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Flávia Argôlo França 2 Curso de Direito do Trabalho: Relações Individuais, Sindicais e Coletivas do Trabalho Luciano Martinez. – 10. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. PRIMEIRA PARTE – RELAÇÕES INDIVIDUAIS DO TRABALHO Capítulo 2: PRINCIPIOLOGIA DO DIREITO DO TRABALHO 2.1 Distinções entre Princípio e Regra Princípios e as regras são espécies do gênero “norma jurídica”. Ambos, portanto, desde que positivados (explícita ou implicitamente), têm força normativa. Os princípios prescrevem diretrizes, produzindo verdadeiros mandados de otimização que, em última análise, visam à potencialização da própria justiça. Por serem dotados de estrutura valorativa, os princípios reclamam uma conduta racional e criativa do intérprete para sua aplicação. Celso Antônio Bandeira de Mello, por isso, com a maestria que lhe é habitual, o define como “mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo--lhe o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo conferindo-lhe a tônica que lhe dá sentido harmônico”. As regras, por sua vez, descrevem em sua estrutura lógica uma hipótese fática e uma consequência jurídica, seguindo um modelo do “tudo ou nada” (all or nothing, segundo a linguagem de Ronald Dworkin), vale dizer, ou se aplicam ou não se aplicam a um caso concreto. De modo geral, as regras são relatos objetivos, descritivos de específicos e bem delimitados comportamentos, sendo aplicáveis, por essa razão, a determinado número de situações, ainda que análogas. Ocorrendo a hipótese, a regra deverá incidir pelo mecanismo da subsunção, o que permite afirmar que num conflito entre duas regras somente uma será válida e, por consequência, somente uma prevalecerá. Observe-se que o conflito entre princípios é normalmente solvido por uma técnica de ponderação de valores e interesses, mediante a qual são considerados os bens jurídicos em litígio, oferecendo-lhes um tratamento de prevalência em casos específicos. Perceba-se que a solução ponderada não implica a conclusão de superioridade de um princípio em relação a outro com ele cotejado, mas apenas uma situação de destaque temporário de um em relação a outro. Os conflitos entre regras obedecem basicamente à teoria das antinomias jurídicas, mediante a qual são preferidas aquelas de maior hierarquia em detrimento das de menor hierarquia (critério hierárquico), as mais novas em lugar das mais antigas (critério cronológico) e/ou as mais específicas em relação às mais genéricas (critério da especialidade). 2.2 Princípios em espécie Cada sistema normativo é caracterizado por um conjunto próprio de regras e de princípios. No direito do trabalho, até mesmo em função de sua construção histórica, os princípios ocupam espaço central, informando uma lógica protecionista. Partindo dessa ideia, e de que a principiologia do direito laboral protege o trabalhador contra suas próprias fraquezas, serão analisados os seguintes princípios: princípio da proteção, em suas três variáveis: — princípio da aplicação da fonte jurídica mais favorável; — princípio da manutenção da condição mais benéfica; — princípio da avaliação in dubio pro operario; princípio da indisponibilidade de direitos; princípio da continuidade da relação de emprego; princípio da primazia da realidade; princípio da razoabilidade; princípio da boa-fé e da confiança. 2.2.1 Princípio da proteção Há relações jurídicas em que os sujeitos estão em postura de igualdade substancial e, consequentemente, em posição de equivalência contratual. Diante dessas relações, a atuação estatal esperada é exatamente a de não privilegiar um contratante em detrimento de outro. Esse figurino contratual, entretanto, não pode ser conservado quando evidente a dessemelhança de forças ou de oportunidades entre os sujeitos das relações contratuais. Em tais hipóteses, cabe ao Estado criar mecanismos de proteção aos vulneráveis, sob pena de compactuar com a exploração do mais forte sobre o mais fraco. Como bem detectou o professor Luiz de Pinho Pedreira, “o motivo dessa proteção é a inferioridade do contratante amparado em face do outro, cuja superioridade lhe permite, ou a um organismo que o represente, impor unilateralmente as cláusulas do contrato, que o primeiro não tem a possibilidade de discutir, cabendo-lhe aceitá-las ou recusá-las em bloco”. Atente-se para o fato de que, no campo laboral, a relação jurídica destinatária do princípio da proteção é unicamente a relação individual de trabalho (máxime a relação individual de emprego), não se estendendo à relação coletiva de trabalho. Esta, como se detalhará em alguns pontos deste estudo, é composta de partes que se encontram em situação de igualdade. Basta lembrar que, nos termos do art. 8º, VI, do texto constitucional, é indispensável