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Prévia do material em texto

N? 0389
PAULO NADER
Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora. Expositor da Escola 
da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Juiz de Direito aposentado 
do Estado do Rio de Janeiro. Membro da Association Internationale 
de Philosophie du Droit et de Philosophie Sociale. Membro 
da Association Internationale de Méthodologie Juridique. Membro 
do Instituto Brasileiro de Filosofia. Membro Correspondente 
da Academia Brasileira de Letras Jurídicas.
Endereço eletrônico: pnader@powerline.com.br
CURSO DE DIREITO CIVIL
PARTE GERAL
E D I T O R A
F O R E N S E
Rio de Janeiro 
2003
apítulo XX
DEFEITOS DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
Sumário: 133. Vícios de consentimento e vícios sociais. 134. Erro. 
135. Dolo. 136. Coação. 137. Estado de perigo. 138. Lesão. 139. Simula­
ção. 140. Fraude contra credores.
133. Vícios de consentimento e vícios sociais
133.1. Aspectos gerais. Entre os elementos essenciais dos negócios 
jurídicos, destaca-se a declaração de vontade, que deve corresponder à 
vontade real, verdadeira, dos agentes, sob pena de comprometer a regulari­
dade do ato. Não basta que a declaração corresponda à vontade, pois é in­
dispensável que esta se tenha formado livre, consciente, isenta de pressões 
ou constrangimentos. Na palavra de Orosimbo Nonato, a vontade é “ele­
mento ontológico do ato jurídico, o seu princípio de eficácia e de vida ” e, 
conforme Trabucchi, constitui <(per accèlenza Velemento dinâmico dei 
mondo giuridico,\ x A vontade que vincula é apenas a manifestada seria­
mente, descartando-se, pois, as per iocuni, iocandi causa, emitidas em ato 
de puro gracejo. 1 •
Os negócios jurídicos, especialmente os contratos, são recursos técni­
cos que a ordem jurídica disponibiliza visando a composição dos interes­
ses. Quando a vontade declarada não corresponde à intenção ou ao querer 
espontâneo do agente não se pode afirmar que os interesses foram satisfei-
1 Cf. in Orosimbo Nonato, Da Coação como Defeito do Ato Jurídico, Rio de Janeiro,
Editora Forense, 1957, p. 99.
470 Piulb Nader
Se há uma declaração de vontade e se o agente é capaz, a forma é líci­
ta ou não vedada em lei, haver & existência e validade do negócio jurídico. 
A eficácia diz respeito aos efeitos jurídicos dos atos negociais. Um testa­
mento firmado por agente, que se encontra em pleno gozo de sua capacida­
de de fato e manifesta a sua declaração de vontade em sintonia com a lei, 
constitui negócio jurídico existente e válido. A sua eficácia se encontra 
condicionada ao evento morte do declarante. Os negócios jurídicos realiza­
dos na forma da lei tratam-se de negócios jurídicos existentes e válidos, 
mas, se submetidos à condição suspensiva, somente alcançarão a eficácia 
se o evento futuro e incerto realizar-se.7 Eficácia do ato, portanto, consiste 
na produção dos efeitos jurídicos correspondentes à natureza dos negócios 
jurídicos concretos.
Ao considerar inconfundíveis os planos do existir, do valer e do ser 
eficaz nos negócios jurídicos, Pontes de Miranda exercita algumas combi­
nações conceptuais: "... o fato jurídico pode ser, valer e não ser eficaz, ou 
ser, não valer e ser eficaz. As próprias normas jurídicas podem ser, valer e 
não ter eficácia. O que se não pode dar é valer e ser eficaz, ou valer, ou ser 
eficaz, sem ser; porque não há validade, ou eficácia do que não é
Relativamente aos efeitos dos atos negociais, três situações podem 
ocorrer na prática: A vontade declarada discrimina todos os efeitos; as par­
tes estabelecem o vínculo jurídico e não acrescentam ou restringem os efei­
tos previstos no ordenamento; os efeitos podem emanar tanto de cláusulas 
do negócio jurídico quanto da previsão legal.
133.3. Saneamento dos atos anuláveis. A caracterização dos vícios 
de consentimento faz anuláveis os atos praticados, todavia há dois modos 
de saná-los: pela ratificação e mediante a prescrição. Pela ratificação as 
partes confirmam o ato negociai, reconhecendo o vício que maculou o ne­
gócio. Tal iniciativa não se confunde com a providência prevista no art. 144 
da Lei Civil, pela qual o declarante que não incorreu em erro se oferece 
para retificar o ato praticado, colocando-o em conformidade com a vontade 
real da outra parte, visando a garantir a prática do negócio de fato. O segun­
do modo de sanar o vício de consentimento, se processa pela decadência 
(art. 178, CC). No dizer de Vicente Ráo: “O Direito repele o conceito de
7 Sobre esta matéria v. a obra de Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico - 
Existência, Validade e Eficácia, ed. cit., p. 23/5.
8 In Tratado de Direito Privado, vol. 4, ed. cit., p. 15.
Ctirno do D ireito C iv il - Parte Gerol 471
perpetuidade do tempo do conflito entre os elementos volitívos e a declara­
ção, e o repele a bem da segurança do comércio jurídico "\}
134. E rro
134.1. Conceito. Erro consiste na falsa representação intelectual da 
realidade. O erro pode ocorrer no processo de formação da vontade ou di­
zer respeito à declaração. No primeiro caso, a vontade se forma em premis­
sas falsas; no segundo o equívoco reside de declaração, A vontade do 
agente é “A” e este declara “B”. Conforme Orlando Gomes, “Aos dois ti­
pos dá-se modernamente igual trato”} 0 Quando o erro se dá na formação 
da vontade, tem-se o chamado erro vício; quando ocorre na declaração da 
vontade configura o chamado erro obstáculo, também denominado erro 
obstativo. Manuel A. Domingues de Andrade exemplifica o erro vício: “A 
compra a B o prédio C, na crença de existirem nele águas subterrâneas que 
pretende explorar, mas verifica depois que essas águas não existem”.1 O 
erro vício se forma antes da declaração mas é com ela que se substanciali- 
za. Nele não há desconformidade entre a vontade e a declaração. O erro 
obstáculo se dá na comunicação. O agente quer “A” e diz “B”. Nosso orde­
namento não distingue uma espécie da outra. A lei brasileira não distingue 
as duas espccies de erro.
O conceito vulgar de erro é mais amplo do que o jurídico, porque en­
quanto aquele pode originar-se em não-correspondências irrelevantes na 
ótica dos interesses, o erro jurídico pressupõe a não-correspondência signi­
ficativa, que importa, considerando-se o interesse geral das pessoas ou 
contemplada a situação concreta do agente emissor da vontade. Para a vali­
dade do negócio jurídico é preciso que a natureza do ato e o objeto corres­
pondam à convicção de seus agentes. Em certos casos é essencial ainda a 
identidade e as qualidades essenciais à pessoa com quem o agente pratica o 
ato negociai.
Erro é vício de consentimento que se forma sem induzimento inten­
cional de pessoa interessada. É o próprio declarante quem interpreta equi- 
vocadamente uma situação fática ou a lei e, fundado em sua cognição falsa, 
manifesta a vontade, criando, modificando ou extinguindo vínculos jurídi-
9 ln Ato Jurídico, ed. cit., p. 286.
10 In Introdução ao Direito Civil, ed. cit., p. 417.
11 Op. cit., vol. II, p. 233.
472 Paulo Nader
cos. A lei brasileira, para efeitos jurídicos, equipara o erro à ignorância, 
mas ambos expressam situações distintas. Enquanto no erro a vontade se 
forma com base na falsa convicção do agente, na ignorância não se registra 
distorção entre o pensamento e a realidade, pois o agente sequer tomara 
ciência da realidade dos fatos ou da lei. Ignorância é ausência de conheci­
mento, enquanto erro é conhecimento divorciado da realidade. Da mesma 
forma que o erro pode induzir à prática de ato negociai não correspondente 
à vontade íntima do agente, pode também levá-lo a abster-se da prática de 
negócio jurídico, que se realizaria não fora o equívoco no conhecimento.
Na opinião de Mazeaud et Mazeaud o erro constitui um fato jurídico 
e como tal é passível de prova por todos os meios, inclusive por presun- 
ções. Assim, se alguém paga elevado preço por uma pintura presume-se 
que a crença dodeclarante fosse a de adquirir o quadro de um mestre e não 
uma simples cópia. A prova do erro é de quem o afirma, pois o ônus da pro­
va cabe a quem alega.1 Segundo a Lei Civil brasileira o declarante deverá 
provar não apenas a ocorrência de um erro essencial e que este seria per­
ceptível no padrão vir medius, ou simplesmente que a outra parte tinha co­
nhecimento do erro e nada fez para impedir que o ato negociai se realizasse 
naquelas condições.
A reserva mental não exerce qualquer influência quanto à validade 
dos atos negociais, salvo se a outra parte dela tiver conhecimento. Configu­
ra um divórcio entre a vontade real e a declarada, mas não constitui um ví­
cio de consentimento uma vez que o agente atua com plena consciência. Se 
alguém faz promessa de recompensa e intimamente está decidido a não 
cumpri-la, tem-se um caso de divórcio entre o querer e a declaração, confi­
gurando a chamada reserva mental (§ 116).
Conforme o grau de intensidade do erro, Planiol distinguiu três espé­
cies: a) erro radical - o que impede a formação do ato; b) erro de gravidade 
média — o que não impede a realização do ato, mas provoca a sua nulidade; 
c) erro leve - que é indiferente e, malgrado a sua realização, o ato é válido*. 
Para o antigo professor da Faculdade de Direito de Paris, “Il est impossible 
de déterminer d ’une manière générale la distinction à faire entre les er­
reurs qui rentrent dans la deuxième et celles qui rentrent dans la troisième 
classe”} As soluções seriam variáveis de acordo com a matéria discipli-
12 Mazeaud et Mazeaud, in Lições de Direito Civil, Parte Segunda, Buenos Aires, Edicio- 
nes Jurídicas Europa-América, 1960, vol. I, p. 199.
