ateroembolismo por colesterol
Síndrome hemolítico-urêmica
Crise renal da esclerodermia
Trombose de veia renal bilateral
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RABDOMIÓLISE
Rabdomiólise significa lesão muscular extensa, liberando na
circulação enzimas musculares (CPK, TGO, LDH, aldolase),
eletrólitos (potássio, fosfato), ácidos (ácido láctico) e pigmentos
(mioglobina). As causas mais comuns de rabdomiólise são: trauma
(especialmente o esmagamento muscular), isquemia muscular
(síndrome compartimental e da reperfusão muscular), imobilização
prolongada, grande mal epiléptico, hipertermia maligna, exercício
físico extenuante, hipocalemia ou hipofosfatemia graves, infecções
(influenza, tétano), intoxicações (etanol, cocaína, anfetamina,
ecstasy) e envenenamentos (Crotalus sp. – cobra cascavel).
A grande quantidade de mioglobina liberada pelo tecido muscular
lesado é filtrada pelo glomérulo e alcança os túbulos. Com um baixo
fluxo tubular (componente pré-renal associado: sequestro de
líquidos no "terceiro espaço" – tecido muscular lesado), a
concentração deste pigmento no lúmen torna-se muito alta,
podendo, então, promover NTA. O grupamento heme contido na
mioglobina é o grande pivô da lesão celular (por causar estresse
oxidativo)... Além de lesar diretamente os túbulos renais, a
mioglobina também possui efeito vasoconstritor, por depletar o
óxido nítrico intrarrenal.
O diagnóstico é dado pela história clínica, pela elevação das
enzimas musculares e pela mioglobinúria no EAS. Entretanto, na
urinálise convencional, a mioglobina é interpretada como
hemoglobina e o resultado mostrará "hemoglobinúria". A bioquímica
urinária é variável, sendo a presença de cilindros granulosos
pigmentados comum.
Nas primeiras 24-48h a diurese do paciente deve ser forçada por
uma vigorosa hidratação com salina isotônica (SF 0,9%). Quando o
débito urinário chega a 3 ml/kg/h (cerca de 200 ml/h), a maioria dos
autores recomenda administrar manitol e bicarbonato de sódio com
salina 0,45%. O manitol mantém um alto fluxo tubular, lavando a
mioglobina, e reduz o edema do epitélio tubular e o sequestro de
líquidos no músculo lesado. Acredita-se que o manitol também
possua efeito antioxidante direto (neutraliza radicais livres)... O
bicarbonato de sódio serve para alcalinizar a urina, reduzindo a
toxicidade da mioglobina e impedindo a formação de cilindros com
a proteína de Tamm-Horsfall... Tais medidas visam prevenir ou
reverter as fases precoces da NTA! Surgindo oligúria refratária,
deve-se realizar hemodiálise de urgência!!!
NEFROTOXICIDADE POR AMINOGLICOSÍDEOS
Algum grau de IRA ocorre em cerca de 15-30% dos pacientes que
usam aminoglicosídeos. De todos os medicamentos nefrotóxicos,
este é o grupo responsável pelo maior número de casos de NTA.
Hipovolemia, ICC, idade avançada e nefropatia crônica são os
principais fatores de risco.
Estas drogas, quando administradas em doses elevadas, mais de
uma vez ao dia e por um período > 10 dias, são altamente
nefrotóxicas. O fármaco é endocitado pelas células do túbulo
proximal, promovendo injúria celular direta. Como o principal defeito
está na reabsorção tubular, a IRA geralmente é não oligúrica. A
NTA por aminoglicosídeos é uma das causas de IRA associada à
hipocalemia e hipomagnesemia. A perda de potássio ocorre por
lesão tubular proximal, enquanto a perda de magnésio se dá por
lesão da alça de Henle. A bioquímica urinária é típica de NTA (rica
em sódio e água). O sedimento pode mostrar cilindros epiteliais e
granulosos.
Aqui é importante o entendimento do seguinte aspecto: como é
possível insuficiência renal sem oligúria?
Por definição, na insuficiência renal há redução significativa da
TFG. Com a queda na filtração glomerular, espera-se que haja uma
redução proporcional do débito urinário, levando à oligúria.
Entretanto, nas doenças tubulares, o débito urinário pode não
diminuir (ou até aumentar), apesar de haver queda da TFG e injúria
renal grave. A explicação é a seguinte: na tubulopatia, há uma
queda desproporcional da reabsorção tubular! No néfron normal,
cerca de 98% do que é filtrado é reabsorvido. Com o túbulo muito
doente, a reabsorção pode cair, por exemplo, para 85%. Assim,
mesmo com uma filtração glomerular reduzida (ex.: 10 ml/min ou 12
L/dia), se a reabsorção for de apenas 85% (10 L/dia), o débito
urinário poderá se manter em 2 L/dia. Se a reabsorção piora (ex.: 9
L/dia), o paciente urina cerca de 3 L/dia.
