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autor WAGNER DE MELLO BRITO 1ª edição SESES rio de janeiro 2018 DIREITO EMPRESARIAL I Conselho editorial roberto paes e gisele lima Autor do original wagner de mello brito Projeto editorial roberto paes Coordenação de produção gisele lima, paula r. de a. machado e thamyres mondim pinho Projeto gráfico paulo vitor bastos Diagramação bfs media Revisão linguística bfs media Revisão de conteúdo thiago gomes petrucci Imagem de capa pressmaster | shutterstock.com Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2018. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip) B862d Brito, Wagner de Mello Direito empresarial I / Wagner de Mello Brito. Rio de Janeiro: SESES, 2018. 144 p: il. isbn: 978-85-5548-604-3. 1. Direito empresarial. 2. Legislação. 3. Administração. 4. Direito societário. I. SESES. II. Estácio. cdd 346.07 Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063 Sumário Prefácio 7 1. Aspectos da empresa 9 Introdução 10 As fases históricas do atual Direito Empresarial brasileiro 10 Fase comercial 12 A teoria dos atos de comércio e a confusão conceitual 13 Teoria e função social da empresa 16 Autonomia e características atuais 18 Fontes do Direito Empresarial 19 Princípios constitucionais norteadores da ordem econômica 20 Conceito jurídico de empresa – Código Civil Brasileiro de 2002 23 Elementos da organização da atividade econômica 24 Empresário individual 24 Conceito – Código Civil Brasileiro de 2002 24 Atividades excluídas do contexto empresarial. Atividade Intelectual – Científica – Artística – Literária 26 Pressupostos para o exercício da Empresa Individual 28 Obrigações profissionais do empresário 31 2. Empresa Individual de Responsabilidade Limitada - (EIRELI) e Estabelecimento 37 Introdução 38 Empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI) 39 A limitação da responsabilidade do empresário individual 39 Conceito de empresa individual de responsabilidade limitada no Brasil – EIRELI 40 Natureza jurídica 40 Características e distinções 40 O titular do capital da empresa individual de responsabilidade limitada 42 Responsabilidade do titular do capital 43 Modo de constituição 44 Nome empresarial 44 Objeto 45 Capital 45 Administração 45 Dissolução e liquidação 46 Aplicação subsidiária das regras previstas para a Sociedade Limitada 47 Estabelecimento empresarial 47 Conceito 47 Natureza jurídica 48 Elementos 49 Estabelecimento principal e estabelecimentos secundários. Filiais, sucursais 55 Negociabilidade do estabelecimento 55 3. Direito Societário: Introdução. 61 Sociedade conceito 63 Espécies ou tipos de sociedades 63 Personificação da sociedade 66 Efeitos da personificação. Separação patrimonial e limite de responsabilidade 66 Diferenciação: sócio e sociedade. Responsabilidade da sociedade e dos sócios 67 Desconsideração da personalidade jurídica da pessoa jurídica 68 Classificação das Sociedades 77 Quanto à personificação: sociedade personificadas e não personificadas 77 Quanto ao objeto 79 Nome empresarial 83 Espécies 84 Formação 84 Princípios e proteção 84 Alienabilidade 85 Ato constitutivo da sociedade. Contrato social 85 Contrato social. Natureza jurídica 86 Cláusulas essenciais e facultativas 86 Capital social 88 Conceito. Formação. Características 88 Princípios 88 4. Da sociedade limitada 91 Introdução 92 Legislação aplicável 92 Responsabilidade dos sócios 93 Deliberações dos sócios 96 Órgãos de deliberação 97 Convocação 98 Instalação 98 Funcionamento 98 Quórum para deliberação 99 Direito de retirada e apuração de haveres 101 Conflito de interesses e responsabilidade pela ilicitude do voto 101 Administração 102 Conselho fiscal 105 A regência supletiva das sociedades limitadas 105 Reorganização societária 107 Cisão 109 5. Direito Societário 115 Introdução 116 Noções históricas 117 Primeiros exemplos no mundo 117 Primeiros Exemplos no Brasil 117 Características 118 1. Responsabilidade dos acionistas limitada ao valor de emissão de suas ações 118 2. Nome empresarial será sempre a denominação 120 3. Livre circulação de ações – sociedade de capital (em regra) 120 4. Regida por estatuto (e não contrato social) 121 5. Sempre sociedade empresária 122 6. Pertence ao mercado de capitais (que integra o sistema financeiro). Subscrição pública do capital (possibilidade) 122 7. Capital social dividido em ações 122 Companhia aberta e mercado de capitais 122 Companhia fechada 123 Constituição da companhia 123 Capital social: formação e alterações 123 Ações: espécies e características 124 Direitos e deveres dos acionistas. Acionista controlador. Acordo de acionistas 125 Acionista controlador 125 Acordo de acionista 126 Debêntures: espécies e características 127 Partes beneficiárias 129 Bônus de subscrição 130 Commercial papers 130 Assembleia geral 130 Espécies de assembleia geral 130 Administração 131 Transformação de Sociedade Anônima 132 Incorporação 132 Fusão de Sociedade Anônima 133 Cisão de Sociedade Anônima 133 7 Prefácio Prezados(as) alunos(as), Olá, tudo bem? Sejam bem-vindos à leitura do livro didático da mais bela dis- ciplina do ramo jurídico. Embora essa seja a minha percepção sobre o tema, este livro pretende fazê-lo chegar a essa conclusão ao término de cada capítulo. Neste livro de Direito Empresarial I será estudada a importância do exercício da empre- sa, da figura do empresário e das instituições correlatas aos fenômenos econômicos disciplinados no Código Civil Brasileiro de 2002. O fenômeno empresarial está presente no dia a dia de todas as pessoas, seja como agente empresarial (empresá- rios, sócios ou acionistas), seja como empregado ou empregador ou ainda como consumidores de produtos ou serviços. Este é um livro didático que, embora reconheça a importância do estudo das diversas relações contábeis-econômicas-jurídicas empresariais, destina-se a con- centrar a sua análise nos principais institutos jurídicos específicos do direito de empresa. Ainda que relevantes, os temas relacionados ao direito das obrigações, direito dos contratos, direito tributário e direito do trabalho são citados em con- sonância com cada tema. Entretanto, sobre tais assuntos, serão produzidos livros específicos relacionados às respectivas disciplinas. Você estudará nesta edição não apenas os conceitos e normas essenciais à com- preensão do fenômeno empresarial, mas, também, exemplos reais ou concretos e jurisprudenciais que ajudarão a entender a aplicação prática da matéria. Ao final de cada capítulo, você será estimulado a resolver atividades e a refletir sobre o con- teúdo aprendido, primando-se pela fixação do conteúdo por meio da aplicação de conceitos e normas a casos concretos e a situações cotidianas. Nunca é demais destacar que o livro é sempre um canal de acesso inicial e preparatório do conteúdo ministrado em sala de aula. Ele é o seu primeiro contato com a disciplina, dando-lhe informações mínimas indispensáveis à compreensão do tema. O estudo prévio às aulas é o mais recomendável, pois ajuda a com- preender as discussões realizadas em sala, bem como antecipa questões e dúvidas pertinentes ao assunto. Após as aulas, o uso do livro é também pertinente para trabalhar as questões e atividades propostas, assim como aprofundar leituras e pesquisas jurisprudenciais para colocar em prática e testar seus conhecimentos. Espero que você aproveite o livro com o mesmo entusiasmo e carinho com que ele foi feito. Bons estudos! Aspectos da empresa 1 capítulo 1 • 10 Aspectos da empresa. Introdução Talvez você não sedê conta, mas a empresa e o direito empresarial estão tão ligados a sua vida que hoje mesmo você se beneficiou dele e não percebeu. Caso você tenha acordado, feito e bebido um café e comido um pão com manteiga, ou algo mais, você já participou de uma variedade de fatos sociais e econômicos sobre os quais se insere o direito de empresa. O plantio, a colheita, a secagem e a manipulação do café e do trigo são fatos sociais e econômicos silencio- sos que fazem parte do café da manhã de muitos brasileiros. A produção, a distri- buição, o transporte, a estocagem, a venda e o consumo são “figurinos” jurídicos da atividade econômica que permitem o café da manhã. Dessa maneira, a ideia de “comércio” foi, e continua sendo, considerada um fato social e econômico que resulta de uma atividade humana que põe em circulação a riqueza produzida, au- mentando-lhe a utilidade e o valor. Assim, a atividade econômica é uma ação hu- mana não só de troca, mas de aproximação dos seres humanos. (SAY, 1803, p. 61) O vocábulo “comércio” etimologicamente significa “troca de mercadorias por mercadorias” ou commutatio mercium. As fases históricas do atual Direito Empresarial brasileiro Você já deve ter estudado em Introdução ao estudo de Direito que o direi- to brasileiro integra uma “família” ou “escola” de tradição jurídica relacionada à conhecida “civil law”. Isso significa dizer, em síntese, que a tradição brasileira foi bastante influenciada pelas tradições jurídicas europeias continentais (Portugal, Espanha, Itália, Alemanha etc), ou seja, pouco influenciada pelas tradições anglo- saxônicas do Reino Unido (Inglaterra, Escócia, Irlanda do Norte e País de Gales). O direito empresarial brasileiro, portanto, reflete aquela tradição. Ocorre que isso não aconteceu do dia para noite e não é academicamente recomendável falar em “evolução histórica” do conteúdo da disciplina. A ideia de “evolução” pode sugerir que a disciplina sofreu uma série de mudanças estruturais em suas características principais. Entretanto, isso nem sempre ocorreu. Apenas com intuito de dar um panorama sobre o que virá a seguir, é pertinen- te apenas destacar que o atual direito empresarial brasileiro é visto pela maioria da doutrina