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O MERCADOR DE VENEZA E A OBRIGAÇÃO DOS CONTRATOS

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O MERCADOR DE VENEZA E A OBRIGAÇÃO DOS CONTRATOS
De bela iniciativa da Professora Luciana Araújo, nos permitir Shakespeare para falar da força dos contratos. A literatura clássica nos permite ter acesso a frases e situações que perduram até hoje. Ora, se perduram por centos anos é porque há pertinência com a atualidade. 
Nota-se subjetivamente um drama na escolha de gênero, pode-se inferir que Antônio vivia uma atração por Bassâni. Tem-se a impressão de que Antônio era solteiro. E tem-se a certeza de que Antônio arriscou tudo que tinha por Bassânio. Fala de Antonio: - A bem da verdade, nem sei de onde esta minha tristeza. Me incomoda saber que isso te incomoda. Mas, como foi que peguei isso, como foi que me achei assim, ou mesmo como foi que isso se apoderou de mim, e de que matéria ela é feita e onde está sua origem, ainda preciso descobrir. E tamanho idiota essa tristeza faz de mim, que me fica muito difícil reconhecer-me a mim mesmo.
O tema da peça tem como eixo central um contrato celebrado entre um agiota judeu Shylock e o mercador de Veneza Antônio (destemido inimigo dos agiotas), que foi procurado por seu amigo Bassânio, porque precisava de dinheiro para empreender uma viagem para conquistar a bela herdeira de Belmonte Pórcia, Antônio estava com todo dinheiro investidos nos navios em viagem.
Fazendo uma leitura jurídica da peça, podemos notar que ninguém sabe quem é a vítima ou quem é o vitimado.
Foram atrás de Shylock, que por satisfação de vingança, concedeu o empréstimo à Antônio, mas pediu como garantia se não houvesse o cumprimento da obrigação dentro do prazo, uma libra de carne do corpo do devedor. 
Bassânio parte para conquista de Pórcia, onde eles mutuamente se amam.
Podemos notar que na peça além do eixo central, ainda existem mais dois contratos, então são três:
1º) O contrato que Pórcia tem com o pai morto, que não conseguiu definir quem seria o pretendente da filha antes de morrer, ele então deixa um sistema de escolha de cofres, de ouro, prata e chumbo, quem escolhesse o correto seria o futuro marido. Aflita por cada pretendente que chegava e não lhe agradava, questionou: - Será que preciso cumprir a vontade de alguém que já morreu? Deve ser uma filha governada por um pai morto? Mas ela segue o mecanismo do pai e acaba funcionando.
Em termos políticos, há de se pensar se devemos ou não obedecer a uma Constituição como a nossa, elaborada em 1988, e que até alguns constituintes já morreram, tudo mudou e evoluiu. Faz sentido continuar valendo, ou temos que fazer acordos por cima do legislado?
2º) O contrato entre Pórcia e Bassânio, quando esta lhe dá o anel: - Tudo eu lhe dou juntamente com este anel; quando você dele se separar, ou perder, ou der para alguém, que isso seja o presságio da ruína de seu amor por mim, e terei nas mãos oportunidade de denunciá-lo, meu senhor.
Contratos não são tão simples como gostaríamos que fossem; eles são acordos entre as partes, carregado de interesses humanos que se materializam em cláusulas que quando descumpridas , o efeito é desastroso. 
3º) O contrato de Antônio com Shilock para beneficiar Bassânio, onde há muita coisa em jogo: - o poder, o cristianismo, o antissemistismo ( verdade que o antissemitismo que conhecemos após Auschwitz é outro). E vingança! Palavra esta que em meio a atualidade, com as crises de existência, crises sociais e tantas outras, não se vê no debate por parte de nenhum filósofo contemporâneo, na linha de Karnal e outros, apenas os clássicos nos dá essa dimensão.
- Ele se parece muito com um coletor de impostos que fosse humilde! Detesto o sujeito por ser um cristão, mas detesto ainda mais porque, assim humilde e simplório, ele faz empréstimos de graça e reduz a taxa de juros aqui para nós em Veneza. Se eu conseguir pegar ele de jeito, então alimento à larga o meu velho rancor contra ele. Ele odeia a nossa sagrada nação judaica e me insulta a mim, até mesmo lá onde os mercadores costumam se reunir, e ofende as minhas boas ofertas e o meu bem merecido e suado sucesso, que ele chama de ganhos em cima de juros. Amaldiçoada seja a minha tribo, se eu conceder perdão a esse sujeito!
Ao saber da perda nos navios de Antônio, Bassânio e seu amigo Grassânio imediatamente retornaram para Veneza. Disfarçadas de homens, supostos advogados, Pórcia e Nerissa sua criada também correram para Veneza. A questão seria discutida num tribunal, presidido pelo Duque que comandava a cidade.