Como toda NTA, a lesão renal por aminoglicosídeos tende a ser
autolimitada,havendo recuperação paulatina da função renal após
a suspensão da droga, pelo mecanismo de regeneração tubular.
NEFROTOXICIDADE POR OUTROS
MEDICAMENTOS
Os mecanismos de nefrotoxicidade dos medicamentos que levam à
NTA são: (1) toxicidade tubular direta; (2) vasoconstrição arteriolar;
(3) obstrução tubular por depósitos ou cristais.
Contraste iodado: a toxicidade ocorre principalmente nos
nefropatas crônicos, que já tinham creatinina > 1,5 mg/dl... A
coexistência de desidratação, diabetes, ICC e mieloma múltiplo
potencializa o risco! A expansão volêmica é indicada para a
prevenção da nefropatia induzida por radiocontraste nos
pacientes de alto risco!!! O esquema mais usado em exames
eletivos consiste na infusão de soro fisiológico 1 ml/kg/h nas 12h
que antecedem o exame, mantendo a mesma taxa de infusão nas
12h posteriores ao exame. A insuficiência renal começa a se
desenvolver dentro das primeiras 48h após o exame e reverte após
sete dias, em média. Apesar de haver lesão tubular direta
(formação de radicais livres pela molécula de contraste), o principal
mecanismo fisiopatológico é a vasoconstrição da arteríola aferente,
mediada pela liberação renal de endotelina. A IRA pode ser tanto
oligúrica quanto não oligúria (dependendo da gravidade do
processo), o sedimento urinário é inocente e a bioquímica urinária é
do tipo pré-renal (sódio baixo e concentrado). Os contrastes não
iônicos e hipo-osmolares possuem menor chance de causar NTA.
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Ciclosporina: imunossupressor utilizado na prevenção da rejeição
após transplante renal. Esta droga é reconhecidamente nefrotóxica,
promovendo lesão tubular isquêmica por vasoconstrição da
arteríola aferente e contração do mesângio (daí a oligúria). Para
evitar seu efeito tóxico, os níveis séricos devem ser monitorizados
de rotina. O perfil da bioquímica urinária é semelhante ao da
toxicidade pelo contraste iodado (pré-renal: pouco sódio e pouca
água).
Anfotericina B: antifúngico potente, é bastante nefrotóxico,
levando à lesão tubular direta e promovendo uma IRA não
oligúrica com importante perda de potássio e magnésio. O quadro
se assemelha à NTA por aminoglicosídeos.
Outras: aciclovir (por formação de cristais), pentamidina, foscarnet,
cisplatina, ifosfamida (esta última pode causar a síndrome de
Fanconi), etc.
OUTRAS CAUSAS DE NECROSE TUBULAR
AGUDA
Variadas substâncias químicas podem ser nefrotóxicas,
promovendo NTA. As principais são os metais pesados (chumbo,
mercúrio), os inseticidas (paraquat), o etilenoglicol e o
envenenamento por cobras (Bothrops – jararaca) ou aranhas
(Loxosceles sp. – aranha marrom). No caso específico do
etilenoglicol, o mecanismo é o acúmulo de cristais de oxalato no
interior dos túbulos.
Além da mioglobina, outro pigmento pode levar à IRA por NTA: a
hemoglobina. Portanto, as hemoglobinúrias maciças podem cursar
com injúria renal!!! O efeito tóxico da hemoglobina é semelhante ao
da mioglobina (incluindo a vasoconstrição arteriolar pela depleção
renal de óxido nítrico).
O exemplo mais comum (e grave) é a reação hemolítica
transfusional por incompatibilidade ABO. Outros exemplos clássicos
de hemólise intravascular: malária falciparum, deficiência de G6PD.
O diagnóstico é suspeitado pelo achado de anemia e
hemoglobinúria no sedimento urinário, sem a presença de
hemácias (hematúria), descartada a rabdomiólise (níveis de CPK
normais).
SÍNDROME DA LISE TUMORAL
A terapia de tumores de alto grau de malignidade, especialmente
linfomas e leucemias, pode aumentar abruptamente os níveis
séricos de ácido úrico (liberado pela lise de células tumorais), que
será filtrado pelo glomérulo e atingirá o lúmen tubular, onde poderá
formar cristais obstrutivos que destroem o epitélio (NTA). A pista
diagnóstica é uma relação urinária ácido úrico/creatinina > 1,0. A
prevenção deve ser feita de acordo com o risco do paciente
(variável em função da neoplasia subjacente), e envolve medidas
como a hidratação vigorosa com cristaloide, o alopurinol e a
rasburicase (urato-oxidase recombinante). Uma síndrome idêntica
pode ocorrer espontaneamente em portadores de tumores
hematológicos de crescimento rápido, sendo denominada
nefropatia aguda pelo ácido úrico ou "lise tumoral espontânea".
LEPTOSPIROSE
"Devemos pensar na possibilidade de leptospirose para todo
paciente febril que desenvolva injúria renal aguda com potássio
sérico baixo".
