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A in constitucionalidade do toque de recolher para crianças e adolescentes

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UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA 
CURSO DE DIREITO 
 
 
 
 
JESSIKA KARLA HOPPE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO TOQUE DE RECOLHER PARA CRIANÇAS E 
ADOLESCENTES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
São Miguel do Oeste - SC 
2014 
 
 
1 
 
JESSIKA KARLA HOPPE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO TOQUE DE RECOLHER PARA CRIANÇAS E 
ADOLESCENTES 
 
 
 
Pesquisa de TCC II, apresentada ao Curso de Direito, Área 
das Ciências Sociais Aplicadas da Universidade do Oeste 
de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção de 
grau de Bacharel em Direito. 
 
 
 
 
Orientador: Prof. Edenilza Gobbo 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
São Miguel do Oeste - SC 
2014 
 
2 
 
TERMO DE APROVAÇÃO 
 
 
 
JESSIKA KARLA HOPPE 
 
 
 
 
 
A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO TOQUE DE RECOLHER PARA CRIANÇAS E 
ADOLESCENTES 
 
 
Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel no 
Curso de Graduação em Direito, Universidade do Oeste de Santa Catarina, – 
UNOESC, pela seguinte banca examinadora: 
 
 
 
 
Orientador: Prof. Edenilza Gobbo. 
Direito, Universidade do Oeste de Santa Catarina – campus de 
São Miguel do Oeste. 
 
 
 
 
 
Membros: ______________________________________________ 
 
 
 ______________________________________________ 
 
 
São Miguel do Oeste, 23 de setembro de 2014. 
 
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Dedico à minha família que me apóia 
e me ajuda em todas as 
circunstâncias, e em qualquer hora. 
Aos meus amigos que de alguma 
forma me apoiaram nessa etapa da 
minha vida 
 
4 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 Em primeiro lugar, agradeço a Deus que esteve e está comigo, tanto nas horas 
boas e difíceis, me iluminando nos vários momentos que passei para desenvolver 
esse trabalho, e agradeço, também, por ser privilegiada tendo essa oportunidade de 
estar concluindo mais esse desafio. 
 Aos meus pais Claídes Marli Watte e Neori Hoppe, que estiveram diretamente 
e indiretamente neste desafio. Aos amigos e colegas que sempre tiveram me 
incentivando nos momentos mais difíceis. 
 Em especial, minha professora e orientadora Edenilza Gobbo pelas sábias 
palavras, pela paciência, conselhos, informações e orientações nesse processo,e a 
todos os professores, que foram instrumentos de mediação para nosso 
conhecimento. 
 A todos aqueles que de alguma forma contribuíram para a realização de mais 
este sonho. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
RESUMO 
 
A Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n° 
8.069/90) adotaram a Doutrina da Proteção Integral em consonância com os 
tratados internacionais sobre a infância e juventude. Preceitua a Carta Magna em 
seu artigo 227 que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar com 
prioridade absoluta todos os direitos garantidos constitucionalmente às crianças e 
adolescentes. Desta feita, caso a família falhe com o cumprimento dos deveres 
inerentes ao poder familiar, obedecendo ao princípio constitucional da cooperação 
cabe à sociedade e ao Estado agir para que sejam assegurados os direitos 
garantidos às crianças e adolescentes. Atualmente, constata-se que em algumas 
cidades existem um grande número de crianças e adolescentes expostas a 
situações de risco por omissão ou negligência da família, diante desta situação fática 
é que nestas cidades o Poder Judiciário têm instaurado medidas protetivas 
mediante portarias judiciais que restringem os horários e locais em que crianças e 
adolescentes possam frequentar, visando salvaguardá-las das situações de risco. 
Tal medida ficou conhecida pela alcunha de “Toque de Recolher”, e sua aplicação 
gerou grande discussão entre os estudiosos do direito a respeito de sua 
constitucionalidade. Diante deste impasse no mundo jurídico é que se procura neste 
trabalho efetuar alguns apontamentos sobre a constitucionalidade da medida. A 
pesquisa será bibliográfica buscando dados e informações disponíveis em 
publicações de livros, teses, artigos e na internet em sites especializados. A linha de 
raciocínio e abordagem para o desenvolvimento da seguinte pesquisa terá como 
fundamento o método hipotético-dedutivo. Quanto à metodologia, o levantamento 
dos dados será por meio de consultas a doutrinas, artigos científicos, pesquisas, 
monografias, jurisprudências, periódicos, sites e demais instrumentos autorizados. 
 
Palavras-chave: Toque de recolher, Estatuto da Criança e Adolescente, Proteção 
integral. 
 
 
 
 
 
6 
 
ABSTRACT 
 
The Federal Constitution of 1988 and the Statute of Children and Adolescents (Law 
No. 8069/90) have adopted the Doctrine of Integral Protection in line with 
international treaties on children and youth. The Constitution stipulates in its article 
227 that it is the duty of the family, society and the State to ensure with absolute 
priority all constitutionally guaranteed rights to children and adolescents. This time, if 
the family fails to fulfill the duties attached to parental authority, obeying the 
constitutional principle of cooperation rests with the society and the state act so that 
the rights guaranteed to children and adolescents rights are ensured. Currently, it 
appears that in some cities there are a large number of children and adolescents 
exposed to situations of risk or negligence by the family before this factual situation is 
that these cities have established the Judiciary protective measures by court rulings 
that restrict the times and locations where children and adolescents can attend, 
aiming to safeguard them from risky situations. This measure became known by the 
nickname "Curfew", and its application generated considerable discussion among 
legal scholars as to its constitutionality. Faced with this impasse in the legal world is 
that this paper seeks to make some notes about the constitutionality of the measure. 
The research literature is seeking data and information available in publications of 
books, theses, articles and online at specialized sites. The line of reasoning and 
approach to the development of the following research will ground the hypothetical-
deductive method. Regarding the methodology, the data collection serápor through 
consultations doctrines, scientific articles, research monographs, jurisprudence, 
periodicals, websites and other approved instruments. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................ 10 
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA SOBRE OS DIREITOS E DEVERES DA 
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ........................................................... 10 
2.1 NA ANTIGUIDADE ................................................................................... 10 
2.2 NO BRASIL .............................................................................................. 12 
2.3 CÓDIGO DE MELLO MATTO .................................................................. 16 
2.4 CÓDIGO DE MENORES .......................................................................... 18 
2.4 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE .................................. 20 
3 O DIREITO FUNDAMENTAL A LIBERDADE DA CRIANÇA E DO 
ADOLESCENTE ......................................................................................22 
3.1 DIREITOS FUNDAMENTAIS ................................................................... 22 
3.2 DIREITO FUNDAMENTAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ........... 25 
3.3 DIREITO FUNDAMENTAL A LIBERDADE .............................................. 27 
3.4 TOLHIMENTO A LIBERDADE DO ADOLESCENTE ............................... 29 
3.4.1 Flagrante de ato infracional ................................................................... 30 
3.4.2 Internação ............................................................................................... 31 
3.4.3 Semiliberdade ......................................................................................... 33 
4 (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO TOQUE DE RECOLHER PARA 
CRIANÇAS E ADOLESCENTES ............................................................. 35 
4.1 CONTEXTUALIZANDO TOQUE DE RECOLHER ................................... 35 
4.2 TOQUE DE RECOLHER: MEDIDA PROTETIVA OU RESTRITIVA? ...... 36 
4.3 (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO TOQUE DE RECOLHER PARA 
CRIANÇAS E ADOLESCENTES .............................................................. 38 
5 CONCLUSÃO ......................................................................................... 45 
 REFERÊNCIAS ....................................................................................... 47 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
 No presente trabalho de conclusão de curso será abordado o assunto sobre a 
(in)constitucionalidade do toque de recolher para as crianças e adolescentes que 
vem sendo decretado por Juízes da Vara da infância nos municípios brasileiros. 
 Os Magistrados municipais, em nome da segurança pública e proteção das 
crianças e adolescentes, fazem ou pretendem fazer normas que disciplinam os 
períodos em que crianças e adolescentes podem transitar e/ou permanecer sozinhas 
nas ruas das cidades. 
 O trabalho tem a intenção de demonstrar se é possível impor o recolhimento 
obrigatório, uma vez que a medida estaria afetando diretamente determinadas 
liberdades individuais que estão protegidas na Constituição Federal. 
 O tema desta monografia mostra-se relevante na medida em que trata da 
aplicação de normas de privação de liberdade em um país livre e democrático, 
trazendo a discussão não apenas no meio jurídico, mas também social. 
 O presente trabalho apresentará três capítulos, os quase de interligam, pois 
cada um terá a intenção de mostrar a evolução dos direitos da criança e do 
adolescente ao longo do tempo. 
 O primeiro capitulo, trará a evolução histórica dos direitos e deveres da criança 
e do adolescente no decorrer dos séculos. Fazendo uma análise do Código Criminal 
do Império, sendo que nessa época é visível o desleixo do Estado perante as 
crianças e adolescente. Já com o Juízo Privativo de Menores, criado pelo jurista 
legislador Mello Mattos, dá-se um início a um novo período que se caracteriza pela 
ação social do Juizado de Menores. Mais tarde, já em 1979, surge o Código de 
Menores, sendo que se dá o estabelecimento da doutrina da situação irregular. 
Somente em 1990, com a Lei n. 8.069/90 cria-se o Estatuto da Criança e do 
Adolescente, aparecendo com o marco ao conceber a proteção integral à criança e 
ao adolescente, assim conhecida como Doutrina da Proteção Integral. 
 Dando sequência, o segundo capitulo apresenta os direitos fundamentais de 
todos os brasileiros, e também os estrangeiros residentes ou de passagem pelo 
território brasileiro, garantidos pela Constituição Federal, fazendo uma abordagem 
mais específica ao direito fundamental à liberdade das crianças e adolescentes. 
Também será abordado em quais situações é permitido o tolhimento da liberdade 
para os adolescentes, já que tal medida não é imposta para as crianças. 
 
