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O que é atenção flutuante

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O que é atenção flutuante? 
Quem já conseguiu a carteira de habilitação para conduzir automóveis ou está 
vivenciando o processo necessário para obtê-la sabe que todo candidato a 
condutor deve se submeter a um exame psicotécnico que avalia suas funções 
psicológicas básicas. Atualmente, um dos testes aplicados pelos psicólogos 
examinadores é o Teste de Atenção Concentrada que, como o próprio nome 
sugere, mensura a capacidade do candidato de concentrar sua atividade mental 
em torno de certos elementos pré-definidos. Esse tipo de aptidão indispensável 
para quem quer conduzir automóveis é exatamente o oposto da atitude psíquica 
que Freud denominou de “atenção flutuante”. 
Signos e significantes 
Desde o momento em que estabeleceu definitivamente o formato da terapia 
psicanalítica, ou seja,quando largou de vez o método catártico e a hipnose, 
Freud já dizia que o psicanalista tinha que se portar diante do paciente de uma 
forma distinta do posicionamento médico habitual. De forma geral, quando o 
médico recebe um doente para uma consulta, sua atenção está voltada para os 
aspectos específicos da fala e da condição física do paciente que podem indicar 
a existência ou não de patologias. Nesse sentido, o médico seleciona a 
priori determinados signos e verifica se eles se manifestam na fala e no corpo 
do doente. Em outras palavras, o médico faz uso da mesma atenção concentrada 
que o condutor emprega para perceber as placas e sinais de trânsito e identificar 
o seu significado. 
Freud notou que se os analistas agissem dessa mesma forma, o tratamento 
psicanalítico não funcionaria. O motivo era o seguinte: enquanto seria possível 
extrair do corpo certos signos patológicos, ou seja, relações fixas entre 
determinados significantes e significados, no caso do inconsciente, objeto da 
terapia analítica, isso não seria concebível, pois o inconsciente a rigor é formado 
por significantes e não dignos. Senão vejamos: um médico não terá dificuldades 
em fazer um diagnóstico de tuberculose ao se deparar com qualquer paciente 
que apresente tosse durante mais de duas semanas, febre, catarro, dor no peito, 
falta de apetite, emagrecimento e cujos exames acusem a presença em seu corpo 
de uma bactéria conhecida como bacilo de Koch. Em contrapartida, um analista 
jamais poderia concluir que todo paciente com fobia de cavalos possui um 
desejo inconsciente de matar o próprio pai, embora esse fosse o caso do 
pequeno Hans. 
Dito de outro modo, não é possível estabelecer antecipadamente o significado 
de uma formação do inconsciente, pois essa é sempre um significante, nunca 
um signo. Com efeito, o sentido de um significante só se revela a partir do 
exame das conexões que ele estabelece com outros significantes. Por esse 
motivo, o analista precisa estar atento a tudo o que o paciente diz. É essa atitude 
de abertura a todas as expressões do analisando que Freud denominou de 
“atenção flutuante”. 
 
Como um barco sem leme 
De acordo com o pai da psicanálise, a atenção flutuante seria a contrapartida do 
terapeuta à regra fundamental da associação livre que o paciente deve seguir 
para que a análise funcione. No início do tratamento, o analista pede ao 
analisando que diga exatamente tudo o que lhe venha à cabeça, mesmo que 
sejam pensamentos aparentemente sem sentido. A premissa que fundamenta 
esse enunciado é a de que determinados conteúdos que poderiam ser vistos 
como banais ou irrelevantes podem muito bem servir aos paradoxais propósitos 
do inconsciente de se revelar de forma disfarçada. Em última instância, não é 
possível dizer que a narrativa de uma briga com a mãe seja mais importante 
para o tratamento que um relato acerca do que se comeu no almoço. A regra da 
associação livre é uma técnica que, se seguida à risca, possibilita ao paciente 
seguir o fluxo de trabalho do inconsciente que, diga-se de passagem, nunca pára 
de trabalhar. Nem na hora do almoço. 
Assim, da mesma forma que o analisando deve evitar selecionar os 
pensamentos que irá comunicar em análise, o analista também deve escutar de 
forma homogênea tudo aquilo que o paciente diz, por mais bobo que pareça ser. 
O terapeuta deve, portanto, evitar fixar sua atenção em certos conteúdos, 
privilegiando-os em detrimento de outros. Por isso, a metáfora aquática 
utilizada por Freud é bastante precisa. A atenção do analista deve flutuar pelos 
significantes que o paciente enuncia, como um barco que perdeu o leme, 
evitando tomar algum fragmento do discurso como cais. A hipótese de Freud é 
a de que, ao fazer isso, ou seja, ao suspender sua atenção habitual e deixar-se 
levar pelas associações do paciente, o analista acabará por seguir o fluxo de 
trabalho do seu próprio inconsciente. Assim, em condições ideais, isto é, caso 
o paciente obedecesse fielmente à regra da associação livre e o analista adotasse 
plenamente a atenção flutuante, se estabeleceria uma comunicação entre os 
inconscientes do terapeuta e do analisando. 
Foi justamente essa situação que Freud imaginou como sendo o ápice da relação 
analítica. Obviamente, trata-se de uma conjuntura que jamais se concretiza com 
perfeição. Assim como nenhum paciente se submete integralmente à regra da 
associação livre, não há nenhum analista que seja capaz de adotar de forma 
plena a atenção flutuante. A própria formação teórica do analista condiciona-o 
a privilegiar certas associações e relações entre determinados eventos – o que 
não constitui uma falha do terapeuta. 
A comunicação entre inconscientes como situação ideal deve estar sempre no 
horizonte do analista, mas esse deve saber de antemão que jamais será capaz de 
alcançá-la em plenitude. Isso não significa, contudo, que o terapeuta deva 
resignar-se e abandonar a técnica da atenção flutuante sob a justificativa de que 
jamais será capaz de atingir tal estado psíquico com perfeição. Creio que seja 
possível ao analista adotar uma atenção flutuante “suficientemente boa”, isto é, 
uma atitude de receptividade total ao mais ínfimo detalhe do discurso do 
paciente, na qual, eventualmente, em função da experiência e do aprendizado 
teórico, certos conteúdos encontrem uma escuta mais – atenta.

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