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RESENHA DO CAPÍTULO IV DO LIVRO CONQUISTA: A DESTRUIÇÃO DOS ÍNDIOS AMERICANOS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA INTEGRAÇÃO LATINO-AMERICANA 
INSTITUTO LATINO-AMERICANO DE TECNOLOGIA, INFRAESTRUTURA E TERRITÓRIO - 
ILATIT 
 
 
DINÂMICA TERRITORIAL DA POPULAÇÃO 
PROFESSOR BRENO VIOTTO PEDROSA 
DISCENTE: João Miguel da Silva 
 
 
RESENHA DO CAPÍTULO IV DO LIVRO 
“CONQUISTA: A DESTRUIÇÃO DOS ÍNDIOS AMERICANOS” 
 
LIVI BACCI, Massimo. Conquista: a destruição dos índios americanos. Lisboa: Edições 
7 0 , 2 0 0 7 . 3 1 9 p . ( L u g a r d a h i s t ó r i a , 7 0 ) I S B N : 9 7 8 9 7 2 4 4 1 3 0 7 5 . 
 
No capítulo IV do livro “Conquista a destruição dos índios americanos"”, Livi Bacci 
vai retratar o processo histórico de formação da cidade de Potosí na primeira metade do século 
XVI, que se deu pela descoberta da rica reserva de prata na montanha de Cerro rico e 
rapidamente passa a ser a principal fonte do êxito económico da coroa espanhola. Para melhor 
compreensão desse processo, o autor retrata o primeiro contato dos espanhóis com o ouro no 
continente americano que foi logo após a chegada dos colonos à Ilha de Hispaniola em 1492, 
quando os marinheiros a mando do almirante chegam em terra firme e capturaram uma 
indígena. Segundo os relatos de Las Casas, foi identificado um adorno de ouro no nariz da 
mulher. Após esse episódio, os europeus relataram ter visto vários indígenas usando 
ornamentos com o mesmo tipo de metal, confirmando a hipótese de que havia ouro escondido 
nas terras do novo mundo. Esse fato foi suficiente para que Colombo organizasse uma segunda 
expedição com a autorização da corte espanhola, na premissa de alto retorno económico a 
coroa, fato que posteriormente justificou o saque organizado de ouro através da violência e do 
trabalho forçado indígena. Assim estabelecida a dominação dos colonos em solo americano e 
o rápido esgotamento da produção de ouro ainda no século XVI, começa uma investida na 
p r o c u r a e p r o d u ç ã o d a p r a t a . 
O autor também vai fornecer de forma quantitativa, um panorama geral da produção de 
ouro e prata extraída naquela época, analisando a partir de três pontos principais: o pagamento 
de um quinto à coroa sobre o minério extraído, a atividade da casa da moeda, a expedição de 
metal para Espanha. Os primeiros registros remetem aos anos de 1503 a 1650, primeiro a 
extração do ouro advindas das Grandes Antilhas, Porto Rico, Cuba e Jamaica até sua rápida 
redução dos jazigos aluviais junto a mão de obra indígena, se estendendo à terra firme das 
Caraíbas ao Panamá até seu esgotamento. No segundo momento tanto o ouro como a prata 
partem do Peru, ponto da história que se refere a conquista dos espanhóis sobre o povo andino 
Inca, onde foi roubado as reservas de tesouro acumulado dos povos pré-incaicos conservado 
p o r v á r i a s g e r a ç õ e s e u s a d o s p a r a f i n s r e l i g i o s o s . 
Questões importantes para compreensão desse período são colocadas pelo autor: O 
porquê que a procura do ouro foi responsável pela destruição dos índios, quantos estavam 
envolvidos e ainda o porquê os efeitos das práticas exercidas sobre os indígenas foram tão 
perversos? As respostas estão no fato de que a Espanha só na primeira metade do século XV, 
importou em média uma tonelada de ouro por ano, isso sem levar em conta que supostamente 
a produção do ouro era muito mais elevada do que a declarada, o que ressalta a questão de 
quanta mão de obra foi necessária para a extração dos minérios levando em conta que a 
produtividade média de um garimpeiro era limitada. Além disso, havia a quantidade da 
população indiretamente envolvida, os familiares dos garimpeiros, índios responsáveis pela 
produção de alimento e reabastecimento das áreas de mineração. Nesse ponto, o autor supõe 
um múltiplo de mais ou menos 10 vezes maior que o número de garimpeiros que completa o 
quadro demográfico concentrado nas regiões ricas em jazigos. Hispaniola, Cuba e Jamaica, 
tinha populações reduzidas, onde as ordens do rei permitia mobilizar um adulto a cada 3 para 
o garimpo. A maior região com produção de ouro era em Popaya em Nova Granada, entre 
1559 e 1599, produzia-se cerca de 400 quilos de ouro por ano, porém sua população que em 
1559 era de 71 000 tributários, foi se reduzindo, em 1582 havia 33 600. O motivo desse cenário 
se deu porque parte dos tributários estavam ocupados na procura do ouro em detrimento da 
produção agrícola, em condições de trabalho compulsório, climas insalubres e má alimentação. 