9 
 
 O terceiro capítulo apresenta a contextualização do toque de recolher, os 
argumentos e fundamentações dos juízes no sentido de legitimar ou não a 
instituição das restrições impostas a criança e adolescente, fazendo também uma 
análise se tal medida é protetiva ou restritiva de direitos. 
 Desse modo, faz-se necessário um aprofundamento para saber se realmente 
essas novas determinações estão ou não de acordo com a construção jurídica atual, 
respeitando a democracia imposta há mais de vinte anos no país. 
 Com os aspectos apresentados nesses três capítulos, chegar-se-á a uma 
conclusão sobre a (in)constitucionalidade do toque de recolher para crianças e 
adolescentes. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
10 
 
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA SOBRE OS DIREITOS E DEVERES DA CRIANÇA E 
DO ADOLESCENTE 
 
 Nesse primeiro capitulo será abordado a evolução histórica dos direitos e 
deveres da criança e adolescente no decorrer dos séculos, iniciando-se nas antigas 
civilizações, perpassando pelo ordenamento jurídico brasileiro, com destaque para o 
Código Criminal do Império que rezava em seu artigo 10 que os menores de 
quatorze anos com discernimento deveriam ser encerrados em uma Casa de 
Correção, caso cometessem algum crime. 
 O texto abordará ainda a criação dos Juizados de Menores, pelo jurista Mello 
Mattos, que institucionalizou o dever do Estado em assistir os menores que, em face 
do estado de carência de suas famílias, tornavam-se dependentes da ajuda do 
mesmo. Apesar dos esforços de Mello Mattos, estes tiveram como uma barreira 
praticamente instransponível, em virtude da política da época, a falta de recursos e 
autonomia para a manutenção dos institutos já existentes. 
 Com o fracasso do Código de Mello Mattos, em 1979 cria-se o Código de 
Menores, também conhecido por ter instituído a doutrina da situação irregular. Tal lei 
de menores cuidava somente do conflito instalado e não da prevenção. 
 Assim, em 1990, com a Lei. 8.069, foi promulgado o Estatuto da Criança e do 
Adolescente, cuja função visa regulamentas e dar efetividade aos dispositivos 
constitucionais. O Estatuto reafirmou a doutrina da proteção integral adotada pela 
Constituição Federal, sendo que a criança é reconhecida como sujeitos de direitos, 
revogando a doutrina de situação irregular. 
 
2.1 NA ANTIGUIDADE 
 
 Nas antigas civilizações os laços familiares eram estabelecidos pelo culto à 
religião e não pelas relações afetivas ou consangüíneas. A religião não formava a 
família, mas ditava suas regras, estabelecia o direito. Juridicamente a sociedade 
familiar era uma associação religiosa e não uma associação natural. 
 Na família o pai tinha poder absolutos sobre seus filhos. Segundo Berti (1999 p. 
26) “Para que a autoridade paterna fosse observada, o pai detinha em suas mãos 
amplos e irrestritos direitos sobre a família, e mais ainda sobre a figura dos filhos”. 
 
11 
 
 Os filhos enquanto estivessem na casa do pai mantinham-se sobre a 
autoridade do pai, independentemente da maioridade, já que naquela época, não se 
distinguiam maiores de menores. O pai exercia um direito prioritário, pois os filhos 
não eram sujeitos de direitos, mas sim objeto de relações jurídicas. Assim, era-lhe 
conferido o poder de decidir, inclusive, sobre a vida ou morte dos filhos (AMIN, 
2007). 
 Em Esparta, o pai transferia o poder sobre a vida e criação dos filhos para o 
Estado, para que este preparasse novos guerreiros. As crianças eram, portanto, 
“patrimônio” do Estado. No Oriente era comum o sacrifício religioso de crianças, em 
razão de sua pureza. Além disso, era comum, entre os antigos, sacrificar as crianças 
doentes, deficientes, malformadas, jogando-as de despenhadeiros, já que para eles 
essas crianças eram consideradas como um peso morto para a sociedade (AMIN, 
2007).O povo hebreu, sendo uma rara exceção, não admitiam o aborto nem o 
sacrifício dos próprios filhos, no entanto, era permitida a venda dos filhos na 
qualidade de escravos, com o objetivo de atenuar a pobreza (BERTI, 1999). 
 Já na idade média, o período foi marcado pelo crescimento da religião cristã 
com seu grande poder de influência sobre os sistemas jurídicos da época. 
Conforme explica Amin (2007, p. 03): 
 
O Cristianismo trouxe uma grande contribuição para o início do 
reconhecimento de direitos para as crianças, pois pregou o direito à 
dignidade para todos, inclusive para os menores. Ademais, atenuou a 
severidade de tratamento na relação pai e filho, pregando o dever de 
respeito, aplicação prática do quarto mandamento de honrar pai e mãe. 
 
 Através de diversos Concílios a Igreja foi outorgando certa proteção aos 
menores prevendo e aplicando penas corporais e espirituais para os pais que 
abandonavam ou expunham os filhos. Por outro lado, os filhos nascidos fora do 
casamento, eram discriminados, pois indiretamente atentavam contra a instituição 
sagrada. 
 Conforme Amin (2007, p. 4): “[…] a filiação natural ou ilegítima - filhos espúrios, 
adulterinos ou sacrílegos - deveria permanecer à margem do Direito, já que era a 
prova viva da violação do modelo moral determinado à época.” 
2.2 NO BRASIL 
 
12 
 
 A história das crianças e adolescentes no Brasil não é muito diferente, já que 
mesmo sendo descoberto em 1500, somente começou a ser povoado em 1530. 
Sendo que, além de muitos homens e escassas mulheres, crianças também 
estiveram presentes nas embarcações. As crianças somente subiam a bordo na 
condição de grumetes ou pagens, como órfãs do Rei enviadas ao Brasil para se 
casarem com os súditos da Coroa, ou como passageiros embarcados em 
companhia dos pais ou de algum parente. (DEL PRIORI, 2007) 
 A presença de mulheres era rara, e muitas vezes proibida a bordo. Grumetes e 
pagens eram obrigados a aceitar abusos sexuais de marujos. Crianças, mesmo 
acompanhadas dos pais, eram violadas por pedófilos e as órfãs tinham que ser 
guardadas e vigiadas cuidadosamente a fim de manter-se virgens, pelo menos, até 
que chegassem à Colônia. (DEL PRIORI, 2007) 
 As crianças eram consideradas como pouco mais que animais, cuja força de 
trabalho deveria ser aproveitada ao máximo enquanto durassem suas curtas vidas. 
Eram recrutados meninos entre nove e dezesseis anos, e não rara as vezes com 
menos idade, para servir como grumetes nas embarcações, já que faltava mão de 
obra de adultos. (DEL PRIORI, 2007) 
 Para os pais dessas crianças que eram alistadas para trabalhar nos navios, 
eram sempre um bom negócio, já que aumentava a renda da família e livravam-se 
de uma boca para alimentar. 
 Para recrutamento, além dessas crianças que eram compradas, também eram 
raptadas crianças judias. Este método significava, simultaneamente, um meio de 
obter mão de obra e de manter sob controle o crescimento da população judaica em 
Portugal. 
 Acrescenta ainda Del Priori (2007, p. 22): 
 
Estas, ao contrário das recrutadas entre as crianças carentes portuguesas, 
eram jogadas nos navios à revelia de seus pais e representavam para estes 
uma grande perda afetiva. As implicações economias eram descartadas, 
pois maioria esmagadora dos judeus era possuidora de recursos para 
sobreviver, prescindindo do expediente de vender a mão de obra de seus 
filhos. 
 
 No período do século XVIII, ocorreu vários nascimentos de filhos de brancos 
com pessoas de outra etnia, tornando o grupo de mestiços e mulatos o mais 
numeroso dos habitantes. Estas crianças foram chamadas de cabra, mestiço, 
13 
 