A leptospirose é uma doença febril aguda de origem infecciosa,
causada pela espiroqueta Leptospira interrogans, com 23 sorotipos
identificados no Brasil.
O agente da leptospirose possui uma forma peculiar de
patogenicidade: pode provocar disfunção celular grave, sem
necrose ou inflamação significativas. A virulência deste micro-
organismo provém da liberação de toxinas... A mais conhecida é
uma glicolipoproteína (GLP) capaz de produzir "capilarite"
generalizada, levando ao extravasamento de líquido e sangue para
os tecidos. Seu espectro clínico é extremamente variável, podendo
cursar com uma forma oligossintomática, conhecida como "forma
anictérica" (90% dos casos), até uma forma caracterizada por
manifestações multissistêmicas graves – a "forma íctero-
hemorrágica", também conhecida como síndrome de Weil,
caracterizada por icterícia, hemorragia pulmonar e insuficiência
renal aguda, cuja letalidade pode alcançar 40%.
As alterações renais são incomuns na forma anictérica, exceto pela
presença de leptospirúria prolongada (até três meses) durante a
fase imune e algumas alterações na sedimentoscopia (micro-
hematúria, cilindrúria). Em contrapartida, na síndrome de Weil a
injúria renal aguda, por ser tão comum, é considerada parte
integrante da síndrome. Vamos compreender a lesão renal da
leptospirose...
Os rins são afetados na síndrome de Weil por três processos: (1)
capilarite, provocando edema renal e formação de petéquias
corticais; (2) nefrite tubulointersticial aguda, com infiltrado
mononuclear e áreas focais de necrose tubular aguda; e (3)
disfunção das células tubulares (desproporcional ao grau de
necrose), especialmente no túbulo proximal. Estas últimas sofrem
atuação direta da toxina GLP, inibindo a Na-K ATPase, de forma a
prejudicar a reabsorção tubular de sódio. O paciente desenvolve
Injúria Renal Aguda (IRA) com rápida elevação das escórias
nitrogenadas. Na maioria das vezes, a ureia e a creatinina não
ultrapassam os valores de 100 mg/dl e 8 mg/dl, respectivamente.
Entretanto, nos casos mais graves, as escórias alcançam valores
acima de 300 mg/dl para ureia e 18 mg/dl para creatinina, com o
paciente desenvolvendo síndrome urêmica e necessitando de
diálise.
A IRA relacionada à leptospirose é não oligúrica em 65% dos
casos, e oligúrica ou oligoanúrica nos 35% restantes. O predomínio
da forma não oligúrica vem do aumento da fração excretória de
sódio, pelo distúrbio tubular proximal. Um fato muito interessante
deve ser comentado: a IRA da leptospirose cursa com níveis
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séricos de potássio baixos ou normais, mesmo quando há
oligúria. Como há um prejuízo à reabsorção de sódio no túbulo
proximal, chega mais sódio ao túbulo coletor (néfron distal). É
exatamente neste segmento tubular que o sódio é reabsorvido em
troca da secreção de potássio! Portanto, mais sódio chegando ao
coletor, mais sódio é reabsorvido, promovendo mais excreção de
potássio na urina. Em outras palavras: na nefropatia da
leptospirose, o aumento da fração excretória de sódio acaba por
aumentar também a fração excretória de potássio.
As anormalidades urinárias mais comuns são inespecíficas e
incluem colúria, como resultado da hiperbilirrubinemia direta
(bilirrubina conjugada); piúria; hematúria; cilindrúria e proteinúria em
níveis variados. Todas essas alterações renais são reversíveis,
desaparecendo gradualmente com a melhora do quadro clínico
sistêmico.
Apesar de lesão tubulointersticial ser um evento frequente na
leptospirose grave, foi percebidoque boa parte dos casos de
insuficiência renal oligúrica podia ser prevenida através de
reposição hídrica generosa. Este fato evidencia a grande
importância do componente pré-renal na gênese da IRA da
leptospirose, provavelmente resultante dos seguintes fenômenos:
a) existência de episódios eméticos intensos associados à redução
da ingesta de líquidos; b) presença de quadro diarreico; c) perdas
insensíveis aumentadas pela existência de febre alta; d) ocorrência
de sangramentos, justificados pela diátese hemorrágica (presente
na leptospirose grave) e, principalmente, pela queda da pressão de
perfusão tecidual (e renal), consequente ao extravasamento de
líquidos para o terceiro espaço, fenômeno deflagrado pela
capilarite.
Tab. 5: Causas clássicas de IRA com hipocalemia.
A lesão muscular, típica de um quadro de leptospirose, costuma ser
evidenciada pela intensa mialgia, classicamente referida nas
panturrilhas, e pode contribuir para o dano renal na medida em que
libera mioglobina na circulação.
O tratamento da IRA na leptospirose visa a instituição precoce das
medidas de suporte, em especial a hidratação venosa (que deve
ser iniciada imediatamente após suspeita clínica). Antibioticoterapia
também está indicada em todos os casos. De um modo geral,
pacientes que não respondem de forma consistente à hidratação
venosa são submetidos à hemodiálise precoce antes que a
síndrome urêmica se instale e ponha em risco a vida do doente. Por
exemplo: sobreposição de disfunção plaquetária pela uremia +
diátese hemorrágica da própria leptospirose (capilarite).
