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Fibrilação Atrial: Tipos, Reconhecimento e Tratamento

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FIBRILAÇÃO ATRIAL 
1. Introdução: 
Depois da taquicardia sinusal, da bradicardia sinusal e das extrassístoles, é a arritmia mais comum. 
Fatores predisponentes: doença mitral reumática, hipertensão arterial, tireotoxicose, idade avançada, miocardiopatia com disfunção de VE, DPOC, doença 
do nódulo sinusal, síndrome de Wolff-Parkinson-White, etc. 
Fatores desencadeantes: estresse adrenérgico, estímulo vagal, libação alcoólica, uso de fórmulas para emagrecer, distúrbio hidroeletrolítico ou 
gasométrico, ICCC descompensada, miocardite, etc. 
É uma arritmia desencadeada pelo mecanismo de re-entrada – o estímulo elétrico, em vez de seguir um sentido único, pode retornar e percorrer caminhos 
circulares. 
2. Tipos Clínicos: 
FA, 1º episódio: paciente que apresenta FA pela 1ª vez, independente da duração ou da presença de sintomas. 
FA recorrente: quando ocorrem 2 ou mais episódios (maioria dos pacientes). 
FA paroxística: autolimitada e com reversão espontânea – dura menos de 7 dias, em geral 48h. 
FA permanente: FA que se mantém por mais de 1 ano. 
FA de baixa resposta ventricular: FA com FC < 100bpm – associada ao uso de inibidores do nódulo AV ou doença prévia do nódulo AV e idosos. 
- Essa classificação não se altera pela reversão do ritmo; alguns pacientes podem ter episódios de paroxística e de persistente – nesse caso, serão 
caracterizados pela forma predominante; essa classificação não é válida para os quadros secundários, pois geralmente se resolvem após o tratamento da 
condição de base. 
3. Reconhecimento no ECG: 
RR IRREGULAR (irregularmente irregular) AUSÊNCIA DE ONDA P QRS ESTREITO (exceto se bloqueio de ramo associado) 
4. Quadro Clínico: 
Pode ser apenas um achado assintomático no ECG, o que ocorre em 
25% dos casos (principalmente em idosos e pacientes com FA 
persistente). Pode, no entanto, estar associada a quadros graves, em 
que se observa que quanto maior a resposta ventricular (frequência 
cardíaca), maior a sintomatologia. 
As queixas mais comuns são palpitações, fadiga, dispneia, intolerância 
aos esforços e lipotímia. Poliúria pode ocorrer por liberação do peptídeo 
natriurético atrial. 
Os sintomas são particularmente mais importantes quando a FC está 
acima de 150bpm e/ou na presença das seguintes condições: estenose 
mitral, estenose aórtica, doença do nódulo sinusal, insuficiência 
cardíaca diastólica, coronariopatia, fração de ejeção muito baixa. 
Nesses pacientes, a FA pode se manifestar com edema agudo de 
pulmão, pré-síncope ou síncope. 
Ao exame físico, encontramos um pulso irregularmente irregular, assim 
como no ECG. Também pode haver a ausculta de batimentos, mas sem 
palpação de pulsos periféricos (déficit de pulso). Variação da fonese de 
B1 também pode ocorrer, bem como um dado clássico: ausência de B4, 
que depende da contração atrial. 
Principal complicação: fenômeno tromboembólico. Há estase atrial, 
predispondo a formação do trombo (principalmente no apêndice atrial 
esquerdo). O fenômeno tromboembólico é quase sempre um AVE 
isquêmico. A FA é a causa mais comum de AVE isquêmico 
cardioembólico 
 
 
 
 
 