Esses mesmos motivos explicam porque o tempo de vida dos índios era tão curta e 
porque morriam em grande quantidade. Dessa forma, na pesquisa de novos depósitos de ouro, 
escavava-se trincheiras com dez pés de largura e até três palmos de profundidade, a terra era 
transportada para um rio para ser lavadas, trabalho também feito por mulheres. O processo se 
repetia em diversas áreas até que fosse encontrado ouro. Os índios eram obrigados a se deslocar 
muitas vezes para dezenas de milhas de distância de suas aldeias, sendo submetidos ao 
comando do capataz por até dez meses. Havia grandes necessidades de abastecimento de 
alimentos que era produzidos em aldeias distantes, o que significa um forte aumento de 
trabalho na produção, preparação e transporte de alimentos aos que não eram designados ao 
trabalho mineiro. Por consequência, era inevitável a morte dos índios, segundo Las Casas, de 
100 índios que eram mandados para as minas, não voltavam 60 e nas minas distantes e de 
piores condições, de 300 não voltavam 30. Era de conhecimento dos espanhóis que o tempo e 
a demanda de trabalho dentro das minas eram nocivas para os índios, no entanto a sede por 
ouro era maior, fazendo com que o número de índios que morreram em condições extremas 
seja incontável. As primeiras fases da colonização deixam sequelas irreversíveis no povo 
indígena, o impacto traumático da violência exercida sob um povo que era adaptado a outro 
modo de vida, promoveu tanto a mortalidade quanto a capacidade de reprodução. O fato de a 
chegada dos europeus ao continente americano ter implicado uma nova dinâmica demográfica 
é contingente, pois se realizou de formas distintas em diferentes lugares. A extração de 
minérios no território andino, demandou maior mão de obra não somente pela quantidade de 
metal precioso, más também pelo nível de dificuldade em relação ao relevo, o clima e a 
necessidade de reabastecimento de alimentos e insumos nas regiões mais inóspitas. Esses 
fatores eram determinantes na mortalidade dos indígenas que foram submetidos ao trabalho 
c o m p u l s ó r i o . 
Para ilustrar melhor a dinâmica demográfica no período colonial, o autor faz um 
paralelo com a descoberta do ouro no Brasil no final do século XVII, em Minas gerais, que 
atraiu 30 000 pessoas de diferentes etnias, onde foram exportadas 14 toneladas de ouro em um 
só ano, superando a produção dos espanhóis nas primeiras décadas do século XV. A população 
chegou até 300 000 pessoas, esses dados demonstram que a descoberta do ouro nessa região 
funcionou como um vórtice no desenvolvimento da agricultura e expansão territorial. 
Do mesmo modo, a descoberta da prata na montanha Cerro de Potosí, também 
representou uma alta concentração populacional e enormes quantidades de metal enviado para 
Espanha. Estima-se que 80% da prata produzida no mundo nessa época são provenientes de 
Potosí, fazendo com que a cidade tivesse uma das maiores densidades populacional do mundo 
superando países europeus. Potosí guarda em suas particularidades o fato de estar situada em 
um planalto a 4000 metros de altura, com clima rigoroso e chuvas torrenciais no verão, uma 
região desértica com terreno acidentado e liso, características que não foramo suficiente para 
i m p e d i r a s g r a n d e s a t i v i d a d e s m i n e i r a s n a m o n t a n h a d e C e r r o R i c o . 
A história da descoberta de Potosí é contada de duas visões diferentes, tanto pelos 
indígenas que já tinham conhecimento da montanha de prata muito antes dos europeus, quanto 
a partir do momento em que foi encontrada a prata no período colonial. A história citada por 
Bacci parte de 1545, onde um pastor de lhamas ao procurar um dos animais que fugira do seu 
rebanho, se perde até chegar na montanha de Cerro e ao se agarrar a um arbusto em uma orla 
irregular, detecta um mineral rico em prata na ponta das raízes, reconhecendo o metal por 
conta de sua experiência nas minas e levando o minério para experimentar e fundir. 