NEFRITE INTERSTICIAL AGUDA (NIA)
O quadro clinicolaboratorial costuma ser suficiente para o
diagnóstico (não precisa de biópsia renal), como no caso da forma
farmacoinduzida (nefrite alérgica)... A coexistência de febre, rash
cutâneo eritematoso, eosinofilia significativa (em 50% dos casos) e,
caracteristicamente, eosinofilúria, hematúria, proteinúria e
cilindros piocitários, permite o diagnóstico em pacientes que
iniciaram um medicamento novo sabidamente implicado no
quadro... Lembre-se que o sedimento urinário deve ser feito "por
quem sabe", utilizando-se colorações especiais para a pesquisa de
eosinófilos (ex.: Hansel). Geralmente há oligúria (pelo edema
intersticial e compressão extrínseca dos túbulos). As causas mais
comuns de NIA são: penicilinas, cefalosporinas, sulfas, quinolonas,
rifampicina, diuréticos, alopurinol e ranitidina. O tratamento pode ser
apenas a suspensão da droga implicada e suporte para a
insuficiência renal. Os corticoides podem acelerar a resolução nos
casos mais graves. A pielonefrite aguda é uma causa de NIA
(piogênica).
GNDA (SÍNDROME NEFRÍTICA)
Em geral se trata de uma reação autoimune, levando à inflamação
glomerular, disfunção renal e oligúria. Nos casos mais graves a
proliferação inflamatória atinge a cápsula de Bowman, originando
estruturas com formato de "crescentes", que podem se expandir e
comprimir as alças glomerulares, o que provoca uma rápida
deterioração da função renal – uma síndrome chamada
glomerulonefrite rapidamente progressiva (GNRP). As principais
causas de GNDA que podem cursar com GNRP são:
glomerulonefrite pós-estreptocócica (pp. adultos), LES, síndrome de
Goodpasture, granulomatose de Wegner, poliangeíte microscópica
e angeíte de Churg-Strauss. O diagnóstico é suspeitado pela clínica
de síndrome nefrítica: oligúria, hipertensão, proteinúria e sedimento
mostrando hematúria dismórfica, cilindros hemáticos e
piocitários. Como vimos no volume I, a GNRP pode ser do grupo
ANCA positivo (pauci-imune), C3 baixo (imunocomplexos) ou
anticorpo anti-MBG positivo (Goodpasture). A confirmação
diagnóstica se dá pela biópsia renal (imunofluorescência), e o
tratamento é feito com corticoide (metilprednisolona) +
imunossupressores (ciclofosfamida) e, nas formas anti-MBG
positivas (ex.: Goodpasture), associação de plasmaférese.
Duas glomerulopatias crônicas, a nefropatia por lesão mínima e a
doença de Berger (nefropatia por IgA), raramente podem evoluir
com insuficiência renal aguda; a primeira, por hipovolemia grave,
relacionada à síndrome nefrótica; a segunda, durante a hematúria
macroscópica maciça, pela lesão tubular hemoglobínica.
NEFROESCLEROSE HIPERTENSIVA MALIGNA
Esta síndrome é o protótipo das doenças microvasculares agudas
do rim, um grupo formado pela nefroesclerose hipertensiva maligna,
ateroembolismo por colesterol, síndrome hemolítico-urêmica e crise
renal da esclerodermia. É uma importante causa de azotemia renal
intrínseca, induzida pelo aumento exagerado e súbito da pressão
arterial sistêmica, geralmente acima de 220 x 120 mmHg. A maioria
● Leptospirose.
● Lesão renal por aminoglicosídeos.
● Lesão renal pela anfotericina B.
● Nefroesclerose hipertensiva maligna.
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dos pacientes é da raça negra ou branca com hipertensão
secundária. A fundoscopia revela sinais de hipertensão acelerada
maligna: hemorragias, exsudatos e/ou papiledema. A lesão
histopatológica característica é a necrose fibrinoide arteriolar e a
arteriosclerose hiperplásica em "bulbo de cebola". O controle da PA
pode reverter, pelo menos em parte, a injúria renal, a despeito de
uma leve piora da azotemia nos primeiros dias de tratamento.
ATEROEMBOLISMO
É uma causa de IRA a ser considerada em indivíduos que
apresentam aterosclerose aórtica e foram submetidos a um
procedimento intravascular (cateterismo, angioplastia), ou foram
vítimas de trauma torácico fechado. Pequenos fragmentos de
colesterol se desprendem da placa ateromatosa e obstruem a
microvasculatura renal (arteríolas e capilares glomerulares).