 
4. Tratamento: 
1º Passo: Existe instabilidade hemodinâmica? 
Primeiramente, o que seria essa instabilidade hemodinâmica? Na arritmologia, não consiste somente na hipotensão arterial, como muitas vezes visto na 
prática. Devemos considerar como instabilidade hemodinânica os seguintes fatores definidores: 
 - Rebaixamento do nível de consciência ou síncope; 
 - Hipotensão arterial sintomática; 
 - Edema agudo de pulmão (ou descompensação da ICC); 
 - Fase aguda do IAM; 
 - Dor anginosa típica em repouso. 
4.1. SEM instabilidade hemodinâmica: 
Não há necessidade de cardioversão elétrica emergencial. Devemos ter em mente que existem dois objetivos primordiais nesses casos: (1) alívio dos 
sintomas e (2) prevenção de episódios tromboembólicos. Ou seja, a reversão do ritmo pode até ser feita, mas não está entre as prioridades. 
Observação: estudos demonstraram, inclusive, que com a reversão do ritmo, o paciente possui uma chance considerável de recidiva da FA, mesmo na 
vigência da terapia antiarrítmica profilática. Em outras palavras, a FA é uma arritima “tinhosa” e que, muitas vezes, não respeita as drogas antiarrítmicas 
profiláticas. 
Nestes casos, como a cardioversão não é a prioridade, temos duas possibilidades para tratamento: 
(1) CONTROLE DA FREQUÊNCIA: 
INIBIDORES DO NAV + TERAPIA ANTITROMBÓTICA CRÔNICA 
 - Costuma ser a escolha preferencial para os quadros recorrentes, em pacientes acima de 65 anos assintomáticos ou com sintomas leves. Nesta 
conduta, em vez de tentar converter a FA ao ritmo sinusal, nós nos limitamos a reduzir sua frequência cardíaca, agindo somente sobre o nódulo AV, que 
agem apenas baixando a resposta da FA, sem reverter a arritmia. Para tal, são usados os inibidores do nódulo átrio-ventricular. Vale lembrar, novamente, 
que os sintomas são decorrentes principalmente da frequência cardíaca alta, e não da perda da contração atrial. 
 - Os inibidores do NAV são: Diltiazem, Verapamil e Betabloqueadores (propanolol, metoprolol, etc). Os digitálicos só são indicados nos casos de ICC 
sistólica sintomática. 
 - Consideramos um bom controle da frequência quando os sintomas estão controlados e a FC de repouso está entre 60-80bpm ou FC no exercício 
(após caminhada de 6 minutos) entre 90-110bpm – mesmo nos pacientes assintomáticos, é importante manter a FC abaixo de 100bpm, para evitarmos a 
síndrome da taquicardiomiopatia (disfunção sistólica do VE decorrente da sobrecarga crônica de frequência). 
(2) CONTROLE DO RITMO: 
CARDIOVERSÃO (ELÉTRICA E/OU ANTIARRÍTMICOS) + PROFILAXIA DE RECIDIVAS COM ANTIARRÍTMICOS + TERAPIA ANTITROMBÓTICA CRÔNICA 
 - Costuma ser indicada para pacientes com menos de 65 anos, principalmente os sintomáticos, incluindo aqueles que foram refratários à terapia do 
“controle da frequência” e nos quadros secundários reversíveis (tireotoxicose, por exemplo) associados à função cardíaca normal. 
 - Nesse caso, objetivamos o controle do ritmo, ou seja, reverter a FA para um ritmo sinusal. Isso pode ser feito com antiarrítmicos e/ou cardioversão 
elétrica. Além disso, iniciamos drogas antiarrítimicas para a profilaxia das recidivas. 
 - Reversão com antiarrítmicos (cardioversão química ou farmacológica): as drogas devem ser iniciadas obrigatoriamente com o paciente hospitalizado, 
pelo risco de proarritmia. Os mais utilizados são amiodarona IV e propafenona VO. A amiodarona, particularmente, além de seus efeitos antiarrítmicos, 
também possui a propriedade de inibir o NAV – dose: 150mg de ataque em 30-60min + 1mg/min por 8h + 0,5mg/min por 16h. 
 - Cardioversão elétrica sincronizada: pode ser realizada de forma eletiva na FA estável ou de forma emergencial na FA instável hemodinamicamente 
(próximo tópico). Se o paciente estiver consciente, analgesia (opioide – morfina) associada a um agente sedativo (midazolam ou propofol) devem ser 
feitos. A oxigenação é fundamental – um oxímetro de pulso deve ser conectado. O choque deve ser sincronizado (cardioversão elétrica) e a carga inicial 
utilizada é de 100-200J. É mais efetivo que a cardioversão farmacológica. 
 - Antiarrítmico profilático oral: diante da grande chance de recidiva após reversão (farmacológica e/ou elétrica), a droga de primeira escolha é a 
amiodarona (200mg/dia). 
 