a participação das entidades sindicais representativas dos trabalhadores nos negócios jurídicos coletivos do trabalho. A presença da entidade sindical equilibra a balança, fazendo desaparecer a vulnerabilidade de quem está sozinho perante a força econômica patronal. Confirma essa assertiva o fato de ser possível, mediante negociação coletiva, o aviltamento de condições contratuais coletivas antes ajustadas (vide art. 7º, VI, XIII e XIV, do texto constitucional). Antes de realizar a análise detalhada das variáveis do princípio da proteção, cabe anotar a polêmica e extremamente criticada exceção produzida pelo legislador da reforma trabalhista de 2017. A Lei n. 13.467/2017 criou a figura do empregado hipersuficiente, aquele que, nos contratos individuais de emprego tem remuneração superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social (no ano de 2018, apenas para ter-se uma ideia de dimensão, esse valor é R$ 11.291,60, vale dizer, o resultado de duas vezes o teto previdenciário do RGPS: R$ 5.645,80 x 2), e o considerou suscetível à arbitragem. Para esse trabalhador o engajamento à arbitragem será possível por sua própria iniciativa ou mediante a sua concordância expressa, sem que se possa alegar que o direito do trabalho é, por si só, indisponível para ele. Note-se, por fim, que o art. 444 da CLT ganhou um parágrafo único para também referir o hipersuficiente e para ali determinar que a livre estipulação produzirá em relação a ele uma prevalência do negociado individualmente sobre o legislado, tal qual aquela admitida genericamente no art. 611-A da CLT. Ali, no art. 444 consolidado, além do referencial da remuneração em valor superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, há também a exigência de que esse trabalhador seja “portador de diploma de nível superior”. A exigência minorada para fins de arbitragem faz crer que, para inserção nessa espécie de solução de conflito, bastará a presença do requisito da elevada retribuição, e nada mais que isso. 2.2.1.1 Princípio da aplicação da fonte jurídica mais favorável Antes de analisar o conceito e a extensão desta variável do princípio da proteção, é importante destacar que ela normalmente é tratada pela doutrina sob o atécnico nome jurídico “princípio da aplicação da norma mais favorável”. Afirma-se isso porque o ora analisado princípio não incide apenas sobre fontes normativas97 (como a lei, o contrato coletivo, a sentença normativa), mas também sobre fontes estritamente contratuais, inclusive sobre aquelas decorrentes do exercício da autonomia individual privada (como o contrato individual de emprego e o regulamento interno de trabalho). Desse modo, em lugar da tradicional menção à expressão “norma mais favorável”, preferiu-se usar neste estudo “fonte mais favorável”, pela amplitude e pelo acerto. 2.2.1.1.1 Conceito e extensão do princípio O princípio da aplicação da fonte mais favorável baseia-se no mandamento nuclear protetivo segundo o qual,diante de uma pluralidade de fontes com vigência simultânea, há de se preferir aquela que seja mais favorável ao trabalhador. Assim, usando um exemplo de extrema singeleza, se um empregado está submetido simultaneamente a um regimento interno de trabalho que autoriza o pagamento de horas extraordinárias na base de 100% e a um acordo coletivo de trabalho que determina que a jornada suplementar seja acrescida de 80%, há de preferir-se, evidentemente, a fonte mais favorável. Dentre as várias fontes com vigência simultânea para se decidir qual a mais favorável ao trabalhador, o aplicador do direito deve orientar-se em conformidade com um dos seguintes métodos de determinação da fonte mais favorável: a acumulação/atomística, o conglobamento/incindibilidade ou o conglobamento por institutos. Pelo método da acumulação ou da atomística, o aplicador da norma pinça de cada uma das fontes em confronto os itens mais favoráveis ao trabalhador, reunindo-os todos para a aplicação ao caso concreto. Com esse ato ele despedaça, atomiza o conjunto para construir outro novo, com os ingredientes de ambos. Pelo método do conglobamento [puro] ou da incindibilidade, ao cotejar as fontes, o aplicador da norma deve verificar qual delas, em conjunto, é a mais benéfica ao trabalhador, e preferi-la, excluindo totalmente a aplicação de outras, consideradas menos favoráveis em bloco. Esse método tem a vantagem de respeitar a organicidade da fonte jurídica, bem como as cláusulas compensatórias internas. Com o propósito de contemporizar os métodos da acumulação e do conglobamento [puro], surgiu uma variável intitulada “conglobamento por institutos”, “conglobamento mitigado” ou “conglobamento orgânico”. Por essa variável do conglobamento, o aplicador, em vez de verificar, na sua inteireza, qual o conjunto normativo mais favorável ao trabalhador, seleciona, dentro do conjunto, institutos que podem ser apreciados separadamente. É importante registrar que se entende por instituto o bloco de vantagens jurídicas que contém elementos internos pertinentes entre si, por exemplo, a jornada e o intervalo; o salário e as utilidades não salariais; a estabilidade e as parcelas decorrentes da cessação do vínculo. Assim, o aplicador pode apreciar separadamente blocos institucionais diferentes, verificando qual deles é o mais favorável ao trabalhador. 