13 Mareei Planiol e Georges Ripert, op. cit.y vol. I, p. 108.
Curso de Direito Civil ~ Pnrte Geral 473
nada. Tais observações de Planiol, indiretamente questionam a posição do 
legislador brasileiro, que estabeleceu para os negócios jurídicos em geral 
algumas regras sobre este vício de consentimento, não obstante as diversas 
normas específicas atreladas aos institutos a que se referem. Nossos Códi­
gos, tanto o revogado quanto o vigente, seguem, todavia, a tendência do 
Direito Comparado.1
134.2. Erro principal ou essencial e erro acidental
134.2.1. Conceito. Também denominado substancial, erro essencial é 
o que incide sobre qualquer dos dados fundamentais do ato negociai, sobre 
a sua essência ou substância, deturpando de tal forma a vontade do agente 
que se este tomasse ciência da realidade não teria celebrado o negócio ju­
rídico ou pelo menos do modo com que o praticou. Erro acidental é o que 
diz respeito a aspectos secundários do ato e que não funcionaria como 
obstáculo ao negócio se não houvesse a falsa representação intelectual da 
realidade.
134.2.2. Espécies de erro acidental ou essencial Confomie Roberto de 
Ruggiero o erro essencial caracteriza-se por uma das seguintes modalidades: 
error in negotio\ error in corpore; error in substantia e error in persona.
134.2.2.1. Error in negotio. Neste tipo a falsa representação intelec­
tual diz respeito à natureza jurídica do ato praticado. Pensa o agente que o 
imóvel lhe está sendo entregue a título de comodato e na realidade se trata 
de contrato locàtício.
134.2.2.2. Error in corpore. O dissenso entre a vontade real e a decla­
rada refere-se à identidade do objeto do negócio. Indica-se “A”, pensando 
tratar-se de “B”.
134.2.2.3. Error in substantia. O agente identifica corretamente a na­
tureza do vínculo estabelecido, bem como o objeto em função do qual ope- 
ra-se o ato negociai, todavia desconhece algumas de suas características
14 Não se tem conhecimento, com precisão, do pensamento romano dos períodos clássico 
e pós-clássico, sobre a figura do erro, uma vez que o texto do Corpus Juris Civilis foi 
alterado por seu compiladores, sendo difícil apurar o pensamento original. Conforme 
expõe o Min. José Carlos Moreira Alves, a invalidade do negócio jurídico exigia dois 
requisitos: a) escusabilidade; b) essencialidade. O erro não poderia ser grosseiro, nem 
de gravidade que implicasse, sem ele, a realização do ato. In Direito Romano, vol. I, ed. 
cit., p. 174.
474 Paulo Nader
essenciais. Exemplo: alguém adquire um aparelho televisor na crença de 
ser a cores, verificando depois que o seu funcionamento é em preto e bran­
co. As partes, conforme observa Enneccerus, notadamente no comércio de 
antigüidades, às vezes não se sentem seguras quanto à qualidade de um ob­
jeto e resolvem, mediante cláusula contratual, assumirem o risco.15 Ocor­
rendo tal hipótese, não se caracterizará a figura do erro e o ato não será 
passível de anulação.
134.2.2.4. Error inpersona. Esta espécie diz respeito à identidade da 
pessoa com quem o agente pratica o ato negociai ou a alguma de suas quali- 
dades. A empresa contrata fulano, pensando ser beltrano (quanto à identi­
dade). Alguém contrata os serviços profissionais de uma pessoa para a 
manutenção de seu equipamento, pensando tratar-se de técnico profissio­
nal, mas depois constata que se trata de estagiário. Coviello adverte que 
nao há como se confundir o error in persona com o error in nomine} Às 
vezes o declarante erra tão-somente quanto ao nome da pessoa em sua de­
claração, fato este que não leva à nulidade do ato desde que se possa apurar, 
objetivamente, a identidade verdadeira.
134.2.3. Espécies de erro acidental. Tal modalidade, conforme assi­
nalado, recai sobre elementos meramente circunstanciais. Na análise de 
Roberto de Ruggiero, pode referir-se in qualitate, ou seja, sobre qualidades 
secundárias; in quantitate, relativa aos bens que devem ser numerados, pe­
sados ou medidos. O erro acidental pode incidir sobre termo, condição e 
encargo. Relevante a destacar-se é que incidindo o erro sobre qualquer um 
desses elementos poderá qualificar-se como essencial, se os interessados 
assim estipularam em sua declaração de vontade.
134.2.4. Erro de fato e erro de Direito. Como as próprias denomina­
ções revelam, o erro de fato diz respeito ao objeto, à natureza da relação 
formada e às condições do ato negociai. Erro de Direito consiste no desco­
nhecimento das implicações jurídicas trazidas pelo negócio jurídico. Con­
figura também a espécie o conhecimento desvirtuado, errôneo, que não 
corresponde à interpretação corrente das leis aplicáveis ao caso concreto.
J 5 In Direito Civil- Parte Geral, 39a ed., Ia ed. espanhola, Barcelona, Bosch, Casa Edito- 
H rial, 1944, vol. 2o, p. 195.
16 Nicolas Coviello, in Doctrina General dei Derecho Civil, trad, da 4a ed. italiana, Méxi­
co, Union Tipográfica Editorial Hispano-Americana, 1938, p. 425.
Curso cii Direito Civil - Pnrto Ooral 47S
Segundo a lição de Mazeaud et Mazeaud, tal erro há de ser substancial e 
não recair sobre ponto controvertido e que enseja interpretação divergente 
dos tribunais.17
134 2.5. Efeitos do erro segundo a doutrina. Entre os autores latinos, 
conforme assinala A. Ferrer Correia, predomina o entendimento de que o 
erro essencial deve levar à nulidade, enquanto que o erro acidental, apenas 
à anulabilidade. O primeiro, então, constitui um verdadeiro obstáculo, que 
supera, inclusive, a vontade do agente que incidiu em erro. Ainda que este 
queira, a nulidade prevalece. Conforme o antigo professor da Faculdade de 
Direito de Coimbra: “O enganado não tem um direito de escolha entre 
manter o negócio jurídico de conteúdo inicialmente não querido e promo­
ver a sua anulação: pois o ser o negócio nulo (não apenas anulável) è uma 
pura conseqüência ex lege”.18
Tal posição se me afigura extremamente radical e contrária aos prin­
cípios que regem o Direito Privado, uma vez que a vontade das partes deve 
prevalecer sempre que não contrariar a lei, a ordem pública e os bons costu­
mes. A par deste argumento de fundo , há que se atentar para as dificuldades 
que se teria para a efetivação de tal teoria no campoprático. À revelia das 
partes, como o judiciário tomaria conhecimento do ato negociai è como im­
por a solução de uma sentença coercitivamente?
134.2.6. Erro e vício redibitório. Erro, como vício de consentimento, 
não se confunde com os chamados vícios redibitórios, que se acham regu­
lados entre os arts. 441 e 446 da Lei Civil, junto aos contratos. Conforme 
Colin et Capitant, erro "consiste em crer na existência de uma qualidade, 
de um fato, de um acontecimento, que em realidade não existem”, 9 en­
quanto que vício redibitório é defeito específico dos contratos comutativos 
e se refere apenas aos vícios ocultos da coisa, tomando-a imprópria ao uso 
a que se destina ou reduzindo-lhe o valor. A distinção fundamental entre 
ambos, para o jurista Francisco Amaral, consiste no fato de que o erro é fe­
17 Mazeaud et Mazeaud, op. cit., Parte Segunda, vol. I, p. 198.
18 In Erro e Interpretação na Teoria do Negócio Jurídico, 2a ed., Coimbra, Biblioteca Ju­
rídica Atlântica, 1968, p. 35. Entre os autores que seguem tal entendimento, na França 
e Itália, A. Ferrer Correia aponta os seguintes: Scialoja, Giorgi, Paciflci-Manzoni, Co- 
viello, Dante Caporali, Chironi e Abello, Ferrara, Messineo, Stolfi, Dusi, Butera, entre 
outros. Op.cit., p. 35.
19 Ambrosio Colin e H. Capitant, in Curso Elementar de Direito Civil, Madrid, Instituto 
Editorial Reus, 1952, Tomo Io, p. 180.
476 Paulo Näder
nômeno de natureza subjetiva, enquanto que o vício redibitório é de natureza 
objetiva “constituindo-se concretamente na ausência de qualidades que a 
coisa deveria ter”. É inequívoco, porém, que ao se constatar a existência 
do vício redibitório se estará constatando, também, que uma ou ambas as 
partes incidiram em erro. A matéria pertinente aos vícios redibitórios deve 
ser estudada na teoria dos contratos, que integra a parte das obrigações.
134,2.7. O erro no Direito Civil brasileiro. A Lei Civil dispõe sobre a 
matéria entre os arts. 138 e 144 e sob a epígrafe Do erro ou ignorância. Em 
tal capítulo as referências são apenas para a figura do erro, mas a interpreta­
ção da epígrafe deixa claro que, para todos efeitos, deve-se tomar as regras 
como extensivas à ignorância.
Conforme as circunstâncias em que os fatos se desenrolam, o erro 
substancial poderá induzir à anulação do ato negociai. E para que isto ocor­
ra caberá à parte prejudicada ingressar em juízo com a ação própria, Não 
basta que o ato tenha sido praticado sob impulso de erro essencial. A lei 
exige que o erro em questão seja perceptível pelo homem médio. Assim, 
nos atos bilaterais, se a parte que não cometeu o erro pôde notar que o dé­
clarante estava laborando em equívoco, e não interveio, fazendo o esclare­
cimento devido, certamente terá faltado com a boa-fè em detrimento do 
declarante. O que a lei deseja saber é se o erro poderia ser evitado por inici­
ativa de quem não o estava cometendo. O art. 138 do Código Civil optou 
por empregar uma presunção, que a meu ver é meramente relativa. Se uma 
pessoa, de mediana capacidade de compreensão, pudesse interpretar na 
conduta do declarante e nas circunstâncias gerais, que o mesmo estava inci­
dindo em erro essencial, ter-se-ia o ato como anulável. Caso contrário, não. 
Este é o primeiro requisito imposto para que o ato seja considerado anulá­
vel (art. 138, ÇC).
É de se atentar para o fato de que não basta a ocorrência do erro subs­
tancial para que o negócio jurídico seja anulável. O Código Civil de 2002
inovou ao instituir um co-requisito. O legislador teve por mira não apenas a01proteção do declarante, como fizera o Código Beviláqua (art. 86), que se 
limitou a declarar a anulabilidade dos atos praticados com erro substancial. 
