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PSICOLOGIA FENOMENOLÓGICA – ON LINE Nesta disciplina, você entrará em contato a Psicologia Fenomenológica, com ênfase nas possibilidades abertas pelo pensamento desenvolvido pelo filósofo Martin Heidegger (1989 – 1976) para a Psicologia. Apoiado na Fenomenologia de Edmund Husserl (1959 – 1938), ele questionou a ontologia metafísica e a tentativa de determinação substancial do ser da existência humana. Destacaremos sua compreensão da existência humana, denominada Dasein (ser-aí). Através dessa quebra do paradigma metafísico, Heidegger abre caminho para novas perspectivas de compreensão dos fenômenos humanos. Buscaremos compreender o projeto da Fenomenologia de Husserl, ‘aplicado’ por Heidegger na investigação da existência humana. Em seguida, estudaremos as implicações da compreensão da existência humana como Dasein para a Psicologia. Com isso, entraremos em contato com a compreensão dos fenômenos psicológicos a partir do enfoque da fenomenologia-existencial, na direção de compreender o lugar e as possibilidades de intervenção do psicólogo nessa abordagem. A descrição da existência realizada por Heidegger torna-se fundamento da psicopatologia e da psicoterapia chamada Daseinsanalyse, primeiramente por Ludwig Binswanger (1881 – 1966), depois por Medard Boss (1903 – 1990). Será nosso objetivo nesta disciplina conhecer e compreender os pressupostos epistemológicos e ontológicos do pensamento fenomenológico-existencial para promover a identificação deste método e da concepção de homem que lhe é pertinente com o lugar e a função do psicólogo no trato com o fenômeno psicológico e na promoção de saúde. Este material poderá ser utilizado como orientação para seu estudo e como complemento das atividades realizadas nas aulas presenciais. O programa da disciplina está distribuído em 8 módulos, que devem ser estudados ao longo do semestre letivo. Os módulos 1 a 4 serão objeto de avaliação na NP1 e os 5 a 8 serão avaliados na NP2. MÓDULO 1: INTRODUÇÃO À FENOMENOLOGIA DE EDMUND HUSSERL Apresentação dos dados biográficos de Edmund Husserl Introdução ao método fenomenológico e à consciência intencional Bibliografia Básica: FEIJOÓ, A. (2011) “Husserl e a Fenomenologia”. A existência para além do sujeito, pg. 25-34. MÓDULO 2: INTRODUÇÃO À FENOMENOLOGIA EXISTENCIAL DE MARTIN HEIDEGGER E À ANALÍTICA EXISTENCIAL O projeto fenomenológico de Heidegger A constituição ontológica da existência (Dasein) Bibliografia Básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “Analítica existencial e Daseinsanalyse”, cap.I.B., pg.34-56 MÓDULO 3: A CONDIÇÃO HUMANA DESCRITA PELA FENOMENOLOGIA EXISTENCIAL Temporalidade do Dasein. Angústia e finitude do Dasein Bibliografia obrigatória: SAPIENZA, B. (2015) Encontro com a Daseinsanalyse, pg. 48-95. MÓDULO 4: FENOMENOLOGIA EXISTENCIAL DA HISTÓRIA PESSOAL A concepção de história pessoal (historiobiografia) de Dulce Critelli Historiobiografia e Sentido da Vida na fenomenologia existencial Bibliografia básica: CRITELLI, D. (2012) História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. MÓDULO 5: A DASEINSANALYSE DE LUDWIG BINSWANGER Apresentação dos dados biográficos de L. Binswanger Noções básicas da Daseinsanalyse de L. Binswanger Bibliografia básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “A obra fundadora de Ludwig Binswanger (1881-1966)”, cap. II.A, pg.64-101 MÓDULO 6: A DASEINSANALYSE DE MEDARD BOSS Apresentação da Daseinsanalyse desenvolvida por Medard Boss Indicação dos existenciais pertinentes ao Dasein Bibliografia Básica: EVANGELISTA, P. (2011) A Daseinsanalyse de Medard Boss. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 139-158. MÓDULO 7: COMPREENSÃO E AÇÃO CLÍNICA Concepção de Psicoterapia daseinsanalítica Ação e compreensão na clínica fenomenológico-existencial Bibliografia básica: JARDIM, L.E. Ação e Compreensão na clínica fenomenológico-existencial. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 45 – 76. Bibliografia complementar: POMPÉIA, J. & SAPIENZA, B. “A terapia e a era da técnica”. In: POMPÉIA, J. & SAPIENZA, B. Os dos nascimentos do homem, pg. 123-140. MÓDULO 8: PROCESSOS PSICOTERAPÊUTICOS DASEINSANALÍTICO Compreensão dos fenômenos clínicos atuais Psicoterapia infantil fenomenológica existencial Bibliografia básica: FEIJOÓ, A. (2011) A clínica psicológica na tonalidade do temor, cap. 3.3.2, pg. 155-195. Bibliografia complementar: FEIJOÓ, A. (2011) A clínica psicológica com crianças, cap.3.1,4 p. 108-133. BIBLIOGRAFIA BÁSICA DASTUR, F. & CABESTAN, P. Daseinsanalyse: Fenomenologia e Psicanálise. 1ª ed. Rio de Janeiro: Via Verita, 2015. EVANGELISTA, P. (org) Psicologia fenomenológico-existencial – Possibilidades da atitude clínica fenomenológica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Via Verita, 2015. FEIJOÓ, A. M. L. C. A existência para além do sujeito: A crise da subjetividade moderna e suas repercussões para a possibilidade de uma clínica psicológica com fundamentos fenomenológico-existenciais. Rio de Janeiro: Via Verita, 2011. BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR CRITELLI, D. História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. São Paulo: EDUC, 2012. POMPÉIA, J. A. & SAPIENZA, B. T. Na Presença do Sentido: Uma aproximação fenomenológica a questões existenciais básicas. 2ª ed. São Paulo: EDUC, 2013. POMPÉIA, J. A.; SAPIENZA, B. T. Os dois nascimentos do homem: Escritos sobre terapia e educação na era da técnica. Rio de Janeiro: Via Verita, 2011. SAPIENZA, B. T. Do desabrigo à confiança: Daseinsanalyse e terapia. São Paulo: Escuta, 2007. SAPIENZA, B.T. Encontro com a Daseinsanalyse: A obra Ser e tempo, de Heidegger, com fundamento da terapia daseinsanalítica. São Paulo: Escuta, 2015. Indicamos a seguir alguns endereços eletrônicos cuja consulta é recomendada: PEPSIC – PERIÓDICOS ELETRÔNICOS EM PSICOLOGIA - http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php PERIÓDICOS CAPES - www.periodicos.capes.gov.br BIBLIOTECA VIRTUAL EM SAÚDE – BVS – http://www.bvs-psi.org.br BIBLIOTECA DIGITAL DE TESES E DISSERTAÇÕES (USP) - http://www.teses.usp.br/ SITE DO CENTRO DE FORMAÇÃO E COORDENAÇÃO DE GRUPOS EM PSICOLOGIA – http://www.fenoegrupos.com SITE DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DASEINSANALYSE – http://www.daseinsanalyse.org/ MÓDULO 1: INTRODUÇÃO À FENOMENOLOGIA DE EDMUND HUSSERL Apresentação dos dados biográficos de Edmund Husserl Introdução ao método fenomenológico e à consciência intencional Apresentação dos dados biográficos de Edmund Husserl Bibliografia Básica: FEIJOÓ, A. (2011) “Husserl e a Fenomenologia” A existência para além do sujeito. Rio de Janeiro: Via Verita, pg. 25-34. Edmund Husserl nasce em Prossnitz, na Morávia; atual Prostejov, República Tcheca, em 8 de abril de 1859, filho de comerciantes judeus. Em 1876, inicia seus estudos universitários em Leipzig. Concentra-se na matemática, mas estuda também física, astronomia, filosofia e psicologia com W. Wundt. Em 1882, doutora-se na Universidade de Viena com a tese O Cálculo das Variações. Em 1887, pouco antes de casar-se, defende a tese de habilitação Sobre o Conceito de Número: análise psicológica, na cidade de Halle. Essa trajetória culmina na Psicologia. Nessa época, a Psicologia era o estudo das faculdades mentais do homem. Até bem pouco tempo, era disciplina especulativa, filosófica. Quando Wundt funda o laboratório de psicologia científica em 1879, começa sua trajetória de ciência aplicada. Husserl acompanhou de perto essa transformação. A filosofia do fim do século XIX dividia-se entre duas vertentes: aqueles que defendiam uma base objetiva para o conhecimento e aqueles que o fundamentavam nas faculdades mentais. Os Naturalistas defendiam que a objetividade do conhecimento está na realidade objetiva, externa, “fora” do sujeito. Conhecer a natureza significa saber mensurá-la, a fim de revelar suas leis universais. Essas leis universais, as verdades universais, só são acessíveisatravés de hipóteses. Para isso, esse modelo de conhecimento dispõe da metodologia de observação, mensuração e classificação. Como toda a realidade é objetiva, física, também a consciência, da qual fala a Psicologia, deve ser física. Husserl, como grande pensador, leva ao limite as bases desse pensamento para expor sua contradição: se tudo pode ser reduzido à natureza física, também a concepção de que tudo pode ser reduzido à natureza física é apenas mais um processo físico, incapaz de sustentar-se como verdade universal. Do outro lado, os Psicologistas defendiam a mente como fundamento último de todo conhecimento. Para eles, a objetividade é dada pelo sujeito “puro” abstrato. As leis objetivas, o real, são convenções subjetivas explicáveis pelo psicólogo. Levando às últimas consequências essa fundamentação, também a Psicologia mina o conhecimento objetivo e científico-natural, pois, para ela, tudo é processo psicológico. As ciências, como a matemática, tornam-se relativas. O pensamento de Husserl recebe impulso dessa “crise” insuperável, na tentativa de encontrar solução. Para fundamentar o conhecimento verdadeiro – tarefa da filosofia – Husserl não poderá se apoiar nem no Naturalismo, nem no Psicologismo. A Fenomenologia surge como crítica à pretensão de cientificidade plena das ciências, ao recurso à dedução e à inferência como método de conhecimento (modelo hipotético) e à determinação psicofísica atribuída ao seu sujeito do conhecimento. (Feijoó, 2011) Introdução ao método fenomenológico e à consciência intencional A ascensão das Ciências Humanas amplia a crise das ciências. Qual seria a validade (verdade universal) das descobertas da antropologia, da sociologia ou mesmo da psicologia? A psicologia, num esforço para assegurar a verdade de suas afirmações, recorre ao método científico-natural de investigação. O teste de medição de inteligência desenvolvido por Alfred Binet (1857 -1911) é um exemplo disso; determina-se a inteligência como mensurável e cria-se um instrumento para a medir. Husserl, por outro lado, identifica a carência de fundamentos das ciências-naturais. É o Naturalismo, descrito anteriormente. Seu objetivo é, então, inaugurar um novo fundamento para a lógica, para a teoria do conhecimento e para a psicologia: uma ciência originária, primeira. A chave para a fenomenologia vem dos estudos com Franz Brentano (1838 – 1917). Opondo-se a Wundt, Brentano propõe que os atos mentais são experienciáveis, de modo que a psicologia, através da intuição (observação), é ciência empírica. Brentano apresenta os atos psíquicos como intencionais. Resgata esse conceito da filosofia de Aristóteles. Na tradução latina da filosofia aristotélica, intentio significa dirigir-se a... (Devemos tomar muito cuidado para não confundir este conceito com a ideia comum de “intenção”, que significa desejo, motivação, etc.) Desta ideia, Husserl desenvolve o a priori da correlação: consciência é consciência de... e todo objeto só é enquanto visado por uma consciência. Intencionalidade significa que toda consciência é de algo e todo algo só é enquanto referido à consciência que se tem dele. Nessa formulação, Husserl lança mão de um aspecto da Psicologia de Brentano que será característico da fenomenologia e de toda psicologia fenomenológica que nela se inspira: consciência é ato, não é um receptáculo. Com o conceito de intencionalidade, Husserl supera o Psicologismo, que prioriza o Sujeito na relação Sujeito-Objeto, e o Logicismo e Naturalismo, que priorizam o mundo objetivo e natural, o Objeto na relação Sujeito-Objeto. Para a fenomenologia, Sujeito e Objeto são intimamente relacionados, indissolúveis. Por isso, Feijoó (2011) afirma que Com a noção de intencionalidade, portanto, escapa-se das articulações metafísicas a partir da fenomenologia e encontram-se possibilidades outras de se tratar o fenômeno psíquico, sem perder a possibilidade de se falar em sentidos e significados psíquicos de maneira rigorosa. (p.33) A Fenomenologia surge como tentativa de elaboração de uma ciência rigorosa, capaz de fundamentar as várias ciências. Por isso, Husserl a chama de Ciência Primeira. O princípio de intencionalidade da consciência rege que toda consciência é consciência de algo e que todo algo só é tal como aparece na consciência. “Consciência”, entretanto, não é um recipiente vazio que se preenche; é um ato. O objeto ao qual se dirige e que surge na relação intencional é sempre significativo. Entretanto, nós não experienciamos essa relação íntima entre o nosso ver e a coisa vista, entre nosso sentir e a coisa sentida, entre nosso perceber e a coisa percebida. Husserl chama de atitude natural a nossa postura cotidiana de encontrar objetos “fora”, no mundo, como se existissem em si mesmos. A atitude natural pode ser descrita como aquela que consiste em pensar que o sujeito está no mundo como algo que o contém ou como uma coisa entre as demais. As ciências naturais operam sobre essa crença de que existem objetos em si no exterior, que podem ser observados, investigados e descritos a partir de suas propriedades imanentes. A atitude natural é a atitude ingênua. A fenomenologia busca superar a atitude ingênua suspendendo a crença na realidade da existência em si do mundo exterior, resgatando a consciência como condição de aparição do mundo. Essa etapa do método fenomenológico chama-se epoché e pode ser caracterizada como a colocação entre parênteses da realidade independente da consciência, para que a investigação fenomenológica se volte para a fenomenalização dos fenômenos, isto é, seu aparecer na correlação intencional. Pela redução fenomenológica, a consciência se mostra consciência constituinte de mundo. MÓDULO 2: INTRODUÇÃO À FENOMENOLOGIA EXISTENCIAL DE MARTIN HEIDEGGER E À ANALÍTICA EXISTENCIAL O projeto fenomenológico de Heidegger A constituição ontológica da existência (Dasein) Bibliografia Básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “Analítica existencial e Daseinsanalyse”, cap.I.B., pg.34-56 O livro de Heidegger, Ser e Tempo, publicado em 1927, tem como tarefa a elaboração da fenomenologia como filosofia. E filosofia é, para ele, perguntar pelo SER, isto é, o que é a realidade?, quem somos nós?, tal como feito por toda a história ocidental. O método fenomenológico exige que se suspendam os pressupostos. Assim, Heidegger “coloca entre parênteses” as definições de SER legadas pela tradição filosófica. Precisa perguntar ao SER mesmo o que é. Para isso, começa seu perguntar pelo “ente que compreende ser”, que é o homem. Isto é, a existência é por ele assumida não como animal racional, nem como psiquismo, mas como abertura para coisas, si mesmo e outros serem. Somente o homem pergunta o que é o mundo?, o que são as coisas?, o que sou eu? A tradição filosófica também deixou definições sobre o que é o homem. As várias abordagens psicológicas são exemplos disso; todas elas definem o que é o humano. Mas a fenomenologia é obrigada a colocar todas essas definições em suspensão. Com isso, Heidegger pergunta ao homem pelo seu ser, que seria o primeiro passo na colocação da pergunta pelo sentido de SER em geral. O livro Ser e Tempo torna-se, assim, uma analítica existencial. Heidegger reserva a este o termo Dasein, “ser-aí”, para diferenciá-lo dos demais entes. Traduzindo ao pé da letra, Da significa aí. Sein significa Ser. Dasein é ser-aí. Mas, Heidegger visa descrever não os homens concretos, mas o ser dos homens. Daí a distinção da fenomenologia existencial entre ôntico – que é dos entes históricos, “concretos” (“existenciário”) – e ontológico, que se refere ao ser dos entes (“existencial”). (DASTUR & CABESTAN, 2015, p.40). A analítica do Dasein (ou “analítica existencial”) é uma descrição de aspectos essenciais da existência humana. Heidegger chama esses aspectos de “existenciais”, para diferenciarda palavra “categorias”, usada na filosofia para descrever as propriedades do ser de tudo o que não é humano. Ser e Tempo defende que o humano não é como as demais coisas do mundo, pois 1) seu ser está sempre em jogo (ou seja, é uma questão em aberto) e 2) Dasein compreende ser (ou seja, é abertura para ser de coisas, outros e si mesmo). Medard Boss e Ludwig Binswanger, que desenvolvem a Daseinsanalyse, fundamentam os fenômenos encontrados na clínica nos “existenciais” descritos por Heidegger em Ser e Tempo. A constituição ontológica da existência (Dasein) Bibliografia Básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “Analítica existencial e Daseinsanalyse”, cap.I.B., pg.34-56 O conceito de Dasein se refere à constituição ontológica do ser que nós somos, costumeiramente chamados de “humanos”. Porém, Heidegger não utiliza o termo “ser humano” ou “homem” pois são termos que carregam significados não fenomenológicos acumulados ao longo da história do Ocidente. “Humano”, por exemplo, deriva de “húmus”, terra fértil, articulando-se com a tradição judaico-cristã de definição de homem. Por isso, Heidegger reserva o termo Dasein para indicar o ser que somos. (Cf. DASTUR & CABESTAN, 2015, p.34) No §9 de Ser e Tempo Heidegger escreve: “O ente que temos a tarefa de analisar somos nós mesmos. O ser deste ente é sempre cada vez meu. Em seu ser, isto é, sendo, este ente se comporta com o seu ser.” (1927, p.77) Isso significa que não há uma “essência” ou “natureza” para além dos modos concretos de existência. O livro Ser e Tempo é uma descrição fenomenológica – livre de pressupostos – da constituição ontológica do Dasein. Essa constituição é formada pelos “existenciais”, que são os caracteres ontológicos do Dasein. Resumindo a concepção de Dasein de Ser e Tempo, podemos afirmar que o homem é um ser que é aí, no mundo (ser-no-mundo). E ser no mundo significa ser sempre uma relação significativa consigo mesmo, com os outros e com coisas (mesmo que essas relações estejam implícitas). A analítica do Dasein revela que o homem é ontologicamente no-mundo e com-os-outros. Ser e Tempo não se detém nas descrições dos diversos modos concretos em que nos relacionamos com os outros, pois não é essa a tarefa de Heidegger. Sendo inacabado, o Dasein é ontologicamente possibilidade, ele se realiza em possibilidades. Isso significa que ninguém nasce pronto, mas precisa se realizar. Heidegger chama esse existencial de cura ou cuidado (Sorge, em alemão). O “realizar-se” é sempre situado em relação aos demais e à significatividade compartilhada. Não sendo pronto e acabado, o Dasein precisa sempre realizar-se como uma possibilidade; ao Dasein sempre está faltando algo. Heidegger diz que ele é sempre culpado. A palavra culpa, em alemão, é Schuld, que significa também débito. Sendo inacabado, a existência está sempre em dívida consigo mesma de realizar-se. A única possibilidade que encerra a culpa e que só pode ser vivida por cada qual singularmente é sua própria morte. O Dasein se relaciona constantemente com essa sua própria possibilidade. Entretanto, essa possibilidade nunca é vivenciada por cada um, pois, quando acontece, não estamos mais aí para vivenciá-la. MÓDULO 3: A CONDIÇÃO HUMANA DESCRITA PELA FENOMENOLOGIA EXISTENCIAL (A) Temporalidade do Dasein. Angústia e finitude do Dasein Temporalidade do Dasein. Bibliografia básica: SAPIENZA, B.T. Encontro com a Daseinsanalyse: A obra Ser e tempo, de Heidegger, como fundamento da terapia daseinsanalítica. São Paulo: Escuta, 2015, Pg. 48-95. O conceito de temporalidade é um conceito-chave na fenomenologia existencial. Heidegger escolhe-o para diferenciá-lo do conceito de tempo, que na tradição filosófica e no nosso uso comum já ficou associado ao tempo cronológico, o tempo do relógio. O tempo cronológico é uma sequência linear e infinita de “agoras”, que se inicia no passado e caminha em direção ao futuro. A modo de ser temporal do