2.2.1.1.2 A constitucionalização do princípio da fonte mais favorável O constituinte de 1988, antevendo o aumento das pressões do capital sobre o trabalho nas décadas seguintes, tratou de inserir no texto constitucional uma série de direitos sociais e trabalhistas mínimos, com o objetivo claro de colocá-los além do alcance do poder constituinte derivado, do poder legislativo infraconstitucional e, obviamente, do poder negocial conferidos às partes. A única ressalva apresentada no texto diz respeito às propostas que visassem à melhoria da condição social dos trabalhadores, sendo certo que estas, pela concepção oferecida pela própria Constituição, estariam sempre no topo da pirâmide do ordenamento jurídico. Foi constitucionalizado, assim, o princípio da proteção, num evidente reconhecimento da desigualdade fática havida entre os sujeitos da relação jurídica de trabalho. A técnica de proteção, in casu, foi aquela intitulada por Pinho Pedreira como de “intervenção do Estado nas relações de trabalho”, materializada por meio da promulgação de norma imperativa e de conteúdo mínimo. Sobre as referidas normas de conteúdo mínimo sustentou o mencionado professor baiano, com apoio na doutrina de Manuel Alonso Olea: “[...] o Direito do trabalho é um conjunto de garantias mínimas para o trabalhador, que pode ser ultrapassado em seu benefício. MANUEL ALONSO OLEA formulou, a respeito, um princípio que denominou de ‘princípio de norma mínima’. Com solar clareza o mestre espanhol explica a inderrogabilidade unilateral ou, na linguagem jurídica da sua pátria, o que são as normas de direito necessário relativo: ‘Cada tipo de norma trabalhista imperativa opera, segundo seu posto formal, como condicionante mínimo do conteúdo das que se seguem em hierarquia, isto é, ao estatuir cada norma sobre as condições de trabalho deve-se ter em conta que as estabelecidas nas de posto superior são inderrogáveis em prejuízo do trabalhador. Embora o mandamento que o princípio implica seja dirigido aos poderes normativos, dele deriva que sejam nulas, ou não devam ser aplicadas pelos tribunais quaisquer normas que impliquem redução dos mínimos estabelecidos por outra de nível superior em favor do trabalhador, aos quais não pode este renunciar’” Contudo a Constituição sofreu, no capítulo dos direitos sociais, emendas in pejus sobre o salário-família (EC 20, de 15-12-1998), sobre a dimensão do prazo prescricional dos trabalhadores rurais (EC 28103, de 25-5-2000), sobre a idade máxima da criança para fins de assistência gratuita em creches e pré-escolas (EC 53, de 19-12-2006) e sobre a limitação da dimensão do salário-maternidade para quem recebe altos salários (adição do art. 248 no texto constitucional por meio da EC 20, de 15-12-1998), não existindo ainda qualquer manifestação do STF acerca da constitucionalidade ou inconstitucionalidade do citado processo de reforma operado (para confirmar ou negar a tese exposta). As demais emendas incidentes sobre o art. 6º (que acresceu a moradia como um dos direitos sociais) e sobre o inciso XXXIII do art. 7º (que diminuiu a idade mínima para o trabalho do menor) não são objeto de questionamento porque foram realizadas in melius. A despeito dessas ponderações, um fato é inquestionável: a Constituição criou, sim, um sistema protetivo de direitos sociais e trabalhistas mínimos; autorizou, porém, em contraponto, fosse operada a flexibilização do referido sistema, mediante negociação coletiva, sobre assuntos que dissessem respeito a salários e a jornada (os dois mais importantes conteúdos do contrato de emprego). Aderiu o constituinte de 1988 a um modelo de “liberalismo coletivo” parcial, baseado na faculdade de derrogação de normas de ordem pública social expressamente referidas, mesmo in pejus, por gestão da autonomia coletiva. 