jurídica como reflexo de três grandes fases históricas. Numa primeira capítulo 1 • 11 fase identifica-se como o direito dos mercadores, pois eles que originaram o direito mercantil com suas leis e costumes, ao longo da história, a doutrina é dividida em três períodos: • Primeiro: do séc. XII ao séc. XVIII período subjetivo dos mercadores; • Segundo: do séc. XVIII (Código de Comércio Napoleônico de 1807) ao séc. XX, como núcleo o comerciante e seus atos (objetivos) do Comércio – perío- do objetivo; • Terceiro: do séc. XX até os dias de hoje (séc. XXI), cujo destaque legis- lativo é o Código Civil Italiano de 1942, tendo como o núcleo a empresa. Fase Mercantil. A organização jurídica do comércio ressurge como decorrência do re- nascimento da atividade mercantil durante a Idade Média. Iniciou-se neste pe- ríodo a fase identificada como fase do direito mercantil, por isso, foi chamada de ius mercatorum, ou seja, direito dos mercadores. O direito dos mercadores cen- trado nas corporações de ofício. Estas desenvolveram-se a partir de um protecio- nismo pouco propício à mudança, inibitória da iniciativa individual, à inovação. Tratava-se de uma estrutura social de predileção, preocupada em oferecer aos seus membros a entreajuda e o apoio de cada membro precisasse, em contrapartida de uma submissão ao grupo identificada sob os mais diversos nomes: “mesteres”, “confrarias”, “comunidades”, “hansas”, “guildas”, “artes”, “companhias”, “escolas”. Entretanto, a ajuda mútua e a submissão ao grupo constituíam, principal- mente, uma defesa contra outros poderes políticos e outros agentes econômicos. Por meio de suas rígidas intervenções, regulamentos e hierarquias, as corporações têm como finalidade proteger uma profissão e isso inclui o mercado e seus pro- fissionais contra todas as ameaças externas a fim de neutralizar a concorrência. (PEYREFITTE, p. 40) Nesse primeiro momento, contudo, as normas jurídicas eram aplicadas apenas àqueles que fossem matriculados na corporação. Por essa razão denominou-se esta fase do direito de fase mercantil ou subjetiva, pois as normas eram aplicadas tão somente aos comerciantes, considerados aqueles regularmente matriculados numa corporação. Assim, o âmbito de aplicação do direito era bem restrito à existência de normas especiais, surgidas dos usos e costumes (em contraposição às normas de direito comum (civil), presa à tradição romano-canônica). A aplicação de tais normas era também condicionada à existência de uma jurisdição especial para resolver conflitos entre determinados sujeitos, os mercadores (fase subjetiva do atual direito empresarial). capítulo 1 • 12 Em razão do aumento da importância econômica da atividade mercantil – os mercadores cada vez mais contratavam com não profissionais. Assim, ampliou-se a abrangência da jurisdição especial, que passou a conhecer de causas que envolviam relações entre mercadores profissionais e não mercadores. Essas relações foram chamadas de negócios mistos. Diante desta realidade, surgiu a necessidade de se determinar o que constituía a matéria comercial, da competência exclusiva dos tribunais especiais (consulares), a fim de se ditarem quais normas seriam aplicáveis somente aos mercadores e quais seriam de aplicação comum. Fase comercial Etimologicamente, o vocábulo “comércio” advém do termo latino – commercium. A expressão resulta da aglutinação da preposição cum: continuidade; ação de circulação, e o substantivo merx, ou seja, mercadoria ou produto. A ideia de circulação de mercadorias estava relacionada a bens móveis, aptos a circulação física dos bens. O surgimento desta fase ocorre pelo esgotamento de um tipo de mentalidade corporativa e restritiva das corporações de ofício. O esgotamento desta menta- lidade também se reflete nas estruturas sociais e políticas que se submeteram às mudanças liberais e suas principais revoluções liberais norte-americana e france- sa. Assim, os comerciantes, partindo de práticas costumeiras (usos e costumes), reorganizam um ramo do direito a fim de disciplinar a atuação daqueles que se dedicavam à atividade comercial, independentemente de pertencer à determinada corporação, isto é, os comerciantes: aqueles praticassem atos de comércio. Formou-se, então, o direito comercial como um conjunto de regras especiais, direito dos comerciantes, que reclamavam normas jurídicas aptas a regulá-los, não encontradas no direito comum, o direito civil. Esse era composto de normas vol- tadas a regular a atividade agrícola, vinculada à propriedade imobiliária, ligada à terra. Formava-se, assim, a dicotomia direito civil-direito comercial. Sob a Revolução Francesa de 1789, os costumes das corporações foram conde- nados pela lei de 14-17/6/1791 e todas as regras corporativas desapareceram. Foi a chamada lei Le Chapelier. Poucos anos após, em 1807, foi promulgado o Código Comercial francês, o qual, encerrando a fase subjetiva do atual direito empresarial, inaugura-se a denominada fase objetiva. capítulo 1 • 13 A atividade jurisdicional especial aos comerciantes foi mantida, mas as nor- mas de direito comercial passaram a ser aplicadas não mais àqueles regularmente matriculados numa corporação, mas àqueles que praticassem habitualmente atos de comércio, expressamente enumerados no art. 632 do Código Napoleônico. Ao longo do século XIX, diversos países seguiram o exemplo da codificação francesa, promulgando seus Códigos de Comércio, nos quais se adotou a teoria dos atos de comércio de inspiração francesa, dentre eles o Brasil com o Código Comercial Brasileiro de 1850 – Cco. – e seu respectivo Regulamento 737/1850. A teoria dos atos de comércio e a confusão conceitual A ideia de ato de comércio como fator central do direito comercial nunca foisuficiente para explicar e abranger a estrutura fundamental do capitalismo: as inovações tecnológicas advindas da iniciativa privada ou empreendedorismo indi- vidual voltada à satisfação das infinitas necessidades humanas. Novas formas negociais foram e estarão sempre sendo criadas pelos comer- ciantes. Essas inovações decorreram das transições do capitalismo comercial ao capitalismo industrial. Nesta fase, os comerciantes passaram a exercer atividade de produção de bens e se tornaram, assim, os chefes da indústria. Nesta nova organização socioeconô- mica, a enumeração dos atos de comércio seria meramente exemplificativa, pois jamais poderia dar conta de toda criatividade dos comerciantes para racionalização dos custos, maximização dos lucros e satisfação do público consumidor. A mu- dança de concepção permitiria a aplicação do direito comercial a atos surgidos da prática negocial e não previstos pelo legislador. O Código de Comércio italiano, de 1882, por exemplo, em seu art. 3o, no 3, incluiu no conceito de comércio “a especulação imobiliária”. Outra atividade que etimologicamente não cabia no conceito de “comércio” era a prestação de serviços sem a submissão pessoal e hierárquica caracterizadora do contrato de trabalho. Atividade cada vez mais lucrativa e eficiente não cabia no conceito de “atos de comércio”. Outro aspecto limitador da teoria dos atos de comércio consistia na ausência de explicação de por que determinados atos praticados por não comerciantes eram reputados comerciais (emissão de alguns títulos de créditos) – e, portanto, sujeitos capítulo 1 • 14 às normas do direito comercial –, sem que aqueles que os praticassem fossem reputados comerciantes. Entretanto, alguns atos eram tipicamente comerciais: so- mente poderiam ser praticados por quem exercesse atividade comercial, i.e., fosse comerciante (incluído, aqui, o comerciante “industrial”). A atividade agrária, a atividade imobiliária ou a atividade de prestação de ser- viços, todas com origem em normas herdadas do direito romano, não eram repu- tadas comerciais. Esse fenômeno se convencionou chamar de “sociedade pós-in- dustrial”, na qual o percentual de riqueza gerado pelo setor de serviços é superior àquele gerado pela indústria. Esta guinada para a sociedade pós-industrial ocorreu na transição da década de 1980 para a de 1990. (BELL, D. 1974) Com tais características o adjetivo “comercial” foi, gradativamente, perdendo relevo para o substantivo “atividade”. Assim, diversas normas surgiram no Brasil, no âmbito do direito comercial que eram estendidas a pessoas que, embora não fossem comerciantes em sentido estrito, eram reputadas comerciantes por lei. A lei 4.068/1962, que em seu art. 1o considerou como comerciantes as construtoras de imóveis, para que estas pudes- sem sacar duplicatas. A lei 6.404/1976 – Lei das Sociedades Anônimas –, por sua vez, dispõe em seu art. 2o, § 1o , que, qualquer que seja o objeto da companhia, ela é tida como mercantil. De outro modo, havia pessoas que não eram reconhecidas como comerciantes pelo ordenamento, pois exerciam atividade tida como civil, mas mesmo assim gozavam da proteção que as leis comerciais liberalizavam em favor dos comercian- tes –, em manifesta contrariedade, portanto, com a letra do art. 4o do CCo. A lei 4.591/1964 em seu art. 43, III, sujeitou as incorporadoras ao processo falimentar. Outro exemplo: a lei 8.245/1991, que, em seu art. 51, § 4o, estendeu o direito à renovação compulsória do contrato de locação, até então instituto tipicamente co- mercial, às sociedades civis com fins lucrativos e a lei 5.474/1968 que, em seu art. 20, estendeu a faculdade de sacar duplicatas às “empresas, individuais ou coletivas, fundações ou sociedades civis, que se dediquem à prestação de serviços”. Fase empresarial – origem e desenvolvimento A atual noção de empresa surgiu no Código Comercial francês que tinha por premissa a teoria dos atos de comércio. Este código, em seu art. 632, elencava os atos considerados de comércio, mas