Dasein é outro. Heidegger se depara com essa questão quando se pergunta pela possibilidade de ser todo do Dasein. Ser todo significa: como o Dasein se completa? Dasein se completa quando realizou todas as suas possibilidades. Neste caso, o Dasein só seria todo quando deixa de ser. Porém, deixando de ser, não realiza essa possibilidade. O Dasein que somos pode, por outro lado, experimentar-se como ser finito. É o que Heidegger chama de “decisão antecipadora” da morte. Devemos tomar cuidado com esta ideia, pois não significa que o Dasein imagina a sua morte, menos ainda que a procure. Significa que o Dasein se assume como um ser finito, isto é, que não pode tudo e que "tem" um tempo limitado para ser. Ao fazer isso, abre-se para sua facticidade, isto é, para o ente intramundano junto ao qual já se encontra. Numa interpretação mais livre, podemos dizer que o Dasein reconhece a singularidade e finitude da situação na qual se encontra. O Dasein existe, então, sendo em relação com o que ele ainda não é, mas pode ser. Um sapateiro, por exemplo, encontra seus instrumentos como instrumentos para o conserto do sapato, que ainda não está consertado, mas “pode” estar. Do mesmo modo, o ser-no-mundo se compreende a partir de possibilidades (futuras) próprias. Antecipa-se a si mesmo. Ao antecipar-se (futuro) presentifica seu mundo, no qual já estava. Um sapateiro, antecipando o consertar e antecipando-se como sapateiro, encontra-se com seu mundo naquela situação. Porvir (o termo que Heidegger usa para se referir ao futuro, protegendo-o das significações já cristalizadas), ser-sido (o termo que Heidegger usa para se referir ao passado, pelo mesmo motivo) e presentificação acontecem juntos; não há separação entre passado, presente e futuro. Por isso, a analítica do Dasein distinguirá dois modos de temporalização do Dasein: o próprio e o impróprio. Resumidamente, na temporalização imprópria o ser-no-mundo “vem a si”, compreende-se, a partir do que lhe acontecerá. Dessa forma, esquiva-se do peso do ter-que-ser, que a antecipação da morte desvela, esperando algo. Na temporalização própria, Dasein vem a si mesmo como ser finito, lançado e responsável por ser. Em Ser e Tempo, a possibilidade da morte aparece como a única na qual ninguém pode ser substituído por outrem. A antecipação da morte singulariza o Dasein, portanto, revelando que sua existência está sob seu encargo exclusivamente. A afirmação III vai de encontro com essa ideia, pois sugere que o ser-para-a-morte revela que cada um é substituível na sua existência. Equivocada também está a afirmação IV. A fenomenologia-existencial trabalha com fenômenos, buscando encontrar neles seu sentido. A ideia de tendências latentes é uma hipótese teórica, que não condiz com o fenômeno. O fenomenólogo não tem base fenomenológica para tal inferência. Pelo contrário, pois no poema Mario Quintana transmite um júbilo por reconhecer sua finitude, que torna os momentos de sua vida únicos e irrepetíveis. Angústia e finitude do Dasein As considerações de Heidegger acerca da temporalidade se desdobram na finitude do Dasein. Como vimos, a finitude não coincide com a morte. “Antecipação da morte” não significa imaginar-se morrendo. Até o contrário. Antecipação da morte significa assumir-se como um ser único, insubstituível, destinado a ser. Existir é tarefa. Essa ideia de Heidegger se faz presente no Existencialismo de Sartre através da ideia de que o homem é condenado a ser livre. O conceito de temporalidade, como já vimos, expressa o modo mais originário da existência de lidar com tempo; mais precisamente, de lidar com o próprio tempo. Embora Dasein lide cotidianamente com o tempo como uma sequência infinita de agoras (tempo cronológico), seu tempo mais original é aquele que reconhece sua finitude. Lançada na facticidade, a existência é um intervalo entre dois nadas. O nada se manifestana angústia. É a dissolução do mundo, que revela ao Dasein seu ser como cuidado. Como cuidado, existir é tarefa que só se completa quando o Dasein realiza sua derradeira possibilidade. Heidegger lembra que a possibilidade da impossibilidade não pode ser confundida com a morte biológica. Numa passagem de Ser e Tempo, comenta que a morte biológica pode interromper possibilidades, assim como tardar a chegar. A temporalidade do Dasein traz muitas implicações para a compreensão dos fenômenos que interessam ao psicólogo. A primeira e mais radical é de que a existência humana não pode ser compreendida como um desenvolvimento linear do passado em direção ao futuro. Isto abre um forte debate com as psicologias explicativas. O pensamento natural-científico faz coincidir o sentido do fenômeno com sua causação temporalmente anterior. Ao observar um fenômeno psicológico, não se interessa por o que ele revela (seu sentido), mas imediatamente pergunta por que se dá dessa maneira, buscando sua resposta na sequencia temporal. Se for preciso indicar uma ênfase na temporalidade para a fenomenologia existencial, será o futuro, que Heidegger chama de porvir exatamente para diferenciar das significações já cristalizadas de futuro. O porvir é uma possibilidade de ser si mesmo que o Dasein assume como sua. A partir dessa possibilidade advém a si a sua história e os entes pertinentes. Em outras palavras, eu sou o que posso ser. É por isso que as psicologias humanistas, que se inspiram na fenomenologia-existencial (Não confundamos Psicologia Humanista com Daseinsanalyse!!!), enfatizam os projetos do ser humano, ao invés de buscar explicações em seu passado. O conceito de temporalidade traz grandes repercussões na psicopatologia. Os primeiros psicopatologistas fenomenológicos (Jaspers, Minkowski) elaboraram descrições das vivências psicopatológicas tendo em vista a temporalidade. Por exemplo, a depressão é um encurtamento no porvir, de modo que para o deprimido vem a ser apenas a perpetuação da dor e da tristeza. Talvez a mais importante implicação seja a nova ênfase dada aos conceitos de angústia e morte na prática clínica. A Daseinsanalyse coloca esses conceitos como centro de sua preocupação, reconhecendo nos fenômenos “psicológicos” modos de lidar com a própria finitude, antecipada, e com a angústia, enquanto perda de mundo e de si mesmo. MÓDULO 3: O CARÁTER DE PODER-SER DO DASEIN: FINITUDE (B) Temporalidade do Dasein. Angústia e finitude do Dasein Temporalidade do Dasein. Bibliografia obrigatória: SAPIENZA, B.T. Encontro com a Daseinsanalyse: A obra Ser e tempo, de Heidegger, com fundamento da terapia daseinsanalítica. São Paulo: Escuta, 2015, Pg. 48 – 95. Bibliografia complementar: FEIJOÓ, A. M. “As tonalidades afetivas e a daseinsanalyse: Medard Boss.” A existência para além do sujeito: A crise da subjetividade moderna e suas repercussões para a possibilidade de uma clínica psicológica com fundamentos fenomenológico-existenciais. Rio de Janeiro: Via Vérita, 2011, Pg. 71 – 84. O conceito de temporalidade é um conceito-chave na fenomenologia-existencial. Heidegger escolhe-o para diferenciá-lo do conceito de tempo, que na tradição filosófica e no nosso uso comum já ficou associado ao tempo cronológico, o tempo do relógio. O tempo cronológico é uma sequência linear e infinita de “agoras”, que se inicia no passado e caminha em direção ao futuro. A modo de ser temporal do Dasein é outro. Heidegger se depara com essa questão quando se pergunta pela possibilidade de ser todo do Dasein. Ser todo significa: como o Dasein se completa? Dasein se completa quando realizou todas as suas possibilidades. Neste caso, o Dasein só seria todo quando deixa de ser. Porém, deixando de ser, não realiza essa possibilidade. O Dasein que somos pode, por outro lado, experimentar-se como ser finito. É o que Heidegger chama de “decisão antecipadora” da morte. (Feijoó, 2011, p.41) Devemos tomar cuidado com esta idéia, pois não significa que o Dasein imagina a sua morte. Significa que o Dasein se assume como finito. Ao fazer isso, abre-se para sua facticidade, isto é, para o ente intramundano junto ao qual já se encontra. Numa interpretação mais livre, podemos dizer que o Dasein reconhece a singularidade e finitude da situação na qual se encontra. (Feijoó, 2011) O Dasein existe, então, sendo em relação com o que ele ainda não é, mas pode ser. Um sapateiro, por exemplo, encontra seus instrumentos como instrumentos para o conserto do sapato, que ainda não está consertado, mas “pode” estar. Do mesmo modo, o ser-no-mundo se compreende a partir de possibilidades (futuras) próprias. Antecipa-se a si mesmo. Ao antecipar-se (futuro) presentifica seu mundo, no qual já estava. Um sapateiro, antecipando o consertar e antecipando-se como sapateiro, encontra-se com seu mundo naquela situação. Porvir (o termo que Heidegger usa para se referir ao futuro, protegendo-o das significações já cristalizadas), ser-sido (o termo que Heidegger usa para se referir ao passado, pelo mesmo motivo) e presentificação acontecem juntos; não há separação entre passado, presente e futuro. Por isso, a analítica do Dasein distinguirá dois modos de temporalização do Dasein: o próprio e o impróprio. Resumidamente, na temporalização imprópria o ser-no-mundo “vem a si”, compreende-se, a partir do que lhe acontecerá. Dessa forma, esquiva-se do peso do ter-que-ser, que a antecipação da morte desvela, esperando algo. Na temporalização própria, Dasein vem a si mesmo como ser finito lançado e responsável por ser. Em Ser e Tempo, a possibilidade da morte aparece como a única na qual ninguém pode ser substituído por outrem. A antecipação da morte singulariza o Dasein, portanto, revelando que sua existência está sob seu encargo exclusivamente. A afirmação III vai de encontro com essa idéia, pois sugere que o ser-para-a-morte revela que cada um é substituível na sua existência. Equivocada também está a afirmação IV. A fenomenologia-existencial trabalha com fenômenos, buscando encontrar neles seu sentido. A idéia de tendências latentes é uma hipótese teórica, que não condiz com o fenômeno. O fenomenólogo não tem base fenomenológica para tal inferência. Pelo contrário, pois no poema Mario Quintana transmite um júbilo por reconhecer sua finitude, que torna os momentos de sua vida únicos e irrepetíveis. Angústia e finitude do Dasein As considerações de Heidegger acerca da temporalidade se desdobram na finitude do Dasein. Como vimos, a finitude não coincide com a morte. “Antecipação da morte” não significa imaginar-se morrendo. Até o contrário. Antecipação da morte significa assumir-se como um ser único, insubstituível, destinado a ser. Existir é tarefa. Essa ideia de Heidegger se faz presente no Existencialismo de Sartre através da ideia de que o homem é condenado a ser livre. O conceito de temporalidade, como já vimos, expressa o modo mais originário da existência de lidar com tempo; mais precisamente, de lidar com o próprio tempo. Embora Dasein lide cotidianamente com o tempo como uma sequência infinita de agoras (tempo cronológico), seu tempo mais original é aquele que reconhece sua finitude. Lançada na facticidade, a existência é um intervalo entre dois nadas. O nada se manifesta na angústia. É a dissolução do mundo, que revela ao Dasein seu ser como cuidado. Como cuidado, existir é tarefa que só se completa quando o Dasein realiza sua derradeira possibilidade. Heidegger lembra que a possibilidade da impossibilidade não pode ser confundida com a morte biológica. Numa passagem de Ser e Tempo, comenta que a morte biológica pode interromper possibilidades, assim como tardar a chegar. A temporalidade do Dasein traz muitas implicações para a compreensão dos fenômenos que interessam ao psicólogo. A primeira e mais radical é de que a existência humana não pode ser compreendidacomo um desenvolvimento linear do passado em direção ao futuro. Isto abre um forte debate com as psicologias explicativas. O pensamento natural-científico faz coincidir o sentido do fenômeno com sua causação temporalmente anterior. Ao observar um fenômeno psicológico, não se interessa por o que ele revela (seu sentido), mas imediatamente pergunta por que se dá dessa maneira, buscando sua resposta na sequencia temporal. Se for preciso indicar uma ênfase na temporalidade para a fenomenologia-existencial, será o futuro, que Heidegger chama de porvir exatamente para diferenciar das significações já cristalizadas de futuro. O porvir é uma possibilidade de ser si mesmo que o Dasein assume como sua. A partir dessa possibilidade advém a si a sua história e os entes pertinentes. Em outras palavras, eu sou o que posso ser. É por isso que as psicologias humanistas, que se inspiram na fenomenologia-existencial (Não confundamos Psicologia Humanista com Daseinsanalyse!!!), enfatizam os projetos do ser humano, ao invés de buscar explicações em seu passado. O conceito de temporalidade traz grandes repercussões na psicopatologia. Os primeiros psicopatologistas fenomenológicos (Jaspers, Minkowski) elaboraram descrições das vivências psicopatológicas tendo em vista a temporalidade. Por exemplo, a depressão é um encurtamento no porvir, de modo que para o deprimido vem a ser apenas a perpetuação da dor e da tristeza. Talvez a mais importante implicação seja a nova ênfase dada aos conceitos de angústia e morte na prática clínica. A daseinsanalyse coloca esses conceitos como centro de sua preocupação, reconhecendo nos fenômenos “psicológicos” modos de lidar com a própria finitude, antecipada, e com a angústia, enquanto perda de mundo e de si mesmo. MÓDULO 4: FENOMENOLOGIA EXISTENCIAL DA HISTÓRIA PESSOAL A concepção de história pessoal (historiobiografia) de Dulce Critelli Historiobiografia e Sentido da Vida A concepção de história pessoal (historiobiografia) de Dulce Critelli Bibliografia básica: CRITELLI, D. História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. São Paulo: EDUC, 2012. A filósofa Dulce Critelli fundamenta suas reflexões nas filosofias de Martin Heidegger e Hannah Arendt, que, por sua vez, fornecem importantes compreensões para psicologia fenomenológica existencial. Para a autora, ambos os pensadores são complementares, mas há uma diferença notável entre eles no que tange ao sentido da filosofia. Enquanto para Heidegger a filosofia exige descomprometimento com a vida cotidiana, para a ex-aluna de Heidegger radicada nos EUA, a filosofia é a capacidade de avaliar a vida e de modificá-la. Para Arendt, a filosofia mantém uma relação íntima com a ação. Segundo Critelli (2012), “Quando pensamos, transformamos nossas crenças e, consequentemente, transformamos nosso jeito de viver.” (p.17) Por ação, Arendt se refere à condição humana. Existir é ser iniciador. Fiel ao princípio fenomenológico existencial de suspensão radical de quaisquer a priori que substancializam a existência, Arendt concebe o ser-no-mundo-com-os-outros como ação e palavras. A ação inicia algo novo mundo. Seu sentido vai se desvelando nas repercussões, consequências e desdobramentos. Por isso, o sentido de todo gesto humano depende dos outros. Nas palavras de Critelli (2013), Nossos atos e palavras não são autosignificantes. Se eles ganham impulso nas nossas intenções, raramente as realizam. De um lado, porque à medida que se destinam aos outros (por condição humana, iniciadores como nós), eles podem interferir neles e modificar seu sentido. De outro lado, porque o sentido e o significado de nossos atos e palavras sé se completam pelos efeitos e consequências que provocam. (p.36) Assim, a existência, que é concomitantemente singular (eu sou) e plural (no mundo com os outros), pode perder a autoria de sua história. Como atora dos próprios gestos, seus significados podem ser transformados pelos outros. A fala é a capacidade de explicitar o sentido intencionado, preservando a autoria da ação. Essas reflexões são muito importantes para a psicologia fenomenológica existencial, pois esta suspende as noções de psiquismo, sujeito e indivíduo, reconhecendo o outro como existência singular e plural, no mundo com os outros, constitutivamente estando em jogo a autoria de sua biografia. Historiobiografia e Sentido da Vida A filósofa Dulce Critelli nomeia Historiobiografia a “abordagem terapêutico-pedagógica que tem por intenção a redescoberta do sentido da vida através da compreensão da história pessoal.” (p.12) Esse termo é composto por história e biografia, apontando para dois aspectos fundamentais do existir humano. História significa tanto o “conjunto de conhecimentos relativos ao passado da humanidade” (HOUAISS, 2013), quanto uma narrativa. Esses dois sentidos de articulam na existência humana. Somos seres históricos, isto é, lançados em contextos significativos históricos compartilhados já dados, e biográficos, isto é, que constituímos nossa história pessoal ao longo do existir. Por isso, quem é alguém só pode ser dito quando já foi; a todo momento nossas ações podem inaugurar novos sentidos, que reverberam no já vivido. A todo o momento é possível uma reflexão sobre a história que está em andamento. Isso é necessário, pois existir é estar em risco de perder o próprio ser (a autoria da própria vida) nas interpretações do senso comum. Também é fundamental para cuidar das possibilidades porvindouras, realizando a possibilidade humana de lançar-se em direção ao que ainda não é, mas pode ser (POMPEIA, 2012), cuidando para que a vida seja melhor. Critelli (2012) indica três “guias de viver”: 1) Relatos, 2) Historietas e 3) Histórias. Diferenciam-se pela abrangência temporal e pela complexidade de cada um. A identidade pessoal se costura pelos fios dessas formas de narrativa. Referências Bibliográficas CRITELLI, D. História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. São Paulo: EDUC, 2012. POMPÉIA, J. A.; SAPIENZA, B. T. Os dos nascimentos do homem: Escritos sobre terapia e educação na era da técnica. Rio de Janeiro: Via Vérita, 2011. MÓDULO 5: A DASEINSANALYSE DE LUDWIG BINSWANGER Apresentação dos dados biográficos de L. Binswanger Noções básicas da Daseinsanalyse de L. Binswanger Bibliografia básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “A obra fundadora de Ludwig Binswanger (1881-1966)”, cap. II.A, pg.64-101 Apresentação dos dados biográficos de L. Binswanger Ludwig Binswanger (1881 – 1966) é da terceira geração de psiquiatras em sua família responsáveis pelo sanatório de Bellevue. Após formar-se em medicina, faz residência psiquiátrica na clínica de Burghözli, chefiada por Eugen Bleuler (que cunha a esquizofrenia), sob supervisão de Carl Jung. A psiquiatria dessa época era ou organicista, ou psicanalítica (Freud). Em Burghözli, a psicanálise florecia, sendo Bleuler um importante disseminador das ideias de Freud e Jung, então, importante entusiasta. Durante a residência Binswanger aprofunda seus estudos na psicanálise, o que o leva a iniciar correspondência com Freud que perdura até falecimento deste. Mas o interesse pela psicanálise e a proximidade com seu fundador não impedem que Binswanger, desde cedo, questione o naturalismo da psicanálise. Encontra fundamentação para sua crítica primeiro na fenomenologia de Husserl e sua concepção de consciência intencional e, em seguida, na descrição da existência empreendida por Heidegger em Ser e tempo. Daí a ser o primeiro a desenvolver uma Daseinsanalyse voltada para o sofrimento existencial (não “psíquico”) manifesto na psicopatologia. Da analítica existencial, Binswanger recolhe a noção de ser-no-mundo, a fim de buscar uma compreensão dos modos de ser psicopatológico como modificação nessa estrutura. Ou seja, na experiência psicopatológica, mundo estrutura-se diferentementeque na experiência saudável. O início da influência de Heidegger em sua obra se faz notar a partir de 1930, quando publica o artigo Sonho e Existência. Esse artigo, cuja tradução para o francês foi