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A ATITUDE DE BOA VONTADE E A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA

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A ATITUDE DE BOA VONTADE E A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA 5
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
A ATITUDE DE BOA VONTADE E A
ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA
THE GOOD WILL ATTITUDE AND THE
PERSON CENTERED APPROACH
 Dr. Mauro Martins AMATUZZI1
Dra. Vera Engler CURY2
Carla Fabiana GRAETZ3
Juliana Martensen BELATINI3
Marilu Lorete de ANDRADE3
Moema Maria SEBER3
RESUMO
Esta pesquisa teve por objetivo levantar as características da atitude de
Boa Vontade, levantar também as características da Abordagem Centrada
na Pessoa enquanto uma abordagem mais ampla que sua aplicação no
campo da clínica psicológica, e comparar uma coisa com a outra. O
método adotado foi qualitativo, de tipo fenomenológico. A comparação
mostrou que há semelhanças e diferenças entre as duas, e que a forma
como os conceitos são construídos nesse caso e noutro difere. Na idéia
de BV o foco é a bondade do ato apontando para o aspecto ético, e na
ACP o foco é a relação voltada para o outro confiando nos processos
básicos da vida. Da aproximação dos dois conceitos tira-se a conclusão
da importância do aspecto ético, entendido como essencial, na formação
para ACP e, em geral, na formação do psicólogo.
Palavras-chave: boa vontade, abordagem centrada na pessoa, pesquisa
fenomenológica.
ABSTRACT
This research intended to raise the characteristics of the attitude of goodwill,
and also the characteristics of the Person Centered Approach, considered
as wider than its application to the specific field of clinical psychology,
and to compare both of them. The adopted research method was
(1) Prof. Dr. do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUC-Campinas. Docente do Curso de Pós-Graduação
em Psicologia. Endereço para correspondência: Av. John Boyd Dunlop s/n - Jd. Ipaussurama - CEP 13059-900.
(2) Profa. Dra. do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUC-Campinas. Docente do Curso de Pós-Graduação
em Psicologia. Endereço para correspondência: Av. John Boyd Dunlop s/n - Jd. Ipaussurama - CEP 13059-900.
(3) Bolsista de Orientação Científica.
6 M.M. AMATUZZI et al.
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
qualitative and phenomenological. The comparison showed that there
are some similarities and differences between the two modes and that the
way the concepts are built in each considered system differs. Within
goodwill the focus is the kindness of the act itself, pointing to ethical
aspects, and for PCA the focus is the relationship with other persons,
pointing towards trusting the basic processes of life. By approaching
these two concepts emerged a conclusion on the importance of ethics,
considered here as essential for PCA formation and in general for the
psychologist constitution as a professional.
Key-words: goodwill, person centered approach, phenomenological
research.
A expressão Abordagem Centrada na
Pessoa (ACP) veio a ser usada com um sentido
mais específico somente depois de outra
expressão, Terapia Centrada no Cliente (TCC).
Carl Rogers - psicólogo americano responsável
pelo desenvolvimento desta abordagem desde
a década de cinqüenta - e seus colaboradores
perceberam que os princípios utilizados na
psicoterapia podiam ser também aplicados
em outras situações como educação,
relacionamentos interpessoais, grupos,
conflitos culturais, etc. A ACP veio então a
designar o conjunto de todas essas aplicações,
algo mais amplo que a terapia centrada no
cliente. Foi mérito do Dr. John Wood (1995)
um colaborador direto de Carl Rogers, e que
atualmente vive entre nós no Brasil, mostrar
que a ACP não era, na verdade, uma aplicação
da TCC a outras situações, mas exatamente o
contrário. A ACP, enquanto uma abordagem
dos problemas humanos, correspondia a
princípios gerais que estavam por trás de uma
forma de psicoterapia, a TCC, e que podiam
também estar por trás do modo de agir em
outros campos. A partir daí é que ele pôde
buscar uma formulação desses princípios de
forma independente da si tuação da
psicoterapia. E nessa formulação já não falava
das clássicas três atitudes terapêuticas
(empatia, consideração positiva incondicional
e congruência) formuladas inicialmente por
Rogers num artigo publicado em 1957. Falava
sim de coisas mais amplas, capazes, contudo,
de englobar essas três atitudes.
O que haveria de específico numa
Abordagem Centrada na Pessoa, enquanto
algo mais amplo que uma forma de terapia?
Será que essas características, na sua
generalidade, não acabariam sendo meras
descrições do que vem a ser a boa vontade?