 
 
 
 
 
 
Cabe lembrar que uma taquiarritmia, para produzir 
instabilidade hemodinâmica, geralmente possui 
uma frequência cardíaca maior ou igual a 150bpm. 
Válido para FA persistente ou paroxística recorrente e para pacientes com fatores de risco para 
recidiva (idade > 65, doença mitral reumática,FE <40%, átrio E > 5cm no ECO, ausência de causas 
reversíveis). Na ausência desses fatores, não há indicação de terapia antitrombótica crônica e nem 
antiarrítmica profilática – apenas realiza-se o controle do ritmo + anticoagulação pré e pós-reversão. 
4.2. COM instabilidade hemodinâmica: 
CARDIOVERSÃO ELÉTRICA EMERGENCIAL + PROFILAXIA ORAL COM ANTIARRÍTIMICOS (?) + TERAPIA ANTITROMBÓTICA CRÔNICA 
 - Nesses casos, não há o que discutir. Uma CARDIOVERSÃO ELÉTRICA EMERGENCIAL deve ser prontamente realizada. Como não há tempo de 
anticoagular o paciente por 3 semanas ou de fazer um ECO transesofágico, o paciente deve ser heparinizado junto com a reversão e anticoagulado por, no 
mínimo, 4 semanas após, seguido de terapia antitrombótica crônica apropriada de acordo com o grupo de risco (ver adiante). 
4.3. Terapia anti-trombótica: 
Pela estase sanguínea atrial, existe um risco importante de formação de trombo no átrio esquerdo, especialmente no apêndice atrial esquerdo, visualizado 
apenas no ECO transesofágico. É por isso que existe a necessidade de instituirmos a terapia antitrombótica, realizada em dois momentos distintos: 
(1) Anticoagulação pré e pós-reversão da FA: 
 - NÃO há disponibilidade de ECO transesofágico: 3 semanas de anticoagulação plena com WARFARIN (INR= 2-3) antes da reversão; e fazer, no mínimo, 
mais 4 semanas de anticoagulação plena após a reversão. 
 - HÁ a disponibilidade do ECO transesofágico: na ausência de trombo, fazer HEPARINA PLENA (se paciente INTERNADO) 6-12h antes; ou WARFARIN (se 
paciente AMBULATORIAL) 5 dias antes + no mínimo, 4 semanas de anticoagulação plena após a reversão. Na presença de trombo no ECO, a reversão só 
poderá ser realizada após 3-4 semanas de anticoagulação (INR= 2-3 ou, pelo menos, 2.5 em caso de prótese valvar metálica) e repetição do ECO para 
confirmar o desaparecimento desse trombo. 
Observações: 
- Em caso de FA paroxística, instalada há menos de 48h, não há necessidade de anticoagulação por 3 semanas antes da reversão, nem de ECO 
transesofágico. Preconiza-se apenas a heparinização do paciente antes da reversão + anticoagulação por 4 semanas após a reversão. 
- Se paciente com um 1º episódio de FA, com reversão espontânea: recomenda-se apenas AAS por 4 semanas após a reversão. 
(2) Terapia antitrombótica crônica (ad eternum): 
 - Após a reversão de uma FA persistente ou paroxística recorrente, a anticoagulação com warfarin poderá ser mantida por tempo indeterminado – ad 
eternum (grupo de risco) ou trocada para AAS após 4 semanas (grupo de baixo risco). Assim, o primeiro passo é definir exatamente o risco de evento 
tromboembólico de cada paciente. 
BAIXO RISCO MODERADO RISCO ALTO RISCO 
Idade entre 65-74 anos Idade > 75 anos Embolia prévia (AVE, AIT) 
Sexo feminino Insuficiência cardíaca Estenose mitral 
Doença arterial coronariana FE < 35% Valva protética mecânica 
Tireotoxicose HAS e/ou DM 
 
 - A terapia antitrombótica crônica pode ser feita com warfarin (anticoagulação plena, mantendo-se INR= 2-3) ou com AAS 325mg/dia, respeitando as 
seguintes recomendações: 
CATEGORIA DE RISCO TRATAMENTO 
Sem fatores de risco Aspirina 81-325mg/dia 
1 fator de risco moderado Aspirina 81-325mg/dia ou Warfarin 
Alto risco ou mais de 1 fator de risco moderado Warfarin 
 
Observações: 
- FA secundária a causas reversíveis: as causas mais importantes são tireotoxicose, pericardite, fase aguda do IAM, pós-operatório imediato de cirurgia 
cardíaca e embolia pulmonar. Em todos esses casos, na ausência de instabilidade hemodinâmica (isso exclui a fase aguda do IAM), a opção costuma ser o 
emprego da estratégia de controle da frequência (inibidores do NAV) e terapia antitrombótica, até que a causa básica seja corrigida. 
- FA de baixa resposta ventricular: estes pacientes geralmente são idosos com FA persistente e doença degenerativa no NAV associada. Apresentam-se com 
FC < 100bpm e, por vezes, até bradicárdicos. A conduta resume-se à terapia antitrombótica crônica. 
 