Como esta solução simples poderia representar uma punição para a outra
20 In op. cit.y p. 484.
21 Era do seguinte teor o art. 86 do Código Civil de 1916: "São anuláveis os atos jurídi­
cos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial ”.
Curso do Direito Civil - Parte Geral 477
parte, o legislador impôs um segundo requisito, o qual envolve a participa­
ção deste último. Se o erro era perceptível pelo homem médio e mesmo as­
sim o negócio realizou-se, presume a lei que a outra parte agiu de má-fé, 
merecendo, destarte, sofrer os efeitos da anulação do ato. A solução foi sá­
bia, mas a sua aplicação prática é de todo complexa, pois não bastará ao re­
querente desenvolver a prova de seu erro, devendo produzir uma outra, a 
fim de convencer ao juiz de que o ex adverso poderia ter impedido o seu 
erro e se omitiu. A sensibilidade e a experiência do magistrado serão im­
portantes na avaliação da perceptividade do padrão vir medius.
A redação do referido art. 138 levou alguns autores à interpretação 
equivocada do co-requisito, entendendo que “a pessoa de diligência nor­
mal” se refere à pessoa que errou, quando na realidade, conforme assinala­
mos, trata-se do agente que participou do ato com a pessoa que errou. Tal 
dispositivo se inspirou no art. 1.428 do Código Civil italiano, que dispõe: 
O erro é causa de anulação do contrato quando fo r essencial e reconhecí­
vel pelo outro contraente”. Sílvio Rodrigues, com a acuidade de sempre, 
deu ao dispositivo a sua verdadeira inteligência: "... para que o erro possa 
ser proveitosamente alegado, mister se faz a demonstração de que a pes­
soa que contratou com a vítima do engano estava ao corrente de tal cir­
cunstância, ou poderia, com diligência normal, ter-se posto ao corrente do 
erro . Em igual sentido é a interpretação de Maria Helena Diniz: “O ne­
gócio só será anulado se presumível ou possível o reconhecimento do erro 
pelo outro contratante. Uma das partes não pode beneficiar-se com o erro 
de outra. Deve ser real, palpável e reconhecível pela outra parte, impor- 
tando efetivo prejuízo para o interessado ”.
Entre os requisitos básicos do erro a doutrina se refere à escusabilida- 
de, ou seja, o erro não pode ser grosseiro (error intolerabilis) e perceptível 
ao padrão vir medius. O erro há de ser escusável, desculpável. Diante da 
inovação trazida em nossa sistemática pelo art. 138, tal requisito se tomou 
irrelevante. Em se tratando de erro crasso e não acusado pela parte contrá­
ria, implicará a anulabilidade do ato, salvo se a parte que não errou se dis­
puser a refazer o ato em conformidade com a vontade real do agente.24
22 In Direito Civil, vol. 1, ed. cit., p. 192.
23 In Curso de Direito Civil Brasileiro, Io vol., ed. cit., p. 383.
24 Tal entendimento parece implícito na lição de Luis Díez-Picazo e Antonio Gullón: "... 
um erro inescusável deve possuir transcendência anulatória do negócio jurídico 
quando, dadas suas circunstâncias, fo i reconhecido ou pôde sê-lo pela outra parte em-
478 Pftltlo Nader
O erro substancial, do ponto de vista legal, configura-se nas modali­
dades seguintes, já consideradas neste capítulo: a) error in negotio; b) error 
in corpore; c) error in persona?5 d) error in substantia. Relativamente ao 
error in persona, seja quanto à identidade ou à qualidade essencial, exige a 
lei que a falsa representação intelectual da realidade tenha sido decisiva 
para a realização do ato. Se o agente contrata os serviços de uma pessoa, 
pensando tratar-se de outra, que é especialista, caracteriza-se uma das hi­
póteses. Se “A”, após breve namoro, casa-se com “B”, convencido de que 
se trata de pessoa de reputação ilibada, mas logo descobre antecedentes cri­
minais, verifica-se igualmente error in persona quanto à qualidade essen­
cial. Nos dois exemplos, o agente não teria praticado o negócio jurídico se 
conhecesse, respectivamente, a identidade da pessoa contratada e o passa­
do comprometedor da pessoa com quem convolou núpcias.
Para que o error iuris se caracterize como substancial, caracterizan­
do, destarte, a anulabilidade, impõe a lei dois requisitos: a) não constituir 
recusa à aplicação da lei; b) for o único motivoou a razão principal do ne- 
gócio jurídico. O conhecimento da lei, especialmente por parte de quem 
mantém práticas negociais, constitui um dever jurídico e social, destacado 
no art. 3° da Lei de Introdução ao Código Civil: “Ninguém se escusa de 
cumprir a lei, alegando que não a conhece ”. E foi em razão de tal princípio 
que o Código Bevilaqua não previu o error iuris}1 A doutrina distingue, to­
davia, ignorância de erro de Direito. Desnecessária, por outro lado, a res­
salva do dispositivo quanto a possível propósito de recusa à aplicação da 
lei, pois, havendo esta, não pode existir erro. Na prática o error iuris pode
pregando uma diligência normal. O contrário levaria à solução iniqua de que é licito 
aproveitar-se do erro sofrido por outro”. Op. cit., vol. II, p. 54.
25 Relativamente à qualidade essencial da pessoa, a Revista dos Tribunais, 676/149, re­
produz o seguinte acórdão: “Anula-se o casamento por erro essencial de pessoas, se 
comprovado ficou que a mulher, no casamento, desconhecia ser, o marido, portador de 
esquizofrenia transmissível por herança genética à descendência ”. Cf. in Nélson G. 
Bassil Dower, op. cit., vol. 1, p. 236.
26 O Código Civil de 1916 não previa o error iuris, fato que ensejou divergências doutri­
nárias. Enquanto Clóvis Beviláqua não admitia a figura, Carvalho Santos e Caio Mário 
da Silva Pereira se posicionavam diferentemente.
27 O Código Civil paraguaio, por seu art. 285, nivela o erro de direito nas declarações de 
vontade à ignorância da lei, não considerando-o motivo de anulação de negócio jurídi­
co. No mesmo sentido é o art. 1.270 do Código Civil uruguaio.
Curso do Direito Civil - Pune Geral 47«
caracterizar-se de vários modos. O agente que pratica o ato negociai partin­
do do conhecimento de uma regra geral, mas desconhecendo a existônoin 
de uma específica, interpreta erroneamente o jus positum, O erro há de ler 
significado especial para o agente que nele incorre, constituindo o único 
motivo ou na razão principal da prática negociai.
Para a caracterização de um erro essencial, a Lei Civil não exige que 
as partes façam declaração neste sentido. Relativamente ao erro acidental, 
este somente inquinará o negócio jurídico se expresso como razão determi­
nante daquela prática. De ordinário, o erro acidental não leva à anulaçSo, 
isto porque diz respeito apenas a componentes secundários do ato. Se al­
guém, por exemplo, encomenda um quadro de Portinari e a vontade decla­
rada não coincide com a vontade real quanto à cor da moldura, ter-se-á 
tão-somente um erro acidental, incapaz, por si só, de invalidar o ato de 
compra, salvo se a cor tenha sido objeto de cláusula contratual.
Uma vez caracterizado o erro, essencial ou acidental, produzirá os 
efeitos de lei, não importando se a declaração de vontade tenha sido mani­
festada diretamente ou por núncio, carta convencional, telegrama, e-niail 
ou por outros meios similares e a mensagem, por equívoco, tenha chegado 
truncada ao destinatário. É a previsão do art. 141 da Lei Civil: “A transmis­
são errônea da vontade por meios interpostos é anulável nos mesmos ca­
sos em que o é a declaração direta”.2* É preciso que o divórcio entre a 
vontade real e a declaração de vontade seja decorrência de mero acaso na 
transmissão por parte do núncio ou dos meios mecânicos, não configuran­
do se o intermediário propositadamente altera os dados da declaração.29
A figura prevista no art. 140 da Lei Civil corresponde à da pressupo­
sição, que foi objeto de estudo no capítulo anterior. Refere-se ao motivo 
determinante da vontade real. Esta se formou pressupondo verdadeira uma 
determinada realidade falsa. Como regra geral a pressuposição não integra 
o rol dos vícios de consentimento e somente pode ser causa de anulação de 
negócio jurídico se o motivo ficou consignado como razão de ser do negó­
cio jurídico.
O art. 142 é típico de interpretação de ato negociai. Indiretamente dis­
põe que é possível apurar-se a vontade real dos declarantes desprezando-se a
28 Note-se a imperfeição do texto, que situa a "transmissão errônea da vontade por meios 
interpostos ", como anulável, quando na realidade anulável é o ato praticado naquelas 
condições.
29 Conforme pensamento de Eduardo Espínola, apudFrancisco Amaral, op. cit., p. 487.
480 Paulo Nader
literalidade em prol do contexto e das circunstâncias do ato. À lei se refere 
apenas à identificação da pessoa e da coisa, mas é possível aplicar-se tal cri­
tério hermenêutico na exegese plena da declaração de vontade das partes.
Após figurar em vários anteprojetos que antecederam o Código Bevi- 
láqua, este não incluiu o chamado erro de conta ou de cálculo, que é aci­
dental, vindo a figurar em nosso ordenairiento apenas com o Código Civil 
de 2002, ex vi de seu art. 143: “O erro de cálculo apenas autoriza a retifi­
cação da declaração de vontade”: Por ele, o agente que laborou em erro 
poderá retificar a sua declaração. A retificação unilateral de conta ou de 
cálculo, todavia, deve ocorrer apenas em situações de erro ostensivo. No 
Direito Comparado tal disposição se acha no art. 24 do Código Civil suíço 
e art. 249 do Código Civil português.31
Pelo art. 144, importante inovação foi introduzida no instituto dos ne­
gócios jurídicos e que obstaculiza a anulação do ato. Se a parte que não in­
cidiu em erro se oferecer para realizar o negócio jurídico de acordo com a 
vontade real de quem errou, o ato negociai defeituoso deixa de ser anulá- 
vel. Observe-se que para ocorrer a perda de anulabilidade o ato negociai 
não precisa chegar a ser refeito, bastando que o interessado tenha se ofere­
cido para a sua realização. Se a oferta não for aceita o ato negociai perma­
necerá válido.