mulatos, pardo etc., mas “gente de cor” era o nome que se via nos documentos do 
período. Com quinze anos já se considerava adulto, mulheres com doze anos já 
poderiam se casar. Os escravos mais valiosos e apreciados era aquele que tinha 
entre quinze e vinte e quatro anos, os de idade inferior recebia o nome de muleque. 
(DEL PRIORI) 
 As crianças que chegavam dos navios negreiros eram muito magras, cheias de 
sarna, problemas de pele e outras moléstias e ficavam sujeitas a tratamentos 
horríveis para poder enfrentar e bem impressionar seus compradores. 
 Explica Del Priori (2007, p. 115) que “Para os donos, a maior serventia das 
crianças nascidas no lugar era o fato de tornar possível a existência de uma ama de 
leite para alimentar seus filhos, sendo que não havia necessidade de sobreviver o 
filho da escrava”. Portanto, a vida das crianças escravas pouco valorizada. A própria 
escrava nem sempre desejava o nascimento de um filho no cativeiro e usava método 
para impedir ou abortar uma concepção. 
 Os crimes cometidos por menores nessa época eram muitos diversos dos 
cometidos por adultos, sendo 40% das prisões de menores foram motivadas por 
desordens, 20% por vadiagens, 17% por embriaguez e 16% por furto ou roubo. (DEL 
PRIORI, 2007) 
 O Código do Império rezava, em seu artigo 10 que os menores de quatorze 
anos não consideravam-se criminosos, mas estabelecia que aqueles menores de 
quatorze que cometeram crime com discernimento deveriam ser encerrados em uma 
casa de correção. 
 O Estado brasileiro começou a legislar sobre a criança após sua independência 
política quando, na Constituinte de 1823, José Bonifácio apresentou um projeto em 
prol do menor escravo. Tal projeto apresentado não visava uma preocupação com 
os direitos humanos da criança escrava, mas sim revelava uma preocupação com a 
manutenção da mão de obra.(VERONESE, 1999) 
 A partir de 1860, a questão de escravidão no Brasil começou a impressionar a 
intelectualidade nacional, sendo que em 1862 o Senado aprovou a lei de autoria de 
Silveira da Mota, que estabelecia entre outras medidas a proibição de venda de 
escravos sob pregão e exposição pública, bem como a proibição de, em qualquer 
venda, separar o filho do pai e o marido da mulher. (VERONESE, 1999) 
 Em 28 de setembro de 1871 foi aprovada a Lei n. 2.040, chamada de Lei do 
Ventre Livre ou Lei Rio Branco, que concedia liberdade às crianças nascidas de 
14 
 
mães escravas, tendo por objetivo a paulatina extinção da escravidão infantil. 
Explica Veronese (1999, p. 12): 
 
[…] o menor deveria permanecer sob autoridade do senhor (proprietário de 
escravos) e de sua mãe, que juntos deveriam educá-lo até a idade de 8 
anos. Atingida esta idade, o proprietário da mãe escrava teria duas opções: 
poderia receber do Estado, a 6%, no prazo de trinta anos ou se utilizar dos 
serviços do menor até que este completasse 21 anos. Quase sempre o 
senhor preferia ficar com a criança negra, uma vez que a Lei não 
determinava o número de horas de trabalho, o regime sanitário ou a 
alimentação que deveriam receber estes “escravos livres”. Na verdade isto 
constituía uma nova modalidade de escravidão. 
 
 Se o senhor optasse pela indenização, o menor passaria para o Governo que, 
geralmente, o colocava numa instituição de caridade, a qual também o exploraria, 
fazendo-o trabalhar até os 21 anos de idade, sendo que a criança era separada da 
mãe e de sua comunidade, perdendo sua identidade familiar. 
 Contudo, a Lei do Ventre Livre fracassou no sentido de que não conseguiu 
garantir ao ingênuo uma vida diferente a do escravo, pois continuava numa condição 
de servidão, sem as condições mínimas de higiene, alimentação e educação 
necessárias a qualquer ser humano. (VERONESE, 1999) 
 Com o fim da escravatura em 1888, com a Lei Aurea, deu-se entrada de 
imigrantes em larga escala, sendo que muitos destes sonhavam encontrar aqui um 
país próspero, no entanto quando tais imigrantes chagaram, constataram uma 
diferente realidade, concretizada por fatores como doenças e pragas nas lavouras.Apesar dessa áspera realidade, esse novo modo de produção econômica, que 
agora era baseado no trabalho assalariado, estimulou o primeiro grande surto de 
urbanização, sendo que com isso houve um gradativo e acentuado abandono de 
crianças pelas ruas ou nas portas das casas. (VERONESE, 1999) 
 Com o fim de recolher crianças abandonas e rejeitadas pelos pais, surgiu em 
São Paulo, em 1896, a Casa dos Expostos. Mas devido à escassez de recursos 
materiais e humanos, era grande o número de crianças que não resistiam às 
precárias condições em que eram submetidas. (VERONESE, 1999) 
 Com a revolução industrial, precoce foi a idade com a qual as crianças 
oriundas das famílias operárias ingressavam nas fábricas. Isso era uma forma de 
garantir a aprendizagem de um ofício, o que não podia se oferecido pelas parcas e 
pequenas escolas profissionais, implantadas a partir de 1874, em São Paulo. 
15 
 
 Apesar de várias crianças serem inseridas cedo demais nas fabricas, um certo 
numero delas ainda estavam nas ruas, abandonas e desassistidas. E com suas 
condições precárias a entrada na vida no crime também se dava cedo. 
 Em 1912, o Deputado João Chaves apresentou um projeto de lei que alterou a 
perspectiva do direito de criança e adolescente, afastando-o da área penal e 
propondo a especialização de tribunais e juízes, na linha, portanto, dos movimentos 
internacionais da época. A influência externa e as discussões internas levaram à 
construção de uma doutrina do direito do menor, era a fase de criminalização da 
infância pobre. (VERONESE, 1999) 
 Em 1924 é criado o primeiro Juizado de Menores, na cidade do Rio de Janeiro, 
graças às incansáveis lutas em favor da criança desvalida, pelo jurista e legislador 
Mello Mattos. A criação deste Juízo Privativo de Menores se deu através do Decreto 
n. 16.272, de 20 de dezembro de 1923. (VERONESE, 1999) 
Dá-se ai o início de um novo período que iria se caracterizar pela ação social 
do Juizado de Menores que, reservaria ao juiz o papel de declarar a condição 
jurídica da criança de abandonada ou não, se delinqüente, e qual o amparo que 
deveria receber. 
 Explica Veronese (1999, p. 24): 
 
Uma vez instalado o Juízo Privativo de Menores, este se deparou com a 
escassez de estabelecimentos que executassem e dessem apoio às 
medidas jurídicas que foram empreendidas com relação ao menor. Esta 
dificuldade tornava praticamente ineficaz a ação daquele juízo. Foi criado 
então o Patronato de Menores, como saída viável e tal situação. 
 
 O Patronato recebeu, quando da sua criação, a fim de integrar seu patrimônio, 
a Escola de Menores Abandonados, que foi transformada em Casa de Preservação 
a qual, por sua vez, sofreu imediata reforma. A seção feminina passou a chamar-se 
Casa de Prevenção e Reforma e o setor masculino continuou com a denominação 
de Casa de Preservação. 
 A criação do Juízo de Menores foi mais um erro do que um acerto em favor da 
criança, pois lhe faltava uma organização técnico-administrativa, que lhe desse a 
credibilidade necessária. O Poder Público, através de autorização do Juízo de 
Menores, liberava o menor para o trabalho doméstico, sem nenhum tipo de garantia. 
(VERONESE, 1999) 
16 
 
 A Lei n. 4.242, de 5 de janeiro de 1921, que tratou do orçamento da Despesa 
Geral da República, trazia disposições que seriam típicas de um Código de Menores, 
como a definição de abandono, a suspensão ou mesmo a perda do pátrio poder e 
determinava, para esses casos, processos especiais. Além disso, eliminou o critério 
do discernimento, próprio do Código Criminal do Império, passando a considerar o 
menor de 14 anos totalmente improcessável e irresponsável. 
 
2.3 CÓDIGO DE MELLO MATTOS 
 
 Em 12 de outubro de 1927 foi publicado o Decreto 17.943-A, primeiro Código 
de Menores do Brasil, mais conhecido como Código de Mello Mattos. De acordo com 
a nova lei, caberia ao Juiz de Menores decidir-lhes o destino. A família, 
independente da situação econômica, tinha o dever de suprir adequadamente as 
necessidades básicas das crianças e jovens, de acordo com o modelo estatal. 
Conforme Veronese (1999, p.28): 
 
O Código de Menores institucionalizou o dever do Estado em assistir os 
menores que, em face do estado de carência de suas famílias, tornavam-se 
dependentes da ajuda ou mesmo da proteção pública, para terem 
condições de ser desenvolver ou, no mínimo, subsistirem no caso de 
viverem em situações de pauperização absoluta. 
 
 Apesar dos esforços de Mello Mattos e seus sucessores, estes tiveram como 
uma barreira praticamente intransponível, em virtude da política da época, a falta de 
recursos e de autonomia para a manutenção dos institutos já existentes e a 
implantação de novos. De forma que as reclamações oriundas dos juízes de 
menores nesse sentido eram constantes. 
 Relata Amin (2007, p. 6) que: “A Constituição da Republica do Brasil de 1937, 
permeável às lutas pelos direitos humanos, buscou, além do aspecto jurídico, 
ampliar o horizonte social da infância e juventude, bem como dos setores mais 
carentes da população”. 
 Em 1941 foi organizado o SAM - Serviço de Assistência a Menores, através do 
Decreto-lei n 3.779, com a tarefa de prestar, em todo território nacional, amparo 
social aos menores desvalidos e infratores, isto é, tinha-se como meta centralizar a 
execução de uma política nacional de assistência, desse modo, portanto, o SAM se 
17 
 
propunha ir além do caráter normativo do Código de Menores de 1927. 
(VERONESE, 1999) 
 Acrescenta Amin (2007, p. 7): 
 
A tutela da infância, nesse momento histórico, caracterizava-se pelo regime 
de internações cm quebra dos vínculos familiares, substituídos por vínculos 
institucionais. O objetivo era recuperar o menor, adequando-o ao 
comportamento ditado pelo Estado, mesmo que o afastasse por completo 
da família. A preocupação era correcional e não afetiva. 
 
