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As Leis Abolicionistas no Brasil

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AS LEIS ABOLICIONISTAS NO BRASIL
-A escravidão e a lei-
-Movimento Abolicionista-
-As leis Abolicionistas-
Daiana Alexandre Ferreira (Discente do Curso de Direito – 2°Período/Manhã) 
 E-mail: dn.alexa@hotmail.com
Karla Moore (Profª. História do Direito Brasileiro)
Universidade Cândido Mendes / Campus Campo Grande
RIO DEJANEIRO
2019
A ESCRAVIDÃO E A LEI
Ao se analisar o Brasil e a maior parte de sua história – Colônia, Reino e Império, portanto de 1500 a 1888 –, veremos um elemento formador da Nação brasileira que sempre é deixado de lado nas análises – por mais genéricas que sejam – da legislação do País: o escravo.
A partir do início das navegações começaram a afluir para Portugal escravos negros trazidos por navegadores e, posteriormente, essa mão de obra tornou-se vital para a realização da obra exploratório-colonizadora portuguesa, constituindo um dos principais meios de ganho da política mercantilista de Portugal.
O escravo é considerado e colocado na posição de mercadoria, portanto sujeito a relações de alienação idênticas a qualquer coisa que possa ser de propriedade de alguém. O escravo não constitui um bem pessoal vinculado, mas é alienável ao arbítrio do proprietário. Mesmo no caso da alforria a mentalidade e a legislação indicavam um caminho de dependência estreita que não poderia se extinguir totalmente, mesmo com a libertação do escravo, segundo Sidney Chalhoub:
“A alforria não significava um rompimento brusco dessa política de domínio imaginária, pois o negro, despreparado para as obrigações de uma pessoa livre, devia passar de escravo a homem livre dependente.”[2: CHALHOUB, Sidney. Visões da liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na corte. São Paulo: Companhia das Letras, 1990, p. 135.]
Tornar-se escravo na época moderna no Brasil (ou para o Brasil) era possível de duas maneiras: a primeira era nascer de mulher escrava. A segunda forma era a captura feita na África. Na África negra a escravidão já era praticada, mesmo antes do contato com os portugueses, entretanto, era uma escravidão feita pela guerra, onde o indivíduo entrava em um clã em uma condição inferior e com maiores obrigações de trabalho, porém sem cunho mercantil.
A questão familiar na sociedade patriarcal escravocrata que se montou no Brasil era, no mínimo, ambígua. Enquanto os senhores insistiam em ensinar o Cristianismo aos escravos como forma de submetê-los, obrigavam-nos, ao mesmo tempo, a contrariar o que aprendiam por causa de sua condição servil. A legislação depois da segunda metade do século XIX procurou impedir a separação de cônjuges escravos, uma lei de 1869 indicava essa direção, muito embora nem sempre a lei fosse cumprida. A Igreja responsável pela legalidade dos casamentos, somente às vésperas da Abolição tomou partido nessa questão nas “Constituições do Arcebispado da Bahia”, de 1885.
No que diz respeito à lei que define a própria situação do escravo este é somente propriedade, no tocante à lei penal ele tem uma dúbia situação: é pessoa se for agente do crime e coisa se for vítima. Dessa forma, o escravo poderia responder a um processo caso cometesse algum delito e seu senhor seria indenizado caso o escravo fosse vítima de alguém. As punições, mesmo não penais, aquelas cujo objetivo era disciplinar, tinham requintes de crueldade muito conhecidos por todos e, embora houvesse um acórdão da Relação do Rio de Janeiro de 1o de abril de 1879, que decidia que nenhum escravo pudesse dar queixa contra pessoa alguma, as denúncias contra maus-tratos aumentaram junto com o movimento abolicionista.
As sublevações que cresciam em número, conforme crescia o movimento abolicionista, geraram um movimento legislativo que visava refrear estas fugas e rebeliões, bem como reforçar precauções contra essa situação.
MOVIMENTO ABOLICIONISTA
É no pensamento Iluminista do século XVIII que podemos encontrar as primeiras ideias contrárias à escravidão, se antes deste movimento a escravidão era vista como um desígnio de Deus, depois passou a ser encarada como uma obra do homem e, portanto podia ser revogada. 