O quadro clínico é de IRA oligúrica, associada à febre, eosinofilia,
livedo reticularis, isquemia de dígitos ("síndrome do dedo azul"),
mialgia intensa, com aumento importante da CPK total e
hipocomplementemia. Quase todos os pacientes evoluem com
perda definitiva da função renal!!! O diagnóstico depende da biópsia
(cutânea, muscular ou renal), que irá revelar um achado
patognomônico: as fissuras biconvexas vasculares. Não há
tratamento específico, e o prognóstico é péssimo...
SÍNDROME HEMOLÍTICO-URÊMICA (SHU)
Caracteriza-se pela seguinte associação: (1) anemia hemolítica
microangiopática; (2) trombocitopenia; (3) insuficiência renal aguda
oligúrica. Há uma hiperativação plaquetária, com formação de
agregados de plaquetas e fibrina (trombose) nos capilares
glomerulares. As hemácias, ao passarem em alta velocidade por
esses microtrombo, são fragmentadas e dão origem aos
"esquizócitos" visualizados no sangue periférico. A SHU é mais
comum em crianças pequenas (1-4 anos), manifestando-se
geralmente 7-15 dias após uma disenteria por E. coli êntero-
hemorrágica sorotipo O157:H7 (produtora da verotoxina), bem
como em gestantes e puérperas. Trata-se de uma síndrome
autolimitada e a conduta deve ser apenas de suporte, não raro com
diálise. Alguns casos evoluem para necrose cortical aguda (5%) –
especialmente gestantes e puérperas.
CRISE RENAL DA ESCLERODERMIA
Devemos suspeitar desta grave síndrome em pacientes
esclerodérmicos difusos que apresentam hipertensão acelerada
maligna associada à: IRA oligúrica, anemia hemolítica
microangiopática e plaquetopenia. Esses pacientes têm, na
verdade, uma endarterite interlobular crônica pela esclerodermia
que, subitamente, desenvolve vasoespasmo arteriolar renal difuso,
necrose fibrinoide e arterioloesclerose hiperplásica. Os inibidores da
ECA reduzem a mortalidade destes pacientes de 80% para menos
de 30%, inclusive permitindo a recuperação da função renal!
NECROSE CORTICAL AGUDA
A Necrose Cortical Aguda (NCA) é uma entidade relacionada à
sepse grave e, principalmente, as complicações obstétricas
(descolamento prematuro de placenta, aborto retido, etc.). Cerca de
5% dos casos de síndrome hemolítico-urêmica evolui com NCA.
Sua gênese se baseia no processo de Coagulação Intravascular
Disseminada (CIVD), determinando uma lesão endotelial extensanos vasos do parênquima renal.
Quando devemos suspeitar de NCA? Quando o paciente com
complicação obstétrica ou sepse grave evolui para anúria, ou
quando a "suposta NTA" não se recupera no período esperado – o
paciente permanece oligúrico e dependente de diálise. O
prognóstico da NCA é sempre ruim – em geral, o paciente se torna
agudamente um "renal crônico" (pois perde de forma abrupta e
irreversível um grande número de néfrons).
TROMBOSE DE VEIA RENAL
A trombose de veia renal bilateral pode levar à insuficiência renal
aguda. Uma causa comum é a desidratação grave de uma criança
pequena ou lactente. Faz diagnóstico diferencial com IRA pré-renal
e com a síndrome hemolítico-urêmica, causas comuns de IRA nesta
faixa etária. Outras causas de trombose de veia renal são as
síndromes de hipercoagulabilidade, especialmente a síndrome
nefrótica. O quadro clínico inclui lombalgia, hematúria e proteinúria
importantes. A ultrassonografia mostra aumento no tamanho
renal, e o diagnóstico pode ser confirmado pela angio-TC ou
angio-RM. O tratamento deve ser feito com anticoagulantes.
AZOTEMIA PÓS-RENAL
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A azotemia pós-renal, ou injúria pós-renal, é uma disfunção renal causada
por obstrução aguda do sistema uroexcretor. É responsável por apenas 5-
10% dos casos de injúria renal aguda, embora, no subgrupo dos idosos,
esta proporção se torne um pouco maior devido à elevada prevalência de
doença prostática...
CAUSAS DE NECROSE CORTICAL AGUDA
1. Descolamento prematuro de placenta.
2. Aborto retido.
3. Síndrome HELLP – complicação da pré-eclâmpsia.
4. Sepse grave.
5. Envenenamento por cobra ou aranha.
6. Síndrome hemolítico-urêmica.
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Um conceito fundamental: a azotemia pós-renal só irá se
desenvolver nas obstruções com repercussão renal bilateral, como
ocorre na obstrução uretral, do colo vesical, ureteral bilateral ou
ureteral em rim único. Uma obstrução renal unilateral, mesmo que
completa, geralmente não causa azotemia, pois o rim contralateral
(se for normofuncionante) é capaz de suprir a falta do outro.
Entretanto, se o paciente já for um nefropata crônico (ex.: IRC em
tratamento conservador) mesmo a obstrução de um único ureter
pode desencadear um quadro de uremia, pois o rim não obstruído
pode não ser capaz de manter a homeostase...
Tab. 6: Causas de azotemia pós-renal.