 Em 1943 foi instalada uma Comissão Revisora do Código Mello Mattos, sendo 
que foi diagnosticado que o problema das crianças era principalmente social, sendo 
assim, a comissão trabalhou no propósito de elaborar um código misto, com 
aspectos social e jurídico. (AMIN, 2007) 
 A década de 60 foi marcada por severas criticas ao SAM que não cumpria e 
até se distanciava do seu objetivo inicial. Conforme Amim (2007, p. 7): “Desvio de 
verbas, superlotação, ensino precário, incapacidade de recuperação dos internos 
foram alguns dos problemas que levaram à sua extinção.” 
 Frisa Veronese (1999, p. 32) que: 
 
Embora as criticas ao SAM fossem generalizadas, nada impediu que sua 
lógica de ação se infiltrasse nas políticas da instituição que o 
sucedeu.”Presumias-se que aquelas seriam mais bem protegidos se fossem 
isolados em relação ao seu ambiente de origem que os predispunha a uma 
situação de deliquencia e marginalidade. 
 
 Em 1964 se deu a sistematização das diretrizes, até então esparsas, com a 
criação da Fundação Nacional do Bem Estar do Menor - FUNABEM - com a Lei nº 
4.513, de 1º de dezembro de 1964. A FUNABEM não se preocupava com as 
relações estruturais subjacentes à problemática do menor, seu universo de ação 
limitou-se, às variáveis dependentes do problema, sem uma visão abrangente de 
totalidade. As variáveis dependentes traduziam-se na maioria das vezes em ensino 
formal e profissionalmente, além do fundamental: abrigo, alimentação, vestuário. 
 Segundo Veronese (1999, p. 33): 
 
A criança não mais é simples responsabilidade de entidade privadas e de 
alguns organismos estatais, que atuavam de acordo com seus preceitos 
regionais, passando a ser enquadrada aos objetivos de uma Política do bem 
- estar do Menor, cuja responsabilidade seria da FUNABEM. 
 
18A FUNABEM assumiu na prática uma postura setorial e comprometida com a 
situação política vigente, suas propostas foram paliativas. Ao fechar os olhos para a 
realidade nacional, não considerou as verdadeiras necessidades da infância e 
juventude brasileiras, inserindo-as num só contexto de carências que atingiam não 
só a si, mas sua família, bem como toda sua classe de origem. 
 Conforme Bierrenbahch (1987, p. 84): “A FUNABEM trouxe uma suposta 
modernização a um processo ultrapassado de atendimento institucionalizando ao 
menor. Como órgão normativo, tentou levar sua mensagem mista de fé e técnica a 
todo o território nacional”. 
 Afirma Amin (2007, p.7): “Legalmente a FUNABEM apresentava uma proposta 
pedagógica assistencial progressista. Na prática, era mais um instrumento de 
controle do regime político autoritário exercido pelos militares.” 
Segundo Veronese (1999, p. 33): 
 
A partir do momento que o problema da infância adquire status de problema 
social, sobre ela recaem os preceitos da ideologia de segurança nacional. A 
PNBEM - Política Nacional do bem-estar do Menor - tem assim toda a sua 
estrutura autoritária resguardada pela ESG - Escola Superior de Guerra - 
cujo fim específico era o de repassar a ideologia supra. 
 
 A PNBEM e, por conseguinte, a própria FUNABEM, serviram como 
instrumentos de controle da sociedade civil. E não só, a política institucional que o 
Brasil vinha adotando demonstrava-se, pelo crescimento do numero de crianças 
marginalizadas, além de ineficiente, também incapaz de reeducá-las, haja vista o 
estilo metodológico nelas empregado, no qual a criança era mero sujeito passivo, 
cliente de uma pedagogia alienada. 
 
2.4 CÓDIGO DE MENORES 
 
 Em 10 de outubro de 1979, surge o Código de Menores, pela Lei n. 6.697, com 
ele se dá o estabelecimento da doutrina da situação irregular, que dizia respeito ao 
menor de 18 anos de idade que se encontrava abandonado materialmente, vitima de 
maus tratos, em perigo moral, desassistido juridicamente, com desvio de conduta e 
ainda o autor de infração penal. 
 A lei de menores cuidava somente do conflito instalado e não da prevenção. 
Era instrumento de controle social da infância e do adolescente, vítimas de omissões 
19 
 
da família, da sociedade e do Estado em seus direitos básicos. Portanto, crianças e 
adolescentes não eram sujeitos de direitos, mas sim objeto de medidas judiciais. 
 Frisa Veronese (1999, p. 37) que: 
 
No Código de Menores, de 1979, a prevenção limitou-se a disciplinar as 
medidas de vigilância, em regra de conteúdo proibitivo para a criança e o 
adolescente, como os jogos de bilhar, denotando que a idéia de prevenir 
totalmente ofensas aos direitos da criança e do adolescente ainda estava 
para ser consolidada. 
 
 Quando o Código de Menores, no seu artigo 1º, II, fazia referencia aos 
menores entre 18 e 21 anos, designava especialmente os chamados jovens - 
adultos, autores de delitos praticados antes dos 18 anos, que implicavam em medida 
de internação. No entanto, estes jovens - adultos, mesmo tendo alcançado a 
maioridade, não podiam se reinserir na sociedade por continuarem apresentando os 
mesmos desvios, os mesmos problemas que os levaram à internação, e assim 
permaneciam sob jurisdição do Juízo de Menores, sujeitos às medidas previstas no 
citado Código. (VERONESE, 1999) 
 Assim, a internação poderia ser mantida após os 18 anos, tendo, porém, como 
limite máximo, a idade de 21 anos. O juiz competente seria o Juiz de Menores e, 
desse modo, deveriam ser aplicados os princípios e regras do Direito do menor, 
vedada a aplicação extensiva de preceitos do Código Penal, uma vez que, durante a 
menoridade, seria inaplicável o Estatuto Repressivo, em face de inimputabilidade 
penal. 
 Segundo Veronese (1999, p. 42): 
 
As situações de desrespeito à condição de ser criança, de ser adolescente, 
foram tornando-se cada vez mais flagrantes, e desencadearam um 
processo de mobilização nacional, na tentativa de alterar o Código de 
Menores, e de suscitar uma nova legislação nesta área. Tanto que em 13 de 
julho de 1990, foi sancionado o Estatuto da Criança e dos Adolescentes, 
uma lei mais compatível com a realidade brasileira. 
 
 Em 13 de julho de 1990 foi promulgada a Lei nº 8.069, denominado Estatuto da 
Criança e do Adolescente, cuja função visa regulamentar e dar efetividade aos 
dispositivos constitucionais acima referidos. O Estatuto reafirmou a doutrina da 
proteção integral adotada pela Constituição Federal, sendo que tal doutrina 
reconhece a criança e o adolescente como sujeitos de direitos, revogando a doutrina 
20 
 
da situação irregular, até então vigente em nosso país através do Código de 
Menores de 1979. (VERONESE, 1999) 
 A origem do Estatuto da Criança e do Adolescente decorre do grande 
movimento social e anseios dos brasileiros na efetivação da proteção à criança e ao 
adolescente, já delineados de forma sucinta na Constituição Federal de 1988. 
 Constata-se que a evolução histórica dos direitos das crianças e adolescentes 
teve uma longa caminhada a passos lentos e com diversos obstáculos. 
 
2.5 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 
 
 Ao contrário dos antigos Código de Menores que abrangiam os menores em 
situação irregular, decorrente da omissão ou falta dos pais, da falta de assistência 
em geral e da prática de ato infracional, o Estatuto da Criança e do Adolescente 
aparece como marco ao conceber a proteção integral à criança e ao adolescente, 
assim conhecida como a Doutrina da Proteção Integral. 
 Estatuto da Criança e do adolescente, Lei n. 8.069/90, diferentemente do 
Código de Menores de 1979, dispõe a proteção integral à criança e ao adolescente. 
Tal lei estabelece uma série de dispositivos destinados à prevenção de situações 
que importem em ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente. 
(VERONESE, 1999) 
 Assim como explica D’Andrea (2005, p. 21) “Essa inovação, contudo, não parte 
isoladamente do Estatuto. É, acima de tudo, consequência da própria Constituição 
Federal de 1988, que nos artigos 227 a 229 traça princípios elementares da 
proteção integral […]”. Diferentemente de outros países, o legislador reuniu os mais 
importantes princípios, direitos e normas de proteção da criança e do adolescente 
dentro de uma só lei. 
 O Estatuto da Criança e do Adolescente se constrói com vistas ao Direito 
Internacional Público e Privado, ante os Tratados e as Convenções Internacionais, 
ao Direito Constitucional, que defere absoluta prioridade à criança e ao adolescente, 
ao Direito Civil, Penal, Trabalhista, Processual e, ainda, certas leis extravagantes. 
 Segundo Veronese (1997, p. 15) “O surgimento de uma legislação que se 
ocupasse seriamente dos direitos da infância e da adolescência era de caráter 
imprescindível, pois havia uma necessidade fundamental de que estes passassem 
da condição de menores para cidadãos”. 
21 
 
 Conforme Elias (2005, p. 01) “O ECA é aplicado a todas as crianças e 
adolescentes, independentemente da situação”. A proteção integral é abrangente, 
aplicando-se a todos os indivíduos que não completaram dezoito anos, atingindo 
todas as áreas da saúde, à liberdade, ao respeito, à dignidade, à convivência 
familiar e comunitária, à educação, à profissionalização, ao lazer e ao esporte. 
 O ECA, trata-se de uma lei que é fruto do esforço conjunto e milhares de 
pessoas e comunidades empenhadas na defesa e promoção das crianças e 
adolescentes do Brasil. Nesse sentido, acrescenta Cury (2005, p. 17) “A democracia 
requer leis que garantam e promovam a dignidade da pessoa humana, assegurando 
seus direitos e o cumprimento dos deveres”. 
 Portanto, o Estatuto da Criançae do Adolescente substuiu a doutrina da 
situação irregular pela da proteção integral para ampara não apenas aqueles que 
estivessem em situação de abandono, maus-tratos ou envolvidas em ato infracional, 
protegendo a todas de modo universal. 
 Após analisar a evolução da proteção a criança e adolescente no ordenamento 
jurídico, o próximo capitulo irá tratar a respeito dos direitos fundamentais da criança 
e adolescente, esses que asseguram, por lei ou por outros meios, todas as 
oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar os desenvolvimentos físicos, 
mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
22 
 
3 O DIREITO FUNDAMENTAL A LIBERDADE DA CRIANÇA E DO 
ADOLESCENTE 
 
 O presente capítulo tratará dos direitos fundamentais de todos os brasileiros 
sem distinção de raça e também para os estrangeiros que estiverem em solo 
brasileiro, assim como preceitua o artigo 5º da Constituição Federal. Além de 
analisar os direitos fundamentais em geral, será analisado os direitos fundamentais 
das crianças e dos adolescentes, que está elencado no artigo 3° do ECA e também 
no artigo 227 da Constituição Federal. 
 