 
 
 
 
 
- Síndrome bradicardia-taquicardia (doença do nódulo sinusal): qualquer antiarrítmico é contraindicado na ausência de um marca-passo funcionando. 
Portanto, a conduta sempre começa pela colocação de um marca-passo definitivo. 
FLUTTER ATRIAL 
1. Introdução: 
Tal como na FA, o flutter é uma taquiarritmia por re-entrada. Mas, nesse caso, trata-se de um circuito único de macro re-entrada, localizado no átrio direito. 
No flutter típico (tipo I), o circuito passa pelo istmo, entre a valva tricúspide e o óstio da cava inferior e percorre o sentido anti-horário, explicando as ondas 
F negativas em D2, D3 e AVF. 
Possui praticamente as mesmas causas da FA – ICC sistólica sintomática, DPOC, doença mitral reumática (mais comuns), pós-operatório de cirurgia 
cardíaca, etc. A grande maioria dos casos ocorrem em cardiopatas ou pneumopatas. Uma causa especialmente comum é a CIA (comunicação interatrial). 
Raramente ocorre de forma isolada (lone atrial flutter). 
2. Quadro Clínico: 
O flutter é uma arritmia geralmente transitória, revertendo espontaneamente para ritmo sinusal ou convertendo-se em fibrilação atrial. Os sintomas são 
os mesmos da FA: palpitações, fadiga, intolerância aos esforços, tontura, dispneia, precordialgia. 
3. Achados no ECG: 
INTERVALOS RR REGULARES APRESENTA-SE TIPICAMENTE COM CONDUÇÃO 2:1 – duas ondas de flutter para cada QRS. 
ONDAS DE FLUTTER TÍPICAS (DENTE DE SERRA E NEGATIVAS) NÍTIDAS EM D2, D3 E AVF. 
A FREQUÊNCIA CARDÍACA É 150bpm (dois quadrados entre as ondas R). 
Às vezes, podem haver variações eletrocardiográficas, como o flutter 
de condição 4:1 (a cada 4 ondas F, há um QRS). Esta apresentação do 
flutter ocorre em duas situações: (1) com o uso de inibidores do NAV e 
(2) indivíduos com doença prévia do NAV, geralmente idosos com 
doença degenerativa do sistema de condução. Ver no ECG 4. 
No caso do ECG acima, temos um flutter de condução 1:1 (após o 
quinto QRS). Trata-se de uma arritmia quase sempre relacionada à 
instabilidade hemodinâmica. Esse tipo de flutter só ocorre na vigência 
de drogas antiarrítmicas dos grupos IA e IC. 
No eletro acima, temos um flutter reverso. Vemos uma taquiarritmia 
ventricular, com RR regular, mas não vemos a onda F com seu 
aspecto típico de dente serrilhado. Neste tipo de flutter, as ondas F 
são positivas em D2, D3 e AVF (por isso o flutter é reverso) Para 
melhor visualização, realiza-se uma manobra vagal (compressão do 
seio carotídeo). Isto permite melhor visualização das manobras de 
flutter (“abrindo a taquicardia”). 
 
4. Tratamento: 
O flutter atrial é uma arritmia frequentemente sintomática (palpitações, fadiga, intolerância aos esforços, tontura, dispneia, precordialgia) e pode 
descompensar uma ICC ou uma estenose mitral. Além disso, pode se converter a qualquer momento em fibrilação atrial. 
Entretanto, na maioria das vezes, possui tendência à reversão espontânea (flutter atrial paroxístico), mas com risco elevado de recidiva (flutter paroxístico 
recorrente). Num grupo menor de pacientes, o flutter se comporta com cronificação da arritmia (flutter atrial persistente). 
 