Ou não será também que a boa vontade não
teria muito mais a ver com uma forma de ser
que resultaria essencial para a solução de
vários problemas humanos? Ou até que os
problemas humanos se desenvolveriam, em
parte, por fal ta de boa vontade no
relacionamento interpessoal?
Uma sondagem bibliográfica revelou a
inexistência de estudos descritivos do que
seja a boa vontade (BV) e, obviamente, também
a inexistência de estudos relacionando BV e
ACP.
Uma pesquisa como essa, além de ser
útil na iniciação científica de graduandos de
Psicologia (devido à simplicidade de seu
delineamento), poderia também propiciar uma
reflexão interessante sobre a ACP e seus
princípios, e sobre a presença de valores
como algo essencial na atuação do psicólogo
ou qualquer profissional que lide com o ser
humano. A comparação da atitude de boa
vontade como modo de ser da abordagem
centrada na pessoa traz à baila a importante
questão do aspecto ético (explícito na
expressão “boa vontade”) da atuação
profissional. E do aspecto ético não apenas
como algo que se acrescenta a uma atitude
A ATITUDE DE BOA VONTADE E A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA 7
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
profissional já constituída, mas sim justamente
como algo constituinte da própria atitude
profissional.
A expressão “boa vontade” aparece em
resumos de publicações científicas, mas de
uma forma incidental. Não há uma pesquisa
que explore o tema em si mesmo.
Um único artigo se aproxima um pouco
mais. Bolls, Tan & Austin (1997) propuseram-se
a comparar a atitude de estudantes americanos
natos com a de caucasianos a respeito do
comportamento comunicativo de professores.
Um dos aspectos desse comportamento
comunicativo a ser considerado, era justamente
a boa vontade do professor. Concluíram, neste
aspecto, que os estudantes americanos
percebiam os professores como tendo menor
boa vontade do que percebiam os caucasianos.
Seria interessante aprofundar um pouco mais
essa pesquisa para que pudéssemos
determinar como foi medido isso, e qual o
conceito subjacente de BV que foi utilizado.
Pudemos notar também que a idéia de
BV, mesmo usada incidentalmente, tem dois
tipos de uso. Um mais negativo e outro mais
positivo.
Francis (1997), escrevendo sobre terapia
com crianças, afirma que o progresso
terapêutico não depende de sorte ou boa
vontade, mas de ferramentas específicas
cultivadas pelo terapeuta. Aqui a expressão
BV se refere a algo insuficiente.
Westermann (1992) descreve um tipo de
cerimônia terapêutica de liberação dos votos
matrimoniais no contexto da logoterapia.
Afirma que um tal rito de cura conduz ao
término um casamento irrevogavelmente
perturbado, numa atitude de reverência e, ao
mesmo tempo, serve para construir uma ponte
de boa vontade para o futuro. Aqui o termo BV
tem uma conotação nitidamente positiva.
Também positiva é a conotação do termo
quando usada no trabalho de Richman (1991).
Falando do suicídio de idosos, defende a idéia
de que se poderá salvar vidas e aumentar a
felicidade com mais conhecimento a respeito
e também com boa vontade tanto por parte da
comunidade profissional como da comunidade
civil.
No levantamento real izado não
encontramos mais do que menções desse tipo
e, mesmo assim, em um númeropequeno de
publicações (não mais do que 15 referências,
na maioria livros e não artigos), entre 1991 e
1998. Como já dissemos, o tema não é
explorado por si mesmo.
Quanto a artigos científicos mais recentes
que se referem à Abordagem Centrada na
Pessoa, Patterson (1995) propõe um sistema
universal de psicoterapia com princípios
derivados da Terapia Centrada no Cliente. De
acordo com esse autor, tradicionalmente deu-
se excessiva importância aos métodos e
técnicas psicoterápicas, em detrimento da
determinação prévia dos objetivos que, para
ele, constituem-se em três níveis: o principal
diz respeito ao tipo de pessoa que desejamos
que o cliente se torne ao final da psicoterapia;
o intermediário refere-se à redução de sintomas
para os behavioristas, ou melhoria nas relações
interpessoais em terapias familiares e de casal,
ou seja, objetivos a médio prazo e há também
os objetivos imediatos que concernem a
aspectos do próprio processo psicoterapêutico.