 
3.1 DIREITOS FUNDAMENTAIS 
 
 Nos primórdios do período republicano, em que as preocupações com os 
direitos inerentes ao ser humano irromperam-se com o maior abundância, essa 
categoria jurídica abarcava exclusivamente os chamados direitos individuais ou civis, 
marcados pela preocupação de limites a atividade estatal, criando, por assim dizer, 
direitos de resistência do indivíduo perante possíveis arbitrariedades do Poder 
Publico. 
 O fato é que o evolver das relações econômico-sociais trouxe ao cenário 
jurídico preocupações humanas redimensionadas, forjando um novo patamar de 
alforria do individuo, em que direitos sociais, culturais e econômicos, caracterizados 
não mais por uma ausência, mas pela presença do Estado em atividades 
prestacionais, acumularam-se aos já existentes direitos individuais ou civis. 
(ARAÚJO, 2010) 
 Os direitos fundamentais constituem uma categoria jurídica, 
constitucionalmente erigida e vocacionada à proteção da dignidade humana em 
todas as dimensões. Possuem natureza poliédrica, prestando-se ao resguardo do 
ser humano na sua liberdade, nas suas necessidades e na sua preservação. Os 
direitos fundamentais passam a assumir também uma dimensão institucional, na 
medida em que pontuam a forma de ser e a atuar do Estado que os reconhece. 
(ARAÚJO, 2010) 
 Os direitos fundamentais também têm por função permitir que o indivíduo 
possa participar, de maneira efetiva, do processo político do Estado a que esteja 
 
23 
 
vinculado, não só por meio do exercício do voto e dos demais mecanismos de 
participação popular, como também se candidatando a ser um representante do 
povo na condução daquele mesmo Estado. (DANTAS, 2014) 
 Ainda, os direitos fundamentais estão diretamente relacionados com o 
denominado Estado Democrático de Direito, ou seja, com aquele modelo de ente 
estatal não só submetido ao império da lei, como também à denominada soberania 
popular, que permite ao povo participar das decisões políticas do Estado, seja por 
meio de representantes eletivos, seja por meio de mecanismos de democracia 
direta. (DANTAS, 2014) 
 A Constituição de 1988 preceitua em seu Título II o tema “Dos Direitos e 
Garantias Fundamentais”, indicando expressamente o rol de institutos jurídicos que 
integram, no plano do direito positivo, essa categoria. Sendo que ao disciplinar os 
direitos fundamentais, não abraçou corte metodológico específico, abrangendo, por 
vezes, num mesmo capítulo, direitos de natureza diversa, sendo direito individuais, 
coletivos, sociais, nacionalidade, políticos e partidos políticos. (ARAÚJO, 2010) 
Pode-se constatar, que os direitos e garantias fundamentais, em razão de sua 
importância, devem todos estar fundamentados no chamado principio da dignidade 
humana, apontado pela doutrina como a fonte primordial de todo o ordenamento 
jurídico, e, sobretudo, dos direitos e garantias fundamentais. (DANTAS, 2014) 
 Conforme Dantas, (p. 270, 2014): 
 
Baseando-se nessas ponderações, podemos afirmar, em apertada síntese, 
que os direitos e garantias fundamentais são aqueles que, fundamentados 
no principio da dignidade humana e diretamente relacionados com o Estado 
Democrático de Direito, dizem respeito às esferas de interesse essenciais 
ao gênero humano, destinando-se não só à tutela dos direitos individuais, 
como também dos direitos políticos, dos direitos sociais, culturais e 
econômicos, além dos direitos de fraternidade e de solidariedade. 
 
 Os direitos fundamentais são extrapatrimoniais por não terem natureza 
econômica imediata. São irrenunciáveis, por sua vez, em razão de seu titular não os 
poder renunciar de maneira alguma, mesmo que eventualmente, deixe de exercê-
los. São ainda, intransmissíveis, por não transmitirem com a morte do titular, são 
tidos também como imprescritíveis, em razão de não haver prazo para o seu 
exercício, e por fim são indisponíveis, uma vez que, em regra, não podem ser 
alienados. (DANTAS, 2014) 
24 
 
 Além dessas características dos direitos fundamentais, a doutrina costuma 
dividir tais direitos em três categorias, sendo elas, direitos fundamentais de primeira, 
segunda e terceira gerações. Tal divisão leva em conta a ordem histórica-
cronologica em que tais direitos fundamentais passaram a receber expresso amparo 
das Constituições. (DANTAS, 2014) 
 Os direitos fundamentais de primeira geração, foi o primeiro patamar de alforia 
do ser humano reconhecido por uma Constituição. São direitos que surgiram com a 
ideia de um soberano, cuja vontade era a lei, concebeu-se um Estado em que as 
funções do poder fossem atribuídas a órgãos distintos, impedindo a concentração de 
poderes e o arbítrio de uma ou de um grupo de pessoas. (ARAÚJO, 2010) 
 Os direitos fundamentais de segunda geração, traduzem uma etapa de 
evolução na proteção da dignidade humana. Sua essência é a preocupação com as 
necessidades do seu humano. Se os direitos fundamentais de primeira geração 
tinham como preocupação a liberdade contra o arbítrio estatal, os de segunda 
geração partem de um patamar mais evoluído, onde o homem reclama agora uma 
nova forma de proteção da sua dignidade, com a satisfação das necessidades 
mínimas para que se tenha dignidade e sentido na vida humana. (ARAÚJO, 2010) 
 Os direitos fundamentais de terceira geração, enfoca-se o ser humano 
relacional, em conjunção com o próximo, sem fronteiras físicas ou econômicas. O 
direito à paz no mundo, do patrimônio comum da humanidade e à comunicação 
integram o rol desses novos direitos. Se a tecnologia e as novas formas de 
relacionamento social e econômico criaram outras formas de submissão do ser 
humano, cabe ao direito constituir meios para a sua alforria. (ARAÚJO, 2010) 
 Os direito fundamentais de quarta geração tratam-se dos direitos relacionados 
à engenharia genética. E os de quinta geração é seria um sistema de direitos ainda 
a incorporar os anseios e necessidades humanas que se apresentam com o tempo, 
direitos ainda a serem desenvolvidos e articulados. (ARAUJO, 2010) 
 Os destinatários do direitos fundamentais, assim como preceitua o artigo 5º da 
Constituição Federal, serão os brasileiros e estrangeiros residentes no País. Os 
direitos fundamentais tem um forte sentido de proteção do ser humano, e mesmo o 
próprio caput do artigo 5º faz advertência de que essa proteção realiza-se sem 
distinção de qualquer natureza. (ARAÚJO, 2010) 
 Então como elenca o art. 5º todos os brasileiros ou estrangeiros no Brasil,terão 
direito a vida, sendo que esse direito é o mais fundamental de todos os direitos, já 
25 
 
que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais 
direitos. Considerando que o direito a vida não abrange somente o aspecto 
biológico, tanto o direito de nascer como o de permanecer vivo, como também o 
aspecto psicossocial do ser humano, referente ao direito desde último de viver com 
dignidade. É por isso, que nosso ordenamento jurídico proíbe não só o aborto, o 
homicídio e a pena de morte, para a garantia da vida, como também a tortura e as 
penas perpétuas, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis, como mecanismos 
que assegurem à pessoa uma vida digna. (DANTAS, 2014) 
 Além de todos os direitos fundamentais elencados no artigo 5º, cabe aqui o 
enfoque do direito de locomoção, que está expresso no inciso XV, que “é livre a 
locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos 
termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”. (DANTAS, 2014) 
 O dispositivo constitucional em analise tem por escopo a tutela da denominada 
liberdade de locomoção, que consiste no direito, concedido a todo individuo, de ir, vir 
e permanecer, sem que possa sofrer injusto cerceamento em tal direito, por parte do 
Estado ou mesmo de particulares. (DANTAS, 2014) 
 Entretanto, como todo direito fundamental, também não é absoluto, 
comportando restrições, desde que previstas no texto constitucional, ou para 
garantia da lei e da ordem. Como por exemplo, pode-se citar o próprio artigo 5º, 
inciso XV, que restringe tal direito em tempo de guerra, bem como o inciso LXI, do 
mesmo dispositivo, que permite tanto a prisão em flagrante, como também a prisão 
por ordem judicial. (DANTAS, 2014) 
 Por fim, após analisar os direitos fundamentais de todos os brasileiros sem 
distinção, cabe agora aprofundar no estudo, e focar nos direitos fundamentais da 
criança e do adolescente, sendo que é o objeto de estudo do presente trabalho. 
 