também fazia alusão aos empreendimentos. A doutrina jurídica, ao tentar explicar a empresa enquanto ato, percebeu que ela não capítulo 1 • 15 era simplesmente um conjunto de atos, mas um conjunto de atos coordenados, ou seja, uma atividade organizada. No Brasil, o art. 19 do Regulamento 737 de 1850, tradução quase literal do art. 632 do Código Comercial francês, também fazia alusão à empresa reputada de mercancia (sic), com o que se aludia, pela vez primeira, a certas atividades como sendo comerciais. Com a mesma conotação o art. 3o do CCo italiano de 1882, que reputava atos de comércio diversas espécies de empresas. Assim, empresa seria um ato de comércio. Qualquer pessoa que realizasse pro- fissionalmente tais atos de intermediação na troca seria reputada comerciante, tal qual aquele que exercesse habitualmente empresa seria reputado empresário. Aqui você deve perceber que a base de construção do conceito de empresa estava diretamente ligada ao aspecto fático (econômico) da figura do comerciante: a interposição na troca de coisas móveis e a organização dos fatores de produção, ou seja, o exercício de empresa. Este é o motivo pelo qual alguns países, inclusive o Brasil, que tinham códigos de inspiração francesa identificaram o conteúdo ju- rídico com o conteúdo econômico da empresa. O autor italiano Cesare Vivante, por exemplo, chegou a afirmar que “empresa é um organismo econômico que, por seu próprio risco, recolhe e põe em atuação sistematicamente os elementos necessários para obter um produto destinado à tro- ca. A combinação de vários fatores, natureza, capital, trabalho, que se associando produzem resultados impossíveis de conseguir se atuassem separados, e o risco que o empresário assume ao produzir uma nova riqueza, são os dois requisitos indis- pensáveis a toda empresa.” (VIVANTE, p. 131) Dessa forma, a doutrina e o direito italiano adotaram como jurídico, o concei- to econômico de empresa. Porém, para esta mesma doutrina, nem toda atividade econômica deveria ser considerado “empresa”, mas sim e tão somente as atividades previstas não Código Comercial italiano. (VIVANTE, p. 131) Ainda que tal concepção tenha tido críticas contundentes (ROCCO, p. 178), a noção de empresa ingressa no mundo jurídico como categoria de atividade de troca, intermediação ou especulação sobre o trabalho. Entretanto, a partir do mo- mento em que o comerciante passa a se apropriar dos meios de produção, dá-se o ingresso na fase do capitalismo industrial e, então, a figura do comerciante entra em declínio e se obscurece, passando ao primeiro plano a figura do empresário, reconhecida pelo Código Civil Italiano de 1942, em seu art. 2.082. capítulo 1 • 16 Com essas informações podemos concluir que: • Sob a teoria dos atos de comércio, percebia-se a sua insuficiência para deli- mitar o campo de aplicação do direito comercial. Era visível a enorme dificuldade em definir o que poderia ser considerado comércio para o direito e como identifi- car a figura do comerciante; • No entanto, com a adoção da teoria da empresa, a ênfase passou a ser a noção de exercício de atividade econômica organizada tendente à produção ou circulação de bens ou serviços; • A noção econômica de empresa excede, em muito, a noção jurídica de em- presa, tendo em vista que certas atividades econômicas organizadas não são consi- deradas empresas pelo direito; • Há entre os juristas e legisladores, enorme dificuldade em afirmar, o que não é empresa e, portanto, quem não é empresário. Diante desta dificuldade é se faz opção juridicamente arbitrária para afastar determinadas atividades econômicas do conceito de atividade empresária, o que cria desigualdades jurídicas injustificá- veis do ponto de vista tributário e do modo de recuperação de empresas. Teoria e função social da empresa A teoria da empresa pode ser sucintamente explicada como a concepção que identifica o empresário e a forma como ele organiza os fatoresde produção (capi- tal, trabalho, insumos e tecnologia) para o exercício da atividade econômica, com a finalidade de produção ou circulação de bens ou serviços. Na teoria da empresa, o eixo central está na natureza da atividade, ou seja, na existência ou não de estru- tura empresarial em que o empreendedor exerce a atividade econômica. Alguns conceitos são definidos de forma diferentes por mais de um ramo do conhecimento humano, e a ideia de empresa é exemplo típico dessa situação. O vocábulo “empresa” advém da palavra latina prehensus, derivada de prehendere, que significa empreender, praticar. Sob perspectiva econômica a ideia de empresa foi formulada por Ronald Coase em 1937, em seu célebre livro intitulado A natureza da empresa (COASE, p. 386- 405). Nesse livro, o autor identifica a empresa como a organização dos fatores de produção de uma empresa que pode ser feita internamente, quando ela recolhe as matérias-primas, processa-as, constrói os produtos, distribui-os e vende-os direta- mente aos consumidores, ou, por outro lado, essa mesma organização dos fatores capítulo 1 • 17 pode ser feita externamente, ao adquirir as matérias-primas processadas e delegar a distribuição e venda dos produtos a terceiros. Esta concepção se popularizou no meio acadêmico a ponto de influenciar legisladores do mundo inteiro. No Brasil, esta concepção é percebida no Código Civil Brasileiro de 2002 – art. 966, caput. Entretanto, do ponto de vista jurídico, a ideia de empresa é reflexo da ideia da intervenção do Estado na economia, ao fazer a atividade empresarial atender não apenas ao interesse individual, mas também a interesses metaindi- viduais, atuando também em prol da coletividade. Implica dizer que o conceito jurídico de empresa já surgiu atrelado ao atingimento de uma finalidade (função) social. Não se pode deixar de destacar que a sistematização inicial desta concepção teve origem regimes políticos totalitários. William Conrad Kessler, em sua obra The German Corporation Law of 1937, publicado na American Economic Review, em dezembro de 1938, destacava que a lei alemã de 1937 era instrumento do partido nacional-socialista para instituir sua filosofia de governo no campo da atividade econômica. Foram introduzidos dois princípios totalitários no direito societário alemão: o “bem-estar geral acima do interesse individual” e o “princípio do líder” ou “Führersprinzip”. (KESSLER, p. 653-662) A teoria da empresa adotada no Brasil foi muito influenciada pela Constituição italiana, forjada originalmente sob o regime corporativista e delineada na Carta del Lavoro de 1927 e também pelo código civil italiano de 1942 que, a partir do art. 2.082 dispõe que “é empresário (imprenditore) quem exerce profissionalmente uma atividade econômica organizada com fim de produção ou comércio de bens ou serviços”. Esta concepção identifica tanto o trabalho quanto a livre iniciativa como exi- gências sociais, pois todos se beneficiariam dessas atividades econômicas, caben- do ao Estado a tutela e controle quanto ao atendimento desses interesses. Dessa forma, o conceito jurídico de empresa adotado pelo Código Civil Brasileiro de 2002 está imerso no cadinho da função social, verdadeira mescla dos conceitos de funcionalismo e de solidarismo, no sentido de realização de atividade não em benefício próprio, mas no benefício social. capítulo 1 • 18 Autonomia e características atuais Muito se discute hoje sobre se a inserção do Direito Comercial no Código Civil Brasileiro de 2002 e as alterações feitas afeta ou não a sua autonomia. As responsabilidades sejam no Direito Civil ou no Direito Comercial, apa- rentemente são as mesmas, devido à semelhança entre ambas foram incluídas pelo legislador em uma mesma lei, que são do direito privado. Entretanto, o direito comercial não morreu. A nova nomenclatura “Direito Empresarial” que consta na nova lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, pertence ao ramo privado do direito, disciplinando as relações jurídicas dos comerciantes ou empresários a qualquer relação comercial. Assim, o código civil brasileiro aparece como referência do início de uma nova fase do Direito Comercial brasileiro. Porém, não se deve falar em unificação das disciplinas de Direito Civil e Direito Empresarial. Com o advento do Código Civil, houve apenas a unificação de certas obrigações de direito privado e a inclusão, na lei civil, de relações jurí- dicas relativos à empresa que, em grande parte, eram disciplinadas especialmen- te no Código Comercial Brasileiro de 1850 e em leis especiais. O Código Civil Brasileiro de 2002 apenas tentou organizar o “Direito de Empresa”, dividindo em quatro títulos previstos dos artigos 966 a 1.195. Disciplina quase tudo que diga respeito ao “empresário”, à “empresa”, ao “estabelecimento”, e aos “institutos com- plementares” que regulamentam e disciplinam a atividade empresarial. A autonomia do Direito Comercial no Brasil é especialmente identificada na Constituição da República que em seu art. 22, inciso I, distingue o “Direito Civil” em separado de “Comercial”. A Constituição é de 1988. Nessa data, a referência à disciplina era de direito comercial. Com o advento do Código Civil Brasileiro de 2002, a doutrina passou a identificá-la como “direito empresarial” pelos motivos já expostos. Atualmente quase toda a doutrina destaca a sua autonomia (integral) cujo destaque vem a ser o Enunciado no 75 da I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal em que dispõe que “A disciplina de matéria mercantil no novo Código Civil não afeta a autonomia do Direito Comercial”. Tramitam no Congresso Nacional dois projetos de lei que visam reorganizar as normas jurídicas que, atualmente, refletem momentos históricos diferentes. • Projeto da Câmara dos Deputados – PLC 1572. Disponível em: <http:// www.camara.gov.br/proposicoes>. Acesso em: jul. 2018; capítulo 1 • 19 • Projeto do Senado Federal – PLS 487/2013. Disponível em: <https:// www25.senado.leg.br/web/atividade/materias>. Acesso em: jul. 2018. São dados fundamentais para destacar a autonomia normativa do Direito Empresarial e que a inserção de normas empresariais no Código Civil Brasileiro de 2002. Reflete apenas mais uma tentativa de organização no direito privado brasileiro. Fontes do Direito Empresarial Considerando que o direito empresarial é o ramo do direito que regula a ati- vidade econômica organizada para produção e circulação de bens e serviços, bem como todos os atos praticados para a consecução dessa atividade é possível identi- ficar as seguintes fontes do direito empresarial: • Fontes materiais: fatos históricos, fenômenos socioeconômicos e políticos. • Fontes formais: conteúdos ou normas jurídicas, são elas que dão funda- mento para o ramo do direito a ser estudado e são validadoras das normas jurídi- cas estabelecidas. As fontes materiais do Direito Empresarial já foram objeto de estudo quando se analisaram as fases históricas deste ramo do Direito, listando os principais fatos históricos e movimentos sociais e políticos relacionados com ele. No que concerne às fontes formais, elas podem ser ainda fontes primárias ou secundárias: a) Fontes Formais Primárias: • Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; • Leis Empresárias Especiais, tratados internacionais; decretos, instruções normativas, regulamentos; • Código Civil de 2002 (Livro II – Direito de Empresa); • Código Comercial de 1850. b) Fontes Formais Secundárias: • Código Civil de 2002; • Usos e Costumes do Comércio; • Analogia, costumes e princípios gerais do direito. capítulo 1 • 20 Princípios constitucionais norteadores da ordem econômica A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 em seu art. 170 de- termina que a atividade econômica no Brasil se submeta aos seguintes princípios: Princípio da dignidade da pessoa humana (CRFB/1988 – art.170, caput) Em obediência a esse princípio, a atividade empresarial deve conferir a cada pessoauma respeitabilidade, um direito a um respeito inerente à qualidade de ser humano. Assim, o exercício de qualquer parcela da atividade econômica de modo não adequado àquela promoção expressará violação do princípio duplamente con- templado na Constituição. (GRAU, p. 198) Princípio da propriedade privada e da função social da propriedade Princípio que identifica a função social uma limitação, no sentido de que legítimo será o interesse individual quando estiver voltado à satisfação social, e, não apenas quando não o exercer em prejuízo da coletividade. O princípio da função social, dessa forma, impõe ao proprietário (ou a quem for exercer o direito de usar, gozar e dispor da propriedade) a prática de comportamentos em benefício da sociedade. Portanto, o proprietário (ou o titular do poder de controle de uma empresa) deve ter, ao mesmo tempo, um direito (livre iniciativa de empresa) e uma fun- ção (finalidade), à satisfação das necessidades sociais de maneira lucrativa, como, por exemplo, entrega de produtos e serviços ao público consumidor por meio da realização do pleno emprego (que proporciona a dignidade do trabalhador), da preservação do meio ambiente. Princípio da livre-iniciativa (CRFB/1988 - art. 1o, IV c/c. art. 170, caput) A previsão constitucional da livre-iniciativa estabelece que escolha de qual atividade será empreendida assim como o quantum a ser produzido ou comercia- lizado resultam de uma decisão livre dos agentes econômicos. Isso significa dizer que a Constituição consagra uma economia de mercado, de natureza capitalista, pois a iniciativa privada é um princípio básico da ordem capitalista. capítulo 1 • 21 Princípio da valorização do trabalho humano (CRFB/1988 – art. 1o, IV c/c. art. 170, caput) Além de ser um princípio constitucional, é um fundamento da ordem eco- nômica e está intimamente ligado à dignidade da pessoa humana. Este princípio determina que a ordem econômica deva dar prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos os demais valores da economia de mercado. Princípio da soberania nacional econômica (CRFB/1988 – art. 1, Inc. I c/c. art. 170, Inc. I). Este princípio visa garantir que o exercício de qualquer atividade econômica realizada no Brasil não entre em choque com os interesses nacionais. A noção de interesse nacional tem sido usada como ferramenta analítica e instrumento de ação política. No primeiro caso, o conceito seria utilizado para descrever o me- lhor curso da política externa de uma nação. No segundo caso, seria utilizado por atores políticos como meio de justificar decisões tomadas, denunciar ou propor políticas. (CONTRERA, 2015) Assim, os interesses nacionais estão em um plano superior aos interesses do livre exercício da iniciativa privada. Esta concepção não supõe o isolamento do Brasil no cenário internacional, mas o desenvolvimento dos fundamentos da eco- nomia e a superação da situação de dependência em relação às economias desen- volvidas. (GRAU, p. 226) Princípio da livre concorrência Princípio que decorre da livre-iniciativa e atua como limite do seu exercício. Visa prevenir abusos da livre-iniciativa, pois assegura o direito de todo agente econômico de conquistar clientela, em igualdade de condições. Desta maneira, proíbe-se a utilização incorreta da livre-iniciativa e do poder econômico. É fundamento para a repressão do abuso do poder econômico previs- to no artigo 173, §4o , da Constituição de 1988. Trata-se de princípio fundamen- tal para a defesa da economia de mercado, especialmente, porque visa proteger o mercado e os consumidores contra a tendência prejudicial da concentração de poder nas mãos de poucos empresários. capítulo 1 • 22 Princípio de defesa do consumidor (CRFB/1988 – art. 5o, XXXII c/c art. 170, V) Princípio que busca incentivar o desenvolvimento das relações comerciais, bem como viabilizar o desenvolvimento econômico e o bem-estar da coletividade, tendo o consumidor como sujeito fundamental para a circulação de bens numa economia de mercado, que não pode ser visto apenas como instrumento para obtenção de lucro. Princípio de defesa do meio ambiente Princípio diretamente atrelado ao conceito de desenvolvimento sustentável no sentido de preservar aquelas coisas nas quais se sustenta o desenvolvimento. Assim, a defesa do meio ambiente está intimamente ligada ao direito – funda- mental – à vida e, por isso, deve preponderar sobre quaisquer considerações de desenvolvimento econômico desenfreado. Dessa forma, a tutela do meio ambiente serve como mandamento aos agentes econômicos no exercício de qualquer inicia- tiva privada, especialmente das atividades empresariais bem como ferramenta de proteção da cidadania. Princípio da redução das desigualdades regionais e sociais (CRFB/1988 – art. 3o, III c/c art. 170, VII) Trata-se de princípio que busca equilibrar, simultaneamente o crescimento econômico com a redução das desigualdades econômicas a fim de erradicação a pobreza e a marginalização social. Parte-se da premissa de que o processo de de- senvolvimento econômico no Brasil não pode ser desenfreado. Busca-se contribuir para o estável funcionamento dos mercados com evidente função social. Princípio da busca do pleno emprego Princípio que deve ser entendido como uma busca pela “expansão das oportu- nidades de emprego produtivo” (GRAU, p. 253). Neste sentido, busca-se propi- ciar trabalho a todos quantos estejam em condições de exercer atividade produtiva com pleno emprego da força de trabalho capaz. Este princípio se harmoniza com o princípio da valorização do trabalho humano, pois se impede que o princípio seja considerado apenas como mera busca quantitativa. O homem que vive sem capítulo 1 • 23 possibilidades de emprego, em estado de escassez econômica, está impossibilitado para desenvolver suas capacidades básicas, situação que ofende a dignidade da pessoa humana, inclusive. Princípio do tratamento diferenciado para as microempresas e empresas de pequeno porte Princípio que visa facilitar as atividades das microempresas e empresas de pe- queno porte e, dessa forma, promove a efetivação da livre-iniciativa, bem como da livre concorrência. Diante disso, ocorre ampla abertura para o livre exercício de atividade econômica, tornando mais simples a disputa saudável pelo merca- do consumidor. A diferença entre esses dois pequenos empresários é estabelecida na lei com- plementar no 123/2006 (alterada pela lei complementar no 128/2008). São esses os fundamentos que servem de base para todo o sistema jurídico, ou seja, os alicerces das demais normas jurídicas. Conceito jurídico de empresa – Código Civil Brasileiro de 2002 O Código Civil Brasileiro de 2002, em seu Livro II, cuidou “Do Direito de Empresa”, que abrange os arts. 966 a 1.195. Entretanto, há outros dispositivos no Código que se referem à matéria: arts. 45, 48, 49, 50, 51, 82, III, 89, 90, 91, 927, parágrafo único, 931, 932, III, 933, 2.031, 2.033, 2.035, 2.037 e 2.045. Desse modo, percebe-se o quanto é vasto este assunto. O art. 2.045 do Código Civil Brasileiro de 2002 revogou expressamente a Primeira Parte do Código Comercial (lei 556, de 25/6/1850), que abrangia os arts. 1o a 456, dedicados a regular a figura do comerciante e seus auxiliares (arts. 1o a 120), os contratos e obrigações mercan- tis (arts. 121 a 286); e as sociedades comerciais (arts. 287 a 353). Do ponto de vista econômico, a empresa “é um organismo econômico que, por seu próprio risco, recolhe e põe em atuação sistematicamente os elementos necessários para obter um produto destinado à troca” (VIVANTE, p. 131). Para Alberto Asquini, a empresa, em economia, seria “toda organização de trabalho e de capital tendo como fim a produção de bens ou serviços para troca.” (ASQUINI, p. 110) Diante da dificuldade de adaptação do conceito econômico de empresa às suas implicações jurídicas, sobreveio a obra de Alberto Asquini, demonstrando que capítulo 1 • 24 ideia de empresa deveria ser encarada pelodireito como um “fenômeno poliédri- co, o qual tem, sob o aspecto jurídico, não um, mas diversos perfis em relação aos diversos elementos que o integram” (ASQUINI, p. 109). Assim, o conceito eco- nômico de empresa recebe, do ponto vista jurídico, várias perspectivas: a figura do empresário (sujeito), atividade (fato-empresa), e estabelecimento (coisa). Assim, o Código Civil Brasileiro de 2002 encampou em parte a referida perspectiva jurí- dica de Asquini: 1. Perfil Subjetivo (Pessoas): Empresário, sociedades e Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI); 2. Perfil Objetivo (Coisas); estabelecimento; 3. Perfil funcional (fato): empresa. Elementos da organização da atividade econômica Os elementos de empresa são os fatores de produção empregados pelo Empresário (Individual), que são: o capital, o trabalho ou mão de obra (alheio), os bens (a matéria-prima equipamentos, o estabelecimento – CCB/02 - Art. 1142) e a tecnologia. Tudo o que for necessário para produção ou circulação de bens ou prestação de serviços é visto como elementos de empresa, ou seja, a massa de energia produtora. A organização dos elementos de empresa de forma combinada ou inteligente varia conforme o tipo de atividade, de tal modo que compõem um conjunto, um aparelho. Cada aspecto representa uma peça da atividade econômi- ca toda. Separados, são apenas coisas e pessoas. Reunidos inteligentemente, for- mam uma organização, um aparelho apto a entrar em funcionamento. Entrando em funcionamento, surge a empresa. Empresário individual Conceito – Código Civil Brasileiro de 2002 Empresário é quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços – CCB/02 – art. 966, caput. Assim, a caracterização do empresário individual se dá pelo efetivo exercício profissional de atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços. Há atividade empresarial sempre que houver uma série de atos orientados a um determinado fim. Por isso se diz atividade organizada. capítulo 1 • 25 No Brasil, o conceito econômico de empresa (atividade econômica organiza- da) subjaz ao conceito jurídico de empresário. O que qualifica o empresário é o exercício de atividade econômica. Dessa maneira, a noção de empresário advém do conceito de atividade empresarial. Não confunda! (Confusões conceituais) 1. Empresário é pessoa física (natural); • Portanto não se confunde com sociedade empresária (Pessoa Jurídica). 2. Empresário (pessoa natural) é quem exerce em seu nome (individual) a ativi- dade econômica (Empresário (Individual)). • Portanto não se confunde com sócio (ou acionista) de sociedade empresária; • O sócio (ou acionista) faz parte de um contrato (contrato social), mas quem exerce a atividade econômica é a sociedade (pessoa jurídica) resultante do contra- to social. 3. Empresário é pessoa física (natural), ou seja, é sujeito de direito. • Empresário (Individual) não se confunde com estabelecimento; • Estabelecimento é conjunto de bens (mesa, cadeira, imóvel, veículos etc.), portanto objeto de direito – CCB/02 – art. 1.142. 4. Empresário (Individual) não se confunde com “firma”. • Esta é uma técnica de identificação do nome do empresário; • O nome da pessoa não se confunde com a própria pessoa. O intuito lucrativo No art. 966 CCB/02 “empresário é quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada”. A justificativa da necessidade da presença de intuito lu- crativo como requisito da figura do empresário varia conforme seu enquadramen- to na ideia de profissionalismo ou na ideia de economicidade: O profissionalismo é entendido por parte da doutrina como: • Habitualidade (propósito de permanência) no exercício da atividade; • O exercício da atividade com intuito de lucro. A economicidade, por sua vez, é entendida por parte da doutrina significando • O intuito lucrativo; • A assunção dos riscos econômicos da atividade; capítulo 1 • 26 • O respeito ao regime de ingressos e saídas, de modo a possibilitar a conse- cução de um fim. Entretanto, para alguns autores, o intuito de lucro não é elemento caracteriza- dor do empresário (ASQUINI, p. 116), pois a norma do art. 966 não menciona expressamente o “intuito de lucro”. Ademais, a análise do intuito do lucro só faz sentido com relação às empresas capitalistas que pertençam ao setor privado. Entretanto, há sociedades empresárias que, por força de lei, não têm a característi- ca do intuito de lucro. São as sociedades empresárias do setor público (Sociedade de Economia Mista – lei 6.404/76 – art. 238). Por outro lado, alguns autores afirmam que o intuito lucrativo não seria elemento distintivo do empresário em razão de os profissionais liberais, que não são considerados empresários pelo orde- namento, também atuarem com o intuito lucrativo. (ALMEIDA, 1999) Atividades excluídas do contexto empresarial. Atividade Intelectual – Científica – Artística – Literária A simples leitura do conceito de empresário contida no CCB/02 – art. 966, caput, poderia englobar praticamente todo gênero de atividade econômica voltada para a produção ou circulação de bens ou serviços. Entretanto, o ordenamento jurídico brasileiro adotou o critério da empresarialidade por determinação legal. Isso significa que será a lei que determinará quem pode ou não ser considera- do empresário. Dessa maneira, nem todos os agentes econômicos que exerçam atividade eco- nômica organizada com intuito lucrativo, serão considerados empresários. Assim, aqueles que exercem profissão intelectual (gênero), qualificada pelo aspecto pre- dominante científico, literária ou artística (espécie), regulamentada por estatuto próprio, também não serão tidos como empresários. Isso se dá porque esses pro- fissionais já possuem estatuto próprio a regular sua atividade. Há também deter- minação legal de se inscreverem em livros ou listas particulares, em detrimento da inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis. Fique atento, pois não são empresários os advogados e as sociedades de ad- vogados, por exercerem atividade privativa de advogado e regrada, portanto, pelo Estatuto do Advogado (lei 8.906/1994 – art. 16). Assim, devem registro no Conselho Seccional da Ordem dos Advogados (lei 8.906/1994 – arts. 10 e 15, §1o). capítulo 1 • 27 Elemento de empresa Agentes econômicos rurais (produtor rural) e profissionais liberais, em prin- cípio não são empresários. Assim, as sociedades envolvendo produtores rurais, médicos, engenheiros, advogados, não são consideradas sociedades empresárias, porque entram no art. 966, parágrafo único, primeira parte do NCC. Contudo no art. 966, caput, (2a parte) já dá a exceção ao dizer: “salvo se o exercício da pro- fissão constituir elemento de empresa.” Predomina o entendimento do Professor José Edwaldo Tavares Borba no sentido de que o aspecto intelectual constitui um dos fatores (elementos) ou instrumentos de atuação da atividade econômica. Não mais o principal aspecto, apenas mais um. A atividade passe a ser considerada em- presária se o aspecto intelectual (científico, artístico ou literário) seja apenas mais um elemento dentro de uma cadeia de atos e negócios empresariais. Neste caso, a atividade econômica passa a ser considerada empresarial. (BORBA, 2003) Outras hipóteses de empresarialidade por determinação ou opção legal 1. As sociedades anônimas serão sempre sociedades empresárias independente- mente de seu objeto (art. 982, parágrafo único). 2. As cooperativas, as quais serão sempre sociedades simples (art. 982, parágrafo único). 3. As pessoas físicas ou jurídicas que exercerem atividade rural. Desse modo, quem exercer atividade orientada ao cultivo do solo, à silvicultura, à pecuária e a atividades conexas dirigidas à transformação ou alienação dos produtos agrícolas inseridas no exercício normal da agricultura, ou seja, aquele que exercer atividade rural, não será, de ordinário, empresário e, portanto, não estará subordinadoao estatuto do empresário. • Entretanto, é possível que à pessoa natural que exercer atividade agrícola e à pessoa jurídica que tiver por finalidade o exercício de atividade agrícola a possibili- dade de se sujeitarem ao estatuto do empresário, mediante a inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis – CCB/02 – art. 971 e 984. • Neste caso, há hipótese legal de sujeição voluntária ao estatuto do empresá- rio mediante a inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis. capítulo 1 • 28 Pressupostos para o exercício da Empresa Individual Para ser considerado empresário, basta a pessoa física (natural) ter capacidade, exercício efetivo da empresa (profissionalismo – finalidade de lucro) e ausência de proibição legal. CCB/02 – art. 972. O Registro na Junta Comercial não é, em regra, requisito para identificação do Empresário (Individual). Ainda que pessoa exerça a empresa sem o registro, será considerada empresária. A pessoa com capacidade que exercer a empresa com profissionalismo e com finalidade de lucro, ainda que legalmente proibida de exer- cer a empresa também será considerada empresária. Assim, os requisitos para caracterização do empresário são: a) plena capacida- de, b) exercício efetivo da empresa (profissionalismo) e c) ausência de proibição legal. • Capacidade A capacidade civil está disciplinada nos arts. 3o ao 5o do Código Civil. Terá plena capacidade a pessoa com liberdade para administrar a si própria e aos seus bens. A plena capacidade se adquire com a maioridade ou pela