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Aula 5 de Bases Matemáticas Rodrigo Hausen 1 de julho de 2014 1 Princípio da Indução Finita 1.1 Versão Fraca Definição 1 (P.I.F., versão fraca) Seja p(n) uma proposição aberta no universo dos números naturais. SE valem ambas as propriedades abaixo: • (Base de indução) p(n0) é verdadeira para algum n0 ∈ N • (Passo de indução) p(n)⇒ p(n+ 1) para todo n ≥ n0 ENTÃO p(n) é verdadeira para todo n ≥ n0. Exercício 1 Demonstre que 2n ≥ 1 + n para todo número natural. Demonstração. Seja p(n) = �2n ≥ 1 + n.� Demonstraremos que p(n) é verdadeira para todo n ∈ N usando o P. I. F. Base de indução: p(0) é verdadeira? Ou seja, 20 ≥ 1 + 0 ? Sim. Passo de indução: p(n)⇒ p(n+ 1) para todo n ≥ 0 ? Assuma que p(n) é verdade, ou seja, que 2n ≥ 1 + n. O que podemos dizer sobre 2n+1? 2n ≥ 1 + n 2 · 2n ≥ 2 · (1 + n) 2n+1 ≥ 2 + 2n 2n+1 ≥ 1 + n+ 1 + n ≥ 1 + n+ 1 , pois n ≥ 0 2n+1 ≥ 1 + n+ 1 Logo, se p(n), então p(n+ 1) é verdade. Como tanto a base, quanto o passo de indução são válidos, então p(n) é verdade para todo n ≥ 0. � Ao usar o PIF, tenha cuidado! É necessário demonstrar tanto a base, quanto o passo de indução. A falta de cuidado com o PIF pode levar a conclusões absurdas, tais como as que se seguem. 1 Absurdo 1 É verdade que n = 0 para todo n ∈ N. Demonstração errada. Seja p(n) = “n = 0′′. Como p(0) é válida, pois 0 = 0, então p(n) vale para todo n. � Erro na demonstração: não mostramos que o passo de indução é válido! É impossível demonstrar que vale o passo de indução, já que p(n) é falsa para n > 0. Absurdo 2 n2 + n é ímpar para todo n ≥ n0 Demonstração errada. Seja p(n) = “n2 + n é ímpar.� Assuma que p(n) é válida, logo n2 + n = 2k + 1 para algum k ∈ N. O que podemos dizer de (n+ 1)2 + (n+ 1)? (n+ 1)2 + (n+ 1) = n2 + 2n+ 1 + n+ 1 = n2 + n︸ ︷︷ ︸ =2k+1, por hipótese +2n+ 2 = 2k + 1 + 2n+ 2 = 2 (k + n+ 1)︸ ︷︷ ︸ ∈N +1 Logo, (n + 1)2 + (n + 1) também é ímpar, portanto está demonstrado que n2 + n é ímpar para todo n ∈ N. � Erro na demonstração: Não demonstramos que a base de indução p(0) é válida. Veja que são falsas: p(0) = “02 + 0 é ímpar′′ p(1) = “12 + 1 é ímpar′′ p(2) = “22 + 2 é ímpar′′ Não existe nenhum n0 que sirva para demonstrar a base de indução, uma vez que p(n) é falso para todo n. Veja que n2 + n = n(n+ 1) é sempre par: se n for par, então o produto n(n + 1) é múltiplo de 2; se se n for ímpar, então n+ 1 é par e o produto n(n+ 1) continua sendo múltiplo de 2. Logo, na˜o p(n) = “n2 + n é par� é verdadeira para todo n ∈ N. Vamos voltar para o uso correto do PIF. Exercício 2 Demonstre que o número máximo de movimentos necessários para resolver o jogo das Torres de Hanoi com n discos é, no máximo, 2n−1. O jogo das Torres de Hanoi é composto de uma plataforma onde estão fixados 3 pinos e n discos de tamanhos diferentes que possuem um furo no meio para encaixarem nos pinos. Regra geral: em qualquer configuração dos n discos, é proibido haver um disco maior sobre um disco menor. Na configuração inicial, todos os discos estão encaixados em um dos pinos. 2 n n−1 2 1 .. . Cada jogada consiste em mover um disco de um pino para outro, sempre respeitando a regra geral. O objetivo do jogo é mover todos os discos do pino original para um dos outros dois pinos. Seja T (n) o número de movimentos necessários para resolver o jogo das Torres de Hanói com n discos. Exemplos: • com 1 disco, T (1) = 1 movimento (mova o disco do pino origem para outro pino). • com 2 discos: 2 1 Início 2 1 1o. movimento 1 2 2o. movimento 1 2 3o. movimento T (2) ≤ 3 (para provar que T (2) = 3, precisaríamos demonstrar que não dá para resolver em menos do que 3 movimentos) Podemos refrasear o enunciado do exercício como: demonstre que T (n) ≤ 2n − 1 para todo n ≥ 1. Demonstração. Consideremos a proposição p(n) = “T (n) ≤ 2n − 1.