Para ele, um aspecto essencial do processo
terapêutico seria algum tipo de atividade
desempenhada ou vivenciada pelo próprio
cliente, tal como auto-exploração, ou
exploração interpessoal que parecem estar
universalmente presentes em psicoterapias
bem sucedidas. Segundo o modelo proposto
por ele, cabe ao terapeuta promover certas
condições para que o cliente se engaje nestas
atividades que garantem o sucesso de qualquer
processo terapêutico. E elas nada mais são
do que as três atitudes definidas por Rogers
como compreensão empática, consideração
positiva incondicional e congruência ou
autenticidade do terapeuta. Resumindo, uma
relação terapeuta - cliente, baseada nas
“condições necessárias e suficientes para a
8 M.M. AMATUZZI et al.
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
mudança terapêutica de personalidade” pro-
postas por Rogers num artigo clássico escrito
em 1957, promoveria a possibilidade de o cliente
iniciar sua jornada rumo ao autoconhecimento.
Wood (1996), num estudo de caso sobre
cientistas desempregados, conclui que aqueles
a quem foi oferecida a oportunidade de reunir-
se informalmente para conversar sobre sua
situação e trocar experiências pessoais foram
mais bem sucedidos quanto a arranjar novos
empregos ou ocupações do que os que fizeram
parte de clínicas de emprego propostas pelo
governo americano, de forma a ressaltar a
importância dos aspectos interpessoais e do
desenvolvimento de uma empatia grupal.
Também Bozarth (1990), examinando as
sessões gravadas de psicoterapia e artigos de
Rogers para compreender se ele alterou seu
funcionamento operacional como
psicoterapeuta ao longo dos anos, concluiu
que as proposições fundamentais da ACP
mantiveram-se consistentes ao longo dos anos,
embora com uma ênfase cada vez maior na
autenticidade do terapeuta e na expressão de
seu self durante os contatos com os clientes.
O‘Hara (1998) num capítulo ainda no
prelo, sobre Psicoterapia Breve, intitulado
“Moments of eternity: what Carl Rogers has to
offer brief - therapists”, enfatiza a permanência
de um paradigma na ACP quanto a uma empatia
relacional, presente tanto na terapia a dois
(individual) quanto em experiências grupais
(grupos intensivos), promovendo uma
transformação nos modos de experienciar do
cliente, ampliando sua consciência sobre si
mesmo, as outras pessoas e o mundo ao seu
redor.
A partir desse contexto esta pesquisa
pretendeu:
1) descrever fenomenologicamente a BV
a partir de depoimentos vivenciais;
2) caracterizar a ACP enquanto anterior
às suas aplicações, a partir da obra de
John Wood; e
3) comparar os elementos que compõem
a atitude de BV com os que compõem
o modo de ser da ACP.
Método
Trata-se de uma pesquisa qualitativa e
que se inspira também em um enfoque
fenomenológico.
Para a descrição da estrutura vivencial
da boa vontade trabalhou-se a partir de
depoimentos colhidos junto a pessoas de
qualquer tipo, desde que podendo relatar
experiência concreta vivenciada por eles acerca
de nosso tema. O número de sujeitos foi
estabelecido pelo critério de saturação.
Para a caracterização da ACP o trabalho
seguiu inicialmente um caminho documental,
partindo-se de escritos de Wood. Posterior-
mente foi complementada a leitura do autor
escolhido com uma entrevista pessoal realizada
com ele.
O procedimento junto aos sujeitos que
forneceram os depoimentos vivenciais seguiu
os seguintes passos:
1) obtenção do consentimento para
participar na pesquisa através de um
depoimento escrito;
2) solicitação do depoimento através de
uma instrução que segue, aproxima-
damente, o seguinte molde: “Estamos
fazendo uma pesquisa sobre a boa
vontade. E queremos fazer isso a partir
das experiências vividas pelas pessoas.
Você pode me contar uma experiência
sua a respeito de boa vontade?”;
3) não houve nenhuma conversa de
esclarecimento com os sujeitos a partir
do recebimento do depoimento e foram,
posteriormente, excluídos aqueles que
não responderam de acordo com o que
foi solicitado.
Em relação ao estabelecimento das
características da ACP, partiu-se do texto “ Da
Abordagem Centrada na Pessoa à Terapia
A ATITUDE DE BOA VONTADE E A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA 9
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
Centrada no Cliente: uma retrospectiva de 60
anos” (Wood, 1995). O resumo foi apresentado
ao autor.
O plano de análise seguiu, inicialmen-
te, os passos previstos por Giorgi (1985) para
pesquisas fenomenológicas em psicologia.
Para essa pesquisa ficaram operacionalizados
como segue:
1) Leitura de um primeiro depoimento
sobre BV para se entrar em contato
com seu sentido global.
2) Divisão do texto em unidades de
significado.