2.2.1.2 Princípio da manutenção da condição mais benéfica O princípio da manutenção da condição mais benéfica ou da inalterabilidade contratual in pejus baseia-se no mandamento nuclear protetivo segundo o qual, diante de fontes autônomas com vigência sucessiva, há de se manter a condição anterior, se mais benéfica. Assim, a título de exemplo, imagine-se que, por ocasião da admissão de um empregado, existisse um regulamento empresarial interno que oferecesse, entre outras vantagens, férias de sessenta dias por ano. A extinção ou a modificação desse regulamento não seria suficiente para que desaparecesse o direito às férias em dimensão privilegiada. O regulamento poderia até ser extinto ou modificado, mas essa extinção ou modificação somente valeria para empregados contratados depois do ato modificativo do regulamento. Nesse sentido, é positivo observar o teor da Súmula 51, I, do TST, no sentido de que “as cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento”. O art. 468 da CLT consubstancia o princípio da manutenção da condição mais benéfica, na medida em que assevera que “nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia” (destaques não constantes do original). Perceba-se que o fundamento é justamente o direito adquirido diante dos negócios jurídicos estabelecidos em relações individuais de emprego. Isso mesmo: o princípio da manutenção da condição mais favorável somente se manifesta diante dos negócios jurídicos estabelecidos em relações individuais de emprego; jamais, como mencionado alhures, em negóciosjurídicos estabelecidos em relações coletivas de trabalho. Estas são regidas por uma lógica diferente. Aliás, como os empregados estão necessariamente representados por sua entidade sindical nas relações coletivas de trabalho (vide art. 8º, VI, da Constituição de 1988), elas não são apreciadas sob a lógica do princípio da proteção. Os sujeitos da relação coletiva de trabalho estão em plano de igualdade, sendo possível, por isso, que as entidades sindicais profissionais negociem aparentemente in pejus. Diz-se “aparentemente in pejus” porque as negociações realizadas mediante atuação da entidade sindical obreira gozam de presunção geradora de melhoria. Basta observar que, por vezes, a extinção de um complemento salarial (por exemplo, um adicional por tempo de serviço) pode ter justificado um aumento salarial real ou até mesmo impedido um ato de despedimento coletivo. Assim, não há espaço para a invocação do princípio da manutenção da condição mais benéfica nos contratos coletivos simplesmente porque a relação jurídica correspondente não é orientada pelo princípio da proteção. 2.2.1.3 Princípio da avaliação in dubio pro operário O princípio da avaliação interpretativa in dubio pro operario baseia-se no mandamento nuclear protetivo segundo o qual, diante de uma única disposição, suscetível de interpretações diversas e ensejadora de dúvidas, há que aplicar aquela que seja mais favorável ao trabalhador. Essa avaliação pró-vulnerável não é exclusiva do direito do trabalho. Essa interpretação mais favorável ao aderente tem importante justificativa adicional, aplicável aos contratos de emprego. Enfim, se não foi o aderente o responsável pela construção do instrumento contratual, não será ele o apenado diante das ambiguidades ou das contradições emergentes. Atente-se para o fato de que o princípio ora em análise aplica-se predominantemente à interpretação dos negócios jurídicos, embora seja razoável a sua incidência sobre a interpretação de textos legais. Atente-se também para o fato de que esse princípio somente tem razão de ser diante das situações de dúvida. Não existindo dúvida, não se poderá aplicar o ora analisado princípio. Há mais: o in dubio pro operario não foi criado para ser aplicado na interpretação da prova produzida no processo do trabalho. Sustenta-se isso porque a prova é avaliada segundo o princípio da persuasão racional e de acordo com a distribuição do ônus probatório. Rigorosamente, não há prova dividida; pode haver, sim, prova mal avaliada. 2.2.2 Princípio da indisponibilidade de direitos O princípio da indisponibilidade dos direitos ou da irrenunciabilidade de direitos baseia-se no mandamento nuclear protetivo segundo o qual não é dado ao empregado dispor (renunciar ou transacionar) de direito trabalhista, sendo, por conta disso, nulo qualquer ato jurídico praticado contra essa disposição. Tal proteção, que, em última análise, visa proteger o trabalhador das suas próprias fraquezas, está materializada em uma série de dispositivos da CLT, entre os quais se destaca o seu art. 9º. Essa atuação legal impede que o vulnerável, sob a miragem do que lhe seria supostamente vantajoso, disponha dos direitos mínimos que à custa de muitas lutas históricas lhe foram assegurados nos termos da lei. Cabe aqui um registro importantíssimo, embora negligenciado ou até mesmo esquecido: o princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas tem uma atuação essencialmente intracontratual, sendo em rigor inexigível nas dimensões intercontratuais. Tal ocorre porque, a despeito de o direito do trabalho ser intervencionista dentro dos limites de um determinado contrato e em face de um considerado empregador, ele esmaece, ou desaparece, quando a questão é posta em face de mais de um contrato de emprego. Assim, por exemplo, apesar de saber-se do limite ordinário de oito horas de trabalho por dia de serviço dentro de um determinado contrato, não há linde a considerar se o empregado decide ter um segundo emprego, logo depois de findo o seu primeiro expediente laboral. 