′′ Vamos demonstrá-la para n ≥ 1 usando o PIF. Base de indução: p(1) é verdadeira? Ou seja, queremos saber se vale T (1) ≤ 21 − 1. Isto é verdade, pois para resolver o problema para apenas 1 disco, basta movê-lo para outro pino (1 movimento). Passo de indução: p(n)⇒ p(n+ 1) ? Suponha que p(n) é verdadeiro, ou seja, T (n) ≤ 2n − 1, o que significa que podemos resolver o problema para n discos em, no máximo, 2n − 1 3 movimentos. Como podemos usar este fato para resolver o problema para n+ 1 discos? n+1 n 2 1 .. . Início n+1 n 2 1 .. . T(n) mov. Mova os n discos menores para outro pino n+1 1 mov. n 2 1 .. . Mova disco maior para pino não ocupado n 2 1 .. . n+1 T(n) mov. Mova os n discos menores para cima do disco maior De acordo com o raciocínio mostrado no diagrama acima, podemos re- solver o problema das torres de Hanoi com n+1 discos usando, no máximo, T (n) + 1 + T (n) movimentos, ou seja: T (n+ 1) ≤ 2T (n) + 1 T (n+ 1) ≤ 2(2n − 1) + 1 T (n+ 1) ≤ 2 · 2n − 2 + 1 T (n+ 1) ≤ 2n+1 − 1 A última desigualdade demonstra que p(n+ 1) é válida. � 1.2 Versão Forte Exercício 3 Demonstre que todo número natural maior ou igual a dois é primo ou produto de primos. Demonstração. Seja p(n) = “n é primo oun é produto de primos′′. Usa- remos o PIF para demonstrar que p(n) é verdadeira para n ≥ 2. Base de indução: p(2) é verdade? Sim, pois 2 é primo. Passo de indução: p(n)⇒ p(n+ 1)? Assuma que p(n) é válida, ou seja, que n é primo oun é produto de primos. O que podemos falar de n+ 1? Se n+1 for primo, p(n+1) já é verdade e não há mais nada a demonstrar. Caso contrário, n + 1 não é primo, o que significa que n + 1 é múltiplo de algum natural a, ou seja n+ 1 = a · k para algum k ∈ N 4 Note que, tanto a quanto k não podem ser maiores do que n+ 1, pois caso contrário, o produto seria maior do que n+ 1. Ambos tampouco podem ser iguais a n + 1, pois isto implicaria que o outro número é igual a 1, o que resultaria em n + 1 primo, pois ele só seria divisível por n + 1 e 1, o que contradiria o fato de n+ 1 não ser primo. Portanto, temos n+ 1 = a · k, onde a ≤ n e k ≤ n. Vamos interromper a demonstração por um momento para observar que, com a versão fraca do PIF, nada podemos afirmar sobre a nem sobre k, já que a única hipótese é que n é primo ou produto de primos. Se a < n ou k < n, fica difícil usar a versão fraca. Nestes casos, usamos uma outra versão do PIF, chamada de versão forte. Definição 2 (Versão forte do Princípio da Indução Finita) Seja p(n) uma proposição aberta no universo dos números naturais. SE valem ambas as propriedades abaixo: • (Base de indução) p(n0) é verdadeira para algum n0 ∈ N • (Passo de indução) p(n0) e p(n0 + 1) e . . . p(n− 1) e p(n)⇒ p(n+ 1) para todo n ≥ n0 ENTÃO p(n) é verdadeira para todo n ≥ n0. Note que a única diferença entre a versão fraca e a versão forte é que na versão forte podemos assumir como verdadeiras as proposições p(n0), p(n0 + 1), . . . , p(n− 1), p(n). Retornando à demonstração anterior, vamos reescrever o passo de indu- ção (não precisamos mexer na demonstração da base de indução pois ela é idêntica para as duas versões). Retornando à demonstração do Exercício 3: Passo de indução: p(n0) e p(n0 + 1) e . . . p(n− 1) e p(n)⇒ p(n+ 1) ? Assuma que são verdadeiras p(n0), p(n0+1), . . . , p(n), ou seja, que todos os números naturais entre n0 e n são primos ou produtos de primos. Como já visto anteriormente, se n+1 não é primo, então n+1 = a·k, onde a, k são números naturais entre 2 e n. Pela hipótese do passo de indução, tanto a quanto k são inteiros ou produto de primos, logo a · k é produto de primos. � 5
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