3) Redação da compreensão
psicológica de cada unidade de
significado.
4) Síntese do depoimento.
5) Repetição dos 4 pontos acima para
outros depoimentos.
6) Busca de uma saturação verificando
se os componentes do vivido que
puderam ser levantados encontram-
se em todos os depoimentos
considerados.
7) Redação de uma síntese geral sobre
estrutura vivida da BV, de acordo com
esses depoimentos.
8) Estabelecimento dos pontos
descritivos da ACP.
9) Comparação da estrutura da BV com
as características da ACP.
10) Redação de resultados encontrados.
11) Discussão desses resultados em face
das preocupações da pesquisa.
12) Redação de conclusões.
RESULTADOS
1) Os depoimentos sobre a BV e sua
compreensão psicológica
Todos os nomes próprios, que constam
na transcrição dos depoimentos, são fictícios.
Heloísa, 42 anos
(1)Uma das coisas que falo e faço de
Boa Vontade, é com adolescentes filhos de
amigas minhas, ensinando alguma coisa,
explicando coisas que os pais estão com
dificuldades de fazer. Faço com Boa Vontade.
(2)Normalmente recebo retorno, que se “deram”
super bem naquilo que “interferi” no sentido de
ajudar.
Compreensão:
1) Heloísa sente-se bem em explicar
alguma coisa aos adolescentes, quando seus
pais, amigos dela, estão com dificuldades.
Ela o faz espontaneamente e acredita ter
condições para ensiná-los, sente-se útil já que
os pais não estão conseguindo.
2) Heloísa valoriza sua interferência junto
aos adolescentes por constatar que
efetivamente foi de alguma ajuda.
Síntese:
Para Heloísa a Boa Vontade refere-se a
uma ação para a qual se sente capaz, feita
espontaneamente e que a faz sentir-se bem. É
importante para ela verificar se sua Boa Vontade
foi realmente útil a quem ajudou, cumprindo
seu objetivo.
Isabela, 13 anos
(1) Foi uma vez que eu estava voltando
da missa com a minha mãe, uma mulher que
estava na minha frente deixou cair do pulso um
relógio de ouro.(2) Ela nem percebeu, saiu
andando, mas eu peguei o relógio e devolvi a
ela.
Compreensão:
1) Isabela relata sua experiência de Boa
Vontade, ao voltar de uma missa, quando
presencia a perda deum relógio por uma
mulher.
10 M.M. AMATUZZI et al.
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
2) Isabela relaciona a Boa Vontade ao
fato de a pessoa não ter percebido a perda do
relógio, e ela ter a iniciativa de pegá-lo e
devolvê-lo.
Síntese:
Para Isabela a Boa Vontade está
relacionada à sua atitude espontânea em
devolver algo de valor material, praticando uma
boa ação, demonstrando solidariedade para
com a pessoa.
Maria, 62 anos
(1) Dias atrás fui ao sacolão fazer
compras, na saída fui abordada por duas
senhoras humildes pedindo informações sobre
determinado endereço, (2) ao perceber que as
mesmas estavam bem distantes do local
ofereci carona e resolvi da forma mais prática.
Compreensão:
1) Maria descreve um episódio em que
duas senhoras humildes solicitam-lhe
informações sobre determinado endereço.
2) Percebendo que as senhoras se
encontravam distantes do referido endereço,
Maria se dispõe a levá-las até o mesmo,
considerando que sua atitude foi prática.
Síntese:
Para Maria a vivência de Boa Vontade
implica em uma disponibilidade para auxiliar
outras pessoas, em um ato espontâneo, a
partir da percepção de uma necessidade, e
que se constitui numa ajuda efetiva.
João, 80 anos
(1) Um exemplo de Boa Vontade são
meus netos virem todo domingo de manhã na
minha casa trazer almoço para mim (2) e fazer
companhia durante a tarde.
Compreensão:
1) João sente-se querido e bem cuidado
quando seus netos vêm trazer o almoço todos
os domingos e fazer- lhe companhia,
percebendo isto como um ato de Boa Vontade.
2) João sente que seus netos o querem
bem, que eles estão presentes em sua vida,
pois mesmo tendo compromissos, vêm
visitá-lo, ainda que seja só para trazer o almoço.
Síntese:
João relata um exemplo de Boa Vontade
para com ele. Da forma como ele entende, Boa
Vontade é agir afetuosamente com pessoas
queridas, dedicar-lhes tempo e atenção e,
sendo tratado dessa maneira, sente-se feliz,
valorizado e importante.