2.2.2.1 Renúncia e transação no direito do trabalho A renúncia e a transação são atos jurídicos de despojamento. Embora se assemelhem pela disponibilidade, são institutos bem diferentes e com efeitos jurídicos totalmente diversos. A renúncia é um ato unilateral por meio do qual o renunciante abdica de um direito certo e de titularidade induvidosa; a transação, por outro lado, é um ato bilateral por meio do qual os litigantes, diante da dúvida quanto à titularidade ou quanto à extensão de um direito, resolvem, por concessões recíprocas, pôr fim ao litígio ou, ao menos, preveni-lo. Tanto a renúncia quanto a transação são atos jurídicos que, em rigor, não produzem efeitos no âmbito da autonomia individual privada dos empregados por força de indisponibilidade legal. É a lei que considera nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos trabalhistas. A proteção ora em exame, constante do art. 9º da CLT, extrapola os lindes da lei para transformar-se em postulado, aplicável em favor de qualquer empregado, e não apenas em favor dos urbanos. É inimaginável, portanto, que qualquer empregado (urbano, rural ou doméstico), no âmbito contratual, renuncie a direitos trabalhistas, tal qual o direito ao recebimento do salário mínimo, à fruição de férias ou à percepção do décimo terceiro salário. O empregador que ingenuamente acreditar nesse ato de disponibilidade sofrerá prejuízos, uma vez que o empregado, desprezando a declaração de renúncia, poderá pleitear, com sucesso, o direito supostamente renunciado. Teoricamente, entretanto, a lei pode autorizar que, em casos excepcionais, o empregado pratique ato de renúncia do seu direito para abarcar vantagem equivalente. Perceba-se, por fim, a existência de uma diferença bem clara entre renunciar ou transacionar direitos e renunciar ou transacionar créditos correspondentes aos direitos. Chama-se a atenção para essa distinção porque os créditos trabalhistas, notadamente quando finda a relação de emprego, não têm a mesma proteção jurídica conferida aos direitos trabalhistas. Isso é facilmente constatável a partir da evidência de que a própria lei admite a possibilidade de o Juiz do Trabalho tentar a conciliação entre os litigantes (vide art. 831 da CLT), independentemente de a demanda envolver acionantes desempregados ou ainda vinculados ao contrato de emprego. Apesar de a palavra “conciliação” ser entendida aqui como um ato de aproximação dos litigantes112, não há como deixar de reconhecer que, por meio desse ato, os contendores transacionam e, mediante concessões recíprocas, extinguem a obrigação. 2.2.2.2 Os conflitos de interesses e as fórmulas de solução O conflito resulta de uma luta consciente e pessoal por meio da qual cada um dos litigantes (indivíduos ou grupos) busca a satisfação do seu interesse em detrimento do interesse do adversário. Os conflitos fazem parte da vida, e a vida muda e evolui em decorrência deles. O progresso e o alcance de condições cada vez mais isonômicas entre os contendores são resultantes das contemporizações produzidas por esses episódios, itens demonstrativos do lado positivo das pelejas. 2.2.2.2.1 Conflito, impasse e solução O conflito decorre de um conjunto de ações e reações O conflito decorre de um conjunto de ações e reações entre os litigantes. O indivíduo ou grupo que se entende prejudicado manifesta uma pretensão — um direito de que se afirma titular — esperando o imediato reconhecimento do seu antagonista. Se o adversário apresenta alguma oposição ao reconhecimento da pretensão, dispara-se o processo de atrito e dá-se início ao impasse. A partir desse instante os contendores naturalmente se desgastam, mas as colisões, apesar de lesivas, favorecem a quebra das arestas. O embate produz a aproximação e estimula a discussão. Com o diálogo é conhecida a motivação de cada um dos opositores e até mesmo identificada a razoabilidade do ponto devista de cada um deles. Inicia-se, então, um período de arrefecimento de ânimos e as partes litigantes partem para um momento de superação visando à solução. É justamente nesse instante que surgem as primeiras propostas contemporizadoras. 