A hiperplasia prostática benigna é a causa mais comum de injúria pós-
renal. Nesta doença, o tecido prostático que cresce é o interno,
comprimindo, assim, em graus variados, a uretra prostática.
Eventualmente, a obstrução pode se agravar de maneira súbita ("retenção
urinária aguda"), por edema da glândula, espasmo do colo vesical ou
disfunção aguda do músculo detrusor, levando à retenção urinária. Os
fatores precipitantes mais frequentes são: uso de medicamentos com efeito
anticolinérgico (disfunção do detrusor) ou simpatomimético (espasmo do
colo vesical) – Tabela 7, infecção prostática (prostatite) ou do trato
urinário e infarto prostático. Clinicamente, o paciente apresenta-se com
oligoanúria, desconforto hipogástrico e "bexigoma". Alguns evoluem com
síncope vasovagal, desencadeada reflexamente pela distensão aguda da
bexiga. Lembre-se que a presença de diurese de modo algum descarta a
hipótese de obstrução, pois o fluxo de urina pode estar ocorrendo por
"transbordamento" em uma bexiga repleta... A passagem de um cateter de
Foley costuma resolver a obstrução e, portanto, a azotemia. Quando a
retenção vesical for maior que 900 ml, a chance do paciente voltar a urinar
espontaneamente é pequena (em torno de 15%), necessitando de cirurgia
prostática desobstrutiva.
Vale ressaltar que um "bexigoma" muito volumoso, ao ser rapidamente
esvaziado, pode levar à hematúria macroscópica, pela rotura de pequenos
vasos da parede vesical.
As outras causas menos comuns de obstrução do sistema uroexcretor
devem ser divididas em: (1) congênitas e (2) adquiridas. Exemplos de
uropatia obstrutiva bilateral congênita: valva uretral posterior, estenose
uretral, fimose. Das patologias adquiridas, destacam-se: câncer de
próstata, câncer de bexiga, bexiga neurogênica, cálculo uretral, cálculo
ureteral bilateral ou em rim único, carcinoma metastático para pelve (mais
comum: Ca de colo uterino), linfoma pélvico, fibrose retroperitoneal,
ligadura cirúrgica acidental dos ureteres.
Tab. 7
Quando suspeitar de IRA pós-renal? Naquele paciente idoso com história
de prostatismo e que repentinamente ficou anúrico (por obstrução
Obstrução uretral
● Congênita: valva uretral posterior, estenose, fimose.
● Estenose iatrogênica (ex.: cateter de Foley por tempo
prolongado).
● Cálculo uretral.
Obstrução do colo vesical e uretra prostática
● Hiperplasia prostática benigna (principal).
● Câncer de próstata.
● Câncer de bexiga.
Obstrução dos óstios vesicais
● Câncer de bexiga.
Obstrução ureteral
● Bilateral:
➤ Carcinoma metastático (colo uterino – principal);
➤ Linfoma pélvico;
➤ Fibrose retroperitoneal;
➤ Cálculo bilateral (raro).
● Unilateral em rim único:
➤ Cálculo;
➤ Papila necrosada;
➤ Coágulo;
➤ Inflamação;
➤ Tumor.
Funcional
● Bexiga neurogênica (ex.: neuropatia diabética).
● Medicamentos.
● Mielopatia (ex.: traumatismo raquimedular).
DROGAS QUE PODEM CAUSAR RETENÇÃO URINÁRIA
AGUDA
Alfa-adrenérgicos (descongestionantes nasais):
● Sulfato de efedrina;
● Pseudoefedrina;
● Fenilefrina;
● Fenilpropanolamina.
Anticolinérgicos:
● Metaproterenol;
● Terbutalina;
● Antidepressivos: imipramina, nortriptilina, amitriptilina;
● Antiarrítmicos: quinidina, procainamida;
● Anticolinérgicos: atropina, escopolamina, oxibutina;
● Antiparkinsonianos: bromocriptina, levodopa;
● Reposição hormonal: progesterona, testosterona;
● Antipsicóticos: haloperidol, clorpromazina;
● Anti-histamínicos: difenidramina, hidroxizina;
● Anti-hipertensivos: hidralazina, nifedipina;
● Outros: diazepam, indometacina, morfina, anestésicos.
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completa da uretra prostática). Insuficiência renal com anúria pode ser
encontrada eventualmente na necrose cortical aguda e na glomerulonefrite
rapidamente progressiva, mas deve sempre nos fazer pensar em obstrução
do trato urinário!
Como dissemos, nem toda azotemia pós-renal é anúrica... Quando a
obstrução é parcial ou funcional, o paciente urina, apresentando oligúria,
débito urinário normal ou até mesmo poliúria! A poliúria, neste caso,
deve-se à perda da capacidade de concentrar a urina, resultado da
nefropatia obstrutiva crônica (uma nefrite tubulointersticial crônica).
Muitos pacientes têm obstrução parcial de longa data, e apenas
"agudizam" a disfunção renal.