emancipação. Exercício da empresa pelo incapaz O incapaz também pode exercer a empresa. Entretanto, o incapaz somente poderá dar continuidade a uma empresa já iniciada, não poderá iniciar, em nome próprio, empresa própria – CCB/02 – art. 974. A permissão legislativa para o exercício da empresa pelo incapaz se dá em atenção à função social de empresa que visa permitir a preservação da empresa, da manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores. Tais situações ocorrem quando essa pessoa já era um empresário e se torna in- capaz de forma superveniente; ou quando já era incapaz e herda bens de empresa estabelecida e organizada. Em ambos os casos, obviamente, a celebração de atos jurídicos dependerá da representação ou assistência. Entretanto, quem exerce a empresa é o incapaz. A sua responsabilidade se dará nos termos do CCB/02 – art. 928 c/c art. 974, §2o. Os representantes ou assistentes se apresentam sob a categoria de administradores da atividade econô- mica e por isso respondem como tais – CCB/02 – art. 1.747 c/c. art. 1.748 c/c. art. 1.752. capítulo 1 • 29 Entretanto, para que um incapaz possa validamente continuar uma empresa iniciada por alguém plenamente capaz deverá obter autorização judicial CCB/02 – art. art. 974, §1o. Uma vez concedida, essa autorização deverá ser a mesma ar- quivada na respectiva Junta Comercial – CCB/02 – art. 976. Pode acontecer de o próprio representante ou o assistente desse empresário incapaz não ter plena capacidade jurídica, ou ser impedido de exercer atividade empresarial. Neste caso, deverá, com autorização judicial, nomear administrador – CCB/02 – art. 975. Essa nomeação não isenta o representante ou assistente do empresário incapaz da responsabilidade pelos atos do gerente nomeado CCB/02 – art. 975, §2o. Ademais, o Código Civil criou regra excepcional para proteção do patrimô- nio não empresarial do incapaz autorizado à empresa – CCB/02 - Art. 974, §2º. Trata-se de especial hipótese de patrimônio de afetação ou única hipótese de res- ponsabilidade limitada para este específico empresário individual (GALIZZI e CHAVES. 2004, pg. 87/88). • Exercício efetivo da empresa A caracterização do empresário individual se dá pelo efetivo exercício profis- sional de atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços. Ao contrário senso, se a atividade econômica não for efetivamente exercida por determinado período de tempo, o sujeito não poderá ser considerado empre- sário e por consequência não poderá ser decretada sua falência – lei 11.101/2005 – art. 1o c/c. art. 96, VIII. No mesmo sentido, não se considera empresário aquele que exerce certa ativi- dade temporariamente, esporadicamente, mesmo que seus fins estejam pautados no lucro. Portanto, aquele que episodicamente organiza ou compra certas merca- dorias para revenda, não pode ser considerado empresário. • Ausência de impedimento legal. Os proibidos para atividade empresária A atividade econômica no Brasil se submete ao princípio da livre-iniciativa – CRFB/1988 – art. 170. Porém, a própria Constituição da República de 1988 estabelece que o exercício de profissão estará sujeito ao atendimento dos requisi- tos previstos em lei ordinária – CRFB/1988 – art. 5o, XIII), que fundamenta a validade das proibições ao exercício da empresa. O proibido de exercer a empresa deve ser capaz, ou seja, possuir ampla disponibilidade para realização de negócios capítulo 1 • 30 jurídicos, mas por força de uma vedação expressa na lei ele não pode exercer a empresa. Os principais impedidos de exercer a atividade empresarial são: • Membros da Magistratura – art. 95, PU, I da CF c/c com a LOMAN; • Membros do Ministério Público – art. 128, §5o, II, (c) da CR/88 c/c lei 8.625/93 (membros do MP) c/c LC 106/03 (LC estadual do MP/RJ); • Servidores públicos ativos – art. 117, X, c/c. art. 132, XIII da lei 8.112/90. • Militares da ativa – art. 29 da lei 6.880/80 c/c art. 204 do CPM (Dl. 1001/69); • Médicos não podem exercer a atividade farmacêutica – lei 5.991/93 – art. 21 c/c art. 55 c/c. Dec. 20.377/31; • Devedores do INSS – lei 8.212/91 – art. 95, §2o, (d); • Prepostos/Empregados – CCB/02 – art. 1170 c/c. Art. 482 CLT; • Leiloeiro art. 36, alínea a, 1o do Decreto 21.981/32; 10; • O falido não reabilitado – lei 11.101/2005 – art. 102 c/c. art. 158, III c/c. art. 159. Entretanto, a despeito da proibição, se tais pessoas exercerem efetivamente a empresa, responderão como empresários – CCB/02 – art. 973. ATENÇÃO Em relação aos Deputados, não há proibição expressa – art. 54, II, (a) c/c. art. 29, IX da CRFB/1988. A situação do estrangeiro O estrangeiro com visto definitivo pode ser empresário no Brasil, porém tem que ser domiciliado. Isso porque o estrangeiro com visto provisório não pode ser empresário individual no Brasil. Lei 6.815/1980 – art. 99. A questão do registro Não é necessário o registro para a pessoa ser considerada empresária. O Registro é um gênero que tem três modalidades previstas no art. 32 da lei 8.934/94: Matrícula (inciso I), Arquivamento (inciso II) e Autenticação (inciso III). Registro é importante para dar regularidade, publicidade e proteção jurídica ao empresário. capítulo 1 • 31 O Registro, em regra, tem natureza declaratória – lei 8.934/1994 – art. 36. A realização da inscrição (Registro) do Empresário (Individual) enseja uma presun- ção relativa de que o sujeito é empresário. A presunção é relativa porque admite prova em contrário. Nada impede que se prove que apesar do registro, aquele sujeito nunca exerceu efetivamente a empresa. Porém exceções, ou seja, existem dois casos em que o Registro será indispen- sável para que a pessoa adquira a condição de empresário: • Art. 32, I da lei 8.934/94 = MATRÍCULA. As pessoas nas quais a lei exige a matrícula são pessoas que só adquirem a condição de empresário após o Registro, denominado matrícula; • Art. 971 e art. 984 NCC = ATIVIDADE RURAL. Quem exerce atividade preponderantemente rural não é considerado empresário. Porém se esta pessoa optar por se registrar na Junta Comercial, ele terá tratamento de empresário. A ratio dos arts. 971 e 984 NCC é possibilitar a eventual recuperação da empresa daquele que explora atividade preponderantemente rural. Se não há o Registro, a atividade é irregular. Ainda que irregular, o Empresário (Individual) responde por todas as suas obrigações,civis, consumeristas, empresárias, trabalhistas, tributárias. Entretanto, o empresário irregular não poderá: • Requerer a falência de outro devedor empresário por falta de legitimidade ativa – lei 11.101/2005 – art. 97, §1o. Somente o empresário regular (devidamen- te registrado) pode requerer a falência do seu devedor empresário. • Requerer recuperação judicial – lei 11.101/2005 – art. 48. • O empresário irregular não pode participar do procedimento licitatório – art. 28 da lei 8.666/93. • Não terá direito à proteção ao nome empresarial. Art. 33 da lei 8.934/94 c/c CCB/02 – art. 1.166. Mesmo sem registro, se o sujeito for plenamente capaz, exercer efetivamen- te a empresa e não for proibido, ele será considerado empresário, irregular, mas empresário com todas consequências negativas que isso pode implicar tais como: Obrigações profissionais do empresário Os empresários individuais possuem basicamente três obrigações fundamen- tais, para que suas atividades sejam legalmente amparadas: 1) dever de arquiva- mento de seus atos constitutivos na Junta Comercial; 2) dever de escrituração dos capítulo 1 • 32 livros empresariais obrigatórios e; 3) dever de levantar, periodicamente, o balanço patrimonial e de resultado econômico da empresa. • Dever de arquivamento de seus atos constitutivos na Junta Comercial A inscrição do empresário individual deve obrigatoriamente ser feita no Registro Público das Empresas Mercantis – CCB/02 – art. 967 c/c. art. 1.150. O requerimento deve ser dirigido à Junta Comercial contendo os requisitos do artigo 968, do Código Civil de 2002 c/c. lei 8.934/1994 c/c Dec 1.800/1996. Caso, o Empresário (Individual) tenha intenção de abrir uma sucursal, filial ou agência em lugar diverso, sujeito a jurisdição de outra Junta, será tomado o mesmo caminho anteriormente referido. Os documentos necessários para a realização do registro de uma empresa de- verão ser apresentados à Junta Comercial no prazo de 30 dias, contados da data da lavratura dos atos respectivos. Feito o registro dentro do prazo legal, os efeitos se operam ex tunc, retroagindo à data da lavratura – lei 8.934/1194 – art. 36. Não feito em prazo legal, os efeitos serão apenas ex nunc, correndo a partir do arquivamento feito pela Junta Comercial. Requerido o registro além desse prazo, ele somente produzirá efeito a partir da data de concessão e não da lavratura do ato constitutivo. • Dever de escrituração dos livros empresariais obrigatórios O Empresário (Individual) deverá também utilizar sistema de escrituração de livros, manual, mecanizado ou eletrônico – CCB/02 – art. 1.179. Os livros empresariais têm funções gerenciais (registro de dados para análise e avaliação); funções documentais (necessidade de demonstração ou prova dos resultados da empresa) e função fiscal (controle de incidência de tributos). ATENÇÃO A falta de escrituração pode produzir consequências motivadoras e consequências sancionatórias. • Consequência motivadora: a) impede acesso à recuperação judicial da empresa – lei 11.101/2005 – art. 51, §1o; b) ineficácia probatória dos livros CCB/02 – art. 226; • Consequência sancionatórias: a) presunção de veracidade de fatos alegados contra o em- presário – CPC/15 – art. 417; b) tipicidade de crime falimentar – lei 11.101/2005 – art. 178. capítulo 1 • 33 Exibição dos livros empresariais Em regra, o Empresário (Individual) tem direito ao sigilo dos livros – CRFB/1988 – art. 5o, XII c/c. CCB/02 – art. 1.190. Entretanto, há situações excepcionais em que a exibição pode ser exigida de forma parcial ou até mesmo exibição total: • A exibição parcial pode ser requerida: a) Por Juiz de direito (ex officio) – CPC/15 – art. 421. I. STF/SÚMULA no 260. O exame de livros comerciais, em ação judicial, fica limitado às transações entre os litigantes. II. STF/SÚMULA no 390. A exibição judicial de livros comerciais pode ser requerida como medida preventiva. b) Por agentes da Fazenda Pública – CCB/02 – art. 1.193 c/c. Código Tributário Nacional – art.113 c/c. art. 195 c/c. art. 196. c) Pelo fiscal do INSS – lei 8.212/1991 – art. 33, §1o I. SÚMULA no 439. Estão sujeitos à fiscalização tributária ou pre- videnciária quaisquer livros comerciais, limitado o exame aos pontos objeto da investigação. • A exibição total pode ser requerida: a) Por parte em processo judicial de liquidação, sucessão, comunhão ou sociedade, administração de bens alheios ou falência – CCB/02 – art. 1191 c/c. CPC/15 – art. 420. b) Por sócios ou administradores de sociedade empresária – CCB/02 – art. 1021. Eficácia probatória dos livros empresariais A produção dos dados nos livros empresariais decorre de atos unilaterais. Portanto é um documento unilateral. Assim, em nenhuma hipótese faz pro- va plena. A prova pode ser a favor do Empresário (Individual) se houver: • Regularidade na escrituração – CCB/02 – art. 226 c/c. art. 1.179 c/c. art. 1.180 c/c. 11.183; • Isonomia das partes litigantes. capítulo 1 • 34 A prova pode ser contra o Empresário (Individual) se não houver regularidade ou se a outra parte for hipossuficiente e teve direito à inversão do ônus da prova – CCB/02 – art. 226 c/c CPC/15 – art. 417. • Dever de levantar, periodicamente, o balanço patrimonial e de resultado econômico da empresa. O Empresário (Individual) também dispõe do dever de levantamento do ba- lanço patrimonial e de resultado econômico. Estes deverão ser feitos anualmente – CCB/02 – art. 1.179 c/c 1.180. No caso das sociedades anônimas, que distribuem dividendos a cada seis meses, o balanço deverá ser semestral – lei 4.595/1964 – art. 31. O balanço patrimonial serve para demonstrar a situação real da empresa, indi- cando seu ativo e passivo, ou seja, todos os bens. Já o de resultado acompanhará o de balanço patrimonial e constarão crédito e débito. Estas informações são de extrema importância, para que seja avaliada, anual- mente ou semestralmente, como a empresa está em relação a lucros, dividendos, bens etc. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, José Gabriel Assis de. A noção jurídica de empresa. Revista de Informação Legislativa, 143/212, ano 36, jul.-set. 1999. ASQUINI, Alberto. Perfis da empresa. Trad. Fábio Konder Comparato. Revista de Direito Mercantil, n. 104. BELL, D. O Advento da Sociedade Pós-Industrial. São Paulo: Cultrix. 1974. BORBA, José Edwaldo Tavares. Parecer ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas. 2003. Disponível em: <http://www.irtdpjbrasil.com.br/NEWSITE/pareceborba.htm>. Acesso em: 21 jul. 2017. COASE, Ronald. The nature of the firm. Economica. New Series, v. 4. n. 16. p. 386-405, nov. 1937. CONTRERA, Flávio. O conceito de interesse nacional: debate teórico e metodológico nas relações internacionais (UFSCar). 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Trad. Cesar Siliò Belena. Madrid: Reus, 1932. v. I. capítulo 1 • 36 Empresa Individual de Responsabilidade Limitada - (EIRELI) e Estabelecimento 2 capítulo 2 • 38 Empresa Individual de ResponsabilidadeLimitada - (EIRELI) e Estabelecimento Introdução O ambiente jurídico e econômico no Brasil sempre conviveu com a necessi- dade de implementar mecanismos que, ao mesmo tempo, proporcionam segu- rança e simplicidade aos agentes econômicos. Em momento propício, a matéria relativa à limitação patrimonial do empresário individual deu margem a criação da Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) instituído pela Lei nº 12.441/2011. Entretanto, a necessidade de limitação da responsabilidade patrimonial para o empresário individual ainda é um fato, pois, apesar de sua presença em vários países, observa-se que tanto os doutrinadores quanto legisladores brasileiros, não conseguiram distinguir a limitação da responsabilidade do empresário individual do conceito de sociedade e seus sócios. Desse modo, embora haja certa acomodação, ainda se faz necessária a criação de um meio técnico que permita ao empresário individual a prática de suas ati- vidades afastado da responsabilidade patrimonial ilimitada, que até o momento norteia esse exercício. A atividade econômica empresarial é o principal fator impulsionador do de- senvolvimento sócio-econômico, mas, a exploração de uma atividade econômica organizada sempre envolve risco de insucesso, seja para os sócios de uma sociedade empresária, seja para o empresário individual. No que concerne ao empresário individual, entretanto, que está mais exposto, uma vez que responde com todos os seus bens disponíveis perante os credores vinculados ao exercício da sua atividade econômica, o risco é sempre mais elevado. Por outro lado, é sabido que os empresários e as sociedades empresárias, ao exercerem a atividade empresarial, organizam um conjunto de bens instrumen- tais voltados à obtenção de bens destinados à satisfação de necessidades alheias, e este conjunto de bens instrumentais, por sua orientação teleológica, assume um significado técnico e econômico distinto dos bens individuais que o compõem. A reunião destes bens constitui o conceito de estabelecimento empresarial como sendo "todo complexo de bens organizados, para o exercício da empresa, por em- presário ou sociedade empresária" (ccb/02 - art. 1142 ). Assim, o estabelecimento empresarial assume uma significação econômica superior ao da soma dos bens capítulo 2 • 39 individuais que o compõem, de modo que há a necessidade de que a lei assegure normas aptas a disciplinar esta realidade e as consequências em caso de alienação, pois neste caso deve-se identificar qual é o bem que se pretende transferir. OBJETIVOS Neste capítulo, você vai ter oportunidade de estudar A empresa individual de responsabi- lidade limitada - EIRELI, seu conceito, natureza jurídica, características, titularidade, patrimô- nio e suas responsabilidades, bem como terá oportunidade de estudar também o conceito, natureza e efeitos da negociação do estabelecimento empresarial. Empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI) A limitação da responsabilidade do empresário individual O Empresário (Individual), como você já estudou, é um agente econômico que, no exercício da atividade econômica se coloca em inúmeras relações jurí- dicas: no contrato de trabalho com seus funcionários, nos contratos com seus fornecedores, nas relações de consumo e nas relações tributárias. Como já visto, a Responsabilidade do Empresário (Individual) é ilimitada – CCB/02 – art. 391 c/c CPC/15 – art. 789. Em caso de inadimplemento inescusável de suas obriga- ções responde o Empresário (Individual) com todos os seus bens disponíveis, res- salvadas as exceções legais – CCB/02 – art. 1.711 a art. 1.722 c/c. lei 8.009/1990 c/c. CPC/15 – art. 833. Dentre os vários riscos que a atividade econômica já enseja no Brasil, o risco de perder todos os bens angariados por toda uma vida acaba sendo mais um dado desencorajador da livre iniciativa empresarial, o que inibe o desenvolvimento na- cional – CRFB/1988 – art. 1o, IV c/c art. 3o, II c/c art. 170. Diante desse cenário é que a limitação da responsabilidade do empresário passou a ser assunto recorrente na história recente do direito empresarial. A pos- sibilidade de evitar que o patrimônio pessoal ou familiar do empreendedor fique sujeito aos riscos dos negócios influenciou as diversas hipóteses de limitação de responsabilidade dos sócios nas estruturas societárias. Faltava apenas um meca- nismo de limitação da Responsabilidade do Empresário (Individual). Esta lacuna veio a ser preenchida com a lei 12.441/2011 que inseriu o art. 980-A no Código Civil Brasileiro de 2002. capítulo 2 • 40 Conceito de empresa individual de responsabilidade limitada no Brasil – EIRELI1 A empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI) é conceitua- da pelo próprio Código Civil Brasileiro de 2002 afirmando que a mesa deve ser constituída por uma única pessoa, titular da totalidade do capital, devidamente integralizado, não inferior a 100 vezes o maior salário mínimo vigente no País. – CCB/02 – art. 980-A. Natureza jurídica A EIRELI identifica-se como pessoa jurídica de direito privado voltada ao exercício de atividade econômica com titular e patrimônio próprio (CCB/02 – art. 44, VI, c/c art. 980-A). Características e distinções A partir do conceito e de sua natureza jurídica torna-se possível traçar algumas características do instituto. (GONÇALVES NETO, p. 153-180) • A primeira característica é que a EIRELI não se confunde com Empresário (Individual), pois o empresário identifica-se como pessoa físi- ca (natural) com Responsabilidade ilimitada (CCB/02 – art. 391) e a EIRELI é uma pessoa jurídica (CCB/02 – art. 44,VI) cuja pessoa que a constitui tem Responsabilidade limitada (CCB/02 – art. 980-A). Ainda que não seja Empresário (Individual), devem ser exigidos os requisitos (CCB/02 – art. 972) da figura do empresário para a pessoa física (natural) que queira constituir a EIRELI tendo em vista que ela (pessoa jurídica) age pelos atos dele (criador). • A segunda característica da EIRELI é que esta não se confunde com so- ciedade empresária. Isso pode ser afirmado pelo fato de que o CCB/02 – em seu art. 44 faz expressa distinção entre as sociedades (CCB/02 – art. 44, II) e a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI – CCB/02 – art. 44, VI). Esta distinção pode ser percebida pelo fato de que as sociedades, em regra, exigem a presença de pelo menos dois sócios (CCB/02 – art. 981) e a EIRELI é constituída por apenas uma pessoa (CCB/02 – art. 980-A) e assim pode permanecer por prazo 1 Pronúncia correta: Apesar de a sigla Eireli ser comumente pronunciada com ênfase na letra "e" ("Ei-ré-li"), a forma correta foneticamente deve destacar a letra "i" (Ei-re-lí), já que palavras terminadas em "i" ou "u" compondo sílaba com outra letra são oxítonas. capítulo 2 • 41 indeterminado. Desta distinção é possível afastar qualquer concepção de que a EIRELI seja sociedade unipessoal. • O ato constitutivo da EIRELI identifica-se como uma declaração uni- lateral de vontade. Assim, é espécie do gênero dos negócios jurídicos unilaterais. Afasta-se, portanto, da ideia de contrato (unilateral, bilateral ou plurilateral). • A limitação da responsabilidade patrimonial do titular do capital atri- buído aos negócios realizados pela empresa exercida pela pessoa jurídica. Trata-se de inovação no direito brasileiro, pois a limitação da responsabilidade pelas obri- gações decorrentes de uma atividade econômica só era atribuída apenas aos sócios de determinadas pessoas jurídicas. • Quem realiza a atividade econômica é a pessoa jurídica, pois a pessoa que cria a EIRELI não pratica pessoalmente nenhum ato concernente aos fins da em- presa, mas o faz como se fora ela, na qualidade de ser humano que exterioriza a vontade da pessoa jurídica. • Outra característica destacável encontra-se na EXIGÊNCIA DE UM CAPITAL MÍNIMO. Neste ponto, pouco importa a atividade econômica exer- cida pela pessoa jurídica e a forma do ato de sua constituição. Como nãohá “só- cios”, o capital deixa de ser fracionado em cotas ou ações, para consolidar-se como um todo indiviso. • A EIRELI não se confunde com um patrimônio de afetação. Este carac- teriza-se como um conjunto de bens (patrimônio separado), porém inserido no patrimônio de um mesmo sujeito de direito, submetido a um regime jurídico pró- prio, diferente do regime jurídico que incide sobre o restante do patrimônio dessa mesma pessoa. Ocorre que o legislador atribuiu personalidade jurídica (CCB/02 – art. 44, VI c/c art. 45) a esse novo sujeito (EIRELI), não há como enquadrá-la assim. • A EIRELI não se confunde com fundação. Embora ambas as hipóteses sejam pessoa jurídica de direito privado (CCB/02 – art. 44, III e VI) passível de atribuição de direitos e obrigações (personalização – CCB/02 – art. 45), há várias diferenças entre elas: a) Fundação deve ter finalidade não econômica (CCB/02 – art. 62) enquanto a EIRELI pode ser constituída com fim lucrativo empresarial (CCB/02 – art. 980-A, caput c/c §5o). b) Além disso, uma vez criada a fundação, esta destaca-se da pessoa do fundador, ao passo que a EIRELI permanece sempre vinculada ao criador. capítulo 2 • 42 c) Do mesmo modo, o patrimônio da fundação desprende-se totalmente da pessoa do instituidor, sem qualquer contrapartida, ao passo que o da- quela, conquanto autônomo, mantém-se vinculado à pessoa que for titular do seu capital. d) A dissolução da EIRELI pode ser determinada a qualquer tempo pelo titular do seu capital, retornando os bens remanescentes ao patrimônio do criador ou, por seu falecimento, incorporando-se ao de seus herdeiros. Diversamente ocorre na fundação, em que a dissolução se dá sem partici- pação do instituidor, mesmo em caso de morte deste em que também não afeta a pessoa jurídica (fundação), e os bens dela, em regra, migram para entidade de fins iguais ou semelhantes (salvo cláusula em contrário). • A EIRELI não se confunde com estabelecimento empresarial. Como já afirmado a EIRELI é pessoa jurídica de direito privado (CCB/02 – art. 44, VI). Portanto é passível de ser sujeito titular de direito e obrigações (CCB/02 – art. 45). O estabelecimento por sua vez caracteriza-se como um con- junto (complexo) de bens materiais ou imateriais utilizados pelo Empresário (Individual), sociedade empresária ou pela própria EIRELI para o exercício da empresa (CCB/02 – art. 1.142). Dessa forma, não se pode falar em transferência onerosa da EIRELI como se esta fosse objeto de trespasse (CCB/02 – art. 1.145 c/c art. 1.146). O que pode ocorrer e a pessoa jurídica da EIRELI negociar o seu próprio estabelecimento, dispondo livremente de seus bens, inclusive da totali- dade deles, dá-los em usufruto ou onerá-los. Neste caso a EIRELI, figura como parte na relação jurídica que o tenha o estabelecimento como objeto, ressalvada a hipótese de a EIRELI alienar o próprio estabelecimento para o titular e criador do seu capital, sendo a EIRELI sujeito ativo ou passivo de uma relação jurídica da qual participe em polo oposto o seu criador. Esta vedação se dá porque quem ma- nifesta a vontade da EIRELI é seu próprio do criador da empresa – o que elimina a caráter intersubjetivo da relação. O titular do capital da empresa individual de responsabilidade limitada O capital da EIRELI pode, desde março de 2017, ser constituído por qual- quer pessoa: pessoa física (natural) ou pessoa jurídica. A norma (CCB/02 – art. 980-A) não identifica se a constituição de EIRELI possa ser feita pessoa física (natural) ou pessoa jurídica que se dedique ao exercício de atividade própria de empresário ou por sociedade empresária. capítulo 2 • 43 Ainda que se deva considerar que o instituto tenha sido pensado e concebi- do com o fim de proteger a atividade econômica e o patrimônio do Empresário (Individual) para reduzir os riscos do seu negócio (a deve-se ponderar que no projeto de lei original, que deu origem à lei 12.441/2011 (PL 4.605/2009), a redação original, propunha a criação da empresa individual constituída “por um único sócio, pessoa natural”. Entretanto, tal redação foi modificada (sem motiva- ção), para “por uma única pessoa”, ou seja, a expressão “natural” foi intencional- mente retirada. A IN 117/2011 – DNRC (Departamento Nacional de Registro do Comércio), à época, baixou o Manual de Atos de Registro de Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, no qual admitia a possibilidade da EIRELI ser constituída por pessoa jurídica, mas, posteriormente, republicou a referida nor- mativa para vedar essa alternativa. Ocorre que o DNRC foi substituído pelo DREI (Departamento de Registro Empresarial e Integração) ligado à Secretaria Especial da Micro e Pequena Empresa que, a partir de março de 2017, em sua Instrução Normativa no 38/2017, passou a admitir, que pessoa jurídica constitua EIRELI (DREI – IN no 38/2017 – Anexo V – item 1.2.5. alínea C). Muito provavelmente esta mudança de orientação tenha se dado pela força da norma constitucional que determina que ninguém pode deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (CRFB/1988 – art. 5o, II). Se a lei (CCB/02 – art. 980-A) não proíbe a constituição de EIRELI por pessoa jurídica, não seria cabível um ato administrativo (instrução normativa) extrapolar seus limites normativos e impor tal proibição. Responsabilidade do titular do capital O criador da EIRELI somente terá direito à Responsabilidade limitada se atendidas as regras estabelecidas para sua regular constituição e que seu capital esteja totalmente integralizado no momento em que o ato constitutivo for levado a registro perante a Junta Comercial. Caso haja irregularidade na sua constituição não se pode falar em produção dos efeitos de limitação da responsabilidade de seu criador. Dessa forma, cabe à Junta Comercial local aferir a presença dos requisitos da constituição da EIRELI (CCB/02 – art. 1153). capítulo 2 • 44 Assim, os efeitos desejados pelo criador não serão produzidos se, por exemplo: • Houver realização parcial do capital.; • Se houver promessa de integralização futura representada por título de crédito; • No caso de integralização com um bem de valor real inferior ao do que for estimado pelo titular; • Se o titular do capital, na condução dos negócios da empresa, desviar-se dos fins a que ela se propõe ou praticar alguma ilegalidade; • Se não mantiver perfeita separação entre o seu patrimônio e o da empresa por ele criada - hipótese que conduz à desconsideração da personalidade jurídica (CCB/02 – art. 50); • Se o titular do capital atua fora dos padrões de conduta que a lei exige do administrador, o que acarreta sua obrigação pessoal (CCB/02 – art. 980-A, §6o c/c. art. 1.053 c/c art. 1.011 c/c. art. 1.016); • O não recolhimento das contribuições previdenciárias retidas dos empregados. Modo de constituição A constituição da EIRELI deve se dar por meio de uma declaração unilateral de vontade, firmada pelo seu criador, em instrumento público ou particular, no qual devem estar presentes as exigências regulamentares constantes do Manual dos Atos de Registro, aprovado pela já noticiada DREI – IN no 38/2017 – Anexo V. Após a inscrição do ato constitutivo na Junta Comercial, a EIRELI adquire perso- nalidade jurídica – CCB/02 – arts. 44 e 45. Nome empresarial A EIRELI deve ser identificada por seu nome empresarial. Este nome pode ser uma firma como uma denominação, à semelhança das sociedades limitadas (CCB/02 – art. 980-A, §1o c/c §6o). Para distingui-la do empresário e da socie- dade empresária, a lei determina que seja acrescida a expressão “Eireli” no final do nome que for a ela atribuído. A eventual omissão da sigla “Eireli” na firma ou denominação implica perda da limitação da responsabilidade da pessoa física que a gerou. (CCB/02 – art. 1.158, §3o) capítulo 2 • 45 Objeto A atividade econômica da EIRELI tem de figurar de forma precisa e completa no ato constitutivo. Deve-se destacar que é recomendável que se adote um ramo da atividade
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