Discute-se, doutrinariamente, se o contratante, prejudicado pela anula­
ção do negócio jurídico por erro da outra parte, teria direito à indenização. A 
opinião prevalente, segundo Enneccerus, é no sentido positivo, ainda que o
• • • •# T ' • tdeclarante haja incorrido em culpa in contrahendo. A vista da inovação 
trazida ao nosso Direito pelo art. 138 do Código Civil, tal indenização não te­
ria qualquer cabimento, pois a anulação depende de culpa da parte que não 
incorreu em erro. E como é cediço em Direito, ninguém pode tirar vantagem 
de sua própria torpeza (nemo auditur propriam turpitudinem allegans).
Além de formular as regras gerais aplicáveis em matéria de erro e ig­
norância, o Código Civil considerou a incidência deste vício em alguns ins­
30 V. in Clóvis Beviláqua, Comentários ao Código Civil, vol. 1, ed. cit., p. 272.
31 No Código Civil suíço: " Art. 25... Os simples erros de cálculo não impedem a valida­
de do contrato; devem, porém, ser corrigidos. ” E no Código Civil português: "Art.
249. O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declara­
ção ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá o direito à 
retificação desta u. No Código Seabra tal disposição constava do art. 665.
32 Ludwig Enneccerus, op. cit., vol. 2o, p. 205.
Curso de Direilo Civil •** Parto Ocrai 481
titutos jurídicos. Assim é que, após considerar anulável o casamento 
celebrado em que houve erro essencial na declaração quanto à pessoa do 
outro cônjuge (art. 1.556 do CG), o Código Civil enumera as hipóteses ca- 
racterizadoras.33 Pelo art. 1.903 o diploma legal declara anulável a disposi­
ção do testamento em que houve erro na designação do beneficiário ou na 
indicação do bem. No mesmo artigo orienta o intérprete quanto à interpre­
tação do ato negociai, visando a revelação da vontade real do declarante. O 
art. 1.909 declara anulável a disposição testamentária decorrente de erro, 
dolo e coação.
Ao dispor sobre a prova dos negócios jurídicos, a Lei Civil (art. 214) 
prevê que a confissão é irrevogável, mas considera anulável se decorrente 
de erro de fato ou de coação. A transação é passívelde anulação, entre ou­
tros motivos, por erro essencial quanto à pessoa ou coisa controversa. E a 
disposição do art. 849, cujo parág. único veda a anulação por erro de direito 
quanto a “questões que foram objeto de controvérsia entre as partes ”. O 
art. 869 não considera relevante o erro em que incide o gestor de negócios 
ao dar as contas a outra pessoa, subsistindo os seus direitos se o negócio foi 
utilmente administrado.
135. Dolo
135.1. Conceito. Consiste o dolo em artifícios ou manobras de uma 
pessoa visando a induzir outra em erro a fim de tirar proveito para si ou para 
terceiro. E prática desonesta de que se vale maliciosamente alguém preten­
dendo a realização de um ato negociai vantajoso. Ao declarar a sua vontade 
sob o efeito de dolo o agente incide em erro, o qual, por si só, constitui vício 
de consentimento, mas na classificação do fato prevalece o dolo que abran­
ge, conceptualmente, o erro; é a sua causa. As duas espécies - erro e dolo - , 
todavia, não se confundem, pois enquanto no erro o equívoco se forma es­
pontaneamente, no dolo ele é induzido. Dolo é ardil para provocar o erro de 
alguém na formação de sua vontade ou na declaração. Pode acontecer de o 
agente atuar, dolosamente, visando a formar a consciência da parte, "a sua 
cabeça ”, levando-a a erro. Na palavra de Colin et Capitant “dolo supõe 
manobras fraudulentas, manipulações, afirmações falazes empregadas para 
provocarem o erro em uma pessoa e determiná-la a executar um ato 4
33 A disposição do art. 1.556 do CC é despicienda, à vista do disposto no art. 171, II.
34 Colin et Capitant, op. cit., p. 182.
482 Paulo Nader
Para a plena caracterização do dolo como vício é essencial que o 
agente que incide em erro desconheça o fato no momento em que declara o 
seu consentimento. Se antes de assinar o termo de contrato o deceptus vem 
a se cientificar da ocorrência e, não obstante, manifesta a sua vontade, des­
caracteriza-se o dolo como vício de consentimento. O declarante não pode­
rá alegar tal fato, posteriormente, como causa para anulação do negócio 
jurídico. O dolo invalidante deve ser anterior à declaração. Se posterior, 
não terá o condão de anular o ato negociai, pois a vontade declarada já é in- 
tangível. Pontes de Miranda retrata a hipótese de dolo posterior, mas 
como novo fato jurídico capaz de ensejar reparação por danos: “Dolo pos­
terior ou é ato ilícito relativo (e.g. arts. 1.057 e 1.060), ou absoluto (art. 
159), com a conseqüente irradiação de efeitos (prestação de perdas; repa­
ração de danos) ”.36 Marcos Bemardes de Mello exemplifica dolo poste­
rior. "... se aquele que contratou vender a casa mobiliada lhe retira parte 
ou todos os móveis... ”.37
Não apenas os atos bilaterais são suscetíveis de tal vício de consenti-
9
mento. E possível a sua ocorrência também nos atos unilaterais, como nos 
testamentos, e ainda nos plurilaterais. Quanto a estes, há distinções a se­
rem feitas. O negócio jurídico poderá ser, total ou parcialmente, defeituoso. 
Se apenas uma das partes, ou um terceiro em seu favor, agiu maquiavelica­
mente, deturpando a vontade, ou a declaração desta, de tal forma que o 
agente não praticaria o ato em seu todo em condições normais, o negócio 
jurídico estará contaminado por inteiro, salvo quanto a possíveis outras re­
lações jurídicas independentes e relativas às demais partes entre si.38 O 
pensamento de Emílio Betti é também neste sentido: ‘No contratoplurila- 
teral, o dolo adquire transcendência jurídica entre as partes do ato ilícito, 
mas não em relação à outra ou outras partes que têm permanecido estra­
nhas... ”.39
35 Neste sentido, v. Marcos Bemardes de Mello, in Teoria do Fato Jurídico - Plano da 
Validade, 5a ed., Editora Saraiva, 2001, p. 133.
36 In Tratado de Direito Privado, ed. cit., p. 327.
37 Op. cit., p. 133.
38 O art. 1.420 do Código Civil italiano prevê a hipótese de anulabilidade no contrato plu- 
rilateral: “...a nulidade que ferir o vinculo de uma só das partes não importa em nuli­
dade do contrato, a não ser que a participação desta seja, de acordo com as 
circunstâncias, considerada essencial ”. O art. 1.446 também contém disposição perti­
nente à matéria.
39 Emílio Betti, op. cit., p. 342.
Curio do Direito Civil - Parto Geral
Para a exata compreensão do conceito é necessária a distinção entre o 
dolus bonus e o malus. O primeiro é inofensivo e já incorporado às práticas 
do comércio em geral. É o vezo de supervalorizar a coisa colocada à venda 
ou às condições do negócio. A publicidade, especialmente a veiculada pe­
los canais de televisão, enaltecendo a qualidade do produto, tem o poder de 
induzir o ato de compra. O exagero na propaganda, todavia, tem o seu limi­
te, podendo configurar a chamada publicidade enganosa, quando transmite 
dados falsos, por inteiro ou parcialmente, quanto à natureza, característi­
cas, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço, entre outros. A 
publicidade enganosa pode caracterizar-se também por omissão de infor­
mações relevantes sobre os produtos ou serviços. É o que dispõe o art. 37 
do Código de Proteção do Consumidor (Lei n° 8.078/90). O dolus bonus 
não compromete a validade do ato jurídico-negocial, uma vez que geral­
mente corresponde às expectativas do consumidor. A distinção entre o do­
lus bonus e o malus deriva do Direito Romano.40
O dolo capaz de invalidar o negócio jurídico é o malus, que se reveste 
de gravidade, pois o agente não se limita a valorizar o seu produto ou servi­
ço, mas desenvolve argumentações, dissimula, vale-se de informações não 
verdadeiras e às vezes de sutilezas para surpreender o incauto, levando-o a 
participar de um ato negociai que, em circunstâncias normais, não o prati­
caria. Se, do ponto de vista teórico, não há dificuldade na distinção entre 
ambas classes, os casos concretos podem oferecer dúvidas quanto à classi­
ficação, devendo o julgador analisar as peculiaridades do fato, bem como 
os usos e costumes da região. Para Emílio Betti o critério de delimitação 
entre o dolo ilícito e a picardia lícita “se deduz das idéias dominantes, para 
uma sociedade como a atual, na prática comum do comércio O critério é 
contingente e variável, pois depende da consciência social41 Penso que, 
não obstante o esforço do juiz, se a dúvida persistir, haverá de se reconhe­
cer a presença do dolus bonus, uma vez que dolo não se presume, devendo 
ser devidamente comprovado para prevalecer na decisão. Conforme Aubry 
et Rau, o dolo “doit être clairement établV\ pois é sempre suscetível de ser 
provado por todos meios de prova juridicamente permitidos.42
40 V. in José Carlos Moreira Alves, Direito Romano, vol. I, ed. cit., p. 176.
41 Emilio Betti, Teoria General dei Negocio Jurídico, Madrid, Editorial Revista de Dere- 
cho Privado, s/d, p. 339.
42 C. Aubry et C. Rau, in Cours de Droit Civil Français, 4a ed., Paris, Marchai, Billard et 
Cie., Imprimeurs-Éditeurs, 1871, tome quatrième, p. 304. O art. 1.116, in fine, do Có­
digo Napoleão dispõe que: "O dolo não se presume e deve ser provado
4 Paulo Nudcr
135.2. Dados contingentes na definição de dolo invalidante« Para 
alcançar o preciso conceito de dolo invalidante, o jurista Marcos Bemar- 
58 de Mello 3 relaciona alguns dados realmente desinfluentes à caracteri- 
çflò daquela espécie de vício de consentimento:
I 135.2.1. Parte do ato em que o erro recai. Se o erro se refere a todo o 
ígôçio ou a parte dele isto é irrelevante à caracterização do dolo invalida- 
!p pois 0 importante a constatar é se o ato seria realizado se o agente não 
s$e .enganado.
135.2.2. Meios utilizados. Não é significativo o recurso empregado vi­
ndo a iludir, o importante é que o meio adotado seja eficaz, levando o agente 
)raticar o negócio jurídico com uma falsa representação da realidade.