Fisiopatologia da IRA pós-renal
Após um quadro de obstrução urinária aguda, a pressão no interior
dos túbulos renais aumenta de maneira súbita. Curiosamente, a
filtração glomerular não se reduz nas primeiras horas e, muito pelo
contrário, aumenta. Este fato deve-se à produção inicial excessiva
de prostaglandinas pelo parênquima renal. Tais substâncias
promovem vasodilatação da arteríola aferente, o que aumenta de
forma importante a pressão hidrostática no tufo glomerular,
aumentando, por conseguinte, a filtração. Chamamos esta fase de
"hiperêmica". Após as primeiras horas do início da obstrução (12 a
24h), observamos a síntese progressiva de substâncias
vasoconstritoras, como angiotensina II e tromboxane A2, que levam
a uma diminuição da filtração glomerular. Se a obstrução (mesmo
que parcial) for persistente, o epitélio tubular, sob efeito da maior
pressão luminal, libera substâncias quimiotáxicas que atraem
células inflamatórias. O resultado a médio e longo prazo será uma
nefrite tubulointersticial crônica (nefropatia obstrutiva). Os
monócitos e macrófagos infiltrantes secretam citocinas que
promovem fibrose tecidual. Parece que um dos fatores mais
importantes neste processo é o TGF-beta (Transforming Growth
Factor-beta).
QUADRO DE CONCEITOS II-A IRA pós-renal.
QUADRO DECONCEITOS II-B IRA pós-renal.
O grande risco em um paciente com obstrução urinária é o surgimento de
infecção. Na presença de obstrução, a pielonefrite leva à perda renal em
poucos dias, tornando a desobstrução um procedimento de emergência!!!
Sem infecção associada, leva mais tempo para que tenhamos uma
nefropatia tubulointersticial irreversível, talvez duas a quatro semanas
(dependendo do grau de obstrução e da reserva renal prévia). Quanto
mais tempo obstruído, maior o número de néfrons perdidos... A nefropatia
obstrutiva crônica leva à fibrose intersticial e atrofia do sistema tubular,
cursando com poliúria (perda da concentração urinária) e acidose tubular
hipercalêmica (tipo IV).
O exame de urina na azotemia pós-renal pode ser inocente, mas também
pode revelar hematúria, piúria e discreta proteinúria (lesão da mucosa). A
bioquímica urinária é variável.
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QUADRO CLÍNICO: A SÍNDROME URÊMICA
AGUDA
Na maioria das vezes, a injúria renal aguda é um diagnóstico laboratorial
feito em um paciente que apresenta uma das condições clínicas descritas
anteriormente. Portanto, em geral, os sinais e sintomas são devidos à
condição clínica causal, como hipovolemia, insuficiência cardíaca, sepse,
síndrome nefrítica, etc., e não à injúria renal em si.
Nas azotemias mais graves aparecem sinais e sintomas de insuficiência
renal, que juntos compõem a chamada síndrome urêmica aguda ou uremia
aguda. Esta síndrome é composta por três distúrbios básicos: (1) acúmulo
de toxinas nitrogenadas dialisáveis; (2) hipervolemia; (3) desequilíbrio
hidroeletrolítico e acidobásico.
Os sinais e sintomas que definem a síndrome urêmica são provocados pelo
acúmulo no organismo de grande quantidade de "escórias nitrogenadas",
que são substâncias tóxicas, contendo nitrogênio, derivadas do
metabolismo proteico. Como já ressaltado, a maioria dessas substâncias
não é conhecida, porém, quando elas estão em níveis elevados, há um
aumento paralelo da ureia e da creatinina sérica. Na IRA, para se
desenvolver a síndrome urêmica, geralmente a creatinina está acima de 4,0
mg/dl e a ureia acima de 120 mg/dl. Como já mencionado, a síndrome
urêmica é também chamada de "uremia", um nome com significado
errôneo, dado na época em que se acreditava que a síndrome era causada
pelo acúmulo de ureia. De fato, a ureia realmente contribui para alguns
sinais e sintomas da síndrome urêmica, mas somente quando em níveis
muito altos (> 380 mg/dl), relacionando-se especialmente ao
desenvolvimento de náuseas, vômitos, anorexia e sangramentos.
Neste capítulo falaremos apenas das manifestações tipicamente AGUDAS
da síndrome urêmica. As demais manifestações serão abordadas no
próximo capítulo (doença renal crônica).
Deixamos claro, entretanto, que esta é apenas uma divisão didática para
facilitar o aprendizado do tema, mesmo porque o paciente "renal crônico",
com quadro clínico dominado apenas pelas manifestações decorrentes do
A injúria pós-renal aguda geralmente se instala quando ocorre
obstrução total ou quase total com repercussão bilateral. A
condição de base mais frequentemente encontrada é a hiperplasia
prostática benigna, que promove obstrução ao nível do colo vesical.
Tais indivíduos geralmente referem sintomas prévios de
prostatismo, sendo a "retenção urinária aguda" precipitada por
drogas com efeito anticolinérgico ou simpatomimético, prostatite
infecciosa, infecção do trato urinário ou infarto prostático.