Shylock levou o contrato ao Duque, exigindo cumprimento da cláusula. O Duque anunciou a chegada de um advogado. Era justamente Pórcia, que ninguém reconheceu como tal. Argumenta Pórcia, trazendo para os expectadores mais uma reflexão a respeito de justiça e piedade, pede à Shylock:
A misericórdia é uma virtude que não se pode fazer passar à força por uma peneira, mas pinga como a chuva mansa cai dos céus na terra. É duplamente abençoada: abençoa quem tem compaixão para dar e quem a recebe. Poderosa nos poderosos, harmoniza-se com o monarca no trono melhor que a coroa. O cetro denota a força do poder temporal, o atributo real que inspira o respeito à majestade, fonte do temor e da reverência aos reis. Mas a misericórdia está acima de qualquer movimento do cetro. Ela tem seu trono no coração dos reis, é um atributo de Deus e um tributo a Deus, é um poder mundano que se mostra divino, quando a misericórdia vem temperar a justiça. Portanto, judeu, embora o cumprimento da justiça seja a tua argumentação, considere o seguinte: no cumprimento da justiça, nenhum de nós vai encontrar a salvação. Nós lhe suplicamos por misericórdia, e essa mesma súplica ensina-nos a todos que devemos praticar a misericórdia. Até aqui, falei para mitigar a sua argumentação em prol da justiça, que, se for mantida, este tribunal de Veneza fica obrigado a dar sentença contra aquele mercador ali.
Bassânio fez uma intervenção e propôs pagar a Shylock o dobro da dívida. Pórcia examinou o contrato, insistiu na validade das cláusulas e argumentou que Shylock, de fato, deveria receber o combinado. Shylock assentiu; se pôs vitorioso.
A parte mais emocionante é o discurso de Shylock que tem uma reflexão sobre identidade e igualdade. Sou um judeu.- Então um judeu não possui olhos? Um judeu não possui mãos, órgãos, dimensões, sentidos, afeições, paixões? Não é alimentado pelos mesmos alimentos, ferido com as mesmas armas, sujeito às mesmas doenças, curado pelos mesmos meios, aquecido e esfriado pelo mesmo verão e pelo mesmo inverno que um cristão? Se nos picais, não sangramos? Se nos fazeis cócegas, não rimos? Se nos envenenais, não morremos? E se vós nos ultrajais, não nos vingamos?
Porém, Pórcia usou do positivismo de Hobbes e cumprindo a literalidade do contrato, faz exatamente o que Shylock pediu: dá-lhe apenas a letra da lei. - Portanto, prepara-te para cobrar-lhe a carne. Não derrames sangue, nem cortes um isso a mais nem a menos, mas exatamente uma libra de carne. Se tirares mais que uma libra exatamente, o menos, mesmo que seja a vigésima parte de um escrópulo para mais ou para menos, mesmo que seja por uma diferença em peso daquilo que se estima ser o peso de um fio de cabelo, tu morres, e todos os teus bens serão confiscados! A um estrangeiro era vedado o derrame de sangue de um cidadão veneziano. Assustado, e acuado, Shylock desistiu de executar o contrato e aceitou a oferta de Bassânio. Tarde demais. 
O Duque condenou Shylock à morte, aceitando relevar a pena se o judeu entregasse a Veneza parte de sua fortuna. Shylock também deveria aceitar o cristianismo, bem como deveria deixar sua herança para a filha Jessica, que fugira com um cristão.
Bassânio entregou o anel para Pórcia, imaginando agradecer ao advogado, sem saber que o destinatário do anel era dono do objeto. Isto é, não suspeitava de que o advogado era Pórcia. Quando Bassânio e Graciano retornam a Belmonte, à procura de Pórcia e de Merissa, foram acusados de infiéis pelas amadas, justamente porque deram os respectivos anéis. Pórtia revelou seus atos. Noticiou-se que o navio de Antonionão se perdera. A alegria dos personagens ao fim deduz que não há bem que sempre dure, nem mal que sempre ature
Do ponto de vista estritamente jurídico, a validade de um negócio jurídico requer objeto lícito, possível, determinado ou determinável (Código Civil Brasileiro, art. 104). Impossível a retirada de uma libra de carne, sem que se derramasse sangue de um cidadão veneziano. Ilícito garantir-se uma obrigação pecuniária com o próprio corpo.
Mas, o problema filosófico claro em questão, além dos acima citados, é a dogmática do direito, onde a essência é a norma, e até que ponto a teoria do direito deve centrar-se apenas na norma, relegando-se para outros campos das ciências que contribuem ricamente para uma sentença com equidade.

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