135.2.3. Esçusabilidade. Não se exige que o erro seja escusável, isto 
que não possa ser percebidofacilmente no padrão vir medius. O relevan- 
é que tenha havido nexo de causa e efeito entre a manobra do declaratá- 
a e o erro cometido pelo deceptus.
135.2.4. Capacidade delitual. O autor da ação dolosa pode ou não ser 
nalmente capaz.
jjj, 135.2. 5. Autoria pelo diretamente beneficiado. Não é essencial que a 
ir).obra ardilosa tenha sido aplicada por quem participa do ato. Basta que 
lha sido por terceiro e que um participante do negócio dela tivesse prévio 
líhecimento e se omitido. O negócio não será anulável, mas o terceiro 
'á, passível de ser acionado por perdas e danos.
' 135:2.6. Intenção de causar dano e a ocorrência de dano. O essencial 
arácterização do vício de consentimento é a intenção de induzir em erro, 
Ò a ae causar prejuízo. Também não é necessário que haja prejuízo para o 
ieptUs. Neste sentido é o pensamento de Carvalho Santos, para quem 
2$ta que o artifício tenha sido empregado para induzir a pessoa a efe- 
i r urh negócio jurídico, o que não seria conseguido, na convicção do 
ente do dolot de outra maneira Clóvis Beviláqua inclui um duplo 
ípósito do autor do dolo: o de prejudicar o que incide em erro e ao mes- 
> tempo de beneficiar-se. 5
In op. cit., p. 133.
hl, Código Civil Brasileiro Interpretado, ed. cit., vol. II, p. 329. 
In Comentários ao Código Civil, ed. cit., vol. 1, p. 273.
Curso de Direito Civil - Parte Oeral 485
135.3. Induzimento a erro sem dolo. A figura em estudo pressupõe 
intenção, má-fé, que induz o declarante à pratica do ato. Pode ocofrer, toda­
via, que tal induzimento pelo declaratário do ato ou por terceiro, ciente o 
primeiro, não tenha ocorrido maliciosa e astuciosamente, mas incidindo 
concomitantemente em erro. Assim, um marchand, na crença de que um 
quadro é de autoria de Di Cavalcanti, convence o cliente a adquiri-lo è, pos­
teriormente, ambos verificam que se tratava de falsificação. Tal fato não 
caracteriza dolo, mas apenas erro. O negócio jurídico é passível de anula­
ção tanto quanto ocorresse por dolo. Se fora este o vício caberia ainda uma 
ação de indenização por perdas e danos. Esta é a diferença de natureza 
prática quanto aos efeitos jurídicos de ambas espécies. Nota-se, portan­
to, maior gravidade no dolo em relação ao erro. Neste mesmo sentido a ob­
servação de Carlos Alberto da Mota Pinto: “Só existirá dolo, quando se 
verifique o emprego de qualquer sugestão ou artifício com a intenção ou 
consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração...”,4 
Entre outros elementos que considera essenciais à caracterização do dolo 
invalidante, Marcos Bemardes de Mello inclui “A intenção de induzir, re­
forçar ou manter o outro figurante em erro. Não há dolo se não há intenção 
de provocar ou estimular o engano ”.
135.4. Dolo principal ou essencial e dolo acidental. Diz-se princi­
pal ou essencial o dolo (<dolus dans causam contratuí) que é a razão deter­
minante da prática do ato negociai. Se o agente não fosse enganado, 
estando ciente, pois, da realidade dos fatos, não teria declarado o seu con­
sentimento ou, se o tivesse, não seria com igual conteúdo.
Para a caracterização da espécie são necessários quatro requisitos: a) 
que a intencional forma de atuação sobre a vontade do declarante, visando 
a enganá-lo, tenha sido a causa que o levou à prática do ato negociai; b) que 
a ação enganosa tenha sido desenvolvida pelo parceiro do negócio jurídico 
ou por terceiro, desde que aquele tivesse ciência e se omitido; c) gravidade 
do método empregado, seja pelo enredo ou pelos artifícios empregados; d) re­
lação de causalidade entre a manobra enganosa e a declaração de vontade.48
Bem ilustrativo é o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do 
Estado do Rio Grande do Sul, que reconheceu a presença de dolo essencial
46 Op. cit., p. 397.
47 Op. cit., p. 132.
48 Cf. Antônio Chaves, in Enciclopédia Saraiva de Direito, vol. 29, p. 276.
486 Paulo Nader
cm uma prática bancária: “Se a parte, em confiança, firma com estabeleci­
mento bancário contrato visando a liquidar dívida de terceiro, a tanto con­
vencido pelo gerente da própria instituição que não informa as exatas 
conseqüências do negócio, emerge o dolo civil, caracterizado pelo erro em 
quo induziu o contratante que, ciente da amplitude da relação, não assinaria o 
contrato”.49 No enunciado do acórdão encontram-se todos os elementos ne­
cessários à caracterização do vício de consentimento: a) Desinformação inten­
cional, em lugar de esclarecimentos sobre a largueza das responsabilidades 
assumidas pelo declarante; b) erro em que incidiu o declarante; c) não fora a 
desinformação e o declarante não teria praticado o ato; d) relação de causa e 
efeito entre a desinformação intencional e a declaração de vontade. 0
O dolo chamado acidental (dolus accidens) também atua diretamente 
na formação da vontade, mas para determinar apenas certas condições do 
ato. O agente se utiliza de expedientes escusos, a fim de obter vantagem ou 
simplesmente para prejudicar o declarante, induzindo-o a aceitar determi­
nadas cláusulas secundárias do negócio jurídico. Embora não tenha o con­
dão de anular o ato, pode ensejar ação dc reparação de danos sofridos.51
O denominador comum entre o dolo principal e o acidental, conforme 
Trabucchi, “é que em ambos casos se requer uma relação de causalidade 
entre o engano e o consentimento ”.52
135.5. Dolo comissivo e dolo negativo. O vício de consentimento, 
ora em estudo, pode caracterizar-se mediante ação (dolo comissivo ou posi­
tivo) ou por omissão do agente (dolo negativo ou omissivo).
49 Apelação cível n° 599398096, em que foi relator o Des. Ilton Carlos Dellandrea. Julga­
mento realizado em 04.11.99.
50 Em recente acórdão o Superior Tribunal de Justiça anulou contrato de cessão de direi­
tos hereditários, reconhecendo que os cedentes, analfabetos, foram induzidos a erro: 
"Caso em que irmãos analfabetos foram induzidos à celebração do negócio jurídico
> através de maquinações, expedientes astuciosos, engendrados pelo inventarian- 
te-cessionário. Manobras insidiosas levaram a engano os irmãos cedentes que não ti­
nham, de qualquer forma, compreensão da desproporção entre o preço e o valor da 
coisa. Ocorrência de dolo, vício de consentimento ”, 4a Turma do STJ, Rei. Min. Bar- 
ros Monteiro, RESP 107961/RS, julgamento em 13.03.2001.
51 V. in Amoldo Wald, op. cit., p. 203.
52 Apud Luis Rojo Ajuria, El Dolo en los Contratos, Ia ed., Madrid, Editorial Civitas, 
S. A., 1994, p. 159.
Curco dc Direito Civil » Parto Geral 487
135.6. Regras do Direito Civil sobre o dolo
135.6.1. Anulabilidade do ato negociai por doloso induzimento a 
erro. O dolo essencial toma o negócio jurídico anulável, a teor do art 145 
do diploma legal. A solução legal é justa e se acha em harmonia com a dou­
trina e o Direito Comparado. A lei deixa ao critério do declarante a iniciati­
va para a invalidação do ato. Pode ser que este, consultando os seus 
interesses, prefira reconhecer o ato e deixar escoar o prazo decadencial de 
quatro anos. No desenrolar da ação judicial o declarante deverá provar: a) a 
má-fé do declaratário, ao induzi-lo em erro; b) que praticou o ato com falsa 
representação da realidade; c) que não praticaria o ato sob aquelas condi­
ções se não agisse com erro; d) que o erro em que incidiu foi causado pela 
ação ou omissão enganosa do declaratário.
135.6.2. Dolo acidental e seus efeitos jurídicos. Do latim accidenta- 
lis9 a palavra é empregada em oposição a substancialis. A primeira se refe­
re a dado meramente contingente, enquanto que a segunda diz respeito ao 
conteúdo essencial da coisa. Dolo acidental (dolus incidens) é o que recai 
sobre aspectos secundários, acessórios do negócio e que, por não se reves­
tir dc gravidade, não levaria o agente a desistir do ato negociai se conheces­
se previamente a realidade, embora pudesse fazê-lo de modo diverso. O art.
146 da Lei Civil dispõea respeito, estabelecendo não a invalidade do ato, 
mas o direito de indenização por perdas e danos. “A” adquire de “B” uma 
empresa de elevado valor e constata, posteriormente, que um dos veículos 
não pertencia ao patrimônio como “B” asseverara, mas a terceiro. In casu, 
constatada a prática de dolo acidental o negócio jurídico não será anulável, 
mas ao adquirente assistirá o direito de postular em juízo o ressarcimento 
do dano material. O dolo acidental não é considerado vício de consenti­
mento e nem o fato motivador do contrato.
135.6.3. Silêncio intencional. O legislador não confiou à doutrina o 
conceito de dolo negativo ou por omissão, dispondo a respeito ex vi do art.
147 do Código Civil. Enquanto que no dolo positivo ou comissivo a inten­
ção de enganar se consubstancia em ações objetivas, quando se utilizam de 
argumentos, mentiras, no dolo negativo ou omissivo o seu autor deixa de 
prestar informações relevantes sobre o negócio, fazendo o deceptus, ao de­
clarar o seu consentimento, crer em uma situação que não confere com a re­
alidade. O autor da ação dolosa omite um dado relevante do negócio. A Lei 
situa o silêncio intencional em negócio jurídico bilateral, quando a mano­
bra se dá por parte do declaratário em face do declarante. A previsão é 
para o dolo principal, quando o agente enganado possui o ônus de provar, 
por todos os meios juridicamente permitidos, que o ato não se realizaria se 
lhe fosse dado conhecer a realidade.
488 Paulo Nader
135.6.4. Dolo de terceiro. Quando o declarante é induzido por tercei­
ro a erro ao praticar o ato negociai, prevê o art. 148 do Código Civil duas si­
tuações distintas e que produzem efeitos jurídicos também distintos. Se o 
declaratário tinha conhecimento da ação dolosa ou pelo menos deveria co­
nhecê-la, o negócio jurídico assim praticado é anulável. Pensamos, toda­
via, que é indispensável ccrtificar-se sobre a natureza do dolo: se principal 
òu Se acidental. A conseqüência legal se refere apenas à primeira espécie. 