O movimento abolicionista se fortaleceu entre os iluministas franceses e entre os intelectuais ingleses e norte-americanos, que tinham como principal lema de luta a idéia de liberdade propagada após a Revolução Francesa (1789) e a Independência dos Estados Unidos (1776).
Paralelo a essas questões filosóficas, alimentando-se delas e sendo alimentados por elas, estava o interesse econômico de alguns países já capitalistas que passava a ditar regras que não incluíam a escravidão, aliás, abominavam-na como um entrave ao seu progresso econômico. A indústria trabalhava com uma mão de obra mais eficaz e mais barata, a assalariada, a massa cativa pareceria um entrave a modernização dos métodos de produção.
No Tratado de 1810 entre D. João e a Inglaterra havia uma cláusula que obrigava o então Príncipe Regente a proibir o tráfico negreiro “em outra alguma parte da Costa da África que não pertença atualmente aos domínios de Sua Alteza Real”.[3: QUEIROZ, Suely R. Reis de. A abolição da escravidão. 5. ed. São Paulo: Brasiliense, [198-], p. 22.]
Quando da independência do Brasil, a Inglaterra utilizou a necessidade do país em ter o reconhecimento de sua autonomia e conseguiu incluir no acordo uma cláusula que indicava que o tráfico seria extinto três anos após a ratificação de um novo acordo sobre o assunto, o que ocorreu em 13 de março de 1827. Depois desse período o tráfico seria tratado como pirataria. Resultado prático dessa lei: nunca tantos escravos foram traficados para o Brasil quanto depois que promulgaram uma lei que proibia tal ato, um aumento de aproximadamente 85% no número de escravos traficados para o Brasil.[4: Emilia Viotti da Costa indica que houve a entrada de 371.615 escravos no período de 1840-1851.]
REVOLUÇÃO INDUSTRIAL (XIX – 1840)
Segundo ANDRADE (2010), o século XIX viveu uma ebulição em torno da questão da escravidão. A Revolução Industrial iniciada na segunda metade do século XVIII na Inglaterra já passava a modificar os parâmetros sociais e econômicos e, por isso, a abolição da escravidão tanto pela Inglaterra como pelas demais nações do mundo estão diretamente relacionadas ao processo de industrialização. Mesmo antes da data oficial do fim da escravidão na Inglaterra já havia um movimento bastante representativo pela Europa e pelos Estados Unidos, em defesa do fim da escravidão. Para conclusão do projeto de industrialização a modificação das relações de trabalho e de mercado consumidor era essencial. Assim, dava-se maior importância à ampliação de mercados e da produtividade. O trabalho escravo e o monopólio práticas comuns da exploração colonial pareciam ultrapassados ao novo modelo, fomentado a partir da industrialização.
LEIS ABOLICIONISTAS
As leis abolicionistas foram aprovadas no Brasil entre 1850 e 1888 e fizeram parte da transição gradual que o país percorreu até decretar a abolição da escravatura. A saber:
LEI BILL ABERDEEN (1845)
Por essa lei, era conferido à Marinha inglesa o direito de aprisionar qualquer navio negreiro e dava aos tribunais ingleses do vice-almirantado o direito de julgar os traficantes presos nestas incursões.
Mesmo a ação inglesa contra o tráfico tendo se tornado mais rude ele continuou, um mercador de escravos que conseguisse que a cada um de seus três navios chegasse ao destino já fazia fortuna.
LEI EUSÉBIO DE QUEIRÓS (1850)
Por essa lei as embarcações brasileiras que fossem encontradas em qualquer parte e as estrangeiras encontradas nos portos, enseadas, ancoradouros ou mares territoriais do Brasil, tendo escravos a bordo ou já os tendo desembarcado, seriam apreendidas e consideradas importadoras de escravos. Estariam envolvidos no crime todos, inclusive os que dessem ajuda ao desembarque ou aqueles que soubessem e não avisassem as autoridades.
No artigo 6º afirmava que os escravos apreendidos deveriam, às custas do Estado,serem reenviados à África. Os africanos, embora considerados livres, eram entregues a um senhor e prestavam serviço a este por quatorze anos, depois destes eram considerados emancipados.