Bacci considera as minas de Potosí um elemento não secundário da “Leyenda negra”, 
devido aos relatos sobre as péssimas condições de trabalho imposta aos indígenas. Ademais, a 
atividade mineira foi responsável pela transformação demográfica de uma área com mais de 
1000 quilómetros de comprimento e algumas centenas de largura, pois demandava de grandes 
quantidades de combustível, lenha e materiais extraídos de regiões mais ou menos remotas. O 
motivo pela qual Potosí se enquadra na “leyenda negra” segundo o autor, se deu por conta da 
grande desorganização na divisão do trabalho dentro do maior polo de extração de prata da 
américa, que nos primeiros anos, passou de 300 espanhóis e 3000 índios para 14 000 até que 
se esgotasse as primeiras reservas. Sem encontrar fontes alternativas de riqueza, milhares de 
índios retornaram para suas aldeias de origem. Os escravos africanos não suportavam o clima 
e o cansaço, os métodos de extração eram primitivos e arriscados, a fundição da prata era feita 
em milhares de pequenos fornos, levando o rápido declínio de sua produção. As atividades são 
retomadas após a chegada do vice-rei Francisco de Toledo, com a intenção de restabelecer a 
ordem civil e económica, fez pacto com empresários locais para investimento na melhoria das 
técnicas de extração, na reposição da mão de obra, em novas instalações para separar e lavar o 
minério através da aplicação de mercúrio que era extraído das minas de Huancavelica e a 
implantação do sistema de “mita”. A introdução do mercúrio e o sistema de “mita” em 1573, 
fez crescer oito vezes a produção de prata num período de dez anos, isso possibilitou que até 
o fim do século fosse importado os maiores carregamentos de prata da história. 
As melhorias do recenseamento aplicado por Toledo tinham exceções, uma vez que a 
produção de prata era propriedade do Estado, a prestação de serviços nas “mitas” não tinha 
caráter individual, a responsabilidade agora recaia sobre as aldeias onde deveriam enviar parte 
de seus homens com a premissa de utilidade pública e fins religiosos. Dessa forma, eram 
recrutados todos os anos aproximadamente 14 000 índios para as minas, provenientes de 125 
comunidades de regiões como La Paz, Cuzco e Arequipa. Eram obrigados a percorrer longas 
distâncias que podiam chegar a 1000 quilómetros para quem vinha de lugares mais distantes. 
Os índios viajavam com suas famílias e mobílias utilizando alpacas para transporte e venda. 
As viagens podiam durar um mês e repetiam-se no sentido inverso um ano mais tarde. 
A distribuição do trabalho nas “mitas” se dava da seguinte forma: Nas minas e nas 
galerias 1369; nos moinhos movidos a água 2047; nos moinhos movidos por cavalos 620; nas 
operações de amálgama 222; outras atividades 195. Um total de 4453 trabalhadores atuando 
diretamente nas minas em uma semana a cada três, fazendo com que a exploração de minérios 
se desse de forma quase ininterrupta. Os outros dois terços da mita ao invés de poder gozar de 
tempo livre e descanso, desempenhavam outros serviços forçados como o transporte de 
abastecimento dos mosteiros, funcionários, entre outros ou desenvolvendo novos jazigos. O 
sistema de “mita” permaneceu por mais dois séculos até ser abolido por Símon Bolívar em 
1 8 2 5 . 
A cidade de Potosí atingiu seu apogeu demográfico em 1611 com 160 000 habitantes, 
número provavelmente sobrestimado segundo o autor, pois muitos se fixaram na cidade ao 
invés de retornar a seu lugar de origem. De forma geral, a cidade foi representada pela força 
migratória e não pela mortalidade, pois a dinâmica populacional se deu de forma centrípeta e 
centrífuga que ampliou e multiplicou o movimento pendular anual de aproximadamente 40 
000 pessoas. É evidente que houve uma expansão demográfica no final do século XVI e 
começo do século XVII, más essa expansão não anula o fato de que as longas viagens e as 
condições de trabalho tenham custado a vida de milhares de tributários, pois como ressalta o 
autor, as condições de trabalho no interior das minas eram decerto desumanas. Segundo o 
Padre José de Acosta, as minas tinham a profundidade de até 300 metros e usava-se luz de 
velas, os minérios partidos eram transportados para cima e cada mineiro levava cerca de 30 
quilos nas costas por um grande lance de escada improvisada de forma rudimentar. Somadas 
a isso, deve-se levar em consideração as fortes mudanças de temperatura, desmoronamento de 
galerias, a poeira inalada e ingerida, fatores responsáveis por doenças respiratórias, 
traumatismo e mortes. A mortalidade em 1602 girava em torno de 3 a 4% por ano e cerca de 
1 5 0 0 0 a f e t a d o s n a s a t i v i d a d e s m i n e i r a s p o r a n o n e s s e p e r í o d o . 