Se o dolo for acidental o efeito jurídico deverá ser apenas o de ressarcimen­
to por perdas e danos. Estando o declaratário isento de culpa em relação à 
manobra enganosa de terceiro, prevê a Lei Civil ação de perdas e danos 
contra o terceiro, caso o negócio jurídico não seja espontaneamente desfei­
to pelas partes.
135.6.5. Dolo por representante de parte. Quando a ação dolosa é 
praticada por representante, a Lei distingue as duas espécies de representa­
ção: a legal e a convencional, prevendo efeitos distintos para ambas. Em se 
tratando de dolo praticado por tutor, curador, pais, o representado só res­
ponde civilmente até o valor correspondente ao seu proveito. Na hipótese 
de representante convencional, diz o art. 149 da Lei Civil que o representa­
do responderá solidariamente com o autor por perdas e danos.
135.6.6. Dolo recíproco. Cogita a Lei Civil, finalmente, sobre a pos­
sibilidade de ambas as partes atuarem dolosamente na prática negociai, 
uma induzindo a outra em erro. Prevê o art. 150 que nenhuma poderá alegar 
o dolo da parte contrária visando a anulação do ato, nem pretender indeni­
zação por perdas e danos. A Lei não é expressa, mas a doutrina entende que 
a prescrição abrange tanto o dolo positivo quanto o negativo, o dolo princi­
pal e o acidental. Havendo reciprocidade, dá-se, portanto, uma compensa­
ção entre as ações dolosas (dolus inter utramque partem compensãtur). A 
solução brasileira para o dolo bilateral diverge da estabelecida no Código 
Civil de Portugal, de 1966, ex vi de seu art. 254: "... a anulabilidade não é 
excluída pelo facto de o dolo ser bilateral
135.7. Dolo e figuras jurídicas semelhantes. A palavra dolo é em­
pregada em várias acepções na linguagem jurídica. É um termo análogo ou 
analógico, pois se refere a sentidos que guardam entre si alguns pontos de 
contato: O principal deles é a má-fé que rege a conduta de quem exercita a 
dòlosidade, seja no âmbito civil ou criminal. Na primeira esfera é emprega­
do como vício de consentimento, què tem por conseqüência a anulabilida­
de do ato negociai. Nesta acepção é referido por dolo principal ou
Curso de Direito Civil - Parte Geral 489
essencial. Ainda no âmbito civil dolo significa ato ilícito, que é praticado 
visando a induzir a erro o declarante de ato negociai, relativamente a dados 
secundários do negócio e por isto mesmo provoca apenas o ressarcimento 
por perdas e danos. O dolo pode estar presente também na prática do ato ilí­
cito em sentido estrito, previsto no art. 186 do Código Civil. Tal espécie de 
fato jurídico pode ser praticado também com culpa stricto sensu, que com­
preende a imprudência, a imperícia e a negligência. O elemento objetivo 
consiste em violar direito e causar dano a outrem.
Genericamente, no campo do Direito Penal, dolo é elemento subjeti­
vo da ação criminosa. Na definição do art. 18 do Código Penal, age dolosa­
mente quem pratica uma conduta com vontade de praticar o crime ou 
assume o risco de produzi-lo. Conforme Miguel Reale Júnior enfatiza, "... 
relevante para o Direito Penal é a vontade da ação típica, pois a lesão ao 
bem jurídico pode ocorrer e o fato ser indiferente O dolo, presente na 
figura típica do estelionato, se assemelha ao dolo civil. A fraude é pratica­
da com intencionalidade, visando a tirar proveito para si ou para outrem. 
Como no dolus malus, a conduta do agente é maliciosa, visando a induzir 
ou a manter a vítima em erro. No estelionato faz parte do tipo a intenção de 
se obter vantagem ilícita em prejuízo de alguém, enquanto que no dolo o nú­
cleo conceptual consiste em induzir alguém em erro a fim de declarar o con­
sentimento em ato negociai que em condições normais não praticaria.54
135.8. Direito Comparado. O Código Napoleão conceitua o dolo 
principal, de acordo com a doutrina atual, em seu art. 1.116 e prevê, no dis­
positivo seguinte, a sua anulabilidade.55 A legislação alemã - BGB - tam­
bém dispôs apenas sobre o dolo principal e, concentradamente no art. 123, 
prevendo igual conseqüência à do Código Civil francês: a anulabilidade do 
ato negociai.56 O Código Federal suíço, èx vi de seu art. 28, vai mais longe e
53 In Instituições de Direito Penal, Parte Geral, Ia ed., Rio de Janeiro, Cia. Editora Foren­
se, 2002, vol. I, p. 218.
54 V. Marcos Bemardes de Mello, op. cit.f p. 139
55 Dispõe o art. 1.116: "O dolo é causa de nulidade da convenção quando os artifícios 
praticados por uma das partes forem tais que é evidente que, sem esses artifícios, a ou­
tra parte não teria contratado. O dolo não se presume e deve ser provado ”.
56 Diz a primeira parte do extenso dispositivo do Código Civil alemão: "Quem fo r levado 
a enunciar uma declaração de vontade por engano doloso ou, antijuridicamente, por 
ameaça, poderá impugnar a declaração... ”.
490 Paulo Nader
para considerar anulável o ato negociai ainda na ocorrência do dolo aciden­
tal: “Se um contratante, por parte do outro, fo r induzido à conclusão de um 
contrato por engano intencional, não será o contrato, para ele, obrigató­
rio, mesmo quando o erro resultante não fosse essencial”. Tanto o Código 
alemão quanto o suíço se referem ainda a hipótese de a ação dolosa partir 
de terceiro. O critério de anulabilidade está em harmonia com a previsão do 
Código Civil brasileiro. O Código Civil português, ao conceituar a figura 
do dolo, não distingue o principal do acidental (art. 253), apresentando a 
solução genérica de anulabilidade do ato, aplicável também para os casos 
de dolo recíproco (art. 254). O Código Civil italiano se mostra também har­
mônico com o Direito brasileiro: a) distingue dolo principal (art. 1.439) de 
dolo acidental (art. 1.440); b) prevê a anulabilidade para o dolo principal e 
reparação por perdas e danos em relação ao dolo acidental.
135.9. Avaliação crítica dos sistemas. Prima facie , o critério brasi­
leiro de estabelecer diferentesefeitos jurídicos para dois níveis de gravida­
de se apresenta como justo e ao mesmo tempo prático. De fato, a previsão 
de anulabilidade para o dolo principal e de indenização por perdas e danos 
em face do dolo acidental se apresenta, em princípio, como solução equâ­
nime. No primeiro caso, o declarante que incorreu em erro é quem avaliará 
da conveniência ou não de requerer a anulação do ato negociai. No segun­
do, cabível tão-somente a reparação por perdas e danos.
Embora o sistema pátrio não se manifeste neste sentido, penso que ao 
deceptus não se poderá negar, havendo o dolo principal, a opção pela repa­
ração por perdas e danos, mantido o vínculo existente, pois, no caso con­
creto, a anulação poderá apresentar efeito penalizador. Outro aspecto que 
ressalta é a dificuldade, em muitos casos, de se distinguir, na espécie, se 
ocorreu o dolo principal ou o acidental. Se o pedido judicial for o de desfa- 
zimento do negócio e o juiz se convencer que a ocorrência foi a de dolo aci­
dental ou vice-versa? Há que se permitir o pedido alternativo ou a 
fungibilidade das ações. Conforme observa Luis Rojo Ajuria, há situações am­
bíguas e de difícil definição. Razão assiste a Josserand, quando conclui que: 
“por força das coisas, a distinção do dolo determinante e do acidental toma o 
aspecto de uma questão de fato, submetida à apreciação dos juizes”?1
57 Cf. in Luis Rojo Ajuria, El Dolo nos Contratos, op. cit., p. 177.
Curso do Direito Civil ~ Fârto Geral 491
136. Coação
A coação prevista como vício de consentimento é a moral, vis com­
pulsiva, e não a coação física ou vis absoluta, pois esta simplesmente anula 
a vontade e um ato praticado nesta última circunstância é ato inexistente, 
radicalmente nulo. Se alguém, por exemplo, manu militari, apõe a impres­
são digital de uma pessoa em termo de contrato ou segurando a sua mão a 
faz assinar, ter-se-á coação física. Entre os artigos 151 e 155 o Código Civil 
dispôs sobre a coação moral como vício de consentimento.
136.1. Conceito. Coação é pressão de ordem moral, psicológica, que 
se faz mediante ameaça de mal sério e grave, que poderá atingir o agente, a 
membro da família ou à pessoa a ele ligada ou, ainda, ao patrimônio, para 
que a pessoa pratique determinado negócio jurídico. Em termos simples “é 
constrangimento injusto para a obtenção de um ato ”, conforme expõe Tito 
Fulgêncio. Tal animus inquina o ato negociai de vício de consentimento, 
tomando-o anulável, uma vez que a vontade declarada não corresponde à 
vontade real ou verdadeira. A declaração é expressa sem convicção, apenas 
por temor e para que o agente se livre do forte constrangimento. A hipótese 
não é de medo, porque este, por mais forte que seja, não configura vício de 
consentimento. Conforme o civilista Orosimbo Nonato, “O medo, em si, 
por intenso que seja, desconstitui defeito do ato jurídico se não deriva de 
pressão brutal e injusta desenvolvida por vontade estranha armada para 
tomar o consentimento do agente ”.5 Na comparação de Flour e Jean-Luc 
Aubert, enquanto o erro e o dolo atingem o consentimento em seu elemen­
to intelectual, a vis compulsiva atinge o consentimento em seu elemento de 
liberdade...”.60
Em Roma, o Jus Civile não considerava a coação um vício de consen­
timento, partindo da presunção de que se o coato praticou o negócio foi 
porque assim o quis, do contrário teria resistido (quamvis si liberum essea 
noluissem, tamen coactus voluit), daí o entendimento generalizado de que 
os negócios jurídicos assim realizados não seriam suscetíveis de anulação. 