prefaciada por Michel Foucault, encontra-se traduzido para o português1. Nele, Binswanger discute a experiência onírica, tema tão caro à psicanálise, contrapondo à hipótese freudiana genética e simbólica a ideia de que o sonhar é um modo de existir. Cabe ao investigador fenomenólogo compreender a experiência manifesta no sonho e, principalmente, o “espaço afinado” que nele se apresenta. Isto é, o sonho revela o mundo espacial e temporal peculiar ao sonhador. Como afirmam DASTUR & CABESTAN (2015, p.72), “É o tema que o Dasein se dá no sonho que é importante, não o que ele simboliza, e é, então o conteúdo desse drama, dessa ação que é o sonho, que constitui seu elemento decisivo.” O sonho não é produzido por uma subjetividade, como propunha Freud, mas um acontecimento, uma visitação; “vem a mim um sonho”. Do filósofo pré-socrático Heráclito Binswanger retoma a oposição entre mundo privado (idion) e mundo comum (koinon). Em vigília, a existência compartilha com os demais um mesmo mundo (koinon), ao passo que dormindo, está solitário (idios). Essa oposição se articula à compreensão de Binswanger da experiência psicopatológica como envolvimento com o mundo próprio em detrimento da experiência compartilhada. Ao contato cotidiano com o sofrimento psicopatológico, Binswanger acrescenta uma preocupação epistemológica e metodológica com a psiquiatria, que deveria, na sua concepção, fundamentar-se numa visão clara e correta sobre a existência, que o discurso científico não é capaz de fornecer. Nota de rodapé 1. BINSWANGER, Ludwig. O sonho e a existência. Nat. hum., São Paulo , v. 4, n. 2, p. 417-449, dez. 2002 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-24302002000200007&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 22 jan. 2016. Noções básicas da Daseinsanalyse de L. Binswanger A primeira fase daseinsanalítica da psiquiatria de Binswanger apoia-se na analítica existencial de Ser e tempo, de Heidegger, conforme discutido acima. O primeiro marco desse trabalho é o artigo “Sonho e Existência”, que discute os fenômenos de ascensão e queda como modos de a existência especializar-se. Em 1942 o psiquiatra publica sua principal obra, Formas fundamentais e conhecimento do Dasein, na qual enuncia sua “visão de homem”. Recorre à analítica existencial de Heidegger, mas substitui o cuidado como essência do Dasein pela relação dual Eu-Tu (descrita por Martin Buber).1 Elabora, assim, uma fenomenologia do amor, que, a seu ver, é o fundamento do ser si-mesmo do Dasein. Explicam Dastur & Cabestan (2015): Encontram-se repetidas vezes alusões a essa diferença fundamental de ponto de vista, sendo o ponto de partida da análise existencial de Heidegger a Jemeingkeit, a qualidade do que é sempre a cada vez meu, ao passo que o da antropologia biswangueriana é a Ursrigkeit, a nostridade. (p.80) Em razão dessa diferença, o pensamento de Binswanger distancia-se de Heidegger e retorna à fenomenologia de Husserl, mais precisamente à questão da consciência interna do tempo. A análise fenomenológica da consciência do tempo empreendida por Husserl mostra que tempo não é algo objetivo, cronológico, externo à consciência. A consciência do tempo diz respeito à articulação a cada momento do que já foi objeto da consciência (e permanece como retido – “retenção”) e o que é antecipado (“protenção”). Dito em termos menos precisos, passado e futuro estão presentes a cada momento. Binswanger retoma essa análise husserliana para considerar modificações estruturais na consciência de tempo na psicopatologia. Por exemplo, no melancólico o futuro é vivenciado como já vivido; “a proteção está infiltrada de momentos retentivos.” (DASTUR & CABESTAN, 2015, p.92). No maníaco, retenções e protenções cedem lugar ao instante atual, de modo a vivenciar somente o presente, a momentaneidade. No esquizofrênico, a estrutura temporal esfalece-se, aniquilando a experiência vivida. Binswanger é fenomenológico na concepção de realidade que subjaz às análises da psicopatologia. Para ele, “o mundo real reside apenas na pressuposição constantemente prescrita de que a experiência continuará constantemente a se desenrolar segundo o mesmo estilo constitutivo.” (BINSWANGER, 1993, apud DASTUR & CABESTAN, 2015, p.90) Ou seja, mundo é uma trama de sentido que tende a permanecer a mesma. Mas, na experiência psicopatológica, esse apoio se perde. Notas de rodapé 1. Sobre o cuidado, ver o Módulo 3 e sua respectiva bibliografia: SAPIENZA, B.T. Encontro com a Daseinsanalyse: A obra Ser e tempo, de Heidegger, como fundamento da terapia daseinsanalítica. São Paulo: Escuta, 2015, Pg. 48-95. MÓDULO 6: A DASEINSANALYSE DE MEDARD BOSS Apresentação da Daseinsanalyse desenvolvida por Medard Boss Indicação dos existenciais pertinentes ao Dasein Bibliografia Básica: EVANGELISTA, P. A Daseinsanalyse de Medard Boss. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 139 – 158. Bibliografia Complementar: FEIJOÓ, A. M. A Existência para além do Sujeito. Cap. II, 2.2. “As tonalidades afetivas e a daseinsanalyse: Medard Boss.”, pág. 71 – 84. Como já vimos, a fenomenologia-existencial é um movimento filosófico identificado com a obra de Martin Heidegger. Ser e Tempo, publicado em 1927, ‘utiliza’ a metodologia fenomenológica de Husserl para mostrar e fazer ver o fenômeno da existência humana a partir de si mesmo, e não de teorias. Assim, os existenciais são uma descrição fenomenológica da existência. Antes da publicação de Ser e Tempo, a fenomenologia de Husserl já tinha sido ‘importada’ para as ciências psicológicas. Foi Karl Jaspers (1883 – 1969), psiquiatra e aluno de Husserl, que primeiramente se propôs a descrever a experiência vivenciada por pacientes internados em hospital psiquiátrico. Seu importante livro Psicopatologia Geral (1913) é um marco na Psicopatologia. Nele, Jaspers segue o método fenomenológico husserliano para descrever a vivência psicopatológica como fenômeno. Além disso, manifesta uma crítica ao emprego da metodologia científico-natural na compreensão dos fenômenos humanos. A psicopatologia do começo do século XX fundamentava-se na medicina organicista e, em centros de vanguarda, na psicanálise freudiana. Ambas as perspectivas são causais e explicativas. A fenomenologia de Husserl aparece, então, como um método descritivo da experiência humana. Esse passo inicial dado por Jaspers é seguido por outros psiquiatras nas décadas seguintes, como o francês Eugene Minkowski (1885 – 1972) e os alemães Erwin Straus (1891 – 1975) e Von Gebsatel (1883 – 1974). A publicação de Ser e Tempo em 1927 traz novas possibilidades de compreensão dos fenômenos humanos, inaugurando uma ‘segunda fase’ do pensamento fenomenológico na compreensão dos fenômenos psicológicos. O termo “daseinsanalyse” aparece pela primeira vez no tratado de Heidegger. Lá, como vimos, significa uma descrição dos ‘existenciais’, que são a constituição ontológica do ser que somos. O primeiro psiquiatra a reconhecer a importância da concepção de Dasein para a psicopatologia foi Ludwig Binswanger. Em 1941, Binswanger elabora uma daseinsanalyse psiquiátrica como novo método de investigação dos fenômenos psiquiátricos. Percebe-se uma modificação no significado do conceito, que na filosofia de Heidegger era ontológico (descrição do ser) e agora se torna ôntico (descrição de modos concretos). Binswanger apóia-se em Ser e Tempo para desfazer a dicotomia sujeito-objeto, que para ele é um “verdadeiro câncer da ciência.” (Boss, “Análise existencial – daseinsanalyse”). Segundo Binswanger, “Uma psicoterapia de base analítico existencial investiga a história de vida do doente e tratamento (…) Explica a biografía e suas particularidadespatológicas (…) como uma modificação da estrutura total do ser-no-mundo…” (Binswanger, “Análisis existencial y psicoterapia”, p.459, tradução própria) Segundo Boss, a compreensão que Binswanger desenvolve de Ser e Tempo é equivocada, pois confunde ôntico e ontológico, vindo a sentir a necessidade de acrescentar a relação de amor ao existencial “cura”. Revelada sua confusão, Binswanger mesmo deixa de considerar suas investigações daseinsanalíticas, preferindo considerá-las uma “antropologia fenomenológica”. Daseinsanalyse torna-se o termo para se referir ao esforço de Medard Boss, com auxílio de Heidegger, para compreender os fenômenos humanos saudáveis e patológicos a partir da compreensão da existência humana como Dasein. Indicação dos existenciais pertinentes ao Dasein A descrição fenomenológica da existência como ser-no-mundo possível é o fundamento da compreensão fenomenológico-existencial. O psicólogo que fundamenta o seu trabalho nesta abordagem está interessado em compreender junto ao(s) outro(s) como é seu mundo e como se lança nesse que é o seu mundo, resgatando sua condição ontológica de ser-possível. A fenomenologia-existencial não é uma teoria. Teorias são construtos hipotéticos utilizados para explicar as causas não-observáveis de fenômenos observáveis. A fenomenologia é o oposto disso, pois se propõe a compreender o modo de ser do fenômeno tal como aparece. Na psicologia, isso significa compreender a existência do(s) outro(s). A descrição da existência em Ser e Tempo serve como parâmetro para nortear essa compreensão. Os existenciais são coordenadas para a compreensão. Por exemplo, a vivência de um paciente será compreendida à luz de como é com-os-outros, como espacializa, temporaliza, assume sua existência como própria e singular, etc. A fenomenologia-existencial abole a noção de consciência em prol do ser-aí, que é a existência enquanto abertura de mundo. Com isso, abandona a primazia cognitiva que fundamenta grande parte da psicologia do século XX. Deixa de lado também noções preconcebidas de saúde e doença. Assim, o psicólogo fenomenológico-existencial aproxima-se da existência do outro como um ser-possível responsável por seu ser-no-mundo. MÓDULO 7: COMPREENSÃO E AÇÃO CLÍNICA NA PERSPECTIVA FENOMENOLÓGICO-EXISTENCIAL Compreender a ação clínica na perspectiva fenomenológico-existencial e o lugar e as possibilidades do psicólogo nesse contexto teórico. Bibliografia básica: JARDIM, L.E. Ação e Compreensão na clínica fenomenológico-existencial. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 45 – 76. POMPÉIA, J. A.; SAPIENZA, B. T. “Uma caracterização da Psicoterapia” In: Na Presença do Sentido: Uma aproximação fenomenológica a questões existenciais básicas. São Paulo: EDUC, 2010. Bibliografia complementar: BARRETTO, C.L.B.T. A Ação Clínica e a Perspectiva Fenomenológica Existencial In: MORATO, H. et al. (org.) Aconselhamento Psicológico numa Perspectiva Fenomenológica Existencial: Uma Introdução, pp. 41- 51. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009. Concepção de uma Psicoterapia daseinsanalítica Para uma compreensão adequada da ação clínica na perspectiva fenomenológico-existencial temos que considerar a definição de psicoterapia daseinsanalítica como “procura, via poiesis, pela verdade que liberta para a dedicação ao sentido.” (Pompeia, 2004. pp.169). Para entendermos o sentido dessa definição, precisamos ter clareza sobre os termos que a compõem, todos eles pertencentes ao contexto fenomenológico existencial. Em Ser e Tempo, Heidegger (1927/1998) indica cura como essência do Dasein. Etimologicamente, cura remete a cuidado; o Dasein é o ente que, existindo, cuida de ser. No contexto psicoterapêutico, o sofrimento psicológico indica restrições nas possibilidades de existir. Assim, a terapia é pro-cura significando que ela vai em direção ao cuidado, favorecendo-o. Poiesis é o termo grego, origem da palavra poesia. Significa pro-dução, isto é, realização de algo que antes não existia, condução de algo possível ao aberto do mundo. Poiesis está associado a techné (Cf. Módulo 05), que é a ação que propicia o surgimento de algo. Poiesis é uma modalidade de discurso: a fala poiética. Nesse modo de discurso, algo se apresenta e pode ser abarcado, compreendido, compartilhado. O discurso poiético está no polo oposto do discurso lógico, persuasivo. Para compreendermos ‘liberdade’, precisamos desdobrá-la em ‘liberdade de...’ e ‘liberdade para...’ O senso comum entende liberdade como ausência de solicitações (liberdade de...). Em geral, quando alguém procura terapia está querendo se livrar de algo que oprime e restringe. Mas a terapia age na direção da liberdade para ouvir, compreender e poder (obedecer, de ob-audire) lidar com as solicitações do existir. Na concepção latina, verdade vem do étimo veritas, que significa a correspondência entre a ideia (conceito) e o objeto. Ao longo da história filosófica ocidental, a correspondência é garantida pelo método, que deve seguir as regras lógicas de demonstração. Assim, a verdade (veritas) é demonstrável. Mas, veritas é a tradução latina para o termo grego aletheia, que significa des-velamento, des-ocultação. Heidegger (1927/1998) resgata o sentido original de verdade como o mostrar-se algo. Esta verdade (aletheia) é reconhecida, compreendida, pois se refere ao como algo se mostra para mim. Sentido é aquilo que na “hora em que falta, todos nós sabemos de que se trata.” (Pompeia, 2010, p.164) Sendo fundamentalmente possibilidade, o ser-no-mundo só existe enquanto encontra a significância das coisas, dos outros e de si mesmo, à luz dos projetos nos quais está lançado. É a dedicação ao projeto de sentido (que Pompeia chama de ‘sonhos’) que está comprometida quando a existência está restrita. Por isso, a psicoterapia daseinsanalítica visa resgatar a possibilidade de escutar o que o existir solicita (sentido) para poder ser. Ação e compreensão na clínica fenomenológico-existencial A partir da caracterização de psicoterapia acima, a concepção de fenomenologia enquanto um arcabouço teórico não se sustenta e esta passa a ser entendida como uma postura do terapeuta que favorece ao paciente revelar-se como fenômeno. A postura do terapeuta exige, portanto, a escuta atenta e um demorar-se nas situações relatadas, visando explicitar os sentidos vividos pelo paciente nas descrições de suas experiências. A compreensão, na analítica do dasein, é um aspecto fundamental da condição de estar lançado do homem implicando na condição de ser-no-mundo. O ser-aí habita o mundo faticamente em sua abertura constitutiva. Assim, a ação clínica enquanto disponibilidade para a compreensão do existir se configura como oportunidade para explicitação dos sentidos. O paciente e terapeuta, no processo de psicoterapia, realizam o aí compartilhado a partir do qual os modos concretos de ser do paciente se mostram e podem ter seus sentidos des-velados. As tonalidades afetivas que tingem cada experiência podem ser reconhecidas e o paciente passa a se ver responsável pelas escolhas que faz. Desse modo a ação clínica em uma perspectiva fenomenológico-existencial não está ocupada em resolver problemas, retirar sintomas ou adequar o paciente a referências alheias, mas sim, está comprometida em oferecer uma experiência de retomada do próprio acontecer histórico; do já vivido, do atual e do porvir, recolocando o existir do paciente no processo de ser. MÓDULO 8: PROCESSOS PSICOTERAPÊUTICOS DASEINSANALÍTICO Apresentar a compreensão fenomenológico-existencial de fenômenos clínicos na relação terapêutica e seu manejo Bibliografia básica: FEIJOÓ, A. M. “3.4.A tonalidade afetiva do tédio.” A Existência para além do Sujeito, pp. 173 – 195 Bibliografia complementar: FEIJOÓ, A. M. “3.1. Considerações acerca da criança e a clínica psicológica infantil.” A Existência para além do Sujeito, pp. 90 – 107. Compreensão dos fenômenosclínicos atuais Ana Maria Feijoo (2011) delimita pontos fundamentais para uma psicologia fenomenológico-existencial. Afirma que o ser-para-morte presente na obra Ser e Tempo de Heidegger refere-se “ao horizonte de finitude em que todas as possibilidades sempre se encontram, e no qual o ser-aí se abre como cuidado, em seu ter de ser quem ele sempre é, para o caráter de indeterminação de sua existência. Portanto cabe ao ser-aí e apenas a ele a sua tutela: é isto que a decisão antecipadora da morte revela, determinando o seu próprio modo de ser.” ( pp. 133) Esta consideração implica no horizonte possível para a clínica psicológica na perspectiva fenomenológico-existencial. Inicialmente, propõe que a atitude fenomenológica é a base da atenção clínica e está comprometida em ilustrar das o exercício hermenêutico presente nos atendimentos psicológicos, comprometidos em desvelar os sentidos das vivências ônticas. Este compromisso da clínica fenomenológico-existencial considera que as experiências de sofrimentos são articuladas com a restrição do poder-ser do homem, portanto a realização da existência é aproximar-se do seu ser-próprio. Assim, a prática clínica nesta abordagem está comprometida com a desconstrução das identificações restritivas e o que exige deslocamento existencial da disposição afetiva fundamental. Uma das possibilidades do processo terapêutico é a revelação da verdade clínica que liberta da restrição identitária do aqui-agora. Mais uma vez, a compreensão é entendida enquanto ação na clínica fenomenológica, pois compreender possibilita esclarecer o modo de ser-no-mundo dos pacientes. O esclarecimento contribui para que os pacientes possam se tornar responsáveis por suas escolhas, oportunizando decisões que os aproximem do seu poder-ser. A clínica fenomenológico-existencial não está comprometida em tratar, adequar ou fazer com que o paciente se adapte ao mundo, mas sim oferecer espaço para que o cuidado pela própria existência possa ser vivido pelo paciente, o que contribui para alcançar um modo-de-ser mais autêntico, ou seja, afinado com as possibilidades reais de cada pessoa. Atendimento à crianças Bibliografia básica: FEIJOÓ, A. M. “3.1. Considerações acerca da criança e a clínica psicológica infantil.” A Existência para além do Sujeito, pp. 90 – 107 Para compreender o atendimento clínico existencial com crianças é necessário que deixemos de lado as “teorias tradicionais acerca do desenvolvimento, da personalidade, da aprendizagem da criança,” (Feijoo, pp. 91) que postulam a chegada de um bebê ao mundo como um ser autocentrado e/ou encapsulado. Para a fenomenologia-existencial o ser-aí da criança já se constitui como um Dasein. O nascimento biológico do ser humano delimita a inauguração da existência e, portanto, da condição de estar lançado no mundo. Assim, o ser-aí da criança é entendido enquanto um ente com caráter indeterminado. Para aprofundar a compreensão do ser-aí da criança é necessário retomar a noção de intencionalidade proposta por Husserl. Nela a consciência é considerada em sua imanência, ou seja, se realiza enquanto uma ação de dirigir-se a... e constitui a cooriginalidade de homem e mundo. Todo ato é tido como intencional, incluindo os atos de sugar, chorar e dormir do bebê que podem ser, equivocadamente, entendidos enquanto reflexos. Com isso, afastamo-nos das determinações biológicas ou sociais e aproximamo-nos da ideia que o mundo oferece possibilidades para a criança ser do seu modo. O ser-aí do bebê é marcado pela quietude, calor, alimentação e estado de sono. Porém, o ato de assustar-se com algum barulho já evidencia a articulação do bebê com o espaço. Por fim, temos que considerar que a responsabilidade e liberdade são dimensões constitutivas do ser-aí para a psicologia fenomenológico-existencial, porém, na vida das crianças, tais dimensões estão sob tutela temporária dos adultos responsáveis por elas. Esta peculiaridade do modo de ser da criança estabelece objetivos claros para o atendimento psicológico infantil, pois a terapia, neste contexto, deve oferecer espaço para que a criança possa preencher com seus significados e experimentar na sessão sua responsabilidade para ser, sendo acompanhada no desenrolar do processo. Desse modo, a criança pode experimentar as dimensões ontológicas e cuidar de si. Neste sentido, o atendimento psicológico infantil não deve ser confundido com psicodiagnóstico ou trabalho pedagógico como reforço escolar. O psicólogo não deve ocupar o lugar dos pais ou da escola que assumem a tutela temporária das responsabilidades da criança, pois esta ainda não pode assumi-las por completo. EXERCÍCIOS RESOLVIDOS MÓDULO 1 (1) Husserl (1859 – 1938) foi o iniciador da fenomenologia. Sua formação acadêmica iniciou-se na matemática, passou pela psicologia filosófica e desembocou na filosofia. A fenomenologia é filosofia. Sobre a fenomenologia elaborada por Husserl, está correto afirmar: I – Busca um fundamento seguro para as ciências humanas, as ciências naturais e a filosofia. II – Tem como lema o retorno “às coisas mesmas”, que significa um retorno à pesquisa empírica e à experimentação. III – A palavra “fenomenologia” é composta por “fenômeno”, que significa “aquilo que aparece”, e “logos”, que significa “sentido imanente”. IV – Foi formulada desde 1900 como um modelo de atendimento psicoterápico, que visa a compreensão do outro. V – Concebe o mundo como existindo em si mesmo e concebe um método (“método fenomenológico”) para conhecer a realidade que se esconde por trás das aparências. Estão corretas apenas as afirmações: (A) I, II, III, IV e V. (B) I, II, IV e V. (C) I e III. (D) II, IV. (E) I e III. Resposta => Se você leu atentamente os textos e compreendeu o impulso husserliano à Fenomenologia, foi capaz de identificar a alternativa E como correta. A afirmação II indica como “retorno às coisas mesmas” o retorno à empiria, por isso está incorreta. A proposta da fenomenologia é retornar aos fenômenos no seu aparecer na correlação intencional, isto é, na relação consciência-objeto. A afirmação IV apresenta a fenomenologia como um método psicoterápico, o que está errado, pois surgiu como filosofia primeira, no esforço de fundamentação de todas as ciências. A afirmação V fala de uma “realidade por trás da aparência”. Para a fenomenologia, o que aparece é o que é tal como é. (2) Leia atentamente a seguinte afirmação de Husserl: Mostra-se, pois, por toda a parte, esta admirável correlação entre o fenômeno do conhecimento e o objeto de conhecimento. Advertimos agora que a tarefa da fenomenologia, ou antes, o campo das suas tarefas e investigações, não é uma coisa tão trivial como se apenas houvesse que olhar, simplesmente abrir os olhos. (Husserl, 1907/1990, p.33) [Referência bibliográfica: Husserl, E. A Ideia da Fenomenologia. Trad.: Artur Morão. 