Obs: O flutter atípico é aquele em que a frequência entre as ondas F é maior que 300 bpm – a distância entre as ondas R passa de 4 quadrados. 
Existem algumas semelhanças e diferenças em relação ao tratamento da fibrilação atrial: 
 - Uma semelhança é a decisão entre a estratégia de controle da frequência versus a estratégia de controle do ritmo. 
(1) CONTROLE DA FREQUÊNCIA: geralmente utilizada em pacientes estáveis hemodinamicamente e com alta chance de reversão espontânea para ritmo 
sinusal (sem ICC sintomática grave, átrio E < 5cm, início recente, causa reversível). Utilizam-se os inibidores do NAV (diltiazem,verapamil, 
betabloqueadores ou, em caso de ICC sistólica sintomática, digitálico). 
(2) CONTROLE DO RITMO: para casos de flutter persistente ou recorrente, ou sem os fatores de reversão espontânea. Pode ser feita de forma 
farmacológica ou elétrica. Entretanto, é a taquiarritmia que mais responde à cardioversão elétrica e que menos responde à cardioversão química 
(Ibutilida é a 1ª escolha e amiodarona a 2ª). 
A anticoagulação pré e pós-reversão também é necessária, assim como na FA, bem como a terapia antitrombótica crônica, dependendo do grupo de risco. 
Após a reversão, diante da chance de recidiva, iniciar, assim como na FA, antiarrítmico profilático oral – Dofetilida em 1ª escolha e Amiodorana como 2ª 
escolha. 
Há a possibilidade também da conduta intervencionista, com ablação por radiofrequência do istmo do átrio direito, com sucesso primário de 85% e taxa 
de recidiva de 15%. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
TAQUICARDIA SUPRAVENTRICULAR PAROXÍSTICA (TVSP OU “TAQUI SUPRA”) 
1. Introdução: 
Tipicamente, se apresenta como uma taquicardia de frequência bastante alta (120-250bpm). É uma arritmia por re-entrada – é precipitada por uma 
extrassístole atrial e tem como substrato arritmogênico a presença da dupla via nodal, ou seja, um nódulo AV composto por duas vias de propriedades 
eletrofisiológicas distintas: (1) via beta, de condução rápida e período refratário longo; (2) via alfa, de condução lenta e período refratário curto. A maioria 
das pessoas só possui a via beta, sem ter o risco, portanto, de desenvolver esta arritmia. 
 - Um estímulo precoce (extrassístole atrial) pode chegar ao nódulo NAV no momento 
em que a via beta está refrataria, mas a via alfa não. Esta possibilidade só existe porque o 
período refratário da via beta é longo e o da via alfa é curto. A extrassístole, portanto, 
alcançará o sistema His-Purkinje através da via alfa (figura 2A), e não pela via beta. 
 - Como a condução pela via alfa é lenta, há tempo suficiente para que a via beta 
recupere sua excitabilidade, assim que o estímulo chega ao feixe de His. Isso permite o 
retorno do estímulo pela via beta, encontrando novamente a via alfa (figura 2B) e 
iniciando repetidas rotações. É assim que se dispara o circuito de re-entrada. 
Existem duas propriedades eletrofisiológicas das fibras cardíacas: (1) velocidade de 
condução (rápida ou lenta) e (2) período refratário (curto ou longo). O período refratário é 
o tempo que a fibra demora a se recuperar do estímulo anterior. 
2. Tipos Clínicos: 
(1) Taquicardia AV por re-entrada 
nodal: corresponde a 75% dos casos. 
Mecanismo de re-entrada utiliza 
duas vias do nódulo AV – a via alfa 
(lenta) e a via beta (rápida). O tipo 
dito “comum” (90% dos casos) é a 
forma “lenta-rápida” – o estímulo 
desce pela via alfa e sobe pela via 
beta. O tipo dito “incomum” (10% 
dos casos) é a forma “rápida-lenta” – 
o estímulo desce pela via beta e sobe 
pela via alfa. 
(2) Taquicardia AV por re-entrada 
na via acessória: corresponde a 15-
25% dos casos. Mecanismo de re-
entrada utiliza o nódulo AV e uma 
via acessória (feixe de fibras 
musculares que comunica átrio com 
ventrículo e compete com o NAV). O 
tipo mais comum é a taquicardia 
ortodrômica (95% dos casos) – o 
estímulo desce pelo nódulo AV e 
sobe pela via acessória. O tipo 
menos comum (raro – 5%) é a 
taquicardia antidrômica – o estímulo 
desce pela via acessória e sobre pelo 
nódulo AV. 
3. Quadro Clínico: 
Acomete qualquer idade (predomínio em jovens) e não depende de cardiopatia estrutural. Manifesta-se com palpitações no precórdio ou no pescoço 
(geralmente muito intensas, que fazem o paciente parar o que está fazendo), tonteira, dispneia, poliúria ou síncope. Os sintomas começam e terminam 
subitamente (caráter paroxístico). 
4. Achados no ECG: 
4.1. Taqui AV Nodal Re-entrante: 
RR REGULAR FC ENTRE 120-250BOM QRS ESTREITO PSEUDO S (D2, D3 E AVF) PSEUDO R (V1) INÍCIO COM PR LONGO 
*Os átrios são ativados retrogradamente pela via beta. A ativação atrial é representada pela onda P retrógrada, tipicamente negativa em D2, D3 e AVF e 
positiva em V1. Como a via beta é de condução rápida, a ativação atrial ocorre quase ao mesmo tempo dos ventrículos. Portanto, a onda P retrógrada se 
inscreve praticamente dentro do QRS: ou a onda simplesmente não aparece ou aparece no final do QRS como uma pequena deflexão, simulando uma onda 
S em D2, D3 e AVF (pseudo S) ou uma onda R em V1 (pseudo R). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4.2. Taqui AV Re-entrante com Via Acessória: 
A ativação atrial retrógrada ocorre APÓS se completar a ativação ventricular – portanto, a onda P retrógrada (onda P’) se inscreve pouco depois do QRS. 
Outra diferença é que o PR da extrassístole atrial não é longo. 
Uma terceira diferença, que ocorre eventualmente, é a alternância de amplitude do QRS. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5. Tratamento: 
5.1. COM instabilidade hemodinâmica: 
Se instabilidade hemodinâmica = cardioversão elétrica emergencial com 150J. 
5.2. SEM instabilidade hemodinâmica: 
Se o paciente não apresentar sinais de instabilidade hemodinâmica, a primeira medida é tentar reverter a taquiarritmia com manobra vagal, através da 
compressão do seio carotídeo ou da manobra de Valsalva. A compressão carotídea é contraindicada na presença de sopro. 
Se a taqui supra não for extinta pela manobra vagal, a conduta é tentar a reversão farmacológica com ADENOSINA VENOSA, na dose inicial (em bolus) de 
6mg. Se não houver reversão, nova dose de 12mg. 
Se não reverter com Adenosina, a próxima medida é fazer o Verapamil venoso 5-10mg ou o Diltiazem venoso 20-25mg. Betabloqueadores venosos seriam 
outras drogas disponíveis. 
5.3. Terapia de manutenção (profilaxia): 
Após a restauração do ritmo sinusal, deve-se observar se o ECG apresenta critérios da síndrome de Wolff-Parkinson-White (PR curto e onda delta). Na 
ausência de tais critérios, poderá fazer o uso de Verapamil ou Diltiazem oral, combinados ou não com a Digoxina. Os betabloqueadores são drogas de 
segunda linha. 
5.4. Terapia intervencionista definitiva: 
Recomendada pela maioria dos arritmologistas, através da ablação por radiofrequência da via alfa (na taqui AV nodal) ou da via acessória (na Taqui AV por 
via acessória). A taqui supra é a arritmia mais curável pela ablação (95% de sucesso). 
 