3.2 DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 
 
 Com a Constituição, as crianças e os adolescentes também foram 
reconhecidos como cidadãos e passaram a usufruir todos os direitos 
constitucionalmente consagrados, que se aplicam às pessoas maiores de 18 anos. 
Passaram da situação de menor para a de criança cidadã e adolescente cidadão. 
 A base de sustentação da Constituição Federal de 1988, em relação aos 
direitos fundamentais da criança e do adolescente foi a Convenção sobre o Direito 
26 
 
da Criança, adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro 
de 1989, que adotou o princípio da proteção integral e a necessidade de reconhecer 
a criança como pessoa em desenvolvimento, merecedora de proteção especial. 
(FERREIRA, 2010) 
 O Estatuto da Criança e do adolescente em seu artigo 3º dispõe sobre os 
direitos fundamentais das crianças e adolescentes, que a rigor, mencionar que as 
mesmas gozam de direitos fundamentais seria prescindível, tendo em vista que os 
direitos e garantias conferidos a todos e inclusive para os menores, já estão também 
dispostos na Constituição Federal em seu artigo 227. (CURY, 2000) 
 Verifica-se que o Estatuto não criou qualquer direito novo em benefício da 
criança e do adolescente, tendo apenas regulamentado o que já tinha sido 
especificado pelo legislador constituinte, reconhecendo-os como sujeitos de direitos. 
(FERREIRA, 2010) 
 O Estatuto, dando cumprimento à Constituição, legisla igualmente sobre a 
instrumentação para serem alcançados os direitos, e, por isto, já no seu artigo 3º é 
enfatizado que são assegurados, por lei ou por outros meios, todas as 
oportunidades e facilidades para seu desenvolvimento físico, mental, espiritual e 
social, em condições de liberdade e de dignidade. (CURY, 2000) 
 A meta desse artigo é o desenvolvimento como pessoa humana, já que uma 
sociedade será justa no momento em que oportunizar a todas as suas crianças e 
aos seus adolescentes estas condições de desenvolvimento íntegro, nas diferentes 
dimensões fundamentais do ser humano. Para que este desenvolvimento não seja 
transposto como objetivo para organizações autoritárias, massificantes, sufocantes, 
o Estatuto condiciona explicitamente a liberdade e a dignidade da criança ou do 
adolescente como pré-requisito inarredável para este desenvolvimento acontecer. 
(CURY, 2000) 
 Apesar de o Estatuto ser minucioso, o mesmo não arrola todos os direitos 
fundamentais da criança e do adolescente, o que não significa que as demais 
previsões constitucionais desses direitos não se apliquem, sendo que os direitos da 
pessoa humana referidos na Constituição Federal também lhes são inerentes. 
(FONSECA, 2011) 
 Sendo assim preconiza o artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente: 
 
27 
 
Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais 
inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata 
esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as 
oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, 
mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. 
 
 Os princípios afirmados nesse artigo são três: a) crianças e adolescentes 
gozam de todos os direitos fundamentais assegurados a toda pessoa humana; b) 
eles tem direito, além disso, à proteção integral que é a eles atribuída por este 
Estatuto; c) a eles são garantidos também todos os instrumentos necessários para 
assegurar seu desenvolvimento físico, mental, moral e espiritual, em condições de 
liberdade e dignidade. (CURY, 2000) 
 As crianças e adolescentes são sujeitos de direitos plenos, sendo que os 
mesmos tem mais direitos que outros cidadãos, isto é, eles tem direitos específicos 
que lhes asseguram o seu desenvolvimento e crescimento, para tornar-se cidadãos 
adultos livres e dignos. 
 Além de todos os outros direitos fundamentais garantidos para as crianças e 
adolescentes, a seguir será analisado o direito fundamental a liberdade, que é o 
objeto de estudo do presente estudo. 
 
3.3 DIREITO FUNDAMENTAL A LIBERDADE 
 
 Dispõe o artigo 15 do Estatuto da Criança e do adolescente, que “a criança e o 
adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas 
humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, 
humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis”. Este artigo foi um divisor 
de águas entre as velhas práticas, do antigo Código de Menores, e dos novos 
paradigmas. Proibiu-se, com isso, que Juízes expedissem portarias disciplinando o 
direito de ir e vir do público infanto-juvenil. Permitiu-se, assim, que crianças e 
adolescentes pudessem exercer o direito de ir e vir, inclusive de estar em 
logradouros públicos e espaços comunitários; de opinião e expressão; crença e culto 
religioso; brincar, praticar esportes e divertir-se; participar da vida familiar e 
comunitária, sem discriminação; participar da vida política, na forma da lei e buscar 
refúgio, auxílio e orientação. (PAIVA, 2010) 
 As crianças e adolescentes devem ter o pleno acesso e gozo aos direitos 
constitucionais, dentre eles, os direitos à liberdade, ao respeito e à dignidade. O 
28 
 
direito de liberdade compreende o direito de ter suas próprias idéias e crenças, e 
exercê-las sob a orientação dos pais ou responsável, observadas as limitações e 
garantias consagradas no ordenamento jurídico. O direito ao respeito consiste na 
inviolabilidade da sua integridade física, psíquica e moral, incluindo o direito à 
imagem, aos valores e opiniões, não sendo permitida qualquer discriminação étnica, 
racial ou religiosa. A dignidade garanteque as crianças e adolescentes sejam 
amparados e postos a salvo de tratamentos desumanos, violentos, humilhantes ou 
repressivos. (D’ANDREA. 2005) 
 No direito à liberdade preconiza o artigo 16 do Estatuto da Criança e do 
Adolescente: 
 
Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: 
I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, 
ressalvadas as restrições legais; 
II- opinião e expressão; 
III- crença e culto religioso; 
IV- brincar, praticar esportes e divertir-se; 
V- participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; 
VI- participar da vida política, na forma da lei; 
VII- buscar refúgio, auxilio e orientação. 
 
 Esse artigo serve também para que a educação estabelecida pelos pais para 
com seus filhos tenham certos limites. Logo, a limitação estaria no exercício do 
poder familiar para com esses direitos e não o contrário. (SANTOS, 2007) 
 As liberdades e garantias visam assegurar à criança e ao adolescente a 
participação na vida social, ao desenvolvimento saudável e livre de interferências 
nocivas, garantindo a liberdade de escolha de juízo de valores. (D’ANDREA, 2005) 
 A liberdade que se outorga a crianças e adolescentes, embora tenha a 
dimensão daquela conferida aos adultos, envolve certa complexidade, já que se está 
falando em pessoas em desenvolvimento. Sendo assim, não está diante de uma 
liberdade absoluta, que não é outorgada sequer aos adultos, pois quando o 
exercício pleno do direito de liberdade colidir ou obstar a condição de pessoa em 
processo de desenvolvimento estaremos diante de uma barreira limitativa àquele 
direito, em outras palavras ocorre a limitação da liberdade de crianças e 
adolescentes quando para o asseguramento da proteção integral. (FONSECA, 2011) 
 Tais limitações da liberdade pode se encontrar no artigo 75 do ECA, onde 
crianças e adolescentes só terão acesso às diversões públicas e espetáculos 
classificados como adequados a sua faixa etária, e a criança só poderá ingressar e 
29 
 
permanecer nos locais de apresentação e exibição quando acompanhada dos pais 
ou responsáveis. Ainda o artigo 80 do ECA preconiza que as crianças e 
adolescentes não podem entrar nem permanecer em locais que explorem jogos e 
apostas. O artigo 83, proíbe a viajem de crianças pra fora da comarca, onde reside, 
desacompanhada dos pais ou responsáveis. E o artigo 106 do ECA preconiza que o 
adolescente pode, ainda, ser privado de sua liberdade quando em flagrante de ato 
infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária. 
 Dita liberdade, como pode ver, sofre limitações dos decretos administrativos ou 
regulamentos restritivos e gerais (horários de funcionamento, faixa etária etc), mas 
além dessas limitações também sofre restrições oriundas do exercício do poder 
familiar, daí porque a própria norma legal faz ressalva às “restrições legais”. 
(FONSECA, 2011) 
 
3.4 TOLHIMENTO A LIBERDADE DO ADOLESCENTE 
 
 Preconiza o artigo 110 do Estatuto da Criança e do Adolescente que “Nenhum 
adolescente será privado de sua liberdade sem o devido processo legal”. 
 A medida de privação da liberdade que vigorava no Código de Menores de 
1979 revelava que o menor era, acima de tudo, objeto da intervenção do Estado, 
que, para assegurar a ordem pública, excluía-o do convívio social. A defesa técnica 
era facultativa, o que desobrigava o Estado de fornecê-la para os menores. 
Obviamente que esta omissão prejudicava principalmente os jovens das camadas de 
baixa renda, para os quais destinava-se, geralmente, o imediato confinamento em 
instituições ressociolizadoras. (CURY, 2000) 
 Contudo, aquela visão acerca do adolescente infrator enfatizava aspectos 
negativos de sua personalidade, e que muitas vezes eram consideradas 
irreversíveis. Ele era percebido de forma descontextualizada, sua vida familiar, 
escolar e profissional não era vista em sua realidade, mas sim de maneira ideal. E o 
ideal, para um Estado centralizador e autoritário como o do Brasil dos anos 70, era 
conservador. (CURY, 2000) 
 Com o Estatuto da Criança e do Adolescente, que expressa uma determinação 
legal de defender os direitos de crianças e adolescentes, especificamente em seu 
artigo 110 que faz uma imposição jurídica de estender os direitos processuais 
básicos aos adolescentes, limitando os poderes do juiz. Enfim, de conservar para os 
30 
 
adolescentes infratores, acima de tudo, sua identidade enquanto cidadãos. (CURY, 
2000) 
 Portanto, com o ECA, o adolescente infrator cabe, além de outras medidas, a 
privação da liberdade, que será decretada quando haver flagrante de ato infracional 
ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, e outras 
medidas que seram analisadas a seguir. 
 
