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Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 1 O CONSTITUCIONALISMO APÓS O NEW DEAL CASS R. SUNSTEIN [N A] Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 2 I. Introdução Estamos em meio a um período de considerável insatisfação com o desempenho do governo federal. O aumento dos poderes presidenciais que se seguiu ao New Deal e a criação de uma enorme burocracia concentrada no ramo Executivo aumentaram o poder das facções (factional power) e a representação de interesses particularistas (self-interested representation), levando freqüentemente a uma regulação que falha em servir aos interesses do público em geral. De forma significativa, o governo federal termina ou regulando demais ou regulando de menos. A falha das instituições na sua tarefa de intervenção ou de controle não é o resultado somente de decisões equivocadas de importantes agentes públicos ou do triunfo de uma determinada agenda política. Grande parte do fracasso da regulação pública na última metade de século reflete a inadequação de importantes aspectos da concepção constitucional consagrada pelo New Deal. A reforma das instituições, portanto, constitui parte substancial da agenda do direito público moderno. A. O Constitucionalismo do New Deal O sistema regulatório estabelecido durante o New Deal [ n1 ] falhou em cumprir sua promessa original. Naquela época, os reformadores acreditavam que os agentes públicos funcionariam como agentes transformadores independentes, com iniciativa própria, politicamente neutros e com grande conhecimento técnico. Essa idéia básica uniu a crença constitucional original na necessidade de um governo nacional enérgico [ n 2 ] ao desejo, associado ao movimento progressista, [ n 3] de isolar os agentes públicos de pressões particularistas, a serviço do interesse público de longo prazo. O conceito de administração autônoma, atualmente sob intenso ataque, era originalmente fonte de grande otimismo a respeito da reforma possível do sistema de freios e contrapesos. Os New Dealers acreditavam que mudanças institucionais eram necessárias para permitir que o governo federal enfrentasse os múltiplos problemas econômicos e sociais que surgiram no rastro da depressão. O programa institucional do New Deal era um elemento de uma crítica tripartite ao arcabouço constitucional tradicional. A primeira crítica, de caráter substantivo, era o ponto culminante de um longo período de revisão daquele arcabouço e do sistema do common law. Para os reformistas do New Deal, o common law não era nem natural nem pré-político. Pelo contrário, ele incorporava uma teoria social determinada, que atendia a certos interesses às custas de outros. [n 4] Particularmente, os New Dealers viam o common law como um mecanismo de insulamento da distribuição existente de riqueza e de benefícios legais∗ em relação ao controle coletivo. O catálogo de direitos do common law incluía, ao mesmo tempo, muito e muito pouco – uma excessiva proteção do interesse estabelecido dos proprietários e uma proteção insuficiente dos interesses dos pobres, idosos e desempregados. Por causa disto, os reformadores da época do New Deal reivindicaram mudanças substanciais que promovessem a redistribuição de recursos e o reconhecimento de novos interesses enquanto ∗ N.T.: Ao longo do texto, o autor utiliza os termos “right” e “entitlement”. “Right” foi traduzido como “direito” (= direito subjetivo), e “entitlement”, como “benefício legal”, utilizado, aqui, no sentido de pretensão jurídica a um benefício reconhecido pelo Estado. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 3 benefícios legais [n 5]. De forma ainda mais dramática, o presidente Franklin Roosevelt chegou a falar numa “segunda Carta de Direitos”, à disposição de todos, “independentemente de posição, raça ou credo”, que incluiria: O direito a um emprego remunerado nas fábricas, lojas, fazendas ou minas da nação; O direito de ganhar o suficiente para satisfazer de forma adequada suas necessidades relacionadas a alimentação, vestuário e lazer; O direito de todo agricultor de produzir e vender suas mercadorias para obter um retorno que dará a ele e sua família uma vida digna; O direito de todo empresário, grande ou pequeno, de atuar em um ambiente livre da concorrência desleal e da dominação por monopólios, tanto nacionais quanto estrangeiros; O direito de toda família a uma moradia digna; O direito à saúde e à assistência médica adequada; O direito a adequada proteção dos idosos frente às dificuldades econômicas, doenças, acidentes e desemprego; O direito a uma boa educação. [N 6] O Segundo elemento da crítica ao New Deal centrava-se no sistema institucional baseado na tripartição dos poderes e no mecanismo de freios e contrapesos. Os reformadores acreditavam que a estrutura constitucional original, como o common law, estava intimamente associada à proteção da distribuição vigente de riqueza e benefícios legais. Na visão deles, o sistema de separação de funções impedia o governo de reagir de forma rápida e flexível para estabilizar a economia e proteger os menos favorecidos contra as flutuações do mercado desregulado. [N 7] Além disso, os reformadores acreditavam que a distribuição de poderes entre os três ramos do governo criava disputas políticas que retiravam dos funcionários do ramo Executivo a capacidade de desenvolver políticas públicas livres de pressões partidárias. Embora os ataques mais radicais à tripartição dos poderes tenham falhado, alguns dos impulsos por trás desses ataques prepararam o caminho para reforçar a autoridade presidencial e para o crescimento da Administração reguladora. [N 8] As recém-criadas agências, em larga medida uma criatura do New Deal, [N 9] reuniam em si as funções estatais tradicionalmente separadas e permaneciam livres do controle direto do Congresso, da Justiça federal e às vezes até mesmo do Presidente. [N 10] A crítica institucional do período, apontando para a necessidade de entidades livres dos entraves da separação dos poderes, naturalmente acompanhava o conteúdo programático do New Deal. O terceiro elemento da crítica trazida pelo New Deal, também institucional, produziu uma enorme mudança na relação entre o governo federal e os Estados. A interdependência econômica, revelação central da Depressão, tornou cada vez mais difícil para os reformadores acreditar que os Estados poderiam resolver seus problemas econômicos e sociais por conta própria. A concorrência entre os Estados às vezes produzia paralisia; muitos problemas exigiam um remédio uniforme de âmbito nacional. Os Estados freqüentemente pareciam arenas para o paroquialismo e para o conflito de facções. [N 12] Mais que isso, o tamanho do governo dos Estados e o domínio de grupos privados bem organizados nos Estados tornaram difícil continuar alimentando a velha crença de que a auto-determinação local poderia ser Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 4 verdadeiramente atingida pela autonomia do Estado. Nestas circunstâncias, a demanda por um aumento do exercício do poder regulador federal parecia bastante natural. No período do New Deal, o quadro constitucional original foi portanto reformulado de três diferentes formas. O New Deal deu início a uma concepção distinta de direitos subjetivos, rejeitando as premissas do status quo e do common law paradecidir o que era “ação” ou “inércia”governamental; propôs uma concepção dramaticamente distinta do papel do presidente da república e um conjunto inédito de atores administrativos; e rejeitou as noções tradicionais de federalismo. A expressão “constitucionalismo do New Deal” descreve a estrutura resultante desse processo. B. Controvérsias atuais Embora os reformadores dos anos trinta tenham tido amplo sucesso na transformação dos benefícios legais e das formas institucionais, o direito público americano não assimilou totalmente o constitucionalismo do New Deal, e muitas controvérsias atuais refletem a ambivalência de seu legado. Parte do direito público moderno, por exemplo, é construído a partir do common law e do status quo. Por exemplo, o direito a uma audiência, [N 13] o direito a um tribunal nos termos do art. III da Constituição, [N 14] e o direito de recorrer ao Judiciário para contestar o ato de uma agência [N 15] são fortemente influenciados por categorias do common law; a existência de um direito protegido no common law é altamente relevante nas três areas. Uma das maiores ironias do direito administrativo moderno – uma area cujas origens residem num repúdio substancial ao common law – é sua contínua filiação às categorias do common law. As questões institucionais encontram-se num semelhante processo de contínua mudança. Ao longo das últimas três décadas, a Administração autônoma vem sofrendo pressões de toda ordem. Em várias leis editadas desde 1960, o Congresso limitou a discricionariedade administrativa mediante um maior detalhamento de prazos, procedimentos e instruções sobre implementação. Nos anos sessenta e setenta, o Judiciário assumiu uma postura crescentemente agressiva no controle dos atos administrativos. Desde 1970, o Presidente tem tentado aumentar o seu controle. Ressurgiu igualmente a dúvida sobre o status constitucional das agências no que se refere à sua independência em relação ao controle presidencial. Em todos esses campos, o tradicional sistema de freios e contrapesos foi revigorado num esforço para monitorar o processo administrativo e resgatar a responsabilização política. As falhas atuais das agências reguladoras minaram portanto a lição institucional do New Deal durante um período em que o ceticismo do New Deal a respeito do “governo limitado” permanece em sua maior parte intacto, pelo menos no contexto da regulação social. [N 16] Os recentes esforços para impor o controle do Executivo e do Judiciário sobre o processo regulatório foram especialmente controversos. À luz da tensão ideológica entre o Presidente e o Judiciário durante a administração Reagan, talvez não devesse causar surpresa que aqueles favoráveis a um papel ativo do Judiciário tendam a se opor ao exercício da autoridade presidencial [N 17] e que aqueles que vêem com bons olhos a autoridade presidencial sejam Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 5 céticos em relação ao papel de supervisão da Justiça Federal. [N 18] Entretanto, a divergência entre os defensores do controle presidencial e aqueles que preferem o controle judicial é reforçada não somente pelas distintas visões sobre o quão desejável é a regulação econômica e social, mas também pelo desacordo sobre qual deve ser o papel da política, do direito e da especialização técnica no processo regulatório. [N 19] Os defensores de um papel judicial forte geralmente abraçam uma concepção tecnocrática de regulação – também associada ao New Deal – para a qual a análise no direito e dos fatos conduz a uma única solução correta para cada caso, ou pelo menos a um rol muito restrito de soluções aceitáveis. [N 20] Numa curiosa inversão da concepção do New Deal segundo a qual a racionalidade tecnocrática afasta o controle judicial, alguns observadores sustentam que os juízes deveriam exercer um papel importante na regulação – para garantir a “legalidade” e afastar os interesses das facções – e que o papel do Presidente é secundário. [N 21] Os defensores do controle presidencial são profundamente céticos em relação a essa coclusão. Para eles, as questões regulatórias são acima de tudo “políticas”. Aqui, como em qualquer outro contexto, o sentido exato do termo “político” não é sempre claro, mas a idéia central é que a regulação envolve questões de valores, e não de fatos, e que os valores importantes deveriam ser implementados por aqueles que são responsabilizáveis perante os cidadãos. Além disso, argumenta-se que o controle presidencial promove a racionalidade tecnocrática. [N 22] Conclui-se, assim, que o Presidente deveria exercer um papel crítico na regulação, e que os juízes deveriam ter uma atuação modesta. As controvérsias sobre o estabelecimento de instruções claras pelo Congresso para as agências freqüentemente acendem disputas similares sobre a relação entre as características política e tecnocrática da regulação. Defensores da especificidade do Congresso apontam o risco de falha regulatória e as vantagens do processo legislativo em termos de visibilidade e responsabilização. [N 23] Os críticos sustentam que o próprio Congresso é sitiado pelas facções [N24] e que um certo grau de autonomia da agência é necessário para garantir flexibilidade e especialização na matéria tratada. Em todas essas áreas, o debate sobre o processo regulatório trouxe de volta para seu centro a natureza da tripartição dos poderes numa era de regulação positiva. Finalmente, esforços têm sido feitos em busca do atingimento de alguns dos objetivos associados à estrutura federal original. Propostas para o aumento da autonomia dos Estados, promoção da auto-determinação local, e busca da democracia econômica resgatam as raízes da Constituição em pricípios do republicanismo cívico. [N25] Pelo menos para alguns, os objetivos de tais propostas consistem em encontrar um domínio para a participação ativa do cidadão na tomada de decisões fundamentais da vida social, promover a flexibilidade e a diversidade, e garantir que resultados políticos resultem da virtude cívica e da deliberação, e não das barganhas e dos interesses particularistas. O principal objetivo deste artigo é descrever a relação entre a estrutura constitucional original e a reforma do New Deal e destacar algumas das lições da última metade do século para os dilemas do direito público moderno. O artigo sugere que a crítica substantiva do New Deal estava amplamente correta; e mais, que em alguns aspectos ela não foi longe o bastante. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 6 [N26] Uma importante tarefa para o futuro é portanto criar um novo conjunto de benefícios legais que acompanhem o desenvolvimento do direito público. Por outro lado, o marco institucional do New Deal foi um grande erro – um meio desnecessário e em alguns aspectos contraproducente de levar adiante seu conteúdo programático. Mesmo que o objetivo institucional de isolar os agentes públicos dos eleitores esteja baseado na tradição do constitucionalismo americano, [N 27] este objetivo não foi bem desenvolvido pelas inovações institucionais do New Deal. As agências administrativas falharam enquanto veículos de aspirações democráticas e os regimes regulatórios que elas criaram não foram igualmente bem sucedidos. Nessas circunstâncias, faz-se necessário ao mesmo tempo reagir às patologias das instituições atuais e levar em conta novas iniciativas. Tais estratégias devem é claro reconhecer a necessidade de agências reguladoras que podem oferecer flexibilidade ao longo do tempo e especialização na matéria tratada. Entretanto, na trilha do abandono da visão do New Deal sobre a administraçãoindependente, a melhor alternativa é desenvolver um sistema agressivo de controle por parte do Executivo, do Legislativo e do Judiciário – um sistema no qual as três instituições se aproximem das garantias do marco constitucional original, mas sem incorrer na visão anacrônica do “governo limitado”. Um sistema assim, acompanhado de uma reformulação do conjunto de direitos e do fortalecimento do federalismo, promoverá aqueles aspectos do constitucionalismo do New Deal que ainda hoje encontram forte sustentação. Proponho algumas reformas para o atingimento desses objetivos. Elas incluem (1) o aumento da supervisão presidencial das agências executivas, acompanhado de várias garantias; (2) a reformulação do controle por parte do Executivo de modo a incluir o poder e a responsabilidade de estimular iniciativas regulatórias – em alguma extensão algo parecido com o modelo do ombudsman [N28] – assim como a competência para desestimular propostas desnecessárias ou contraproducentes; (3) manutenção de um papel moderadamente agressivo para a Justiça Federal; (4) desenvolvimento de um papel mais amplo para o Congresso em relação à atuação das agências, mediante o estabelecimento de fins regulatórios, prazos e várias formas de monitoramento; (5) redução das leis que identificam os meios pelos quais as agências devem perseguir objetivos legais; (6) inclusão das agências independentes no âmbito da competência de supervisão do Presidente; (7) revisão do sistema de direitos para ampliar o abandono do New Deal dos princípios do status quo e do common law; (8) reformulação das doutrinas do direito administrativo para colocar os cidadãos∗ no mesmo plano das entidades reguladas; (9) uma mudança da perspectiva nacional do New Deal para um sistema que aumente as oportunidades para a auto-determinação local e a participação democrática. Esse artigo é organizado da seguinte forma. A parte II descreve a relação entre o governo limitado e a distribuição tradicional dos poderes nacionais; ela também explora a forma como o constitucionalismo do New Deal afastou-se do marco original, tanto na sua crítica institucional quanto na sua oposição ao ideal do governo limitado. A parte III descreve e ∗ N.T.: “regulatory beneficiaries”, no original. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 7 avalia a mudança de posicionamento do Presidente, do Judiciário e do Congresso em relação ao processo administrativo, sugerindo que concepções tradicionais de administração tornaram anacrônicas devido às várias interferências na autonomia das agências. A parte III também se dedica às relações entre as várias formas de controle e discute o ataque constitucional contra as agências independentes, relacionando esse ataque ao declínio na crença em uma administração a la New Deal. A parte III defende uma revisão do sistema de freios e contrapesos, adaptado para uma época de regulação governamental ativa da economia. A parte IV discute a reformulação de direitos durante o período do New Deal, a reforma regulatória substantiva e a questão da auto-determinação local. II. A Reforma promovida pelo New Deal A. A distribuição dos poderes de âmbito nacional: as funções subjacentes O New Deal consistiu numa revisão consciente do arranjo constitucional original de freios e contrapesos, e alguns dos problemas da regulação moderna são um produto da reação míope dos reformistas que fizeram o New Deal ao sistema de separação e divisão de poderes. O constitucionalismo do New Deal deve portanto ser compreendido com o pano de fundo do arcabouço tradicional. É necessário de início registrar que a noção de separação de poderes é em importantes aspectos uma caracterização imperfeita do sistema constitucional, que deveria ser entendido em termos de freios e contrapesos. [N.29] Os três ramos têm obviamente funções que se sobrepõem; cada um deles envolve-se em certo grau nas atividades dos demais. [N30] O termo “separação” tende a encobrir este fato. A distribuição de poderes no âmbito nacional foi fortemente influenciada pela revisão madisoniana do pensamento republicano clássico e em particular pela concepção madisoniana de representação. [N31] No modelo de Madison, o maior perigo para um sistema político reside nas facções – grupos privados bem organizados que usurpam o poder governamental para fazer valer seus interesses, contrários ao público em geral. [N32] Madison acreditava que a política não deveria ser uma série de trocas inescrupulosas entre facções que buscavam exclusivamente seus interesses. O processo deveria, ao contrário, incorporar de forma significativa a deliberação e o diálogo sobre o interesse público. Como Madison a via, porém, a experiência tinha mostrado que a crença republicana clássica numa democracia de pequena escala, que exigia a participação ativa do cidadão [N 33] no governo, era irreal e contraproducente. [N34] Em vista do comportamento individualista do cidadão, os esforços para estimular a tomada de decisões pelos cidadãos produziria uma luta de facções. [N35] A ampla participação do cidadão não serviria portanto à tradicional crença republicana no governo deliberativo. A solução de Madison reformulou de modo dramático o pensamento republicano tradicional. [N 36] Para os republicanos clássicos, somente uma república pequena e com auto-governo poderia produzir cidadãos virtuosos e deles se beneficiar. [N 37] Madison virou essa concepção de ponta-cabeça. Em sua visão, somente uma república grande, com Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 8 representantes relativamente isolados, poderia gerar uma democracia deliberativa que funcionasse adequadamente. Uma república pequena seria destroçada pela disputa entre facções; já em uma grande república, ao contrário, os representantes seriam capazes de fugir às pressões dos grupos poderosos e se engajar nas tarefas deliberativas da política. Era portanto necessário transferir as decisões para as mãos de representantes escolhidos de um grande território, “cuja sabedoria pode melhor discernir o interesse verdadeiro de seu país e cujo patriotismo e amor pela justiça tornarão menos provável que sacrifiquem aquele interesse maior por causas particularistas ou conjunturais.” [N 38] Neste aspecto, há uma tendência burkeana na teoria da representação de Madison. [N 39] Madison abandonou a crença republicana clássica no auto-governo direto dos cidadãos [N40] sem rejeitar a crença republicana fundamental na democracia deliberativa. Obviamente, os fundadores desenvolveram também outras garantias, inclusive o federalismo e uma forma de aferir a responsabilização política, mediante a eleição direta da Câmara dos Deputados e mediante o controle eleitoral de outras instituições. A distribuição dos poderes de âmbito nacional atendeu a dois objetivos principais. [N41] O primeiro era a eficiência, resultado de uma clara divisão do trabalho. Freqüentemente, a separação dos poderes é vista como limitadora do poder, mas em alguns aspectos ela o libera e o aumenta. Por exemplo, um defeito crucial dos Artigos da Confederação era a ausência de um Executivo forte. Os fundadores, corrigindo esta falha, criaram um ramo Executivo desenhado para promover um governo enérgico e consistente. [N42] O objetivo de eficiência governamental era também promovido pela coordenação da ação executiva, que seria atingida pela criação de um ramo Executivo unitário. [N43] Os fundadores rejeitaram um “Executivo plural” convencidos de que a fragmentação do poder inviabilizaria uma atuação governamental ágil, diminuiria o grau de responsabilizaçãoe impediria a coordenação e a centralização das políticas. [N44] O poder executivo foi então concentrado no Presidente. [N45] A divisão de poder entre o Executivo e o Judiciário também serviu para liberar o Executivo da responsabilidade pelas decisões de que a totalidade ou parte dos cidadãos não aprovasse. Ao conferir funções judicantes a uma instituição separada, os fundadores asseguraram que o Executivo não seria considerado responsável por decisões desfavoráveis a determinadas facções. [N46] Ainda que a distribuição dos poderes nacionais possa ser entendida como uma divisão eficiente do trabalho, a mais conhecida justificativa para a distribuição é a necessidade de diminuir o risco da tirania. Ao mesmo tempo em que exaltava a virtude de uma república grande para promover uma representação orientada pelo espírito público, ele reconhecia que “nem sempre estadistas iluminados estarão no comando”. [N 47] A distribuição dos poderes nacionais foi desenhada para controlar representantes intelectualmente limitados ou comprometidos com interesses particularistas. Acima de qualquer coisa, ela diluía o poder governamental, reduzindo a probabilidade de que um dos ramos fosse capaz de usar seu poder contra a totalidade ou parte dos cidadãos. O sistema de freios e contrapesos permitia que cada ramo – munido de suas próprias ambições – pudesse se contrapor aos demais. [N48] Nesse aspecto, o modelo de freios e contrapesos adequava-se perfeitamente a um sistema no qual o principal perigo era ação governamental, ao invés da ausência de ação. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 9 Em vista dessa história, não deveria causar surpresa o fato de os reformistas do New Deal associarem o sistema de freios e contrapesos à inércia governamental. Essa associação levou os defensores da intervenção governamental a buscar uma reforma substancial da distribuição original dos poderes nacionais. A reforma porém foi somente parcialmente vitoriosa, e muitas de suas falhas fazem retornar os propósitos subjacentes ao sistema original de freios e contrapesos. Faz-se portanto necessário explorar os modos pelos quais a distribuição dos poderes nacionais funciona como uma garantia contra a tirania. Os fundadores enfatizaram uma série de considerações; a maioria é altamente relevante para os dilemas institucionais atuais. 1. O Estado de Direito – A distinção entre Legislativo e Executivo garante que o poder de aplicar o direito não esteja nas mãos de quem o cria. Como os legisladores não podem deixar de se submeter à lei que eles próprios criaram, eles devem, ao editar as leis, assumir a perspectiva dos cidadãos comuns sujeitos à força da lei. Assim, “[s]e um Executivo autônomo garantirá a aplicação da lei até mesmo contra os seus criadores, estes não se basearão em interesses distintos daqueles do resto da Comunidade.” [N49] Dessa forma, a distribuição dos poderes nacionais promove um valor constitucional fundamental: o caráter geral do processo legislativo. 2. Governantes versus Governados – uma justificativa relacionada, porém mais geral, realça a necessidade de garantir que os agentes governamentais não agirão de acordo com seus próprios interesses, mas sim de acordo com o interesse público. A preocupação em evitar que os governantes tenham interesses próprios e possam oprimir o povo teve um importante papel na elaboração da Constituição. [N50] A expressão “representação de interesses particularistas” descreve o fenômeno de representantes procurarem a realização de seus próprios interesses. [N51] Se o poder estivesse concentrado num único ramo, maior seria a probabilidade de este ramo aumentar seu próprio poder em prejuízo dos governados. Com a permissão para que cada ramo controle os demais, pretendeu-se, com a distribuição dos poderes nacionais, oferecer uma solução parcial para esse problema, aumentando o controle democrático sobre os representantes e criando garantias para a liberdade e a propriedade privada contra a ação do governo. [N52] 3. O Governo limitado – uma razão distinta para a distribuição dos poderes constitucionais consiste no ideal do Governo limitado. O Executivo e o Judiciário devem agir em harmonia com o Legislativo para o cumprimento da lei. Nenhuma lei pode ser usada contra os cidadãos sem um amplo consenso. Cada ramo tem o poder de impedir imposições legais. Esse sistema tende a dificultar a ação do governo, exceto na hipótese de haver um consenso generalizado sobre o que deve ser feito. Essa lógica ecoa a observação de Montesquieu segundo a qual um sistema com três ramos “deveria naturalmente produzir um estado de repouso ou inércia.” [N53] Para os fundadores, a legislatura apresentou a primeira ameaça de invasão indevida da esfera privada. O período imediatamente anterior à Convenção Constitucional de 1787 se Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 10 caracterizou, na visão de muitos dos fundadores, por perigosas intervenções da legislatura no domínio da liberdade e da propriedade privada. [N54] A distribuição dos poderes nacionais foi portanto pensada para a proteção dos direitos individuais – principalmente os direitos de propriedade – em relação à legislatura. Nesse aspecto há uma íntima conexão entre a distribuição dos poderes nacionais, a proteção da ordem privada e a ênfase que os fundadores deram à necessidade de “deliberação” para a ação governamental. [N56] A deliberação foi pensada em parte como um freio contra as paixões populares pela redistribuição de riqueza. 4. O Problema da Facção – a distribuição de poderes ao nível nacional também ajudou a resolver um problema central do governo: a dinâmica das facções, que traz o risco de grupos privados usurparem o poder público para redistribuir riqueza ou oportunidades em seu benefício. [N57] Esses grupos privados, sejam eles minorias ou (mais provavelmente) maiorias, podem usar o poder governamental para oprimir os demais. A separação dos poderes e o sistema de freios e contrapesos foram pensados para reduzir esse risco. Uma facção poderia vir a dominar um ramo, mas não era provável que dominasse os três. A distribuição de poderes nacionais portanto funcionou de modo a proteger as minorias contra a tirania de grupos privados poderosos. É importante ressaltar que as preocupações dos fundadores com a lógica das facções, com a representação de interesses particularistas e com o ideal de Governo limitado estavam intimamente relacionadas, e mesmo se fundiam em última instância no esforço geral de utilizar o constitucionalismo para limitar a força da democracia. [N58] 5. Estabilidade: a distribuição dos poderes nacionais não somente limita o governo; ela também promove a estabilidade ao isolar o status quo em relação a mudanças rápidas. Em muitos casos, dois ou mais ramos devem atuar juntos para alterar o direito vigente; o sistema é estruturado de modo a fornecer a cada ramo os meios e o desejo de resistir aos demais. O desejo de promover a estabilidade estava intimamente relacionado à crença dos fundadores na propriedade privada e no desenvolvimento econômico numa república de comerciantes. De modo significativo, o sistema de freios e contrapesos garantiu que os termos da regulação freqüentemente fossem definidos pelos tribunais do common law, que ocupavam um importante lugar no sistema. Nunca será demais enfatizar esse ponto. [N59] A criação e implementação do common law pelo Judiciário poderia exercer grande impacto na ordem social, ao promover os mercados privados e resistir aos vários perigos associados a um governo que centralizasse o poder de criar, interpretar e executar as leis.Um Judiciário politicamente insulado poderia assumir essa função porque se entendia que o common law incorporava um sistema de direitos naturais e pré-políticos; [N60] ao agir de acordo com os ditames da “razão”, os tribunais não estavam sujeitos aos riscos decorrentes de uma combinação de poderes nos ramos legislativo ou executivo do governo nacional. Como veremos, todas essas concepções serão duramente atacadas durante o período do New Deal. Ao mesmo tempo, a natureza federal do sistema gerou uma outra série de limitações ao governo, [FN 61] promoveu flexibilidade, responsabilização política e diversidade, e permitiu Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 11 um certo grau de auto-determinação mediante a participação no governo em moldes republicanos clássicos. O resultado disso foi um sistema complexo. A representação madisoniana ao nível nacional permitiria a deliberação no governo; a criação de um Executivo unitário e a divisão do trabalho permitiriam que a atuação estatal de âmbito nacional fosse ao encontro das necessidades nacionais; a distribuição dos poderes nacionais forneceria controles que diminuiriam os riscos do facciosismo, da representação de interesses particularistas e de restrições exageradas à liberdade e à propriedade privada; o sistema federal criaria salvaguardas adicionais, bem como permitiria um certo grau de auto- determinação do cidadão. B. A Segunda Carta de Direitos, a Agência do New Deal e o Governo limitado 1. Reforma institucional e substantiva – A agência reguladora moderna foi o resultado em larga medida da profunda insatisfação com a ordem privada do sistema do common law e a distribuição original dos poderes nacionais. [N62] Os Progressistas criticavam o common law com vários fundamentos. [N63] Parte importante de sua crítica era centrada no caráter antidemocrático do processo de criação do direito a partir das decisões judiciais – um problema particularmente muito sério no contexto constitucional, mas também problemática no que se refere ao common law. O problema apareceu de forma mais aguda durante a era Lochner, [N64], quando os constranginetos constitucionais deviam sua origem e forma às categorias do common law. Uma preocupação adicional era o caráter anacrônico ou pelo menos incompleto dos direitos do common law. A Depressão e as falhas do mercado desregulado tornaram mais difícil sustentar a tese de que a intervenção governamental para além das regras do common law [N65] era incompatível com a produtividade econômica. O colapso do sistema de mercado do common law durante a Depressão fez com que as premissas utópicas do laissez-faire parecessem irreais. E mais, a recuperação econômica parecia demandar uma coordenação e um planejamento cada vez maiores. Uma preocupação final era a necessidade de redistribuição de riqueza e benefícios legais, [N66] o que não poderia passar pelo common law. Numa perspectiva ainda mais profunda, muitos dos reformadores viam o common law não como uma ordem pré-política, mas como um esquema regulatório, e apontavam a inadequação do common law para este papel regulador. [N67] O próprio termo “New Deal” é altamente sugestivo. Ele conota um reembaralhar de cartas, do qual resultaria uma diferente distribuição de ônus e benefícios. Os reformadores no período do New Deal exigiam portanto o reconhecimento de uma nova categoria de direitos subjetivos. Os direitos tradicionais da ordem do mercado não mais captavam a categoria de interesses fundamentais; aqueles direitos eram ao mesmo tempo inclusivos de mais e inclusivos de menos. Direitos de assistência governamental aos desempregados, por exemplo, eram insuficientemente protegidos pelo common law, tal como os interesses dos pobres, dos consumidores de alimentos e remédios perigosos, os idosos, os que negociavam no mercado de capitais, e as vítimas de práticas comerciais desleais. Ao mesmo tempo, o sistema do common law deu uma proteção indevida aos direitos de propriedade privada. Em alguns aspectos, o próprio common law parecia um produto do Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 12 poder de facções, ao proteger alguns interesses e relutar em reconhecer outros. [N68] Esse tema básico, um ingrediente central do constitucionalismo do New Deal, foi importante durante toda a administração Roosevelt. Em seu discurso de aceitação da indicação democrata para a presidência em 1936, por exemplo, Roosevelt sustentou que, apesar de os Fundadores terem se preocupado apenas com os direitos políticos, novas circunstâncias exigiam o reconhecimento também de direitos econômicos, porque “a liberdade não admite meio termo.”∗ [N69] A expressão mais dramática dessa noção revisada de direito veio com o pronunciamento do presidente Roosevelt sobre o “Estado da União”, de 1944, que estabeleceu a “Segunda Carta de Direitos” acima citada. [N71] Esses direitos deveriam ser aplicados a todos os cidadãos, “independentemente de posição, raça ou credo.” [N71] O programa substantivo do New Deal consistiu portanto numa rejeição do sistema do common law em favor de uma nova concepção de direitos, embora de dimensões ainda incertas. [N72] O programa alterou dramaticamente as bases a partir das quais a ação inércia governamental e o partidarismo ou a neutralidade deveriam ser avaliados. Embora a nova concepção de direitos revisasse a concepção original, ela conservou uma certa dose de continuidade. O presidente Roosevelt encaixou de forma precisa o novo espírito dos benefícios legais na moldura dos direitos; a terminologia que ele utilizou remontava à Carta de Direitos original e a ela fez acréscimos. A argumentação para o abandono da ordem do common law assumiu várias formas. Às vezes, os reformadores enfatizavam a necessidade de um planejamento central sob o comando do governo nacional. [N73] Na ocasião, eles realçaram os benefícios da cartelização para promover a produtividade econômica. [N74] Há, neste aspecto, uma íntima conexão entre as justificativas para a regulação baseadas no interesse público e as explicações que vêem a regulação como um produto de acordos entre grupos de interesse; [N75] esses acordos, na forma de cartelização, foram pensados para estimular o funcionamento de uma economia deprimida. Às vezes a regulação era justificada com argumentos econômicos mais convencionais, tais como “falhas de mercado” na forma de externalidades ignoradas pelo common law ou como falta de informação por parte de consumidores e trabalhadores. [N76] Fundamentos alternativos e potencialmente mais radicais para a expansão dos direitos materiais enfatizaram o caráter essencialmente antidemocrático da ordem do mercado. Segundo essa visão, o controle coletivo era necessário para o atingimento da democracia. [N77] Algumas formas de regulação eram tidas como redistributivas pela sua própria natureza – as leis sobre salário mínimo e limite da jornada de trabalho eram exemplos. [N78] Outras justificativas para a regulação têm sido invocadas recentemente, inclusive valores públicos ou de caráter não mercantil, distintos das escolhas do consumo privado [N79] e as dificuldades enfrentadas pela pessoas diante de decisões relativas a eventos de baixa probabilidade, como acidentes de trânsito e de trabalho. [N80] No campo da discriminação por raça e gênero, os defensores da regulação têm argumentado que algumas preferências são distorcidas ou censuráveis e contribuem para perpetuar hierarquias sociais indesejáveis. ∗ N.T.: no original, “freedom is no half-and-half affair”. Livro: Regulação Econômica e Democracia:O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 13 [N81] Durante o período do New Deal, os reformadores acreditavam que essas concepções de direitos materiais exigiam uma reforma institucional significativa. A separação dos poderes e o modelo de freios e contrapesos pareciam impedir o governo de intervir na economia. Um sistema de poderes mais unificados era necessário para permitir a ação governamental freqüente e dramática. [N82] Mais que isso, o caráter complexo da regulação moderna ampliou enormemente a necessidade de conhecimento técnico e de especialização no processo de tomada de decisões governamentais. Nenhuma das instituições originais parecia ter essas qualidades. Essa percepção da inadequação do marco institucional herdado levou a duas conseqüências. A primeira foi um aumento dramático do poder do Presidente, que assumiu poderes antes associados aos tribunais do common law. [N83] A segunda foi a atribuição de poder a agências reguladoras. A concepção de administração do New Deal via as agências como insuladas em relação à política, tecnicamente sofisticadas e dotadas de capacidade de iniciativa. A expectativa era de que técnicos neutros, atuando acima dos conflitos, seriam capazes de discernir o interesse público. [N84] O Presidente Roosevelt declarou que “[o] dia da administração esclarecida chegou” [N85] Seria um erro exagerar a associação entre o New Deal e a crença na especialidade neutra. As agências reguladoras independentes, inclusive a Interstate Commerce Comission, a Federal Trade Comission e a Federal Radio Comission∗ foram criadas bem antes do New Deal. Mais que isso, as numerosas agências criadas no período do New Deal eram substancialmente diferentes. Algumas dessas agências, por exemplo, lidavam com instruções legislativas relativamente claras. [N86] Seria portanto equivocado sugerir que um modelo unitário de administração abrange todas as entidades regulatórias associadas ao período do New Deal, mas não abrangeria nenhuma criada anteriormente. Apesar disso, o legado duradouro do período é a figura do administrador insulado, imerso numa área específica do conhecimento técnico, dotado de ampla discricionariedade, e do qual se espera que desenvolva um conjunto de funções estatais até então tradicionalmente separadas. Apesar do risco de simplificação excessiva, pode-se apontar uma concepção de administração própria do New Deal. Havia uma forte dimensão madisoniana no entusiasmo do New Deal pelas agências insuladas e dotadas de especialização técnica. Assim como os fundadores pensaram o sistema constitucional original em parte para insular os representantes nacionais de modo a aumentar a probabilidade de efetivar um governo deliberativo, a concepção de administração do New Deal tentou insular os agentes públicos de modo a proteger os processos governamentais contra as distorções oriundas do facciosismo. [N87] Tanto no sistema original quanto na reformulação promovida pelo New Deal, os reformadores acreditavam que a proteção contra o facciosismo, mediante o insulamento, era altamente desejável. ∗ N.T.: órgão incumbido da regulação das atividades de radiodifusão, criado em 1926 e extinto em 1934, quando o Communications Act criou a Federal Communications Commission (FCC), dotada de competências bem mais amplas. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 14 O marco institucional do New Deal, porém, se diferenciava do sistema constitucional original em importantes aspectos. Em primeiro lugar, o mecanismo de insulação enquanto salvaguarda contra o facciosismo serviu a diferentes propósitos nos dois períodos. No modelo madisoniano, a insulação era pensada como um bloqueio contra a mudança. A democracia deliberativa era pensada em parte para proteger o status quo contra, dentre outras coisas, a distribuição de riqueza. Ao contrário, os New Dealers viam mudanças no status quo, inclusive medidas redistributivas, como algo altamente desejável, [N88] e a insulação e a deliberação como meios de atingimento de tais fins. Em segundo lugar, a crença do New Deal na importância da especialização técnica e na imersão nos fatos era estranha ao marco original. Embora a importância de uma administração enérgica fosse um tema central no período da fundação, não havia uma ênfase na sofisticação técnica nos processos governamentais. Essa diferença era um produto natural das diferentes concepções sobre o objetivo da regulação nacional. Em terceiro lugar, no sistema madisoniano, os estados tinham um amplo papel como um freio contra o governo federal e como uma arena para a auto-determinação coletiva. Durante o período do New Deal, ao contrário, os estados pareciam fracos e ineficazes, incapazes de lidar com problemas sociais sérios; eles pareciam grande demais para oferecer um fórum para uma autêntica auto-determinação. A idéia de que os estados controlariam o governo federal, se verdadeira, parecia perversa à luz da necessidade de uma ação nacional. Por esta razão, os reformadores demonstraram pouca simpatia pela autonomia dos estados. [N90] A mudança na concepção do papel do governo dos estados foi dramática. Esforços anteriores de reforma tinham se concentrado nas instituições locais e dos estados, em parte por causa da tenacidade da crença jeffersoniana numa cidadania engajada numa democracia do tipo face-a- face.∗ [N91] Ao tornar a presidência, ao invés dos estados e das localidades, o ponto focal do auto-governo, os reformadores, num único golpe, uniram a crença hamiltoniana num governo nacional enérgico com a afirmação jeffersoniana da auto-determinação do cidadão. [N92] Os reformadores portanto democratizaram as noções hamiltoniana de um governo enérgico mediante concepções inovadoras da presidência e da administração reguladora. A crença progressista na insulação dos funcionários públicos, o colapso da ordem do common law e a crítica à tripartiçÃo dos poderes legitimaram um novo conjunto de concepções institucionais. Foi por essa razão que James Landis não via nenhum conflito entre insulação da administração e responsividade perante a vontade do povo, descrevendo os administradores nacionais como o mecanismo pelo qual “nossas instituições democráticas” poderiam “exercer algum controle sobre as fases mutantes de nossa vida econômica.” [N93] Administradores não sujeitos às tradicionais pressões seriam capazes de promover o interesse público na produtividade econômica e ao mesmo tempo redistribuir recursos e proteger novos direitos. Por fim, o sistema madisoniano de democracia deliberativa incluía o sistema de freios e contrapesos como uma salvaguarda necessária da propriedade privada e da liberdade contra o ∗ N.T.: no original, “face-to-face democracy”. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 15 facciosismo e a representação dos interesses particularistas. Ao contrário, a concepção do New Deal de administração autônoma rejeita o sistema de freios e contrapesos, por considerá-los um obstáculo à mudança social. [N94] Uma das vantagens da administração autônoma era sua capacidade para a ação imediata, uma qualidade que os três ramos do governo não tinham. Uma importante conseqüência dessa grande valorização da capacidade de ação imediata era a hostilidade em relação ao Judiciário. O papel do Judiciário foi portanto limitado e as agências tinham ampla discricionariedade para determinar o interesse público. Os New Dealers eram obviamente reformadores que acreditavamque o objetivo das agências era perseguir a produtividade econômica e a justiça distributiva. Eles reconheciam que os funcionários das agências não seriam inteiramente neutros. [N95] Como Herbert Croly escreveu, “[a] imparcialidade é o dever do juiz, mais do que do estadista; dos tribunais, mais do que do governo.” [N96] Entretanto pelo menos alguns dos reformadores acreditavam que a noção de interesse público era relativamente pacífica – e mesmo que ela era às vezes codificada como um standard legal [N97] – e que as agências, devido à sua especialização e insulação, deveriam ter uma grande margem de autonomia na definição do interesse público. Mais que isso, o poder do presidente de controlar as agências era freqüentemente limitado, de fato e de direito. Cetamente, o poder do presidente também aumentou enormemente durante o período do New Deal [N98] – um resultado da fé no caráter democrático da função da presidência e da crença na necessidade de uma ação executiva vigorosa. Apesar de tudo isso, algumas agências reguladoras estavam legalmente imunizadas em relação ao controle presidencial direto – o legado da fé dos progressistas na tecnocracia – e às vezes o entusiasmo pela administração tecnocrática se convertia na prática em um alto grau de autonomia para os funcionários das agências. De acordo com a concepção do papel do Legislativo na época, agora conhecida, o Congresso se limitava a identificar problemas e solcitar sua resolução a uma agência. [N99] Havia alguma tensão na visão do New Deal sobre o ramo executivo. O aumento do poder presidencial baseava-se numa crença na relação direta entre a vontade do povo e a vontade do presidente; pois a presidência, mais do que os estados ou os tribunais do common law, era considerada como o principal regulador. Em contraposição, a fé na administração burocrática era baseada na capacidade dos reguladores de discernir o interesse público e promover os objetivos democráticos, ainda que de forma indireta e insulada. A tensão entre a crença na criação de direito pelo presidente e a fé na autonomia administrativa ainda persiste nos debates contemporâneos sobre os papéis do presidente, do Congresso e dos tribunais no processo regulatório. Durante o período do New Deal, três tipos de questões eram submetidas às agências: estritamente legal, tecnocrática e política. [N100] As decisões de caráter estritamente legal envolviam a aplicação do direito aos fatos. Elas raramente exigiam julgamentos amplos sobre política pública ou especialização técnica. Um exemplo de uma decisão estritamente jurídica Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 16 é a decisão de um juiz administrativo∗ de conceder ou suspender benefícios por invalidez de acordo com os standards do Social Security Act. [N101] Em casos como esse, o Congresso poderia também ter deixado a decisão nas mãos de juízes estaduais ou federais. A decisão de delegar competência para um administrador é parcialmente uma questão de conveniência e parcialmente um desejo de limitar o ônus sobre os juízes do Poder Judiciário.∗∗ Em contraposição, decisões tecnocráticas envolvem a aplicação de conhecimento técnico especializado a metas de política pública que o Congresso claramente identificou. Um exemplo de decisão tecnocrática é a determinação administrativa do método mais adequado para se atingir determinado nível de poluição. A decisão de delegar competência para uma agência administrativa nesse contexto é baseada na necessidade de especialização e talvez no desejo de evitar os efeitos distorcedores do partidarismo. Por último, decisões políticas exigem em larga medida juízos de valor; elas involvem questões básicas de distribuição e alocação de recursos. Uma decisão sobre regulação de elementos carcinogênicos no ambiente de trabalho é essencialmente política, pois ela não repousa exclusivamente na aplicação de um conhecimento técnico. A justificativa para a delegação de poder para um agente administrativo poderia ser a ausência de consenso político, o desejo de afastar a responsabilidade política pela decisão, ou a crença em que a insulação promove decisões corretas. A maior parte das decisões regulatórias envolve uma combinação de características estritamente legais, tecnocráticas e políticas. Decisões sobre a concessão de benefícios por invalidez, por exemplo, exigem não somente uma avaliação dos fatos, mas também especialização e até juízo de valor. Mesmo a escolha de meios para o atingimento de fins que já são consensuais pode suscitar questões redistributivas importantes. Até mesmo as decisões mais políticas deveriam ser instruídas por um conhecimento especializado. É portanto anacrônico entender a administração somente pela referência a uma ou outra dessas três concepções. Entretanto, as decisões das agências não deveriam ser vistas como uma unidade indiferenciada. Podem-se distinguir tendências gerais em vários campos – tendências que têm uma considerável importância prática. O Administrative Procedure Act (APA) [N102] incorpora apenas de forma discreta essas distinções, [N103] embora a prática administrativa, nos tribunais e em outros lugares, o faça em maior grau. A natureza de uma decisão está ligada de forma significativa tanto à necessidade de delegação para a agência quanto ao tipo e a extensão da supervisão pelos três ramos. No ∗ N.T.: no original, “administrative law judge”. Os “ALJs” não fazem parte do Poder Judiciário norte- americano, mas do Poder Executivo. Trata-se de juízes administrativos independentes que, no âmbito das agências, são competentes para tomar decisões administrativas relacionadas, por exemplo, a concessões de benefícios trabalhistas. Suas decisões podem na maioria das vezes ser revistas no âmbito da própria agência. Exercem o que se costuma chamar de função “quase-judicial” das agências. Ver, por exemplo, o website do Office of Administrative Law Judges: http://www.oalj.dol.gov. ∗∗ N.T.: no original, “article III judges”. A contraposição dos “administrative law judges”aos aos “article III judges” é feita por serem estes últimos juízes do Poder Judiciário, do qual trata o art. III da Constituição dos E.U.A. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 17 período do New Deal, porém, distinções desse tipo raramente eram feitas. Duas conseqüências se seguiam. Primeiro, todas as decisões importantes eram submetidas às agências para sua decisão. Em segundo lugar, as funções de controle por parte do Congresso, dos tribunais e às vezes até do presidente eram muito limitados. 2. A Crítica Institucional Moderna – pelo menos desde os anos quarenta, muitos observadores têm invocado as questões tradicionais ligadas à distribuição dos poderes nacionais para questionar o papel e o desempenho das agências administrativas. Os críticos incluem aqueles que aceitam e aqueles que rejeitam a crítica dos progressistas ao common law. [N105] No período imediatamente posterior ao New Deal, conservadores que defendiam um retorno à ordem do common law do fim do século XIX buscaram formas jurídicas de controle sobre as agências administrativas. [N106] Entretanto, o ataque à administração autônoma não precisa aparecer junto com a defesa da desregulação. Mais recentemente, por exemplo, aqueles preocupados com a falha das agências ao aplicar as leis também exigiram controles jurídicos. [N107] O primeiro problema é que a agência do New Deal combina funções executiva, judicial e legislativa. Em algum grau, as leis específicas das agências e o APA tentam separar essas atividades, [N108] mas esses parâmetrosnão chegaram a formar um sistema que se aproximasse do sistema constitucional de freios e contrapesos. Há pouca concorrência entre funcionários dentro das agências, com “ambição” agindo para “controlar ambição”. O mais freqüente é que se espere dos administradores que ajam de forma concertada; de fato, essa expectativa foi um dos motivos mesmos da criação da agência. O que os administradores do New Deal celebravam como uma virtude – a combinação de funções – é agora freqüentemente apontado como vício, exatamente por causa dos problemas que deram origem à distribuição original dos poderes nacionais. O segundo problema é que os atores das agências não são responsabilizáveis mediante eleições e freqüentemente não são responsivos perante o público em geral. Por causa da ausência das salvaguardas eleitorais, as agências são especialmente suscetíveis à pressão das facções e freqüentemente são mais passíveis de agir de acordo com seus próprios interesses. [N109] A concepção da administração do New Deal comemorava o abandono dessas preocupações tradicionais. Certamente o repúdio ao sistema de separação dos poderes e de freios e contrapesos era uma caracterísitca central da reforma promovida pelo New Deal. Ao criar um novo conjunto de agentes administrativos autônomos, os criadores do New Deal tentaram evitar os tribunais do common law e, eventualmente, o processo legislativo, que pareciam ter se tornado presas do controle das facções. [N110] Entretanto, ao se afastar das garantias tradicionais, os reformadores aumentaram a probabilidade de ocorrência dos abusos para os quais que o sistema tradicional foi pensado para conter. A reação inicial dos tribunais a esses tipos de ataque era previsível: eles anularam as leis que criavam as agências declarando-as inconstitucionais, com base nos artigos I, II e III, assim como na cláusula do devido processo. O exemplo mais familiar é o caso Schechter Poultry Corp. v. United States, [N111], no qual a Suprema Corte anulou o National Industrial Recovery Act, declarando-o uma delegação inconstitucional de poder legislativo para grupos Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 18 privados. [N112] O ataque constitucional terminou por se desintegrar [N113] devido ao prolongado e persistente apoio popular à administração reguladora. Tomado como um todo, o processo alterou o sistema constitucional de uma maneira tão profunda que algo semelhante a uma emenda constitucional parecia ter ocorrido. [N114] Depois de superado o desafio constitucional, a disputa entre os defensores e os críticos da administração do New Deal ressurgiu no debate sobre o APA. Durante esse debate, os críticos progressistas do common law buscavam a autonomia administrativa, enquanto seus oponentes invocavam as concepções de liberdade privada e de freios e contrapesos pré-New Deal, defendendo a criação de restrições severas às agências administrativas. [N115] O conflitou levou a um compromisso factível mediante o qual amplas delegações de poder foram toleradas na medida em que foram acompanhadas de garantias procedimentais abrangentes. Essas garantias traziam para o processo administrativo alguns das armadilhas do processo judicial, [N116] criavam um separação de poderes interna às agências, [N117] e permitiam aos regulados uma variedade de formas de contestar as decisões amdinistrativas. [N118] Focado nos direitos dos regulados, o APA era anacrônico à luz do ataque do New Deal à ordem privada do sistema do common law. [N119] Mais recentemente, o APA parece cada vez mais inadequado à luz das mudanças nos processos amdinistrativos e das novas concepções sobre as “falhas” das agências. O problema das facções, por exemplo, teve um papel central no direito administrativo nas últimas duas décadas. [N120] A ausência tanto de uma verdadeiro insulamento quanto de salvaguardas eleitorais tornou os administradores suscetíveis à influência de grupos privados bem organizados. Episódios de “captura” das agências são comuns na literatura, embora o fenômeno seja complexo. A preocupação mais importante reside na produção de normas por grupos privados – o análogo funcional do National recovery Act tal qual construído e invalidado no caso Schechter Poultry. [N122] Embora o poder dos grupos bem organizados seja freqüentemente atribuído à ausência de salvaguardas constitucionais ordinárias – inclusive controles pelos três ramos do governo –, as fontes exatas e a natureza do fenômeno da “captura” são objeto de grande discussão. Para alguns observadores, enquanto a energia dos grupos que demandam a regulação se dissipe ao longo do processo de implementação, os membros bem organizados do setor regulado continuam aptos para exercer sua influência. [N123] Nessa perspectiva, há uma série previsível de fases nas quais as agências tornam-se cada vez menos dedicadas à sua missão original. [N124] Outros sustentam que o Congresso tem a intenção de que a regulação seja “capturada” [N125] e que, por essa razão, o problema não é tão importante quanto poderia parecer. [N126] Alguns comentadores sugerem que as agências independentes estão particularmente sujeitas à influência dos regulados porque elas são imunes ao controle presidencial pleno. [N127] Outros ainda sustentam que a captura ocorre porque as agências recebem a maior parte de sua informação dos setores regulados. [N128] Qualquer que seja a dimensão do problema do facciosismo e qualquer que seja a sua Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 19 definição, [N129] ele pode se manifestar na forma de regulação excessiva ou de muito pouca regulação. Um objetivo central do direito admnistrativo tem sido o de restringir o poder dos grupos privados bem organizados sobre as agências, e muito do desejo de limitar a autonomia das agências é um resultado daquela preocupação. A autonomia das agências, em suma, tem servido não como uma garantia da administração neutra, mas como uma fonte de vulnerabilidade para as pressões de grupos bem organizados. O controle por parte dos três ramos constitucionais do governo é um corretivo promissor. O problema da representação de interesses particularistas é também uma fonte freqüente de preocupação com a administração autônoma. [n130] O temor é de que os administradores tentem promover seus próprios interesses às custas dos interesses do público. Alguns observadores sustentaram que os administradores tentam mais que tudo ampliar seus próprios poderes, freqüentemente produzindo regulação excessiva ou equivocada. [n131] Essa preocupação se avolumou consideravelmente porque as agências não são sujeitas nem à disciplina do mercado nem ao processo eleitoral. Além disso, a ausência do sistema de freios e contrapesos agrava o problema. O processo administrativo também sofre de problemas de ineficiência, uma preocupação trazida pelo esforço constitucional original de criar um executivo unitário. Freqüentemente, a burocracia não consegue agir com a devida celeridade. [n132] Muitas agências têm tarefas que se sobrepõem ou que são inconsistentes. Sem um controle unitário, é difícil coordenar as decisões da agência ou redirecionar as políticas nacionais. Ataques ao caráter ad hoc da política regulatória nacional [n133] e os recentes desafios à noção de agências “independentes” suscitaram essa preocupação. [n134] Os ideais do governo limitado e da estabilidade, originalmente de grande importância para a distribuição dos poderes nacionais, oferecem uma última e convincente justificativa para um retorno ao marco constitucional original. As razões são ao mesmo tempo práticas e conceituais. O problema práticoé que, desde o New Deal, nem o governo limitado nem a estabilidade podem ser considerados virtudes absolutas. Em muitas áreas, a intervenção governamental substancial é necessária. Se limitações estruturais rígidas tornam mais difícil a ação governamental, problemas sociais importantes podem restar sem solução. Além disso, mudanças rápidas são às vezes necessárias para resolver problemas sociais, particularmente em áreas como regulação do meio ambiente e telecomunicações, nas quais a teconologia está em constante evolução. Por essas razões, alguns observadores têm criticado o sistema de freios e contrapesos por ele dificultar a ação do governo. Essas críticas são exageradas, porém, porque, como veremos, o sistema de freios e contrapesos não precisa levar necessariamente ao imobilismo. A maior dificuldade para o argumento que sustenta a volta ao ideal orginal de governo limitado é conceitual. O ideal, em sua acepção tradicional, é mais difícil de se justificar na trilha do declínio da concepção da era Lochner da relação entre o cidadão e o Estado. [n135] Agora é claro que o próprio common law é um sistema regulatório, que incorpora uma série de escolhas sociais controversas. [n136] A ordem do sistema do common law parece “limitada” somente porque o regime regulatório parece natural e até mesmo invisível para Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 20 aqueles a ele acostumados. De forma mais geral, concepções tradicionais de ação e inércia governamental repousam sobre premissas controversas; elas dependem de balizas sobre as funções ordinárias e desejáveis do governo que deveriam se submeter ao debate público. [n137] Mais que isso, a inércia governamental, ainda que entendida como tal, pode ser ela própria um resultado do poder das facções. [n138] As queixas contra a captura das agências refletem essa questão; as leis podem ser neutralizadas pela inércia e a desregulação, igualmente, pela execução rigorosa das mesmas leis. Em suma, embora a administração moderna seja às vezes disfuncional, ela não deveria ser entendida como a imposição do governo a um sistema de ordem privada pura. O “governo limitado” tal qual expressado no common law é ele próprio um sistema de regulação e controle. Em qualquer situação, muitos das preocupações subjacentes à distribuição original dos poderes nacionais exerceram um papel fundamental nas avaliações modernas do desempenho da administração. Essas preocupações levaram a um forte declínio da fé na agência do New Deal, insulada em relação à supervisão do Legislativo, do Executivo e do Judiciário. Esse declínio da fé no ideário institucional do New Deal é totalmente justificado. [n139] O ataque que o New Deal promoveu ao sistema de freios e contrapesos não era um componente obrigatório de seu marco institucional e foi um grande erro. Um papel agressivo para cada um dos ramos constitucionais do governo – ou mesmo uma forma de freios e contrapesos – pode promover os objetivos do New Deal que ainda são atualmente sustentados. A tarefa atual é desenvolver os arranjos e estruturas institucionais que poderão concretizar, na era do Estado administrativo, alguns dos propósitos constitucionais originais; esta não é uma ambição pequena, à luz da rejeição à noção tradicional de “governo limitado” à qual a distribuição original de poderes estava intimamente associada. III. O Sistema de freios e contrapesos após o New Deal A. Supervisão presidencial 1. A justificativa teórica para o controle pelo Executivo – os argumentos favoráveis ao controle presidencial da burocracia derivam das preocupações constitucionais tradicionais e de recentes problemas no processo regulatório. Particularmente três fatores são de especial importância na defesa do Executivo unitário. Em primeiro lugar, o presidente é responsabilizável perante o eleitorado. A visibilidade do presidente garante um grau de responsividade; decisões presidenciais são sujeitas ao escrutínio público de modo singular. O presidente também tem uma base eleitoral nacional, o que o preserva de pressões paroquiais a que se sujeitam as agências e torna mais fácil para o presidente evitar os perigos da respresentação de interesses particularistas e da tirania das facções. O papel de supervisão do presidente deveria portanto aumentar a probabilidade de que as decisões discricionárias das agências administrativas correspondam às necessidades do público. Em segundo lugar, o presidente encontra-se numa posição incomum para centralizar e Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 21 coordenar o processo regulatório. Ele é o único agente público nacional incumbido da aplicação de uma vasta legislação. Essa posição é especialmente importante à luz da proliferação de agências com responsabilidades que se sobrepõem. A posição institucional do presidente é útil para a coordenação do amplo – e às vezes inconsistente -- conjunto legislativo do Estado regulador moderno. [n140] Por exemplo, mais de uma dúzia de agências são responsáveis pela política energética federal. Por último, o presidente tem a capacidade não somente de coordenar, mas também de energizar e direcionar a política regulatória de uma forma que seria difícil ou impossível de se fazer caso aquela política fosse determinada individualmente pelos funcionários das agências. Essa habilidade é especialmente importante no início de uma mandato presidencial e quando há um consenso nacional no sentido de mudar o rumo da política regulatória. O controle pelo presidente tende a funcionar contra os efeitos danosos de freios e contrapesos intra-Executivo, permitindo ao governo responder às mudanças da opinião pública e diminuindo a probabilidade de que a política se torne rotinizada e fortemente burocratizada. O fato de o presidente indicar funcionários das agências poderia por si só amenizar alguns dos riscos associados à burocracia descentralizada. Entretanto, os dirigentes das agências estão sujeitos a distintas pressões de seus staffs e dos regulados, e a supervisão presidencial pode oferecer um controle eficaz contra essas pressões. [n141] Em resposta a essas preocupações, alguns presidentes recentemente aumentaram firmemente seu controle sobre a burocracia, em proporções que foram altamente controversas. [n142] No período do New Deal, o Comitê Brownlow, indicado pelo presidente Roosevelt, invocou os propósitos constitucionais originais para fundamentar a centralização presidencial. [n143] O Comitê recomendou uma série de mudanças institucionais para aumentar o poder presidencial. Comissões organizadas pelos presidentes Truman e Johnson chegaram a conclusões similares. [n144] Mais recentemente, os presidentes Nixon, Ford e Carter editaram decretos∗ pensados para garantir a direção centralizada da regulação. [n145] O presidente Reagan tomou os passos mais dramáticos nos Executive Orders 12291 [n146] e 12498, [n147] que aumentam substancialmente a supervisão presidencial da burocracia. As iniciativas de Reagan concentraram a competência relevante no Office of Management and Budget (OMB). [n148] O Executive Order 12291 autoriza o OMB a rever e comentar regulamentos propostos pelas agências executivas, testando os regulamentos para verificar sua correspondência a princípios de análise de custo-benefício e custo-efetividade. [n149] O Executive Order 12498 dá um passo adiante, exigindo que as agências submetam à aprovação do OMB um “plano regulatório anual” que traça as ações propostas para o ano seguinte. [n150] Essas medidas trouxeram para o processo regulatório um sistema de revisão semelhante àquele usado na elaboração do orçamentonacional. Em ambos os sistemas, o presidente confere ao OMB poder de coordenar e centralizar as competências do ramo executivo. Tal centralização e coordenação garante que uma instituição com uma visão da totalidade do ∗ N.T.: no original, “orders”. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 22 processo regulatório faça a gestão da política. Em ambos os casos, porém, o Congresso retém o poder de criar o direito em último caso. Assim como o Executivo não tem competência para se recusar a gastar recursos destinados a finalidades específicas, [n151] o presidente não pode se eximir da execução das leis de que ele discorda, nem pode executar leis somente da forma que desejar. [n152] Portanto, tanto as agências como o OMB estão sujeitos às limitações estabelecidas em lei. Em alguma medida, o OMB tem tentado executar as tarefas que os tribunais desenvolvem ao seguir um padrão de controle judicial nos termos da hard look doctrine. [n153] O OMB tem, entretanto, algumas vantagens potenciais em relação ao Judiciário, na sua capacidade de centralizar e coordenar o processo administrativo, seu maior poder de iniciativa, sua responsabilização política e sua capacidade de reunir um corpo de funcionários especializados em determinada matéria. Um dos objetivos do processo de revisão é dar certeza de que a agência levou em consideração todos os fatores relevantes e os ponderou de forma racional. Um outro objetivo é diminuir os riscos do poder das facções e da representação de interesses particularistas – riscos em relação aos quais administradores nas agências tendem a ser vulneráveis. [n154] A posição do OMB com um coordenador geral da política regulatória lhe traz uma vantagem comparativa para resistir a pressões de grupos bem organizados que buscam regulação de mais ou de menos. Além disso, a própria possibilidade de revisão provavelmente teve um importante efeito nas decisões das agências. É razoável supor que a revisão do OMB efetivamente evita propostas descuidadas ou impróprias. Nesses aspectos, a revisão pelo OMB poderia bem servir tanto aos objetivos tecnocráticos quanto aos democráticos. A ênfase na análise de custo-benefício é pensada para disciplinar as decisões das agências – levar a “análise de políticas” a incorporar e garantir que as vantagens e desvantagens das propostas de ação sejam levadas em consideração. [n155] À luz das expectativas do New Deal em relação à especialização técnica das agências, é irônico que o controle presidencial da burocracia por meio da revisão pelo OMB possa justificar, ao invés de ameaçar, o ideal de governo tecnocrático do New Deal. Mais que isso, a concepção subjacente aos recentes decretos do Executivo, pelo menos em parte, é a de que a administração paroquial compromete o interesse público de longo prazo na produtividade e uma economia competitiva, e que os saberes técnicos associados ao OMB podem promover aquele interesse público. O processo no OMB também atende aos propósitos originais dos fundadores ao criar um Executivo unitário. Ao mesmo tempo, o controle pelo OMB garante que as visões daqueles próximos ao presidente informem os juízos de valor e que as posições do presidente sobre a regulação permaneçam portanto à frente do processo regulatório. Nesse aspecto, as iniciativas tentam justificar um modelo político de administração completamente distinto das concepções do New Deal. O aumento do controle presidencial portanto cria uma confusão, ao endossar e ao mesmo tempo rejeitar a perspectiva tecnocrática da administração. A revisão pelo OMB deveria ser entendida como uma tentativa de unir duas aspirações fundamentais, embora aparentemente antagônicas, do New Deal – a especialização técnica e a responsabilização política. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 23 As preocupações institucionais e materiais dos recentes decretos presidenciais deveriam ser claramente distinguidas. A posição substantiva consiste em grande parte no ceticismo em relação à regulação econômica e social. [n156] Não pode haver dúvida de que um objetivo principal e o efeito da revisão pelo OMB na administração Reagan é reduzir a intervenção regulatória. [n157] Nesse aspecto, o OMB assumiu algumas das tarefas associadas aos juízes anti-regulação dos anos trinta e quarenta – uma extraordinária ironia à luz dos posicionamentos bem distintos da presidência e do Judiciário durante aquele período. A posição institucional incorpora uma preferência pelo controle político da burocracia, uma posição que poderia coexistir com uma atitude mais hospitaleira em relação à regulação. 2. O controle pelo Executivo na prática – As considerações acima consubstanciam uma forte justificativa teórica para o controle da burocracia pelo presidente. No entanto, os críticos têm atacado o papel do OMB com base numa série de argumentos práticos e teóricos. Alguns se queixam de que o OMB desmontará os esquemas regulatórios aprovados pelo Congresso [n158] e que os funcionários do OMB são incompetentes para tomar decisões regulatórias – uma grande ameaça às justificativas fundamentais para a administração autônoma [n159] O segredo e o insulamento da revisão do OMB podem exarcerbar o problema, prejudicando tanto a especialização técnica quanto a responsabilização política. Uma outra preocupação é a de que à luz da atual hostilidade do presidente em relação à regulação, um papel maior para o OMB pode significar um retrocesso nos programas sociais. Além disso, o OMB pode ser indevidamente suscetível à influência de grupos privados bem organizados. No fundo, os críticos alertam – num retorno parcial à concepção de administração do New Deal – que o controle pelo OMB politiza um sistema que deveria envolver primariamente a aplicação do direito e de saberes técnicos. [n160] Essas críticas invocam as concepções madisonianas da política, também associadas ao New Deal, que vêem o insulamento como uma salvaguarda contra o poder das facções. De acordo com essa visão, o controle pelo OMB ameaça solapar a crença republicana tradicional na democracia deliberativa. Em complementação a essas preocupações sobre a justificativa teórica para o controle presidencial, muitos observadores têm criticado o desempenho efetivo do OMB. Há evidências de que a interação do OMB com grupos privados politicamente poderosos afetou sua atuação. [n161] O OMB pode também ter sido afetado pelo ardor anti-regulatório. [n162] A revisão pelo OMB tem provocado um atraso considerável no processo regulatório. [n163] Um outro risco é o de que o OMB encerre os procedimentos normativos num estágio anterior ao previsto para evitar o escrutínio público de sua intervenção. Além disso, a posição do OMB como guardião das despesas e a carência de especialização técnica de seu pessoal sugerem que o OMB pode não implementar os programas legais de forma plena ou efetiva. O programa regulatório também revela que o OMB tem controlado substancialmente o processo regulatório, às vezes efetivamente atropelando a autoridade das agências na tomada da decisão final. Muitas regras foram alteradas pelo OMB, ou mesmo revogadas ou devolvidas às agências para reconsideração. Em 1985, o OMB considerou que somente 70,7% das regras editadas pelas agências por ele revistas eram compatíveis com o Executive Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 24 Order 12291. [n164] Ele requisitou alterações em 23,1% dos casos. [n165] As próprias agências revogaram mais de 3% dasregras. [n166] O fato de que regras são freqüentemente desenvolvidas durante um processo de negociação e discussão com o OMB sugere que ele algumas vezes assumiu o poder de decisão final – um papel que em muitos casos é ilegal. [n167] Aqueles que criticam o processo de revisão como indevidamente contrário à regulação e talvez até mesmo ilegal sugerem que o presidente deveria considerar a opção de transferir esse poder de supervisão do OMB para uma outra instituição, ainda que sob controle presidencial direto. Um sistema como esse poderia reduzir um possível viés -- que deriva da posição particular do OMB como guardião das despesas – e assegurar algumas das vantagens associadas à direção centralizada pelo Executivo. Mais que isso, um sistema como esse se combinaria confortavelmente com a recomendação, referida acima, de que a instituição incumbida da supervisão deveria entender sua missão de forma mais ampla, abrangendo não simplesmente vetar ou diminuir a quantidade de regulamentos, mas também o papel de criar e dar suporte a regras regulatórias. [n168] De qualquer modo, nenhum dos problemas da revisão pelo OMB é motivo suficiente para rejeitar a idéia geral de supervisão presidencial da burocracia. [n169] Um sistema de controle pelo Executivo golpeia o próprio equilíbrio entre dois objetivos da administração – insulamento em relação a pressões partidárias e responsividade em relação às preferências eleitorais. O controle pelo Executivo não sacrifica o objetivo madisoniano de democracia deliberativa. Insulamento de menos ou em demasia ameaça solapar o aracabouço madisoniano. Como um órgão de coordenação como o OMB não está sujeito às pressões concentradas que grupos privados impõem às agências, o controle pelo OMB provavelmente reduz, ao invés de aumentar, a possibilidade de facciosismo. Tal supervisão, mais do que isso, provavelmente diminuiria, ao invés de aumentar, a ocorrência de violações à legislação. O controle pelo OMB pode muito bem contrapor-se à arbitrariedade ou a violações legais cometidas por agências. Na medida em que esses regulamentos que emergem do processo do OMB não seguem determinações legais, essa incompatibilidade é sujeita ao controle judicial. [n170] E embora os problemas de implementação do OMB sejam reveladores, não ocorreram grandes escândalos. Aqueles problemas que ocorreram deveriam ser suscetíveis de controle mediante a garantia, por controles internos [n171] e externos [n172], de que os funcionários do OMB estejam conscientes dos limites de seu papel. Alguns controles já estão disponíveis. [n173] Quanto ao problema do sigilo, o OMB tem adotado medidas para assegurar a abertura (disclosure) das análises de impacto regulatório e também tem dado publicidade aos resultados de suas próprias revisões. Em qualquer circunstância, os processos deliberativos dentro de determinada agência, ou entre agências, não precisam geralmente ser tornados públicos. Algum grau de sigilo no processo de revisão é justificado por preocupações legítimas, principalmente a necessidade de garantir abertura (openness) e imparcialidade durante o processo deliberativo. [n174] Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 25 Isso não é para sustentar que mais abertura seria indesejável. Em particular, o OMB deveria tornar disponível para o Congresso e para o público a maior parte dos detalhes do seu processo de revisão após a edição da norma. [n175] Ele deveria também impor controles mais severos sobre os contatos ex parte com grupos privados, inclusive a divulgação (disclosure) de todas as comunicações relevantes que ocorrem por fora do processo de produção das normas. [n176] Exigências como essas melhorariam de forma significativa o atual sistema. Qualquer que seja o objetivo, aperfeiçoar o processo decisório tecnocrático ou promover a responsabilização, muito se pode ganhar com alguma forma de variação do processo centralizado introduzido pelos recentes decretos presidenciais. Decisões regulatórias envolvem necessariamente juízos de valor, e essas decisões deveriam ser monitoradas por funcionários próximos ao presidente. A supervisão pelo Executivo deveria ter o salutar efeito de aumentar a autoridade dos dirigentes das agências sobre funcionários subordinados, ao trazer à luz mais cedo as questões tratadas, permitindo assim aos dirigentes participar antes que as posições tenham se consumado pelas decisões do staff. Com as devidas garantias, discutidas abaixo, o controle pelo executivo deveria diminuir o risco da política facciosa e promover decisões que tendem a convergir com a vontade do público. [n177] Algumas vantagens potenciais da coordenação das agências pelo Executivo são sugeridas pelos benefícios que têm acompanhado a coordenação do orçamento por aquele poder. Poucos defenderiam o retorno a um sistema no qual cada agência submetia seu orçamento ao Congresso sem a coordenação presidencial. Considerações similares confirmam a aprovação das atuais iniciativas e sugerem que elas também deveriam ser aplicadas às agências “independentes”. [n178] As limitações ao papel do OMB derivam da justificativa para a supervisão pelo Executivo. O objetivo do controle é estabelecer o arcabouço básico no qual as decisões são tomadas. Uma tal supervisão é menos adequada quando a decisão é predominantemente legalista. Em contraposição, questões amplas de políticas públicas – por exemplo, aquelas ligadas à política do Occupational Safety and Health Administration (OSHA) para os carcinógenos [n179] – exigem um grau significativo de participação do OMB. Uma decisão tecnocrática é um caso intermediário. A determinação dos meios apropriados para o atingimento de fins consensuais deveria incluir a participação do OMB de modo a promover os valores tecnocráticos e diminuir o risco de facciosismo. E o que é mais simportante, o OMB deveria evitar intervenções ad hoc ou do tipo “one-shot”. É em casos desse tipo que considerações políticas na forma da política facciosa podem mais provavelmente contaminar o processo regulatório. [n180] É também em tais casos que a falta de sofisticação técnica do OMB é mais problemática. [n181] Mais que isso, o controle pelo OMB não deve atropelar o papel da agência como a última autoridade incumbida da decisão – um limite expressamente reconhecido (ainda que não seguido na prática) em ambos os decretos presidenciais. [n182] O Congresso tem competência constitucional para exigir que a agência tome a decisão; [n183] mais que isso, a necessidade de alguma especialização e insulamento justifica a decisão de conferir às agências a competência em última instância. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 26 Além disso, o foco na produtividade econômica e na análise de custo-benefício deve ser moderado pelo reconhecimento de que alguns esquemas regulatórios visam a redistribuir recursos ou a reconhecer e estimular valores estranhos à lógica do mercado. [n184] Sistemas regulatórios que têm outros objetivos além da eficiência econômica incluem a regulação da telecomunicações, a seguridade social, leis antidiscriminatórias e algumas medidas ambientais. Finalmente, uma preocupação séria sobre a revisão da regulação é que ela tem em algumas circunstâncias levado a um movimento indevidamente amplo e agressivo em relação à desregulação mediante abdicação do Executivo. [n186] – um resultado nem desejável nem inevitável. Apesar disso, a estrutura institucional do controle pelo presidente é desejável – por razões de responsabilização – totalmente à parte dos resultados substantivos que ele produz. O crescimento do controle presidencial tranformouprofundamente a agência do New Deal. A autonomia administrativa foi substancialmente restringida por causa dos riscos da descentralização, da execução descoordenada e da falta de responsabilização. Na administração Reagan, a supervisão pelo presidente foi também associada com o ceticismo sobre aspectos substantivos do programa do New Deal. Embora a supervisão tenha sido sem dúvida buscada por interesses que se opunham à regulação, temerosos de que a autonomia das agências ajudaria a reforçá-la, [n187] não há uma conexão necessária entre uma posição política anti-regulatória e a defesa do controle pelo Executivo. Numa outra administração, a centralização no Executivo poderia ter o efeito oposto. Qualquer que seja a posição em relação à regulação em distintos cenários, um controle presidencial maior da burocracia é uma resposta promissora aos riscos criados pelo tipo de agência criada pelo New Deal. B. Controle Judicial Até aqui, argumentei que o controle presidencial da burocracia pode funcionar como um remédio parcial para alguns dos problemas introduzidos no sistema de tripartição dos poderes pelo crescimento das agências administrativas. Um papel maior para o Executivo não elimina, porém, a necessidade de outros controles sobre o processo regulatório. Durante o último quarto de século, a Justiça Federal também atuou como um importante controle sobre as agências administrativas. A atuação judicial manifestou-se de forma mais proeminente no desenvolvimento da “hard-look doctrine”. [n188] À medida em que a doutrina evoluiu, os juízes primeiro exigiam que as agências tomassem para si a responsabilidade de acompanhar atentamente as vantagens e desvantagens das estratégias regulatórias questionadas. Posteriormente, o próprio Judiciário assumiu essa responsabilidade. A “hard-look doctrine” assumiu duas formas primárias. Primeiramente, o Judiciário limitou as iniciativas regulatórias, [n189] às vezes exigindo das agências que demonstrassem que as vantagens da regulação justificavam as desvantagens. [n190] Em tais casos, a racionalidade tecnocrática por parte do Judiciário funcionava como um controle sobre a intervenção Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 27 regulatória [n191] semelhante àquelas criadas pelos recentes decretos presidenciais. Em alguns aspectos, essa atuação do Judiciário confirmou o temor do New Deal em relação a limitações da regulação por juízes interessados na manutenção da tradicional ordem do mercado. De outro ângulo, porém, a atuação pode ser vista como uma peculiar inversão daquele temor, porque o controle judicial agressivo às vezes foi necessário para afirmar os objetivos tecnocráticos associados ao próprio New Deal. Em segundo lugar, os tribunais têm se baseado na hard look doctrine para invalidar ou devolver para a agência para reconsideração medidas regulatórias que não atendiam aos objetivos da lei que tratava da respectiva matéria. [n192] O Judiicário tem intervindo em parte por causa de seu receio de que as leis estivessem sendo implementadas de forma inadequada. Em tais casos, a necessidade de justificar os objetivos legais contra um Executivo relutante ou voltado para interesses justifica uma atuação judicial. É irônico que a supervisão judicial cuidadosa da ação das agências, rejeitada pelos defensores originais da regulação e defendida quase exclusivamente por seus oponentes, é agora invocada por aqueles que buscam uma ação regulatória para levar adiante objetivos do New Deal. O APA, que trata do controle judicial das agências, estabele duas funções primárias para o Judiciário. Em primeiro lugar, ele deve garantir a fidelidade ao direito positivo. [n193] Em segundo, ele deve invalidar decisões que sejam “arbitrárias” ou caprichosas. [n194] A hard- look doctrine tem sido um esforço para implementar essas exigências básicas do APA. 1. Controlando a conformidade ao direito – A exigência básica de que as agências se atenham à lei e a execução judicial dessa exigência são incontroversos. A questão central é se e quando a deferência a uma interpretação administrativa da lei é compatível com o princípio segundo o qual cabe ao Judiciário “dizer o que o direito é”. [n195] Os casos criaram uma confusão a respeito dessa questão. Algumas vezes os juízes objetivavam aceitar uma interpretação administrativa a menos que ela estivesse totalmente errada ou seja de forma muito direta incompatível com um juízo específico do Congresso sobre o ponto em questão. [n196] Essa posição é um resultado direto da perspectiva do New Deal, que favorecia a autonomia da agência e que via no Judiicário um obstáculo à implementação da lei. [n197] Ao mesmo tempo, os juízes freqüentemente abordam questões de direito sem deferência para as interpretações das agências, [n198] apontando para a ausência de competência técnica da administração em questões jurídicas. [n199] Essa abordagem algumas vezes foi associada à hostilidade em relação à regulação. [n 200] Mais recentemente, entretanto, os juízes passaram a realizar uma investigação judicial independente das questões de direito para garantir a implementação dos programas regulatórios, um desenvolvimento paralelo ao crescimento do controle das decisões das agências com base na hard-look doctrine. Subjacente a cada uma dessas tendências encontra-se a visão de que a autonomia da agência ameaça solapar os objetivos da legislação. Num recente e importante distanciamento dessa perspectiva das questões de direito, entretanto, a Suprema Corte confirmou uma regra de deferência para interpretações do direito Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 28 feitas por uma agência. Em Chevron USA, Inc. v. National Resources Defense Council, Inc., [N201] o Tribunal decidiu que, a menos que o Congresso tenha “tratado diretamente da questão analisada”, os juízes devem dar deferência à “construção que o Executivo fez da legislação que ele é incumbido de aplicar”. [n202] O Tribunal justificou sua decisão em parte destacando a supervisão presidencial sobre as agências e o fato de o Presidente, ao contrário dos juízes, ser responsabilizável perante o eleitorado. [n203] Essa concepção é um retorno parcial às concepções do New Deal sobre a relação entre as agências e o Judiciário. Freqüentemente o Congresso delega poder discricionário para uma agência administrativa porque não tem tido condições de tratar da respectiva matéria; mesmo quando o Congresso tenha tratado do assunto, a lei pode ser ambígua. Se, como parecer sugerir Chevron, os juízes devem aceitar amplamente as interpretações da Administração Pública, haverá pouco ou nenhum controle da discricionariedade do Executivo na interpretação da lei. Combinado com o recente crescimento do controle presidencial, Chevron parece conferir consideráveis poderes de interpretação da lei para o Presidente. [n204] O significado de Chevron, porém, não é inteiramente claro. Chevron reconhece que não se deve dar deferência quando o Congresso tratou da matéria de forma direta, e talvez o Tribunal definirá essa categoria de forma ampla. Se for assim, os juízes abordarão freqüentemente questões de direito de forma independente. Se Chevron requer deferência sempre que haja ambigüidade, porém, o caso poderia ter um grande impacto. [n205] Essa abordagem pró-deferência seria inaceitável por uma série de razões. Em primeiro lugar, ela é muito genérica e indiferenciada. A justificativa para a deferência a decisões de uma agência depende da vontade do Congresso, que em casos ambíguos é resonstruída com base em vários fatores, inclusive a especialização técnica da agência, suarelativa responsabilização política e sua habilidade de centralizar e coordenar a política administrativa. Porque esses fatores têm força distinta em diferentes contextos, o grau adequado de deferência não pode ser definido por uma regra geral. A extensão da deferência deveria depender da natureza da matéria e, acima de tudo, da aplicabilidade das capacidades administrativas especiais. Essas capacidades são mais favoráveis à deferência quando a matéria envolve questões de fato e de política pública – uma questão “mista” – e quando a solução depende portanto de considerações extra-jurídicas. A deferência é muito menos adequada quando a matéria é exclusivamente de direito. [n206] Chevron falha ao não fazer essas distinções. Em segundo lugar, Chevron falha por não distinguir, de um lado, as ambigüidades e, de outro, delegações legislativas do poder de interpretar o direito para as agências. A Chevron Court argumentou que quando o texto da lei não é suficiente para resolver uma questão, deve-se entender que o Congresso delegou essa resolução para a agência. [n207] Entretanto, ambigüidades nem sempre são delegações. O fato de uma lei poder ser lida de diversas formas não significa que o Congresso teve a intenção de que a agência resolvesse a questão. Embora a regra de deferência de Chevron seja adequada quando o Congresso propositadamente deixou uma lacuna para ser preenchida pela agência, uma regra distinta Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 29 deveria ser aplicada quando se trata apenas de ambigüidade. [n208] Em tais casos, uma investigação judicial independente é necessária para controlar a interpretação que a agência deu à lei. Em terceiro lugar, Chevron sugere que os agentes da Administração Pública deveria decidir o objetivo de sua própria competência. Essa noção contradiz claramente os princípios que derivam da separação dos poderes tal qual ela é concebida desde Marbury v. Madison [n209] e o artigo 78 de Os Federalistas. [n210] A justificativa para o controle judicial depende em parte da idéia de que raposas não devem tomar conta do galinheiro – uma imposição diante da qual Chevron parece ser indiferente. Seria muito estranho argumentar que a interpretação que o Congresso ou os estados fazem da Constituição deveria ser aceita sempre que o texto constitucional fosse ambíguo; tal concepção destruiria o direito constitucional existente. Aqueles limitados por uma regra não deveriam determinar a natureza dessa limitação. A relação entre a Constituição e o Congresso é análoga à relação entre as leis e as agências. [n211] Em ambos os contextos, um árbitro independente é necessário para determinar a natureza da limitação. [n212] Esse princípio assume especial importância à luz do estranho status constitucional da agência administrativa. Sem as salvaguardas eleitorais ordinárias nem os tradicionais freios e contrapesos, os riscos de facciosismo e de representação de interesses particularistas aumentam. Uma participação firme do Judiciário na interpretação das leis é portanto desejável, especialmente quando o interesse individualista da agência está em questão. Considere-se, por exemplo, uma decisão de uma agência que, alegando estar interpretando uma lei, trata da possibilidade ou necessidade -- ou não -- de controle de suas próprias decisões, de procedimentos detalhados, ou da imposição, pela própria agência, de multas que em última instância aproveitarão a ela própria. Em casos nos quais o interesse próprio da agência é tão evidente, é duvidoso que a regra do Chevron deva ser aplicada. [n213] Entretanto, o potencial de decisões interessadas alcança a mioria dos casos nos quais uma agência está decidindo sobre suas competências legais. Em quarto lugar, Chevron não reflete com precisão a vontade do legislador, que o próprio Tribunal sugere ser crítica da regra da deferência. [n214] o APA – a principal lei que trata do controle judicial e, portanto, do próprio caso Chevron – surgiu num período de grande desconfiança na atividade das agências. [n215] À medida em que há indicações da opinião do Congresso no passado recente, elas sugerem que o Congresso favorece uma atuação relativamente agressiva do Judiciário. [n216] À luz dessas intenções, a regra adequada é a da ampla e independente interpretação judicial das leis, com o grau de deferência aumentando à medida em que a matéria se torna mais técnica ou envolve questões de política pública. Finalmente, a abordagem a la Chevron é baseada numa concepção errada do processo de interpretação das leis. O Congresso raramente trata de questões específicas de forma direta, mas essa omissão não elimina todos os constrangimentos para a Administração Pública. Ao invés disso, as leis estipulam princípios que orientam e disciplinam a discricionariedade Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 30 administrativa mesmo em casos inesperados. [n217] A questão não é se o congresso tratou diretamente da matéria específica, mas se a lei exige ou veda a ação administrativa em questão. Por essas razões, Chevron deveria ser interpretado de forma estrita, como seu contexto sugere: o caso involve uma lei altamente complexa numa área técnica, e uma iniciativa razoável que tentava conciliar uma série de políticas, todas elas permitidas pela lei. [n218] Uma recente decisão da Suprema Corte que discutia o caso Chevron enfatizou exatamente essas considerações e descreveu o caso como envolvendo uma aplicação do direito aos fatos, e não uma aprovação genérica da deferência a interpretações do direito pela agência. [n219] Visto assim, Chevron afirma que a deferência a interpretações do direito pelas agências é adequada quando as capacidades institucionais peculiares da agência são demandadas. [n220] O caso não deveria ser tratado como um abandono dramático da recente tendência geral de aumento do controle judicial independente da interpretação do direito pelas agências. 2. Controle da Arbitrariedade – O APA exige que o Judiciário examine não somente se o ato de uma agência é conforme à lei, mas também se ele é “arbitrário, caprichoso, se abusa da discricionariedade ou se de qualquer outro modo não está de acordo com o direito.” [n221] Essa questão não pode ser respondida somente com base na lei. O Judiciário devem investigar o mérito da decisão da agência. Essa tarefa encontra-se de certa forma em tensão com a rejeição auto-consciente da criação judidical de direito que deu origem às agências no período do New Deal. A investigação sobre a arbitrariedade é melhor entendida como um meio de eliminar erros graves de análise e motivações não permitidas da atuação administrativa. Nesse contexto, a hard-look doctrine exige que as agências levem em consideração todos os fatores relavantes para a lei, para justificar o abandono de práticas passadas, para fornecer explicações detalhadas de suas decisões, para explicar a rejeição de alternativas, e para mostrar conexões entre objetivos legais e políticas regulatórias. [n222] A hard-look doctrine às vezes exige também uma atenção especial para o resultado final. [n223] Os tribunais aplicam a doutrina para um amplo leque de decisões, da mais tecnocrática até a mais política. Em todos os contextos, a principal justificativa para o exame judicial é o temor de que a agência subverta os objetivos da lei. A hard-look doctrine é associada com uma crença no poder da especialização técnica e do direito para ajudar na solução dos problemas regulatórios. Às vezes se pensa que a imersão nas informações técnicas pode fornecer resultados corretos ou pelo menos restringir consideravelmenteo rol de opções aceitáveis. O objetivo do controle judicial é assegurar que considerações ilegítimas, inclusive fatores legais irrelevantes, não tenham influenciado os resultados da agência. Em sua forma ideal, o controle judicial é pensado para atender tanto aos ideais tecnocráticos quanto aos políticos. Um exemplo útil da abordagem hard-look é o caso Motor Vehicle Manufacturers Association v. State Farm Mutual Automobile Insurance Co., [N224] que envolveu a Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 31 revogação pela administração Reagan de um regulamento sobre equipamentos de segurança em automóveis. O regulamento teria exigido a instalação de cintos de segurança automáticos ou airbags nos novos automóveis. A decisão da Suprema Corte de invalidar a revogação administrativa baseou-se em parte na falha da agência em considerar a opção de um regulamento que tratasse apenas de airbags, em contraposição àquele que dava aos fabricantes a faculdade de optar entre airbags e cintos de segurança automáticos. A rejeição de uma alternativa plausível sugeriu que a conclusão estava conduzindo a análise, e não o contrário. A divergência entre os Ministros da Suprema Corte sobre a rejeição da regra de segurança em automóveis é derivada das visões contrastantes sobre o papel próprio da política no processo regulatório. [n226] A maioria tratou a questão como se ela dissesse respeito simplesmente à aplicação de conhecimento técnico ao problema. [n227] Juízos de valor de uma administração hostil à regulação eram irrelevantes; os fatos por si mesmos impunham uma solução à qual qualquer administração, aplicando o critério legal correto, teria chegado. O juiz Rehnquist afirmou que a decisão era em última instância política, e que o Tribunal deveria respeitar a mudança na opinião pública que se refletia na mudança na administração. [n228] A abordagem da maioria, entretanto, deveria ser vista não como uma desconsideração ingênua do papel próprio da política, [n229], mas como um esforço de eliminar fatores ilegítimos ou desarticulados – talvez a intenção de auxíliar um setor automobilístico em dificuldades ou uma tendência geral anti-regulatória – e de garantir que esses fatores estejam identificados para discussão e comentários durante e após o processo normativo. Nesse aspecto, a hard-look doctrine poderia ser considerada um meio de limitar influências inadmissíveis no processo regulatório. Uma atuação agressiva do Judiciário portanto favorece a concepção de administração do New Deal. A hard-look doctrine, como forma de evitar a arbitrariedade, tem sido criticada por uma série de razões. Os críticos se queixam de que a exigência de explicação detalhada tem pouco efeito substantivo sobre as decisões de uma agência; [n230] que o controle judicial aumenta a demora e o risco de não-implementação; [n231] que os tribunais carecem de conhecimento técnico e de responsabilização para exercer um papel construtivo no processo administrativo; e que a hard-look doctrine ignora o desejável, e em muitos casos inevitável, papel motivador da “política” nas decisões de uma agência. [n232] Em última instância, o risco, às vezes verificado na prática, é o de que os resultados dependam da preferência dos juízes sobre políticas públicas, e não dos agentes públicos responsivos perante os eleitores. [n233] Muitas dessas preocupações têm algum fundamento, mas elas são insuficientes para justificar o abandono da hard-look doctrine. A exigência de explicação detalhada tem sido um poderoso instrumento para frear a arbitrariedade ou decisões inadequadamente motivadas das agências. [n234] Tal como o controle feito pelo OMB, o controle judicial é valioso acima de tudo para impedir decisões negligentes ou ilegítimas – um ponto enfatizado por Alexander Hamilton ao justificar a independência do Judiciário, totalmente Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 32 fora do contexto do direito constitucional. [n235] A falta de especialização técnica e de responsabilização do Judiciário é motivo para uma postura modesta, mas a hard-look doctrine, entendida de modo adequado, leva esses fatores em consideração. Juízes podem exigir e avaliar explicações detalhadas das decisões regulatórias sem substituir os juízos técnicos e políticos das agências pelos seus. Tem havido erros judiciais na aplicação efetiva da perspectiva hard-look, [n236] mas a doutrina não propiciou o abuso por parte do Judiciário. Devido ao desconfortável status constitucional da agência administrativa, algum grau de controle judicial é altamente desejável. O insulamento dos juízes funciona como uma salvaguarda contra o poder das facções, que tem sido um dos principais problemas a perturbar o modelo de agência do New Deal. [n237] O controle judicial pode também ajudar a iniciar ou inibir a ação de uma agência; dificilmente pode-se dizer que há uma associação inevitável entre uma atuação agressiva do Judiciário e um ânimo anti-regulatório. Não é difícil de encontrar exemplos de decisões judiciais que estimulam a regulação. O Judiciário tem ajudado na execução da legislação em várias áreas, como, por exemplo, direitos civis, [n238] direito ambiental, [n239] benefícios da seguridade social, [n240] saúde e segurança no trabalho, [n241] e segurança automobilística. [n242] Talvez a evidência mais dramática desse efeito seja fornecida pelos Programas Regulatórios de 1985 e 1986 do Governo dos Estados Unidos, que revelam que uma série de regras propostas foram desenvolvidas e editadas sob a pressão do controle judicial e diretrizes impostas judicialmente. [n243] A observação apenas dos casos contenciosos provavelmente não oferce uma visão completa da questão; a mera possibilidade de controle judicial também evita a inércia arbitrária ou ilícita. Embora seja importante entender que o contencioso pode produzir uma demora significativa e às vezes aumentar o risco de não-implementação, [n244] o registro recente sugere que o contrário tem freqüentemente ocorrido. Mais que isso, as decisões de uma agência não precisam e não deveriam ser “políticas” no sentido amplo de corresponder somente a pressões do eleitorado. Essa concepção de política foi rejeitada pelo New Deal. O papel adequado da “política” consiste em juízos de valor feitos em conformidade com a lei e sujeitos ao controle público. Freqüentemente, decisões de uma agência são e deveriam ser baseadas em grande parte em questões técnicas, que compõem o fundamento para a escolha de valores. Pode-se imaginar, por exemplo, estudos sobre os riscos de um carcinógeno, estudo esse que, ao produzir evidência, leva agentes públicos com distintas posições sobre a regulação a adotatem uma mesma decisão no caso concreto. Essa concepção sobre o papel dos técnicos especialistas no processo regulatório forma a base para o que se poderia chamar de concepção “deliberativa” de administração, uma perspectiva com raízes em teorias republicanas da política, no tratamento madisoniano da representação, [n245] e no próprio New Deal. [n246] A concepção deliberativa rejeita tanto a visão puramente tecnocrática quanto a política. Ela também não vê o processo como um mecanismo de imposição de uma visão única do bem comum ou de conciliação de Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 33 “interesses” exógenos. [n247] Ao contrário, essa concepção vê o processo regulatório como um amálgama de opções valorativas e especialização técnica. As opções valorativas relevantes devem ser compatíveiscom a lei, e não uma máscara para o exercício de poder político, e deve estar razoavelmente de acordo com os dados técnicos disponíveis. Nessa concepção, o papel da política lmita-se a influenciar os juízos de valor dentro dos limites de uma lei. A hard-look doctrine, tal como os recentes decretos presidenciais, é melhor entendida como um esforço de levar adiante essa concepção de administração. Legitimidade processual e cabimento do controle judicial -- Uma questão furtiva sobre o controle judicial, geralmente suscitada sob as rubricas de standing e reviewability, é a de se o Judiciário deveria tratar os cidadãos -- beneficiários da regulação -- e os setores regulados da mesma forma. Durante um longo período, o papel do Judiciário era permitir às entidades reguladas a afastar intervenções não autorizadas; aqueles que seriam os beneficiários da regulação não podiam buscar ajuda no Judiciário. [n248] Essa prática era baseada largamente no entendimento de que os beneficiários deveria buscar uma compensação no Legislativo, e não no tribunal. Nessa perspectiva, interesses na proteção regulatória não deveriam ser tratados como “direitos” subjetivos. Nos anos setenta, esse princípio foi alvo de forte ataque em dois sentidos.Em primeiro lugar, a evidência do poder dos setores regulados sobre as agências sugeriu que, se a fidelidade à legislação era o objetivo, o Judiciário deveria proteger os beneficiários da regulação assim como as entidades reguladas. [n249] O fato de que os setores regulados poderiam recorrer ao Judiciário para defender seus direitos, enquanto os beneficiários da regulação podiam recorrer somente à política, parecia consubstanciar a desigualdade no processo regulatório, no qual os setores regulados ao menos às vezes tinham um poder desproporcional. [n250] Em segundo lugar, a evolução das concepções sobre a importância dos direitos de propriedade colocou em dúvida se os interesses do common law invocados pelos setores regulados mereciam uma proteção maior do que os interesses legais dos beneficiários da regulação. [n251] Nessa pespectiva, era muito estranho sugerir que os interesses, por exemplo, de vítimas de práticas trabalhistas desleais, de poluição e de vários tipos de discriminação não mereciam proteção judicial. Por iniciativa própria, os juízes começaram a colocar os beneficiários no mesmo nível dos regulados. [n252] Essas tendências são compatíveis com o ataque do New Deal ao common law – e são realmente um resultado desse ataque. O New Deal foi em grande parte a resposta a uma percepção de que o catálogo de direitos do common law não era suficientemente includente. É um fato irônico que, durante a primeira geração após o New Deal, o papel do Judiciário permaneceu fundado no common law, enquanto os tribunais tentavam proteger os direitos privados tradicionais das intervenções regulatórias não autorizadas. [n253] O aumento de uma série de doutrinas que protegem os interesses criados pelas leis regulatórias tem sido surpreendentemente lento, embora relativamente estável nos anos sessenta e setenta. [n254] Em vários casos nos últimos anos, porém, a Suprema Corte tem utilizado doutrinas de standing [n255] e de reviewability [n256] para limitar o acesso de beneficiários da regulação ao Judiciário. Em alguns casos, a Corte sugeriu que a provisão constitucional que exige que Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 34 o presidente “zele pela fiel execução da lei”[n257] justifica as restrições à possibilidade do controle judicial. [n258] Em outros casos, a Corte indicou que o remédio adequado para a ilegalidade cometida pela Administração Pública está no Congresso ou na própria agência. [n259] Algumas das recentes decisões sobre legitimidade processual sugerem que violações à lei que os esquemas regulatórios tentam evitar não são passíveis de discussão judicial: por exemplo, os danos probabilísticos ou sistêmicos causados por deduções fiscais concedidas a escolas que praticam discriminação racial (segregated schools), ou por incentivos fiscais para prover assistência de saúde aos pobres, não oferecem uma base para o recurso ao Judiciário. [n260] A Corte também tem dificuldade para concluir se e quando benefícios criados por lei são qualificados como direitos constitucionais de “liberdade” e “propriedade”. [n261] Finalmente, a Corte criou uma presunção de que a inércia da agência não pode ser objeto de controle. [n262] Essas tendências representam um retorno parcial às concepções pré-New Deal do sistema jurídico e refletem uma abordagem mal orientada da Constituição e do papel do Judiciário. A cláusula “take Care” é um dever, não uma autorização. Ela não autoriza o presidente ou os agentes públicos a violar o direito por meio da “inércia”, da mesma forma que não autoriza a fazer o mesmo por meio da “ação”. Quanto à possibilidade de recurso ao Judiciário, nenhuma distinção forte deveria ser feita entre beneficiários da regulação e regulados. [n263] Não há razão para restringir aquele primeiro grupo somente aos remédios políticos. A queixa comum dos beneficiários é de que as agências violaram a legislação e assim evitaram a implementação de conquistas já garantidas no processo legislativo. Em tais casos, parece estranho sugerir que os beneficiários devem voltar ao processo político para corrigir a ilegalidade cometida pela Administração Pública. [n264] Tanto a presunção de que a inércia da agência não pode ser controlada judicialmente quanto o ceticismo geral em relação à adequação dos benefícios legais a categorias como liberdade e propriedade dificilmente se combinam com as premissas do New Deal. Especificamente, a idéia de que a inércia da agência deve se presumir imune ao controle judicial, se levada ao extremo, é, de partida, inconsistente com a criação do esquema regulatório; a criação do programa administrativo revela um desejo do Congresso de corrigir o problema, e a omissão da agência frustra essa intenção. Mais do que isso, a presunção de impossibilidade de controle judicial da inércia, mas não da ação, cria um incentivo contrário à implementação da legislação. Restringir o Judiciário ao controle da intervenção regulatória imporia um indefensável limitação ao papel judicial de exigir das agências sua observância do direito. [ n 265 ] Até aqui, discutiram-se primariamente as doutrinas que tratavam da legitimidade processual. No entanto, há uma questão distinta, relativa à possibilidade de controle judicial da ação da agência como um todo. O Congresso criou uma presunção forte de possibilidade de controle, [ n 266 ] movido pela preocupação tradicional com o Estado de Direito. O controle judicial é valioso porque traz considerações quanto à conformidade à lei e à regularidade procedimental. Entretanto, o APA imuniza a ação da agência em relação ao controle judicial nas hipóteses em que há vedação legal do controle ou quando a decisão é “atribuída por lei à discricionariedade da agência”. [ n 267 ] As considerações apresentadas na discussão anterior Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 35 sugerem que deve ser afastada a exceção à possibilidade de controle judicial com base na “discricionariedade atribuída à agência”. A Suprema Corte declarou, ao formular o standard, que a exceção é aplicável quando uma lei “traz termos de tal forma amplos que... não há direito aplicável”. [ n 268 ] Segundo esta formulação, dizer que uma decisão é “atribuída à discricionariedade da agência” é dizer que ela é legal em seu mérito. Se “não há direito aplicável” para a decisão sob análise, não há, por hipótese, restriçãolegal ao agente da Administração Pública; a decisão não pode ser considerada ilegal. Ao invés de fazer uma determinação inicial de que a decisão é “atribuída à discricionariedade da agência” e, portanto, não passível de controle judicial, o Judiciário poderia simplesmente julgar o mérito do caso. A exceção com base na “a atribuição de discricionariedade à agência” cria desnecessariamente um confuso questionamento inicial sobre haver ou não “direito aplicável” – um teste com o balanceamento de múltiplos fatores que em algumas vezes produz resultados incorretos. [ n 269 ] Seria melhor afastar a investigação como um todo. Tal passo não significaria que todas as decisões seriam passíveis de controle judicial. Seria ainda possível para o Congresso imunizar decisões em relação a esse controle – o que seria obviamente sujeito às restrições constitucionais – com disposições legais afastando qualquer intervenção judicial. O desenvolvimento de um controle judicial moderadamente agressivo nos termos da hard- look doctrine -- que em geral teve efeitos realmente salutares -- reflete uma rejeição da crença que o New Deal erroneamente depositou na administração autônoma. Uma atuação firme do Judiciário disciplinou resultados administrativos, corrigindo decisões não equilibradas e de horizontes curtos, servindo como um como significante elemento dissuasivo. [ n 270 ] Deve- se evitar o retorno da postura pró-deferência associada ao New Deal. Ao mesmo tempo, e talvez muito mais importante, doutrinas que distinguem entre beneficiários da regulação e regulados devem ser rejeitadas como ressurgimentos anacrônicos de concepções do sistema jurídico do período pré-New Deal. A mudança do papel do Congresso É sabido que, ao criar agências durante o período do New Deal, o Congresso freqüentemente traçou diretrizes mínimas para limitar a discricionariedade administrativa. A legislação típica da época exigia das agências a promoção do interesse público, para evitar práticas “desarrazoadas”, ou evitar “injustiças”. [ n 271 ] Nos últimos anos, no entanto, o Congresso tentou impor um controle maior. Este controle assumiu vária formas: aumento da especificidade das leis; meios de constrangimento das agências (agency-forcing) na forma de detalhamento de prazos para atuação da agência (timetables); [ n 272 ] vários mecanismos de supervisão pelo Congresso, [ n 273 ] incluindo audiências freqüentes e o agora extinto veto legislativo; leis que prevêem finalidades a serem alcançadas em lugar de oferecer valores a serem sopesados; regras auto-limitadoras determinando a extinção das agências após uma data específica (sunset provisions); [ n 274] provisões amplas para o controle judicial, incluindo autorização para que os beneficiários da regulação movam ações judiciais contra os Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 36 regulados e contra as próprias agências; [ n 275 ] e extinção das agências que o Congresso considerasse não mais úteis. [ n 276 ] Cada uma destas iniciativas parece entrar em conflito com importantes elementos da concepção de administração do New Deal, uma vez que elas interferem na autonomia dos agentes administrativos. Esses esforços tentam assegurar a implementação das diretrizes legais e impedir a “captura” das agências [ n 277 ] – os mesmos objetivos que fundamentam a hardlook doctrine. Trata-se, portanto, de uma concepção política de regulação, com o entendimento de que é ao Congresso que cabem as decisões políticas fundamentais. As emendas ao Clean Air Act de 1977, que representaram, em larga medida, a frustração em relação às falhas visíveis na implementação das diretrizes legais, [ n 278 ] são um exemplo da tendência de aumento do controle pelo Congresso. A lei agora exige que a EPA∗ decida dentro de um ano se certos poluentes são perigosos nos termos da lei. Outras provisões legais incluem prazos semelhantes. [ n 279 ] A EPA está submetida a mais de trezentos prazos legais distintos, [ n 280 ] dos quais somente cerca de quatorze por cento têm sido cumpridos. [ n 281] O Congresso não só detalhou prazos e procedimentos para a ação regulatória, como também determinou exatamente às agências o que regular e em que extensão. Por exemplo, o Congresso estipulou padrões específicos para a economia de combustível para automóveis na medida adequada para promover a conservação de energia e a proteção meio ambiente. [ n 282 ] A emenda Delaney e inúmeras outras leis que tratam de carcinógenos impõem exigências claras aos agentes públicos. [ n 283 ] A Safe Drinking Water Act, alterada em 1986, especifica oitenta e três elementos contaminadores para os quais a EPA deve estipular padrões de controle nos próximos três anos. [ n 284 ] Embora a forma própria de agir do Congresso leve a uma rejeição da sabedoria institucional do New Deal, ela é geralmente motivada pelo desejo de assegurar a execução das leis de regulação. Nesse contexto, distinto da supervisão presidencial, o ator institucional que busca limites à autonomia das agências tem uma predisposição favorável à regulação. No entanto, esta conexão não é necessária. Adversários de uma regulação forte poderiam também exigir a criação pelo Congresso de diretrizes legais específicas. O movimento em direção ao aumento do controle do Congresso não está ausente de riscos. Estudos mostraram que a edição de leis mais detalhistas pode produzir regulação capturada por acertos de facções. [ n 285 ] Para alguns, tais evidências baseiam-se na visão de que a Administração Pública é melhor equipada que o Congresso para tomar decisões políticas. De acordo com esta visão, os burocratas das agências, submetidos ao controle presidencial, estão mais aptos para servir ao interesse público do que os legisladores, que estão submetidos a uma gama de pressões particularistas. [ n 286 ] Um recente estudo sobre a Clean Air Act sugere que o Congresso estipulou objetivos irreais e que a execução desses objetivos via Judiciário foi contraproducente. [ n 287 ] Além disso, os prazos legais revelaram-se algumas ∗ N.T.: sigla da Environmental Protection Agency, agência reguladora da área de meio ambiente do governo federal dos E.U.A., criada em 1970. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 37 vezes de uma rigidez irrealista. [ n 288 ] Em termos mais gerais, a teoria da public choice revela que os resultados legislativos serão, em grande extensão, aleatórios. Por exemplo, a ordem segundo a qual matérias são suscitadas afeta os resultados de forma significativa, apesar de logicamente a ordem não dever desempenhar nenhum papel; atores políticos freqüentemente manipulam estrategicamente a agenda para promover seus próprios interesses; e a maioria dos processos apresentam dificuldades em agregar preferências. Não se espera, portanto, que os resultados do processo legislativos reflitam com precisão os desejos da maioria. [ n 289 ] Mais do que isso, estudos sobre o comportamento do Congresso sugerem que os legisladores podem falhar ao procurar atingir soluções nacionais apropriadas uma vez que eles gastam muito de seu tempo e interesse atendendo seus eleitores. [ n 290 ] Argumentos mais convencionais contra uma legislação detalhista e delegações evidentes enfatizam a necessidade de flexibilidade para responder às mudanças conjunturais e ausência de especialização técnica entre os legisladores [ n 291] – considerações semelhantes àquelas que fundamentam a queda da doutrina da vedação de delegação de poderes. [ n 292] Todos esses fatores questionam a visão de que o remédio parao comportamento administrativo impróprio repousa em delegações claras de competência. [ n 293 ] Há, entretanto, importantes considerações para sopesar. O controle pelo Legislativo tem sido uma importante proteção contra a falha de implementação. [ n 294] Exigências legais claras e prazos determinados, especialmente quando atrelados ao controle judicial, freqüentemente são responsáveis por trazer a regulação desejada. [ n 295 ] As eventuais carências de especialização técnica ou de flexibilidade do Congresso não justificam as delegações tão amplas, com finalidades tão indeterminadas, como as realizadas na época do New Deal. [ n 296 ] O Congresso pode permitir a especialização técnica e as adaptações conjunturais das agências, enquanto simultaneamente limita a discricionariedade administrativa. No entanto, os riscos de facciosismo e de irracionalidade no controle exercido pelo Legislativo são naturais e sugerem que algumas formas de supervisão pelo Legislativo são melhores que outras. Em particular, leis que especificam fins a serem atingidos são geralmente preferíveis àquelas que estipulam métodos particulares de regulação ou simplesmente identificam valores a serem sopesados. A legislação que especifica fins vinculantes (ends-forcing), ao contrário das leis que especificam meios, garante flexibilidade e a aplicação de conhecimento técnico especializado. Leis que identificam meios, ao contrário, aumentam o risco de facciosismo; haja vista que métodos de promoção de finalidades não são freqüentemente parte visível do processo legislativo, grupos bem organizados podem ter um poder desproporcional na escolha desses objetivos. [ n 297 ] Além disso, a necessidade de detalhamento da lei modifica-se de acordo com fatores conhecidos: a necessidade de flexibilidade a todo o tempo, o grau de sofisticação técnica do qual dependem as decisões, e o risco de que um texto carregado de especificações possa evitar a aprovação da lei na primeira oportunidade. [ n 298 ] A composição estimada do grupo de beneficiários da regulação e dos regulados é também relevante. Por exemplo, a imprecisão legal está mais apta a provocar risco em um difuso grupo de beneficiários do que Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 38 em um grupo bem organizado. [ n 299 ] Duas conclusões gerais podem ser obtidas dos esforços atuais para aumentar a supervisão pelo Legislativo. Primeiramente, os vários mecanismos de controle pelo Congresso tornaram anacrônica a imagem tradicional da Administração autônoma. Em segundo lugar, esses mecanismos alimentaram uma considerável promessa de promoção de responsabilização política e de diminuição do risco de falha no processo de implementação, especialmente quando o controle legislativo adquire a forma de especificação de fins legais, ao invés de definição dos meios. A relação entre as várias formas de controle 1. A importância do controle simultâneo. – Como descrito acima, todos os três ramos do governo rejeitaram importantes aspectos da experiência institucional do New Deal. A idéia da autonomia da Administração está ultrapassada. [ n 300 ] Mais do que isso, alguns papéis ativos do Presidente, do Legislativo e do Judiciário são desejáveis. A reivindicação pelo aumento do controle repousa em um conjunto de crenças sobre os objetivos adequados das instituições nacionais. Esses objetivos incluem proteção contra o facciosismo e a representação de interesses particularistas, garantia de um grau de deliberação no governo, responsividade à opinião pública e desenvolvimento de novos direitos subjetivos seguindo o reconhecimento pelo New Deal de que as regras legais são construídas socialmente. Em particular, a estrutura que proponho reconhece a continuada necessidade de instituições reguladoras que guardem uma medida de discricionariedade. Entretanto, essas instituições não podem ser autônomas. E mais, a supervisão das agências reguladoras pelos três ramos do governo deve coexistir perfeita e confortavelmente com programas administrativos agressivos. Por exemplo, um papel do Congresso na especificação de fins regulatórios e o controle judicial pensado para assegurar a observância desses fins pelo Executivo podem trabalhar para promover, ao invés de minar, a intervenção federal. Um sistema de controle simultâneo deve também aumentar a responsabilização, a correção das decisões e a legalidade. Assim sendo, a crítica do New Deal à tripartição dos poderes como necessariamente ligada à inércia revela-se extremamente grosseira. O mecanismo de freios e contrapesos, corrigido de forma adequada, promoverá o controle eleitoral e em algumas vezes permitirá a intervenção regulatória. Esta proposição persiste mesmo se as críticas do New Deal estiverem corretas quanto à sugestão de que as instituições que estejam livres de mecanismos de freios e contrapesos seriam particularmente aptas para uma ação imediata. A importância desses esforços para conter a autonomia das agências extrai-se das funções da distribuição original dos poderes nacionais. O controle presidencial fornece alguns dos benefícios associados com a divisão do trabalho; a este respeito, um sistema de separação dos poderes permite meios de facilitar, ao invés de impedir, a ação governamental. Pelo menos em algumas formas, o controle presidencial diminui os riscos da tirania das facções e da representação de interesses particularistas despertados pelo exercício da discricionariedade pela burocracia. O Judiciário forneceu um significante controle suplementar. Em particular, o Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 39 seu insulamento torna-o menos suscetível a pressões impostas por grupos privados bem organizados. A criação de leis detalhistas pelo Congresso serve como uma importante proteção contra a falha de implementação e assegura uma larga medida de visibilidade para escolhas regulatórias fundamentais. A ligação entre qualquer um desses objetivos e qualquer conjunto particular de arranjos institucionais não pode ser estabelecida com certeza. A teoria e a experiência, entretanto, sugerem que as recomendações institucionais feitas aqui aumentarão a probabilidade de promoção de todos esses objetivos de uma forma que una importantes aspectos do New Deal com traços centrais do arcabouço constitucional original. Por esta razão, é possível rejeitar significantes elementos da concepção de administração do New Deal sem aceitar a noção pré- New Deal de “governo limitado”. É claro que o valor dos esforços para conter a autonomia das agências irá variar de acordo com o contexto regulatório. Quando uma decisão é predominantemente política, a supervisão presidencial e legislativa é o mais desejável. Decisões de caráter estritamente legal apresentam a hipótese menos recomendada para supervisão presidencial e legislativa. Assuntos tecnocráticos pedem uma medida de controle presidencial, mas menos supervisão pelo Congresso. Em todos esses três contextos, o controle judicial é desejável, mas sua natureza e escopo irão variar. Como descrito acima, essas iniciativas apresentam riscos. Embora o controle presidencial diminua algumas ameaças de facciosismo associadas à discricionariedade da agência, tal controle também põe em risco o papel adequado da especialização. Juízes podem ter suas próprias agendas, e sua responsabilização e habilidades técnicas são limitadas. O detalhamento de leis pelo Congresso tem algumas vezes levado a finalidades irreais, produzidas por prescrições irracionais, e refletido o poder de grupos bem organizados. Contudo, da forma como descritos aqui, os prováveisbenefícios do controle pesam mais que os potenciais perigos em todos os três casos. A crítica às inovações institucionais do New Deal respondem a um fenômeno mais geral que é comum a uma reforma institucional. Depois de iniciado o período de entusiasmo pelas novas instituições, as expectativas originais são freqüentemente desapontadas e novos mecanismos de controle precisam ser adotados. O aumento dos controles sobre as agências fornece um exemplo deste ciclo comum. [ n 301 ] 2. A relação entre os ramos do governo. – Qual é a relação entre essas várias iniciativas? Algumas delas parecem ajustar-se muito confortavelmente entre si. O detalhamento de leis pelo Congresso facilita o controle judicial e vice-versa. O principal objetivo do controle judicial é assegurar a adesão às leis e essa função é mais facilmente executada quando uma lei é clara e específica. A supervisão presidencial e a especificação de objetivos legais pelo Congresso colocam de certa forma uma maior dificuldade. Está entre os objetivos daquele primeiro assegurar algum grau de coordenação e direção centralizada e, ao mesmo tempo, promover ações tecnocráticas. A especificação de objetivos legais pelo Congresso pode tornar a coordenação impossível, devido às divergências entre as leis, e porque também Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 40 minimiza o papel dos especialistas. A necessidade de supervisão presidencial é maior quando a direção do Congresso é ausente; é em menor grau premente quando o Congresso atua claramente. Desta forma, a supervisão presidencial e a atuação do Congresso podem ser vistas como alternativas [ n 302 ] a serviço de funções similares para promover responsabilização política e assegurar a implementação; entretanto, há distintos benefícios e riscos potenciais. A experiência dos últimos decretos presidenciais sugere que ambos podem trabalhar juntos. No mínimo, alguma ambigüidade nas leis é inevitável, e mesmo quando o Congresso é relativamente claro, um papel presidencial pode ser desejável para assegurar um sistema coordenado de execução da lei. O controle simultâneo pelo Judiciário e pelo Executivo, contudo, parece paradoxal. A importância do papel do Judiciário origina-se, sobretudo, de um receio de “más políticas” – decisões baseadas em fatores legalmente irrelevantes ou sob pressão exercida por grupos privados bem organizados. O argumento favorável ao controle judicial, portanto, tende a enfatizar as regras de especialização técnica e a legalidade nas decisões das agências. A importância do controle presidencial, por outro lado, enfatiza a dimensão política das decisões das agências e a necessidade de assegurar os resultados conforme a vontade da população. Não deve causar surpresa que as recentes defesas do controle presidencial são hostis aos tribunais e que os defensores da hard-look doctrine desconfiam do aumento do papel do OMB. [ n 303 ] As duas formas de controle parecem profundamente incompatíveis. Entretanto, a incompatibilidade é apenas superficial. Os controles presidencial e judicial agem cada qual para se defender contra os riscos colocados pelo outro. O controle presidencial promove coordenação e centralização, tornando mais fácil para o governo agir com rapidez. Ele também permite o redirecionamento da política nacional de acordo com as circunstâncias ou com a opinião pública, impedindo, assim, a inércia da burocracia. Além disso, a supervisão presidencial deve aumentar o controle político e a utilização de conhecimento técnico – trazendo análises políticas uniformes – e, assim, tende a insular as decisões das agências em relação à possibilidade de reforma pelo Judiciário. Mais do que isso, os dispositivos para a coordenação e a supervisão presidencial, tal como a preparação da análise do impacto regulatório, podem ser úteis aos tribunais na condução do controle que exercem nos termos da hard-look doctrine. Ao mesmo tempo, uma atuação judicial firme minimiza o problema – especialmente grave em uma era de supervisão presidencial ativa – de um ramo determinar a extensão de seu próprio poder legal. Esta consideração assume especial importância na era do Estado Administrativo. O aumento do número das agências administrativas iniciou uma crise para a distribuição original dos poderes nacionais. Talvez de forma surpreendente, o crescimento da supervisão presidencial e judicial reproduz algumas das maiores características do esquema constitucional original sem prejudicar as funções regulatórias das agências administrativas. Considere-se, por exemplo, a alegação de que a supervisão do OMB resultou em uma inércia ilegal da agência – um tipo de ilegalidade da qual não há um exame público detalhado. [ n 304 ] O controle judicial da proteção regulatória inadequada, justificando reivindicações de falha na atuação que violou a lei, dissuade a conduta ilegal deste tipo. [ n 305 ] A posição institucional do Judiciário geralmente promove este resultado e em algumas vezes o fará sem Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 41 considerar a ideologia do Presidente que indicou os juízes. [ n 306 ] Os resultados de duas décadas de controle judicial nos termos da hard-look doctrine sugerem, entretanto, que o controle judicial é, na melhor das hipóteses, uma parte da salvaguarda contra a má atuação da Administração Pública, e que ele traz consigo seus próprios riscos. Os tribunais não são razoavelmente capazes de entender em profundidade o programa de execução dos objetivos da lei de uma agência; [ n 307 ] carecem de sofisticação técnica; podem responder somente quando são demandados; produzem atrasos; suas decisões são ad hoc; não são politicamente responsáveis; e, em algumas casos, procuram aplicar suas próprias preferências políticas, as quais podem ser tanto contra como a favor da regulação. À luz das últimas indicações de muitos dos juízes federais que são provavelmente céticos quanto à regulação, não seria surpresa se na próxima década o Judiciário invalidasse muitas intervenções das agências reguladoras; algumas dessas decisões serão altamente questionáveis. [ n 308 ] Além disso, o controle das falhas sistêmicas é extremamente difícil de ser feito pelas juízes, que agem caso a caso. A este respeito, a ação legislativa e a executiva são muito mais promissoras. Pelo menos, a supervisão presidencial é apta a ser um importante suplemento para o controle judicial, servindo a algumas das funções da hard-look doctrine sem estar submetida a seus riscos. Por fim, é um erro tratar as decisões das agências como se fossem em seu todo “políticas” ou baseadas inteiramente na aplicação de conhecimento técnico especializado. Este, com razão, desempenha um relevante papel nas decisões regulatórias. A imersão nos fatos algumas vezes leva a um consenso sobre a melhor solução, mesmo entre pessoas com visões amplamente diversas de regulação. De forma análoga, restrições legais são às vezes suficientemente rígidas para fazer com que administrações com agendas políticas amplamente diferentes cheguem a um mesmo resultado em uma questão específica. Uma significativa continuidade entre diferentes administrações deve, portanto, ser normal, e reversões súbitas de curso podem então refletir um ilegítimo exercício de pressão política, justificando a presunção de ilegalidade sujeita à APA. [ n 309 ] Por outro lado, as administrações podem de acordo com a lei alcançar resultados distintos em matérias regulatórias. Julgamentos políticos podem tornar-se críticos; contudo, o termo “político” não deve permitir arbitrariedades e inconstâncias. Ao contrário, o termoreivindica juízos de valor a respeito dos quais pessoas razoáveis podem divergir. Nestes casos, o papel dos tribunais é assegurar que a agência articule os juízos de valor e que sejam submetidos ao controle e exame públicos atentos. 3. O Sistema de Freios e Contrapesos, Revivido e Reformulado. (a) Os riscos de controles simultâneos. – As sugestões desenvolvidas – especialmente aquelas que se referem ao controle simultâneo pelo Executivo e pelo Legislativo – apresentam riscos. Primeiramente, a presença de dois planos de controle no processo regulatório pode levar a uma tendência anti- regulatória. Desta forma, o OMB muito mais obstruiu do que efetivamente desenvolveu a regulação. O mesmo, muitas vezes, é verdade para o Judiciário. Ainda que os julgamentos destes últimos anos tenham invalidado a desregulação e obrigado as agências a agir, a perpetuação da validade das recentes decisões está, no mínimo, incerta; [ n 310 ] em Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 42 qualquer caso, o Judiciário apresenta dificuldades em assegurar uma intervenção regulatória. [ n 311 ] A existência de duas instituições que estabelecem limites à regulação pode minar os propósitos que estavam presentes na origem da criação das leis regulatórias. Um agente regulador submetido a vários controles pode encontrar dificuldades para executar sua missão. Uma reflexão mais geral relaciona-se com a avaliação de soluções legalistas e procedimentais. Ambos, tanto a supervisão do OMB como o controle judicial, têm sido alvo de críticas por criarem expedientes meramente protocolares (boilerplate) que passam a ser seguidos pelas agências, gerando demoras custosas sem qualquer efetivo benefício em termos de resultado e, talvez, sem a produção de quaisquer efeitos em seu todo. A criação de mais uma etapa de controle será custoso e absorverá tempo, assim como poderá não servir aos objetivos pretendidos. Uma consideração relacionada a essa se refere à possibilidade de, em alguns momentos, o Congresso ter boas razões para delegar poderes discricionários às agências reguladoras, enquanto que intensificar a revisão pelo OMB e pelos tribunais tende a remover as vantagens associadas à delegação original. O legado das agências do período do New Deal, em outras palavras, não é um modelo que não gera ambigüidades, e novos arranjos institucionais não devem ser indiferentes às metas introduzidas que se referiam à alocação de poderes para a competência técnocrática e à relativa autonomia dos administradores. Assim, o controle simultâneo pelo OMB e pelo Judiciário geraria riscos. Em particular, aqueles que exercem semelhante controle não deveriam duplicar o trabalho da agência; como exposto acima, o papel de supervisão é limitado. Mais do que isso – e este é um aspecto fundamental – a entidade responsável pela supervisão da regulação deve promovê-la assim como deve contê-la. Parte desta missão deve dirigir-se contra as falhas de execução das leis de regulação. Nesse sentido, um sistema semelhante ao presente modelo de revisão do OMB poderia ser adaptado para promover aspectos da agenda substantiva do New Deal e da Great Society. Um sistema como este envolveria o redirecionamento e o estímulo à política regulatória assim como diminuiria os riscos de inércia associados a um sistema de revisão múltipla. Uma analogia parcial pode ser feita com o mecanismo do ombudsman; [ n 312 ] uma agência supervisora serviria como uma câmara de compensação similar para solicitação de iniciativas regulatórias. Neste sistema, informações fornecidas por cidadãos e pelas próprias agências seriam o fundamento da supervisão. Entretanto, a decisão final deve partir da própria agência. A potencialidade de desenvolvimento a este respeito pode ser encontrada no recente esforço em exigir das agências a geração de cronogramas e prazos para que elas respondam a solicitações de elaboração de regulamentos por parte dos interessados. Dentro de tal sistema, tampouco o controle presidencial ou o judicial poderiam ser excludentes um do outro; um equilibraria o outro. Assim, com este modelo, escolhas políticas seriam realizadas por seus responsáveis; a paralisia relacionada aos mecanismos de freios e contrapesos no interior do Executivo seria afastada; as escolhas coletivas seriam permitidas; e haveria meios de proteção contra decisões que não estivessem de acordo com a lei ou fossem impulsionadas pelo poder de facções ou pela representação de interesses particularistas. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 43 (b) O Valor Permanente dos Mecanismos de Freios e Contrapesos: -- Desta forma, a discussão sugere, em grande medida, que a crítica original do New Deal à distribuição dos poderes nacionais e aos mecanismos de freios e contrapesos era decorrente do status quo do período do laissez-faire e de uma hostilidade do Judiciário em relação à regulação. Esta crítica foi excessivamente dura, mesmo que -- ou, talvez, especialmente porque -- se acredite, como um reformador do New Deal, que a efetiva intervenção regulatória é altamente desejável em alguns momentos. Quatro argumentos básicos fundamentam esta conclusão. Primeiramente, a centralização de poderes na presidência ou nos agentes públicos insulados em relação ao controle pelo Judiciário ou pelo Congresso não conduz necessariamente a uma execução vigorosa dos programas regulatórios. Ao contrário, tal centralização pode produzir inércia ou decisões inconsistentes com os compromissos legais subjacentes à construção das ações reguladoras. Se os administradores estão completamente comprometidos com os objetivos regulatórios, os mecanismos de freios e contrapesos podem ser vistos como um obstáculo à reforma; entretanto, em um período de ambivalência do Executivo, controles podem ser um importante instrumento de implementação legal. Em segundo lugar, a distribuição dos poderes nacionais está longe de ser a responsável pela inércia regulatória. A crítica do New Deal teve sua maior força enquanto prevalecia o sistema do laissez-faire; é possível que os mecanismos de freios e contrapesos tenham contribuído para perpetuar este sistema. Por esta razão, a crítica tornou-se mais poderosa nos anos trinta do que ela é hoje. Entretanto, se o status quo favorece a intervenção regulatória, os mecanismos de freios e contrapesos podem aumentar a probabilidade de que a regulação permaneça em seu lugar. Em terceiro lugar, um sistema de distribuição de poderes pode, de fato, auxiliar aqueles que procuram introduzir mudanças, incluindo grupos relativamente de menor influência. Uma importante função da divisão dos poderes é assegurar que os distintos ramos do governo persigam diferentes agendas. Desta forma, a existência de três ramos do governo multiplica as formas de acesso a ele, permitindo a expressão de diferentes visões políticas. Tal sistema aumenta a probabilidade de que pelo menos um ramo do governo seja responsável pelo interesse de grupos politicamente fracos e se torne, portanto, um promotor de reformas. Muitas vezes, um único ramo iniciou sozinho formas de mudanças sociais. [ n 314 ] Como exemplo, o próprio New Deal foi, em larga medida, produto de uma liderança de um ramo do governo – a presidência. Por contraste, em um sistema centralizado e sem divisão de poderes, a probabilidade de que maiorias influentes permaneçam fortalecidas é ampliada; nenhuma alternativa institucional existe para aqueles que persigam interesses contrários aos da maioria. Nesse sentido, um governo com separação de poderes tem consideráveis vantagens comparadas aos sistemas unitários.Assim, o impulso vigoroso de um dos ramos – uma possibilidade dentro de um sistema de separação dos poderes – pode criar a oportunidade para mudança. Tal impulso pode ser especialmente forte se um ramo do governo tiver o poder de produzir a maior parte das reformas por si próprio – se, em resumo, o governo é verdadeiramente dividido e não Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 44 somente submetido aos mecanismos de freios e contrapesos. A atual estrutura constitucional, em um grau elevado, contempla esta condição, uma vez que cada um dos três ramos está apto a gerar mudanças independentemente dos demais. Nestas circunstâncias, a convicção do New Deal de que a distribuição dos poderes nacionais inevitavelmente produziria inércia, ou inevitavelmente frustaria a intervenção governamental, é infundada. Em quarto e último lugar, mesmo que um sistema baseado nos mecanismos de freios e contrapesos possa, às vezes, diminuir a quantidade e a velocidade das mudanças, mudanças rápidas são dificilmente desejáveis sempre. Em quaisquer casos, os riscos de poucas alterações podem ser o preço em que se incorreria para diminuir o facciosismo e aumentar a deliberação no governo. A centralização de poderes nas agências reguladoras pode aumentar a responsividade às oscilações da opinião pública, porém tal responsividade está longe de ser um bem inevitável. Um sistema balanceado de monitoramento como sugerido aqui é, portanto, preferível à concepção de administração autônoma do New Deal e do sistema parcial de controle como descrito, por exemplo, em recomendações para o aumento do controle presidencial e a diminuição do controle judicial. [ n 315 ] Ao mesmo tempo, é importante ser realista quanto ao valor de mudanças institucionais na forma como proposta aqui. E mais, o foco em controles institucionais tende a perpetuar a possibilidade da preocupação anacrônica do direito administrativo com o controle da discricionariedade. [ n 316] Por exemplo, o desempenho da regulação depende, em larga medida, de fatores outros que não somente arranjos institucionais. Orçamento, qualidade técnica do quadro de funcionários, distribuição de poderes sociais, compromisso ideológico, propósitos públicos, e controles regulatórios substantivos -- todos desempenham papéis críticos. [ n 317 ] As várias mudanças sugeridas aqui por si mesmas não irão evitar a regulação excessiva e a falha de implementação. A melhoria do processo regulatório deve ser acompanhada por uma variedade de outras reformas, [ n 318 ] algumas das quais serão discutidas abaixo. Todavia, mudanças institutionais devem introduzir uma diferença substancial. O aumento do controle presidencial, judicial e do Congresso possivelmente serve aos propósitos institucionais da estrutura constitucional original sem, ao mesmo tempo, retornar ao ideal anacrônico do governo limitado. E. Restrições constitucionais O aumento simultâneo dos controles do Executivo, do Judiciário e do Legislativo é acompanhado por uma crescente incerteza quanto ao status constitucional das agências reguladoras. Obviamente, a Administração tem sido uma importante fração do governo nacional desde sua fundação. [ n 319 ] As atuais incertezas constitucionais, reminescentes dos desafios ao processo regulatório anteriores ao New Deal, não atingiram a Administração Pública em geral, mas somente aspectos particulares vistos como ameaça aos princípios constitucionais fundamentais. Algumas dessas incertezas manifestam-se nos esforços renovados para se utilizar a doutrina da vedação de delegação de poderes para limitar a discricionariedade das agências. [ n 320 ] Outros exigem que os juízes interpretem o artigo III literalmente e, assim, subtraiam as funções judicantes das agências reguladoras. [ n 321 ] O mais importante dos conjuntos de objeções questiona o poder do Congresso para criar Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 45 agências independentes do Presidente. Em todos estes casos, a consideração básica é a de que as agências reguladoras, que combinam funções estatais tradicionalmente separadas e que se encontram imunizadas em relação ao controle presidencial, estão sujeitas ao risco de facciosismo e da representação de interesses particularistas. A questão da competência do Congresso para criar agências “independentes” está intimamente relacionada aos temas explorados logo abaixo; ela convoca também para uma análise da relação entre o sistema de freios e contrapesos, por um lado, e o constitucionalismo do New Deal, por outro. A agência independente, definida como aquela cujos membros não estão submetidos ao poder de exoneração do Presidente, é o modelo de instituição do New Deal. Sua constitucionalidade foi aceita em grande medida porque se entendeu que a Constituição não poderia ser lida de modo a impedir que técnicos e agentes públicos insulados formulassem políticas regulatórias por solicitação do Congresso, mesmo que esses agentes não estivessem enquadrados em nenhum dos ramos constitucionais do governo. [ n 322 ] Entretanto, este argumento recebeu contundentes críticas durante a última década [ n 323 ] e não seria supreendente assistir-se, num futuro próximo, a um ataque ao conceito de administração independente. Um ataque como esse seria o correpondente constitucional da crescente desconfiança no modelo de administração do New Deal, expressada pelo crescimento dos controles legislativo, presidencial e judicial. Contudo, as severas críticas dirigidas aos vários aspectos da administração moderna são falhas. Elas repousam em métodos de interpretação constitucional que são inadequados, especialmente no contexto do direito administrativo. A interpretação literal do texto constitucional e da intenção dos constituintes não têm utilidade à luz das vastas mudanças no governo nacional desde sua fundação. Essas mudanças clamam por uma abordagem que leve as novas circunstâncias em consideração mas que, ao mesmo tempo, reintroduza no processo regulatório algumas das garantias do sistema constitutional original. 1. Formalismo, Holmesianismo e Funcionalismo. Nos últimos anos, houve um acentuado aumento do “formalismo” constitucional nos casos que envolvem a separação dos poderes. Decisões formalistas são fundadas na crença de que o texto da Constituição e a intenção dos Fundadores são vinculantes, de que as novas circunstâncias são irrelevantes para os resultados constitucionais e de que considerações mais amplas relativas a “políticas públicas” não teriam lugar em decisões jurídicas. Embora este tipo de análise tenha tido maior influência durante o início do desenvolvimento do moderno Estado regulador, [ n 324 ] as recentes decisões também refletem algumas dessas idéias. Por exemplo, em Buckley v. Valeo, [ n 325 ] a Suprema Corte derrubou a provisão da Federal Election Act segundo a qual os membros da Federal Election Comission não eram indicados pelo Presidente. De forma análoga, em INS v. Chadha, [ n 326 ] a Corte invalidou o veto legislativo que violava a cláusula de representação e desrespeitava a exigência constitucional do bicameralismo. E em Bowsher v. Synar, [ n 327 ] a Corte invalidou o artigo II da Gramm-Rudman-Hollings Act, que proibia o Congresso de conceder a ele mesmo o poder exclusivo de remover um funcionário encarregado da execução da lei. Todas essas decisões trataram do texto da Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 46 Constituição e da intenção dos Fundadores como se ambos estivessemmuito claros, com respostas evidentes aos problemas postos. As novas circunstâncias e até mesmo considerações subjacentes à estrutura constitucional foram em larga medida ignoradas. O formalismo constitucional deste tipo tem fundamentos fracos. A abordagem formalista é vulnerável a uma ampla gama de objeções relativas à caracterização adequada da intenção dos Fundadores, [ n 328 ] ao problema de sua interpretação e à questão do quanto ela deveria ser considerada em situações não previstas. [ n 329 ] No contexto do direito administrativo, o problema crítico do formalismo reside em enormes alterações no ramo executivo desde o New Deal. A abordagem formalista afirma, por exemplo, que a noção de um “executivo unitário” é suficiente para resolver um grande número de questões que envolvam agências federais administrativas. Entretanto, o governo federal e o ramo executivo, em particular, modificaram-se tão drasticamente desde a fundação que a “intenção dos Fundadores” não poderia ser mecanicamente aplicada como se, desta forma, fosse possível tratar da matéria. A moderna presidência é tão diferente da entidade idealizada pelos Fundadores que seria irreal simplesmente “aplicar” suas escolhas à situação presente. Desde seu início, a presidência norte-americana era frágil, segundo padrões modernos, especialmente em assuntos domésticos. Seu papel regulador era minímo. Poderes de polícia eram exercidos principalmente pelos estados. O processo legislativo federal estava a cargo do Congresso. Questões gerais de regulação eram decididas pelas legislaturas estaduais e pelos juízes do commom law. Contudo, desde o New Deal, o ramo Executivo tornou-se o mais importante formulador de políticas em nível nacional; é o que freqüentemente assume a iniciativa no processo legislativo, exercendo poderes originalmente idealizados para permanecer no domínio do Congresso e dos estados. Por esta razão, a argumantação da Suprema Corte em Chadha e Bowsher foi exageradamente mecânica. A constitucionalidade do veto legislativo não poderia ser resolvida somente por referência ao texto constitucional. [ n 332 ] Por razões semelhantes, esforços para revigorar uma abordagem literal do artigo III, para excluir funções judicantes do ramo executivo, devem ser repelidos. [ n 333 ] Uma revivificação da doutrina da vedação da delegação de poderes também seria um equívoco à luz das seguintes considerações: há boas razões para sustentar a delegação de discricionariedade, [ n 334 ] standards podem ser extraídos de textos legais aparentemente vagos, o controle judicial com base no princípio da vedação da delegação seria difícil e intrusivo, e garantias alternativas estão disponíveis. [ n 335 ] Claro que medidas extremas, como as adotadas em Schechter Poultry, deveriam ser invalidadas. No pólo oposto ao formalismo constitucional está a posição que poderia ser associada ao juiz Holmes: o Judiciário deveria pressupor que tudo o que o Congresso faz no campo da separação dos poderes é constitucional, a menos que nenhum argumento plausível possa ser apresentado a seu favor. [ n 336 ] Segundo a visão “holmesiana”, questões relativas à separação dos poderes não são, pela sua própria natureza, justiciáveis (justiciable), uma vez que as instituições relevantes estariam aptas a se proteger. [ n 337 ] Alguns observadores argumentam em favor da abordagem holmesiana alegando que as circunstâncias Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 47 supervenientes tornam as atribuições constitucionais originais menos relevantes ou mais obscuras. [ n 338 ] Outros baseiam-se na alegada indeterminação do texto constitucional. [ n 339 ] Nos anos trinta, a Suprema Corte adotou a abordagem holmesiana para decidir vários casos que envolviam o tema da separação dos poderes e das agências administrativas, [ n 340 ] mas deixou de fazê-lo recentemente. A abordagem holmesiana, entretanto, é apenas um pouco melhor que a do formalismo. Em sua forma usual, ela atingiu um indiscriminado abandono da separação dos poderes, e sua crença em um eqüilíbrio institucional auto-ajustável, baseada na suposição de igualdade de poderes em uma eventual oposição de forças, não tem fundamento histórico nem teórico. Há uma boa razão para se supor que sem adequados controles um ramo exerceria, algumas vezes, muito mais poder em relação aos outros. [ n 341 ] Um dos objetivos da Constituição era prevenir este resultado e reprimir desequilíbrios quando ocorressem. [ n 342 ] O consentimento de um ramo para a redistribuição nacional de poderes poderia não prevenir – e, até mesmo, aumentar – o perigo de um novo arranjo arriscar alguns dos propósitos subjacentes à estrutura constitucional. A posição holmesiana, que imuniza efetivamente os resultados políticos em relação aos controles constitucionais, é, portanto, inadequada. A alternativa ao formalismo e ao holmesianismo poderia ser definida como funcionalismo. [ n 343 ] Em termos gerais, a abordagem funcional analisa o momento em que as práticas presentes debilitam as atribuições constitucionais que deveriam ser consideradas como centrais. O texto da Constituição e a intenção dos constituintes são relevantes, mas não suficientes, a ponto de serem determinantes em casos difíceis; são princípios fundamentais estruturais que desempenham um papel crucial. [ n 344 ] Como sugerido acima, esses princípios incluem a execução unitária de leis, o afastamento do facciosismo, a proteção contra a representação não responsabilizável ou a representação de interesses particularistas, e a promoção da deliberação no governo. [ n 345 ] A abordagem funcional afirma, por exemplo, que a constitucionalidade do veto legislativo não deveria ser resolvida somente pela referência ao texto. [ n 346 ] Todavia, a abordagem funcional levaria ao mesmo resultado em Chadha. A prática tinha demonstrado que o veto legislativo agravara o problema do facciosismo [ n 347 ] - o mesmo problema que tinha motivado sua criação. Na prática, o veto legislativo criou para grupos privados bem organizados uma oportunidade adicional para afastar a regulação. Neste sentido, debilitou-se o esforço constitucional central de diminuir o poder dos grupos privados bem organizados acima dos processos governamentais. Embora Bowsher seja um caso mais complicado, ele pode ser analisado da mesma forma. A atribuição pelo Congresso de poder ao Comptroller General subtraiu o poder de execução das leis do controle direto de agentes do Executivo, uma vez que, na prática, o Comptroller General agia independentemente do Presidente. [ n 348 ] A execução das leis era, portanto, colocada nas mãos de alguém que não era, na prática, responsabilizável perante ninguém. Uma defesa alternativa de Bowsher apontaria para o perigo de se reunirem funções executiva e legislativa uma vez que o Comptroller General está submetido à remoção do Congresso e é tradicionalmente visto como um agente do mesmo. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 48 Claro que há problemas com a abordagem funcional. Em particular, ela permite um amplo grau de discricionariedade (e, portanto, de incerteza) tanto na caracterização do compromisso constitucional adequado quanto na definição do momento de sua violação. Ao contrário, as abordagens formalistas e holmesianas são altamente previsíveis. Contudo, os vícios do funcionalismo a este respeito podem também ser considerados como virtudes porque lhe permitem evitar as falhas das concepções formalistas e holmesianas. 2. O Status Constitucional das Agências Independentes. – O formalismo constitucional teve especial importâncianos recentes ataques às agências “independentes”. Embora a primeira agência independente, a Interstate Commerce Comission, tenha sido criada no final do século XIX, a noção de agência independente somente se tornou popular várias décadas depois, como resultado do receio em relação a uma presidência indevidamente poderosa, somado à crença nos efeitos saudáveis da competência técnica imparcial. [ n 349 ] Em parte, a ascensão das agências independentes pode ser também vista como uma indicação de poder dos setores privados regulados que acreditavam que as agências lhe dariam um tratamento mais favorável.[ n 350 ] O New Deal testemunhou a criação de um conjunto de agências independentes, embora, como exemplifica a Interstate Commerce Commission, limitações ao poder presidencial de exoneração já existam antes do New Deal. [ n 351 ] O modelo tornou- se muito menos popular nos últimos vinte anos, em parte por causa da percepção de que as agências independentes têm estado, na prática, sujeitas à influência de grupos privados bem organizados. [ n 352 ] A noção de administração independente corresponde à concepção madisoniana de representação em seu intuito de isolar agentes públicos de pressões políticas. [ n 353 ] Entretanto, a concepção do New Deal de administração une a crença no insulamento com o otimismo quanto ao poder de imersão nos fatos e na competência técnica para resolver problemas de regulação. Além disso, os defensores do New Deal viam o insulamento mais como um mecanismo para a quebra do status quo do que para sua preservação – o contrário da visão constitucional dos Fundadores. A agência independente seria um desdobramento natural do programa do New Deal. Apesar de alguma continuidade em relação à teoria madisoniana, a agência independente está em considerável tensão com os princípios que remontam à moldura constitucional original. A primeira seção do artigo II da Constituição confere o poder executivo a “um Presidente”. [ n 354 ] A cláusula ‘”take care”∗ cria para o Presidente – e para ninguém mais -- a responsabilidade de “zelar pela fiel execução da lei”. [ n 355 ] Estas provisões refletem a autoconsciência da decisão dos Fundadores para criar um Executivo unitário que seria responsabilizável perante o eleitorado e capaz de assumir a enérgica execução das leis. A concepção fundamental do ramo executivo encontrou uma incisiva confirmação em Myers v. United States, [ n 356 ] na qual a Suprema Corte decidiu que Congresso não poderia se envolver na decisão de exoneração de um agente postal. [ n 357 ] Em Humphrey’s Executor v. United Sates, [ n 358 ] contudo, a Suprema Corte posicionou-se em favor da ∗ N.T.: Constituição dos E.U.A., art. II, seção 3a : “[…] he shall take care that the laws be faithfully executed, and shall commission all the officers of the United States”. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 49 constitucionalidade das agências independentes. Referindo-se à necessidade de especialização técnica e de imparcialidade, a Corte decidiu que os membros da FTC∗ deveriam ser independentes em tudo, exceto na sua indicação para o cargo, e que a FTC não era “em nenhum sentido ... um braço ou um olho do executivo” [ n 359 ] Para a Corte, “os atos da Comissão são, em parte, quase-legislativos e, em parte, quase-judicias”, e ela é “uma agência dos Poderes Legislativo e Judiciário”. [ n 360 ] Pelo menos até recentemente, Humphrey’s Executor foi interpretado como um caso em que se estabeleceu a discricionariedade do Congresso para criar agências independentes, desde que os agentes públicos mais importantes destas últimas tenham funções legislativa e judicante. Entretanto, o ceticismo quanto ao status constitucional das agências independentes tem sido renovado na última década, [ n 362 ] e há sinais de que o significado jurídico dessa independência mudará em um futuro próximo. Tais desdobramentos não deverão causar surpresas à luz do declínio da crença no modelo de Administração pública do New Deal, que aposta alto no insulamento. Este ceticismo foi impulsionado pela abordagem formalista das recentes decisões da Suprema Corte – uma abordagem que está em grave tensão com a análise em Humphrey’s Excutor, que em qualquer situação tem pouco a ser dito a seu favor. A noção de funções quase-legislativa e quase-judicial, fator principal da decisão, não ajuda muito. [ n 363 ] O ponto para a crítica formalista é que a Constituição não deixa nenhum espaço para a existência de uma entidade governamental “fora” dos três ramos nela expressamente arrolados e o silêncio constitucional sugere que um ente como as agências independentes não poderia existir. O formalismo constitucional fornece, no mínimo, um poderoso argumento contra a existência de agências independentes como também um argumento contra a Gramm-Rudman-Hollings Act e o veto legislativo. O Presidente – e não os administradores independentes -- é o agente especificado constitucionalmente para a execução da lei federal criada pelo Congresso. Entretanto, há vários argumentos contra a posição formalista. O texto da Constituição e sua história [ n 364] não garantem um fundamento inequívoco para os ataques à administração independente; e a mudança no caráter da moderna presidência torna irreal acreditar na intenção dos Fundadores ou fingir que ela poderia ser mecanicamente aplicada aos problemas atuais. À luz das enormes mudanças na natureza da presidência, a decisão de criar um Executivo unitário não poderia ser tratada como se isto resolvesse o problema. E mais, a decisão de permitir a criação de agências “independentes” poderia ser entendida como um necessário quid pro quo para a negação da doutrina da vedação de delegação de poderes. O artefato da agência independente permite que o poder presidencial no processo de criação do direito, que conheceu um aumento sem precedentes desde o New Deal, seja limitado pelo Congresso. Nesse sentido, poder-se-ia considerar que a figura da agência independente aproxima o governo nacional do sistema original de freios e contrapesos. Além disso, o termo “independente” é na prática uma qualificação errada. Há formas de controle sobre as agências tanto pelo Congresso como pelo Presidente. [ n 365 ] Mesmo se a Constituição pudesse impedir o Congresso de criar agências reguladoras totalmente imunes ∗ N.T.: sigla da Federal Trade Comission, já referida em nota anterior. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 50 ao controle presidencial, a criação pelo Congresso de agências não precisaria ser entendida nesses termos. Embora a crítica formalista contra as agências independentes estivesse, ao menos implicitamente, em questão em Bowsher, a Corte tentou contornar o problema. A Corte indicou que sua decisão não tinha nenhuma influência na constitucionalidade da concepção de administração independente. [ n 366 ] A linguagem da Corte em Bowsher, contudo, pode ter um impacto nesta matéria de modo compatível com a abordagem funcional. A Corte decidiu que os motivos arrolados para a destituição do Comptroller General pelo Congresso – ineficiência, negligência e abuso de poder – eram “muito amplos” e permitiam a exoneração no caso de “qualquer transgressão explícita ou perceptível da vontade do legislativo”. [ n 367 ] Até o momento, as leis que criaram as agências independentes utilizam quase exatamente a mesma linguagem. Se esta linguagem gera uma competência “muito ampla” para a exoneração, as chamadas agências independentes não são na prática independentesdo controle presidencial. [ n 368] Qualquer que seja o significado último de agência independente e se ele tem ou não respaldo constitucional, não deveria causar surpresa se os recentes ataques à independência e o correspondente declínio da concepção de Administração Pública do New Deal eventualmente conduzissem ao aumento do controle presidencial de todas as agências reguladoras. Tal desdobramento seria altamente desejável. Compreendida funcionalmente, a total independência ameaça princípios centrais de responsabilização eleitoral. Há evidências de que a falta de responsabilização das agências reguladoras independentes tem dado ensejo a abusos. [ n 369 ] Os compromissos constitucionais para evitar o facciosismo e limitar o hiato entre governantes e governados tende a fortalecer a idéia de supervisão presidencial. As mais variadas políticas subjacentes à noção de presidência unitária também são relevantes. Em todo caso, não há razão para se acreditar que o modelo de agência independente – se indepedência for compreendida de forma literal – é necessário para levar a cabo os principais propósitos substantivos do modelo de administração do New Deal. [ n 371 ] Além disso, tal controle aumenta a probabilidade de se alcançar um importante objetivo institucional do New Deal – fazer com que os agentes públicos sirvam ao direito público. Ao mesmo tempo, a supervisão presidencial das agências independentes poderia ser um passo adicional na reintrodução de mecanismos de freios e contrapesos nos atuais processos administrativos, completando as várias medidas descritas e defendidas acima. IV. REGULAÇÃO, DIREITOS E AUTO-DETERMINAÇÃO LOCAL A discussão até aqui abrangeu primariamente o desafio que o New Deal trouxe para o sistema de freios e contrapesos e a reação àquelas inovações no último quarto de século. Como discutido acima, entretanto, o New Deal alterou significativamente dois outros aspectos da estrutura constitucional: os direitos individuais e o federalismo. Os reformadores que fizeram o New Deal rejeitavam as linhas básicas do common law e do status quo para a definição de direitos substantivos, e acreditavam que a presidência e as agências reguladoras contribuiriam mais para a auto-determinação democrática do que o governo local ou dos Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 51 estados. Uma discussão completa sobre constitucionalismo após o New Deal precisa então se dirigir não apenas às questões das instituições nacionais, mas também àquelas envolvendo os direitos individuais e o federalismo. Tal discussão necessita também lidar com o aspecto substantivo da reforma do direito administrativo, em oposição ao aspecto institucional. [ n 372] Para os presentes propósitos, umas poucas observações devem bastar. A. Direitos Os reformadores que fizeram o New Deal afirmavam que o catálogo de direitos protegidos pelo common law não era natural ou pré-político, mas uma escolha social consciente. [ n 373] Este entendimento alterou dramaticamente as linhas básicas para distinção entre “ação” e “inércia” governamental, ou neutralidade e partidarismo não permissível – um ponto que o direito público moderno tem reconhecido de forma insuficiente. Na era pré-New Deal, os juízes às vezes viam os desvios em relação ao common law e ao status quo como uma interferência na ordem natural, como violações inaceitáveis dos princípios da neutralidade e do não partidarismo. Este era o entendimento que prevaleceu na era Lochner, durante a qual uma agressiva Suprema Corte identificou as exigências da cláusula do devido processo legal com aquelas do common law [n 374] Quando a Corte rejeitou Lochner, ela o fez em grande medida com base na concepção de que as linhas básicas do common law, até então seguidas pela Corte, não mais eram justificáveis. [n 375] A Corte reconheceu que o respeito pelas linhas básicas do common law e pela distribuição vigente de riqueza e de direitos subjetivos poderia por si próprio ser o produto de uma “ação” governamental ou o resultado de uma facção; o common law era em si mesmo uma criação do sistema jurídico. [n 376] A lição do fim da era Lochner era que as linhas básicas do common law ou do status quo não mais deveriam ser utilizadas de forma inconsciente no direito público. Não obstante esse entendimento, as concepções de direito subjetivo anteriores ao New Deal permeiam o direito público moderno. Por exemplo, as doutrinas sobre o controle judicial da ação administrativa dependem largamente do common law. Os interesses dos beneficiários da regulação não são sempre passíveis de submissão ao Judiciário, especialmente quando se trata do problema da legitimidade processual para acionar o controle judicial da “inércia” das agências. [ n 377] A state action doctrine não busca verificar se o Estado “atuou” ou não, mas constatar se a ação estatal deu-se nos limites de funções governamentais consideradas normais ou naturais, [ n 378] em grande medida a partir do ponto de vista do common law. A revogação parcial das regras de proteção da propriedade imóvel (trespass law) pode ser considerada, sem dúvida, state action, possivelmente inconstitucional, [ n 379] enquanto a execução daquelas mesmas regras, assim como a revogação de uma lei proibindo a discriminação racial, são tratadas como constitucionalmente legítimas, e talvez não configurem mesmo state action. [ n 380] De modo semelhante, o direito à audiência depende em parte de estar ou não em questão um interesse reconhecido pelo common law ou um interesse que se reputa “criado pelo governo”. O direito do devido processo legal portanto reflete uma distinção, baseada em categorias do common law, entre direitos positivos e naturais, [ n 381]- uma distinção que foi repudiada durante o New Deal. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 52 O debate sobre direitos “positivos” e “negativos” também depende das diretrizes escolhidas. O caráter “positivo” ou “negativo” de um direito depende de ele exigir ou não mudanças nas práticas existentes. A seleção de tais diretrizes tem sido crucial em casos envolvendo a imposição de deveres “afirmativos” ao governo. A defesa das regras de proteção da propriedade imóvel é, assim, geralmente percebida como uma garantia negativa, enquanto a proteção aos direitos de bem-estar é vista como positiva. [ n 382] Distinções deste tipo ensejam não um questionamento sobre o caráter “positivo” ou “negativo” dos direitos, mas sim sobre como elas influenciam a vinculação do governo às categorias do common law. Casos envolvendo discriminação por raça e gênero levantam questões similares. Assim, por exemplo, o ataque constitucional à “ação afirmativa” depende da aceitação, como linha básica, da distribuição existente de benefícios e ônus entre negros e brancos e homens e mulheres. Se a distribuição existente fosse vista como um produto de decisões públicas e privadas, seria mais difícil sustentar que a indiferença quanto à raça, como refletida nos resultados do mercado, era decorrente da “neutralidade” ou “inércia”. De forma análoga, leis de combate à discriminação sexual são marcadas por um debate acerca do caráter “real” ou socialmente construído das diferenças. [ n 383] Uma abordagem coerente com os argumentos do New Deal reconheceria que mesmo diferenças “reais” têm seu significado dado por práticas legais e sociais. [ n 384] Tal abordagem reconheceria, por exemplo, que o tratamento legal de direitos de reprodução e aborto levanta questões não somente sobre privacidade, mas também sobre discriminação sexual. [ n 385]Uma tarefa maior para o futuro é trazer a concepção básica do New Deal – o caráter socialmente construído dos direitos subjetivos – para influenciar a doutrina atual. [ n 386] Tal passo produziria significativas mudanças nas linhas básicas a partir das quais decisões são tomadas. [ n 387] Uma possível meta seria produzir uma teoria dos direitos individuais que seja às vezes crítica de práticas existentes, que não seja meramente positivista, e que não se baseia no status quo ou no common law para avaliar resultados jurídicos. Esta tarefa é grande, e é duvidoso que o Judiciário possa realizá-la sozinho. Os Poderes Legislativo e Executivo precisam exercer um papel importante. O esforço, discutido acima, [ n 388] para colocar os interesses dos beneficiários da regulação na mesma posição daqueles das indústrias reguladas seria um passo importante nessa direção, e serviria como um modelo para o futuro. B. Auto-Governo Republicano e Reforma Substantiva No sistema constitucional original, o federalismo proveu um caminho para a auto- determinação local. O auto-governo dos cidadãos poderia ser atingido mediante os governos estadual e local. [ n 389] Ao mesmo tempo, os estados e o governo nacional controlar-se-iam reciprocamente, [ n 390] gerando um controle vertical sobre a opressão governamental. Competição entre estados por residentes atuaria como uma salvaguarda adicional, encorajando políticas humanas e eficientes. No período do New Deal, contudo, a crença no localismo parecia irrealista ou perversa. Os governos dos estados pareciam ser mais um fórum para pressões particularistas locais do que Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 53 para o auto-governo republicano. [ n 391] Os estados estavam muito longe de permitir uma democracia face-a-face (face-toface democracy). A noção de freios e contra pesos verticais entre esferas local e federal que competiam entre si parecia inconsistente com a necessidade de uma intervenção governamental ativa para contrabalançar os efeitos da Depressão. A competição entre estados teria um efeito concorrencial contraproducente (a “race to the bottom”), que iria prejudicar os desavantajados e inviabializar a ação estatal coordenada. Os reformistas do New Deal de bom grado abandonaram a crença na auto-determinação através do governo local e olharam, ao invés, para instituições nacionais, e em particular para agências reguladoras e para a presidência, a fim de satisfazer as aspirações democráticas. [ n 392] Nos anos trinta, havia uma boa razão para esta posição. Condições econômicas, em particular, fizeram medidas locais parecerem desesperançosamente inadequadas. Numa análise retrospectiva, contudo, o abandono indiscriminado das metas originais do federalismo por parte do New Deal foi míope. Os protagonistas do New Deal eram extremamente descuidados no tratamento do problema. Instituições nacionais são, quando muito, uma arena imperfeita para a busca de auto-determinação pelos cidadãos, e controles federais são com freqüência excessivamente rígidos e ineficientes. A presidência, por si só, embora visível, dificilmente pode funcionar como um fórum para um auto-governo republicano. Com mais importância, a experiência tem mostrado que a crença do New Deal em que a administração autônoma serviria a metas democráticas era injustificada. A agência administrativa moderna tem diminuído as ligações entre os processos governamentais e os cidadãos. Embora o revigoramento dos mecanismos de freios e contra pesos devesse aumentar o caráter democrático da administração federal, não se pode mais acreditar que agências federais possam servir como uma saída para aspirações democráticas. A este respeito, a estrutura original da soberania dual era de longe superior ao entendimento do New Deal. No último quarto de século, tem havido numerosos esforços de desenvolvimento de mecanismos que assegurem a participação do cidadão nas esferas pública e privada. [ n 393] A tarefa para o futuro é incorporar os entendimentos do New Deal sobre as conseqüências potencialmente destrutivas das competições interestaduais, [ n 394] bem como as percepções mais recentes do efeito freqüentemente negativo da autonomia do estado sobre grupos com desvantagens, [ n 395] a um sistema que busque promover diversidade geográfica, auto- determinação local e participação dos cidadãos no governo. Esta tarefa também é enorme, mas é possível identificar algumas reformas promissoras. Uma estratégia seria reformular esquemas regulatórios nacionais, tomando a forma de regras prescritivas, mediante uma espécie de “direito reconstitutivo” (“reconstitutive law”) que permitisse maior flexibilidade local, estadual e do setor privado. [ n 396] Abordagens reconstitutivas não pretendem determinar resultados especiais; elas são portanto distintas de, por exemplo, padrões de bem-estar ou padrões ocupacionais nacionais e de regulação de “comando e controle” que exigem que empresas ou estados reduzam a poluição até um certo nível por meios e em momentos específicos. Abordagens reconstitutivas tentam promover Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 54 propósitos reguladores através de métodos flexíveis como realocação de direitos, alteração de procedimentos ou mudanças de limites jurisdicionais. Tais métodos incentivam mas não forçam resultados especiais, ao contrário, criam incentivos ou pressões que, no entanto, permitem flexibilidade privada e local num mercado reestruturado. Algumas abordagens reconstitutivas incluem proteger e incentivar negociações coletivas no direito do trabalho, ao invés de impor padrões uniformes nacionais, [ n 397] ou organizar um sistema de autorizações negociáveis de poluição, ao invés de manter um modelo repressivo de controle ambiental nacional, [n 398] permitir formas diversas de regulação da radiodifusão em comunidades diferentes, e afrouxar as exigências nos programas de concessões federais. [ n 399] Na área social, os estados talvez pudessem receber alguns poderes atualmente reservados ao governo federal. Tal esforço talvez tivesse como objetivo o encorajamento da experimentação e a diversidade de treinamento profissional para os desempregados. Outra abordagem para promover a auto-determinação é o movimento direcionado à democracia na economia e no local de trabalho, [ n 400] que tem a vantagem de buscar participação e auto- determinação em áreas em que o cidadão esteja ativamente engajado. [ n 401] Em todos estes contextos, funcionários públicos locais e estaduais talvez pudessem receber competência para estabelecer procedimentos e impor tipos diferentes de controles. O governo federal poderia criar tetos e bases para permitir a discricionariedade do administrador local. Estratégias deste tipo, entretanto, deveriam ser adotadas apenas em certas áreas. Como os reformistas do New Deal percebiam, a competição entre os estados possui seu lado negativo. Os estados freqüentemente tentam se superar no esforço de atrair indústrias que produzem empregos e receita, eliminando normas importantes, [ n 402] como as relativas à segurança e à proteção da saúde no trabalho. Além disso, pressões competitivas tornam garantias mínimas de renda e serviços sociais extremamente difíceis de serem fornecidos ao nível estadual. [ n 403] Mais que isso, em alguns casos, um compromisso moral nacional, freqüentemente tendo fundamentos constitucionais, requer padrões federais uniformes – um ponto que é sustentado pelos freqüentes efeitos negativos que a autonomia local e estadual gera para os grupos tradicionalmente desprivilegiados. [ n 404]Discriminação por raça e gênero é uma área particularmente imprópria para ser deixada sob responsabilidade dos estados. A justificativa para exigência de regras de âmbito nacional é então mais forte quando a competição entre estados traz a regulação e a redistribuição de renda para abaixo do nível ótimo, quando se criam externalidades interestaduais (interstate spillovers) ou efeitos carona (freee-rider effects), e quando fortes compromissos morais demandam uniformidade. A justificativa para a desregulação e para a transferência de atribuições regulatórias para autoridades locais e estaduais geralmente depende do propósito de um programa regulatório. Alguns programas regulatórios são desenhados para promover metas econômicas; [ n 405] alguns são redistributivos; [ n 406] outros são desenhados para proteger direitos. [ n 407] Alguns programas regulatórios têm o objetivo de moldar preferências, [ n 408] para refletir os resultados dos processos deliberativos entre os cidadãos e os representantes, ou para promover valores de interesse público ou não-materiais (noncommodity values). [ n 409] Tais medidas incluem regulação de radiodifusão, proteção do meio ambiente, [ n 410] e proibição de discriminação por raça e gênero. [ n 411] Esforços para classificar e especificar Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 55 os vários propósitos da regulação com freqüência revelam que a desregulação ou a transferência de atribuições para estados e localidades serão benéficas. A meta básica da desregulação, da descentralização e de estratégias reconstitutivas é promover produtividade econômica, diversidade e flexibilidade, ao mesmo tempo em que reconhece a necessidade, por razões econômicas e não econômicas, de uma intervenção substancial de caráter nacional nos mercados privados. Por meio de relaxamento de controles nacionais, estas estratégias iriam também promover a auto-determinação no nível local. Tais estratégias deveriam ser vistas, acima de tudo, como um esforço para integrar as reformas de direitos do New Deal à existência, no regime constitucional original, de oportunidades para a auto-determinação local. Assim, movimentos em direção ao controle local são o análogo, no nível vertical, ao restabelecimento do sistema de freios e contra-pesos no nível horizontal. Em conjunto, tais reformas promoveriam os propósitos do plano constitucional original sem adotar as linhas básicas do common law ou do status quo, nem regredir para concepções anacrônicas de direitos privados. V. Conclusão A distribuição de poderes nacionais foi desenhada para garantir uma nítida divisão do trabalho, para promover a deliberação no governo e para prover uma série de freios contra o poder das facções e a representação de interesses particularistas. O marco constitucional original estava também associado ao sistema do common law, porque os mecanismos de freios e contrapesos tornavam a ação nacional mais difícil, permitindo, portanto, que os estados e os juízes do common law estabelecessem os termos básicos da regulação. Em sua dimensão substantiva, o constitucionalismo do New Deal rejeitou de forma consciente o common law. Entendia-se que um novo conceito de direitos subjetivos era necessário para proteger os trabalhadores, os pobres, os idosos, os consumidores e outros em situação menos favorecida pela lógica competitiva do mercado. Acima de tudo, o constitucionalismo do New Deal reconheceu que as linhas básicas derivadas do common law ou do status quo não mais proviam pontos de vista neutros ou naturais para a tomada de decisões jurídicas. A proposta institucional do New Deal formou-se naturalmente a partir dessa crítica. Na visão dos reformadores dos anos trinta, a distribuição original dos poderes nacionais obstruía a ação governamental necessária. A proposta do New Deal era tanto aumentar o poder da presidência quanto criar a figura da agência administrativa moderna, composta por funcionários públicos tecnicamente sofisticados, perseguindo o interesse público. Esperava- se que as agências do New Deal energizassem o governo e escapassem da paralisia associada ao Judiciário e ao sistema de freios e contrapesos. Desta forma, o período do New Deal passou por um ataque simultâneo ao legado substantivo e institucional do regime constitucional original. O constitucionalismo do New Deal manteve um grau de continuidade em relação à crença madisoniana em um governo deliberativo, mas os reformadores dos anos trinta desejavam que a deliberação levasse a uma mudança – e não Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 56 à preservação -- da distribuição vigente de riqueza e benefícios legais. Nas últimas três décadas, tem-se assistido a uma crescente rejeição da concepção de Administração Pública do New Deal, embora a crítica substantiva ao common law tenha permanecido em larga medida intacta. Por lhes faltarem os mecanismos de freios e contra- pesos internos, as agências administrativas apresentam riscos especiais do ponto de vista da distribuição tradicional de poderes nacionais. Perigos como o facciosismo e a representação de interesses particularistas têm sido a principal preocupação do direito administrativo moderno. Muitas propostas para reforma regulatória, seja judicial, executiva, ou legislativa, desenvolvem-se a partir dessa preocupação. O declínio da estrutura institucional do New Deal manifestou-se primeiramente no Judiciário, à medida em que juízes desenvolveram doutrinas com o objetivo de eliminar fundamentos inadmissíveis para as decisões regulatórias. A conseqüência disso é a moderna hard look doctrine, que repousa numa concepção deliberativa de Administração Pública. Entendida de forma adequada, a doutrina protege os beneficiários da regulação do mesmo modo que os regulados. Presidentes americanos também têm tido um controle cada vez maior sobre a burocracia, mais recentemente delegando poder de supervisão para OMB. Em adição, o Congresso estabeleceu prazos que são vinculantes, executáveis judicialmente, leis que estipulam “metas” e diretrizes regulatórias precisas para assegurar que agências reguladoras não subvertam as leis reguladoras no processo de implementação. Os três ramos do governo têm então se intrometido na autonomia das agências por modos que têm restaurado algumas das características da estrutura constitucional original. Os recentes exercícios de poder por cada ramo do governo rejeitam o conceito de Administração Pública do New Deal. Tudo tem sido altamente controverso. Critica-se o controle judicial por significar a substituição de agentes públicos com especialização técnica e responsabilidade política por juízes destituídos dessas características. O poder presidencial tem gerado ataque afiado por parte de críticos favoráveis a um modelo de autonomia administrativa do New Deal. A especificação da legislação por parte do Congresso é tida como criadora do aumento de riscos associados ao facciosismo e à falta de competência técnica. Os controles simultâneos pelos três Poderes podem, no entanto, estar fortemente amarrados ao ideal subjacente de governo deliberativo e aos propósitos da distribuição original dos poderes nacionais. Estes controles podem assegurar que as decisões das agências levem em consideração a legislação pertinente, fatos técnicos e a “política” propriamente compreendida. É um erro adotar um conceito de administração totalmente tecnocrático ou totalmente político. A abordagem deliberativa esboçada aqui mantém continuidade com ambos, a estrutura original e o New Deal, e concilia escolhaspolíticas e especialização técnica. Um sistema de supervisão pelos Poderes definidos na Constituição não produz uma adesão cega ao status quo. Através da multiplicação de vias de acesso ao governo, esse sistema pode, ao contrário, aumentar as oportunidades para grupos procurarem e alcançarem as mudanças que desejam. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 57 A tarefa para o futuro é atingir alguns dos propósitos subjacentes à distribuição de poderes sem abandonar o entendimento de que o sistema de regulação do common law é insuficiente. Esta tarefa tem três componentes. No nível nacional, a meta é promover representação madisoniana enquanto se fornecem proteções contra o facciosismo e a representação de interesses particularistas. No nível local, a tarefa é promover os ideais de diversidade, participação e auto-governo, de modo tal a perseguir os objetivos republicanos tradicionais, que são inadequadamente servidos tanto pelo governo do Estado moderno ou pela presidência. [ n 412] Em termos de direitos subjetivos, a meta é desenvolver uma série de direitos que não tomem do common law ou do status quo as diretrizes para decisão. Neste contexto, idéias do New Deal têm sido insuficientemente incorporadas ao direito público moderno, que continua a confiar em argumentos questionáveis de “neutralidade” e “inércia”. Todas estas tarefas são formidáveis. Em especial, a noção madisoniana de representação em certa medida foi se desmontado na prática, [ n 413] e o sistema de freios e contra pesos encontra-se intimamente associado ao o medo da “ação” governamental e à aceitação da “inércia” governamental. A transferência de atribuições aos estados precisa ser seletiva e necessita proteger-se contra eliminação de proteções reguladoras que somente instituições nacionais são aptas para oferecer. O desenvolvimento de um sistema de direitos subjetivos que rejeita linhas básicas do status quo é enormemente difícil. Reformas como as aqui sugeridas necessitam ser parte de uma estratégia bem mais ampla de reconstrução do sistema constitucional à luz do que ocorreu durante e após o New Deal. Não deve ser otimista demais, contudo, sugerir que apontamos algumas das estruturas com as quais é possível começar a tarefa da integração do crescimento da burocracia e a rejeição do common law num sistema que busque diminuir os riscos da tirania das facções e da representação de interesses particularistas. --------- Obs.: algumas notas trazem referências à paginação original do texto, da revista em que foi publicado. Essas referências estão destacadas em amarelo, para que sejam alteradas a partir do cotejamento com o corpo do texto original em inglês, quando da revisão da diagramação final do livro, já com sua paginação definida. IMPORTANTE: somente os números de páginas marcadas em amarelo devem ser adaptadas à nova paginação do livro. Nota “a”. Professor de Direito da Faculdade de Direito e do Departamento de Ciência Política da Universidade de Chicago. Partes desse trabalho foram apresentadas no encontro anual da American Political Science Association em setembro de 1987, no encontro anual da American Association of Law Schools, em janeiro de 1987, e na NEH/Federalist Society Conference on the Bicentennial of the Constitution, em Chicago, Ilinois, em novembro de 1986. O autor gostaria de agradecer a Bruce A. Ackerman, Akhil Amar, Walter Blum, Clark Byse, Robert Clark, David P. Currie, Christopher Edley, Richard Fallon, Robert Ferguson, Donald Gjerdingen, Barry Karl, Frank I. Michelman, Martha Minow, Henry P. Monaghan, Richard A. Posner, Carol M. Rose, Susan Rose-Ackerman, Richard B. Stewart, David A. Strauss, Peter L. Strauss, Kathleen Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 58 Sullivan e aos demais participantes no Workshop sobre direito e governo da Universidade de Chicago pelo auxílio precioso. Veronica Dougherty and Daniel B. Rodriguez contribuíram com valiosas sugestões e com assistência na pesquisa. Nota 1. O período inicial de crescimento das agências reguladoras ocorreu antes do New Deal, no final do século 19 e nas duas primeiras décadas deste século. Ver, a respeito, S. SKOWRONEK, BUILDING A NEW AMERICAN STATE: THE EXPANSION OF NATIONAL ADMINISTRATIVE CAPACITIES, 1877-1920 (1982) (traz uma análise do início do desenvolvimento do Estado Administrativo moderno). É importante ressaltar que o New Deal estava longe de constituir um todo homogêneo. Havia vertentes que concorriam entre si e diversos períodos distintos de experimentação, com diferentes ênfases. Apesar de todo seu caráter inovador, o New Deal não consistiu numa mudança global abrupta; ele deveria antes ser visto como o auge de um conjunto de idéias com origens muito anteriores. Ver, a respeito, id.; W. WILSON, CONGRESSIONAL GOVERNMENT: A STUDY IN AMERICAN POLITICS 22-23 (1981) [daqui por diante, W. WILSON, CONGRESSIONAL GOVERNMENT] (descreve “a nova liderança do Executivo”); W. WILSON, CONSTITUTIONAL GOVERNMENT IN THE UNITED STATES 57-81 (1921) [daqui por diante, W. WILSON, CONSTITUTIONAL GOVERNMENT]; id. pág. 60 (relata a ascensão do Presidente “como a força unificadora no nosso complexo sistema, o líder de seu partido e da nação”); W. WILSON, THE NEW FREEDOM: A CALL FOR THE EMANCIPATION OF THE GENEROUS ENERGIES OF THE PEOPLE 5-8 (1961) (detalha a capanha de Wilson para regular os trustes). A discussão neste artigo portanto é estilizada, enfatizando as características predominantes. Para uma análise do período, ver P. CONKIN, THE NEW DEAL (2d ed. 1975); K. DAVIS, FDR: THE NEW DEAL YEARS, 1933-1937 (1986); O. GRAHAM, JR., TOWARD A PLANNED SOCIETY (1976); E. HAWLEY, THE NEW DEAL AND THE PROBLEM OF MONOPOLY (1966); R. HOFSTADTER, THE AGE OF REFORM (1955); B. KARL, THE UNEASY STATE (1983); J. PATTERSON, CONGRESSIONAL CONSERVATISM AND THE NEW DEAL (1967); J. PATTERSON, THE NEW DEAL AND THE STATES: FEDERALISM IN TRANSITION (1969). Nota 2. Ver infra pp. 432-33. Nota 3. Ver, e.g., M. BERNSTEIN, REGULATING BUSINESS BY INDEPENDENT COMMISSIONS 35-39 (1955). Ver também, a respeito, R. HOFSTADTER, nota 1, supra, pp. 232-36 (descreve os esforços de Theodore Roosevelt para criar uma administração apartidária); S. SKOWRONEK, nota 1, supra, pp. 177-211 (discute o objetivo do movimento progressista de reformulação da Administração). Nota 4. Ver infra pp. 437-38. Nota 5. Ver infra pp. 437-40. Nota 6. F. D. Roosevelt, Message to the Congress on the State of the Union (11 de janeiro de 1944), reimpresso em 13 THE PUBLIC PAPERS AND ADDRESSES OF FRANKLIN D. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 59 ROOSEVELT, VICTORY AND THE THRESHOLD OF PEACE, 1944-45, p. 41 (1950). O Presidente Roosevelt descreveu a origem do termo “New Deal” dessa forma: “A palavra ‘Deal’ implicava que o governo, por si mesmo, iria utilizar ações afirmativas para realizar seus objetivos, ao invés de parar e esperar que as leis gerais da economia sozinhas os concretizassem. A palavra ‘New’ implicava que uma nova ordem de coisas idealizada para beneficiar a grande massa de nossos produtores agrícolas, trabalhadores e empresários substituiria a velha ordem de privilégios em uma Nação totalmente insatisfeita com o sistema vigente”. F. D. Roosevelt, 2 THE PUBLIC PAPERS AND ADDRESSES OF FRANKLIN D. ROOSEVELT, THE YEAR OF CRISIS, 1933, p. 5 (1938). Nota 7. Ver Dunn, Regulation by Commission, 199 N. AM. REV. 205, 205-06 (1914) (discute a inabilidade dos tribunais, do Legislativoe Executivo em exercer a função de regular de forma adequada); ver também J. LANDIS, THE ADMINISTRATIVE PROCESS 10-46 (1938) (argumenta em favor das agências, comparando-as aos tribunais); Eastman, The Place of the Independent Commission, 12 CONST. REV. 95 (1928) (discute a função e o lugar da comissão independente dentro do governo). Nota 8. Ver infra, pp. 440-41. Nota 9. Embora as agência administrativas tenham sido parte do governo desde o começo da república, a moderna agência reguladora é um fenômeno recente. A Interstate Commerce Commission foi criada em 1887 e a Federal Trade Commission, em 1914, mas foi somente com o New Deal que a figura da moderna agência tornou-se um elemento marcante do governo norte-americano. Onze agências foram criadas entre a elaboração da Constituição e o fim da Guerra Civil; seis foram criadas de 1865 até a virada do século; nove agências foram criadas de 1900 até o final da Primeira Guerra Mundial; outras nove foram criadas entre 1918 e a Depressão de 1929; e não menos que 17 foram criadas na década entre 1930 e 1940. Ver ATTORNEY GENERAL'S COMMITTEE ON ADMINISTRATIVE PROCEDURE, FINAL REPORT 7-11 (1941) [daqui por diante, ATTORNEY GENERAL'S COMMITTEE]. Estas agências do New Deal incluíam o Federal Home Loan Bank Board, a Federal Deposit Insurance Corporation, a Securities and Exchange Commission, o Social Security Board, o National Labor Relations Board, a Commodity Exchange Commission, o Railroad Retirement Board, a Wage and Hour Division of the Department of Labor, e o Selective Service Administration. Ver id. pp. 10-11. Além disso, é claro, novas atribuições foram conferidas às instituições estabelecidas nesse período. [N.T.: a Interstate Commerce Comission (ICC) foi criada em 1887, com o propósito inicial de regular as atividades relacionadas ao setor de transporte ferroviário, tendo sido substituída, em 1995, pelo Surface Transportation Board (STB). A Federal Trade Commission (FTC) é o órgão de defesa da concorrência e do consumidor dos E.U.A.]. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 60 Nota 10. Ver infra, pp. 444-45. Discute-se o grau de imunidade em relação ao controle presidencial que foi idealizado para as agências, ou o quão imunes elas foram de fato. Ver id.; infra, nota 352. Nota 11. Ver J. LANDIS, nota 7, supra, pp. 30-40 (descreve os limites institucionais da capacidade do Judiciário para regular a atividade econômica); Hale, Coercion and Distribution in a Supposedly Noncoercive State, 38 POL. SCI. Q. 470, 478-81 (1923) (discute a coerção nos mercados). Nota 12. Ver nota 391, infra, e respectivo texto. Nota 13. Ver infra, pp. 502-03. Nota 14. Ver Northern Pipeline Constr. Co. v. Marathon Pipeline Co., 458 U.S. 50 (1982). Nota 15. Ver infra, pp. 474-78 (discute a possibilidade de controle judicial e as questões relacionadas à legitimidade processual). Nota 16. O presidente Reagan, por exemplo, não alterou fundamentalmente o Estado Regulador. Durante seu primeiro mandato, ele se pronunciou de modo favorável à “rede de proteção social”, e suas intervenções no campo do gasto público e da regulação não pretendiam eliminar certos patamares mínimos. Ver, a respeito, MAINTAINING THE SAFETY NET: INCOME REDISTRIBUTION PROGRAMS IN THE REAGAN ADMINISTRATION (J. Weicher ed. 1984) (analisa as mudanças no seguro-desemprego e nos programas redistributivos durante o primeiro mandato de Reagan). Nota 17. Ver, e.g., Davis, Presidential Control of Rulemaking, 56 TUL. L. REV. 849, 853-56 (1982); Morrison, OMB Interference with Agency Rulemaking: The Wrong Way to Write a Regulation, 99 HARV. L. REV. 1059, 1064-71 (1986) [daqui por diante, Morrison, OMB Interference with Agency Rulemaking]; Morrison, Presidential Intervention in Informal Rulemaking: Striking the Proper Balance, 56 TUL. L. REV. 879, 897-902 (1982) [daqui por diante, Morrison, Presidential Intervention in Informal Rulemaking]. Os tribunais acabaram por invalidar muitos esforços desregulatórios. Ver, e.g., Motor Vehicle Mfrs. Ass'n v. State Farm Mut. Auto. Ins. Co., 463 U.S. 29 (1983) (declara inválida a revogação por uma agência de regulamento sobre equipamentos de segurança em automóveis; Action for Children's Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 61 Television v. FCC, 821 F.2d 741, 745-77 (D.C. Cir. 1987) (invalida a desregulamentação das diretrizes de comercialização em programas de televisão infantis); Independent U.S. Tanker Owners Comm'n v. Dole, 809 F.2d 847, 853-55 (D.C. Cir. 1987) (invalida a desregulação dos navios subsidiados da marinha mercante), cert. denied, 56 U.S.L.W. 3243 (U.S. Oct. 6, 1987); Garland, Deregulation and Judicial Review, 98 HARV. L. REV. 507, 534-41 (1985) (descreve casos de desregulação na administração Reagan); Sunstein, Deregulation and the Hard-Look Doctrine, 1983 SUP. CT. REV. 177, 190-91. Os tribunais também exerceram seu controle sobre a inércia da Administração, chegando algumas vezes a compelir o Poder Público a agir. Ver, e.g., Doyle v. Brock, 821 F.2d 778, 783-87 (D.C. Cir. 1987) (invalida uma decisão da Secretary of Labor de não questionar o procedimento de eleição de um sindicato); NAACP v. Secretary of Hous. & Urban Dev. (HUD), 817 F.2d 149, 157-61 (1st Cir. 1987) (exige que o HUD siga as políticas antidiscriminatórias do Fair Housing Act); Public Citizen Health Research Group v. Auchter, 702 F.2d 1150 (D.C. Cir. 1983) (determina que o OSHA edite normas sobre a exposição ao óxido de etileno nas indústrias); Carpet, Linoleum & Resilient Tile Layers Local 419 v. Brown, 656 F.2d 564 (10th Cir. 1981) (controlando a falha das agências em implementar o Davis-Bacon Act). Entretanto, ver Heckler v. Chaney, 470 U.S. 821 (1985) (cria uma presunção contrária ao controle judicial da omissão das agências na tarefa de execução da lei). [N.T.: OSHA é a sigla da Occupational Safety and Health Administration, criada em 1971, com o objetivo de zelar pela segurança e saúde no local de trabalho]. Nota 18. Ver, e.g., Gray, Presidential Involvement in Informal Rulemaking, 56 TUL. L. REV. 863, 869-78 (1982); Pierce, The Role of Constitutional and Political Theory in Administrative Law, 64 TEX. L. REV. 469, 520-24 (1985); Scalia, Vermont Yankee: The APA, the D.C. Circuit, and the Supreme Court, 1978 SUP. CT. REV. 345. Nota 19. Cf. C. Edley, Judging Governance: The Structure of Administrative Law (temp. ed. June 26, 1986) (trabalho não publicado, disponível na Biblioteca da Faculdade de Direito de Harvard) (argumenta que a distinção tricotômica entre decisão política, decisão judicial neutra e isenta, e decisão técnica com base em conhecimento científico especializado permeia a visão que o Judiciário tem das decisões administrativas e oferece distinções que desorientam e não têm utilidade). Nota 20 Cf. Morrison, OMB Interference with Agency Rulemaking, supra, nota 17, pp. 1066-67 (censura o OMB por politizar o processo de elaboração normativa das agências, ao criticar as decisões técnicas tomadas pelos especialistas). Nota 21. Ver Davis, nota 17, supra (critica os esforços recentes do Presidente para aumentar seu poder de controle por meio do Office of Management and Budget); Morrison, OMB Interference with Agency Rulemaking, nota 17 supra, pp. 1066-67 (idem). Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 62 Nota 22. Ver infra, pp. 453-56. Nota 23. Ver, e.g., T. LOWI, THE END OF LIBERALISM: THE SECOND REPUBLICOF THE UNITED STATES 298-301 (2a. ed., 1979). Nota 24. Ver nota 286, infra, e respectivo texto. Nota 25. Ver Stewart, Federalism and Rights, 19 GA. L. REV. 917, 918 (1985) (“[D]ecentralized self-government promotes republican values by providing citizens greater opportunities to participate in public and political life and collectively to deliberate and define the character of their community.”). Ver, a respeito, B. BARBER, STRONG DEMOCRACY (1984) (defende a descentralização como forma de promover a democracia participativa). Nota 26 Na área da regulação econômica, contudo, e em premissas econômicas em geral, as concepções do New Deal estavam equivocadas, o que levou à criação de esquemas regulatórios baseados em premissas erradas. Ver a respeito S. BREYER, REGULATION AND ITS REFORM (1982) (discute as falhas regulatórias que freqüentemente resultam da dissociação entre diagnóstico dos problemas do mercado e soluções administrativas aplicadas). Nota 27. Ver infra pp. 431-32. Nota 28. Ver infra pp. 488-89. Nota 29 Ver F. McDONALD, NOVUS ORDO SECLORUM 258 (1985) ('The doctrine of the separation of powers had clearly been abandoned in the framing of the Constitution; as Madison explained in Federalist numbers 47-51, mixing powers was necessary to ensure a system of checks and balances.”). Nota 30. Exemplos de sobreposição de controles incluem o papel do Presidente na elaboração das leis, principalmente a presentment clause; o poder do Congresso de discutir e aprovar as indicações presidenciais; o poder do Congresso de atribuir ao Presidente exclusivamente, ou Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 63 a funcionários de alto escalão ou a tribunais a competência para fazer indicações; o controle judicial e os papéis mesclados do Congresso e do Presidente na área de relações internacionais. [N.T.: a presentment clause consiste na atribuição constitucional do poder de veto ao presidente dos E.U.A., art. I, § 7, cl. 2: “Every bill which shall have passed the House of Representatives and the Senate, shall, before it becomes a law, be presented to the president of the United States; if he approve, he shall sign it, but if not, he shall return it, with its objections, to that house in which it shall have originated (…)”] Nota 31. Ver D. EPSTEIN, THE POLITICAL THEORY OF THE FEDERALIST 93-99 (1984) (discute a visão de Madison sobre os deveres dos representantes de promover o bem público) Nota 32. Ver THE FEDERALIST NO. 10 (J. Madison). Nota 33. Ver Sunstein, Interest Groups in American Public Law, 38 STAN. L. REV. 29, 35-48 (1985) (discute a relação entre a teoria madisoniana e o pensamento republicano clássico) Nota 34. Ver THE FEDERALIST NO. 10 (J. Madison). Nota 35. Ver id. (critica as pequenas repúblicas como arenas propícias para o facciosismo) Nota 36. O papel do pensamento republicano no desenho constitucional é controvertido. Ver, e.g., R. DAHL, A PREFACE TO DEMOCRATIC THEORY 4-33 (1956) (oferece uma abordagem pluralista); Ackerman, The Storrs Lectures: Discovering the Constitution, 93 YALE L.J. 1013, 1016-23 (1984) (sugere a prevalência da “política normal” no sistema original); Diamond, Ethics and Politics: The American Way, in THE MORAL FOUNDATIONS OF THE AMERICAN REPUBLIC 39, 46-49 (R. Horwitz ed. 1977) (enfatiza as crenças dos Fundadores nas disputas particularistas e individualistas). Ver também as fontes citadas abaixo na nota 37. Nota 37. Ver Sunstein, nota 33 supra, 31-32, 35-38. Para diversas interpretações sobre o republicanismo e os fundadores, ver J. DIGGINS, THE LOST SOUL OF AMERICAN POLITICS (1984); J.G.A. POCOCK, THE MACHIAVELLIAN MOMENT 333-552 (1975); Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 64 G. WOOD, THE CREATION OF THE AMERICAN REPUBLIC 1776-1787, 46-90, 430-67 (1969); Banning, Republican Ideology and the Triumph of the Constitution, 1789 to 1793, 31 WM. & MARY Q. 167 (1974); Kramnick, Republican Revisionism Revisited, 87 AM. HIST. REV. 629 (1982); and Shalhope, Republicanism and Early American Historiography, 39 WM. & MARY Q. 334 (1982). Nota 38. THE FEDERALIST NO. 10, 60 (J. Madison) (C. Van Doren ed. 1945). Nota 39. Ver Barber, The Compromised Republic: Public Purposelessness in America, in THE MORAL FOUNDATIONS OF THE AMERICAN REPUBLIC 19, 25-26 (R. Horwitz ed. 1977). Nota 40. Importantes exceções à rejeição madisoniana à democracia direta foram os raros, mas fundamentais, momentos de criação constitucional, dos quais os cidadãos efetivamente participaram. Ver Ackerman, nota 36 supra, 1022-24. O New Deal poderia ser entendido como um “momento constitucional” dessa espécie. Ver id. 1051-57. Nota 41. A discussão que se segue baseia-se naquela desenvolvida em G. STONE, L. SEIDMAN, C. SUNSTEIN & M. TUSHNET, CONSTITUTIONAL LAW 343-45 (1986). Nota 42. James Wilson descreveu a necessidade de um Executivo unitário nestes termos: “[I]n the active scenes of government, there are emergencies, in which the man [who] deliberates, is lost. But, can either secrecy or dispatch be expected, when, to every enterprise, mutual communication, mutual consultation, and mutual agreement among men, perhaps of discordant views of discordant tempers and of discordant interests, are indispensably necessary? . . . If, on the other hand, the executive power of government is placed in the hands of one person, is there not reason to expect, in his plans and conduct, promptitude, activity, firmness, consistency and energy?” -- Discurso de James Wilson, reproduzido em Miller, An Inquiry into the Relevance of the Intentions of the Founding Fathers, with Special Emphasis upon the Doctrine of Separation of Powers, 27 ARK. L. REV. 583, 589 (1973). Ver a respeito Flaumenhaft, Hamilton's Administrative Republic and the American Presidency, in THE PRESIDENCY IN THE CONSTITUTIONAL ORDER 65, 65-112 (J. Bessette & J. Tulis eds. 1981) (discute a posição de Hamilton). Nota 43. Ver a respeito E. CORWIN, THE PRESIDENT: OFFICE AND POWERS 1787-1957, at 3-30 (1957) (discute o Executivo unitário); Strauss, The Place of Agencies in Government: Separation of Powers and the Fourth Branch, 84 COLUM. L. REV. 573, 599-602 (1984) (idem). Este objetivo, porém, não elimina a competência do Congresso para Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 65 estruturar o Poder Executivo. Ver infra p. 498. Nota 44. Ver THE FOUNDERS' CONSTITUTION 491-99 (P. Kurland & R. Lerner eds. 1987) (discute a história da elaboração da Constituição). Nota 45. Ver Flaumenhaft, nota 42 supra, 70-71, 74; id. 70 (argumenta que no sistema hamiltoniano de um governo nacional enérgico, “[o]nly replacing the vestiges of democratic participation by an efficacious administrative system could supply the energy to protect [Americans] against turmoil and invasion and the energy to manage their prosperity,” e conclui que “[t]he rejection of classical politics culminates in the politics of administration”). Essa concepção combina confortavelmente com a teoria da representação de Madison; também antecipa o New Deal. Ver infra pp. 441-42. Nota 46. Ver Holmes, Precommitment and the Paradox of Democracy, in CONSTITUTIONALISM AND DEMOCRACY (J. Elster & A. Slagstad eds., com publicação prevista para 1988). Nota 47. THE FEDERALIST NO. 10, 58 (J. Madison) (C. Van Doren ed. 1945). Nota 48. Esta justificativa apareceem THE FEDERALIST, n. 47 (J. Madison) (C. Van Doren ed. 1945): “The accumulation of all powers, legislative, executive, and judiciary in the same hands, whether of one, a few, or many, and whether hereditary, self-appointed, or elective, may justly be pronounced the very definition of tyranny.” Id. 322. Esta idéia básica pode também ser encontrada na festejada afirmação do juiz Brandeis segundo a qual “doctrine of the separation of powers was adopted by the Convention of 1787, not to promote efficiency but to preclude the exercise of arbitrary power. The purpose was, not to avoid friction, but, by means of the inevitable friction incident to the distribution of the governmental powers among three departments, to save the people from autocracy.” Myers v. United States, 272 U.S. 52, 293 (1926) (Juiz Brandeis, voto vencido). Nota 49. D. EPSTEIN, nota 31 supra, 130 (cita J. LOCKE, TWO TREATISES OF GOVERNMENT 410 (P. Laslett ed. 1965) (3d. ed., 1698)). A esse respeito, o sistema de freios e contrapesos continha uma implícita mas poderosa idéia de proteção igualitária. Nota 50. Ver THE FEDERALIST Nº 51 (J. Madison). Nota 51. O termo econômico é ‘”agency costs”. Ver Jensen & Meckling, Theory of the Firm: Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 66 Managerial Behavior, Agency Costs, and Ownership Structure, 3 J. FIN. ECON. 305 (1976). Nota 52. Ver Levi, Some Aspects of Separation of Powers, 76 COLUM. L. REV. 371, 374 (1976). Nota 53. C. MONTESQUIEU, THE SPIRIT OF THE LAWS 211 (D. Carrithers ed. 1977) (T. Nugent trans. 2d ed. 1748). Nota 54 Ver J. RAKOVE, THE BEGINNINGS OF NATIONAL POLITICS 392-96 (1979); Riesman, Money, Credit, and Federalist Political Economy, in BEYOND CONFEDERATION: ORIGINS OF THE CONSTITUTION AND AMERICAN NATIONAL IDENTITY 128, 150-51 (R. Beeman, S. Botein & E. Carter eds. 1987). Nota 55 Ver G. WOOD, nota 37 supra, 609; ver também J. MAIN, THE ANTIFEDERALISTS: CRITICS OF THE CONSTITUTION 49-50, 162-64, 168-74, 269-81 (1961) (descreve as divergências entre federalistas e antifederalistas em assuntos como renegociação de dívidas, emissão de papel-moeda, e democracia); Hofstadter, The Founding Fathers: An Age of Realism, in THE MORAL FOUNDATIONS OF THE AMERICAN REPUBLIC 73, 79 (R. Horwitz ed. 1977) (ressalta e condena o caráter antidemocrático do arcabouço constitucional tradicional). Nota 56. Sobre o tema da deliberação, ver THE FEDERALIST Nos. 10 and 63 (J. Madison) e THE FEDERALIST Nos. 27, 71, e 73 (A. Hamilton). Nota 57. Ver THE FEDERALIST No. 10 (J. Madison). Nota 58. Madison defendia a criação de distritos eleitorais grandes e mandatos longos na hipótese de o sufrágio se tornar universal, não limitado àqueles com propriedade, baseado na teoria de que mandatos longos em distritos grandes atrairiam “persons of general respectability, and of probable attachment to the rights of property,” que seriam capazes de “to render the Body more stable in its policy, and more capable of stemming popular currents taking a wrong direction, till reason & justice could regain their ascendancy.” Madison, Property and Suffrage: Second Thoughts on the Constitutional Convention, in THE MIND OF THE FOUNDER 394, 399-400 (M. Meyers rev. ed. 1981); no mesmo sentido, F. McDONALD, nota 29 supra, 176-83 (discute a perspectiva de que o período anterior à elaboração da Constituição foi caracterizado por um excesso de democracia); 1 THE Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 67 FOUNDERS' CONSTITUTION, nota 44 supra, 544 (cita uma referência de Rep. Gerry ao “excesso de democracia”). Ver, entretanto, Diamond, nota 36 supra, 68-72 (sugere o caráter democrático das garantias originais). Nota 59. Ver a respeito S. SKOWRONEK, nota 1 supra, pp. 39-46 e 285-92 (assevera que o sistema original era um “Estado de tribunais e partidos”) Nota 60. Ver F. McDONALD, nota 29 supra, pp. 11-40 e 111-14 (mostra a relevância do commom law para o sistema criado pelos Fundadores). Um comentador recente ilustrou esta perspectiva de uma maneira característica do século dezenove. Ver R. EPSTEIN, TAKINGS: PRIVATE PROPERTY AND THE POWER OF EMINENT DOMAIN (1985); Epstein, A Theory of Strict Liability, 2 J. LEGAL STUD. 151 (1973). A concepção que os Fundadores tinham do common law diferia da formulação do século dezenove; assim, a análise histórica que McDonald faz da importância da propriedade e do common law é substancialmente diferente daquela apresentada por Epstein. Nota 61. Ver THE FEDERALIST N. 51 (J. Madison) (descreve o sistema federativo como um método de repartição de poder e, portanto, uma forma de proteção contra o abuso). Nota 62. Ver J. LANDIS, nota 7 supra, pp. 6-46. Nota 63. Ver Stewart & Sunstein, Public Programs and Private Rights, 95 HARV. L. REV. 1193, 1238-39 (1982); J. LANDIS, nota 7 supra, pp. 30-46; M. BERNSTEIN, nota 3 supra, pp. 27-28 (“The courts were accused of . . . lack of sympathy with regulatory objectives . . .. Distrust of the judiciary played an important role in strengthening the case for transferring regulatory responsibilities to an administrative agency.”). Nota 64. A expressão “a era Lochner” refere-se aproximadamente aos anos entre 1905 e 1937, que se seguiram à decisão da Suprema Corte no caso Lochner v. New York, 198 U.S. 45 (1905). Nota 65. O fato de o common law consistir num sistema regulatório que incorpora uma forma de intervenção governamental foi, é claro, uma importante lição do movimento do realismo jurídico. Ver Cohen, Property and Sovereignty, 13 CORNELL L.Q. 8 (1927); Hale, nota 11 supra. Nota 66. Ver F. D. Roosevelt, Acceptance of the Renomination for the Presidency (June 27, Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 68 1936), reimpresso em 5 THE PUBLIC PAPERS AND ADDRESSES OF FRANKLIN D. ROOSEVELT, THE PEOPLE APPROVE, 1936, pp. 230, 234 (1938) (afirma que o governo deve se proteger contra a tirania dos “economic royalists”); nota 6 supra. Nota 67. Ver J. LANDIS, nota 7 supra, pp. 30-46; Hale, nota 11 supra, p. 493. Nota 68. Ver West Coast Hotel Co. v. Parrish, 300 U.S. 379, 399 (1937) (descreve a falha do common law em garantir um salário mínimo como “a subsidy for unconscionable unemployers”); ver também J. LANDIS, nota 7 supra (descreve o crescimento e as formas do processo administrativo a partir das forças econômicas e do desenvolvimento industrial). O entendimento de que o sistema do common law institucionalizou escolhas políticas surgiu antes do New Deal. Ver, e.g., Miller v. Schoene, 276 U.S. 272, 279 (1928) (reconhece que a falha em combater uma injustiça é “none the less a choice”); H. CROLY, THE PROMISE OF AMERICAN LIFE 134, 136 (1909) (“The tendency of the legally trained mind is inevitably and extremely conservative. . . . The existing political order has been created by lawyers; and they naturally believe somewhat obsequiously in a system for which they are responsible, and from which they benefit.”); ver também F. D. Roosevelt, The Constitution of the United States Was a Layman's Document, Not a Lawyer's Contract (Sept. 17, 1937), reimpresso em 6 THE PUBLIC PARPERS AND ADDRESSES OF FRANKLIN D. ROOSEVELT, THE CONSTITUTION PREVAILS, 1937, 359 (1941) (sustenta que a Constituição deveria ser interpretada de modo a promover o bem comum). Nota 69. Ver 5 F. D. Roosevelt, nota 66 supra, pp. 232-34. Nota 70. Ver supra p. 423. Nota 71. 13 F. D. Roosevelt,nota 6 supra, p. 41. Nota 72. A Great Society do Presidente Johnson consideravelmente o rol de direitos do New Deal, a ele acrescentando o direito à não-discriminação, o interesse na proteção ambiental, e direitos materiais fundamentais em áreas como habitação, alimentação, assistência médica e seguridade social. Com essa ampliação, a Great Society permaneceu fiel à filosofia do New Deal tal qual expressada na “Second Bill of Rights” do Presidente Roosevelt. Ver a respeito Vogel, The “New” Social Regulation in Historical and Comparative Perspective, in REGULATION IN PERSPECTIVE 155 (T. McCraw ed. 1981) (compara a regulação durante o New Deal com o arcabouço regulatório relativo ao meio ambiente, à proteção do consumidor e aos direitos civis entre os anos de 1964 e 1977). Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 69 Nota 73. Para uma discussão detalhada, ver O. GRAHAM, JR., citado na nota 1 acima. O National Industrial Recovery Act, ch. 90, 48 Stat. 195 (1933), exemplifica o movimento em direção à centralização. Nota 74. Ver O National Industrial Recovery Act, ch. 90, 48 Stat. 195 (1933). O NIRA, como é sabido, foi parcialmente declarado inválido em Schechter Poultry Corp. v. United States, 295 U.S. 495, 542 (1935), por ter sido considerado uma delegação inconstitucional do poder público a grupos privados. Cf. K. DAVIS, nota 1 supra, pp. 260-75 (sustenta que grandes interesses empresariais dominavam o NIRA); E. HAWLEY, nota 1 supra, 270 (idem). Nota 75. Ver a respeito Becker, A Theory of Competition Among Pressure Groups for Political Influence, 98 Q.J. ECON. 371 (1983) (discute a disputa entre grupos de interesse por benefícios políticos); Peltzman, Toward a More General Theory of Regulation, 19 J.L. & ECON. 211 (1976) (desenvolve um modelo para explicar a dominação exercida por um grupo pequeno no processo regulatório); Stigler, The Theory of Economic Regulation, 2 BELL J. ECON. & MGMT. SCI. 3 (1971) (sustenta que a regulação é concebida e operacionalizada primeiramente para o benefício da indústria). Nota 76. Regulamentações com fundamentos como esses incluem o Federal Food, Drug, and Cosmetic Act, 21 U.S.C. §§ 301-392 (1982 & Supp. III 1985), e o National Labor Relations Act, 29 U.S.C. §§ 151-168 (1982 & Supp. III 1985). Nota 77 O National Labor Relations Act, 29 U.S.C. §§ 151-168 (1982 & Supp. III 1985), e o National Industrial Recovery Act, ch. 90, 48 Stat. 195 (1933), podem ser compreendidos como esforços para estabelecer o controle coletivo. Como um antigo comentador observou: “For better or worse the American people have proclaimed themselves to be a democracy, and they have proclaimed that democracy means popular economic, social, and moral emancipation . . .. The economic and social changes of the past generation have brought out a serious and a glaring contradiction between the demands of a constructive democratic ideal and the machinery of methods and institutions, which have been considered sufficient for its realization. This is the fundamental discrepancy which must be at least partially eradicated before American national integrity can be triumphantly re-affirmed.” Ver H. CROLY, nota 68 supra, 270. Nota 78. Ver K. DAVIS, nota 1 supra, pp. 516-17 (sugere que Roosevelt pode ter ficado aliviado com a invalidação do NIRA, mas ressalta o seu desejo de manter a regulamentação Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 70 relativa à jornada de trabalho e salário como medidas redistributivas). Nota 79. Ver Stewart, Regulation in a Liberal State: The Role of Non-Commodity Values, 92 YALE L.J. 1537, 1566-87 (1983); Sunstein, Legal Interference with Private Preferences, 53 U. CHI. L. REV. 1129, 1132-36, 1140-45 (1986). Nota 80 Ver a respeito JUDGMENT UNDER UNCERTAINTY: HEURISTICS AND BIASES (D. Kahneman, P. Slovic & A. Tversky eds. 1982) (discute as várias dificuldades cognitivas que as pessoas enfrentam ao tomar decisões com base em probabilidades). Várias rationales que justificam a regulação são enumeradas em Sunstein, citado na nota 79 acima, pp. 1166-69. Cf. S. HADDEN, READ THE LABEL: REDUCING RISK BY PROVIDING INFORMATION 211-27 (1986) (discute as dificuldades cognitivas para se processarem advertências sobre riscos). Nota 81. Ver, e.g., Lawrence, The Id, the Ego, and Equal Protection: Reckoning with Unconscious Racism, 39 STAN. L. REV. 317, 350-51 (1987). Nota 82. Para um exemplo particularmente extremo, ver L. DENNIS, THE COMING AMERICAN FASCISM (1936), que vê os sistemas político e econômico americano como não funcionais e tendentes ao fascismo. Nota 83. Ver T. LOWI, THE PERSONAL PRESIDENT 45-48 (1985). Nota 84. Ver F. GOODNOW, POLITICS AND ADMINISTRATION 85 (1900) (sugere que a Administração é “unconnected with politics because it embraces fields of semi-scientific, quasi-judicial and quasi-business or commercial activity”); Long, Bureaucracy and Constitutionalism, 46 AM. POL. SCI. REV. 808, 816 (1952) (argumenta que a burocracia deveria servir como um “órgão representativo,” uma “fonte de racionalidade” e um novo ramo do governo.) Nota 85. F. D. Roosevelt, Campaign Address on Progressive Government (Sept. 13, 1932), republicado em 1 THE PUBLIC PAPERS AND ADDRESSES OF FRANKLIN D. ROOSEVELT, THE GENESIS OF THE NEW DEAL, 1928-32, p. 752 (1938). Nota 86. Ver, e.g., Agricultural Adjustment Act, 7 U.S.C. §§ 601-624 (1982 & Supp. 1985). Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 71 Nota 87 Ver U.S. COMM'N ON ORG. OF THE EXECUTIVE BRANCH OF THE GOV'T, THE INDEPENDENT REGULATORY COMMISSION, H.R. DOC. No. 116, 81st Cong., 1st Sess. app. N at viii (1949) (Task Force Report) (sugere que a comissão independente “provides a means for insulating regulation from partisan influence or favoritism, for obtaining deliberation, expertness and continuity of attention, and for combining adaptability of regulation with consistency of policy so far as practical”); Eastman, nota 7 supra, 101 (“[T]he cold neutrality of the commission . . . ought rather to be safeguarded jealously against [political] influences. They are as out of place in the case of a commission as they would be in the case of a court.”). Sobre a relação entre republicanismo e o movimento progressista, ver Diggins, Republicanism and Progressivism, 37 AM. Q. 572 (1985). Nota 88 Herbert Croly apresentou uma expressão antiga desse sentimento, afirmando que “[w]hat a democratic nation must do is not to accept human nature as it is, but to move in the direction of its improvement.” Ver H. CROLY, nota 68 supra, p. 413. Neste ponto, a agência do New Deal serviu a objetivos semelhantes àqueles dos tribunais federais agressivos nas décadas de 60 e 70; o insulamento era justificado de forma análoga nos dois períodos. Ver, e.g., O. FISS, THE CIVIL RIGHTS INJUNCTION 4-5 (1982) (argumenta que, de 1954 a 1974, a injunction era “used to restructure educational systems throughout the nation” e em geral para como instrumento processual de garantia em casos envolvendo direitos civis). Nota 89 Ver, entretanto, J. CHAMBERLAIN, FAREWELL TO REFORM 314-15 (1932) (sugere que aqueles que acreditam em comitês e comissões “fail explicitly to realize that such a board, once set up, would merely amount to the definition of the boundaries of the battlefield. The fight for control of the Board would still go on, between the various 'interests' in contemporary society . . ..”).Nota 90 Ver infra pp. 504-05. Nota 91 Ver S. Milkis, New Deal Party Politics, Administrative Reform and the Transformation of the American Constitution 9-10 (artigo não publicado, disponível na Biblioteca da Faculdade de Direito de Harvard) (concebido para 'The Legacy of the New Deal: Our Inheritance,' um seminário patrocinado pelo Center for Constructive Alternatives, Hillsdale College, Hillsdale, Mich., Mar. 8-12, 1987); cf. B. KARL, nota supra 1, pp. 233-34 (descreve a substituição da “autonomia local” pelo nacionalismo do New Deal). O resultado nos tribunais, como sabido, foi um aumento dramático do poder federal, especialmente com a commerce clause. Ver, e.g., Wickard v. Filburn, 317 U.S. 111 (1942); United States v. Darby, 312 U.S. 100 (1941). Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 72 Nota 92 Ver S. Milkis, nota 91 supra, 17. Nota 93 J. LANDIS, nota 7 supra, p. 16. Nota 94 Ver W. ELLIOT, THE NEED FOR CONSTITUTIONAL REFORM: A PROGRAM FOR NATIONAL SECURITY 31-34, 200-02 (1935) (descreve o sitema de freios e contrapesos como não funcional e argumenta a favor do aumento do poder presidencial); T. FINLETTER, CAN REPRESENTATIVE GOVERNMENT DO THE JOB? 5-6 (1945) (critica o sistema original como “designed to achieve political negatives and the laissez-faire state”); H. HAZLITT, A NEW CONSTITUTION NOW 9-10, 102-06, 180 (1942) (argumenta a favor de um sistema parlamentarista a partir de premissas análogas); W. MACDONALD, A NEW CONSTITUTION FOR A NEW AMERICA 37 (1921) (descreve o sistema americano como “rigid and irresponsible” e adverte sobre a necessidade de partir para o desenvolvimento de um sistema parlamentarista). Woodrow Wilson anteriomente havia feito um comentário nesse sentido. Ver W. WILSON, CONGRESSIONAL GOVERNMENT, nota 1 supra, 206 (“[T]he federal government lacks strength because its powers are divided.”); W. WILSON, CONSTITUTIONAL GOVERNMENT, nota 1 supra, 221 (“[W]e must think less of checks and balances and more of coordinated power, less of separation of functions and more of the synthesis of action.”). Nota 95. Ver Stewart, The Reformation of American Administrative Law, 88 HARV. L. REV. 1667, 1677-78 (1975). Nota 96. H. CROLY, nota 68 supra, p. 192. Nota 97 Ver, e.g., 47 U.S.C. § 151 (1982) (descreve os propósitos da Federal Communications Commission); 49 U.S.C. § 10101 (1982) (lista os standards seguidos pela Interstate Commerce Commission). Nota 98 Ver a respeito T. LOWI, nota 83 supra, pp. 48-66 (descreve as quatro partes da “Roosevelt Revolution”); S. Milkis, nota 91 supra (descreve a transformação que o Presidente Roosevelt operou no papel do Chefe do Executivo, de líder de um partido político governista para um executivo administrador de uma nação). Nota 99 As delegações vagas do Congresso são caricaturadas em T. LOWI, citado na nota 23 acima, pp. xi-xii. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 73 Nota 100 Cf. C. Edley, nota 19 supra, pp. 3-5 e 15. Nota101 Cf., entretanto, J. MASHAW, BUREAUCRATIC JUSTICE 49-61 (1985) (discute as dificuldades da execução puramente legalista do Social Security Act). Nota102 5 U.S.C. §§ 551-559, 701-706 (1982) (codifica e emenda o ch. 324, 60 Stat. 237 (1946)). Nota103 Ele não faz, por exemplo, tais distinções na seção que discute o escopo do controle judicial, ver id. § 706, exceto quando determina que o notice-and-comment rulemaking pode ser revisto no caso de ter havido arbitrariedade, ver id. § 706(2)(A), enquanto os procedimentos formais são passíveis de revisão a partir de evidências materiais, ver id. § 706(2)(E). Nota104 Comparar INS v. Cardoza-Fonseca, 107 S. Ct. 1207, 1221 (1987) (que sustenta ser o Judiciário a autoridade final em matéria de statutory construction) com FCC v. WNCN Listeners Guild, 450 U.S. 582, 596 (1981) (que defere às agências a escolha final dentre as opções de política pública em jogo). Nota 105 Ver, e.g., M. BERNSTEIN, nota 3 supra, pp. 291-97 (ataca a independência das agências, mas sem defender a desregulação); T. LOWI, nota 23 supra, pp. 295- 313 (idem). Nota 106 Ver M. BERNSTEIN, nota 3 supra, pp. 96-97; Gellhorn, The Administrative Procedure Act: The Beginnings, 72 VA. L. REV. 219 (1986) (descrevendo a aprovação do APA) Nota 107 Ver, e.g., Morrison, The Administrative Procedure Act: A Living and Responsive Law, 72 VA. L. REV. 253, 264-68 (1986) (descreve e aprova o controle judicial das agências). Nota108 Ver o Administrative Procedure Act, 5 U.S.C. § 554 (1982). A posição institucional dos juízes administrativos (administrative law judges) tem sido frequentemente criticada, com algumas vozes defendendo um maior grau de independência para tais juízes. Ver Scalia, Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 74 The ALJ Fiasco: A Reprise, 47 U. CHI. L. REV. 57 (1979) (defende mudanças na seleção e promoção dos juízes). Nota109 Ver infra pp. 448-50. Nota 110 Ver M. BERNSTEIN, nota 3 supra, pp. 26-28, 43-46 e 55-57; S. SKOWRONEK, nota 1 supra, pp. 165-66 e 253-54 (enumera as motivações que estão por trás da expansão administrativa do início do século vinte). Nota 111 295 U.S. 495 (1935). Nota 112 Ver id. pp. 539-42; ver também Carter v. Carter Coal Co., 298 U.S. 238, 311 (1936) (sustenta que o Bituminous Coal Conservation Act significava uma uma concessão arbitrária de poder a particulares e uma “'clear[ ] . . . denial of rights safeguarded by the due process clause”); Crowell v. Benson, 285 U.S. 22, 54-65 (1932) (interpreta de forma restrita uma delegação de competência judicial que o Congresso realizou para uma agência, de modo a evitar conflito com o art. III da Constituição); Myers v. United States, 272 U.S. 52, 63-64 (1926) (declara que os funcionários do Executivo devem ser sujeitos ao controle pleno do Presidente). Nota 113 Ver Yakus v. United States, 321 U.S. 414 (1944) (ratifica a delegação ao Price Administrator o poder de estabelecer os preços durante o período de guerra); nota 91 supra (cita casos que confirmam o amplo poder do Congresso sob a commerce clause). Nota 114 Ver Ackerman, nota 36 supra, pp. 1051-57 (sustenta que “the great judicial retreat of 1937” era “the final point in the process of structural amendment”). Nota 115 Ver M. BERNSTEIN, nota 3 supra, pp. 192-95; Gellhorn, nota 106 supra; ver também Dodd, Garfield, McGuire, Maguire & Pound, Report of the Special Committee on Administrative Law, 63 A.B.A. REP. 331, 339-40 (1938) (critica a administração autônoma como uma “idéia marxiana”); Verkuil, The Emerging Concept of Administrative Procedure, 78 COLUM. L. REV. 258, 268-74 (1978) (relata os acontecimentos que envolveram a Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 75 aprovação do APA e os argumentos dos “procedural conservatives”). Nota 116 Ver o Administrative Procedure Act, 5 U.S.C. §§ 554, 556-557 (1982) (que trata, dentre outras coisas, de prazos, procedimentos, acordos e do exercício de funções quase- judiciais pelos agentes da Administração). Nota 117 Ver id. § 554(d) (proíbe os agentes públicos responsáveis pela investigação ou pela acusação de participar nas decisões das agências). Nota 118 Ver id. § 706 (estabelece o escopo do controle judicial das decisões dasagências). Nota 119 O APA, contudo, realmente permite aos tribunais “to compel agency action unlawfully withheld or unreasonable delayed,” id. § 706(1), e sua definição de ação de agência inclui “failure to act.” Id. § 551 (1982). Nota 120 Seria, entretanto, um erro sugerir que a tirania das facções é onipresente na administração. Ver S. KELMAN, MAKING PUBLIC POLICY 88-113 (1987); K. SCHLOZMAN & J. TIERNEY, ORGANIZED INTERESTS AND AMERICAN DEMOCRACY 341-46 (1986). Nota 121 Ver P. QUIRK, INDUSTRY INFLUENCE IN FEDERAL REGULATORY AGENCIES 4-21 (1981); K. SCHLOZMAN & J. TIERNEY, nota 120 supra, pp. 341-46; Stewart, nota 95 supra, pp. 1684-87 (oferece quatro explicações “mais sutis” do que a da captura para a tendência “pró-setor regulado” que as agências manifestam). Por ter agravado o problema do poder das facções, propiciando aos grupos privados uma oportunidade adicional de afastar a regulação, o veto legislativo foi um método inadequado utilizado pelo Congresso para reafirmar seu papel de fazer as leis. Ver Bruff & Gellhorn, Congressional Control of Administrative Regulation: A Study of Legislative Vetoes, 90 HARV. L. REV. 1369, 1372-81 (1977). Nota 122 Ver supra p. 447. Nota 123 The often diffuse and poorly organized beneficiaries of regulation may be plagued with free-rider problems, while the well-organized regulated class members may be better able to mobilize as a unit. See M. BERNSTEIN, nota supra3, at 74-95. Nota 123 Os beneficiários da regulação, sempre difusos e parcamente organizados, são suscetíveis ao problema do efeito carona, enquanto os agentes regulados, bem organizados, Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 76 podem estar mais aptos a se mobilizar de forma unitária. Ver M. BERNSTEIN, nota 3 supra, 74-95. Nota 124 Ver id. (afirma que as agências experimentam as fases típicas da vida: gestação, juventude, maturidade e velhice). Nota 125 Ver a respeito Stigler, nota 75 supra, p. 3 (argumenta que a regulação é concebida para beneficiar a indústria regulada, e não o público em geral). Nota 126 Ver a respeito Jaffe, The Illusion of the Ideal Administration, 86 HARV. L. REV. 1187-88 (1973). Nota 127 Ver nota 352 infra e respectivo texto. Nota 128 Ver Stewart, nota 95 supra, p. 1686. Outras teorias sugerem que os agentes regulados são capazes de influenciar a escolha dos administradores e que os administradores são influenciados pelo fato de que eles poderão eventualmente procurar emprego em firmas reguladas. Ver P. QUIRK, nota 121 supra, pp. 17-19. Essas teorias são difíceis de avaliar em abstrato. Uma perspectiva útil tenta distinguir programas regulatórios a partir da distribuição de benefícios e ônus entre regulados e consumidores. Quando os agentes regulados são bem organizados, agindo de forma unitária, e os consumidores r são numerosos e desorganizados, pode-se esperar que aqueles primeiros exercerão uma influência considerável no processo regulatório. Quando o inverso ocorre, chega-se à conclusão oposta: os consumidores serão mais influentes. Quando empresas reguladas e consumidores têm estruturas equivalentes, eles tendem a se contrabalançar. Esta teoria da capacidade das indústrias de influenciar as decisões da agência possui algum poder explicativo. Ver a respeito Wilson, The Politics of Regulation, in THE POLITICS OF REGULATION 385 (J. Wilson ed. 1980) (descreve os efeitos dos grupos de interesse organizados sobre os setores regulados). Ver, entretanto, M. DERTHICK & P. QUIRK, THE POLITICS OF DEREGULATION 8-27, 237-58 (1985) (explica os processos mediante os quais os administradores têm escapado de pressões concentradas e promovido os interesses de grupos não organizados em meio à eliminação da regulação econômica). Nota 129 Um problema que surge ao se avaliarem as várias teorias da captura é a dificuldade de estabelecer um ponto de partida consensual para a definição do facciosismo. Poder-se-ia definir o fenômeno da captura em termos procedimentais ou materiais. Se a captura fosse definida procedimentalmente, poder-se-ia indagar se os agentes públicos respondem mecanicamente às pressões a eles impostas, ou se eles deliberam sobre a matéria em Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 77 discussão. Esta definição porém levanta a dificuldade de se revisitarem os processos subjetivos de decisão. Por esta razão, uma definição mais substantiva, incorporando alguma avaliação em termos de a decisão em questão ser boa ou não, poderia ser preferível. Uma perspectiva como essa é consistente com aquela de Madison, que indagava se o grupo busca objetivos compatíveis com o bem estar da sociedade. Ver THE FEDERALIST No. 10 (J. Madison). Entretanto as dificuldades podem ser ainda maiores se a captura é definida em termos de resultados. Algum parâmetro material de comparação sobre o grau adequado de regulação tem que ser escolhido, e qualquer critério será inevitavelmente controverso – uma lição do próprio New Deal. Nota 130 Ver, e.g., G. BENVENISTE, BUREAUCRACY 71-111 (1977). Nota 131 Ver D. MUELLER, PUBLIC CHOICE 156-70 (1978); W. NISKANEN, BUREAUCRACY AND REPRESENTATIVE GOVERNMENT 36-42 (1971). Nota 132 Ver Stewart, The Discontents of Legalism: Interest Group Relations in Administrative Regulation, 1985 WIS. L. REV. 655, 680-82; id. p. 682 (“the current system of regulation and administrative law wastes resources, penalizes new investment, and discourages entry by new competitors”); cf. R. UNGER, FALSE NECESSITY 454-57 (1987) (questiona o sistema constitucional de freios e contrapesos por este bloquear a experimentação institucional). Nota 133 A ausência de centralização reflete-se por exemplo na grande diversidade das estatísticas da relação gastos das agências federais/vida salva, que variam de US $ 70.000,00 (referentes às regras da Consumer Product Safety Commission – CPSC – sobre determinados tipos de aquecedores domésticos) a US $132 milhões (referentes às regras da Food and Drug Administration – FDA -- que vedam o uso de certos tipos de hormônios na alimentação de gado bovino). Ver EXECUTIVE OFFICE OF THE PRESIDENT, OFFICE OF MANAGEMENT AND BUDGET, REGULATORY PROGRAM OF THE U.S. GOV'T xxi (Apr. 1, 1986-Mar. 1, 1987) [daqui por diante OMB REGULATORY PROGRAM, 1986]. Ver a respeito Stewart, nota 132 supra, 678-82 (discute os benefícios e desvantagens da “regulação centralizada”). A crítica do Professor Stewart ao legalismo como uma solução para os problemas regulatórios segue a hostilidade original do New Deal em relação às soluções jurídicas.) (Ver supra p. 437. [N.T.: a Consumer Product Safety Commission (CPSP) foi criada em 1972, com a finalidade de proteger a saúde e a vida do consumidor, mediante uma série de políticas e ações voltadas para a prevenção de acidentes decorrentes de produtos que trazem riscos para as pessoas. Food and Drug Administration (FDA) foi o nome dado em 1930 à Food, Drug and Inseticide Administration, criada em 1927, com funções regulatórias, a partir da reorganização do Bureau of Chemistry. A FDA tem poderes regulatórios que abrangem alimentos, medicamentos, aparelhos médicos, bancos de sangue, cosméticos, medicamentos veterinários e aparelhos que emitem radiação]. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 78 Nota 134 Ver infra pp. 496-500. Nota 135 Ver B. ACKERMAN, RECONSTRUCTING AMERICAN LAW 1-5, 28-37 (1984); Sunstein, Lochner's Legacy, 87 COLUM.L. REV 873 (1987). Nota 136 Cf. Olsen, The Myth of State Intervention in the Family, 18 U. MICH. J.L. REF. 835 (1985) (argumenta que qualquer configuração do direito de família necessariamente constitui uma forma de intervenção estatal) Nota 137 Ver Hale, nota 11 supra, 470-71, 493-94. Nota 138 Ver P. BACHRACH & M. BARATZ, POWER AND POVERTY 47-51 (1970); S. LUKES, POWER: A RADICAL VIEW 18-20 (1974). Nota 139 É relativamente raro haver uma avaliação sistemática do impacto real da regulação, por causa das sérias dificuldades metodológicas para medir os custos e benefícios. Os estudos disponíveis sugerem que os ganhos e as perdas sociais têm sido sempre substanciais, e que há disparidades dentre os diversos programas. Dentre trabalhos esclarecedores, podem ser citados CENTER FOR POLICY ALTERNATIVES AT THE MASSACHUSETTS INSTITUTE OF TECHNOLOGY, BENEFITS OF ENVIRONMENTAL, HEALTH, AND SAFETY REGULATION, preparado para o Comitê de Assuntos Governamentais do Senado dos Estados Unidos, 96º Congresso, 2ª Sessão (Comm. Print 1980); R. LITAN & W. NORDHAUS, REFORMING FEDERAL REGULATION (1982); K. MEIER, REGULATION: POLITICS, BUREAUCRACY, AND ECONOMICS (1985). Nota 140 Ver M. BERNSTEIN, nota 3 supra, 54-55 (discute a necessidade de coordenação do Executivo); Huber, Electricity and the Environment: In Search of Regulatory Authority, 100 HARV. L. REV. 1002 (1987) (discute a necessidade de coordenaçao federal na regulação do setor de energia elétrica); cf. Youngstown Sheet & Tube Co. v. Sawyer, 343 U.S. 579, 667-72 (1952) (voto vencido do Chief Justice Vinson) (descreve o Presidente com o único funcionário nacional responsável pela coordenação de um emaranhado de leis). Nota 141 Ver, e.g., AMERICAN BAR ASSOCIATION, COMMISSION ON LAW AND THE ECONOMY, FEDERAL REGULATION: ROADS TO REFORM (1979); Bruff, Presidential Power and Administrative Rulemaking, 88 YALE L.J. 451 (1979); Strauss, nota 43 supra. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 79 Nota 142 Membros do Congresso têm expressado considerável preocupação com estas iniciativas, e o Congresso freqüentemente tem promovido audiências para investigar o processo. Ver Role of OMB in Regulation: Hearings Before the Subcomm. on Oversight and Investigations of the House Comm. on Energy and Commerce, 97th Cong., 1st Sess. (1981). Nota 143 O Comitê afirmou que “[…] não foi por acidente, mas mediante uma fórmula pensada, que os Pais Fundadores criaram o Executivo americano na Constituição sobre uma sólida base [...] [O] Executivo americano ocupa uma invejável posição dentre os poderes executivos dos Estados do mundo, combinando, da forma como faz, os elementos de controle popular e os meios para uma ação vigorosa e o exercício de liderança – unindo estabilidade e flexibilidade.” REPORT OF THE PRESIDENT'S COMMITTEE ON ADMINISTRATION MANAGEMENT IN THE GOVERNMENT OF THE UNITED STATES 1 (Jan. 1937). O Presidente Roosevelt retomou esses temas num comunicado ao Congresso, queixando-se de que “a atual organização e equipamento do quadro do Executivo no governo frustra a intenção constitucional de que haja um único responsável chefe do Executivo para coordenar e administrar os departamentos.” Id. at ii. Nota 144 Ver R. NATHAN, THE ADMINISTRATIVE PRESIDENCY 4-5 (1983). Nota 145 Ver a respeito NATIONAL ACADEMY OF PUBLIC ADMINISTRATION, PRESIDENTIAL MANAGEMENT OF RULEMAKING IN REGULATORY AGENCIES 9-10 (1987) (descreve os programas de gerenciamento regulatório dos Presidentes Nixon, Ford e Carter). Nota 146 Exec. Order No. 12,291, 3 C.F.R. 127 (1981), republicado em 5 U.S.C. § 601 note (1982). Nota 147 Exec. Order No. 12,498, 3 C.F.R. 323 (1985), republicado em 5 U.S.C. § 601 note (1982 & Supp. III 1985). Nota 148 O fato de que o OMB, mais do que o Presidente, tome decisões causa algumas complicações. Para essa discussão, ver Strauss & Sunstein, The Role of the President and OMB in Informal Rulemaking, 38 ADMIN. L. REV. 181, 190-91 (1986). Ver também pp. 483-91 abaixo, para uma sugestão de reformas no atual sistema, inclusive a transferência da Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 80 autoridade supervisora para a OMB. As vantagens da revisão são relacionadas à supervisão do Poder Executivo em geral, mais do que ao OMB especificamente. Nota 149 Exec. Order No. 12,291, 3 C.F.R. 127, 128-130, 131 (1981), repulicado em 5 U.S.C. § 601 note (1982). O exercício do controle presidencial não precisa ser acompanhado por tais princípios susbstantivos, embora a atribuição de competência ao OMB possa conduzir a essa direção. Nota 150 Exec. Order No. 12,498, § 1(a), 3 C.F.R. 323, 323 (1985), republicado em 5 U.S.C. § 601 nota (1982 & Supp. III 1985). Nota 151 Ver a respeito G. STONE, L. SEIDMAN, C. SUNSTEIN & M. TUSHNET, nota 41 supra, pp. 362-63 (ressalta que a maioria dos juízes e dos comentadores têm rejeitado a reivindicação, por parte do Poder Executivo, do exercício de uma suposta competência constitucional para relaizar os gastos públicos sem levar em conta o caráter vinculado e obrigatório que o Congresso atribuiu a certos recursos). Nota 152 See Motor Vehicle Mfrs. Ass'n v. State Farm Mutual Auto. Ins. Co., 463 U.S. 29 (1983) (invalidating the National Highway Traffic and Safety Administration's (NHTSA) rescission of its own passive restraint requirement on the ground that presidential deregulation violated the law); id. at 59 (Rehnquist, J., dissenting) (stating that the President must adhere to the statute). The President can resist some legislation through the exercise of prosecutorial discretion, and the line between unlawful failure to enforce and a lawful exercise of discretion will sometimes be thin. See Sunstein, Reviewing Agency Inaction After Heckler v. Chaney, 52 U. CHI. L. REV. 653, 665-75 (1985). Nota 152 Ver Motor Vehicle Mfrs. Ass'n v. State Farm Mutual Auto. Ins. Co., 463 U.S. 29 (1983) (invalida a revogação promovida pela National Highway Traffic and Safety Administration – NHTSA – de seu próprio regulamento sobre equipamentos de segurança em automóveis, com o argumento de que a desregulação promovida pela Presidente era contrária ao direito); id. 59 (voto vencido do juiz Rehnquist, que afirmava que o Presidente deveria se submeter à lei). O Presidente pode se opor a parte da legislação mediante o exercício de discricionariedade. O limite entre a falha ilegal na execução da lei e o exercício lícito de discricionariedade é algumas vezes tênue. Ver Sunstein, Reviewing Agency Inaction After Heckler v. Chaney, 52 U. CHI. L. REV. 653, 665-75 (1985). [N.T.: a National Highway Traffic and Safety Administration (NHTSA) foi criada em 1970, sucedendo o National Highway Safety Bureau. Tem como objetivo reduzir o número de mortes, ferimentos e prejuízos econômicos decorrentes de acidentes envolvendo automóveis, mediante ação regulatória que abrange regras, equipamentos e procedimentos de segurança]. Nota 153 Ver Sunstein, Factions, Self-Interest, and the APA: Four Lessons Since 1946, 72 VA. L. REV. 271, 294 (1986); infra pp. 469-73. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 81 Nota 154 Ver supra pp. 449-50. Nota 155 Ver G. EADS & M. FIX, RELIEF OR REFORM: REAGAN'S REGULATORY DILEMMA 54-67 (1984); ver também OMB REGULATORY PROGRAM, 1986, nota 133 supra, pp. xi-xvi, xix-xxxi (descreve a política regulatória do Presidente Reagan e reivindica uma alocação maiseficiente dos recursos regulatórios, especialmente na área de regulação do risco). O Presidente Carter também tentou implementar o controle tecnocrático. Ver G. EADS & M. FIX, supra, 54-65 (discute os esforços do Presidente Carter em trazer a análise econômica para sustentar propostas regulatórios). Nota 156 Ver a respeito EXECUTIVE OFFICE OF THE PRESIDENT, OFFICE OF MANAGEMENT AND BUDGET, REGULATORY PROGRAM OF THE UNITED STATES GOVERNMENT xi-xiii (Apr. 1, 1985-Mar. 31, 1986) [daqui por diante OMB REGULATORY PROGRAM, 1985] (critica fortemente a excessiva regulação existente em praticamente todas as áreas do governo dos Estados Unidos); Olson, The Quiet Shift of Power: Office of Management & Budget Supervision of Environmental Protection Agency Rulemaking Under Executive Order 12,291, 4 VA. J. NAT. RESOURCES L. 1, 64-73, 80 (1984) (descreve a hostilidade demonstrada pelo OMB ao monitorar as regras da EPA). Nota 157 Ver infra pp. 458-59. Nota 158 Ver Morrison, nota 107 supra, pp. 266-67. Nota 159 Ver Morrison, OMB Interference with Agency Rulemaking, nota 17 supra, pp. 1066-67. Nota 160 Ver Morrison, nota 107 supra, 265-68; Olson, nota 156 supra, 60-64, 69-73. Em um passo de considerável importância, o OMB publicou um programa regulatório oficial do governo dos Estados Unidos usando documentos criados pelas Executive Orders 12291 e 12498. O programa regulatório é dividido em três partes básicas. A primeira parte traz uma descrição, pelo OMB, de seu programa regulatório, um desenho de iniciativas regulatórias especialmente importantes para o próximo ano, uma discussão geral sobre redução de riscos (muito influenciada pela economia do bem-estar), e um esboço de vários caminhos para ganhos de vantagem em mercados, incluindo a comercialização de um direito de poluir. A segunda, de longe, a maior seção do programa, descreve a agenda regulatória de cada agência. A terceira parte trata da implementação da Executive Order 12291 e traz informação sobre a interferência do OMB na discricionariedade das várias agências para editar normas. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 82 Muitos aspectos do relatório regulatório são especialmente impressionantes. O relatório transmite um sentido de coerência e coordenação entre os departamentos do Executivo. Os princípios gerais anunciados pelas várias agências são aplicados consistentemente; é quase como se o relatório fosse escrito por uma única pessoa. Desta forma, o processo tem um sucesso significativo mostrar um ramo executivo unitário. O programa regulatório é também útil para informar o público da natureza e dos objetivos da regulação nacional nos últimos tempos e em um futuro próximo. Outra característica distinta do programa é a onipresença da ideologia do laissez-faire. Os princípios do laissez-faire aparecem no relato das políticas de quase todos os departamentos federais e agências, e esses princípios têm um impacto significativo em casos concretos. Ver OMB REGULATORY PROGRAM, 1986, nota supra 133. O Departamento da Agricultura, por exemplo, inicia o relato de suas políticas com a sugestão de “[e]xceto onde de outra forma for exigida por lei, mercados competitivos devem ser deixados para alocar recursos do setor privado e para resolver problemas econômicos e sociais com mínima ou nenhuma intervenção governamental”. Id. p. 5. O Departamento de Educação descreve o primeiro de seus “principais objetivos regulatórios” como a “desregulação, incluindo [...] eliminação de requerimentos prescritivos em excesso”. Id. p. 49; ver também id. p. 147 (Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano); id. p. 175 (Departamento do Interior). A lista pode ser facilmente expandida. A instrução geral dos objetivos do OMB e o requerimento de uma demonstração regra por regra de que a ação federal é necessária revela a orientação do programa regulatório na direção da ordem tradicional do mercado. Deste modo, o processo criado pelo decreto presidencial fundiu as concepções pré-New Deal do papel do governo com idéias pós-New Deal sobre a estrutura institucional governamental. Cf. infra pp. 472-73, 480-82 (que mostra como os controles judicial e do Congresso sobre a autonomia das agências têm algumas vezes aumentado a regulação). Significativamente, a especificação legislativa e o controle judicial demonstraram-se especialmente relevantes para o programa regulatório. Em inúmeros casos, as agências propuseram regras porque o Congresso exigiu que o fizessem. No momento em que há um silêncio legal ou ambigüidade, incertezas são geralmente resolvidas em favor da inação. Ordens judiciais exigindo ação das agências em um certo período de tempo referem- se à proposta de edição de normas. Ver infra pp. 472-73. O programa regulatório, portanto, confirma a importância do controle judicial em assegurar a implementação de leis. Nota 161 Ver G. EADS & M. FIX, nota 155 supra, p. 118, pp. 124-38; J. LASH, A SEASON OF SPOILS 25, 62-73 (1984); Houck, President X and the New (Approved) Decisionmaking, 36 AM. U.L. REV. 535, 542 & n.42 (1986); Olson, nota 156 supra, pp. 60-64, pp. 69-73, p. 80. Nota 162 Ver Olson, nota 156 supra, p. 14, 42-43, 80. Nota 163 Ver a respeito NATIONAL ACADEMY OF PUBLIC ADMINISTRATION, nota 145 supra, pp. 5-6, pp. 37-38 (descrevendo algumas das regulamentações que o OMB vetou); Olson, nota 156 supra, pp. 48-49 (afirmando que o OMB tem vetado significativamente regulamentações da EPA com as quais discorda) Nota 164 Ver OMB REGULATORY PROGRAM, 1985, nota 156 supra, p. 553. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 83 Nota 165 Ver id. Nota 166 Ver id. Nota 167 Ver NATIONAL ACADEMY OF PUBLIC ADMINISTRATION, nota 145 supra, pp. 25-32 (discutindo as acusações de que o OMB agiu ilegalmente ao usurpar a competência decisória das agências); OMB WATCH, OMB CONTROL OF RULEMAKING 28 (1985) (criticando a regra da OMB, afirmando que ela solapa a autoridade das agências). Nota 168 Ver infra pp. 488-89. Nota 169 Agora há vários estudos sobre o controle executivo na prática. Embora seja cedo para uma avaliação final, os resultados preliminares aparecem misturados. Um importante estudo da EPA sugere que o controle pelo OMB mediante a Executive Order 12291 resultou em uma mudança na competência da EPA, gerando um poder desproporcional para os grupos privados bem organizados e produzindo violações legais. Ver Olson, nota 156 supra, pp. 64-73. Uma visão geral do sistema sugere de certa forma um quadro mais claro, mas oferece razões para cautela. Ver G. EADS & M. FIX, nota 155 supra, pp. 117-38. Outros estudos sugerem que o processo cumpriu alguns ou muitos de seus objetivos. Ver NATIONAL ACADEMY OF PUBLIC ADMINISTRATION, nota 145 supra, p. 48, 58-59 (respaldando o conceito de administração regulatória pelo OMB, mas apresentando um quadro ligado aos resultados atuais); DeMuth & Ginsburg, White House Review of Agency Rulemaking, 99 HARV. L. REV. 1075, 1080-88 (1986). De qualquer forma, o fato de haver problemas na implementação da revisão pelo OMB não é razão para rejeitar este avanço, da mesma forma que a eventualidade de um orçamento censurável não seria razão para abandonar o atual processo orçamentário em favor de uma volta ao sistema descentralizadao anterior. Nota 170 Ver nota 17 supra (citando decisões que invalidam esforços de desregulação). Para uma discussão de casos recentes em que a desregulação pela agência foi derrubada pelos tribunais, ver Garland, nota 17 supra, pp. 534-41. Nota 171 O próprio OMB impôs salvaguardas, incluindo a limitação de contatos ex parte.Para uma discussão geral de novas salvaguardas, ver W. Gramm, Memorandum for the Heads of Departments and Agencies Subject to Executive Order Nos. 12291 and 12498 (Aug. 8, 1986) (memorando não publicado, em arquivo da Harvard Law School Library). Nota 172 O controle pelo Congresso e pelo Judiciário são importantes freios externos. Nota 173 Ver notas 171-72 supra. Nota 174 Cf. United States v. Nixon, 418 U.S. 683, 708 (1974) (reconhecendo o privilégio do Executivo); Sierra Club v. Costle, 657 F.2d 298, 404-08 (D.C. Cir. 1981) (reconhecendo a necessidade de não se dar abertura -- disclosure -- à comunicação intra-Executivo). Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 84 Nota 175 Ver Strauss & Sunstein, nota 148 supra, p. 207 (reimpressão da recomendação pela ABA) [daqui por diante Recomendação ABA]; ver também NATIONAL ACADEMY OF PUBLIC ADMINISTRATION, nota 145 supra, p. vii, pp. 4-5, pp. 34-35. Nota 176 Ver Recomendação ABA, nota 175 supra (defendendo a abertura de “toda comunicação substantiva com pessoas fora do ramo executivo”). O OMB falhou ao não implementar essa recommendação, dando publicidade (disclosing) a contatos ex parte somente para a agência envolvida, e não para o público em geral. Ver W. Gramm, nota 171 supra (discutindo contratos ex parte). Nota 177 Ver Mashaw, Prodelegation: Why Administrators Should Make Political Decisions, 1 J.L., ECON. & ORG. 81, 95-99 (1985). Nota 178 Ver infra pp. 496-500. Tal aplicação é recomendada pela American Bar Association. Ver Recomendação da ABA, nota supra175, p. 206. Há, contudo, duas diferenças entre o contexto orçamentário e regulatório. Primeiramente, no contexto regulatório, o Congresso conferiu poderes aos funcionários das agências por lei; tais funcionários, particularmente do OMB, são portanto os últimos tomadores de decisão. Secundariamente, no contexto regulatório, o Congresso fornece padrões legais que a agência deve cumprir; não há tal padrão no contexto orçamentário. Nota 179 Ver Occupational Safety and Health Act, 29 U.S.C. § 651 (1982) (criando OSHA). Nota 180 Vários estudos da atuação do OMB confirmam este ponto, sugerindo que a intervenção isolada algumas vezes ocorre em resposta ao exercício de influência de grupos bem organizados. Ver nota 161 supra e texto que acompanha. Nota 181 Ver M. REAGAN, REGULATION: THE POLITICS OF POLICY 176 (1987). Nota 182 Ver Executive Order No. 12,291, 3 C.F.R. 127, 130 § 3(f)(3) (1981), republicado em 5 U.S.C. § 601 (1982) (“Nothing in this subsection shall be construed as displacing the agencies' responsibilities delegated by law”); Executive Order 12,498, 3 C.F.R. 323 § 1(b), republicado em 5 U.S.C. § 601 (Supp. III 1985) (“The head of each Executive agency subject to this Order shall ensure that all regulatory actions are consistent with the goals of the Administration and will be appropriately implemented”); cf. Myers v. United States, 272 U.S. 52, 135 (1926) (reconhecendo que “pode haver deveres tão peculiar e especificamente dirigidos à discricionariedade de um funcionário em particular, que se levanta a questão de se o Presidente pode anular ou revisar a interpretação que um funcionário faz de seus deveres legais em determinada situação”); Kendall v. United States, 37 U.S. (12 Pet.) 524, 610 (1838) (“Há certos deveres políticos impostos a muitos oficiais do departamento executivo, cujo cumprimento está sob a direção do Presidente. Mas seria alarmante uma doutrina segundo a qual o Congresso não pudesse impor a qualquer funcionário do Executivo qualquer dever que acreditasse ser apropriado...”). Nota 183 Cf. Myers, 272 U.S. p. 135 (sugerindo que certas delegações de poder do Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 85 Congresso aos funcionárioss das agências poderiam estar além do poder presidencial de ditar resultados); Kendall, 37 U.S. (12 Pet.) pp. 609-14 (indicando que o Congresso tem tal poder). Nos primeiros anos da nação, o Procurador Geral emitiu opiniões vacilantes sobre o poder do Presidente de ditar os resultados. Ver W. GELLHORN, C. BYSE, P. STRAUSS, T. RAKOFF, & R. SCHOTLAND, ADMINISTRATIVE LAW 159 n.8 (8th ed. 1987). Nota 184 Ver o início citado na nota 79 supra. Nota 185 Ver NATIONAL ACADEMY OF PUBLIC ADMINISTRATION, nota 145 supra, pp. 4-6, 35; Olson, nota 156 supra, pp. 48-49. Nota 186 Ver S. BREYER & R. STEWART, ADMINISTRATIVE LAW AND REGULATORY POLICY 661 (2d ed. 1985) (citando C. Boyden Gray, Conselheiro do Presidente na Task Force on Regulatory Relief, solicitando a setores econômicos regulados que exigissem ajuda presidencial se julgassem que as agências não cooperavam). Nota 187 Muitos administradores de carreira, que foram nomeados em outra administração, indubitavelmente não compartilhavam da agenda política da Administração Reagan. Nota 188 O termo “hard look” primeiramente apareceu em Pikes Peak Broadcasting Co. v. FCC, 422 F.2d 671, 682 (D.C. Cir. 1969), cert. denied, 395 U.S. 979 (1969), e Wait Radio v. FCC, 418 F.2d 1153, 1156 n.8, 1160 (D.C. Cir. 1969), aff'd, 459 F.2d 1203 (D.C. Cir. 1972), cert. denied, 409 U.S. 1027 (1972). A doutrina foi desenvolvida pela Corte de Apelação do Distrito de Columbia dos Estados Unidos e confirmada, pelos menos em uma ocasião, pela Suprema Corte. Ver, e.g., Motor Vehicle Mfrs. Ass'n v. State Farm Mut. Auto. Ins. Co., 463 U.S. 29 (1983). Nota 189 Ver, e.g., Industrial Union Dept't, AFL-CIO v. American Petroleum Inst., 448 U.S. 607, 659 (1980) (plurality opinion) (julgando que a Secretaria do Trabalho, no estabelecimento de um novo padrão para níveis permissíveis de benzeno em um local de trabalho, excedeu o poder concedido pela OSHA sob o Occupational Safety and Health Act). Nota 190 Ver, e.g., Asbestos Information Ass'n v. OSHA, 727 F.2d 415, 423 (5th Cir. 1984) (notando que a medida de segurança proposta “deve, ao final, produzir benefícios cujos custos não sejam desarrazoados”); Aqua Slide 'N' Dive Corp. v. Consumer Prod. Safety Comm'n, 569 F.2d 831, 835 (5th Cir. 1978) (desconsiderando os padrões da CPSC porque a Comissão não examinou a efetividade dos padrões ou seu impacto na disponibilidade ou utilidade do produto). Nota 191 Ver, e.g., Aqua Slide, 569 F.2d pp. 840-44 (avaliando os dados tecnológicos e invalidando a decisão da agência em seu fundamento). Nota 192 Ver, e.g., State Farm, 463 U.S. 29; Action for Children's Television v. FCC, 821 F.2d 741, 745-77 (D.C. Cir. 1987); Independent U.S. Tanker Owners Comm'n v. Dole, 809 F.2d 847, 853-55 (D.C. Cir. 1987); ver também R. S. MELNICK, REGULATION AND THE Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 86 COURTS: THE CASE OF THE CLEAN AIR ACT 351 (1983) (discutindo a vedação, por vários tribunais, da prática da EPA de criar exceções para poluidores, na medida em que tais prazos de extensão poderiam questionar a vontade do legislador do Clean Air Act); Garland, nota 17 supra, pp. 534-41 (discutindo o novo teste de “razoabilidade” usado em casos de desregulação). Nota 193 Ver Administrative Procedure Act, 5 U.S.C. § 706 (1966). Nota 194 Ver id. A APA também incumbiu o Judiciário de assegurar o cumprimento de exigências procedimentais -- ver id., um ponto não tratado aqui. Nota 195 Marbury v. Madison, 5 U.S. (1 Cranch), 137, 177 (1803). Nota 196 Ver, e.g., Gray v. Powell, 314 U.S. 402, 412 (1941) (estabelecendo que a delegação de poder do Congresso a uma agência “será respeitada e a conclusão administrativa permanecerá intocável”).Nota 197 Ver id. p. 412 (“Não está na alçada do Judiciário absorver as funções administrativas em tal extensão que as agências executivas ou legislativas tornem-se meramente órgãos de instrução (fact-finding), desprovidos das vantagens de agir imediata e definitivamente”). Esses princípios partem do cânone hermenêutico segundo o qual as leis que derrogam o common law devem ser interpretadas de forma estrita; este cânone serve como um obstáculo aos objetivos institucionais e substantivos do programa do New Deal. A noção de deferência às interpretações administrativas, tal como o princípio de que as remedial statutes devem ser interpretadas de modo amplo, deve ser entendida como um corretivo àquele cânone, incorporando o respeito à reforma promovida pelo New Deal. [N.T.: uma remedial statute é uma lei que trata de aspectos estritamente processuais para a tutela de direitos já existentes – uma procedural law, em oposição a uma substantive law]. Nota 198 Ver, e.g., Industrial Union Dep't, AFL-CIO v. American Petroleum Inst., 448 U.S. 607, 658-59 (1980) (plurality opinion) (enfatizando que o tribunal a quo não fez qualquer análise de matéria de fato, mas simplesmente de direito, interpretando a competência legal da Secretary of Labor sob o Occupational Safety and Health Act). Nota 199 Ver Bowen v. American Hosp. Ass'n, 106 S. Ct. 2101 (1986) (plurality opinion) (invalidando uma regulamentação da agência porque estava fora de sua competência); ver também J. LANDIS, nota supra7, pp. 152-54. Nota 200 Ver Industrial Union Dep't, 448 U.S. pp. 637-46, 652-58. Nota 201 467 U.S. 837 (1984). Nota 202 Id. p. 842, p. 844. Nota 203 Ver id. pp. 865-66. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 87 Nota 204 Para uma perspectiva favorável ao aumento do controle do Executivo e de Chevron, ver Pierce, citado na nota 18 acima. Para uma recente discussão sobre competências, ver Diver, Statutory Interpretation in the Administrative State, 133 U. PA. L. REV. 549 (1985), que argumenta em favor da regra de presunção de deferência à interpretação da agência. Uma discussão cética sobre Chevron, sobreposta àquela apresentada aqui, está Breyer, Judicial Review of Questions of Law and Policy, 38 ADMIN. L. REV. 363, 372-82 (1986). A conexão entre a doutrina da deferência judicial e o controle presidencial não é casual. Chevron mesmo apontou para a responsabilização política do presidente como uma justificativa para a deferência: “Enquanto as agências não são diretamente responsabilizáveis (accountable) perante o público, o Chefe do Executivo é, e isto é inteiramente apropriado para este ramo do governo tomar tais decisões de política pública...” 467 U.S. p. 865. Nota 205 Ver, e.g., Young v. Community Nutrition Inst., 106 S. Ct. 2360 (1986) (aceitando a interpretação que a FDA fez de um texto legal ambíguo). Nota 206 Assume-se, por exemplo, que a lei requer à agência a demonstração de um “risco significativo” antes de regular o uso de uma substância em um local de trabalho, e que a agência conclua que uma substância particular produz tal risco. A decisão sobre se a lei permite a regulação em um caso particular não pode ser feita somente com base no texto legal. Uma análise de fatos e opções de políticas públicas são relevantes também. A justificativa para a deferência é portanto substancial. Um caso oposto é aquele em que a questão é saber se um standard legal exige que a agência faça uma análise de custo-benefício ou se ela deve simplesmente demonstrar a existência de um risco significativo. Ver, e.g., Industrial Union Dep't, AFL-CIO v. American Petroleum Inst., 448 U.S. 607 (1980) (decidindo que um risco significativo deve ser demonstrado em regra para que se possam regular carcinógenos sujeitos à OSHA). Esta questão é independente dos fatos particulares. Mesmo se questões de política pública estão envolvidas, está longe de ser pacífico que a agência é melhor qualificada para tomar a decisão. A justificativa para a deferência quando se trata de questões exclusivamente de direito é muito mais fraca, porque tais questões não implicam a competência institucional da agência. Nota 207 Ver Chevron, 467 U.S. pp. 864-66; ver também Monaghan, Marbury and the Administrative State, 83 COLUM. L. REV. 1, 32-34 (1983) (comparando o controle judicial da ação das agências com base na deferência ao controle constitucional da ação do Congresso, e reconciliando ambas com os princípios anunciados em Marbury v. Madison, 5 U.S. (1 Cranch) 137 (1803)). Questões semelhantes surgem no law of preemption, que exige que os juízes decidam se o silêncio do Congresso indica a vontade de deixar o assunto para a alçada do governo do estado ou se, pelo contrário, reflete um balanceamento que veda a regulação estadual. [N.T.: a federal preemption consiste na reserva material que o Congresso pode expressa e claramente criar para a legislação federal, o que impede, portanto, que determinada matéria seja objeto de leis estaduais]. Nota 208 Ver Young, 106 S. Ct. pp. 2367-68 (Stevens, J., divergindo) (argumentando que o Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 88 Judiciário deve resolver qualquer ambigüidade nas leis). Nota 209 5 U.S. (1 Cranch) 137 (1803). Nota 210 Hamilton apontou que o controle judicial serviu não somente para permitir a invalidação de leis inconstitucionais, mas também para impedir os órgãos legislativos de editar medidas opressivas. Ver THE FEDERALIST NO. 78, at 525-26 (A. Hamilton) (C. Van Doren ed. 1945). Hamilton escreveu: “E não é somente em relação às infrações da Constituição que a independência dos juízes pode ser um remédio necessário contra estes caprichos momentâneos que podem nascer nas sociedades, quando estes acessos de mau humor não tendem senão a ofender uma classe particular de cidadãos, por leis injustas e parciais. É preciso que a firmeza dos juízes mitigue a severidade de semelhantes leis e lhes restrinja o efeito; o que não só diminuirá os inconvenientes das que já tiverem passado mas desviará o corpo legislativo de fazer outras da mesma ordem, forçando-o a ser mais circunspecto nas suas tentativas de injustiça, quando vir que os escrúpulos dos juízes lhes hão de sempre dar cabo.” [N.T.: reproduzo, aqui, a excelente tradução desse trecho do artigo 78, da coleção Os Pensadores da Abril Cultural - 1a. edição, 1973, p. 170 – infelizmente, sem indicação do nome do tradutor] Nota 211 Ver id. p. 527; cf. Monaghan, nota 207 supra, pp. 32-34 (argumentando que o papel do controle judicial é substancialmente o mesmo no direito administrativo e no direito constitucional). Nota 212 Se o Congresso especificamente autoriza a agência a determinar os limites de sua própria competência, uma conclusão distinta é adequada. Ver Monaghan, nota 207 supra, p. 33 (“O dever do Judiciário é assegurar que a agência administrativa atenha-se à zona de discricionariedade a ela atribuída a ela pela lei que a criou”). Nota 213 Ver Breyer, nota 204 supra, p. 371 (sugerindo que os juízes tendem menos a dar deferência a uma decisão da agência se ela não puder “ser confiável para dar uma resposta balanceada”); Note, Coring the Seedless Grape: A Reinterpretation of Chevron U.S.A. v. NRDC, 87 COLUM. L. REV. 986 (1987). Nota 214 Ver Chevron, 467 U.S. pp. 862-65; cf. Monaghan, nota 207 supra, pp. 32-34; Sunstein, nota 17 supra, p. 199 (discutindo a história da APA); Sunstein, nota 153 supra, p. 289 n.96 (discutindo a história legislativa da APA e ilustrando o desejo do Congresso de uma forte supervisão judicial das decisões da agência). Nota 215 Versupra p. 448. Nota 216 Membros do Congresso mostraram entusiasmo pela Emenda Bumpers, que expandiria o controle judicial sobre as decisões da agência. Ver J. MASHAW & R. MERRILL, ADMINISTRATIVE LAW: THE AMERICAN PUBLIC LAW SYSTEM 383-85 (2d ed. 1985). Em 1982, a Emenda Bumpers passou de forma avassaladora pelo Senado como parte do S. 1080, mas o projeto expirou na Câmara. Ver id. p. 385. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 89 Nota 217 Ver, e.g., Motor Vehicle Mfrs. Ass'n. v. State Farm Auto. Ins. Co., 463 U.S. 29, 55 (1983) (justificando a invalidação do ato de uma agência que havia revogado um regulamento com exigências não previstas em lei, em parte com o fundamento de que a lei atribuía à segurança um alto valor). Juízes quase sempre extrapolaram os objetivos da lei ao interpretar sua linguagem. Ver R. DWORKIN, LAW'S EMPIRE 313-54 (1986); Fuller, Positivism and Fidelity to Law--A Reply to Professor Hart, 71 HARV. L. REV. 630, 661-69 (1958). Esta abordagem deve ser contrastada com a técnica que extrapola os propósitos (por exemplo, “proteger o meio ambiente”) e os coloca fora do contexto para barrar certos atos administrativos que não são a rigor proibidos pela lei. É contra esta última abordagem que Chevron pode ter se insurgido. Ver Easterbrook, Statutes' Domains, 50 U. CHI. L. REV. 533, 544 (1983) (sugerindo que o domínio legal “seja restrito a casos antecipados pelos padrões legais e expressamente resolvidos pelo processo legislativo”). A própria abordagem de Easterbrook, contudo, depende da crença na primazia da ordem do common law – uma crença que o Congresso e o Presidente rejeitaram durante e depois do New Deal. Nota 218 Ver Chevron, 467 U.S. pp. 865-66. Nota 219 Ver INS v. Cardoza-Fonseca, 107 S. Ct. 1207, 1221 (1987) (afirmando que uma questão “pura de interpretação da lei deve ser resolvida pelo Judiciário com métodos tradicionais de interpretação” e assinalando que “uma questão estritamente jurídica […] é, obviamente, muito distinta de um problema de interpretação que surge em […]casos em que a agência é solicitada a aplicar […] standards a um determinado um conjunto de fatos”); ver também International Union, United Auto., Aerospace & Agric. Implement Workers v. Brock, 816 F.2d 761, 765 (D.C. Cir. 1987) (argumentando que “as decisões Chevron e Cardoza-Fonseca, juntas, guiaram a nossa análise”). Nota 220 Ver Cardoza-Fonseca, 107 S. Ct. em 1221. Nota 221 5 U.S.C. § 706 (1982). Nota 222 Ver Sunstein, nota 17 supra, p. 177, pp. 181-84. Nota 223 Ver Motor Vehicle Mfrs. Ass'n v. State Farm Mut. Auto. Ins. Co., 463 U.S. 29 (1983). Nota 224 463 U.S. 29 (1983). Nota 225 Ver id. pp. 46-51. Nota 226 Compare 463 U.S. pp. 32-57 com 463 U.S. pp. 57-59 (Juiz Rehnquist, concordando em parte e divergindo em parte). Nota 227 Ver 463 U.S. pp. 46-57. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 90 Nota 228 Ver id. p. 59 (Juiz Rehnquist, concordando em parte e divergindo em parte). Nota 229 Cf. C. Edley, nota 19 supra (argumentando em favor do reconhecimento de um papel para a política). Nota 230 Ver Sax, The (Unhappy) Truth About NEPA, 26 OKLA. L. REV. 239, 247- 48 (1973). Nota 231 Ver, e.g., Mashaw & Harfst, Regulation and Legal Culture: The Case of Motor Vehicle Safety, 4 YALE J. ON REG. 257 (1987) (argumentando que a revisão judicial das decisões da agência contribuiu para o decréscimo da elaboração de regras sobre segurança em veículos). Nota 232 Ver Scalia, Two Wrongs Make a Right: The Judicialization of Standardless Rulemaking, REG., July-Aug. 1977, p. 38, p. 40 (argumentando que a politização do processo de elaboração de regras pela agência não é inadequado, mas desejável). Nota 233 Ver Shapiro, APA: Past, Present, Future, 72 VA. L. REV. 447, 478-79 (1986). Além disso, um controle judicial agressivo das opções de política pública das agências está claramente em conflito com um controle que segue a doutrina da deferência às interpretações do direito pelas agências. Ver Breyer, nota supra204, pp. 363-65. Nota 234 Ver Pedersen, Formal Records and Informal Rulemaking, 85 YALE L.J. 38, 59-60 (1975) (descrevendo os benefícios do controle judicial das regulamentações da EPA); Stewart, The Development of Administrative and Quasi-Constitutional Law in Judicial Review of Environmental Decision-making: Lessons from the Clean Air Act, 62 IOWA L. REV. 713, 731-32 (1977). Nota 235 Ver nota supra210; cf. Mashaw & Harfst, nota 231 supra, pp. 273-316 (demonstrando que a possibilidade de controle judicial tem um efeito significativo sobre as decisões da agência, mas argumentando que o resultado tem sido perverso no contexto de decisões sobre segurança em automóveis). Nota 236 Ver R.S. MELNICK, nota 192 supra, pp. 357-60; Mashaw & Harfst, nota 231 supra, pp. 312-16 (argumentando que a reforma judicial das decisões da NHTSA levou a agência a abandonar sua função de fixação de standards). Nota 237 Ver supra pp. 448-50. Nota 238 Ver Adams v. Richardson, 480 F.2d 1159 (D.C. Cir. 1973) (exigindo a aplicação do título VI do Civil Rights Act de 1964). Nota 239 Ver Natural Resources Defense Council, Inc. v. Train, 510 F.2d 692 (D.C. Cir. 1975) (como modificado) (compelindo a EPA a publicar linhas diretivas de limitação a efluentes como requerido pelo controle legislativo de poluição da água); Calvert Cliffs' Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 91 Coordinating Comm., Inc. v. United States Atomic Energy Comm'n, 449 F.2d 1109 (D.C. Cir. 1971) (derrubando regras procedimentais estabelecidas pela Atomic Energy Commission por serem incompatíveis com a legislação ambiental); Environmental Defense Fund v. Ruckelshaus, 439 F.2d 584 (D.C. Cir. 1971) (requerendo audiências dobre o DDT); R.S. MELNICK, nota 192 supra, pp. 345-60. Nota 240 Ver Pulido v. Heckler, 758 F.2d 503 (10th Cir. 1985) (ordenando a HHS a adotar regras de regulação a respeito de despesas de viagem de demandantes incapazes que compareciam a audiências administrativas). Nota 241 Ver United Steelworkers v. Pendergrass, 819 F.2d 1263 (3d Cir. 1987) (requerendo à Secretary of Labor que publique os standards para prover empregados com informação sobre produtos químicos perigosos, resultando na 52 Fed. Reg. 31,852 (1987) (modificando 29 C.F.R. § 1910.1200) ( 29 C.F.R. §§ 1910.1200, 1915.99, 1917.28, 1918.90, e 1926.59)); Farmworker Justice Fund, Inc. v. Brock, 811 F.2d 613 (ordenando à Secretary of Labor a lançar um padrão para a área federal de saneamento), (vacated as moot, reh'g denied as moot), 817 F.2d 890 (a ser codificado por D.C. Cir. 1987); Public Citizen Health Research Group v. Tyson, 796 F.2d 1479 (D.C. Cir. 1986) (emitindo uma opinião que levou à regulação do óxido de etileno, ver 29 C.F.R. § 1910.1047 (1986)); Public Citizen Health Research Group v. Auchter, 702 F.2d 1150 (D.C. Cir. 1983) (o mesmo); National Congress of Hispanic Am. Citizens v. Marshall, 626 F.2d 882 (D.C. Cir. 1979) (ordenando a Secretary of Labor a lançar um cronograma para o desenvolvimento de um standard para uma área de saneamento para empregados da agricultura); International Union, United Auto., Aerospace, & Agric. Implement Workers v. Donovan, 590 F. Supp. 747 (D.D.C. 1984) (emitindo uma opinião que levou à proposta de regulamentação do formaldeído, ver 50 Fed. Reg. 50,412 (1985) (a ser codificado C.F.R. § 1910.1000 tab. Z-2) (proposto pelo Dec. 10, 1985)), juntado ao, 756 F.2d 162 (D.C. Cir. 1985).Nota 242 Ver Motor Vehicle Mfrs. Ass'n v. State Farm Mut. Auto. Ins. Co., 463 U.S. 29 (1983). Porém, ver Mashaw & Harfst, nota 231 supra, pp. 312-14 (sugerindo que a hostilidade judicial à regulação prejudicou a atuação da NHTSA). Nota 243 A imposição judicial de prazos ocorreu, por exemplo, no desenvolvimento de regras de regulação para a avaliação de danos a recursos naturais, para a proteção dos consumidores da poluição por combustão de madeira residencial, para a proteção da visibilidade nos parques nacionais e áreas florestais, para o desenvolvimento de um plano para proteção da camada de ozônio, para a regulação da exploração das minas, e para a edição geral de regras para proteção dos trabalhadores.Ver OMB REGULATORY PROGRAM, 1986, nota 133 supra, pp. 213-14, 432, 434, 469, 492. A supervisão judicial ocorreu na regulação do benzeno, do formaldeído e da radiação para a proteção de trabalhadores. Ver id. p. 307, 311, 321. Nota 244 Ver Mashaw & Harfst, nota 231 supra, pp. 289-99, 312-16. Nota 245 Ver supra pp. 430-32. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 92 Nota 246 Ver supra pp. 440-43. Nota 247 Cf. Reich, Public Administration and Public Deliberation: An Interpretive Essay, 94 YALE L.J. 1617, 1631-40 (1985) (argumentando que a administração pública deve ser vista mais como um processo deliberativo do que como um meio de ajustes entre interesses pré-existentes). Nota 248 Ver, e.g., Alabama Power Co. v. Ickes, 302 U.S. 464 (1938) (sustentando que somente aqueles que sofreram “ofensa legal” (legal injury) têm legitimidade processual); Hahn v. Gottlieb, 430 F.2d 1243 (1st Cir. 1970) (decidindo que os inquilinos não tinham o direito de obter uma revisão judicial de decisões da Federal Housing Administration que permitiam o aumento dos aluguéis); cf. International Longshoremen's & Warehousemen's Union, Local 37 v. Boyd, 347 U.S. 222 (1954) (negando a permissão de trabalhadores estrangeiros para questionar uma interpretação da INS de uma lei antes que as sanções estabelecidas pela interpretação fossem aplicadas contra eles). Nota 249 Ver Stewart & Sunstein, nota 63 supra, pp. 1278-82. Nota 250 O fato de que beneficiários difusos enfrentam significativos custos de transação em seus esforços de exercer poder político agrava o problema da desproporção de poderes. Ver a respeito R. HARDIN, COLLECTIVE ACTION (1982) (discutindo problemas de organização). Nota 251 Cf. Reich, The New Property, 73 YALE L.J. 733, 785-86 (1964) (argumentando que interesses legais devem ser considerados “property”). Considerações sobre a falha ao proteger beneficiários da regulação podem ser encontradas nas origens da APA. Ver ATTORNEY GENERAL'S COMMITTEE, nota 9 supra, p. 76. O Attorney General's Committee on Administrative Procedure, que publicou um relatório final em 1941 examinando práticas procedimentais de agências administrativas e métodos de controle judicial de suas decisões, constatou que embora a revisão judicial sirva como um freio contra o excesso de poder no abuso do direito privado, “[d]esde o ponto de vista da política pública e do interesse público, é importante não apenas que o administrador não invada indevidamente o direito privado, mas também que efetivamente cumpra seus deveres legais. Um excessivo favorecimento do interesse privado pode ser tão prejudicial quanto uma intervenção excessiva. [...] A Federal Trade Commission pode violar a política legislativa e causar dano aos interesses privados tanto por falhar na investigação e na detecção de métodos desleais de concorrência quanto por condenar métodos justos por excesso de rigor.” Por outro lado, a APA e sua história são ambíguas na determinação do status legal dos beneficiários regulados. Ver Sunstein, nota supra152, p. 657; ATTORNEY GENERAL'S COMMITTEE, nota 9 supra, pp. 76, 86. O Attorney General’s Committee afirmou: “o controle judicial é raramente disponível, teoricamente ou na prática, para forçar a execução efetiva da lei pelos administradores. Ele está adaptado principalmente para conter o excesso de poder e não para compelir seu exercício [...] Ainda permanece sem solução a questão de se a recusa do administrador em praticar a ação é passível de controle judicial [...] Em alguns momentos o Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 93 controle pode ser inútil porque a determinação de se a ação deveria ou não ser praticada nas circunstâncias pode ter sido atribuída ao juízo exclusivo do administrador do interesse público e da conveniência. Entretanto, se a recusa é baseada em uma interpretação errônea da lei, a revisão judicial é eficaz para remover ao menos esta barreira.” Id. (nota de rodapé omitida, ênfases acrescentadas). Nota 252 Ver Association of Data Processing Serv. Orgs. v. Camp, 397 U.S. 150 (1970) (reconhecendo a legitimidade processual dos competidores); Adams v. Richardson, 480 F.2d 1159 (D.C. Cir. 1973) (revendo reclamações de que uma agência teria falhado de foorma ilegal ao implementar uma lei de direitos civis); Environmental Defense Fund v. Ruckleshaus, 439 F.2d 584 (D.C. Cir. 1971) (permitindo a uma organização ambiental contestar a recusa do Agriculture Department para regular o DDT). Nota 253 Ver J. VINING, LEGAL IDENTITY 20-27 (1978). Nota 254 Ver, e.g., os casos citados na nota 252 supra. Nota 255 Ver Allen v. Wright, 468 U.S. 737 (1984); Simon v. Eastern Ky. Welfare Rights Org., 426 U.S. 26 (1976); Warth v. Seldin, 422 U.S. 490 (1975). Mas cf. Clarke v. Securities Indus. Ass'n, 107 S. Ct. 750 (1987) (concedendo que uma associação comercial representando corretores de seguros legitimidade para contestar a aprovação pelo Comptroller General da aplicação de um banco nacional estabelecer descontos para services de corretagem). Nota 256 Ver Heckler v. Chaney, 470 U.S. 821 (1985) (decidindo que a inércia da agência é, presume-se, imune ao controle judicial); Block v. Community Nutrition Inst., 467 U.S. 340 (1984) (decidindo que os consumidores finais podem não obter a revisão judicial de pedidos no mercado de leite). Nota 257 Constituição dos E.U.A., art. II, § 3. Nota 258 Ver Chaney, 470 U.S. p. 832; Allen, 468 U.S. p. 761. Nota 259 Ver Allen, 468 U.S. pp. 759-60. Nota 260 Ver id. (negando legitimidade aos pais de crianças negras para contestar a concessão de isenções fiscais a escolas privadas que praticavam discriminação racial); Simon, 426 U.S. 26 (negando à população carente legitimidade para pleitear taxas favoráveis para tratamento hospitalar em instituição que não proveu serviços de emergência, de acordo com sua capacidade financeira); cf. Mashaw & Harfst, nota 231 supra, pp. 302-09 (argumentando que a revisão judicial de regulamentação de segurança nos carros foi afetada pela falta de disposição judicial em aceitar demonstrações probabilísticas de dano). Nota 261 Ver, e.g., Arnett v. Kennedy, 416 U.S. 134 (1974) (plurality opinion of Rehnquist, J.) (argumentado que direitos criados legalmente não são protegidos constitucionalmente). Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 94 Nota 262 Ver Chaney, 470 U.S. 821. Nota 263 Algumas distinções entre beneficiários da regulação e membros do setor regulado, entretanto, são apropriadas porque as agências não podem acomodar todos os beneficiários que apresentam pleitos plausíveis. Uma importante função das agências é alocar recursos entre reclamantes concorrentes. Ver Sunstein, nota supra152, pp. 672-75. Nota 264 Limitaçõesna legitimidade processual são freqüentemente criadas como um meio de restringir intervenções judiciais no processo político. Ver A. BICKEL, THE LEAST DANGEROUS BRANCH (1962). Essa racionalidade tem alguma plausibilidade quando o autor procura invalidar uma decisão política em termos constitucionais. É bastante implausível, entretanto, quando o autor requer que uma agência administrativa atenha-se à vontade do Congresso. Em tais casos, considerações sobre democracia estão a favor e não contra a atuação judicial. Nota 265 Claro que há distintas questões envolvendo remédios em ações ajuizadas para compelir a ação da agência. Ver Garland, nota 17 supra, pp. 562-68; Sunstein, nota 152 supra, pp. 656-61. Nota 266 Ver Abbott Laboratories v. Gardner, 387 U.S. 136, 140 & n.2 (1967). Nota 267 5 U.S.C. § 701(a)(2) (1982). Nota 268 Citizens to Preserve Overton Park v. Volpe, 401 U.S. 402, 410 (1971) (citando a história legislativa da APA); de acordo com Heckler v. Chaney, 470 U.S. 821 (1985) (utitlizando o mesmo teste). Nota 269 O teste bastante complexo para a possibilidade de controle é proposto em Hahn v. Gottlieb, 430 F.2d 1243 (1st Cir. 1970), em que o tribunal concluiu que ela depende, “primeiro, da possibilidade de a matéria em questão poder ser levada para análise pelo Judiciário; segundo, da necessidade de supervisão judicial para proteger os interesses dos requerentes; e terceiro, do impacto do controle na efetividade da atuação da agência”. Id. p. 1249. Um tribunal de apelação usou esta complicada análise para concluir que a recusa do FBI em contratar um homossexual encontrava-se abrangida pela discricionariedade da agência conferida por lei. Ver Padula v. Webster, 822 F.2d 97 (D.C. Cir. 1987). Nota 270 Ver nota 234 supra e texto que a acompanha. Nota 271 Ver, e.g., 15 U.S.C. § 45(a) (1982) (tratando da FTC); id. § 2051 (1982) (tratando da Consumer Product Safety Commission); 47 U.S.C. § 151 (1982) (tratando da FCC); 49 U.S.C. § 10101 (1982) (tratando da ICC). Nota 272 Ver B. ACKERMAN & W. HASSLER, CLEAN COAL/DIRTY AIR 26-27, 122-28 (1981). Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 95 Nota 273 Ver H. SEIDMAN & R. GILMOUR, POLITICS, POSITION, AND POWER 37-66 (1986). Nota 274 Ver, e.g., 15 U.S.C. § 761 note (1982) (estabelecendo um período de vida de quatro anos para a Federal Energy Administration). Nota 275 Ver, e.g., Clean Air Act, 42 U.S.C. §§ 7604-7605 (1982) (estabelecendo procedimentos para ações judiciais de cidadãos contra os Estados Unidos, suas agências, e pessoas que violaram a lei); Energy Policy and Conservation Act, id. § 6305(a) (permitindo ações judiciais de cidadãos contra agências federais e companhias que violaram a lei); Surface Mining Control and Reclamation Act, 30 U.S.C. § 1270 (1982) (permitindo a pessoas com interesses negativamente afetados processar os Estados Unidos, suas agências, e pessoas que violaram a lei). Nota 276 Ver, e.g., Airline Deregulation Act of 1978, 49 U.S.C. app. § 1551 (1982) (abolindo a Civil Aeronautics Board). Nota 277 Ver M. REAGAN, nota 181 supra, pp. 95-96. Nota 278 O House Interstate and Foreign Commerce Committee estabeleceu que um de seus objetivos ao promulgar a lei era prover “uma maior orientação por parte do Legislativo e uma vontade do legislador mais clara” sobre como certos aspectos da Lei devem ser administrados. Ver H.R. REP. NO. 294, 95th Cong., 1st Sess. 2 (1977). Em requerimento para regulação pela EPA de quatro poluentes específicos, o Conselho enfatizou que a EPA falhou ao instituir regras de regulação de poluentes apesar da evidência de “sérios riscos à saúde” associados a eles. Ver id. p. 36. Nota 279 Ver, e.g., 42 U.S.C. § 7408(c) (1982) (requerendo ao administrador que aprimore e reveja o critério de concentração de dióxido de nitrogênio [n]ão mais tarde que seis meses a partir de 7 de agosto de 1977”); id. § 7409(a) (requerendo que o administrador “publique as propostas de regulamentos que prescrevam . . . [um] padrão de qualidade para o ar do ambiente” para determinados poluentes do ar); id. § 7410(a)(2) (requerendo que o administrador aprove ou desaprove o plano para qualidade do ar em até quatro meses depois da data em que é submetido para análise). Nota 280 Ver OMB REGULATORY PROGRAM, 1985, nota 156 supra, p. xiii. Nota 281 Ver ENVIRONMENTAL AND ENERGY STUDY INSTITUTE & ENVIRONMENTAL LAW INSTITUTE, STATUTORY DEADLINES IN ENVIRONMENTAL LEGISLATION: NECESSARY BUT NEEDED IMPROVEMENT ii (1985). Nota 282 Ver 15 U.S.C. § 2002(a)(1) (1982). Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 96 Nota 283 Ver 21 U.S.C. § 348 (1982 & Supp. III 1985) (especificando em detalhe as únicas circunstâncias sob as quais aditivos alimentares serão considerados seguros); 15 U.S.C. § 2080 (1982) (detalhando os procedimentos que a CPSC deve seguir antes de emitir notícias de edição de normas (notices of rulemaking) a respeito da possibilidade de produtos cacirnogênicos); 42 U.S.C. § 7545 (1982 & Supp. III 1985) (requerendo que o administrador imponha requerimentos para registro na elaboração de aditivos de combustíveis). Nota 284 Ver 42 U.S.C.A. § 300g-1 (West Supp. 1987). A supervisão do Congresso tem aumentado também em outras áreas. A lei que regulamenta a poluição por automóveis, por exemplo, editada em 1970, determina uma redução de noventa por cento das emissões de hidrocarboneto e dióxido de carbono até 1983. Ver 42 U.S.C. § 7521(a)(3)(A)(ii)(I) (1982). As emendas do Federal Water Pollution Control Act de 1972 também estabelecem objetivos particulares e exigências, dentre outras, de que todo lançamento de poluentes em águas navegáveis deve ser eliminado até 1985. Ver 33 U.S.C. § 1251(a) (1982). O Resource Conservation and Recovery Act, 42 U.S.C. §§ 6901-6987 (1982 & Supp. III 1985), proíbe a disposição em terra de líquidos em grande quantidade e especifica procedimentos de teste de elementos tóxicos Ver 42 U.S.C. §§ 6921, 6924(c)(1) (Supp. III 1985). As regras envolvendo deficientes do Social Security e SSI são relativamente precisas e emendas recentes têm aumentado a clareza. Ver 42 U.S.C. §§ 405, 408, 416, 421 (1982 & Supp. III). A tendência de aumento de especificidade legal é descrita em M. REAGAN, citado na nota 181 acima, pp. 95-98. A história recente, portanto, fornece base para a sugestão, em J. ELY, DEMOCRACY AND DISTRUST 131-34 (1980), e T. LOWI, citado na nota 23 acima, pp. 305-09, de que é possível para o Congresso desenvolver linhas diretivas relativamente claras em alguns casos. Entretanto, é duvidoso que a evidência auxiliasse um revigoramento da doutrina da vedação da delegação de poderes, que requer claros padrões determinados pelo Congresso. Ver Stewart, Beyond Delegation Doctrine, 36 AM. U.L. REV. 323 (1987) (argumentando que a doutrina da vedação da delegação de poderes é indeterminada em sua aplicação, mesmo quando o Congresso tenta prover standards claros); infra p. 494. Nota 285 Ver B. ACKERMAN & W. HASSLER, nota 272 supra, pp. 121-28; Graham, The Failure of Agency-Forcing: The Regulation of Airborne Carcinogens Under Section 112 of the Clean Air Act, 1985 DUKE L.J. 100. Nota 286 Ver Mashaw, nota supra177, pp. 95-99. Nota 287 Ver R. S. MELNICK, nota 192 supra, pp. 343-55. Nota 288 Para uma discussão crítica das limitações de tempo, ver Abbott, The Case Against Federal Statutory and Judicial Deadlines: A Cost-Benefit Appraisal, 39 ADMIN. L. REV. 171 (1987), e Tomlinson, Report on the Experience of Various Agencies with Statutory Time Limits Applicable to Licensing or ClearanceFunctions and to Rulemaking, in ADMINISTRATIVE CONFERENCE OF THE UNITED STATES, RECOMMENDATIONS AND REPORTS, pp. 119, 122-23 (1978) [daqui por diante ADMINISTRATIVE CONFERENCE]. Estes estudos sugerem que as limitações de tempo Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 97 muito estritas podem falhar ao aumentar a produção de normas e interferir na competência da agência em estabelecer prioridades, algumas vezes em detrimento de uma regulação adequada. Eles sugerem como alternativa que o Congresso requeira das próprias agências a determinação e o cumprimento de prazos a menos que as agências tenham uma boa causa para falhar ao fazer isto. Ver Recommendation 78-3: Time Limits on Agency Actions, in ADMINISTRATIVE CONFERENCE, supra, at 9-11 (recomendando maior flexibilidade com os prazos). Por outro lado, tais estudos também sugerem que os prazos estimulam o processo de normatização em casos em que “interesses de fora dos grupos sejam suficientemente considerados sobre os efeitos da demora ao monitorar o desempenho da agência e trazer a agência ao tribunal se necessário.” Tomlinson, supra, p. 122. Nota 289 Ver a respeito K. ARROW, SOCIAL CHOICE AND INDIVIDUAL VALUES (1963); W. RIKER, LIBERALISM AGAINST POPULISM (1982); Plott, Axiomatic Social Choice Theory: An Overview and Interpretation, in RATIONAL MAN AND IRRATIONAL SOCIETY? 229 (B. Barry & R. Hardin eds. 1982) (argumentando que a reunião de decisões individuais de voto leva a preferências sociais que são indiferentes ou autoritárias). Nota 290 Ver a respeito B. CAIN, J. FEREJOHN & M. FIORINA, THE PERSONAL VOTE (1987) (enfatizando o tempo que os deputados gastam atedendo suas bases eleitorais). Nota 291 Cf. Diver, The Optimal Precision of Administrative Rules, 93 YALE L.J. 65 (1983) (discutindo os trade-offs entre transparência nos critérios, acessibilidade e congruência no processo de normatização administrativa). Nota 292 Ver Stewart, nota 95 supra, pp. 1693-97. Nota 293 Para um argumento em favor de uma delineação mais clara de competência, ver, por exemplo, T. LOWI, nota 23 supra, pp. 298-301. Nota 294 As propostas para normatização que partem do Regulatory Program of the United States, discutido acima, confirmam este ponto. Ver, e.g., OMB Regulatory Program, 1986, nota 133 supra, pp. 111, 213-14. Nota 295 Cf. supra pp. 472-73 (dando exemplos de atuação judicial, freqüentemente como resultado de especificação pelo Congresso). Nota 296 Ver J. ELY, nota 284 supra, pp. 131-34. Nota 297 Esta foi de fato a experiência com o Clean Air Act. Ver B. ACKERMAN & W. HASSLER, nota 272 supra, pp. 121-28. Nota 298 O fim da doutrina da vedação da delegação de poderes é descrita como uma “morte por associação”, ver J. ELY, nota 284 supra, p. 133, mas a descrição é enganosa. Por requerer um grau de consenso antes que a regulação possa ser empreendida, a doutrina não foi somente um requerimento neutro de especificação, mas um obstáculo à intervenção Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 98 governamental. Há portanto uma relação entre a era do devido processo material representada por Lochner e a doutrina da vedação da delegação de poderes. No início do século XX, a referida doutrina e o devido processo material serviram a funções anti-regulatórias similares. Nota 299 Ver M. BERNSTEIN, nota 3 supra, pp. 263-64 (argumentando que as leis vagas permitem a grupos disciplinados e estrategicamente posicionados influenciar o processo regulatório). Nota 300 Para uma descrição anacrônica da delegação contemporânea, ver T. LOWI, citado na nota 23 acima, p. xii, pp. 97-107; e também Lowi, Two Roads to Serfdom: Liberalism, Conservatism and Administrative Power, 36 AM. U.L. REV. 295 (1987) (argumentando que a administração autônoma enfraquece valores constitucionais importantes). Nota 301 Ver, e.g., Clark, The Four Stages of Capitalism: Reflections on Investment Management Treatises, 94 HARV. L. REV. 561, 569-73 (1981). Nota 302 Ver Mashaw, nota 177 supra, pp. 95-99 (argumentando que a responsabilização política dos administradores perante o Presidente pode ser preferível à responsabilização perante o Congresso). Nota 303 Ver notas 17-18 supra e textos que as acompanham. Nota 304 Ver, e.g., Morrison, OMB Interference with Agency Rulemaking, nota 17 supra, pp. 1069-71. Nota 305 Por esta razão, a decisão do tribunal em Heckler v. Chaney, 470 U.S. 821 (1985), criando uma presunção contra o controle judicial da inércia da agência, deveria ser lida em seu contexto, que envolveu uma recusa da agência, na ausência de contrangimentos legais, para atuar em um caso específico – uma escolha tradicionalmente deixada à discricionariedade da agência. Nota 306 Ver, e.g., Independent U.S. Tanker Owners Comm'n v. Dole, 809 F.2d 847, 853-55 (D.C. Cir. 1987) (opinião de Bork, J., invalidando a desregulação). Nota 307 Cf. J. MASHAW, nota supra101, pp. 185-90 (apontando dificuldades de um controle judicial efetivo das ações da Social Security Administration). Nota 308 Os tribunais recentemente invalidaram algumas intervenções de agências sob fundamentos controversos. Ver, e.g., Jersey Cent. Power & Light v. Federal Energy Regulation Comm'n, 810 F.2d 1168 (D.C. Cir. 1987) (requerendo à FERC que conceda a um prestador de serviços públicos uma audiência probatória para determinar se a modificação da programação tarifária (rate schedule) para excluir o investimento da empresa em uma planta nuclear cuja construção foi suspensa fora justa e razoável); Restaurant Corp. v. NLRB, 801 F.2d 1390 (D.C. Cir. 1986) (derrubando conclusão da NLRB segundo a qual uma solicitação Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 99 sindical e uma não sindical envolvendo formas de programas de solidariedade intra- empregados (intra-employee generosity) eram substancialmente equivalentes e que tratamentos diferenciados entre ambos constituiria discriminação de acordo com a lei); National Soft Drink Ass'n v. Block, 721 F.2d 1348 (D.C. Cir. 1983) (limitando o poder do Ministro da Agricultura de regular vendas de soft drinks em escolas). Nota 309 Cf. M. BERNSTEIN, nota 3 supra, pp. 107-09, 128-29 (discutindo a necessidade de estabilidade ao longo do tempo). Nota 310 Ver Heckler v. Chaney, 470 U.S. 821 (1985) (criando presunção contrária à possibilidade de controle judicial de recusa da agência em agir). Nota 311 Ver a respeito Garland, nota 17 supra (discutindo resistência histórica dos juízes em emitir ordens determinando às agência que ajam); Sunstein, nota 152 supra (explicando como o conceito de prosecutorial discretion tradicionalmente limitou a revisão da inércia administrativa). Nota 312 Ver a respeito W. GELLHORN, OMBUDSMEN AND OTHERS: CITIZENS' PROTECTORS IN NINE COUNTRIES (1986) (comparando o uso em nove países da figura do ombudsman como uma câmara de compensação (clearinghouse) para reclamações de cidadãos contra ações de agentes públicos). Nota 313 Ver Luneberg, Petitions for Rulemaking: Federal Agency Practice and Recommendations for Improvement, in ADMINISTRATIVE CONFERENCE OF THE UNITED STATES, RECOMMENDATIONS AND REPORTS 493. A seção de Direito Administrativo da American Bar Association adotou uma recomendação para este efeito em 10 de outubro de 1987 (disponível na biblioteca da Harvard Law School). Nota 314 A supervisão judicial das agências executivas, quando o Presidente mostrou-se cético em relação a ações regulatórias em muitas áreas,é o exemplo mais recente. O Judiciário iniciou também mudanças no sistema penal. Ver, e.g., Miranda v. Arizona, 384 U.S. 436 (1966); Batson v. Kentucky, 106 S. Ct. 1712 (1986) (sustentando que a cláusula de igual proteção (equal protection clause) proibe um promotor (prosecutor) de impugnar um jurado apenas com base em um argumento de raça). O Congresso, de modo semelhante, realizou uma reforma significativa na proteção ambiental. Ver Clean Air Act, 42 U.S.C. §§ 7401-7642 (1982); Ackerman, Elliot & Millian, Toward a Theory of Statutory Evolution: The Federalization of Environmental Law, 1 J.L., ECON. & ORG. 313, 317-18, 335- 38 (1985) (descrevendo as circunstâncias que envolveram a aprovação do Clean Air Act). Nota 315 Para ser mais preciso, algumas dificuldades acompanham o presente sistema de freios e contrapesos – dificuldades essas completamente alheias à área do direito administrativo. Em particular, o regime atual torna especialmente difícil ao Presente implementar seu programa, com a exceção eventual de uma ação vigorosa no início do mandato presidencial. Mais genericamente, a divisão entre ramos do executivo e legislativo freqüentemente produziu paralisia e estagnação, obstruindo a resolução política de assuntos Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 100 fundamentais. Ver J. SUNDQUIST, CONSTITUTIONAL REFORM 206-38 (1986). Problemas deste tipo estão além do escopo deste artigo. Nota 316 Ver C. Edley, nota 19 supra. Nota 317 Cf. Moe, Control and Feedback in Economic Regulation: The Case of the NLRB, 79 AM. POLIT. SCI. REV. 1094, 1095 (1985) (argumentando que o desempenho da NLRB é influenciado por influxos do Congresso, do presidente, constrangimentos impostos por tribunais, condições econômicas, interação de equipes das agências e pelo comportamento do eleitor). Nota 318 Ver a respeito S. BREYER, nota 26 supra, pp. 341-68 (mapeando várias abordagens genéricas da reforma regulatória) (1980); Stewart, Reconstitutive Law, 46 MD. L. REV. 86 (1986) (defendendo o uso expandido de diversas estratégias reconstitutivas, incluindo mudanças na jurisdição, dotações e procedimentos na tomada de decisões). Nota 319 Para um breve panorama e citações, ver R. CASS & C. DIVER, ADMINISTRATIVE LAW: CASES AND MATERIALS 3-6 (1987). Nota 320 Ver, e.g., Aranson, Gellhorn & Robinson, A Theory of Legislative Delegation, 68 CORNELL L. REV. 1, 63-67 (1982); Gewirtz, The Courts, Congress, and Executive Policy-Making: Notes on Three Doctrines, LAW & CONTEMP. PROBS., Summer 1976, at 46, 49-65; Schoenbrod, The Delegation Doctrine: Could the Court Give It Substance?, 83 MICH. L. REV. 1223, 1249-74 (1985). Nota 321 Cf. Currie, Bankruptcy Judges and the Independent Judiciary, 16 CREIGHTON L. REV. 441 (1982-83) (argumentando que as provisões do artigo III para estabilidade e salário deveriam ser interpretadas literalmente para invalidar a criação congressual de tribunais falimentares). Nota 322 Ver Humphrey's Executor v. United States, 295 U.S. 602, 628-32 (1935). Nota 323 Ver a respeito Synar v. United States, 626 F. Supp 1374, 1398 (D.D.C. 1986) (expressando a dificuldade em conciliar a decisão em Humphrey's Executor com a doutrina da separação dos poderes) Bowsher v. Synar, 106 S. Ct. 3181 (1986); Miller, Independent Agencies, 1986 SUP. CT. REV. 41, 96-97 (argumentando que a agência independente viola o princípio da separação dos poderes); Scalia, Historical Anomalies in Administrative Law, 1985 SUP. CT. HIST. SOC'Y Y.B. 103, 106-110 (questionando a distinção entre agências executivas e agências independentes e sustentando que a decisão em Humphrey's Executor deveria ser limitada a seu contexto factual e histórico). Nota 324 Ver, e.g., Hampton & Co. v. United States, 276 U.S. 394, 404-11 (1928); Field v. Clark, 143 U.S. 649 (1892). Para um exemplo moderno, ver Currie, The Distribution of Powers After Bowsher, 1986 SUP. CT. REV. 19. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 101 Nota 325 424 U.S. 1, 135-37, 140 (1976). Nota 326 462 U.S. 919, 958 (1983). Nota 327 106 S. Ct. 3181, 3192 (1986). Nota 328 Ver Brest, The Misconceived Quest for the Original Understanding, 60 B.U.L. REV. 204, 214-15 (1980). Nota 329 Ver R. DWORKIN, A MATTER OF PRINCIPLE 138-55 (1985); Brest, nota 328 supra, pp. 215-17. Nota 330 Ver T. LOWI, nota 83 supra, pp 22-41. Nota 331 Ver id. pp. 44-48. Ver a respeito S. Milkis, nota 91 supra (descrevendo a emergência da “Constituição do New Deal” como repercussão do aumento do poder do Executivo e a diminuição da importância da política partidária). Nota 332 Ver Elliot, INS v. Chadha: The Administrative Constitution, the Constitution, and the Legislative Veto, 1983 SUP. CT. REV. 125, 144-45; Strauss, nota 43 supra, pp. 597-99. Nota 333 Ver Fallon, Of Legislative Courts, Administrative Agencies, and Article III, 101 HARV. L. REV. (a ser publicado em 1988) (enumerando argumentos contra a leitura literal do article III). Nota 334 Ver supra p. 445. Nota 335 Ver Stewart, nota 284 supra, pp. 335-43. Nota 336 Ver Myers v. United States, 272 U.S. 52, 177 (1926) (Holmes, J., divergindo); J. CHOPER, JUDICIAL REVIEW AND THE NATIONAL POLITICAL PROCESS 263 (1980). Nota 337 VerJ. CHOPER, nota 336 supra, pp. 273-314. Nota 338 Ver INS v. Chadha, 462 U.S. 919, 967-74, 978 (1983) (Juiz White, divergindo); cf. Bowsher v. Synar, 106 S. Ct. 3181, 3205 (1986) (Juiz White, divergindo) (apontando a importância da Gramm-Rudman-Hollings Act como uma resposta à crise orçamentária). Nota 339 Ver Chadha, 462 U.S. pp. 974-84 (Juiz White, divergindo). Nota 340 Ver, e.g., Humphrey's Executor v. United States, 295 U.S. 602 (1935) (permitindo ao Congresso desenvolver novas formas institucionais); cf. Crowell v. Benson, 285 U.S. 22, 53-54 (1932) (argumentando que uma outorga, pelo Congresso, de poderes judicatórios limitados a um tribunal administrativo (non-article III tribunal) pode ser justificada à medida Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 102 que alivia o Judiciário de uma excessiva carga de trabalho). Nota 341 Ver, e.g., United States v. Nixon, 418 U.S. 683 (1974); Youngstown Sheet & Tube Co. v. Sawyer, 343 U.S. 579 (1952). Nota 342 Ademais, o fato de que os poderes executivo e legislativo estarem de acordo é uma razão insuficiente para afastar uma ofensa à Constituição; as provisões relevantes estão previstas não somente para assegurar a integridade dos poderes, mas também para proteger os cidadãos. Ver Chadha, 462 U.S. pp. 947-51, 957-59. Nota 343 Ver Strauss, Formal and Functional Approaches to Separation-of-Powers Questions--A Foolish Inconsistency?, 72 CORNELL L. REV. 482, 488-89 (1987) (contrastando as abordagens formalista e funcionalista de questões de separação de poderes). Nota 344 Este método pode ser encontrado em McCulloch v. Maryland, 17 U.S. (4 Wheat.) 316 (1819). Ver a respeito C. BLACK, STRUCTURE AND RELATIONSHIP IN CONSTITUTIONAL LAW (1970) (argumentanto que o método de argumentação a partir de relação e estrutura deveria desempenhar um importante papel no direito constitucional federal). Nota 345 Ver supra pp. 430-36. Nota 346 Ver Elliott, nota supra332, pp. 132-47; Strauss, Was There a Baby in the Bathwater? A Comment on the Supreme Court's Legislative Veto Decision, 1983 DUKE L.J. 789, 800-01. Nota 347 Ver Bruff & Gellhorn, nota 121 supra, pp. 1413-14, 1425-26, 1438-39. Nota 348 Ver Strauss, nota343 supra, pp. 519-21. Nota 349 Ver M. BERNSTEIN, nota 3 supra, pp. 128-29, 137-39; Miller, nota 323 supra, pp. 79-83. Nota 350 Ver M. BERNSTEIN, nota 3 supra, p. 5; id. p. 146 (argumentando que a “manutenção do mito da agência independente representa um esforço consciente de grupos regulados para confinar a autoridade regulatória a uma agência que é de certa forma mais suscetível à influência, persuasão, e eventualmente, captura e controle que um ente do Executivo”); ver também D. TRUMAN, THE GOVERNMENTAL PROCESS 417-19 (2d ed. 1971) (afirmando que grupos regulados preferiram a regulação por agências independentes a uma supervisão por uma agência executiva). Nota 351 Ver notas 358-61 infra. Nota 352 Uma crítica influente da independência das agências escrita há trinta anos atrás pode ser encontrada em M. BERNSTEIN, citado na nota 3 acima. Para uma visão contrária, Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 103 ver Jaffe, citado na nota 126 acima, pp. 1187, 1193, 1198-99. O declínio da agência independente aparentemente reflete a crença de que a supervisão presidencial operará como um amortecedor (buffer) contra o facciosismo. A EPA e a OSHA são parte do poder executivo. Somente poucas leis recentes de segurança e saúde estão sendo aplicadas por agências independentes. Ver, e.g., 42 U.S.C. § 7171(a) (1982) (a Federal Energy Regulatory Commission); 15 U.S.C. § 2053(a) (1982) (a Consumer Product Safety Commission). A história recente, portanto, sugere considerável ambivalência do Congresso sobre a agência independente. Na prática, há pouca diferença entre agências executivas e independentes em termos de funções. Muitos departamentos do executivo engajam-se em atividades indistinguíveis daquelas das agências independentes. Os dois tipos de entidade tomam para si tarefas básicas judicantes (adjudication), produção de normas e prosecution. Além disso, agências independentes não estão de modo algum verdadeiramente liberadas do controle político. Tais agências percebem-se como sujeitas ao controle do Congresso, a cujas comissões compete o exercício de uma função de supervisão poderosa. O Presidente, além disso, tem um conjunto de mecanismos formais e informais para controlar as agências nominalmente e fora de sua jurisdição. Ver Strauss, nota supra 43, pp. 589-91; ver também M. BERNSTEIN, nota 3 supra, pp. 109-13 (descrevendo tais mecanismos). De fato, um estudo recente sugere que o comportamento de agências independentes modifica-se sistematicamente de acordo com o partido que ocupa a presidência. Ver Moe, Regulatory Performance and Presidential Administration, 26 AM. J. POL. SCI. 197, 221 (1982). Em alguns casos, entretanto, o Congresso decidiu que a imunidade ao controle presidencial é desejável. Pode não haver dúvidas de que a independência permite às agências alguma meio de insulamento do poder presidencial e aumenta o poder de supervisão dos conselhos legislativos, que não precisam sustentar o efeito do insulamento do apoio presidencial. Nota 353 Ver Sunstein, nota 33 supra, pp. 41-43; supra pp. 430-32. Nota 354 U.S. CONST. art. II, § 1, cl. 1. Nota 355 Id. § 3. Nota 356 272 U.S. 52 (1926). Nota 357 Ver id. pp. 163-64 (“O artigo II concede ao Presidente [...] o poder de indicar e remover agentes públicos do Executivo – uma conclusão confirmada por sua responsabilidade de zelar pela fiel execução das leis”). Nota 358 295 U.S. 602 (1935). Nota 359 Id. p. 628. Nota 360 Id. pp. 628, 630. Nota 361 A afirmação de que em Humphrey's Executor decidiu-se que a produção de normas é um poder quase-legislativo é, contudo, equivocada. À época de Humphrey's Executor, não Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 104 havia sido decidido que o FTC tem poder para produzir normas (rulemaking power). Por funções “quase-legislativas”, a Suprema Corte referia-se a ações investigativas e de relato. Ver Scalia, nota 323 supra, p. 109. Especificamente falando, Humphrey's Executor é uma decisão excessivamente limitada. A Suprema Corte decidiu somente que um membro afastado do FTC tem o direito a salários atrasados. O caso não envolveu um processo para restauração do cargo e, portanto, a Corte não concluiu que o Congresso pode assegurar sua estabilidade – somente que a compensação é devida àqueles que o presidente afastou. Além disto, o caso não envolveu um afastamento com fundamento na recusa de implementar uma política presidencial. Nota 362 Ver a respeito Miller, nota 323 supra, p. 83 (apontando os questionáveis fundamentos constitucionais em que as agências independentes estão apoiadas); Note, Incorporation of Independent Agencies into the Executive Branch, 94 YALE L.J. 1766 (1985) (argumentando que a decisão em Humphrey's Executor deveria ser revista e que as agências independentes deveriam ser incorporadas ao poder executivo). Nota 363 Ver Miller, nota 323 supra, p. 93. Nota 364 Ver Grundstein, Presidential Power, Administration and Administrative Law, 18 GEO. WASH. L. REV. 285, 289-326 (1950). Nota 365 Ver Strauss, nota 43 supra, pp. 587-96; nota 352 supra. Nota 366 Ver Bowsher v. Synar, 106 S. Ct. 3181, 3188 n.4 (1986). Nota 367 Id. p. 3190. Nota 368 Esta conclusão é sustentada por enunciados claros de princípios de interpretação legal que aconselham os tribunais a evitar interpretações que levantam questões constitucionais. Ver, e.g.; Kent v. Dulles, 357 U.S. 116, 127- 30 (1958) (interpretando leis de forma a evitar questões constitucionais). Sob esta abordagem, leis com linguagem ambígua deveriam ser interpretadas para permitir considerável poder de supervisão presidencial. Nota 369 Ver M. BERNSTEIN, nota 3 supra. Nota 370 Ver id. p. 163, pp. 286-87; NATIONAL ACADEMY OF PUBLIC ADMINISTRATION, nota supra145, pp. 15-20. Nota 371 Alguma independência, contudo, é necessária para que a agência desempenhe algum papel. Por exemplo, embora o Presidente possa não tomar a última decisão, um ponto reconhecido no próprio caso Myers, ele pode remover um agente público após uma decisão ser tomada. Ver supra p. 498. Além disto, as agências exigem alguma independência quando exercem uma função judicatória. Ver Myers v. United States, 272 U.S. 52, 135 (1926). Nota 372 Ver a respeito S. BREYER, nota 26 supra (apresentando uma análise geral sobre a Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 105 reforma regulatória); Stewart, nota 318 supra (defendendo a adoção de estratégias de regulação “reconstitutivas” como uma alternativa à confiança nos sistemas regulatórios atuais e na desregulação). Nota 373 Ver supra p. 423. Nota 374 Ver New York Cent. R.R. v. White, 243 U.S. 188, 201 (1917) (sugerindo que se o governo aboliu os direitos do common law, deveria prover um “substituto razoavelmente justo”). Ver a respeito Sunstein, nota 135 supra (descrevendo a influência das linhas fundamentais do common law). Nota 375 Não deveria causar surpresa que a mesma Corte que tinha rejeitado o entendimento da era Lochner tenha produzido a decisão de Erie R.R. v. Tompkins, 304 U.S. 64 (1938), em que o common law foi, de modo similar, tido como um constructo, mais do que natural ou pré-político. Ver West Coast Hotel v. Parrish, 300 U.S. 379, 399 (1937) (concluindo que a ausência de uma legislação de salário mínimo é um “subsídio” aos empregadores); Miller v. Schoene, 276 U.S. 272, 279 (1928) (declarando que a falha em regular é “entretanto uma escolha”). Nota 376 Cf. F. D.Roosevelt, Speech Accepting the Nomination for the Presidency (July 2, 1932), 1 THE PUBLIC PAPERS OF FRANKLIN D. ROOSEVELT, THE GENESIS OF THE NEW DEAL, 1928-1932, at 657 (1938) (sugerindo que as leis da economia “são feitas por seres humanos” mais do que pela “natureza”); F. R. Roosevelt, Annual Message to Congress (Jan. 3, 1936), 5 THE PUBLIC PAPERS AND ADDRESSES OF FRANKLIN D. ROOSEVELT, THE PEOPLE APPROVE, 1936, p. 13 (1938) (“Nestes últimos anos nós somos testemunhas da dominação do governo por grupos financeiros e industriais [...] [Sob o New Deal houve] um apelo vindo do clamor de muitos interesses particularistas e egoístas [...] ao ideal de interesse público. O governo tornou-se o representante e o depositário do interesse público. Nosso objetivo [...] foi construir instituições essencialmente democráticas, buscando [...] a acomodação dos fardos, a ajuda aos necessitados, a proteção do fraco, a libertação do explorado, e a genuína proteção da propriedade das pessoas”); F. D. Roosevelt, Message to Congress, H.R. DOC. NO. 397, 73d Cong., 2d Sess. (1934), republicado em STATUTORY HISTORY OF THE UNITED STATES: INCOME SECURITY 61 (R. Stevens ed. 1970) (defendendo a segurança social como proteção necessária neste “nosso mundo feito por homens” (ênfase acrescida)); infra nota 386 (citando fontes discutindo a natureza contextual do pensamento social). A visão do direito como uma construção social foi uma conseqüência do realismo jurídico. Ver Hale, nota 11 supra, pp. 493-94. O teorema de Coase, ver Coase, The Problem of Social Cost, 3 J.L. & ECON. 1 (1960), foi um produto natural dos entendimentos do New Deal. Reverte também entendimentos de ação e inação por mostrar que julgamentos sobre causa e efeito, ou sobre quem prejudicou quem, foram convencionais mais do que naturais. Ver B. ACKERMAN, nota 135 supra, pp. 46-71 (1985). O teorema de Coase foi, portanto, o análogo no direito privado à rejeição constitucional de Lochner. Nota 377 Ver Heckler v. Chaney, 470 U.S. 821 (1985); Allen v. Wright, 468 U.S. 737 Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 106 (1984); supra pp. 474-78. Nota 378 Ver Sunstein, nota 135 supra, p. 214. Nota 379 Ver PruneYard Shopping Center v. Robins, 447 U.S. 74, 83-84 (1980) (sustentando uma anulação parcial das regras de proteção à propriedade imóvel (trespass law) do estado, mas indicando que uma anulação mais extensa resultaria abusiva); Kaiser Aetna v. United States, 444 U.S. 164, 179-80 (1979) (decidindo que o “direito de excluir” (right to exclude) é um incidente da propriedade). Nota 380 Ver Crawford v. Board of Educ., 458 U.S. 527, 538-39 (1982) (sugerindo que uma “mera revogação” da lei estadual de antidiscriminação é constitucional); Reitman v. Mulkey, 387 U.S. 369 (1967) (invalidando uma provisão constitucional do estado que derrubava uma lei de antidiscriminação, mas indicando que a anulação daquelas leis é em si permissível). Nota 381 Ver Cleveland v. Loudermill, 470 U.S. 532 (1985); Board of Regents v. Roth, 408 U.S. 564 (1972). Nota 382 Ver, e.g., Harris v. McRae, 448 U.S. 297 (1980) (distinguindo as limitações no poder do governo de regulamentar o aborto da obrigação afirmativa de financiar tais operações). Nota 383 Ver Craig v. Boren, 429 U.S. 190, 204 (1976) (sustentando que a demonstração estatística de proposições sociológicas amplas “está em tensão com a filosofia normativa subjacente `a cláusula de igual proteção (equal protection clause)”). Ver a respeito C. MACKINNON, FEMINISM UNMODIFIED 32-45 (1987) (sugerindo uma abordagem para a discriminação de gênero que se concentre no modo como essas diferenças se convertem em desvantagens, ao invés de se preocupar com a maneira como as diferenças surgem). Nota 384 Ver C. MACKINNON, nota 383 supra, pp. 32-40; Minow, The Supreme Court, 1986 Term--Foreword: Justice Engendered, 101 HARV. L. REV. 10, 34-36 (1987) (descrevendo a conexão entre análise jurídica e categorização). Nota 385 Ver C. MACKINNON, nota 383 supra, pp. 32-45. Nota 386 Tal tarefa associa a teoria jurídica a temas importantes no pensamento social contemporâneo, envolvendo inevitavelmente a posição social (situated character) do observador. Ver a respeito G. LAKOFF, WOMEN, FIRE, AND DANGEROUS THINGS: WHAT CATEGORIES REVEAL ABOUT THE MIND (1987) (mostrando que compromissos normativos são construídos na própria linguagem); T. NAGEL, THE VIEW FROM NOWHERE (1986) (discutindo a dificuldade de se elaborarem enunciados normativos e descritivos à luz da posição social de quem fala). Nota 387 Cf. Minow, nota 384 supra, p. 16 (instando o judiciário a “abordar questões de Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 107 diferença através da busca de premissas implícitas sobre diferença”); id. pp. 70-95 Nota 388 Ver supra pp. 474-77. Nota 389 Ver THE FEDERALIST NO. 46 (J. Madison). Nota 390 Ver THE FEDERALIST NO. 51 (J. Madison). Nota 391 Ver B. KARL, nota 1 supra, pp. 233-34 (discutindo a autonomia do estado como “democracia para alguns”); ver também S. Milkis, nota supra 91, pp. 72-73 (criticando a transferência feita pelo New Deal do poder local para o governo federal por ela enfraquecer o tradicional governo americano). Nota 392 Ver início citado na nota 391 supra. Nota 393 Ver B. BARBER, nota supra25; D. ELAZAR, EXPLORING FEDERALISM (1987); S. ELKIN, CITY AND REGIME IN THE AMERICAN REPUBLIC (1987); R. STEWART, FEDERALISM AND POLITICAL ECONOMY IN THE GREAT REPUBLIC (a ser publicado em 1987); Brest, Constitutional Citizenship, 34 CLEV. ST. L. REV. 175 (1986); Frug, The City as a Legal Concept, 93 HARV. L. REV. 1059 (1980); Rapaczynski, From Sovereignty to Process: The Jurisprudence of Federalism After Garcia, 1985 SUP. CT. REV. 341; Stewart, nota 25 supra; Walker, A Critique of the Elitist Theory of Democracy, 60 AM. POL. SCI. REV. 285 (1966). Nota 394 Ver G. McCONNELL, THE DECLINE OF AGRARIAN DEMOCRACY 166-72 (1953); G. McCONNELL, PRIVATE POWER AND AMERICAN DEMOCRACY 101-18 (1966). Nota 395 Ver a respeito J. D. GREENSTONE & P. PETERSON, RACE AND AUTHORITY IN URBAN POLITICS (1973) (discutindo a necessidade de participação comunitária de negros em sua luta por igualdade); G. McCONNELL, PRIVATE POWER AND AMERICAN DEMOCRACY, nota 394 supra, pp. 101-11 (enfatizando os meios pelos quais o estado e a autonomia local ameaçam grupos desavantajados e rejeitando as reivindicações de que a informalidade do governo produz justiça e que a rendição do poder público a grupos privados leva à democracia); Michelman, The Supreme Court, 1985 Term--Foreword: Traces of Self-Government, 100 HARV. L. REV. 4, 73 (1986) (argumentando que o estrito majoritarianismo (majoritarianism) não garantiu o engajamento ativo dos cidadãos); ver também THE FEDERALIST NO. 51 (J. Madison) (discutindo o perigo de maiorias sectárias em uma república de proporções reduzidas). Nota 396 Ver Stewart, nota 318 supra. Nota 397 Ver P. Weiler, The Future of Labor and Employment Law: Reflections on Wrongful Dismissal Within the Market, the Law, and Collective Bargaining (temp. ed. Oct. 1987) (manuscritos não publicados, em arquivo do autor). Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 108 Nota 398 Ver Ackerman & Stewart, Reforming Environmental Law, 37 STAN. L. REV. 1333 (1985). Nota 399 Ver Stewart, nota 318 supra, pp. 106-07. Nota 400 Ver, e.g., M. CARNOY & D. SHEARER, ECONOMIC DEMOCRACY (1980); R. DAHL, A PREFACE TO ECONOMIC DEMOCRACY(1985); C. PATEMAN, PARTICIPATION AND DEMOCRATIC THEORY (1977); Elster, The Possibility of Rational Politics, 28 ARCH. EUR. SOC. 67 (1987). Nota 401 Ver C. GUNN, WORKERS' SELF-MANAGEMENT IN THE UNITED STATES (1984); R. MASON, PARTICIPATORY AND WORKPLACE DEMOCRACY 136 (1982) (argumentando que esta “[p]articipação no local de trabalho é um meio eficiente de gerar maior participação no governo”). Para uma mais cautelosa, embora ardente perspectiva, ver E. GREENBERG, WORKPLACE DEMOCRACY: THE POLITICAL EFFECTS OF PARTICIPATION (1986), que analisa os efeitos da democracia no local de trabalho no noroeste do Pacífico em cooperativas madeireiras. Nota 402 Ver Rose-Ackerman, Does Federalism Matter?, 89 J. POL. ECON. 152, 154- 58 (1981). Nota 403 Ver P. PETERSON, CITY LIMITS 46-50 (1981). Nota 404 Ver fontes citadas na nota 395 supra. Nota 405 Ver, e.g., 15 U.S.C. § 1 (1982) (leis federais antitruste); id. § 2 (1982) (estabelecendo e definindo poderes da Federal Trade Commission). Nota 406 Ver, e.g., 42 U.S.C. § 7 (1982) (tratando da seguridade social). Nota 407 Ver, e.g., 42 U.S.C. § 2000(e) (1982) (proibindo a consideração de raça, cor, religião, sexo, ou origem nacional em decisões de emprego). Nota 408 Ver id. Nota 409 Ver, e.g., Endangered Species Act, 16 U.S.C. §§ 1531-1543 (1982). Nota 410 Ver Sax, The Legitimacy of Collective Values: The Case of the Public Lands, 56 U. COLO. L. REV. 537 (1985) (discutindo a posse de terra pública como um meio de promover valores coletivos); Stewart, nota 79 supra, at 1566-87 (descrevendo a teoria dos valores não materiais (noncommodity values)). Nota 411 Ver, e.g., Lawrence, nota 81 supra, pp. 350-51. Livro: Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano São Paulo: Editora 34, 2004 www.editora34.com.br Material para uso didático 109 Nota 412 Ver Barber, nota 39 supra, pp. 30-38. Nota 413 Ver Peltzman, nota 75 supra, pp. 212-13; Stigler, nota supra 75, pp. 10- 13. Entretanto ver M. DERTHICK & P. QUIRK, nota 128 supra, pp. 237-52 (descrevendo o papel da ideologia no movimento de desregulação); S. KELMAN, nota 120 supra, pp. 44-113, 231-85 (descrevendo o caráter de espírito público do comportamento dos representantes); A. MAASS, CONGRESS AND THE COMMON GOOD (1983) (idem).