SÍNDROME DE WOLFF-PARKINSON-WHITE 
1. Introdução: 
É uma síndrome decorrente da presença de uma via acessória congênita com capacidade de condução anterógrada (do átrio para o ventrículo), revelando-
se no ECG sinusal com o padrão da “pré-excitação ventricular” (PR curto e onda delta) e manifestando-se clinicamente com taquiarritmias de repetição, 
geralmente do tipo taqui-supra. 
Todo paciente com história de palpitações de início e término súbitos, ou de síncope inexplicada, ou com episódio registrado de taqui-supra, deve ter o seu 
ECG de repouso avaliado visando descartar ou confirmar a SWPW. 
Veja o que acontece: o estímulo sinusal chega ao nódulo AV e à via acessória, mas, como esta última apresenta condução rápida (em comparação com o 
nódulo AV), os ventrículos são ativados precocemente, explicando o intervalo PR curto. A ativação ventricular, proveniente da via acessória, começa pelo 
miocárdio (e não pelo sistema Hiss-Purkinje), justificando um alentecimento (?) na porção inicial do QRS, representado pela onda delta. A porção final do 
QRS é estreita, já que o término da ativação ventricular se faz normalmente pelo nódulo AV e sistema Hiss-Purkinje. Em outras palavras: os ventrículos sãoativados por 2 vias: via acessória (fase inicial) e nódulo AV-sistema Hiss-Purkinje (fase final). 
Um PR curto tem menos de 0,12 segundo (3mm). Lembrar que o intervalo PR é 
medido do início da onda P até o início do QRS! Geralmente, quando o PR está curto, 
a onda P praticamente ‘cola’ no QRS. A onda delta, como visto ao lado, é um 
alentecimento ou “espessamento” na porção inicial do QRS. O restante do QRS é 
estreito, embora sua amplitude e polaridade possam ser modificadas, o que faz do 
padrão da SWPW o ‘grande simulador’ eletrocardiográfico: pode ser confundido com 
infarto, hipertrofia de VE e bloqueio de ramo. 
 