A coação, tanto quanto o dolo, não teria relevância na formação dos atos 
negociais. Foi o Direito pretoriano quem reconheceu a invalidade dos atos
58 Apud Orosimbo Nonato, Da Coação como Defeito do Ato Jurídico, ed. cit., p. 111.
59 In Da Coação como Defeito do Ato Jurídico, op. cit., p. 119.
60 Jacques Flour et Jean-Luc Aubert, in Les Obligations - L 'acte juridique, 8a ed., Paris,
ArmandColin, 1998, vol. l ,p . 149.
obediência não é força irresistível, capaz de violentar a vontade. Se al­
guém, todavia, valendo-se desta relação acrescenta ainda ameaça de um 
mal grave, o negócio jurídico fica maculado e passível de anulação.
Nicolas Coviello questiona a hipótese de alguém, necessitando de 
ajuda em face de perigo criado por acontecimentos naturais, como incên­
dio, inundação, ou por ação de pessoas, como um bando de ladrões, con­
sente em praticar ato negociai com quem lhe presta socorro. Se a matéria 
for analisada em face do Direito pátrio pode gerar duplo posicionamento. O 
art. 151, que define o vício de consentimento, tem por núcleo a coação 
como fator que incute temor de dano. Nas hipóteses conjeturadas não há 
um elemento coator impondo a prática do negócio jurídico. O homo juridi- 
cus formalista, adepto do pensamento positivista, certamente excluirá a ca­
racterização, uma vez que o fato não possui a tipicidade da lei. É 
indubitável que o declarante não expressou a sua vontade real e que, em 
condições normais, não realizaria o ato negociai. O declaratário, ciente das 
condições psicológicas do declarante, foi nada escrupuloso, benefician- 
do-se do infortúnio e assumindo atitude contrária à moral. O negócio jurí­
dico será inválido, à vista do disposto no art. 104, II, da Lei Civil, uma vez 
que é contrário a moral. É de se notar que a hipótese apresentada não se en­
quadra nas figuras do estado de perigo e nem da lesão, que são dois novos 
vícios de consentimentos trazidos pelo Código Civil de 2002.
136.2.2. O bem ameaçado. Este deve ser relevante. Se de ordem pa­
trimonial, logicamente o bem ameaçado deverá ser de valor superior ao do 
negócio a ser feito. Assim, se “A” propõe obter um empréstimo junto a “B” 
por valor determinado e sob a ameaça de desaparecer com o carro de “B”, 
que se acha em seu poder e corresponde à metade do valor pretendido, não 
se poderá qualificar como grave a ameaça. O alvo da ameaça pode ser a 
pessoa do declarante ou algum membro de sua família ou, ainda, indiyíduo 
de sua ligação. Creio que o bem ameaçado pode ser qualquer um, desde que 
tenha importante significado para o declarante. Se este possui uma devoção 
profunda por uma determinada imagem religiosa e o elemento coator explo­
ra tal fato, impondo ao coato a prática do ato negociai sob pena de destruir 
aquele bem, ter-se-á a vis compulsiva. Ao praticar o ato o declarante estará 
premido por uma forte ameaça. Ao pleitear judicialmente a anulação o coato 
terá o ônus de provar: a) a ameaça; b) o significado da imagem em sua vida; 
c) que a única causa da declaração de vontade foi a ameaça sofrida.
67 Op. cit.y p. 429.
Curso de Direito Civil > Parto Gcrul 49S
136.2.3. Declaração de consentimento em ato negociai. A declara­
ção, sob coação moral, é um ato viciado de vontade. Esta não se expressa 
espontânea, livre, acorde com a vontade real, verdadeira, do declarantc, 
Este declara o que não quer, mas por se achar premido diante de uma alter­
nativa que lhe parece mais grave. Ao declarar, o agente opta pelo sacrifício 
que lhe parece menor. Na palavra do jurista Massimo Bianca “La violenza 
è la piü grave forma di lesione delia libertà negoziale ,
136.2.4. A grave ameaça como única causa para a declaração de 
consentimento. A caracterização do vício de consentimento exige que a 
grave ameaça seja a única causa da realização do ato negociai. A relação 
entre a ameaça e a declaração deve ser de causa e efeito.
Se, independente da ameaça, o ato fosse realizar-se nas mesmas con­
dições, ocorrendo, com a coação moral, apenas a antecipação do aconteci­
mento, ainda assim a vontade foi viciada, porque naquele momento o 
agente não queria praticá-la. Em situação como esta, todavia, a solução 
mais equânime seria a de se abrir uma alternativa para o declarante: a anu­
lação do ato ou o pleito indenizatório. Ambas situações, todavia, devem ser 
justificadas.Para a anulação o declarante haverá de patentear a inconve­
niência da prática do ato negociai no momento em que foi realizado contra 
à sua verdadeira vontade. Se a opção for a de ressarcimento por perdas c 
danos, estes deverão ser comprovados igualmente.
Teixeira de Freitas adverte que não poderá ser considerada coação 
moral a ameaça que se refere a “um mal impossível, quimérico, ou difícil 
de realizar-se” e também aquela que anuncia a retirada de uma vantagem 
que apenas fora prometida e não chegou a consumar-se.69
136.3. As regras do Código Civil de 2002. O conceito de coação 
moral como vício dc consentimento não se reveste de simplicidade que o 
faça encaixar-se, de modo suficiente, em uma definição doutrinária ou le- 
gal. Os cinco dispositivos de nossa Lei Civil cuidam, em última analise,
68 C. Massimo Bianca, in Diritto Civile, 3 ,11 Contratto, seconda edizione, Milano, Giuf- 
frè editore, 2001, p. 173.
69 In Esboço, vol. I, ed. cit., p. 173.
70 O Esboço de Teixeira de Freitas constitui valioso subsídio para a melhor compreensão 
da coação moral como defeito dos atos negociais. O notável civilista pormenorizou as 
hipóteses, enumerando tanto as situações fáticas que a caracterizam, quanto as que a 
excluem. A matéria é tratada entre os arts. 487 e 500. In Esboço, ed. cit., vol. I, p. 172.
496 Paulo Nader
de dizer em que consiste a vis compulsiva como defeito de negócio jurídico 
capaz de anulá-lo. Estão dispostos entre os arts. 151 e 155.
136.3.1. A ação do coator. Não importam os meios utilizados concre- 
tamente pelo coator, pois o relevante é que os recursos empregados tenham 
sido idôneos, o suficiente, para incutirem fundado receio na consciência do 
agente coato. Se o coator quis brincar, mas provocou a comoção no coato, 
levando-o a crer que se encontrava, por si ou por outra pessoa, sob grave 
ameaça, tal circunstância não deixa de caracterizar a vis compulsiva e o ato 
praticado se toma passível de anulação.
Por outro lado, se o propósito do agente coato era mesmo o de praticar 
o ato negociai nas condições e época em que se realizou, não terá havido ví­
cio de consentimento, não obstante toda a ação desenvolvida pelo coator, 
que terá praticado o delito de constrangimento ilegal, tipificado no art. 146 
do Código Penal.71
136.3.2. O coato. Na esfera judicial e no campo da prova, o importan­
te a ser apurado, em primeiro lugar, é se o ato negociai foi praticado sob 
efeito e motivação de temor. Para tanto o julgador não terá de considerar o 
padrão vir rnedius, mas a pessoa que foi coagida. Para simples referência o 
legislador orienta o juiz no sentido de levar em conta o sexo, a idade, a con­
dição, a saúde, o temperamento da vítima e demais circunstâncias (art. 
152). Nesta hora valerá a maior experiência de vida do julgador, sabedoria 
esta que os compêndios não passam, apenas alertam. Todos os meios de 
prova permitidos em lei deverão ser considerados para a diagnose de fato. 
Peça da maior importância deverá ser a oitiva do declarante pelo juiz, mo­
mento em que este perceberá o nível das reações do autor da ação.
Para aferir a gravidade do temor o juiz haverá de pesquisar todos os 
dados que os autos subministrem, seja ouvindo as partes envolvidas, seja 
colhendo depoimentos e estudando as demais provas carreadas aos autos. 
Deverá o julgador sopesar os meios utilizados, a fim de concluir por sua 
eficácia ou não na conduta do coato. Em se tratando de simples temor reve- 
rencial, quando o agente segue a orientação de pais, patrão, professor, mi­
nistro religioso, ou qualquer outra pessoa que lhe tenha ascendência, não
71 Dispõe o art. 146 do Código Penal brasileiro: “Constranger alguém, mediante violên­
cia ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a ca­
pacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não 
manda: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa ”.
G u m do Direito Civil PÜ fl Cerni
haverá a figura da coação moral, à vista do que dispõe o art. 153 da Lei Ci- 
vil. Roberto dc Ruggiero, todavia, adverte no sentido de não sc excluir a 
possibilidade de ocorrer a conjugação do temor reverenciais a vis compul­
siva:: "não pode excluir-se a priori que o metus reverentialispossa às vezes 
assumir a importância e a gravidade da verdadeira e própria vis e, assim 
invalidar o consentimento ”.72 Ocorrendo tal situação, penso, o intérprete 
haverá de reconhecer o vicio de vontade, não em razão do temor reveren­
ciai, mas da coação moral que antecedeu a prática do ato negociai, Não se 
deve considerar, para efeitos legais, conforme Roberto de Ruggiero73 o te­
mor que se origina de um perigo natural ou por um fato humano extraordi­
nário, tais como naufrágio, terremoto, guerra. Na coação moral é essencial 
que a ameaça vise a extorquir a declaração de vontade.
136.3.3. A iminência do dano. O dano que ameaça a segurança da 
pessoa ou de patrimônio há de ser iminente, segundo a Lei Civil, não com­
portando qualquer providência que possa impedir a ação criminosa, como a 
de pedir socorro policial ou a de impetrar ordem de habeas corpUs,
A iminência do mal a ser suportado não faz parte, todavia, do concei­
to puro de coação moral. Vejamos: O Código Civil italiano, por exemplo, 
não faz menção ao momento em que a ameaça promete consumar-se daí 
Roberto de Ruggiero, notável civilista italiano, assevere que “Não é, po­
rém, necessário que se trate de mal iminente ou atual, podendo ser futu­
ro ”.74 Para o Código Civil brasileiro de 2002 a iminência do mal ameaçado 
faz parte do conceito de coação moral: "A coação, para viciar a declara­
ção da vontade, há de ser tal que incuta à vítima fundado temor de dano 
iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens”.