3.4.1 Flagrante de ato infracional 
 
 Com relação às crianças, ou seja, às pessoas de até doze anos de idade 
incompletos, que cometem infrações análogas às penais, o Estatuto da Criança e do 
Adolescente as excluiu da aplicação de medida socioeducativa, determinando, no 
seu artigo 105, que o ato infracional praticado por criança corresponderão as 
medidas de proteção previstas no artigo 101, que podem ser aplicadas isolada ou 
cumulativamente. (MACIEL, 2008) 
 Dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente que ato infracional é toda 
conduta descrita como crime ou contravenção penal. Isso implica em dizer que no 
caso aplicam-se as garantias de direito penal e processual penal que seria aplicadas 
a qualquer adulto. 
 Na questão de a criança ou adolescente cometer crime ou não, a doutrina 
diverge, assim como explica D’Andrea (p. 86, 2005): 
 
Para os finalistas que situam o dolo e culpa dentro do tipo, o menor comete 
crime (crime=fato + antijurídico). Para os clássicos o menor não comete 
crime, recaindo o dolo e a culpa no conceito de culpabilidade, onde também 
se encontra a imputabilidade (crime = fato típico + antijurídico + culpável). A 
verdade é que ato infracional nada mais é do que a conduta de crime ou 
contravenção, conforme estabelece o próprio ECA, que aparentemente 
adotou as duas teorias acima. A finalista para os adolescentes e a clássica 
para as crianças. O que acontecerá é que o adolescente, como inimputável, 
não será penalizado, mas submetido à medidas chamadas socioeducativas, 
e os menores às chamadas medidas de proteção. 
 
 Para efeito da prática de ato infracional, será considerada a idade do 
adolescente na data do fato. Não poderia ser diferente, pois assim como no crime, o 
tempo da prática do ato infracional será o da ação ou omissão, independentemente 
do resultado (art. 4º, CP), chamada de teoria da atividade. 
31 
 
Na sequência das disposições gerais sobre a prática do ato infracional, o Estatuto 
repete com sutis alterações alguns dispositivos processuais penais, ressaltando que 
o adolescente somente será detido em flagrante de ato infracional ou por ordem 
expressa da autoridade judiciária competente, sendo a ele conferido direito à 
identificação dos responsáveis por sua apreensão e ser informado de seus direitos. 
(D’ANDREA, 2010) 
 Caso apreendido em flagrante de ato infracional, o adolescente é 
encaminhado, desde logo, à autoridade policial competente, a qual passará a lavrar 
o auto, comunicando a autoridade judiciária e a família do apreendido. 
Concomitantemente, deve a autoridade providenciar Defensor ao adolescente, 
mesmo que estejam presentes os pais ou responsáveis. Em seguida a autoridade 
encaminhará a documentação, o adolescente e seus pais ou responsável ao agente 
ministerial, que deve ouvir o adolescente. A ouvida do adolescente, seus pais, vitima 
e testemunhas pelo Ministério Público se afigura ato por demais importante,pois 
poderá esclarecer o ocorrido suprindo eventuais falhas e omissões nos fatos e visa a 
convencer o agente acerca da providencia a ser tomada, inclusive a concessão de 
remissão. A não ouvida do adolescente pelo agente ministerial não dá ensejo a 
qualquer prejuízo, pois pode haver pedido de arquivamento ou representação com a 
concessão de remissão judicial. (FONSECA, 2011) 
 No caso de inviabilidade ou impossibilidade da apresentação imediata do 
adolescente, a autoridade policial poderá encaminhar o adolescente infrator a uma 
entidade de atendimento, quando esta fará a apresentação do adolescente ao 
representante do Ministério Publico, prazo de 24 horas. 
 Outra forma de o adolescente ser privado de sua liberdade é por ordem judicial, 
onde a autoridade competente pode determinar a internação ou a semiliberdade, 
que é o que veremos a seguir. 
 
3.4.2 Internação 
 
 A internação é uma medida privativa de liberdade, prevista no art. 121 do 
Estatuto da Criança e do Adolescente. Sujeita aos princípios da excepcionalidade, 
brevidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, esta 
constitui a mais rigorosa das medidas. A sua aplicação somente é permitida quando 
se tratar de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência à pessoa, 
32 
 
por reiteração no cometimento de outras infrações graves ou por descumprimento 
reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta. (CRUZ, 2013) 
 A internação precisa ser breve. Quer isso dizer que deve alcançar o menor 
período da vida do adolescente, o qual está em processo de formação e tem no seu 
direito fundamental à liberdade um dos mais relevantes fatores para a construção do 
seu caráter. A vida em sociedade, os direitos de expressão, de se divertir e de 
participação da vida política são exemplos da importância do gozo da sua liberdade, 
em um momento singular da sua existência. (MACIEL, 2008) 
 O Estatuto da Criança e do Adolescente, muito embora não seja exaustivo na 
delimitação de um sistema de execução das medidas socioeducativas, apresenta em 
seus dispositivos e regras um sistema de efetiva responsabilização dos 
adolescentes em conflito com a lei, ao qual pode-se denominar de Modelo Jurídico 
de Responsabilidade. (SPOSATO, 2004) 
 É preciso ter claro que a segregação do adolescente não é um fim em si 
mesmo, mas apenas a condição para que a medida socioeducativa seja aplicada. A 
medida, assim, consiste em intervenções diuturnas e multidisciplinares na vida do 
jovem, garantindo-lhe todos os direitos inerentes a qualquer ser humano, previstos 
na Constituição Federal de 1988. 
 Nesse sentido pode afirmar que esse modelo permite afirmar sem receios que 
a inimputabilidade não exclui a reprovabilidade e, portanto, não é sinônimo de 
irresponsabilidade ou impunidade para os adolescentes autores de infrações penais, 
trata-se de uma responsabilidade especial dos adolescentes, em que se verifica, a 
despeito da inimputabilidade, a reprovabilidade e culpabilidade do adolescente a 
quem a medida é imposta. Isto porque a imposição da medida socioeducativa 
guarda profunda semelhança com a aplicação da pena criminal, especialmente pela 
exigência de legalidade, indícios suficientes de autoria e materialidade e 
proporcionalidade. (SPOSATO, 2004) 
 Existem três momentos processuais nos quais a internação pode ser 
decretada, um anterior à prolação da sentença, outro que lhe é simultâneo, e um 
terceiro que lhe é posterior. O Estatuto da Criança e do Adolescente adotou fórmula 
diversa ao dispor sobre cada um dos tipos de internação, sendo a provisória, 
definitiva ou a denominada internação sanção. (MACIEL, 2008) 
Sobre a internação provisória explica Maciel (2008, p. 798): 
 
33 
 
A internação provisória se encontra nos artigos 108, 174, 183 e 184, nos 
quais é fixado o prazo de quarenta e cindo dias como o máximo para o 
respectivo cumprimento e são definidas as hipóteses para a sua decretação, 
quais sejam: a) quando existam indícios suficientes de autoria e 
materialidade, devendo restar demonstrada a imprescindibilidade da medida 
ou b) quando a garantia da segurança pessoal do adolescente ou a 
manutenção da ordem pública assim o exigirem, em função da gravidade do 
ato infracional e de sua repercussão social. 
 
 Importante salientar que não se faz necessária a cumulativadade dos 
elementos indicados para a decretação da internação provisória. 
 A internação definitiva é determinada em sentença, sendo o provimento que o 
legislador considerou como próprio à promoção da reintegração social do 
adolescente, no casos em que é legalmente permitida. (MACIEL, 2008) 
 A internação definitiva não comporta prazo determinado, mas não pode 
ultrapassar o período de 3 anos e precisa ser reavaliada no máximo a cada seis 
meses, tendo como requisitos o cometimento de ato infracional com grave ameaça 
ou violência à pessoa e a reiteração em outras infrações graves. (MACIEL,2008) 
 Além da internação aplicada somente para adolescentes infratores, também 
tem a semiliberdade, que será o assunto do próximo titulo. 
 