Passadas as preocupações relativas à Lei Eusébio de Queirós, o debate da abolição da escravatura voltou à tona. O Brasil, junto com Porto Rico e Cuba (colônias espanholas), eram um dos últimos lugares a permanecerem com a escravidão. Essa questão, aliada com as revoltas de escravos, fez alguns políticos começarem a cogitar a possibilidade de que uma legislação fosse criada em prol da abolição.
LEI DE TERRAS (1850)
A chamada Lei 601 ou Lei de Terras, de 1850, apresentou novos critérios com relação aos direitos e deveres dos proprietários de terra. Conforme retrata (SOUZA), essa nova lei surgiu em um “momento oportuno”, quando o tráfico negreiro passou a ser proibido em terras brasileiras. A atividade, que representava uma grande fonte de riqueza, teria de ser substituída por uma economia onde o potencial produtivo agrícola deveria ser mais bem explorado. Ao mesmo tempo, ela também responde ao projeto de incentivo à imigração que deveria ser financiado com a dinamização da economia agrícola e regularizaria o acesso a terra frente aos novos campesinos assalariados. Dessa maneira, ex-escravos e estrangeiros teriam que enfrentar enormes restrições para possivelmente galgarem a condição de pequeno e médio proprietário.  Dessa maneira, a Lei de Terras transformou a terra em mercadoria no mesmo tempo em que garantiu a posse da mesma aos antigos latifundiários.
LEI DO VENTRE LIVRE (1871)
O fim do tráfico negreiro trouxe consequências econômicas e ideológicas para o país. A mudança ideológica foi, em muito, auxiliada pelo impedimento de importação de escravos, visto que, com o fim do tráfico, a região sudeste passou a comprar escravos do norte que falia. Essa transferência gerou uma dupla consequência: agravou a situação do norte e não resolveu a situação do sul, entretanto no norte amadurecia o sentimento abolicionista. 
O movimento abolicionista crescia, a condenação da escravidão tornava-se cada vez mais lógica. Depois da Guerra de Secessão dos Estados Unidos, somente o Brasil como país independente e as colônias espanholas Porto Rico e Cuba mantinham a escravidão. 
A resistência por parte dos fazendeiros era muito forte, e a guerra do Paraguai só veio a aumentar as tensões, alguns escravos foram mandados à guerra pelos senhores que ambicionavam comendas e títulos, outros enviaram escravos no seu lugar ou no de seus filhos. Esses atos acabaram por gerar uma incoerência que consistia em fazer lutar pelo país quem era considerado pelo mesmo como coisa, o que acabou derivando em um Decreto a 6 de novembro de 1866, que dava liberdade aos escravos designados para o serviço do exército. Pela primeira vez havia alforria imposta pelo Estado.
Em 12 de maio de 1871, o governo apresentou o projeto que daria liberdade aos filhos das escravas: a Lei do Ventre Livre. Todo o debate que se seguiu à apresentação desse projeto era centrado na questão de se estar ou não violando o princípio constitucional do direito de propriedade, mas o Senador negro Torres Homem, político famoso de origens modestas afirmava que a propriedade de escravos era uma monstruosa violação de direito natural. Em 28 de setembro a Lei no 2.040, a Lei do Ventre Livre, foi aprovada pelas duas casas do Parlamento brasileiro.
Não serão de fato livres os filhos de escravas que nascerem a partir da data da lei. Eles ficarão em poder dos senhores que terão a obrigação de mantê-los até a idade de oito anos. Depois dessa idade, o proprietário ou entregava a criança ao Estado recebendo a quantia de 600$000 como indenização, ou ficaria com o liberto (tinham a coragem de chamá-lo assim) até os vinte e um anos, e até lá o rapaz ou a moça seriam obrigados a trabalhar por seu sustento.
LEI DO SEXAGENÁRIO (1885)
O abolicionismo passou a ser o assunto do momento, uma causa cristã que falava de filantropia. Ser abolicionista era ser identificado como moderno favorável ao progresso e à civilização. A agitação popular chegou ao auge no Ministério Dantas quando este apresentou um projeto de lei para libertação de escravos idosos. O projeto não tinha grandes consequências, libertava os pouquíssimos escravos que conseguiam chegar a seis décadas de vida, homens e mulheres que tinham restrita capacidade de trabalho, mas era uma emancipação sem indenização.