2.2.2.2.2 Soluções por via autônoma A palavra negócio provém de uma combinação de partículas egressas do latim, nec-, que revela uma negação, e òtium, indicativo de ócio, folga, desocupação. Um negócio é, portanto e em rigor, uma negação à desocupação, uma atitude, um fazer constante e operativo. A negociação, então, seria uma ação, um procedimento por meio do qual dois ou mais sujeitos de interesses em conflito ou seus representantes, mediante uma série de contemporizações, cedem naquilo que lhes seja possível ou conveniente para o alcance dos resultados pretendidos (ou para a consecução de parte desses resultados), substituindo a ação arbitral de terceiro ou a jurisdição estatal. Quando essa atividade é desenvolvida no plano das relações individuais, diz-se existente uma negociação individual; quando tal exercício é empreendido no âmbito das relações coletivas de trabalho, diz-se praticado o ato de negociação coletiva. 2.2.2.2.3 Soluções por via paraeterônoma Quando o diálogo cessa e cada um dos litigantes insiste em afirmar-se titular de uma vantagem invocada, pode um terceiro, espontaneamente ou a convite das partes, estimular a composição. Esse terceiro, porém, não decide o conflito em lugar dos contendores, mas apenas promove uma catalisação, uma aceleração da concórdia. Nessas circunstâncias revela-se, por via paraeterônoma, mediante a atuação de um conciliador ou de um mediador, o segundo grupo de modalidades extintoras dos conflitos: a conciliação ou a mediação. Perceba-se que o caminho da conciliação ou da mediação conduz a uma negociação indireta. Enfim, apesar do estímulo produzido por um terceiro — conciliador ou mediador —, são as próprias partes que resolvem as suas diferenças. Conciliação A conciliação é uma fórmula paraeterônoma de solução dos conflitos por meio da qual um terceiro tenta aproximar os litigantes mediante argumentos de persuasão superficial. Fala-se em “persuasão superficial” porque o conciliador atua in abstrato, sem discutir o mérito do litígio, pois o que interessa para ele é a obtenção de solução para o litígio. Por meio dos seus atos, os conciliadores não emitem opinião sobre o conteúdo da contenda, mas apenas tentam levar os litigantes ao consenso por via negocial. O § 2º do art. 165 do CPC/2015 passou a oferecer mais elementos ao processo de definição do conciliador, ao afirmar que ele “atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes”. Ele poderá, diante disso, “sugerir soluções para o litígio”, sendo vedada, porém, a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem. Os magistrados, por conta da sua condição de potenciais julgadores, não podem emitir opinião sobre a situação conflituosa, nem podem “abrir o jogo” quanto ao possível futuro resultado de uma prestação jurisdicional. Por isso, ao magistrado é dado unicamente o papel de conciliador (vejam-se, por exemplo, os arts. 125, IV, do CPC/1973, 359 do CPC/2015 e 846 da CLT), e nunca o de mediador. Esta tarefa é dada unicamente aos auxiliares da Justiça (vide art. 149 do CPC/2015). a1) Comissão de conciliação prévia A solução pacífica das controvérsias é um compromisso constitucional (vide preâmbulo do texto constitucional). Por conta disso, o sistema normativo passou a procurar fórmulas de legitimação de órgãos extraestatais para o ofício de aproximar os litigantes. A Lei n. 9.958, de 12 de janeiro de 2000, em uma dessas iniciativas, permitiu que empresas e sindicatos instituíssem comissões com o propósito de tentar a conciliação, antes de os litigantes acessarem a jurisdição. A tentativa de conciliação, apesar do teor do caput do art. 625-D da CLT117, não poderia ser entendida como um pressuposto processual de acesso. Afirma-se isso porque tal entendimento colidiria com o direito fundamental lançado no inciso XXXV, do art. 5º da Constituição de 1988, segundo o qual a lei não pode excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. a2) Tentativas judiciais de aproximação dos litigantes A importância da busca de soluções pacíficas para os litígios justifica que os magistrados assumam a condição de conciliadores para tentar aproximar os contendores em qualquer instante processual. Para tanto, e no autorizado dizer do § 1º do art. 764 da CLT, “os juízes e Tribunais do Trabalho empregarão sempre os seus bons ofícios e persuasão no sentido de uma solução conciliatória dos conflitos”. Esse propósito fez com que a Lei n. 8.952/94 acrescentasse o inciso IV ao texto do art. 125 do CPC/1973. Por conta dessa alteração aditiva passou a competir ao juiz “tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes”. Na mesma ideia manteve-se o legislador do CPC/2015, que, no seu art. 359, previu que “instalada a audiência, o juiz tentará conciliar as partes, independentemente do emprego anterior de outros métodos de solução consensual de conflitos, como a mediação e a arbitragem”. Na esfera trabalhista, a atuação do magistrado como conciliador é o primeiro ato praticado, à luz do art. 846 da CLT120. Observe-se que o mencionado dispositivo sofreu modificação imposta pela Lei n. 9.022/95 justamente para antepor a tentativa de aproximação dos litigantes