Não se admite a futuridade do mal, uma vez que, em tal condição, o 
coato tem possibilidade de buscar o amparo da lei. Excepcionalmente po­
derá ocorrer uma hipótese em que a ameaça seja atual e o dano futuro mas 
incontrolável. Neste caso, penso admissível a caracterização da coação 
moral. Exemplo: A filha de um magnata é seqüestrada e o pai induzido à 
prática de um ato negociai sob a ameaça de que, dali a dois meses, quando o 
chefe do grupo sair da penitenciária, a filha será executada.
72 Op. cit., p. 338.
73 Op. cit., p. 338.
74 Op. cit., p. 337.
498 Paulo Nader
136.3.4. Ameaça e exercício regular de direito. Aquele que age nos li­
mites de seus direitos subjetivos não pratica coação moral. Assim, para in­
duzir o devedor a lhe pagar, o credor ameaça-o de levar o título a protesto. 
Premido pelo receio de ver abalado o seu crédito na praça, o devedor efetua 
o pagamento. O credor não exerceu ato algum de coação moral, apenas 
exercitou o seu direito. Se, todavia, extrapolou nas ameaças, poderá tanto 
responder criminalmente pela prática do crime de ameaça (art. 147 do CP) 
e civilmente por danos morais.
136.3.5. Presunção relativa. Em relação ao bem ameaçado, a Lei Ci­
vil, por seu art. 151, refere-se ao próprio agente coato, à sua família, aos 
seus bens, a qualquer outra pessoa. A única observação que a Lei faz é 
quando a pessoa ameaçada não for o declarante, membro de sua família, 
mas qualquer outra pessoa. A orientação é no sentido de que o juiz, consi­
derando as circunstâncias, concluirá se ocorreu coação. Tal diretriz é des­
necessária, pois qualquer que seja o entendimento do magistrado 
forçosamente deverá levar em conta todos os dados pertinentes ao enredo. 
Depreende-se que o propósito da mencionada disposição é a de se tomar 
por presunção relativa o nexo de afetividade que liga o coato ao membro 
ameaçado de sua família, capaz de emocioná-lo a ponto de praticar um ne­
gócio jurídico forçado pela gravidade da ameaça. Não se tratando de mem­
bro da família tal presunção inexistirá.
Relevante a destacar-se é que o parág. único do art. 151faculta ao juiz 
a decisão por eqüidade quanto à existência ou não de coação.
136.3.6. A coação por terceiro. Sob a vigência do Código Beviláqua a 
coação por terceiro tomava o negócio jurídico anulável incondicionalmen­
te. Com o Código Civil de 2002 a coação por terceiro pode levar à anulação 
do ato, desde que o declaratário tivesse ou devesse dela tomar conhecimen­
to. A Lei atual optou por proteger o declaratário de boa-fé em detrimento 
do agente coato. Ao referir-se ao declaratário, a Lei impropriamente o trata 
como “a parte a que aproveite ”, quando se sabe que é irrelevante à carac­
terização do vício tenha o declaratário proveito ou não. Quer dizer, se o de­
claratário não tomou ciência da violência moral, nem dela deveria 
conhecer, o negócio jurídico não será anulável. É o que dispõe o art. 154. 
Com tal iniciativa o legislador pátrio rompe com uma regra secular, já pre­
conizada por Pothier: "Quando a violência exercida contra mim para obri­
gar-me a contratar fo i exercida por um terceiro, sem a participação 
daquele com quem eu contratei, nem por isso o Direito Civil deixa de vir 
em meu auxílio, pois rescinde todas as obrigações contratadas por violên­
Cumo do Direito Civil Furto Ocrttl
cia, venha ela de quem vier... A convenção não será, po is, menos viciosa, 
mesmo quando aquele com quem me vi obrigado a celebrá-la não lenha 
participado da violência. Pois, mesmo não tendo ele participado, meu cotb 
sentimento não se torna por isso menos imperfeito...”?
Havendo ação de indenização por perdas e danos, o declaratário res­
ponderá solidariamente com o coator, desde que ciente d a coação ou dela 
devesse ter conhecimento na celebração do negócio jurídico. Nestas condi­
ções o declaratário estará passível de responder criminalmente como partí­
cipe no delito de constrangimento ilegal, por perdas e danos em ação ele 
ressarcimento e ser penalizado com a anulação do ato negociai. 0 terceiro 
deverá responder penal e civilmente em ação de indenização por eventuais 
prejuízos causados à vítima.
136.3.7. Sugestão hipnótica. Discute-se, no campo doutrinário, da 
conveniência de se prever conseqüência jurídica para o a to negociai prati­
cado sob sugestão hipnótica. Nem o Código revogado, nem o atual, rele­
rem-se à hipótese, mas esta foi prevista no art. 115, parág. único, do Projeto 
Beviláqua: “Entre os meios de coação moral compreendem-se as suges­
tões hipnóticas ”. A não inclusão de qualquer preceito sofcre a matéria nik) 
deve ser entendida como exclusão de possibilidade, conforme entende 
Orosimbo Nonato: ‘‘Se a sugestão hipnótica tolhe aquela liberdade ou al­
tera a normalidade da determinação, caracteriza-se defeito cuja qualifica­
ção depende das circunstâncias ”.7 ,
137. Estado de perigo
137.1. Conceito. Dá-se o estado de perigo quando alguém, premido 
pela forte necessidade de livrar-se de grave dano à pessoa,77 realiza negó­
cio jurídico com outrem, sabedor da situação, em condições excessivamen­
te onerosas. O agente pratica o ato fortemente influenciado pelas 
circunstâncias que lhe são adversas. Embora a figura em estudo não sc con­
funda com o vício coação, o declarante expressa a sua vontade sob efeito 
de forte pressão psicológica. Há urgência na realização d o negócio, que 6
75 Op. cit., pp. 48 e 49.
76 In Da Coação como Defeito do Ato Jurídico, ed. cit, p. 122.
77 O Código Civil brasileiro não especifica tratar-se de dano à pessoa, mas dúvida não há 
neste sentido. O Código Civil italiano, por seu art. 1.447 é explícito, ao enunciar: "... 
perigo atual de um dano grave àpessoa... ”.
500 P&ulo Nader
feito a fim de livrar o agente, membro de sua família ou pessoa de sua rela­
ção, do perigo em que se encontra. Sob a vigência do Código Beviláqua, o 
estado de perigo era tratado como coação por ato de terceiro, desde que o 
beneficiado tivesse ciência do ato coativo.78
137.2. Requisitos. A vista do disposto no art. 156 do Código Civil - 
único que regula a matéria - , são elementos essenciais à caracterização do 
vício de consentimento, que é inovação em nosso jus positum:
137.2.1. Perigo. O defeito em questão pressupõe estado de perigo, 
que se revela quando o agente, membro de sua família ou pessoa de sua li­
gação, necessita salvar-se de grave dano, que pode ser atual ou iminente. 
Exemplo: um indivíduo que necessita pagar um resgate para salvar a vida de 
seu filho que se encontra em poder de seqüestradores, pratica ato negociai 
excessivamente oneroso. Alguém, para se livrar de forte dor de dente, por 
falta de opção aceita as condições excessivamente onerosas do cirur- 
gião-dentista. O perigo pode decorrer de um fato humano, como no primeiro 
exemplo, ou de fato natural, como no segundo. Importante c que o ato nego­
ciai tenha sido praticado pendente o perigo. Se logo após, já não se poderá fa­
lar em estado de perigo, assim, qualquer promessa que tenha sido feita nestas 
condições não configura o vício de consentimento aqui abordado.
O perigo, segundo Maria Helena Diniz, não precisa ser real, bastando 
que o declarante tenha praticado o ato na suposição de se encontrar em tal es­
tado. Para tanto é preciso que o declaratário também incida em igual erro.9 
Ocorrendo situação contrária, ou seja, o perigo é real e o declarante supõe não 
se tratar de situação grave, não se caracterizará o estado de perigo.
Se a pessoa-alvo da proteção não é o próprio agente do ato negociai, 
nem qualquer membro de sua família, dispõe o parágrafo único do art. 156 
que o juiz decidirá conforme as circunstâncias. Há de haver um elo de forte 
significado entre o declarante e a pessoa-alvo, para justificar o ato. Tal lia­
me quase sempre é afetivo, emocional, quando se trata, por exemplo, de 
mãe de criação, afilhado, amigo fraternal, ou de outra natureza, como o elo 
profissional. A pessoa-alvo pode ser um funcionário imprescindível, ele- 
mento-chave na empresa do declarante.
137.2.2. Obrigação excessivamente onerosa. O ato negociai há de ter 
sido firmado em condições acentuadamente desvantajosas para o agente e
78 Cf. in Sílvio Rodrigues, op. cit., p. 217.
79 In Curso de Direito Civil, Io vol, ed. cit., p. 401.
Curso do Direito Civil - Pnrla Üerttl 501
apenas justificáveis diante de sua premente necessidade. As condições hão 
de ter sido impostas pelo declaratário e abusivamente, visando tirar provei­
to da situação do declarante. A hipótese será outra se as condições impostas 
pelo declaratário não decorreram da necessidade urgente da parte onerada. 
Se um piloto de helicóptero, de longa data, anuncia viagens por valores 
bastante elevados, quem se utiliza de tais serviços em estado de premência, 
visando a salvar a vida de seu filho, conduzindo-o para hospital em outra 
cidade, não revela intenção de tirar proveito. Por este exemplo não se con­
figura, tecnicamente, o estado de perigo. Com fundamentos outros, que 
não o do art. 156 do Código Civil, o declarante poderá pleitear a redução 
dos valores de tarifa que lhe foram cobrados.
137.2.3. Vilania do declaratário. Não basta que o declaratário tenha 
conhecimento da premente necessidade da outra parte. O fundamental é 
que tenha se aproveitado da situação, impondo condições que lhe são bem 
vantajosas e muito prejudiciais ao declarante. O declaratário age de má-fé 
tão-somente ao fixar as condições do negócio, pois não teve qualquer inter­
ferência no estado de necessidade em que se encontrava o declarante. Nem 
é preciso que tenha induzido a outra parte a realizar o negócio.
137.3. Efeitos jurídicos. Por força do disposto no art. 171, II, do Có­
digo Civil, o negócio jurídico realizado com vício resultante de estado de 
perigo é anulável. O rigor da lei advém, conforme Carlos Alberto Bittar, da 
circunstância de que a outra parte possuía conhecimento do estado de ne­
cessidade por que passava o declarante. O legislador, justamente porque 
houve má-fé, não

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