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QUADRO HISTÓRICO DAS MODALIDADES DE RESOLUÇÃO DE CONFLITO Segundo Rosemiro Pereira Leal AUTOTUTELA É de MANIFESTO EQUÍVOCO dizer que a AUTOTUTELA (uso da violência privada) tenha abrigo atualmente na legislação brasileira. Se a AUTOTUTELA, em sua concepção originária, fosse permitida em lei, seria um atraso histórico injustificável, em face das suas conotações histórico-sociológicas de justiça privada ou uso arbitrário das próprias razões. No ordenamento jurídico brasileiro, não há recepção da figura histórica da autotutela, mas a criação do instituto legal da AUTODEFESA na esfera de direitos da pessoa e do Estado (Comunidade). Quando a ordem jurídica autoriza a AUTODEFESA, não está delegando ao indivíduo a função jurisdicional tutelar que continua a se originar de lei prévia estatal. Não há, portanto, como muitos entendem, uma exceção ao monopólio jurisdicional, que o Estado abre à prática selvagem da AUTOTUTELA. Ao indivíduo é legalmente deferida a AUTODEFESA, em hipóteses expressas: Exs: art. 25 CP – legítima defesa; art. 24 CP – estado de necessidade; art. 23, III, do CP – estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular do direito; art. 301 CPP – prisão em flagrante; art. 1210 CC – garante o direito do possuidor manter-se ou restituir-se pela própria força. O instituto moderno da AUTODEFESA não guarda qualquer relação com a AUTOTUTELA, não regulada em lei. A AUTODEFESA, na modernidade, é uma TUTELA SUBSTITUTA do provimento jurisdicional, legalmente permitida. Não é a AUTODEFESA uma excepcionalidade ao ordenamento jurídico, mas uma regra normatizada do ordenamento jurídico, que, concorrentemente à jurisdição, faz do indivíduo o instantâneo defensor de si mesmo ante uma agressão pré-tipificada em lei. AUTOCOMPOSIÇÃO É também uma forma bem antiga de solução de conflitos humanos, pela qual os interessados na dissipação de suas controvérsias, e ausente o Estado jurisdicional, conciliavam-se pela RENÚNCIA, SUBMISSÃO, DESISTÊNCIA e TRANSAÇÃO. Renúncia Consistia em se tornar silente o prejudicado ante o fato agressor a si mesmo ou a seu patrimônio. Submissão Era a aceitação resignada das condições impostas nos conflitos. Desistência Era o abandono da oposição já oferecida à lesão de um direito ou o não-exercício de um direito já iniciado. Transação Distinguia-se pela troca equilibrada de interesses na solução dos conflitos. Com o surgimento do monopólio estatal da jurisdição (exclusividade de o Estado fazer cumprir o direito), as FORMAS DE AUTOCOMPOSIÇÃO foram acolhidas pelo direito processual dos povos, erigindo-se em INSTITUTOS JURÍDICOS que se definiram pela possibilidade de as partes em conflito destes se utilizarem, com as peculiaridades de cada legislação. ARBITRAGEM Período sacerdotal ou pré-romano A ARBITRAGEM, inicialmente espontânea e não prevista em lei, se dava pela livre escolha de terceiros (sacerdotes, anciãos, líderes, místicos, reis, nobres, caciques, etc.) predestinados à compreensão do direito humano e divino para decidirem os litígios. Período da legis actiones (ações da lei) – Roma- séc. VIII a.C. a V a.C. O período das legis actiones corresponde à realeza e antecede o "formular", que corresponde à República. Esse sistema apresentava três características: JUDICIAL – porque se iniciava perante o magistrado (in jure) e, em seguida, perante o árbitro particular (apud judicem); LEGAL – porque previsto em regras do magistrado FORMALISTA – por se vincular a formas e palavras sacramentais. A FORMA de tais ações (em número de cinco) era a mais solene possível e um simples erro de petição ou de rito conduzia o pedido à improcedência. Período formular – direito romano arcaico – do V a.C. a II a.C. Com a expulsão dos reis e o advento da república romana, aboliu-se o sistema rígido da legis actiones. A função de árbitro foi exercida pelos peritos que se notabilizaram como juristas, surgindo a figura do pretor, nomeado pelo governo (magistrado). O pretor exercia funções jurisdicionais de fornecer a fórmula ao árbitro (instrumento redigido pelo próprio pretor), que continha o resumo, limites e o objeto da demanda, o nome do árbitro livremente escolhido pelos demandantes e o compromisso a ser assinado pelo árbitro e pelos litigantes de seguirem os termos da fórmula e de os litigantes obedecerem à decisão (sentença) a ser proferida pelo árbitro. Criou-se, portanto, uma ARBITRAGEM OFICIAL que consistia em duas etapas, pelo magistrado (pretor – servidor público – in jure) e pelo juiz (árbitro particular – apud judicem). Período formular – direito romano clássico – do séc. II a.C. ao séc. III d.C. Nesse período, o pretor (servidor público), com a ampliação dos seus poderes, passou a nomear o árbitro e instruí-lo, por fórmulas, sobre como deveria conduzir as demandas e proferir sentenças. Marcou o encerramento do que se chama de ciclo do período formular, no qual A ARBITRAGEM já assume feições de instituto jurídico público e cogente com impositividade governamental na escolha do árbitro pelo pretor. Período do direito romano pós-clássico – do séc. III d.C. ao séc. IV d.C. Nessa época, ampliou-se, ainda mais, o poder dos PRETORES, que conheciam e julgavam diretamente os litígios sem interferência, não mais podendo os particulares utilizar-se da arbitragem, por qualquer de suas formas. Essa fase assinala a passagem do modelo romano de Justiça Privada para a Justiça Pública. Ao assumir o Estado Romano o monopólio da atividade de dizer o direito, abolindo oficialmente a ARBITRAGEM FACULTATIVA, era o PRETOR o órgão jurisdicional do Estado e O ESTADO o único e exclusivo árbitro dos litígios. A essa atividade denominou-se JURISDIÇÃO (arbitragem estatal obrigatória).
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