Mário, 34 anos
(1) A experiência de Boa Vontade que
tive foi em um belo dia de sol, e essa data era
o dia 12 de outubro, o Dia da Criança, eu me
dirigia pela avenida Flórida sentido centro,
estava indo para o clube pegar um bronze (2)
quando deparei com um acidente de trânsito
debaixo da ponte da rodovia, tive que socorrer
duas pessoas para o hospital X, onde tive
que ficar até às 17:00 h, (3) o meu feriado
acabou, mas pude ajudar o meu semelhante
e para mim foi muito bom. (4) Como em
Rom.13, 8-10: “O Amor cobre multidão de
pecados, cuide dos outros como você cuida
de você mesmo”, e Rom. 12: 21: “ Vence o Mal
com o Bem”.
Compreensão:
1) Mário viveu esta experiência de Boa
Vontade justamente num dia de sol, Dia da
Criança, quando se preparava para ir ao clube.
2) Quando teve que socorrer duas
pessoas acidentadas, Mário viveu uma
mudança inesperada dos seus planos para
aquele dia.
A ATITUDE DE BOA VONTADE E A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA 11
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
3) Mário, apesar de ter perdido o que
havia programado para o seu lazer, em virtude
do socorro que prestou ao semelhante, sentiu-se
muito bem.
4) Compara sua ação a passagens da
Bíblia, em que há a idéia de cuidar do próximo
como de nós mesmos e, desse modo, vencer
o mal que seria o ato de não ajudar, porque isto
acabaria com seu feriado. Vivencia o que fez
como sendo coerente com os princípios bíblicos
nos quais crê.
Síntese:
Mário vivencia a Boa Vontade como um
ato de amor ao próximo, como um meio de
contribuir para a melhora da humanidade,
livrando-a dos pecados. Sente-se bem ao
ajudar, mesmo quando se sacrifica pelas
pessoas, pois assim, segue seus princípios
religiosos sobre a bondade, e a necessidade
da Boa Vontade para que a humanidade possa
livra-se dos pecados.
Laís, 44 anos
(1) Tenho uma colega de serviço que
perdeu a audição dos dois ouvidos de uma
maneira repentina e veloz, uma espécie de
esclerose auditiva, infelizmente ainda sem
cura.
(2) Soube de uma clínica universitária de
Fonoaudiologia, localizada na cidade Y, e
que lá eles poderiam fazer algo a respeito.
Liguei para eles, e eles se interessaram pelo
caso.
(3) Devido o problema auditivo dessa
minha colega me ofereci para acompanhá-la
até a clínica universitária, perdendo dois dias
de trabalho.
Infelizmente ela não obteve sucesso com
a viagem, e durante um bom tempo ajudei-a
treinando leitura labial no meu horário de
almoço.
Compreensão:
1) Laís descreve a perda de audição de
uma colega que a sensibilizou.
2) Laís toma pessoalmente a iniciativa de
ajudar sua colega, conseguindo que uma clínica
universitária se interessasse pelo caso.
3) Laís, mobilizada pela necessidade da
colega, dispõe-se a acompanhá-la ao serviço
médico mesmo perdendo dias de trabalho.
4) Não obtendo resultado com a viagem,
prossegue sua ajuda dispondo de seu horário
de almoço para treinar leitura labial com sua
colega.
Síntese:
Para Laís, a Boa Vontade é caracterizada
por uma disponibilidade de ajuda espontânea
a quem está com problemas. Implica em se
mobilizar, agir, colaborar no que for possível
para solucionar ou minimizar a dificuldade da
pessoa.
2) A essência da Boa Vontade
A partir dos depoimentos colhidos, a BV
implica numa disponibilidade, que se manifesta
com a percepção de uma necessidade em
outra pessoa, para espontaneamente ajudá-
la, visando efetivamente seu benefício. Inclui
um sentimento positivo em relação a si mesmo,
relacionado com a ação praticada, mas
também um sentimento positivo em relação ao
outro que recebe a ação.
Destacam-se, portanto, os seguintes
elementos:
z Disponibilidade
z Percepção de uma necessidade
z Espontaneidade
z Ajuda
z Visando benefício efetivo
z Sentimento positivo em relação ao outro
12 M.M. AMATUZZI et al.
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
z Sentimento positivo em relação a si
mesmo
3) A essência da Abordagem Centrada na
Pessoa
Eis como Wood (1994: III-IV) caracteriza
os elementos essenciais da ACP. Diz ele que
é um “jeito de ser” (expressão de Rogers) ao
se deparar com certas situações. E descreve
esse jeito com algumas características.