 
 
 
BLOQUEIOS ATRIOVENTRICULARES 
1. Introdução: 
Neste grupo de arritmias, encontramos graus variados de bloqueio na condução do estímulo pela junção AV. O mais importante é definir em que ponto da 
junção está o problema. Quando falamos em junção AV, incluímos estruturas desde o nódulo AV, até o feixe de Hiss. O nódulo AV recebe ampla inervação 
parassimpática (vagal); o feixe de Hiss e seus ramos não recebem este tipo de inervação. 
Assim, dividiremos os distúrbios em “benignos” (acima do feixe de Hiss – supra-hissianos, responsivos à atropina) ou “malignos” (intra ou infra-hissianos, 
não responsivos à atropina). Os malignos geralmente se apresentam com sintomas mais graves, que vão desde síncope até PCR em assistolia ou FV. 
2. Ritmos Benignos: 
Causas? Todas as causas reversíveis de bradiarritmia sinusal também podem causar BAV benignos. Pode decorrer de quadros fisiológicos, como o sono; ou 
em outras situações, como a doença do nó sinusal, uma confição fibrodegenerativa, doença coronariana, doenças inflamatórias (pericartite, miocardite), 
drogas bradicardizantes (antagonistas do canal de cálcio, digitálicos, amiodarona, betabloqueador, etc), vagotonia (hipoxemia, HIC, IAM de parede anterior, 
medo, retenção urinária, etc). 
Clínica? Podem ser sintomáticos ou assintomáticos. 
Quais são e como aparecem no ECG? São arritmias em que o bloqueio da condução AV ocorre acima do feixe de Hiss. Estão incluídos: BAV de 1º grau, BAV 
de 2º grau Mobits I e algumas formas de BAV 2º grau 2:1. 
Tratamento? Nos quadros assintomáticos, nenhuma medida específica, exceto pela remoção de fatores desencadeantes. Nos sintomáticos, por se tratarem 
de condições benignas, a droga de escolha é a ATROPINA. Se não houver responsividade, fica indicada a implantação do MP. 
2.1. BAV de 1º Grau: 
Intervalo PR > 200ms (ou 0,2 segundos). O QRS geralmente é estreito. 
 
 
 
 
 
 
 
 
2.2. BAV de 2º grau Mobitz I: 
(1) Ondas P eventualmente bloqueadas (sem QRS). De acordo com a relação entre o número de ondas P para o número de complexos QRS, podemos dizer 
que são: 3:2, 4:3, 5:4, etc. O intervalo PR antes da onda P bloqueada é maior que o intervalo PR depois da P bloqueada. O QRS geralmente é estreito. 
(2) Fenômeno de Wenckebach: aumento progressivo do PR até o bloqueio da onda P. 
 
 
 
 
 
 
 
3. Ritmos Malignos: 
Causas? Doença de Lev-Lenegre (degeneração senil do sistema de condução), IAM de parede anterior (Mobitz II, BAVT) ou inferior (BAVT), miocardiopatias 
(especialmente a chagásica e as infiltrativas, como a amiloidose). 
Quais são e como aparecem no ECG? Nessas condições, o local do bloqueio costuma ser infra-hissiano (QRS alargado), mas também pode ser intra-hissiano 
(QRS estreito). Estão incluídos: BAV de 2º grau Mobitz II, BAV de 2º grau 2:1 ou BAVT. 
Clínica? Podem ser assintomáticos, mas geralmente são sintomáticos (síncope, cansaço, dispneia). 
Tratamento? Além da remoção de fatores reversíveis, o grande tratamento é a implantação de marca-passo. 
 - Em caso de instabilidade hemodinâmica, um MP transcutâneo deve ser aplicado (com o paciente sedado), enquanto é preparada a colocação de um 
MP transvenoso. 
 - Se o paciente estiver hemodinamicamente estável (mesmo que sintomático), o MP transvenoso é o primeiro passo. 
 - Na ausência de MP, o ACLS inclui como alternativa a infusão de dopamina (2-10mcg/kg/min) ou adrenalina (2-10mcg/min). A atropina deve ser 
evitada. 
 - Quando a conduta é instalar um MP definitivo? (1) na doença do nódulo sinusal sintomática (síncope, cansaço, dispneia); (2) nas doenças 
degenerativas ou destrutivas do sistema de condução AV, manifestando-se com BAV maligno (Mobitz II, BAVT); (3) situações especiais, como pós-IAM 
(BAVT, BAV 2º grau persistente com bloqueio de ramo alternante) e síncope associada à hipersensibilidade do seio carotídeo e assitolia > 3 segundos após 
discreto estímulo do seio carotídeo. 
3.1. BAV de 2º Grau Mobitz II: 
(1) Ondas P eventualmente 
bloqueadas. 
(2) Os intervalos PR antes do 
bloqueio da onda P são iguais 
entre si. Além disso, o intervalo 
PR antes da P bloqueada é igual 
ao intervalo PR depois da onda 
P bloqueada. 
(3) QRS alargado e aberrante e 
FC < 40bpm. 
 