1a ed. 1907. Lisboa: Edições 70, 1990.] Sobre esta citação está correto afirmar: I – A passagem se refere à intencionalidade da consciência, que pode ser descrita como a propriedade de toda consciência ser referida a um objeto e todo objeto só ser enquanto referido a uma consciência. II – Através desta concepção, sujeito cognoscente e objeto conhecido deixam de ser entidades separadas e se revelam co-originários. III – A fenomenologia é uma tarefa pois exige que se saia da atitude natural em relação ao mundo para poder conhecer sua constituição. IV – O fenomenólogo precisa do método fenomenológico para conhecer as intenções da consciência, isto é, o que a motiva. Estão corretas: (A) I, II e IV, apenas. (B) I e II, apenas. (C) II, III e IV, apenas. (D) I, II e III, apenas. (E) II e III, apenas. Resposta => Se você leu os textos indicados e compreendeu os conceitos apresentados, foi capaz de identificar que as afirmações I, II e III apresentam corretamente a intencionalidade da consciência, a correlação intencional (que supera a dualidade Sujeito-Objeto) e a fenomenologiacomo tarefa, respectivamente. A afirmação IV está incorreta, pois define intencionalidade (intentio) como motivação, deturpando o sentido desse termo na fenomenologia, que é “dirigir-se a...”. MÓDULO 2 (3) Sobre o Dasein, Heidegger escreve que “é próprio deste ente que seu ser se lhe abra e manifeste com e por meio do seu próprio ser, isto é, sendo. A compreensão do ser é em si mesma uma determinação do ser do Dasein. O privilégio ôntico que distingue o Dasein está em ser ele ontológico.” (1927, p.38) Nessa afirmação estão presentes dois conceitos essenciais para a compreensão da fenomenologia-existencial e para a implicação das descrições de Heidegger para as ciências do homem. A saber, tratam-se dos conceitos de “ontológico” e “ôntico”, que significam, respectivamente: (A) “ontológico” é a constituição do aparelho psíquico do ser-aí, enquanto “ôntico” se refere às representações que o preenchem. (B) “ontológico” é a constituição essencial do ser-aí, enquanto ôntico refere-se aos modos concretos possíveis em que essa constituição se manifesta cotidianamente. (C) “ontológico” significa que se refere ao ser do ser-aí, enquanto “ôntico” ao ser dos objetos. (D) “ontológico” significa a possibilidade de conscientização do ser-aí sobre si mesmo, enquanto “ôntico”, ao modo irrefletido em que as pessoas vivem. (E) “ontológico” é sinônimo de “fenomenológico”, enquanto “ôntico” se refere às abordagens não-fenomenológicas. Resposta => Se você leu os textos e compreendeu a diferença entre ôntico e ontológico, assinalou a resposta B como a correta, pois nela está expresso que “ontológico” se refere à constituição essencial do Dasein, enquanto “ôntico” se refere aos modos concretos de ser. Assim, dizemos que o ser-no-mundo é ontológico – constitutivo de todo ser-no-mundo –, enquanto ser um existente neste contexto histórico-social, nesta família, etc., é ôntico. (4) Escreve o daseinsanalista Pompeia (2004): Poder existir é uma oportunidade que se renova a cada instante. Pode ser que vivamos só este momento ou por mais alguns dias, anos, até mais de cem anos. Pode, não tem de ser assim, apenas pode. A vida não é um direito nosso, pois pode ser arrebatada a qualquer momento; não é um dever nosso, pois não nos é dada como condição de necessidade, mas é uma contingência. Assim, existir emerge como projeto. A partir desse contexto, a afirmação correta abaixo é: (A) O determinismo encontra-se aí na condição de ser-para-a-morte. (B) A experiência humana da vida é, originariamente, fixada num dado tempo e num dado espaço. (C) A relação entre o homem e sua existência depende do modo como ele enfrenta sua condição de mortal. (D) A existência só pode ser compreendida a partir de uma análise cronológica dos eventos que permeiam a vida de cada homem. (E) O horizonte existencial do homem é infinito e indeterminado. Resposta => A afirmação A apresenta o ser-para-a-morte como uma condição determinística. Está incorreta, pois embora a morte seja uma possibilidade certa, ela não impõe determinação alguma à existência. Como cada qual lida com a mortalidade (e não com a morte em si) é uma questão pessoal, social e cultural e possível, indeterminada. A afirmação B está incorreta, pois não é possível fixar um tempo ou espaço para a vida. Essas questões permanecem em aberto – possíveis – enquanto a existência existir. Na afirmação C lemos que a relação de cada um com sua existência depende de como enfrenta sua condição de mortal. Devemos lembrar que enfrentar a condição de mortal é sinônimo de enfrentar a própria existência. Assim, como cada qual lida com sua vida está, sim, relacionado com como cada qual lida com a possibilidade de sua impossibilidade. E isso a cada instante. É a alternativa correta. Vejamos por que as demais estão incorretas. A afirmação D apresenta que devemos fazer uma análise cronológica dos eventos da vida para compreender a existência. Está errado, pois a cronologia é secundária para o Dasein. Os eventos passados adquirem sentido a partir do projeto em que o Dasein está lançado. Isso ficará mais claro quando estudarmos a temporalidade do Dasein. A afirmação E apresenta que o horizonte existencial como infinito. Está errada, pois o horizonte existencial de todos nós é a morte, que é um acontecimento certo com data incerta. Cada Dasein lida com a possibilidade de sua impossibilidade – horizonte finito – à sua maneira. MÓDULO 3 (5) Leia atentamente o trecho extraído do livro DUBOIS, C. Heidegger: Introdução a uma Leitura. (Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2004) e o poema XIX de Mario Quintana, publicado no livro A Rua dos Cataventos (1940), e considere as afirmações abaixo. Na relação com a possibilidade da morte, que não me oferece nada de particular para esperar, essa possibilidade se dá como a possibilidade mais própria. (...) Como ser-lançado, o Dasein é portanto, enquanto ser-no-mundo, lançado no ser-para-a-morte: ele o experimenta na angústia, da qual, cotidia-namente, decadente, foge. Como? Tranquilizando-se. Morre-se, certamente, mas por enquanto, tudo bem, ainda dá tempo. (...) Ao contrário, o ser-para-a-morte suportado está certo da morte. (...) certeza de si quer dizer: certeza de si como mortal. (...) Sum quer dizer sum moribundus. (DUBOIS, 2004, p.50) Minha morte nasceu quando eu nasci Despertou, balbuciou, cresceu comigo... E dançamos de roda ao luar amigo Na pequenina rua em que vivi. Já não tem mais aquele jeito antigo De rir e que, ai de mim, também perdi! Mas inda agora a estou sentindo aqui, Grave e boa, a escutar o que lhe digo: Tu és a minha doce Prometida, Nem sei quando serão nossas bodas, Se hoje mesmo... ou no fim de longa vida... E as horas lá se vão, loucas ou tristes... Mas é tão bom, em meio às horas todas, Pensar em ti... saber que tu existes! I – Ambos os textos se referem à antecipação da morte. Heidegger utiliza o conceito ser-para-a-morte, enquanto Quintana refere-se a ela como “a Prometida”. II – Com o conceito de ser-para-a-morte, Heidegger se refere à condição mortal do homem. III – A finitude do Dasein é o que desvela para si que é substituível na sua existência. IV – No poema de Mario Quintana, a morte é apresentada como “a Prometida”, o que, do ponto de vista da fenomenologia existencial, revela uma tendência suicida latente de seu Dasein. Estão corretas: (A) I e II, apenas. (B) II e III, apenas. (C) III e IV, apenas. (D) I, II e IV, apenas. (E) I, II e III, apenas. Resposta => Se você leu atentamente a bibliografia indicada, pôde reconhecer que a afirmação I está correta, pois, de acordo com a citação de Dubois, a antecipação da morte revela o ser-para-a-morte constitutivo da existência. No poema de Mario Quintana essa ideia é expressada, em linguagem poética, como a Prometida, uma possibilidade que o acompanha desde sua infância e que um dia acontecerá. Para Heidegger, desde que lançado na existência, o Dasein é ser-para-a-morte. Assim, a afirmação II também está correta. (6) Leia o trecho de Kierkegaard, que inspira a compreensão fenomenológico-existencial sobre a angústia desenvolvida por Heidegger em Ser e Tempo, e responda. A angústia é a possibilidade da liberdade, só esta angústia é, pela fé, absolutamente formadora, na medida em que consome todas as coisas finitas, descobre todas as ilusões. E nenhum Grange Inquisidor dispõe de tão horripilantes tormentos como a angústia, e nenhum espião sabe investir sobre o suspeito com tanta astúcia, justo no momento em que está mais debilitado, ou sabe preparar armadilhas, em que este ficará preso, tão insidiosamente como a angústia, e nenhum juiz sagaz consegue examinar, sim, ‘ex-animar’ [desalentar], o acusado como a angústia, que não o deixa escapar jamais, nem nas diversões, nem no barulho, nem no trabalho, nem de dia nem de noite. (p.164) [Referência bibliográfica: KIERKEGAARD, S. (1944/2011) O Conceito de Angústia. Petrópolis,RJ: Vozes.] Sobre a angústia na Fenomenologia Existencial é correto afirmar: I – Assim como na citação, Heidegger afirma que não há como escapar da angústia, nem mesmo “nas diversões, nem no barulho, nem no trabalho, nem de dia nem de noite” pois a angústia é constitutiva do Dasein (ontológica). II – A angústia rompe com a familiaridade do mundo, produzindo estranhamento. A fenomenologia existencial busca reconduzir quem vivencia essa estranheza a alguma familiaridade. III – Para a fenomenologia existencial, a psicoterapia auxilia na profilaxia da angústia, evitando que ela irrompa. Estão corretas somente: (A) I, apenas. (B) II, apenas. (C) III, apenas. (D) I e II, apenas. (E) II e III, apenas. Resposta => Se você leu atentamente os textos indicados na bibliografia, não deve ter tido dificuldades para compreender a citação de Kierkegaard. Ele escreve sobre o mesmo fenômeno da angústia, descrito por Heidegger, porém, com outra linguagem. Tanto para Kierkegaard quanto para a Heidegger, a angústia – que é o rompimento com a familiaridade com o mundo – é uma possibilidade intrínseca à existência. Portanto, não há como escapar dela. Portanto, as afirmações I e II estão corretas. A afirmação III sugere que há um modo de fugir da angústia; no caso, a psicoterapia. Dado que é uma possibilidade intrínseca, não há como a evitar. Também não há porque a evitar, dado que a angústia revela a cada um que sua existência está sob sua responsabilidade. MÓDULO 3 (2) (7) Leia atentamente o trecho extraído do livro DUBOIS, C. Heidegger: Introdução a uma Leitura. (Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2004) e o poema XIX de Mario Quintana, publicado no livro A Rua dos Cataventos (1940), e considere as afirmações abaixo. Na relação com a possibilidade da morte, que não me oferece nada de particular para esperar, essa possibilidade se dá como a possibilidade mais própria. (...) Como ser-lançado, o Dasein é portanto, enquanto ser-no-mundo, lançado no ser-para-a-morte: ele o experimenta na angústia, da qual, cotidia-namente, decadente, foge. Como? Tranquilizando-se. Morre-se, certamente, mas por enquanto, tudo bem, ainda dá tempo. (...) Ao contrário, o ser-para-a-morte suportado está certo da morte. (...) certeza de si quer dizer: certeza de si como mortal. (...) Sum quer dizer sum moribundus. (DUBOIS, 2004, p.50) Minha morte nasceu quando eu nasci Despertou, balbuciou, cresceu comigo... E dançamos de roda ao luar amigo Na pequenina rua em que vivi. Já não tem mais aquele jeito antigo De rir e que, ai de mim, também perdi! Mas inda agora a estou sentindo aqui, Grave e boa, a escutar o que lhe digo: Tu és a minha doce Prometida, Nem sei quando serão nossas bodas, Se hoje mesmo... ou no fim de longa vida... E as horas lá se vão, loucas ou tristes... Mas é tão bom, em meio às horas todas, Pensar em ti... saber que tu existes! I – Ambos os textos se referem à antecipação da morte. Heidegger utiliza o conceito ser-para-a-morte, enquanto Quintana refere-se a ela como “a Prometida”. II – Com o conceito de ser-para-a-morte, Heidegger se refere à condição mortal do homem. III – A finitude do Dasein é o que desvela para si que é substituível na sua existência. IV – No poema de Mario Quintana, a morte é apresentada como “a Prometida”, o que, do ponto de vista da fenomenologia-existencial, revela uma tendência suicida latente de seu Dasein. Estão corretas: (A) I e II, apenas. (B) II e III, apenas. (C) III e IV, apenas. (D) I, II e IV, apenas. (E) I, II e III, apenas. Resposta => Se você leu atentamente a bibliografia indicada, pôde reconhecer que a afirmação I está correta, pois, de acordo com a citação de Dubois, a antecipação da morte revela o ser-para-a-morte constitutivo da existência. No poema de Mario Quintana essa idéia é expressada, em linguagem poética, como a Prometida, uma possibilidade que o acompanha desde sua infância e que um dia acontecerá. Para Heidegger, desde que lançado na existência, o Dasein é ser-para-a-morte. Assim, a afirmação II também está correta. (8) Leia o trecho de Kierkegaard, que inspira a compreensão fenomenológico-existencial sobre a angústia desenvolvida por Heidegger em Ser e Tempo, e responda. A angústia é a possibilidade da liberdade, só esta angústia é, pela fé, absolutamente formadora, na medida em que consome todas as coisas finitas, descobre todas as ilusões. E nenhum Grange Inquisidor dispõe de tão horripilantes tormentos como a angústia, e nenhum espião sabe investir sobre o suspeito com tanta astúcia, justo no momento em que está mais debilitado, ou sabe preparar armadilhas, em que este ficará preso, tão insidiosamente como a angústia, e nenhum juiz sagaz consegue examinar, sim, ‘ex-animar’ [desalentar], o acusado como a angústia, que não o deixa escapar jamais, nem nas diversões, nem no barulho, nem no trabalho, nem de dia nem de noite. (p.164) KIERKEGAARD, S. (1944/2011) O Conceito de Angústia. Petrópolis, RJ: Vozes. Sobre a angústia na daseinsanalyse é verdadeiro afirmar: I – Assim como na citação, Heidegger afirma que não há como escapar da angústia, nem mesmo “nas diversões, nem no barulho, nem no trabalho, nem de dia nem de noite” pois a angústia é constitutiva do ser-aí (ontológica). II – A angústia rompe com a familiaridade do mundo, produzindo estranhamento. A fenomenologia-existencial busca reconduzir quem vivencia essa estranheza a alguma familiaridade. III – Para a fenomenologia-existencial, a psicoterapia auxilia na profilaxia da angústia, evitando que ela irrompa. (A) I, apenas. (B) II, apenas. (C) III, apenas. (D) I e II, apenas. (E) II e III, apenas. Resposta => Se você leu atentamente os textos indicados na bibliografia, não deve ter tido dificuldades para compreender a citação de Kierkegaard. Ele escreve sobre o mesmo fenômeno da angústia, descrito por Heidegger, porém, com outra linguagem. Tanto para Kierkegaard quanto para a Heidegger, a angústia – que é o rompimento com a familiaridade com o mundo – é uma possibilidade intrínseca à existência. Portanto, não há como escapar dela. Portanto, as afirmações I e II estão corretas. A afirmação III sugere que há um modo de fugir da angústia; no caso, a terapia. Dado que é uma possibilidade intrínseca, não há como a evitar. Também não há porque a evitar, dado que a angústia revela a cada um que sua existência está sob sua responsabilidade. MÓDULO 4 (9) Leia as duas frases de Critelli e, considerando a relação entre elas, indique a alternativa correta: “Os homens experimentam uma necessidade ontológica de compartilhar seus conhecimentos, suas descobertas, seus sentimentos e pensamentos" POIS, "para os homens, tudo o que chamamos de real é aberto e sustentado pelo viver em conjunto.” (p.26) Assinale a alternativa correta: (A) As duas asserções são verdadeiras e a segunda é uma justificativa correta da primeira. (B) As duas asserções são verdadeiras e a segunda não é uma justificativa correta da primeira. (C) A primeira asserção é uma proposição verdadeira e a segunda, uma proposição falsa. (D) A primeira asserção é uma proposição falsa e a segunda, uma proposição verdadeira. (E) Tanto a primeira como a segunda são proposições falsas. Resposta => Se você acompanhou o texto acima e leu o texto indicado pôde compreender que a existência humana é coexistência, isto é, acontece com-os-outros-no-mundo. Terá assinalado a alternativa A como correta. Para Arendt o existir é político. Sendo assim, ser-aí e mundo são dois polos do mesmo fenômeno, que é o existir com outros. Portanto, ambas as afirmações estão corretas e a segunda é uma justificativa correta da primeira. (10) Uma psicóloga fenomenológica atendia em seu consultório uma menina. A menina enrolou uma massinha até formar uma cobra. No momento seguinte, pega um instrumento e começa a cortar a cobra em vários pedaços. Sua primeira reação foi de interpretar à luz das concepções psicanalíticas.Mas, antes disso, perguntou à menina, que lhe respondeu: “a cobra estava se sentindo sozinha, então estou lhe dando amigos.” (situação adaptada de FORGHIERI, 2000) Considerando a compreensão da condição humana desenvolvida por Critelli (2012) e a