1) Uma perspectiva de vida, de modo
geral, positiva. Ou seja, uma postura prática
de quem de fato acredita na vida e em seu
valor.
2) Uma crença numa tendência
formativa direcional, e aqui Wood cita o
próprio Rogers para dizer o que é essa
tendência, no caso de pessoas que procuram
ajuda psicológica: “Os indivíduos têm dentro
de si mesmos amplos recursos para a autocom-
preensão, para alterarem seu autoconceito,
sua atitude básica e seu comportamento
autodirigido; esses recursos podem ser
mobilizados se lhes for proporcionado um
clima definido de atitudes psicológicas
facilitadoras”. Aquela postura prática se
fundamenta numa crença operativa em uma
tendência ao crescimento, no caso do ser
humano ou, de modo mais geral, numa
tendência à complexidade e à harmonia.
3) Uma intenção de ser eficaz nos
próprios objetivos. Wood menciona que, no
caso da terapia centrada no cliente, essa
intenção é a de ajudar outro ser humano a
fazer mudanças construtivas na personalidade.
Fica aberta, no entanto, a possibilidade de
outras intenções, em outras situações nas
quais só se poderia falar de ajuda em sentido
mais metafórico. Por exemplo, a intenção de
preservar efetivamente o meio ambiente, na
situação de consciência ecológica.
4) Um respeito pelo indivíduo e por
sua autonomia e dignidade. E aqui Wood
cita novamente Rogers para, a partir do caso
da terapia, ilustrar o que isso significa: “uma
capacidade de simpatia que não seja
exagerada, uma atitude genuinamente
receptiva e interessada, uma compreensão
profunda que tornaria impossível fazer
julgamentos moraisou ficar chocado ou
horrorizado”; e também “um respeito,
profundamente enraizado, pela integridade da
pessoa [...], uma vontade de aceitá-la como é,
no seu próprio nível de ajustamento, e lhe dar
liberdade para conseguir soluções próprias
para seus problemas”. Wood lembra aqui que
Rogers (citado a partir de Kirschenbaum)
considerava que um terapeuta, em função
disso, deveria ter “uma sólida compreensão de
si mesmo, de seus padrões emocionais
predominantes, e suas próprias limitações e
atalhos”. Ou seja, esse respeito pelo outro,
supõe uma boa dose de autoconhecimento,
sem o que isso nem poderia acontecer. O que
quer dizer também um respeito por si mesmo.
5) Uma flexibilidade de pensamento e
ação, não tolhida por teorias ou práticas
anteriores, nem mesmo pela experiência,
aberta a novas descobertas. E ele comenta
isso acrescentando: Uma habilidade de se
concentrar intensamente e, com clareza
apreender a construção linear da realidade,
pedaço-a-pedaço, bem como perceber sua
realidade integral, holística, “toda-de-uma-vez”.
Essa flexibilidade, que se aproxima bastante
da atitude fenomenológica voltada para as
coisas como se apresentam, implica portanto
numa percepção que não se impõe à realidade,
mas que a acompanha em seu dinamismo de
constituição e, ao mesmo tempo, a apreende
toda de uma vez.
6) Uma tolerância quanto às incertezas
ou ambigüidades, sendo capaz de viver numa
situação caótica até que fatos suficientes se
acumulem para ser possível abstrair-se um
sentido deles. E ele comenta isso novamente
citando Rogers, falando de um interesse “não
na verdade já conhecida ou formulada, mas no
processo pelo qual a verdade é tenuemente
percebida, testada e aproximada”. O que
A ATITUDE DE BOA VONTADE E A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA 13
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
significa, também, não ter conceitos rígidos
ou fixos na apreensão e lida com a realidade.
7) E ele acrescenta que, embora não
sejam exclusivos desta abordagem, também
têm sua importância aqui o senso de humor,
a humildade, e a curiosidade. Afinal ninguém
é perfeito nem possuidor definitivo da verdade.