à apresentação da resposta do réu. Não fosse o bastante, ao juiz trabalhista cabe repetir a atuação de conciliador antes de concluir os autos para julgamento, conforme o caput do art. 850 da CLT. Mediação Considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e as estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia. Os mediadores emitem influente opinião sobre o conteúdo da contenda, informam sobre os riscos da demanda e aconselham ativamente que os litigantes cheguem ao consenso por via negocial para evitar prejuízos jurisdicionais. Ao magistrado, por conta das referidas qualidades, não é dado o papel de mediador, porque, se assim agisse, poderia acidentalmente antecipar algumas soluções meritórias. 2.2.2.2.4 Soluções por via heterônoma Superadas as tentativas de ajuste por força de negociação direta ou indireta, podem os opositores preferir a atuação de um terceiro, não mais para aproximá-los, mas para decidir a contenda em lugar deles. Desvenda-se, assim, por via heterônoma, mediante atuação de um árbitro ou de um juiz/tribunal, o terceiro bloco de fórmulas solucionadoras dos conflitos que incluem a arbitragem e a jurisdição. As partes contrapostas, não conseguindo ajustar autonomamente suas divergências, entregam, então, a um terceiro o encargo da resolução do conflito. Arbitragem A arbitragem é uma fórmula heterônoma de solução dos conflitos por meio da qual um terceiro, escolhido por ambos os litigantes, presta uma solução para a disputa. A submissão à arbitragem pode acontecer antes de o conflito surgir ou na constância dele. Se ajustada antes do surgimento do conflito, diz-se ativado por uma cláusula compromissória, vale dizer, por uma convenção mediante a qual as partes comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios eventualmente emergentes. Se a querela estiver acontecendo, as partes podem valer-se do compromisso arbitral, que pode ser judicial (celebrado por termo, nos autos, perante o juízo ou tribunal onde tem curso a demanda) ou extrajudicial (celebrado por escrito particular, assinado por duas testemunhas, ou por instrumento público). De qualquer sorte, o laudo arbitral não pode produzir efeitos próprios de coisa julgada nas relações individuais de emprego simplesmente porque tal fórmula de solução de conflitos é inadmissível nesse âmbito, salvo na situação excepcional prevista no art. 507-A da CLT, que será posteriormenteanalisada. Isso ocorre porque estas relações são caracterizadas pela situação de desigualdade material entre as partes. Por isso, ciente de que o empregado, desacompanhado de sua entidade sindical, submete-se a qualquer negócio para conseguir e manter o seu emprego, é que o legislador (vide Lei n. 9.307/96) declarou inaplicável a arbitragem na órbita dos chamados “direitos indisponíveis”, entre os quais se encontra, obviamente, o direito mínimo contido nas relações individuais de emprego Jurisdição A jurisdição é uma fórmula heterônoma de solução dos conflitos por meio da qual o Estado-juiz, no exclusivo exercício do seu poder-dever de dizer o direito quando invocado a tanto, soluciona uma disputa, atendendo à iniciativa de um dos litigantes. Ao contrário do que ocorre com a arbitragem, em que os próprios litigantes escolhem quem decidirá o conflito, a jurisdição é caracterizada pelo princípio do juiz natural. Em outras palavras: apesar de a atuação estatal ter sido ativada por um dos contendores, ambos deverão conformar-se, salvo situações de suspeição ou de impedimento devidamente comprovadas, com o magistrado naturalmente investido para instruir e julgar o conflito. Sobre o tema cabe dizer, em revisão ao posicionamento que anteriormente era aqui expendido, que, apesar de a citada Emenda Constitucional n. 45/2004 ter modificado a redação do § 2º do art. 114 da Constituição de 1988 para fazer constar o “comum acordo” dos contendores como pressuposto para o ajuizamento do dissídio coletivo, essa expressão não tem realmente a intenção de oferecer obstáculo à apreciação pelo Poder Judiciário de lesão ou de ameaça a direito, mas de criar um filtro de fortalecimento do diálogo social e de consequente menor intervenção do Judiciário, que, quando solicitado, atuaria não mais do que como um árbitro público. 