3.4.3 Semiliberdade 
 
 A semiliberdade, prevista no artigo 120 do Estatuto da Criança e do 
Adolescente, é a medida socioeducativa que implica uma forma mitigada de privação 
de liberdade e de institucionalização. Por representar uma interferência menos 
aguda no direito de ir e vir do adolescente é, por assim dizer, a medida 
imediatamente menos gravosa que a internação, fator que não exclui seu caráter 
sancionatório, inerente a qualquer medida socioeducativa. Traçando um paralelo às 
penas destinadas aos adultos, a semiliberdade corresponderia à privação de 
liberdade cumprida em regime aberto. (SPOSATO, 2004) 
 O adolescente que cumpre semiliberdade é obrigado a permanecer sob a 
custódia estatal, submetido às regras de uma unidade educacional. A medida 
caracteriza-se pela privação parcial da liberdade, uma vez que ao adolescente é 
assegurado o direito de realizar atividades externas sozinho e independentemente 
de autorização judicial. Isto é o que a diferencia da medida de internação, pois 
34 
 
mesmo quando nesta houver possibilidade de realizar atividade externa, prevalece o 
caráter de privação total da liberdade. (SPOSATO, 2004) 
 A semiliberdade pode ser aplicada de imediato, se o estudo social e psicológico 
a considerar suficiente. Mas também pode ser aplicada como meio de transição de 
internação para o meio aberto, o que é mais habitual. Sua duração é por prazo 
indeterminado, mas a exemplo da internação, a equipe multidisciplinar que 
supervisionar as atividades do adolescente deverá enviar semestralmente relatório 
circunstanciado ao juiz da infância e juventude. (D’ANDREA, 2005) 
 A escolarização e a profissionalização dos adolescentes são obrigatórias na 
medida de semiliberdade, conforme indicação do artigo 120, §1º do ECA. Além 
disso, é fundamental que o órgão executor da medida empenhe-se em aproximar a 
comunidade da casa de semiliberdade a fim de que aquela também se 
responsabilize, de certa forma, pelo sucesso da ressocialização dos adolescentes 
que cumprem a medida de semiliberdade. Reitere-se que o estreitamento dos 
vínculos do jovem com a comunidade é essencial para sua reinserção social, além 
de traduzir as recomendações legais para a organização de toda política 
socioeducativa. (SPOSATO, 2004) 
 A semiliberdade pode ser definida, assim, como a medida socioeducativa de 
parcial privação de liberdade que impõe: responsabilidade e diligência ao 
adolescente, a fim de este exercite seu direito de ir e vir; respeito às normas de 
convivência, bem como ao cumprimento de horários e limites das atividades 
externas; ea articulação de entidades governamentais e não governamentais por 
meio de políticas públicas, para que a inserção social se concretize. (SPOSATO, 
2004) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
35 
 
4 (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO TOQUE DE RECOLHER PARA CRIANÇAS E 
ADOLESCENTES 
 
 O presente capítulo busca responder ao problema de pesquisa, qual seja, se o 
toque de recolher para crianças e adolescentes é inconstitucional. Inicia-se 
contextualizando os momentos históricos em que o toque de recolher foi utilizado 
para posteriormente discutir sua natureza de medida protetiva ou restritiva de 
direitos. 
 
4.1 CONTEXTUALIZANDO DE TOQUE DE RECOLHER 
 
 O toque de recolher é uma reminiscência do Estado autoritário e instrumento 
utilizado em situações de anormalidade institucional. As primeiras notícias que se 
tem sobre o toque de recolher foi na idade média, quando os sinos das igrejas 
tocavam para avisar que era hora de apagar as luzes, para servir de sinal para os 
viajantes que a cidade estava às escuras. (SANTAYANA, 2013) 
 O toque de recolher foi utilizado em momentos de anormalidades, como 
guerras, catástrofes, ou algo similar que justificasse temporariamente a limitação do 
direito de ir e vir das pessoas nas ruas. (SANTAYANA, 2013) 
 Também foi utilizado na Alemanha Nazista entre 1933 a 1945 contra os judeus, 
ainda o toque de recolher foi utilizado nos EUA contra os imigrantes japoneses e 
seus descendentes na Califórnia e em Washington. (SANTAYANA, 2013) 
 Já no Brasil, em tempos atuais, o toque de recolher está sendo utilizado em 
algumas cidades contra em relação as crianças e a adolescentes com o fundamento 
de que as ruas não são um lugar seguro para os mesmos, altas horas da noite, 
diante da maior probabilidade de drogas e de estímulos à prostituição infantil, e da 
menor vigilância dos pais ou responsáveis. O toque de recolher também é estendido 
para as escolas, no sentido de recolher compulsoriamente toda criança e 
adolescente que estiver nas ruas no horário escolar. (SANTAYANA, 2013) 
 O toque de recolher adotado nas cidades do Brasil consiste em proibir a 
circulação, no período noturno, de crianças ou adolescentes por lugares públicos 
desacompanhados de seus pais. Os juízes baseiam-se nos artigos 98, 99 a 101, 148 
e 149 do Estatuto da Criança e Adolescente que tratam das medidas de proteção e 
da competência dos juízes da infância e juventude. (SALIBA, 2012) 
 
36 
 
 As portarias formuladas e expedidas por autoridades judiciárias possuem cada 
uma suas particularidades, não sendo nenhuma igual à outra, a não ser no objetivo 
de delimitar os horários e locais onde as crianças e adolescentes possam freqüentar. 
(SALIBA, 2012) 
 Em regra, o toque de recolher é estabelecido da seguinte maneira: primeiro, o 
Conselho Tutelar, em conjunto com as polícias civil e militar, efetuam vistorias em 
força tarefa pela cidade; abordam as crianças e adolescentes que se encontram 
sozinhos após o horário determinado para cada faixa etária e em locais que 
exponham os mesmos à perigo, constatada a irregularidade a criança ou 
adolescente é encaminhada à sua residência, sendo seus pais ou responsáveis 
advertidos da inobservância da portaria, em casos de reiteração os pais ou 
responsáveis poderão ser punidos com multas pecuniárias, podendo, ainda, 
responderem civilmente com a possível suspensão ou destituição do poder familiar, 
ou criminalmente por abandono material ou qualquer outro tipo penal que se adéque 
ao caso concreto. (SALIBA, 2012) 
 A autoridade judiciária antes de instaurar a medida do toque de recolher deve 
analisar o contexto social da comunidade em que atua e verificar a necessidade de 
sua aplicação, observando-se a real finalidade da medida, qual seja proteger as 
crianças e adolescentes e não apenas limitar o direito de locomoção dos mesmos. 
(SALIBA, 2012) 
 Analisada apenas sob olhar do direito fundamental da criança e das pessoas à 
segurança, a medida parece razoável. Se for nas ruas que estão os perigos e se 
para o cometimento dos delitos as crianças e adolescentes se utilizam das ruas, por 
certo a restrição ao seu acesso ensejará um diminuição da violência e da 
criminalidade. (SALIBA, 2012) 
 Mas ocorre que a medida também precisa ser confrontada a outros direitos 
fundamentais, entre eles o direito a liberdade de locomoção e à convivência 
comunitária e a legalidade, e é o que será analisado a seguir. 
 
4.2 TOQUE DE RECOLHER: MEDIDA PROTETIVA OU RESTRITIVA? 
 
 A portaria que decreta o toque de recolher, apesar der ser emitida pelos juízes 
da vara da infância e juventude, tem gerado inúmeras controvérsias tanto no meio 
jurídico quanto por parte da sociedade. 
37 
 
 Aqueles que se posicionam contra, argumentam que a medida fere os 
princípios legais, tanto da Constituição Federal de 1988 em seu artigo 227 que 
garante ao infanto-juvenil o direito de liberdade, quanto do Estatuto da Criança e do 
Adolescente que relata em seu artigo 16, inciso 1º, que “a criança e o adolescente 
tem o direito de ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários”. 
(SILVA, 2013) 
 Entende-se que o toque de recolher constitui, na verdade, um instrumento 
autoritário e ilegal, que recolhe crianças e adolescentes nas ruas em determinadas 
situações e horários, ferindo os direitos fundamentais desses sujeitos vulneráveis. 
 O poder judiciário tenta, indevidamente, substituir a atribuição dos pais ou 
responsáveis, e também do Poder Executivo, parte legítima para implementação de 
políticas públicas. A medida coercitiva, longe de ser uma medida de proteção, na 
verdade é uma medida de defesa social, que visa precipuamente a diminuição de 
violência juvenil, portanto, desprovida de qualquer caráter pedagógico. Com efeito, 
não existe qualquer projeto de intervenção educativa na vida desses jovens, que são 
lesados em seus direitos fundamentais e submetidos a situação de constrangimento 
e vexame. (SALIBA, 2012). 
 Ainda que estivesse vivendo problemas mais sérios no campo da segurança 
publica, tal recurso é inconcebível numa democracia. A juventude deve ter liberdade 
para, dessa forma, transformar-se numa população de adultos conscientes da 
importância de respeitar a liberdade alheia, ao invés de procurar a solução dos 
problemas de segurança pública implantando normas violadoras da Constituição. 
(NUNES, 2013) 
 Se uma das justificativas para o toque de recolher é a ocorrência de crimes, a 
medida deve se estender a todas as pessoas, crianças, adolescentes, adultos e 
idosos, afinal qualquer um pode praticar crimes. (NUNES, 2013) 
 Proteger as crianças e adolescentes da situação de risco não autoriza o Estado 
ou seus agentes políticos instituir normas inconstitucionais. O fim teleológico do 
Estatuto da Criança e do Adolescente é garantir o desenvolvimento saudável dessas 
pessoas. (NUNES, 2013) 
 Outro ponto de discussão é o foco que se dará na execução da medida. As 
principais vítimas do toque de recolher serão os jovens pertencentes aos extratos 
mais pobres da sociedade. Jovens esses que ficarão privados da melhor sensação 
que se pode ter na vida, que é a sensação de liberdade. (NUNES, 2013) 
38 
 
 Já os argumentos à favor, relata que a portaria esta totalmente de acordo com 
o Estatuto da Criança e do Adolescente, já que em seu artigo 149 dá plenos poderes 
as autoridades competentes de criar portarias disciplinares, ou alvará para autorizar 
a estadia do infanto-juvenil em determinado lugar sem a presença dos pais ou 
responsável legal. (SILVA, 2013) 
 Tal medida é uma forma de reeducar e proteger de forma integral, como manda 
a lei, esses indivíduos de ambientes perigosos

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