O presidente da Câmara, antiabolicionista por convicção e interesse, renunciou abrindo uma crise parlamentar, o Ministério foi dissolvido apesar do apoio da imprensa e dos grupos abolicionistas. Um novo ministério foi formado e apresentou o projeto anterior com modificações, principalmente no tocante a indenizações. Esse projeto tornou-se a Lei no 3.270, conhecida como Saraiva- Cotegipe ou Lei dos Sexagenários.
Mas o escravo não estaria realmente livre, seria obrigação do senhor “cuidar” dele até sua morte salvo se o juiz decidisse o contrário. E, pela Lei dos Sexagenários, mesmo aqueles que conseguiam com o juiz a chance de viverem longe de seus senhores não poderiam ir onde desejassem.
3.1 REAÇÃO AO MOVIMENTO ABOLICIONISTA
(SILVA, 2018), diz que quanto ao quadro de crescimento do movimento abolicionista, houve uma reação de grupos conservadores que tinha como objetivo frear as transformações sociais e econômicas que eram defendidas pelo movimento abolicionista. Essa reação conservadora reforça o perfil elitista de grande parte das classes políticas do final do século XIX, que tinham como grande interesse a manutenção do status quo (termo usado para referir-se ao estado atual das coisas). Em destaque as reações conservadoras aponta-se a Lei Saraiva, aprovada em 9 de janeiro de 1881. Essa lei realizou transformações consideráveis no sistema eleitoral brasileiro e contribuiu para excluir o direito ao voto de muitos. A eleição no Brasil deixou de ser indireta e tornou-se direta, mas a renda mínima anual exigida para se ter direito ao voto aumentou de 100 mil-réis para 200 mil-réis. Duas exigências que a Lei Saraiva impunha eram a pessoa comprovar a sua renda e assinar o documento de alistamento eleitoral. Caso a pessoa não assinasse esse documento, ela não poderia votar, e isso eliminava automaticamente todos os analfabetos, uma vez que estes não poderiam assinar o documento. Assim, essa lei atingia, especificamente, as camadas pobres compostas, em grande parte, por libertos e por negros livres (em decorrência da Lei do Ventre Livre) e, por meio de mecanismos legais, criava dificuldades para que esses grupos tivessem direito ao voto.
LEI AUREA (1888)
Os abolicionistas cresciam em número, o movimento se agigantava no país, mas o golpe de misericórdia veio mesmo dos próprios escravos que, com o auxílio dos abolicionistas, começaram a abandonar as fazendas causando o caos no trabalho e tornando a situação insustentável. O desespero tomou conta dos escravistas que em vão tentaram incluir o exército no combate às fugas e rebeliões. A saída era única: a abolição.
Em 13 de maio de 1888 a Princesa Isabel, regente na ausência de D. Pedro II, promulgou a lei que com simplicidade aboliu a escravidão no país.
	
 
Referências Bibliográficas: 
ANDRADE, Ana Luíza Mello Santiago de. Abolição da escravidão pela Inglaterra. Info Escola. 2010.
Disponível em: https://www.infoescola.com/historia/abolicao-da-escravidao-pela-inglaterra/
Acessado em: 04.09.2019 
CHALHOUB, Sidney. Visões da liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na corte. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
CASTRO, Flávia Lage de. História do Direito Geral e do Brasil. Capítulo XV “BRASIL IMPÉRIO”. ; 8. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora, 2010. 
COSTA, Emilia Viotti da. A abolição. 4. ed. São Paulo: Global, 1988. Da senzala à colônia. São Paulo: Brasiliense, [19 —].
QUEIROZ, Suely R. Reis de. A abolição da escravidão. 5. ed. São Paulo: Brasiliense,
[198-].
SILVA,Daniel Neves. Leis abolicionistas. Brasil Escola. 2018. 
Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/leis-abolicionistas
Acesso em: 04.09.2019.
SOUZA, Rainer Gonçalves. Lei de Terras de 1850. Brasil Escola.
Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/lei-terras-1850.htm
Acessado em: 06.09.2019

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