O autor também menciona outros centros mineiros que tiveram funções análogas no 
que corresponde ao movimento migratório. A mina de Santa Bárbara em Huancavelica, foi de 
grande importância por conter mercúrio que era primordial no processo de amálgama da prata 
em Potosí. No fim do século XVI, estavam submetidos a exploração da mina cerca de 3000 
índios que posteriormente foram reduzidos pela metade. As minas de Huancavelica tinha uma 
particularidade que apresentava um risco ainda maior que Potosí. Tanto a poeira inalada como 
o vapor do mercúrio no tratamento do mineral, foram letais e causavam feridas corrosivas nos 
pulmões dos tributários. Além disso, os homens tinham que transportar as cargas pesadas por 
grandes distâncias expostos ao calor excessivo no interior das minas e ao frio extremo do lado 
de fora. Foi feito um acordo entre o vice-rei Marquês de Macera para preservação da vida dos 
índios, ou seja, a mortalidade dos índios era prejudicial aos interesses dos proprietários das 
m i n a s 
 Com o passar do tempo fica cada vez mais difícil para as comunidades mobilizar o 
número de homens suficiente para enviar as minas. O baixo ganho dos mitayos, as pressões 
exercidas pelos donos das minas para extrair o máximo de trabalho possível, faziam com que 
muitos não regressassem as comunidades de origem, para que não tivessem que se submeter 
novamente a mita. Outro fator que incapacitava as comunidades de mobilizar o número 
previsto de mitayos, se deu pelo declínio demográfico resultante de epidemias e também uma 
sólida emigração dos considerados forasteiros. As comunidades que não conseguiam cumprir 
a mita eram multados por cada índio não enviado para Potosí. Na metade do século XVII, o 
nú me ro d e “ m i t a yos ” e r a m en os q ue a m e t ad e d o q ue e r a d e m and a do . 
A expansão mineira no México foi considerável, embora a produção tenha sido inferior 
que as minas de Potosí, as dificuldades e perigos não eram diferentes. As minas eram profundas 
e chegava a 34 graus no seu interior segundo as medições de Humboldt, para esse geografo, 
apesar do trabalho extenuante, a indústria mineira não havia gerado desertificações como no 
planalto peruano, a mortalidade não era muito diferente queem outros sítios e além de tudo as 
diferenças em relação a atividade mineira do Peru era o fato de o trabalho ser livre, pois a 
atividade demandou menos mão-de-obra não havendo sua escassez, além disso, as minas do 
M é x i c o n ã o e s t a v a m s i t u a d a s n o m e i o d e u m d e s e r t o i n ó s p i t o . 
Para concluir, o autor analisa que primeiro ciclo do ouro, foi essencialmente o saque 
das reservas indígenas acumulado ao longo dos séculos e a procura por jazigos em terrenos 
aluviais que rapidamente se esgotaram. A falta de experiência, de organização e a ganância 
pelo ouro, foi um vórtice destruidor e representou a fatalidade dos indígenas de diversas áreas 
d o c o n t i n e n t e n o s é c u l o X V I . 
Já o impacto demográfico da prata, foi pouco relevante se comparado ao ciclo do ouro, 
pois a produção da prata só se realizou a partir de uma sólida organização financeira e 
empresarial, como a distribuição do trabalho desde o momento da sua extração, o carregamento 
até o processo de amálgama, a logística no envio de minérios por terra e pelo mar e o sistema 
de mita que gerou uma certa rotatividade dos tributários. Dessa forma, o autor também concluí 
que a indústria mineira ao se inserir no sistema social e económico, não representou grandes 
perturbações demográficas. O verdadeiro efeito demográfico, onde o trabalho era compulsivo, 
foi centrípeto e simultaneamente centrífugo, devido a atração exercida pelo centro como Potosí 
s o m a d a s a e m i g r a ç ã o c a u s a d a p e l a o b r i g a ç ã o a m i t a .

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