Historiobriografia está correto afirmar: [Referência bibliográfica: FORGHIERI, Y. C. Psicologia Fenomenológica: fundamentos, método e pesquisa. São Paulo: Ed. Pioneira Thomson, 2000.] (A) O senso comum fundamenta e referenda a compreensão dessa psicóloga. (B) Os atos são autossignificantes. O fenomenólogo precisa ir às coisas mesmas, isto é, à observação dos atos da menina. (C) A palavra é a possibilidade de explicitar as intenções. A menina pôde, ao dizer o que fazia, explicitar o sentido do cortar. (D) O desvelamento do verdadeiro sentido do cortar depende da reflexão da psicóloga. A reflexão (termo que recebe um significado específico na Historiobiografia) é a capacidade de articular o que aparece com as interpretações teóricas. (E) A psicóloga precisa realizar uma Historiobiografia da menina, isto é, pedir que ela conte de sua história e de sua biografia. Resposta => Se você leu atentamente os textos indicados, pôde ver que a alternativa correta é a C. Para responder esta questão, é necessário ter clareza sobre o que é a Historiobiografia desenvolvida por Critelli, que mostra que as alternativas D e E estão erradas. A alternativa A está incorreta, pois a interpretação inicial da psicóloga estava (de acordo como enunciado!) fundamentada na psicanálise. A alternativa B está errada pois “ir às coisas mesmas” é desvelar o sentido dos fenômenos. Para isso, é necessário articular os significados das ações da menina com a enunciação de suas intenções. MÓDULO 5 (11) Explicam DASTUR & CABESTAN (2015): Ludwig Binswanger foi o primeiro entre os psiquiatras a se interessar pela fenomenologia. É na crítica ao psicologismo à qual se dedica Husserl no primeiro tomo de suas Investigações Lógicas, publicadas em 1900, e em sua definição da consciência em termos de intencionalidade e de sentido, que ele encontrou pela primeira vez os motivos de se opor ao naturalismo e ao biologismo de Freud. (p.64) Sobre esse contexto de surgimento da Daseinsanalyse de Binswanger está correto afirmar: I – De Husserl, Binswanger recolhe a noção de que consciência e objeto são um todo indivisível, ou seja, a existência e seu mundo formam uma totalidade indissociável. II – Binswanger critica a falta de fundamentação epistemológica da psiquiatria de sua época, que se apoiava na biologia e/ou na psicanálise. III – Binswanger visa complementar a psicanálise freudiana com aquilo que ela carece: a descrição da corporeidade da existência. Estão corretas: (A) I, somente. (B) II, somente. (C) III, somente. (D) I e II, somente. (E) II e III, somente. Resposta => Se você leu atentamente o texto indicado e a apresentação neste módulo pôde identificar que a afirmação I apresenta corretamente a influência da fenomenologia de Husserl de Binswanger. Husserl apresenta a consciência como intencional, isto é, os atos de consciência são sempre referidos e complementados pelo objeto intencional que os completa e realiza. As bases epistemológicas da psiquiatria da época cindem sujeito e objeto, de modo a procurar a causa da experiência psicopatológica na natureza (biologismo) ou no psiquismo (psicologismo). É disso que trata a afirmação II, que está, portanto, correta. A afirmação III está incorreta, pois a Daseinsanalyse de Binswanger não assume como objetivo a complementação da psicanálise freudiana. Seu objetivo é, outrossim, fornecer bases epistemológicas sólidas para a psiquiatria, que ele ele encontra nas fenomenologias de Husserl e Heidegger. (12) João é estagiário num hospital psiquiátrico e participa do acolhimento de uma paciente que acaba de ser internada, Ana. Ela está muito abatida e visivelmente muito triste. João pergunta a respeito dela, que lhe responde que a tristeza que está sentindo nunca cessará. “Eu tinha que feito as pazes com minha mãe antes de ela morrer”, diz, “agora ela nunca vai me perdoar. Nem eu vou me perdoar.” Ao longo da anamnese que segue João descobre que a mãe de Ana morreu há 8 anos. Recorrendo ao pensamento de Binswanger para compreender o sofrimento dessa paciente, João identifica que: (A) Trata-se de um caso de psicopatologia, pois o sofrimento de Ana está desproporcional ao fato que o causa. (B) Trata-se de um caso de psicopatologia, pois Ana está sofrendo por algo que aconteceu há muito tempo. (C) É necessário identificar a culpa inconsciente que causa esta tristeza por meio do método livre associativo. (D) Para a fenomenologia, não existe melancolia, nem melancólicos. (E) O futuro de Ana está tingido por uma vivência passada. Resposta => Se você estudou a bibliografia indicada e leu o texto acima, terá identificado que as análises de Binswanger buscam descrever a experiência temporal psicopatológica. É um modo de temporalizar-se que configura a experiência psicopatológica. No caso acima, o futuro de Ana é vivenciado como já determinado que seu sentimento não mudará, pois ela sente que nunca se perdoará. Trata-se de um modo de constituição temporal da realidade que antecipa o futuro com vivências passadas. A alternativa que exprime essa compreensão é a E. MÓDULO 6 (13) A fenomenologia-existencial inicia-se em 1927, com a publicação de Ser e Tempo. Surge como filosofia, mas tem enorme repercussão nas ciências humanas, tornando-se fundamento para a compreensão dos fenômenos humanos. Na psicologia, essa influência se verifica em: (A) A ênfase na descrição da vivência do outro. (B) Uma nova formulação de aparelho psíquico. (C) Um novo método de mensuração do comportamento humano. (D) Um método de explicação da relação da consciência com o inconsciente. (E) O aperfeiçoamento do método científico-natural de pesquisa na psicologia. Resposta => Se você leu atentamente os textos e compreendeu a contribuição da obra de Heidegger para a psicologia, pôde reconhecer a alternativa A como correta. A alternativa B propõe que a fenomenologia-existencial realiza uma nova formulação do aparelho psíquico. Isso está incorreto, pois esta abordagem compreende os fenômenos psicológicos à luz do conceito de existência como ser-no-mundo. O mesmo vale para a afirmação D, pois a compreensão da existência como ser-no-mundo torna desnecessários os conceitos de consciente e inconsciente teorizados por Freud. A afirmação C está incorreta, pois considera a mensuração dos comportamentos como influenciada pela fenomenologia. A idéia da mensuração como garantia da certeza do conhecimento está presente nas ciências naturais, de modo que há psicologias que mensuram o comportamento. Por esse mesmo motivo, a afirmação E está incorreta. (14) Leia o trecho abaixo, extraído do livro Psychoanalysis and Daseinsanalysis, de Medard Boss. Há boas razões para supor que a ‘análise do dasein’ de Martin Heidegger é mais apropriada para uma compreensão do homem do que os conceitos que as ciências naturais introduziram na medicina e na psicoterapia. (...) Se o pensamento daseinsanalítico de fato se aproximar mais da realidade humana do que o pensamento científico natural, poderemos encontrar algo que até hoje não encontramos na teoria sobre a psicoterapia: uma compreensão do que estamos realmente fazendo (e por que estamos o fazendo dessa maneira) quando tratamos um paciente psicanaliticamente, estando tal compreensão baseada em intuições sobre a essência do ser humano. (Boss, p.29) A compreensão de homem “mais apropriada” à qual Boss faz menção é a descrita por Heidegger através dos “existenciais”. Os “existenciais” são: (A) os aspectos co-originários do ser-aí, tais como ser-no-mundo, ser-com-os-outros, cuidado, abertura, clareira, ser-para-a-morte. São determinações ontológicas. (B) os momentos em que o ser-aí se sente angustiado por saber que vai morrer, (C) as situações em que oser-aí descobre sua finitude, o que o leva a tomar decisões. (D) os aspectos concretos que determinam cada situação fáctica do ser-aí. (E) os momentos em que o dasein se apercebe de si mesmo como abertura para a significância. Resposta => Se você leu atentamente os textos, pôde compreender o que são os existenciais descritos por Heidegger e como aparecem na psicologia fenomenológico-existencial. São os aspectos constitutivos co-originários da existência. Identificou, portanto, a alternativa A como a correta. A afirmação B associa os existenciais com momentos de angústia e a C, com momentos de possível singularização do ser-aí. Estão incorretas. A alternativa D identifica os existenciais a ‘aspectos concretos’, como se fossem exteriores ao ser-no-mundo, determinando-o. A alternativa E também está incorreta, pois associa os existenciais a ‘momentos’. MÓDULO 7 (15) João Augusto Pompeia define a psicoterapia daseinsanalítica da seguinte forma: Terapia é a procura, via poiesis, pela verdade que liberta para a dedicação ao sentido. (p.169) Considere as afirmações abaixo sobre os significados desses conceitos e indique a alternativa correta: I – Pro-cura significa que a psicoterapia age na direção da cura, isto é, da libertação daquilo que gera sofrimento. II – Poiesis é a raiz etimológica de Poesia, que significa que o psicólogo fenomenológico existencial precisa recorrer a estudos literários (principalmente poesias, que sintetizam experiências) para dialogar com o paciente. III – Na psicoterapia fenomenológica existencial a verdade que se busca é a aletheia, que significa o recordar algo que se mostra para mim e, nesses mostrar-se, faz sentido. IV – Sentido significa ‘significação’ e ‘direção’. Assim, é o fundamento do projetar-se do ser-aí ao futuro possível, isto é, nas possibilidades existenciais porvindouras. V – A vida sem sentido é uma vida vazia. A psicoterapia daseinsanalítica possibilita a busca pelo sentido singular da existência do paciente. Estão corretas apenas as afirmações: (A) I, II e III. (B) II, III e IV. (C) II, IV e V. (D) I, III e V. (E) II, IV e V. Resposta => Se você leu atentamente o texto acima e a bibliografia indicada, pode identificar que as afirmações I e II apresentam definições erradas dos conceitos usados por Pompéia (2010) para caracterizar a psicoterapia daseinsanalítica. Pro-cura significa estar a favor da condição essencial do Dasein, que é ser cuidado. Poiesis significa pro-dução, permitindo que emerja algo que antes era uma possibilidade. As demais afirmações apresentam corretamente os conceitos que definem a psicoterapia daseinsnalítica. Portanto, a alternativa correta é C. (16) Fernanda procura atendimento psicológico porque tem estado intranquila e confusa desde que seu marido faleceu, há 6 meses, em acidente automobilístico. Diz-se muito só e abandonada, e que suas relações de amizade e parentesco têm se deteriorado. Comenta que todos a vêem de modo diferente agora – viúva jovem (30 anos) -, tendo surgido preocupações e interesses novos em relação a ela. Fala de sua solidão, sobre o sentimento de abandono e apesar de saber racionalmente que seu marido não a abandonou, esse sentimento a confunde. Comenta em seguida que o convívio com a família (a dela e a do marido) não tem sido algo que a ajude porque ambas têm a preocupação de que ela imponha respeito, tome cuidado com as amizades, não se aproxime de outros homens para respeitar a memória de seu marido, o que a faz sentir-se envolvida por uma atmosfera de controle. Por outro lado, vê-se como jovem, não quer fechar novas possibilidades para si e para seu filho de três anos, na vida que têm pela frente. Por outro lado, tem sido cortejada por homens que há pouco eram apenas seus amigos e vive essa mudança repentina com dificuldade. Não estando mais segura dessas amizades, nem pode avaliar com clareza as intenções das pessoas que se oferecem para apoiá-la. Comenta que o resultado tem sido o recuo, e percebe claramente que isso só tem agravado ainda mais seu mal-estar. Fica um pouco em silêncio, chora discretamente...em seguida fala que é bom poder falar com liberdade sobre tudo isso. O psicólogo que atende Fernanda é daseinsanalista, de que forma (supostamente) ele conduziria essa sessão? I - Nesse caso, o psicólogo deverá direcionar as reflexões para o luto que a moça está vivendo. Antes de pensar em qualquer outra possibilidade, ela deverá se conscientizar sobre a importância de viver o luto da perda de seu marido. II - Percebendo que Fernanda está falando de uma experiência muito forte para ela, o psicólogo poderá fazer algumas perguntas para compreendê-la melhor. III - O psicólogo acolhe Fernanda em sua dor e pode sugerir que ela oriente as pessoas de sua família e a do marido a procurarem um processo psicoterápico, para que possam compreender que ela é ainda muito nova e precisa vivenciar novas experiências. IV - O psicólogo poderá comentar que percebeu o quanto está sendo importante para ela fazer tais comentários e que a procura de atendimento está sendo a tentativa de abrir uma nova porta, alternativa à postura de recuo que vem tomando. V - O psicólogo analisará a situação global e aconselhará Fernanda a dar início ao processo com ele e procurar terapia para o filho. Estão corretas apenas as afirmações: (A) II e IV. (B) I e II. (C) I, II e V. (D) I, II, III e IV. (E) II, IV e V. Resposta => Se você leu atentamente a situação clínica acima e a bibliografia indicada, pode identificar que as afirmações I, III e V apresentam condutas não compatíveis com o manejo clínico apresentados por JARDIM (2013) e BARRETO (2009). As demais afirmações apresentam corretamente as condutas de um psicólogo daseinsanalista, que está comprometido com o desvelamento de sentidos e a busca por possibilidades mais autênticas de existir do paciente. Portanto, a alternativa correta é A. MÓDULO 8 (17) Jaime procura terapia e é recebido por um daseinsanalista. O paciente conta: Desde que minha esposa me largou, nunca mais consegui ser feliz. Nem no trabalho, que eu gostava tanto, me realizo mais. Eu trabalhava bastante e estava indo bem; tinha sido promovido a gerente de negócios em todo o estado. Com isso tive um ótimo aumento, de modo que ia conseguir quitar o financiamento de nossa casa. Mas aí, de repente, ela aparece e diz que sou um acomodado, que não faço nada para nós dois, que só penso em trabalhar. E me larga. Meus amigos tentam me levar para happy hours, mas nem sei mais como chegar numa mulher. Sinto saudades da minha esposa. Compreendendo a narrativa de Jaime à luz da fenomenologia-existencial está correto afirmar: I – Jaime está passando por um episódio depressivo. A falta de prazer no trabalho é sintoma de sua depressão, motivada pelo abandono da esposa. II – As frases “nunca mais consegui ser feliz” e “nem sei mais como chegar numa mulher” são ouvidas pelo terapeuta como experiências associadas à restrição do poder-ser de Jaime. III – Quando deixa-o, a esposa de Jaime produz um abalo em seu cotidiano, gerando perplexidade e paralisando-o. A única saída para Jaime é se reconciliar com sua esposa para poder recuperar o sentido de sua vida. IV – Ao procurar psicoterapia, Jaime está sinalizando que está questionando-se e marcado por um sofrimento. A terapia oferece a ele o colocar-se diante de sua existência, desafiando-o a ser ele mesmo e partindo em busca de possíveis sentidos dentro do incompreendido. Estão corretas somente as afirmações: (A) I, II e III. (B) II e IV. (C) I e IV. (D) II e III. (E) IV. Resposta => Se você leu os textos e compreendeu o manejo clínico nesta abordagem, foi capaz de identificar que as afirmações I e III estão incorretas. A primeira propõe a delimitação de um diagnóstico para compreender o paciente, quando o objetivo da terapia é o esclarecimento da situação existencial vivida. A terceira apresenta uma solução para vida de Jaime, na qual a responsabilidadeé atribuída a um terceiro, no caso, sua esposa. Porém, a terapia busca explicitar os sentidos vividos para que os pacientes possam se apropriar deles. A alternativa correta, portanto, é B. (18) Marília chega ao consultório, por pedido da escola, em busca de atendimento psicológico para seu filho de 8 anos com a seguinte fala: "A escola reclama que o meu filho não consegue se concentrar nas tarefas da escola, não consegue ficar sentado na sala de aula e atrapalha os coleguinhas. Disseram que ele sofre de TDAH. Em casa ele também é muito levado, bagunceiro e tem o sono muito agitado. Não sei mais o que fazer, estou desesperada, já tentei de tudo, por isso eu vim aqui. Para a senhora me falar o que devo fazer.” Diante desse relato, há diferentes possibilidades de conduta do psicólogo. Escolha a(s) fala(s) que se refere(m) a uma postura de um psicólogo de orientação Fenomenológico-Existencial. I - Este tipo de manifestação aponta para o como o seu filho lida com o desejo do outro. Então, é importante considerarmos as relações estabelecidas entre as pessoas que compõem a família. II - Hoje em dia é muito comum crianças sofrerem de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade. Mas a senhora não precisa se preocupar, pois existem diversos estudos que comprovam o alto índice de sucesso para tratamentos desses casos. III – Marília, para eu compreender o que se passa com o seu filho, não adianta eu me debruçar em um diagnóstico fechado, mas preciso que você me descreva detalhadamente como seu filho é para podermos nos aproximar do sentido que essa patologia tem na vida dele. IV – Marília, estou percebendo a sua aflição e gostaria que você me contasse um pouco mais sobre como se sente, pode ser? Depois marcamos uma sessão para seu filho. Estão corretas somente as falas: (A) Apenas a fala I. (B) As falas I e IV. (C) Apenas a fala III. (D) As falas II, III e IV (E) Apenas a fala IV. Resposta => Se você leu os textos e compreendeu o manejo clínico nesta abordagem com crianças, foi capaz de identificar que as falas I, II e III estão incorretas. A primeira fala está comprometida a encontrar a causa da doença e não a compreender como os sintomas são vivenciados pelo filho de Marília. A segunda fala busca tranquilizar Marília, oferecendo uma solução, com alto índice de sucesso, para a situação. A terceira convida Marília a falar sobre seu filho para que o psicólogo possa compreendê-lo. Porém, a revelação dos sentidos vividos só podem ser acessados por ele mesmo. A alternativa correta, portanto, é E, pois o psicólogo oferece escuta e acolhimento à mãe e se disponibiliza a encontrar com seu filho. EXERCÍCIOS PROPOSTOS MÓDULO 1 (1) Segundo Feijoo (2011), Para a fenomenologia de Husserl, o psiquismo não possui nenhuma determinação prévia, nem mesmo um eu substancial. A consciência é, para este filósofo, transcendente, nunca se retém em si mesma, mas se vê projetada por seus próprios atos para o campo dos objetos correlatos. (p.31) A concepção de “eu” de Husserl é de natureza filosófica, mas pode, com muitos cuidados, ser transportada para o contexto de prática do psicólogo. Seguindo tal concepção, está correto afirmar que uma Psicologia fundamentada na fenomenologia de Husserl: I – Concebe as experiências do paciente/cliente como intencionais, isto é, que a motivação determina os significados experienciados. II – Busca no paciente/cliente os aspectos essenciais de sua experiência, isto é, a consciência reduzida. A redução fenomenológica possibilita a descrição direta, sem hipóteses, da personalidade do paciente/cliente, pois esta (a personalidade) é o aspecto imutável que permanece além da multiplicidade de experiências. III – Compreende que os relatos do paciente/cliente referentes às coisas e aos outros ao seu redor revelam como ele os experiencia, pois a consciência é intencional. IV – Assume o “eu” como um fluxo de vivências intencionais. Estão corretos somente: (A) I e II. (B) II e III. (C) III e IV. (D) I, II e III. (E) II, III e IV. (2) Husserl (1859 – 1938) é o fundador da Fenomenologia, movimento filosófico mais importante do século XX. Após uma breve incursão pela Matemática, o