3.2. BAV 2:1: 
Pode ser benigno ou maligno: 
 - QRS estreito + BAV de 1º grau 
(PR > 200ms) = BAV benigno. 
 - QRS largo, sem BAV de 1º 
grau = BAV maligno. 
 - Casos dúbios: fazer dose-teste 
de atropina (a ausência de 
resposta indica malignidade), 
estudo eletrofisiológico ou teste 
ergométrico. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3.3. BAV Avançado: 
BAV com relações P/QRS de 3:1, 4:1, 5:1, etc. Ou seja, é caracterizado pela presença de mais de uma onda P bloqueada seguida. 
 
3.4. BAV Total: 
(1) Completa dissociação AV (entre P e QRS). A onda P aparece em várias posições com relação ao QRS (dentro, logo antes, logo depois, no segmento ST, 
em cima da onda T, etc). 
(2) Intervalos P-P na frequência sinusal e intervalos R-R regulares, respeitando a frequência de escape. 
(3) O escape pode ser juncional (QRS estreito, FC > 40bpm) ou ventricular (QRS alargado, FC < 40bpm). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BLOQUEIOS DE RAMO 
1. Introdução: 
Inicialmente, devemos nos recordar que o feixe Hiss se divide em 2 ramos: o ramo direito e o ramo esquerdo. O 
primeiro corre pelo endocárdio do lado direito do septo interventricular, originando a rede de Purkinje do VD. O 
último, já na porção superior do septo, se bifurca em 2 fascículos: fascículo anterior esquerdo (que leva a condução 
para a região anterossuperior do endocárdio do VE) e fascículo posterior esquerdo (que leva à condução para a 
região posteroinferior do endocárdio do mesmo ventrículo). 
O bloqueio da condução elétrica pelos ramos direito ou esquerdo, podem ser de 1º e 2º graus (‘incompletos’) ou de 
3º grau (‘completos’), e juntamente com o bloqueio dos fascículos (‘hemibloqueios’) compõem o que se 
convencionou denominar de ‘distúrbios da condução intraventricular’. 
2. Bloqueio de ramo direito: 
A identificação de um BRD isolado não aumenta a chance de o indivíduo ser portador de uma cardiopatia. Neste caso, o BRD provavelmente provém de uma 
leve degeneração localizada do sistema de condução cardíaco e não tem influência no prognóstico de longo prazo. Entretanto, várias cardiopatias e 
pneumopatias podem se manifestar com BRD: HAS, doença coronariana, IAM, cardiomiopatia, DPOC, etc. 
ECG: definido pela presença de onda R’ alargada em V1 e ondas S alargadas em D1 e V6. Nos bloqueios incompletos, o padrão é semelhante, mas as ondas R’ 
e S não são alargadas. 
 
3. Bloqueio de ramo esquerdo: 
A ocorrência de BRE na faixa etária dos 60 anos está associada à cardiopatia e disfunção do VE em 50% dos casos. Como etiologia, predominam as 
cardiopatias hipertensivas, coronariana e por valvopatia aórtica – nestes pacientes, o BRE é um importante preditor de mau prognóstico. 
ECG: definido pela presença de onda S alargada em V1 e onda R alargada + ausência de ondaq em D1 e V6. Nos bloqueios incompletos, o padrão é 
semelhante, mas as ondas S e R são muito alargadas. 
 
 
 
4. Hemibloqueios ou bloqueios divisionais: 
Bloqueio divisional anterossuperior (BDAS) ou hemibloqueio anterior esquerdo (HBAE): definido por um importante desvio do eixo QRS para esquerda, 
numa faixa entre -30 e -120º, uma vez afastada necrose da parede inferior (D2, D3, e aVF). No ECG, o QRS nas derivações D2 e aVF tem predomínio negativo, 
com complexos rS. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Bloqueio divisional posteroinferior (BDPI) ou hemibloqueio posterior esquerdo (HBPE): definido por um importante desvio do eixo do QRS para direita, 
numa faixa em torno de +120º, uma vez afastada necrose da parede lateral alta (D1, aVL) e hipertrofia do ventrículo direito. No ECG, o QRS nas derivações 
D1 e aVL tem predomínio negativo, com compleros rS e na derivação aVR, predomínio positivo, com complexo qR.

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