A obstrução urinária aguda inicialmente produz vasodilatação
arteriolar renal pela liberação de prostaglandinas, o que aumenta a
TFG ("fase hiperêmica"). Em seguida, substâncias vasoconstritoras
são produzidas, reduzindo significativamente a TFG. Se a
obstrução permanecer por mais de 2-4 semanas, o paciente evolui
com fibrose intersticial e atrofia tubular progressiva, a chamada
nefropatia obstrutiva crônica. Na vigência de infecção renal, a perda
renal se acelera (dias), tornando-se a desobstrução um
procedimento emergencial nesses casos!
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estado crônico de falência renal, também pode experimentar um episódio
de "agudização", superpondo os sinais agudos da síndrome urêmica.
Tab. 8: Principais sinais e sintomas da uremia aguda.
Para facilitar o entendimento, dividiremos as manifestações por órgãos e
sistemas.
MANIFESTAÇÕES CARDIOPULMONARES
A insuficiência renal aguda oligúrica ou anúrica pode causar retenção
importante de líquidos e sódio, aumentando a volemia. Os sinais e
sintomas de hipervolemia aguda são: (1) Hipertensão Arterial Sistêmica
(HAS); (2) Edema Agudo de Pulmão (EAP); e (3) edema periférico.
A hipertensão arterial sistêmica é encontrada na IRA oligúrica ou anúrica
das glomerulonefrites, nefrite intersticial aguda, nefroesclerose
hipertensiva maligna, ateroembolismo por colesterol, síndrome
hemolítico-urêmica, crise renal da esclerodermia e obstrução urinária
aguda. A hipertensão, quando presente, pode ser grave e refratária ao
tratamento medicamentoso, só respondendo à diálise. O procedimento
dialítico deve ter como meta, nesta situação, não apenas a redução dos
compostos azotêmicos, mas sim um processo conhecido como
ultrafiltração (que na prática quer dizer "retirada de líquido"), movido por
um gradiente pressórico. Na hemodiálise, isso é feito pelo aumento da
pressão hidrostática no capilar do filtro; na diálise peritoneal, aumenta-se
simplesmente a osmolaridade da solução de diálise ("puxa mais líquido").
Além da retenção hidrossalina, a insuficiência renal predispõe à
vasoconstrição arteriolar sistêmica, talvez pela depleção de substâncias
endógenas vasodilatadoras, como o óxido nítrico.
A retenção hidrossalina também promove congestão e edema pulmonar
cardiogênico, levando à dispneia, ortopneia ou até insuficiência
respiratória. As toxinas urêmicas podem aumentar a permeabilidade
capilar pulmonar, levando a um componente não cardiogênico de edema
pulmonar, do tipo SDRA ("pulmão urêmico"). A ultrafiltração é
mandatória nesses casos, reduzindo o edema pulmonar e melhorando a
troca gasosa e a mecânica ventilatória.
O edema periférico está presente na síndrome nefrítica e no renal crônico
com insuficiência renal agudizada. É do tipo periorbitário, das serosas
(derrame pleural, pericárdico, ascite) e de regiões dependentes de
gravidade (membros inferiores).
A pericardite urêmica manifesta-se com dor torácica pleurítica, associada
a atrito pericárdico e/ou alterações eletrocardiográficas de pericardite
aguda (taquicardia sinusal + pequeno supradesnível de ST de formato
côncavo em várias derivações). Provém de uma inflamação pericárdica
hipervascularizada, predispondo à rotura de capilares e sangramento. Por
isso, o líquido pericárdico geralmente é hemorrágico. O tamponamento
cardíaco é uma das complicações mais temíveis da uremia, pois pode ser
fatal. Ocorre pelo acúmulo muito rápido de líquido na cavidade
pericárdica, elevando subitamente a pressão intrapericárdica. A causa
mais comum é o sangramento pericárdico, o que pode ser precipitado pelo
uso de heparina na hemodiálise. Como prevenção, a hemodiálise deve ser
realizada sem heparina nos pacientes com pericardite urêmica, ou então,
deve-se preferir a diálise peritoneal.
MANIFESTAÇÕES HEMATOLÓGICAS
A anemia pode ocorrer, porém costuma ser menos acentuada que a
anemia da uremia crônica. Diversos podem ser os fatores que causam
anemia no paciente com uremia aguda, muitos deles não diretamente
associados à insuficiência renal. Anemia é um achado muito frequente em
pacientes graves e pode ser consequente à infecção, perda sanguínea,
hemodiluição, hemólise, etc.
A uremia aguda cursa com um distúrbio da hemostasia, devido à
disfunção plaquetária. As plaquetas no paciente urêmico têm menor
capacidade de adesão e agregação. O Tempo de Sangramento (TS) está
caracteristicamente prolongado. O fator de von Willebrand, elemento
importante para a adesão plaquetária ao colágeno, está disfuncionante.
As plaquetas encontram-se

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