Poderíamos resumir esses pontos como
segue:
z Perspectiva positiva de vida
z Crença numa tendência geral ao
desenvolvimento
z Intenção de ser eficaz
z Respeito pela autonomia e dignidade
do outro
z Flexibilidade de pensamento e ação
z Tolerância com incertezas ou
ambigüidades
z Senso de humor, humildade e
curiosidade
4) Comparação entre BV e ACP
A caracterização da BV foi feita mais em
termos do ato do que de uma disposição. Para
que a comparação com a ACP, enquanto uma
abordagem, fosse possível, explicitamos
alguns elementos atitudinais pressupostos pela
BV. Fizemos isso a partir da constatação de
que nos próprios depoimentos existem
indicações disso.
z Para Heloísa, a ajuda aos adolescentes
não é episódica, mas é algo que ela
normalmente faz, mostrando uma
disponibilidade para isso.
z Para a garota Isabela, a predisposição
fica mais implícita; mas o contexto é o
de um ato religioso em que normal-
mente se prega a bondade.
z Na carona oferecida por Maria, parece
que a ação decorreu da percepção de
uma necessidade, como se houvesse
uma ligação estabelecida, ao menos
como predisposição, entre essas duas
coisas (se há a necessidade,
predisponho-me a ajudar).
z Os netos de João, vêm todo Domingo,
o que também sugere que não se trata
de um episódio apenas.
z Também para Mário existe uma
correspondência entre seu ato de
socorrer e coisas que ele acredita ou
valores seus.
z Laís parece ser uma pessoa prestativa
(e persistente) neste tipo de situação.
A partir dessa pista, associamos aos
elementos descritivos do ato de boa vontade
algumas características que poderiam
explicitar seu significado atitudinal, e que
fizessem sentido no contexto dos depoimentos
que tínhamos. O resultado dessa “variação
imaginativa”, típica do método fenomenológico,
foi o seguinte:
1. Disponibilidade: abertura ao novo que
mobiliza, podendo alterar o rumo das
ações; está relacionada a uma
flexibilidade de pensamento e ação.
2. Percepção da necessidade: percepção
de uma carência objetiva no outro;
implica numa atitude de sensibilidade
ao outro, relacionada com o respeito
pela autonomia e dignidade do outro
associado a uma intenção de ser
eficaz.
3. Espontaneidade: fazer não contrariado,
fazer querendo, a partir de dentro; isso
tem a ver com liberdade pessoal e
poderíamos dizer que está associado
a uma perspectiva positiva de vida
humana.
4. Ajuda : é o lado concreto da
disponibilidade, voltando-se para o
outro; obviamente relaciona-se com a
intenção de ser eficaz.
5. Visando benefício efetivo: prolonga o
voltar-se para o outro, traduzindo-se
em uma prática em seu benefício;
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Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
também está relacionado com a
intenção de ser eficaz.
6. Sentimento positivo em relação ao
outro: trata-se de um querer bem ao
outro (um bem querer, ou um querer
bom), de um valorizá-lo de alguma
forma; tem a ver com confirmá-lo como
ser humano (a partir do interior daquele
que age).
7. Sentir-se bem consigo mesmo: trata-
se da satisfação de ter agido dessa
forma em favor do outro; supõe
confirmar-se como ser humano.
Nos itens 1, 4 e 5 da BV (disponibilidade,
ajuda, e visando benefício efetivo) existe uma
correspondência bastante direta com os
elementos descritivos da ACP (flexibilidade
de pensamento e ação, e intenção de ser
eficaz). Nos itens 2 e 3 da BV (percepção da
necessidade, e espontaneidade) encontramos
uma correspondência também, embora não
tão direta, com a ACP (respeito pela autonomia
e dignidade do outro associado a uma intenção
de ser eficaz, e perspectiva positiva de vida
humana).
Os elementos da BV que não têm uma
correspondência direta com os da ACP foram
os últimos de nossa lista, 6 e 7 (sentimento
positivo em relação ao outro, e sentimento
positivo em relação a si mesmo), mas também,
de certa forma, o 3 (espontaneidade, cuja
relação com a perspectiva positiva de vida já
supõe uma certa elaboração mais complexa,
podendo ser considerada também mais
indireta).Por outro lado, os elementos
descritivos da ACP que ficaram sem uma
correspondência direta com os da BV foram
também os últimos, 6 e 7 (tolerância com
incertezas e ambigüidades, e senso de humor,
humildade e curiosidade), mas também, de
certa forma, o 4 (respeito pela autonomia e
dignidade do outro), principalmente se
considerado isoladamente (pois a boa vontade
poderia, às vezes, desrespeitar o outro, quando
a pessoa se baseia exclusivamente no que ela
acha que é o bem para o outro).
Como compreender esses resultados?
5) O significado dos resultados
As semelhanças entre BV e ACP indicam
que não são duas formas de ser totalmente
díspares.