filósofo assume como tarefa tornar a filosofia uma ciência rigorosa, o que o leva a questionar os postulados científicos e filosóficos da época. Sobre esse contexto histórico está correto afirmar: (Feijoo, 2011) I – A Fenomenologia questiona a pretensão de cientificidade plena das ciências naturais, que falham na compreensão do ser humano. Ao postular a objetividade exterior independente do sujeito, a ciência mina suas próprias bases. II – Hipóteses, inferências e deduções são necessários quando se pressupõe a impossibilidade de acesso ao que se quer conhecer. Já a epoché suspende a cisão entre sujeito que conhece e objeto conhecido, tomando-os como uma unidade, de modo que para a Fenomenologia as teorias são prescindíveis. III – Husserl é enfático na crítica à Psicologia da época. A atribuição de uma natureza psicofísica à consciência torna todo conhecimento relativo, pois fundado em acontecimentos fisiológicos. IV – Com o conceito de intencionalidade, Husserl mostra que não é possível conhecer a realidade exterior. A consciência só acessa os conteúdos imanentes, isto é, as representações internas da realidade externa. Estão corretas somente as afirmações: (A) I e II. (B) II e III. (C) III e IV. (D) I, II e III. (E) II, III e IV. (3) O fenomenólogo André Dartigues (1992), comenta a respeito da concepção de consciência de Husserl que ela contém muito mais que a si própria. Para a fenomenologia, a consciência: (A) é o equipamento psicológico que permite ao homem conhecer. (B) é um local no psiquismo, onde ocorrem experiências e o conhecimento. (C) refere-se ao ato de consciência, que sempre visa um objeto. (D) corresponde ao espírito, objeto de estudo da religião. (E) não é assunto de interesse, pois o que importa são as coisas mesmas. (4) Escreve a fenomenóloga FEIJOÓ (2011): “Husserl considera desde as suas primeiras obras o caráter intencional dos fenômenos psíquicos. Ele se refere claramente às relações imanentes da subjetividade ou da consciência pura, ou seja, fenomenologicamente reduzidas, diferenciando-as, assim, dos fenômenos materiais em jogo em uma consciência empírica, na qual se pressupõe que essa seja constituída por propriedades e por uma essencialidade específica” (p.30) A Fenomenologia desconstrói a formulação teórica de uma consciência pura separada do objeto, representada pelo esquema S – O, através da formulação husserliana da consciência intencional, representada pelo esquema S → O. São aspectos que compõem o conceito de consciência intencional: I – Considera um eu interior independente do mundo. II – Não considera como a priori do homem ter um psiquismo. III – Atos da consciência nunca estão separados dos objetos destes atos. IV – A consciência não é em si mesma. Está sempre projetada, em direção ao objeto. V – Pela consciência intencional, podemos ter acesso à verdade objetiva dos objetos. Estão corretas somente: (A) II, III, e IV. (B) I e III. (C) II, III e V. (D) I, II e IV. (E) I, II e III. (5) O filósofo Stegmüller (1997) resume a concepção de consciência da fenomenologia de Husserl da seguinte maneira: [...] a consciência como o entrelaçamento das vivências psíquicas empiricamente verificáveis numa unidade de fluxo de vivência; como a percepção interna dessas próprias vivências e como designação que resume todas as vivências intencionais. (Stegmüller, 1997). Sobre essa concepção de consciência, peculiar à Fenomenologia, está correto afirmar: I - A consciência não é uma substância (alma), mas uma atividade constituída por atos (percepção, imaginação, volição, paixão etc.) com os quais se visa a algo. II - O traço essencial da consciência é a intencionalidade: toda consciência é consciência de algo.III - Consciência é sempre de algum objeto e os objetos só têm sentido para uma consciência. IV - A intencionalidade representa o fato de que sempre há um interesse organizador da percepção, regulando o fenômeno de figura e fundo. Estão corretas apenas: (A) I e II. (B) III e IV. (C) I, II e III. (D) II e III. (E) II e IV. (6) Segundo a fenomenóloga Feijoó (2011), “Husserl propõe que, frente ao fenômeno, possamos assumir uma atitude antinatural própria à fenomenologia.” (p.29) A psicóloga se baseia na distinção efetuada por Edmund Husserl no livro A Idéia da Fenomenologia (1907). Nesse livro, o filósofo afirma que na atitude natural, “na percepção, por exemplo, está obviamente diante dos nossos olhos uma coisa; está aí no meio de outras coisas, vivas e mortas, animadas e inanimadas, portanto no meio de um mundo que, em parte, como as coisas singulares, cai sob a percepção... (p.39) Sobre as atitudes natural e fenomenológica é verdadeiro afirmar que: I – A atitude natural é o modo como cotidianamente encontramos as coisas no mundo, existindo por si mesmos. II – Passa-se da atitude natural para a fenomenológica quando se reconhece a necessidade de mensurar a realidade existente fora e independente do sujeito. III – A atitude fenomenológica refere-se a um passo metodológico pelo qual a consciência suspende a crença na realidade em si dos objetos do mundo. É a chamada epoché. Surgem, então, os fenômenos. IV – Embora Husserl não se preocupasse com a prática psicológica, a atitude fenomenológica foi assumida pela Psicologia como uma possibilidade. Tal atitude acontece na prática psicológica como esforço do psicólogo de deixar que o outro revele os significados de sua experiência tal como a experiencia. V – A atitude fenomenológica implica um novo modo de conceber a consciência e o Eu. A consciência é apenas uma parcela do receptáculo de estímulos externos que compõe o Eu. Estão corretas apenas as afirmações: (A) I, III, IV e V. (B) I, II e III. (C) I, III e IV. (D) II, III e IV. (E) II e III. (7) No livro A Ideia da Fenomenologia (1907/1990), Husserl distingue a atitude natural da atitude fenomenológica. Na atitude natural, afirma que “na percepção, por exemplo, está obviamente diante dos nossos olhos uma coisa; está aí no meio de outras coisas, vivas e mortas, animadas e inanimadas, portanto no meio de um mundo que, em parte, como as coisas singulares, cai sob a percepção... (p.39) [Referência bibliográfica: Husserl, E. A Ideia da Fenomenologia. Trad.: Artur Morão. 1a ed. 1907. Lisboa: Edições 70, 1990.] Sobre as atitudes natural e fenomenológica está correto afirmar: I – A atitude natural é o modo como encontramos as coisas no mundo, existindo por si mesmos. II – Passa-se da atitude natural para a fenomenológica quando se reconhece a necessidade de mensurar a realidade existente fora e independente do sujeito. III – A atitude fenomenológica refere-se a um passo metodológico pelo qual a consciência suspende a crença na realidade em si do mundo externo. IV – Pela atitude fenomenológica, a consciência revela-se condição de aparição do mundo, isto é, mundo revela-se fenômeno. Estão corretas: (A) I, II, III e IV, apenas. (B) I, II e III, apenas. (C) I, III e IV, apenas. (D) II, III e IV, apenas. (E) II e III, apenas. (8) O lema da Fenomenologia de Husserl é “voltar às coisas mesmas”. Segundo o estudioso Tommy GOTO (2008), “A fórmula inicial da fenomenologia não tem a pretensão de negar o conhecimento construído na ciência e na filosofia, apenas requer para si o direito de excluir qualquer perspectiva teórica sobre as coisas para que se possa ir espontânea e livremente até elas, i.e., ‘deixar aparecer a coisa mesma’.” (Introdução à Psicologia Fenomenológica. São Paulo: Paulus, p.74) As afirmações que explicam esta ideia são: I – As “coisas mesmas” são os fenômenos no seu aparecer na correlação intencional. II – As “coisas mesmas” são as os significados que cada consciência atribui aos objetos externos. Estes (os objetos externos) existem antes de qualquer significação. III – Só se chega às coisas mesmas através do método fenomenológico de suspensão (epoché). IV – Deixar aparecer a coisa mesma significa conseguir utilizar um método para conhecer a verdade essencial das coisas, escondida por trás de sua aparência física. V – As “coisas mesmas” são as coisas tal como e apenas enquanto se manifestam na correlação noético-noemática. Estão corretas: (A) I, II, III e V, apenas. (B) II, III, IV e V, apenas. (C) II, IV e V, apenas. (D) I, III e V, apenas. (E) I e V, apenas. MÓDULO 2 (9) A personagem Mafalda, do cartunista argentino Quino, exprime uma máxima da fenomenologia da existência de Heidegger, que fundamenta a clínica daseinsanalítica. São eles: I – Segundo Heidegger, Dasein se relaciona com o ser, se compreende em seu ser e é aberto para ser. Isso significa que toda existência ‘tem’ alguma compreensão de seu ser. II – Mafalda exprime a radical singularidade de cada existência. Nenhum outro pode existir por mim. III – A fala de Mafalda revela a sensação de um peso de existir. Esse peso só aparece quando a existência fica restrita, pois, em sua essência, a existência é livre para fazer escolhas e isso é ‘leve’, não ‘pesado’. “Justo a mim me coube ser eu” significa que posso ser como eu quiser, livre de determinações. IV – Mesmo sendo criança, Mafalda descobriu que vai morrer. Essa é uma máxima da fenomenologia existencial: já que vamos morrer, devemos viver a vida mais leve e prazerosa possível. No caso de uma criança, como Mafalda, isso significa poder se dedicar a brincar, ao invés de ficar se angustiando com a mortalidade. Estão corretas somente: (A) I e II. (B) II e III. (C) III e IV. (D) I e IV. (E) I, III e IV. (10) Segundo a psicóloga fenomenóloga Bilê Sapienza, “As proposições heideggeriana implicam alterações radicais em nosso pensar impregnado pela metafísica tradicional e subverte a costumeira ordem que havia em nossa aceitação tácita (...)” (2025, p.37, grifo meu) Por metafísica Heidegger se refere: I – À crença numa realidade externa objetiva independente do sujeito (interior), tal como na fenomenologia de Husserl,. II – Ao fato de que Dasein é ser-no-mundo-com-os-outros, o que significa que a existência está sempre além (meta) de seu corpo (física). III – Às concepções de homem (interno) e mundo (externo) que fundamentam a Psicologia moderna. IV – À exigência de um método objetivo para se conhecer a realidade. Estão corretas somente: (A) I e II. (B) II e III. (C) III e IV. (D) I e IV. (E) I, III e IV. (11) Segundo a psicóloga fenomenológica Ida Cardinalli (2012), “Na obra Ser e Tempo, o fio condutor do pensamento de Heidegger é o esclarecimento do sentido do ser como tal”. (CARDINALLI, 2012, Daseinsanalyse e esquizofrenia, São Paulo, Escuta, 2012, pag. 53.) Em relação às ideias de Heidegger acerca do existir humano como Dasein, pode-se afirmar que: I – O Da (aí) do Dasein (ser-aí) é a abertura essencial do existir humano, o que significa dizer que ele é esse estar aberto para perceber, compreender, entender e conhecer o que é encontrado no mundo; II – A essência do Dasein é a própria existência; III – O Dasein nunca é um objeto simplesmente presente; IV – As características que constituem o Dasein podem ser consideradas como categorias ou atributos porque a singularidade deve ser o ponto de partida para o conhecimento dos modos de ser do humano. Das afirmativas acima, estão corretas apenas: (A) I, III e IV (B) I, II, III e IV (C) III e IV (D) I, II e III (E) I e II (12) A noção de Dasein (ser-aí), delineada por Heidegger em Ser e Tempo, é o primeiro passo na direção de elaboração de uma ‘psicologia’ fenomenológico-existencial. Uma primeira apresentação da ‘definição’ de Dasein está no §9 do livro Ser e Tempo, onde o filósofo indica que 1) “a ‘essência’deste ente [nós mesmos] está em ter de ser” e 2) “O ser, que está em jogo no ser deste ente, é sempre meu.” (Heidegger, 1927/1998, p.78) Que nossa existência é Dasein (ser-aí) significa: I – O ser-aí é sempre uma possibilidade de ser si-mesmo. Isso significa que o Dasein é as possibilidades existenciais que realiza. II – Existir significa compreender ser, tanto de si mesmo quanto dos outros e das coisas. III – A essência do homem (ser-aí) configura-se a partir do primeiro momento em que aparece no mundo, tornando-se, então, “ser-no-mundo”. IV – Para Heidegger, a existência não tem uma essência quididativa (o que é); isto é, Dasein é atravessado pelo Nada, que é a indeterminação ontológica enquanto tarefa de ter-que-ser. V – O sentido da existência do Dasein é “tornar-se o que realmente é”, que é o conjunto de potencialidades inatas que a existência pode amadurecer e desenvolver ao longo da vida. Estão corretas: (A) I, III e IV, apenas. (B) II, III e V apenas. (C) II e IV, apenas. (D) I, II e IV apenas. (E) II, IV e V, apenas. (13) Leia o trecho abaixo, extraído da Carta Sobre o Humanismo, de Martin Heidegger. Do mesmo modo com ‘animal’, zõon [animal], já se pro-pôs uma interpretação da ‘vida’ que repousa necessariamente sobre uma interpretação do ente como zoé [vida] e physis [energia], em meio à qual se manifesta o ser vivo. Além disto e antes de qualquer outra coisa, resta, enfim, perguntar se a essência do homem como tal, originalmente – e com isso decidindo previamente tudo – realmente se funda da dimensão da animalitas [animalidade]. Estamos nós no caminho certo para essência do homem, quando distinguimos o homem e enquanto o distinguimos, como ser vivo entre outros, da planta, do animal e de Deus? Pode-se proceder assim, pode-se situar, desta maneira, o homem em meio ao ente, como um ente entre outros. Com isso se poderá afirmar, constantemente, coisas acertadas sobre o homem. É preciso, porém, ter bem claramente presente que o homem permanece assim relegado definitivamente para o âmbito essencial da animalitas; é o que acontecerá, mesmo que não seja equiparado ao animal e se lhe atribuir uma diferença específica. (...) Um tal pôr é o modo próprio da Metafísica. Mas com isso a essência do homem é minimizada e não é pensada em sua origem. (...) A Metafísica pensa o homem a partir da animalitas; ela não pensa em direção de sua humanitas [humanidade]. (p.352) Considere as afirmações abaixo sobre a essência do homem para a fenomenologia-existencial: I – Segundo Heidegger a essência do homem não pode ser pensada a partir da animalidade (animalitas). Com isso ele critica o conceito de animal racional, propondo que o homem deva ser pensado a partir de sua irracionalidade. II – Pensar o homem a partir da animalitas não é exclusividade da Metafísica. Nós, cotidianamente, pensamos o homem (e nós mesmos) a partir da animalitas a todo momento em que nos compreendemos como um organismo vivo (zoé). III – A essência do homem para a Daseinsanalyse não está em sua constituição física, nem psíquica, nem social. A essência do homem é ser-aí (Dasein). IV – Conceber o homem como bio-psico-social permanece preso à interpretação “do ente como zoé [vida] e physis [energia], em meio à qual se manifesta o ser vivo.” Portanto, não nos aproxima mais da essência do humano. Estão corretas as afirmações: (A) II e IV, apenas. (B) I e IV, apenas. (C) II e III, apenas. (D) II, III e IV, apenas. (E) I, II e III, apenas. (14) O livro Ser e Tempo de Heidegger (1927) traz como epígrafe a citação de Platão, transcrita abaixo: ... pois é evidente que de há muito sabeis o que propriamente quereis designar quando empregais a expressão ‘ente’. Outrora, também nós julgávamos saber, agora, porém, caímos em aporia. [aporia = “caminho inexpugnável, sem saída”, “dificuldade”] Essa epígrafe está articulada com o projeto de Heidegger nesse livro. Considere as afirmações abaixo, indicando as corretas. I – Heidegger visa resgatar a questão sobre o sentido do ser, que ele considera que foi esquecida pela filosofia. II – Heidegger propõe-se a responder o que significa ‘ser’, encerrando esse debate filosófico. III – No desenvolvimento da questão do ser, Heidegger se depara com vários ‘tipos’ de ser: o ser racional, ser irracional, ser existente, ser afetivo. IV – Para recolocar a questão do ser, Heidegger precisa desvelar o ser do ente para quem perguntar é uma possibilidade. V – As considerações de Heidegger em Ser e Tempo influenciam as psicologias de Binswanger e Boss, que fundam a Daseinsanalyse. Estão corretas: (A) I, II e V, apenas. (B) II, IV e V, apenas. (C) I, IV e V, apenas. (D) I, II e III, apenas. (E) I, III, IV e V, apenas. (15) Em Ser e Tempo, Heidegger afirma que a ‘essência’ do homem reside em sua existência. Para indicar o ser do homem usa o termo Dasein (ser-aí). I – O ser-aí é sempre uma possibilidade de ser si-mesmo. II – Existir significa compreender ser, tanto de si mesmo (Dasein) quanto dos outros e das coisas. III – A essência do homem (ser-aí) configura-se a partir do primeiro momento em que aparece no mundo físico, tornando-se, então, “ser-no-mundo”. IV – Do ponto de vista ôntico, ser-aí é ser-no-mundo-com-os-outros. V – O termo Dasein descreve o aparelho psíquico da existência. Estão corretas as afirmações: (A) III e V, apenas. (B) I e II, apenas. (C) I, II e IV, apenas. (D) II e III, apenas. (E) I, II, IV e V, apenas. (16) Heidegger, em Ser e Tempo (1927), desenvolve uma Analítica do Dasein que servirá de fundamento para a prática terapêutica Daseinsanalítica desenvolvida por Binswanger e Medard Boss. À luz desse contexto teórico, considere as afirmações abaixo e indique as corretas. I – Heidegger preocupa-se com a questão sobre o sentido do ser e com isso identifica um modo de pensar ocidental que ele denomina por pensamento metafísico, um modo de pensar que objetiva, substancializa o ser dos entes. II – O pensamento metafísico caracteriza-se por pensar o ser como abertura de possibilidades. III – Heidegger, preocupado com a questão sobre o sentido do ser, refere-se ao homem com o termo Dasein, ressaltando que o “da” do “dasein” (o “aí” do ser-aí) é o âmbito onde o ser se dá. IV – Heidegger entende que a questão sobre o ser e seu sentido ficou esquecida pelo pensamento metafísico. V – Heidegger deu continuidade às preocupações de Husserl em relação a busca das essências, ou seja, a uma fenomenologia eidética, visando as evidências apodíticas (demonstráveis) Estão corretas somente: (A) I, II, III e IV. (B) I, III e V. (C) I, III e IV (D) I e IV. (E) III e IV. MÓDULO 3 (17) A experiência da angústia tem destaque na fenomenologia de Heidegger, pois ela possibilita uma visão clara da condição existencial. A respeito dessa experiência no contexto fenomenológico-existencial está correto afirmar: I – Na angústia, o ente intramundano desaba, não sendo mais relevante e significante. II – A angústia é precisamente a experiência do ser-no-mundo enquanto tal, do próprio mundo. III – Temor e angústia são diferentes, pois a angústia é “de” alguma coisa e o temor, é temor diante do nada. Apresenta(m) corretamente as ideias de Heidegger acerca do modo de ser da angústia somente as afirmativas: (A) I. (B) II. (C) III. (D) I e II. (E) II e III. (18) Sapienza destaca a importância da obra Ser e tempo de Martin Heidegger para a fundamentação da Daseinsanalyse. A prática clínica fundada no pensamento do filósofo alemão propõe uma postura e um olhar novo do terapeuta frente ao seu paciente e à prática clínica. Com base na postura do terapeuta daseinsanalista, assinale a alternativa correta: I – Fenomenologia requer que estejamos abertos para acolher aquilo que um dado fenomênico conta de si mesmo, em seu mostrar e se ocultar. II – Para atender em Daseinsanalyse, é necessário estar inteiro no atendimentoe sustentar o próprio desamparo como terapeuta, isto é, a insegurança, desabrigo por não contar com uma teoria que “diz o que fazer”. III – Suspender teorias significa que na prática clínica fenomenológica não se preocupa com rigor, mas importa apenas aquilo que o terapeuta pensa sobre o paciente. (A) Apenas I está CORRETA (B) Apenas II e III está CORRETA (C) Apenas I e II estão CORRETAS (D) Apenas I e III estão CORRETAS (E) Todas estão CORRETAS (19) Muitas pessoas procuram psicoterapia em razão de decisões que precisam tomar em suas vidas. As decisões articulam-se com futuro, pois, decidir-se é escolher um futuro possível e abdicar de todos os demais. Entretanto, Heidegger descreve em Ser e tempo que a maioria das vezes a existência não se assume assim, entregando a responsabilidade de seu existir a “a gente”. À luz desse contexto teórico-filosófico está correto afirmar: I – A fenomenologia-existencial compreende a existência como indeterminada, como poder-ser. Existir é tarefa. II – Cotidianamente, existimos abrindo mão de nosso ser-aí, deixando de perceber a singularidade das situações que vivenciamos e de nossa própria existência. III – Na relação psicoterapêutica fenomenológico-existencial, o terapeuta indica para o paciente quais são e como deve tomar as decisões importantes de sua vida. Estão corretas: (A) I, apenas. (B) II, apenas. (C) III, apenas. (D) I e II, apenas. (E) II e III, apenas. (20) Leia o seguinte poema e a seguir responda a questão: Amadurecer e crescer também significa ir, de olhos abertos, em direção à morte. Nós só somos maduros o tanto quanto estejamos dispostos a aceitar nossa própria mortalidade. A morte nos torna sábios para a vida. Eu me nego, por isto, À fuga ilusória para a superficialidade tentadora e para ocultar o doloroso. Eu quero visualizar conscientemente que a qualquer momento será o meu último dia. E por meio disto estar mais desperto, mais vivo, realizado, sábio e mais grato por cada dia, por cada momento. Em meio à plena paixão pela vida, sou mortal. Um dia virá a ser meu último. Saber disto me faz amadurecer. (ULRICH SCHAFFER, Crescer, Amadurecer) Fazendo uma aproximação do poema com a compreensão heideggeriana acerca do ser-para-a-morte, podemos afirmar corretamente que: (A) Neste poema, o poeta expressa claramente o modo como o ser-aí cotidiano/mediano se relaciona com a morte, a saber, por meio da apropriação da morte. (B) Neste poema, o poeta expressa claramente o modo como o ser-aí cotidiano/mediano se relaciona com a morte, a saber, por meio do modo impessoal ou impróprio. (C) Neste poema, o poeta expressa uma relação própria/autêntica com a morte, o que significa pensar na morte em todos os instantes da vida a fim de se preparar para ela. (D) Neste poema, o poeta expressa uma relação própria/autêntica com a morte, uma vez que a traz para o acontecimento presente e, com isso, abre a possibilidade de ver a si mesmo como um poder-ser. (E) Neste poema, o poeta parece estar depressivo, além de apresentar tendências suicidas, o que pode ser evidenciado por seu pensamento constante em sua própria morte. (21) Em seu texto, Sapienza (2015) apresenta os caracteres existenciais, descritos por Heidegger em Ser e tempo, da abertura constitutiva do Dasein do compreender, disposição e discurso. Com base nesses existenciais, assinale a alternativa correta: I – O compreender constitui o poder-ser e é sempre disposto, isto é, determinado por uma disposição. II – A disposição diz respeito o modo como o existir já se encontra no mundo, ao modo como já foi lançado. III – A abertura existencial do Dasein significa o caminho aberto que o existir deve seguir para ser si mesmo, isto é, para alcançar a felicidade. (A) Apenas I está CORRETA (B) Apenas II e III está CORRETA (C) Apenas I e II estão CORRETAS (D) Apenas I e III estão CORRETAS (E) Todas estão CORRETAS (22) O pensar fenomenológico não considera o homem e os demais entes da natureza da mesma maneira. Enquanto no homem seu ser está em suas diversas possibilidades de se ser-no-mundo, os elementos da natureza e os entes que não são humanos não têm possibilidade de virem-a-ser eles mesmos. No contexto fenomenológico-existencial, I - O homem é um tempo que se esgota, um intervalo entre o nascimento e a morte, que se emprega, que se empenha, que se reserva, que se omite, enquanto vive; II - Ao homem cabe desenvolver o conhecimento para garantir sua sobrevivência por meio do controle da natureza; III) Sendo a.existência possibilidade, cada qual tem que transformar esta possibilidade no seu acontecimento. A partir da fenomenologia de Heidegger, estão corretas: (A) Apenas a I. (B) Apenas a II. (C) Apenas a III. (D) Apenas I e II. (E) Apenas I e III. (23) Juvenal está em psicoterapia há 6 meses. Nunca falta às sessões. Começou o processo alegando dificuldades na relação com seu chefe, mas estas logo cederam espaço a dificuldades de relacionamento com seu pai quando ele ainda estava vivo. O pai de Juvenal faleceu há 10 meses. O psicólogo que o atende é daseinsanalista e enfatiza em supervisão que o paciente raramente fala a respeito de si mesmo, pois fala do chefe, do pai, da esposa, do filho, sempre como se os outros fossem os causadores de seu sofrimento. Como o psicólogo é daseinsanalista, ele fundamenta sua compreensão em: I – Juvenal é ek-sistência, que significa que ele é por condição jogado no mundo, aí ‘fora’. Assim, chefe, pai, familiares são mundo de Juvenal e, ao falar deles, fala de seu ser-no-mundo. II – De acordo com a noção heideggeriana de existência, Juvenal é ser-com-outros. Isso significa que ele é suas relações com chefe, pai, esposa, filho, etc. e deve-se buscar com ele uma compreensão de quem e como ele é nessas relações. III – A existência pode ser própria ou imprópria. Ao falar o tempo todo dos outros, Juvenal não está se apropriando de sua existência. Pelo contrário, está sendo impróprio, pois só fala dos outros. IV – A existência de Juvenal pode ser descrita fenomenologicamente como antecipar-se a si mesmo, já no mundo em meio aos entes intramundanos que vêm ao encontro. Estão corretas somente: (A) I e II. (B) II e III. (C) III e IV. (D) I, II e IV. (E) I, III e IV. MÓDULO 4 (24) Edna procura um psicólogo fenomenológico-existencial. Relata que está em crise no seu casamento. Ela e João "não se entendem mais." Procurou finalmente a psicoterapia devido a uma briga que tiveram na semana passada. Ela preparou um jantar para os dois, mas ele jantou rápido e foi assistir futebol na TV. "Nem elogiou minha comida! Quando eu falei isso para ele, ele explodiu e saiu de casa. Acho que foi ver o jogo num bar lá perto. Voltou de madrugada." Com base nas reflexões de Critelli (2012), o psicólogo investiga com Edna o que ela esperava (quais eram as intenções) no momento da briga com João. Ele faz isso, pois: (Assinale a alternativa correta) (A) Os atos de Edna não são autossignificantes. O significado deles aparece nas relações com os outros. Pensando na especificidade da relação com João, o significado das ações de Edna depende de como elas repercutem nele. (B) Conhecer as intenções de Edna é a chance de o psicólogo descobrir se João entendeu errado o significado das ações de Edna. (C) O psicólogo pergunta a ela suas intenções, pois estas permanecem veladas a quem age. A psicoterapia tem o objetivo de desvelar as intenções das ações dos pacientes. (D) Compreender as intenções dos gestos e das ações de Edna possibilita ao psicólogo orientá-la a agir mais de acordo com suas intenções. Esse é o objetivo da psicoterapia fenomenológico-existencial: aproximar ao máximo as intenções (singulares) das ações (compartilhadas). (E) As intenções de Edna não têm relação com seus atos. (25) Ana procura um psicólogo fenomenológico-existencial em estado degrande sofrimento. Seu marido faleceu recentemente num acidente de carro. Para ela, essa experiência a fez “perder o chão”. Critelli (2012) mostra, com base no pensamento de Hannah Arendt, que os seres humanos precisam de sentido para viver. Está correto afirmar sobre Ana, fundamentando-se em Critelli (2012) que: I – Os fatos da vida de Ana precisam ser costurados por um fio de sentido. Sua incompreensão em à morte de João indica que esse fato não está ainda tecido aos nexos de seu existir. II – Acontecimentos inusitados provocam uma ruptura com o senso comum. III – Ana sofre com a perda de seu marido, pois essa situação instala Dasein num processo de luto. Esse processo pode ser descrito quanto às fases evolutivas que o compõem em direção à reestruturação da vida cotidiana. Estão corretas somente: (A) I e III. (B) II e III. (C) I e II. (D) I. (E) II. (26) Ana procura um psicólogo fenomenológico-existencial. Ele recorre à concepção de Historiobiografia de Critelli (2012) para buscar com ela uma compreensão de sua história. Isso significa que: I – Na narrativa dessa história pessoal e na sua interpretação, é possível redescobrir os nexos através dos quais se ligam os acontecimentos da existência de Ana e o sentido de ser já realizado. II – O sentido do processo psicoterapêutico como Historiobiografia é tornar o próprio destino disponível para ação e autoria. III – O método fenomenológico exige que Ana suspenda (epoché) as crenças e explicações que tem sobre sua história e seu comportamento. IV – Historietas que Ana retome são indicativas de seu perfil, seus sonhos e temperamento e orientam seu posicionamento nas situações de sua vida. Estão de acordo com a Historiobriografia (Critelli, 2012) apenas as afirmações: (A) I, II e III. (B) II, III e IV. (C) I, III e IV. (D) II e IV. (E) I, II e IV. (27) Critelli (2012) afirma: “A intenção da Historiobiografia é descobrir a personagem que um indivíduo realiza desdobrada no tempo e nas circunstâncias da sua existência. Trata-se do desvelamento de um destino já realizado em nome de um destino em realização. É um processo que favorece aos indivíduos aquisição de lucidez e os prepara para a autoria consciente e responsável na existência.” Podemos dizer, a partir dessas reflexões de Critelli, que a Historiobiografia nos dá pistas para a formulação de uma atitude clínica fenomenológica existencial. São aspectos dessa atitude: I – A importância de refletir sobre as motivações e os significados, tais como o próprio sujeito o compreende. II – A consideração pelos desdobramentos da ação, para além das intenções e dos significados percebidos pelo sujeito, investigando as repercussões de seus atos junto aos outros e ao mundo. III – O realce dado aos comportamentos do cliente, bem como à busca de novos comportamentos e sua modificação. IV – O relevo dado ao papel pedagógico do terapeuta, que compartilha reflexões sobre a condição humana com o cliente. Estão corretas apenas as afirmações: (A) I e III. (B) I e II. (C) III e IV. (D) I, II e III. (E) I, II e IV. (28) A Historiobriografia (Critelli, 2012) é uma “abordagem terapêutico-pedagógica que tem por intenção a redescoberta do sentido da vida através da compreensão da história pessoal.” (p.12) Embora não tenha sido elaborada por uma psicóloga (Critelli é filósofa) nem seja prerrogativa do psicólogo, trata-se de uma abordagem que fornece elementos importantes para a formulação de uma atitude clínica fenomenológica existencial. São aspectos dessa atitude: I – A importância de perguntar ao agente do ato sua intenção. No contexto clínico, isso significa refletir sobre as motivações para ação realizada. II – A consideração de que o sentido de um ato está “no mundo”, isto é, nos desdobramentos iniciados pela ação. Assim, a atitude clínica considera os testemunhos dos atos. Isso pode acontecer na forma de investigar junto ao “autor” as consequências que ele percebeu e/ou ouvindo dos demais envolvidos como interpretaram esses atos. III – A ênfase dada à ação. Num contexto clínico, o psicólogo fica atento às ações realizadas por quem o procura, assim como estimula o cliente a agir de outros modos. IV – A ênfase no aspecto terapêutico-pedagógico, isto é, nos ensinamentos (pedagogia) sobre a condição humana que propiciam mudanças existências (terapia). Estão corretas apenas as afirmações: (A) I e II. (B) II e III. (C) III e IV. (D) I, II e III. (E) I, II e IV. (29) Um dos conceitos mais importantes da Psicologia é “consciência”. Entretanto, as várias psicologias discordam quanto a que se refere esse termo. A filósofa Hannah Arendt tece reflexões sobre a “consciência”, apontando-a como um aspecto próprio da condição humana. Na Historiobiografia de Dulce Critelli (2012), consciência é a condição indicada por Platão de sermos dois-em-um. Isso significa: I – que nosso pensamento pode se desdobrar em dois, tornando-me expectador e avaliador dos meus próprios atos. II – que é da condição humana ser outro de si mesmo. Funda-se na consciência a possibilidade do diálogo (dia – logos) silencioso consigo mesmo. III – que na relação com outros, o dois-em-um se unifica, silenciando-se, possibilitando aparecer ao outro como indivíduo (não dividido). IV – que a consciência é capacidade da existência de compreender seus atos. As intenções, entretanto, escapam-lhe, ficando veladas pela história silenciosa e oculta que cada um é. Estão corretas apenas as afirmações: (A) I e II. (B) II e III. (C) III e IV. (D) II, III e IV. (E) I, II e III. (30) Leitoras da Revista CLAUDIA escrevem o que, para elas, é o mais importante na vida: (Fonte: http://claudia.abril.com.br/materia/felicidade-e-2143?p=comportamentoreflexoes) Felicidade é... "Estar perto de quem eu amo me deixa nas nuvens. Aconteceu recentemente, na minha formatura. As pessoas mais importantes da minha vida estavam lá, foi um momento único" A lista de ingredientes de anônimos e famosos que já experimentaram o sabor da felicidade é variada, bem temperada e afetiva" - Maristela Ramos, 25 anos, designer gráfica, de Curitiba "Felicidade é se dar conta dos momentos maravilhosos que a vida oferece. Tive dois inesquecíveis: os dias em que meus filhos nasceram" - Sandra Helena Ramos, 32 anos, analista financeira, de Joinville (SC) "Minha maior alegria é fazer compras. Outro dia adquiri uma jóia e fiquei radiante" - Josiane Bassoto de Lima, 30 anos, analista de sistemas, de São Paulo "Dar um mergulho, ficar na areia tomando sol e depois ainda comer frutos do mar! Como moro perto de praias lindas, sigo essa receita todo fim de semana. Aprendi que felicidade é deixar de lado o stress do dia e simplesmente curtir o melhor da vida" - Ana Paula Ramos, 26 anos, designer, de Joinville (SC) As afirmações dessas leitoras estão imersas no senso comum (Critelli, 2012), que é nossa realidade compartilhada. Sobre isso está correto afirmar: I – O senso comum é resultante de renovados acordos que os indivíduos tácita ou explicitamente fazem entre si. II – Na perspectiva fenomenológica existencial de Critelli (2012), fundamentada em Hannah Arendt, o senso comum precisa ser suspendido para que uma verdade apareça. III – O senso comum é formado pelas respostas que coletivamente damos às perguntas essenciais: Quem sou eu? Qual é o sentido da vida? Que sentido eu faço nela? IV – As leitoras Josiane Bassoto de Lima e Ana Paula Ramos apresentam o senso comum, pois para elas a felicidade está associada ao consumo e aos prazeres efêmeros, enquanto Maristela Ramos e Sandra Helena Ramos compreendem a felicidade como algo mais profundo, sendo mais autênticas e estando, portanto, além do senso comum. Estão corretas apenas as afirmações: (A) I, II e III. (B) II, III e IV. (C) II e IV. (D) I e III. (E) I e II. (31) Leia o trecho da notícia abaixo, retirado do canal de notícias R7 (http://noticias.r7.com/),sobre os desabamentos em Petrópolis (RJ) em 2011. Psicólogos dizem que vítimas da tragédia precisam reconstruir identidades Perdas inesperadas de parentes e bens pessoais causam transtornos e traumas Monique Cardone, do R7, e Gabriela Pacheco, do R7, em Petrópolis | 22/01/2011 às 06h00 “Qualquer barulho lembra aquela noite”. Essa é a sensação do pedreiro Luiz Cláudio Ramos Fonseca, que perdeu a casa onde morava na região conhecida como Buraco do Sapo, em Itaipava, distrito de Petrópolis, uma das cidades da região serrana do Rio de Janeiro mais atingidas pelo temporal do último dia 11. De acordo com os psicólogos, esse tipo de trauma é comum após experiências em situações de desastre, como os deslizamentos e enchentes na serra, que deixaram centenas de mortos e milhares de desabrigados e desalojados. Segundo o psicólogo Othon Vieira Neto, especialista em emergência e crise, as pessoas que sobreviveram a tragédias como essas têm perdas rápidas e inesperadas de familiares e bens pessoais. - Cada amigo, parente e até objetos fazem parte da história das pessoas. Quando elas perdem tudo, é como se tivessem perdido a identidade. De acordo com Neto, em relação aos pertences, não são os objetos caros que fazem mais falta. - As pessoas se emocionavam mais com a perda dos álbuns de fotos do que qualquer outra coisa simples. E isso não dá para recuperar e nem comprar de novo, como uma televisão ou um sofá. (...) Para a psicóloga Patrícia Adnet, o maior desafio dos profissionais de saúde que vão trabalhar junto com as vítimas é mostrar o sentido de viver novamente após o trauma. - O psicólogo vai ter que ouvir o desabafo, o choro e acolher esses moradores. Eles vão intervir no sentido de ajudar a construir uma nova identidade porque muitos não querem mais viver porque eles até entendem que podem recuperar a casa, mas não a família que morreu. Fonte: http://noticias.r7.com/rio-de-janeiro/noticias/psicologos-dizem-que-vitimas-da-tragedia-precisam-reconstruir-identidades-20110122.html Critelli (2012) se refere à importância da capacidade de narrar os acontecimentos, pois essa narrativa forma o senso comum, suporte da sensação de realidade. Para a autora, se a realidade for caótica, torna-se insuportável e a reação mais comum é de recusá-la. “Um mundo que não puder ser narrado não pode ser habitado.” (p.33) As tragédias são um modo possível de abalar a sensação de realidade. Nesse contexto, está correto afirmar: I – Os eventos da vida precisam ser arranjados numa história para lidarmos com eles. Os nexos que os articulam fundam sua compreensibilidade, ao mesmo tempo em que indicam a ‘identidade’ daquele para quem esses eventos são significativos. II – A matéria apresenta a situação de pessoas que perderam a noção da realidade, por estarem incapazes de articular o ocorrido num nexo de sentido. III – Segundo a psicóloga Patrícia Adnet, o maior desafio dos psicólogos é “mostrar o sentido de viver após o trauma”. Ou seja, é acompanhar as pessoas cuja realidade ruiu no desvelamento de sentido para esse acontecimento em suas biografias, abrindo-se para o futuro possível, que é condição humana. IV – A psicologia fenomenológica existencial, por compreender que desastres abalam a existência das pessoas, pode explicar a elas que essa situação logo passará e que, como a existência é abertura para o futuro, em breve retomarão suas vidas. Estão corretas apenas: (A) I e II. (B) II e III. (C) III e IV. (D) I, II e III. (E) I, II e IV. MÓDULO 5 (32) Analise as duas afirmações abaixo e indique a alternativa correta. I. A nostridade constitui uma unidade originária que possibilita todo si mesmo e toda ipseidade. II. Binswanger compartilha com Freud o entendimento de que a libido é o fundamento do amor e, portanto, da nostridade. (A) As duas asserções são verdadeiras e a segunda é uma justificativa correta da primeira. (B) As duas asserções são verdadeiras e a segunda é uma justificativa correta da primeira. (C) A primeira asserção é uma proposição verdadeira e a segunda uma proposição falsa. (D) A primeira asserção é uma proposição falsa e a segunda uma proposição verdadeira. (E) Tanto a primeira como a segunda são proposições falsas. (33) O psiquiatra Binswanger recorre às fenomenologias de Husserl e Heidegger para “corrigir” a falta de bases epistemológicas da psiquiatria de sua época. Uma das características principais de sua Daseinsanalyse é: (A) A compreensão de que a existência global do paciente está comprometida na assim chamada psicopatologia. (B) Análises fenomenológicas precisas dos sintomas que