2.2.3 Princípio da continuidade da relação de emprego O princípio da continuidade pode ser entendido como aquele que visa “atribuir à relação de emprego a mais ampla duração possível, sob todos os aspectos”, gerando, por isso, presunções sempre favoráveis aos trabalhadores. Nesse sentido, se um contrato por tempo determinado é violado em algum dos seus requisitos previstos em lei, há, por bem da continuidade, uma conversão do ajuste por tempo determinado em um contrato por tempo indeterminado. A continuidade sugere também a ausência de intenção do empregado em pôr fim ao contrato que o arrima. Por isso, presume-se, sempre, que a terminação de um vínculo se deu por iniciativa patronal e sem causa justa em lugar de por iniciativa operária ou com justa causa. Também em virtude da continuidade, vale dizer, da repetibilidade da prestação do serviço ou do simples reconhecimento da existência desse, presume-se a ocorrência de uma relação de emprego, cabendo ao tomador dos serviços o ônus demonstrativo da formulação de um contrato de trabalho em sentido lato. 2.2.4 Princípio da primazia da realidade O princípio da primazia da realidade baseia-se no mandamento nuclear protetivo segundo o qual a realidade dos fatos prevalece sobre meras cláusulas contratuais ou registros documentais, ainda que em sentido contrário. De nada, portanto, adianta mascarar a verdade, uma vez que se dará prevalência ao que efetivamente existiu. Esse princípio aplica-se tanto a favor quanto contra o empregado. Justifica-se essa atitude porque o princípio ora em análise dá primazia à realidade, e não à versão apresentada pelo trabalhador em detrimento daquela oferecida pelo empregador. É verdade que o empregado, como sujeito juridicamente mais fragilizado, é a vítima preferencial dos documentos que revelam coisa diversa daquilo que efetivamente existiu. Há maus empregadores que, na tentativa de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos direitos trabalhistas, engenham contratos de natureza assemelhada (como representação comercial, estágio ou cooperativa) e constroem falsas provas, inclusive de pagamento. Quando a realidade mascarada é efetivamente visualizada, tornam-se nulos de pleno direito, por força do art. 9º da CLT, todos os atos violadores da legislação laboral. 2.2.5 Princípio da razoabilidade Razoabilidade é a qualidade daquilo que esteja conforme a razão, entendida como a faculdade de que dispõe o ser humano de avaliar, julgar e ponderar ideias universais, concebidas na medida em que seja possível conhecer o real por oposição ao que é aparente. É justamente a razoabilidade, princípio lógico antecedente de todos os referenciais para solução de conflitos entre a vontade e a declaração, que define o alcance e a amplitude de alguns conceitos jurídicos indeterminados, entre os quais a iminência, a irresistibilidade e a inescusabilidade. O princípio da razoabilidade, embora não seja especificamente trabalhista, é aplicado amiúde nas relações de trabalho. Delas brotam comportamentos que precisam ser aferidos segundo um padrão médio de bom-senso. Pode-se, então dizer, entre outras, que ferem o princípio da razoabilidade as seguintes condutas e alegações: a) um empregado afirmar que trabalhava vinte e quatro horas por dia, sem intervalo; b) um empregado braçal afirmar que recebia salário maior do que o do gerente da empresa; c) um empregador apresentar cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes e sustentar que eles foram anotados exatamente nos minutos ali apostos; d) um empregado alegar que se obrigou a serviço incompatível com a sua condição pessoal, por exemplo, um paraplégico alegar que se obrigou a exercer a função de carregador ou o cego que alega ser motorista; e) um empregador afirmar que um empregado, que ganha salário ínfimo e que mora distante do local de trabalho, declarou não precisar do vale-transporte 2.2.6 Princípio da boa-fé e da confiança A boa-fé tem o seu conceito egresso da consciência ética da sociedade. Manifestada por meio de comportamentos reveladores de uma crença positiva e de uma situação de ignorância ou de ausência de intenção malévola, a boa-fé é medida pela prática cotidiana da vida e é remetida, nas lides jurídicas, à apreciação do juiz como partícipe e intérprete do sentimento social. Operando sobre o plano dos princípios e sobre a própria lei, a boa-fé é exigida, como dever acessório, na formação dos contatos e protegida durante o transcurso dos ajustes já formados. Por força dela cada um dos sujeitos de uma relação jurídica deve oferecer informação, ampla e irrestrita, sobre os detalhes do negócio a ser praticado ou do ato jurídico que está em desenvolvimento. Alguns desses detalhes podem ser extremamente relevantes a ponto de influenciar a celebração do ajuste ou a continuidade executiva do negócio. Os parceiros contratuais, segundo o princípio da boa-fé, devem atuar com confidencialidade, com respeito, com lealdade e com mútua cooperação. Não é demasiada a lembrança de que a boa-fé estrutura e apoia o consectário princípio da confiança, assim entendido o mandado orientador que se funda na proteção da legítima expectativa de não ser surpreendido, e ao final prejudicado, com uma atitude contrária à que normalmente se esperaria de quem incutiu confiança sob o fundamento da estabilidade das circunstâncias envolventes.