Mas as diferenças indicam ao menos
que as maneiras de se construir a compreensão
desses dois modos de ser ou agir não são
iguais. Embora a BV seja mais compreendida
em termos de atos, ela pode ser ampliada para
um conceito atitudinal semelhante a um modo
de ser. Viver com um modo de ser de boa
vontade. Isso é fato. Apesar disso, no entanto,
esse modo de ser se descreve um pouco
diferentemente do modo da ACP.
O modo da BV fala mais da “bondade da
vontade”. Não somente enquanto uma vontade
voltada para o que é bom, para um objeto bom,
mas também enquanto vontade boa, ou seja,
como tendência integrativa da pessoa. Daí
porque a sua espontaneidade seja importante.
Boa vontade forçada não é ainda uma vontade
boa. E daí porque o sentimento positivo em
relação ao outro e a satisfação decorrente
para o sujeito que vive assim sejam elementos
essenciais na descrição desse modo de ser.
Mas a forma de descrever o modo de ser
da ACP toma outro caminho. Aqui não é a
bondadeda vontade o eixo descritivo. Mas sim
a forma da relação do sujeito com o mundo,
enquanto disposição interna. O que se propõe
aqui é estar descentrado de si como indivíduo
fechado, e estar centrado no outro como pólo
autônomo do diálogo. A ênfase está na abertura
da pessoa para o outro. E essa abertura
apóia-se na confiança. É por isso que os
pontos da ACP que têm menos correspon-
dência direta com o modo de descrever a BV
são o respeito pela autonomia e dignidade do
outro, considerados não como desinteresse
mas justamente o contrário, a tolerância para
com incertezas e ambigüidades - porque a
segurança da relação não se baseia em
certezas objetivas, mas na confiança de que
A ATITUDE DE BOA VONTADE E A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA 15
Rev. Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 19, n. 2, p. 5-16, maio/agosto 2002
as coisas mesmas apontarão seu rumo se eu
me relacionar com elas em um clima adequa-
do - e o senso de humor, humildade e
curiosidade, pois afinal deve-se abrir mão do
sentimento de onipotência, para poder
participar de um todo no qual se confia; se
houver uma capacidade para facilitar o
desenvolvimento de relações criativas,
realmente abertas.
Seria a BV o essencial da ACP? A
resposta não pode ser simples. Existe
provavelmente uma maneira de ser, um modo
de se relacionar com o mundo, que é mais
criativo e, nas circunstâncias históricas em
que nos encontramos atualmente, é a mais
biologicamente adaptativa e relacionada com
a sobrevivência da humanidade. Mas essa
maneira pode ser descrita de formas diferentes,
e então com ênfases diferentes. A ênfase da
BV é a bondade da vontade, aquela parte de
nós mesmos que nos leva a agir de forma
consciente e deliberada. A ênfase da ACP é a
disposição interna de abertura para o outro,
sendo esse outro, na verdade, o mundo de
relações como um todo.
Devido a essa diferença de ênfase, alguns
aspectos ficam mais bem ressaltados em uma
descrição do que na outra. Descrevendo pelo
viés da BV ressaltamos a espontaneidade e os
sentimentos positivos. Descrevendo pelo viés
da ACP ressaltamos o respeito acreditante no
outro, a tolerância para com incertezas, a
humildade de quem não possui todas as
respostas e, no entanto, confia.
Decorrências para a formação de
psicoterapeutas em Abordagem Centrada
na Pessoa
A aproximação entre ACP e BV evidencia
o caráter daquela como uma abordagem de
suprema relevância para o nosso mundo, na
medida em que abre a pessoa para o outro
numa postura de confiança nos processos
mais fundamentais da vida. Por outro lado,
chama a atenção para os aspectos éticos
dessa relação, na medida em que constrói
significados também em torno da bondade da
vontade. Nosso querer é fundamentalmente
voltado para o que é bom. Isso é uma das
manifestações da tendência formativa e
atualizante de que falava Rogers. E essa
tendência é confiável. À essa luz, os quereres
destrutivos, desagregadores, maus, devem ser
entendidos como derivados e não básicos.
Esse aspecto ético das relações que a
aproximação com a BV permite enfocar na
verdade tem papel importante na formação
para a ACP. Não se trata de algo acessório
como freqüentemente a ética é entendida:
regras que limitam as possibilidades de ação.
Ao contrário, quando enfocamos a qualidade
da vontade envolvida e refletimos sobre isso,
estamos, na verdade, tocando na mola
propulsora de nosso agir. E é essa mola que
também lhe pode dar direção.
Na formação para ACP é, pois, de
importância básica que se contemple as
motivações do agir, as qualidades do querer, e
que, enfim, se trabalhe a bondade da vontade.
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