se instalam no Dasein. (C) Descrição fenomenológica detalhada das causas psicológicas antecedentes aos transtornos psicopatológicos manifestos (sintomas). (D) Divisão fenomenologicamente fundada entre “psicoses existenciais” e “psicoses orgânicas”. (E) Aplicação das ideias de Husserl e Heidegger na psicoterapia, a fim de promover a eliminação da sintomatologia mais eficientemente. (34) Ana foi internada por seu marido ontem na clínica psiquiátrica Santa Maria, onde você é psicólogo. Desde que chegou, Ana está sentada encolhida no canto do quarto que lhe foi destinado. Segundo o marido, ela estava assim em casa também. Está escondida por sob seus braços, mas de vez em quando “arrisca” olhar ao redor; quando seu olhar se cruza com o de qualquer pessoa, esconde-se novamente. Para compreender a experiência de Ana à luz da Daseinsanalyse de Binswanger é mister: I – Considerar a espacialização de Ana, isto é, como seu mundo se lhe abre espacialmente. Seu recuo ao canto é indicativo dessa espacialidade. II – Considerar a afinação (tonalidade afetiva) de seu mundo. Sua “fuga” das trocas de olhares é indicativo disso. III – Considerar como Ana se relaciona com os outros. Como ela está encolhida no canto, ela não está se relacionando. Estão corretas somente: (A) I e II. (B) II e III. (C) I e III. (D) I. (E) II. (35) Segundo DASTUR & CABESTAN (2015), É na crítica ao psicologismo à qual se dedica Husserl no primeiro tomo de suas Investigações Lógicas, publicadas em 1900, e em sua definição da consciência em termos de intencionalidade e de sentido, que ele encontrou pela primeira vez os motivos de se opor ao naturalismo e ao biologismo de Freud.” (p.64) Verifica-se a intencionalidade na Daseinsanalyse de Binswanger nas seguintes concepções: I – Binswanger assume a existência como ser-no-mundo, isto é, existência e mundo como uma unidade indissociável. II – Nas análises fenomenológicas de Binswanger, buscam os símbolos e significados ocultos por trás dos fenômenos patológicos manifestos. III – Nas análises do mundo do melancólico, do maníaco, etc., pois objeto (mundo) e consciência (existência) se constituem concomitantemente. Estão corretas somente: (A) I e II. (B) II e III. (C) I e III. (D) I. (E) II. (36) Jaime procura terapia e é recebido por um daseinsanalista. O paciente conta: Desde que minha esposa me largou, nunca mais consegui ser feliz. Nem no trabalho, que eu gostava tanto, me realizo mais. Eu trabalhava bastante e estava indo bem; tinha sido promovido a gerente de negócios em todo o estado. Com isso tive um ótimo aumento, de modo que ia conseguir quitar o financiamento de nossa casa. Mas aí, de repente, ela aparece e diz que sou um acomodado, que não faço nada para nós dois, que só penso em trabalhar. E me larga. Meus amigos tentam me levar para happy hours, mas nunca mais conseguirei me relacionar com ninguém. Sinto saudades da minha esposa. Compreendendo a narrativa de Jaime à luz da fenomenologia-existencial (Binswanger) está correto afirmar: I – Jaime está passando por um episódio depressivo. A falta de prazer no trabalho é sintoma de sua depressão, motivada pelo abandono da esposa. II – As frases “nunca mais consegui ser feliz” e “nem sei mais como chegar numa mulher” são reveladores da infiltração de momentos retentivosna protenções, isto é, de uma experiência de um futuro já acontecido. III – Quando deixa-o, a esposa de Jaime produz um abala em seu cotidiano, rompendo com o nexo que reunia os acontecimentos, abalando a pressuposição de que tudo continuará sendo como sempre foi (base da experiência da realidade, segundo Binswanger). Estão corretas somente: (A) I e II. (B) II e III. (C) I e III. (D) I. (E) II. MÓDULO 6 (37) Édson, comerciante de 49 anos, procurou psicoterapia no começo do ano. Logo no início da primeira sessão conta que tem dúvidas quanto a permanecer casado. Considera que se casou jovem, quando não tinha tanta experiência, e que se pudesse voltar no tempo teria esperado mais para tomar essa decisão. Está casado há 30 anos e tem 3 filhos (João, 27, Édson Jr., 24 e Juliana, 16). Perdeu o emprego há 10 anos e começou um negócio própria de venda de cosméticos, mas desde então vivencia dificuldades financeiras. Conta que a esposa, que ”tem um salário muito bom”, ajuda nas finanças. Sente que ela o cobra e critica constantemente. Não fez a faculdade de administração que queria ter feito, o que contribui para a sua sensação de ser um fracassado. Conta que quando fica em casa é desleixado, às vezes nem faz a barba. Conversa muito pouco com sua esposa e quando faz, frequentemente acabam discutindo. Conta que não têm relações sexuais há muitos anos. Conta que antes de se casar saía com muitas mulheres. Essa atitude não mudou desde que casou, pois frequentemente sai com mulheres sem que sua esposa saiba. Às vezes os relacionamentos extraconjugais ficam mais sérios, como o que vivencia atualmente. Está se relacionando com Joana há 2 anos. Sente-se cobrado por Joana, que mais uma vez ameaçou terminar o relacionamento com ele caso ele não se divorcie para ficar ela. Nos últimos meses, não sente “tanto tesão por ela”, explicando que “não tem suportado ficar deitado junto com ela por muito tempo. Temos discutido muito.” Está muito aflito neste momento também porque sua filha descobriu o caso com Joana. Édson está confiante de que sua filha não contará nada à mãe, mas sabe que ela não concorda com a situação, pois ela deixou de falar com o pai desde que descobriu. Conta por fim que procurou a terapia, pois já teve que ir ao hospital duas vezes por fortes dores no peito e sensação de que ia morrer, mas chegando lá os médicos não diagnosticaram nenhum problema cardíaco e recomendaram a visita a um psiquiatra. Não sabe o que fazer e se sente impotente par agir. Veio pedir ajuda ao psicólogo para tomar uma decisão. Considera-se numa situação difícil, pois não quer magoar ninguém. Descreve-se como doente. Sendo daseinsanalítico, o psicólogo que atende Édson: I – ouve a fala dele como reveladora de sua realidade. Conhecer Édson significa compreender seu modo de ser-no-mundo, isto é, sua situação enquanto modo como está sendo possível existir neste momento. II – para conhecer Édson, precisará conhecer as pessoas de sua convivência, assim desvelar mais claramente os fenômenos referentes à vida conjugal. Para isso o psicólogo precisa convidar a esposa dele para pelo menos uma sessão. III –entende que Édson está distante de si mesmo, pois se enxerga a partir das relações que vivencia. Seu bem-estar está condicionado aos relacionamentos. Para a daseinsanalyse, o dasein é singular e precisa cuidar de sua existência a partir de si mesmo, tornando-se independente. IV –ouve as falas de Édson sobre sua esposa, sua amante e sua filha como descritivas de seus modos de ser-com-os-outros. A existência é sua situação, é suas relações. Nestas relações Édson é ser-no-mundo-com-os-outros e esses outros desvelam-se para ele tal como ele os descreve. Estão corretas: (A) II e III, apenas. (B) I, II e III, apenas. (C) I, II, III e IV. (D) I, II e IV, apenas. (E) I e IV, apenas. (38) Segundo a daseinsanalista Ida Cardinalli, “O método fenomenológico heideggeriano exige o passo de volta para trás do fenômeno, no sentido vulgar, para o âmbito em que o fenômeno é, antes, aquilo que se oculta” (Daseinsanalyse e Esquizofrenia, 2004, p. 62). Assim a autora retoma a idéia de fenômeno, que constitui a busca metodológica da fenomenologia. Podemos dizer que, no contexto daseinsanalítico, a definição de fenômeno indica: I – Explicitar os fundamentos do modo de ser do Homem. II – Não ver o Homem como objeto da Natureza, possível de estudo e mensuração igual aos demais objetos da Natureza. III – O método não pode visar determinação causal, mensurabilidade, objetificação. IV – Deve ser precisa e conseguir determinar suas conclusões baseadas em uma estrutura teórica bem definida. V – Conseguir qualificar e classificar os fenômenos estudados, sem deixar a subjetividade alheia atrapalhar. Estão corretas apenas: (A) I, II, e III. (B) I, III e IV. (C) I, II, III e IV. (D) II, IV e V. (E) II, III e V. (39) A daseinsanalista Cardinalli afirma que “a compreensão do homem, em cada caso particular, também precisa estar orientada pela explicitação do existir como Dasein, para superar a concepção de homem presente nas diversas teorias das Ciências Humanas” ((Daseinsanalyse e Esquizofrenia, 2004, p. 75). Isso significa dizer que: (A) Os fenômenos humanos devem ser compreendidos a partir do modo pelo qual correspondemos a algo, ou seja, a partir do modo como nossa relação com o mundo é definida. (B) Os fenômenos humanos só devem ser compreendidos em particular, como algo interior e subjetivo ao indivíduo. (C) A existência humana é independente do modo como estabelecemos nossa relação com o mundo. (D) Ao se orientar pela explicitação do existir como Dasein, a fenomenologia visa propor um ideal de saúde psicológica a ser atingido pelos pacientes. (E) Para constituir-se como mais uma teoria científica humana, a fenomenologia precisa orientar-se pela explicação do existir humano como Dasein. (40) Evangelista (2015) apresenta a Daseinsanalyse de Medard Boss e suas contribuições para uma prática clínica fundamentada no pensamento heideggeriano. Para Boss, a psicopatologia daseinsanalítica não se baseia nos manuais de psiquiatria e ganha nova dimensão, quando pautada no existir humano como Dasein. Considere as afirmações abaixo e indique a alternativa correta: I – A descrição do fenômeno patológico supõe o esclarecimento entre a realidade e a experiência do paciente, que não se adequa à realidade vivida pelo paciente sadio. II – Os sintomas corporais patológicos e os chamados psíquicos são sempre privações e podem ser compreendidos como reduções de possibilidades de compreensão do mundo e de si mesmo. III – A Daseinsanalyse se ocupa com trazer à luz o que se mostra do próprio fenômeno e tornar visível o fenômeno patológico. Estão corretas somente: (A) I. (B) II e III. (C) I e II. (D) I e III. (E) III. (41) O psicopatologista francês Tatossian fundamenta suas pesquisas e sua prática clínica na fenomenologia existencial, dialogando constantemente com a Daseinsanalyse de Boss e Binswanger. Para ele, no contexto fenomenológico-existencial, a psicopatologia adquire nova significação. Ele afirma: A especificidade psicopatológica não é fornecida pelas modificações de comportamento, mas pelas modificações do vivido que compreendem as diversas formas de delírio, o distúrbio do humor melancólico ou maníaco e uma grande parte dos distúrbios da percepção e do pensamento da psicopatologia clássica. Mas essas modificações do vivido que se apresentam na pessoa global, e não são redutíveis aos distúrbios das funções parciais do psiquismo, estão escondidas sob o que se mostra imediatamente ao psiquiatra e não podem ser apreendidas, a não ser indiretamente, pela observação psiquiátrica, em que os dados resultam do comportamento material. Essas são as modificações do vivido, que se pode chamar, por exemplo, de ‘estruturas’, para distingui-los dos sintomas, que são as modificações do comportamento que carregam todo o peso da especificidadepsiquiátrica. (2006, p.41) Considerando que Tatossian se aproxima da Daseinsanalyse, é correto afirmar: (A) O psicopatologista observa os comportamentos tidos como psicopatológicos, a fim de reuni-los como ‘síndromes’. As psicopatologias (depressão, esquizofrenia, etc.) são conjuntos de sintomas. É fenomenologia pois observa estritamente o que se mostra, (o comportamento observável). (B) As ‘modificações do vivido’ de que fala Tatossian são modificações no psiquismo do sujeito, portanto, interiores. O sentido das ações do paciente permanece oculto, sendo que a fenomenologia é o desvelamento das causas ocultas dessas ações. (C) Ao afirmar que as modificações do vivido “estão escondidas sob o que se mostra imediatamente ao psiquiatra e não podem ser apreendidas, a não ser indiretamente” Tatossian está afirmando que existem motivações inconscientes que precisam descobertas pela fenomenologia. (D) Para a fenomenologia o delírio, os distúrbios do humor e os da percepção e do pensamento devem ser pensados como modos possíveis de ser e estar no mundo com os outros. (E) A fenomenologia busca as estruturas existenciais da psicopatologia. Assim, busca-se fenomenologicamente no enfermo qual é a estrutura que está se manifestando nele: uma “estrutura psicótica”, “estrutura maníaca”, etc. (42) Segundo Evangelista (2015), nos Seminários de Zollikon Heidegger apresenta aos médicos psiquiatras convidados de Medard Boss indicações para a elaboração de uma nova ciência do homem que leve em conta a condição humana, chamada por ele de Dasein (ser-aí). Em relação à nova ciência do homem, está correto afirmar que: I – é necessário ter uma explicação clara dos modos de ser do homem; II – os conceitos que se referem aos modos de ser do homem são investigados a partir da abstração do contexto social em que a existência acontece; III – após encontrar uma pluralidade de significados para o fenômeno estudado, faz-se necessário a escolha de apenas uma definição/conceito; IV - o homem não deve ser representado como objeto da natureza. Estão corretas somente: (A) I, III e IV. (B) I e II. (C) III e IV. (D) II e III. (E) I e IV (43) Juarez (66 anos, aposentado) é trazido à psicoterapia por sua filha. Na entrevista inicial, ele entra sozinho e explica que caiu no banheiro e quebrou o fêmur há 3 meses. Fez cirurgia, inserindo uma prótese de quadril. Desde então, sua mobilidade restringiu-se. Frequentava um clube perto de sua casa, onde encontrava velhos amigos para jogar dominó e conversar, mas não consegue mais caminhar até lá. Diz: “fiquei dependente da boa vontade de meus filhos, mas não quero atrapalhar a vida deles.” Não vê motivo para ir ao psicólogo, pois “meu problema é ortopédico”. Medard Boss, fundador da Daseinsanalyse, “critica a medicina científico-natural por não compreender o sentido do adoecer humano, focalizando apenas os mecanismos que explicam o processo biológico. Critica-a também por cindir a existência humana em aspectos biológicos e psicológicos, relegando os psicológicos a outro profissional.” (EVANGELISTA, 2015, p.147-8) Considere as afirmações abaixo a respeito da Daseinsanalyse de Medard Boss e indique a alternativa correta. I – Para a compreensão existencial (daseinsanalítica) do sofrimento de Juarez, o psicólogo deve considerar quais as possibilidades de ser no mundo que estão atualmente restritas. Como ele informa dificuldades para encontrar amigos, a fratura no fêmur é “fratura” desse modo de ser. II – Por enquanto, Juarez não demanda para psicoterapia, pois o motivo do seu sofrimento já é conhecido e explicável fisiologicamente: quebrou o fêmur e, de fato, a recuperação da mobilidade leva tempo e depende de fisioterapia. III – Com dificuldades para encontrar seus amigos no clube, Juarez está com esse modo de ser-com-outros restrito. Estão corretas somente: (A) I e III. (B) II e III. (C) I e II. (D) I. (E) I, II e III. (44) Evangelista (2015) apresenta a Daseinsanalyse de Medard Boss como uma nova ciência da saúde humana, que conjuga aspectos da Psicanálise de Freud com a filosofia de Martin Heidegger. Por meio dessa articulação, Boss entra na discussão da “Psicossomática”, disciplina que explica a relação entre o “psíquico” e o “somático”. Considerando essa disciplina é correto afirmar: I – Quanto à Psicanálise e Freud, Boss é crítico somente da Metapsicologia, isto é, o modelo hipotético que explica o funcionamento mental. A prática investigativa de sentido formulada por Freud – a psicoterapia – é seguida por ele, mas fundamentada na fenomenologia existencial de Heidegger. II – Boss é crítico da Psicossomática psicanalítica, pois, para a Daseinsanalyse, as causas dos sintomas psicossomáticos devem ser buscadas nos sentimentos de culpa e angústia do Dasein. III – Na Daseinsanalyse, o termo “Psico-Somática” é inadequado, pois a existência é um todo não divisível em psique e corpo. IV – A Daseinsanalyse não compreende as histerias de conversão como manifestação corpórea de mecanismos psíquicos. Tratam-se, outrossim, de modos de realizar, sem assumi-las clara e abertamente, determinadas possibilidades existenciais. Estão corretas somente: (A) I, II e III. (B) I, III e IV. (C) III e IV. (D) I e II. (E) I, II, III e IV. MÓDULO 7 (45) Eduardo procura um psicólogo, afirmando que está infeliz no trabalho e no casamento. Quando o psicólogo pede para ele detalhar seu sofrimento, Eduardo não expõe nada muito claro. Não encontra nada específico que sinta que lhe faz mal no trabalho nem no casamento. Dá-se conta, enquanto fala, que não entende por que se sente infeliz, embora sinta-se assim. Ele opta por iniciar um processo psicoterapêutico. O psicólogo que o atende é fenomenológico-existencial (daseinsanalítico), fundamentando sua atitude de acordo com as descrições de Jardim (2015) em Ação e Compreensão na clínica fenomenológico-existencial.Sobre o processo psicoterapêutico neste contexto está correto afirmar: I – A ação clínica do psicólogo daseinsanalítico tem como sentido a identificação dos modos de ser da esposa de Eduardo que contribuem para que ele esteja tão infeliz com ela. II – O daseinsanalista terá como fio-condutor de seus esforços compreender os modos de ser de Eduardo no mundo e assim desvelar para ele a origem das suas dificuldades de relacionamento. III – O daseinsanalista cultivará uma relação com Eduardo na qual ele possa se aprofundar nos temas trazidos, articulando diferentes dimensões existenciais. IV – O daseinsanalista se comunicará com uma linguagem poiética, que significa que recorrerá a músicas, poemas e outros recursos expressivos para compreender com ele sua experiência. V – O objetivo da psicoterapia daseinsanalítica de Eduardo é propiciar ao paciente uma atitude de responsabilidade com a própria vida. Estão corretas: (A) I, II e IV, apenas. (B) II, III e IV, apenas. (C) II, III, IV e V, apenas. (D) III e V, apenas. (E) II, IV e V, apenas. (46) Alvina perdeu seu filho a dez anos. Ele era usuário de drogas, vindo a falecer, segundo ela, em decorrência do uso de crack. Na sessão ela relata que ele a fez sofrer muito, passando noites desaparecido. Mas quando o reencontrava, não conseguia brigar com ele por causa de “amor de mãe”. Chora muito dizendo que não sabe em que errou. Faz acompanhamento com psiquiatras a bastante tempo, sendo medicada com antidepressivos, mas isso não faz com que suma sua vontade de “ir ficar com ele”. Diz que nunca pensou em se matar, pois é religiosa, mas sente muitas saudades de seu filho e quer voltar a cuidar dele. Também relata sofrer com dores de cabeça fortes e dores na coluna, que a impedem de trabalhar. Vive de aposentadoria por invalidez. Pede que o psicólogo a ajude a não se sentir mais assim, pois não suporta mais tanto sofrimento. Considerando esse relato, indique a alternativa incorreta sobre compreensão fenomenológico-existencial do sofrimento psicológico de Alvina. (A) Alvinaestá restrita quanto às possibilidades de compreender o sentido que sua relação com seu filho teve e tem em sua vida. (B) Os sentimentos de tristeza, dores e vontade de morrer manifestam a importância do filho para ela. (C) Alvina busca a eliminação desses fenômenos, sendo o morrer a forma mais radical de fechamento para as possibilidades. (D) Alvina lança-se em direção ao seu futuro antecipando a permanência de seu sofrimento, não vislumbrado outra possibilidade senão a morte. (E) Alvina repete comportamentos que a tornam pouco eficaz nos relacionamentos sociais. A ausência de uma rede de apoio e de estímulos positivos gera empobrecimento de sua existência. (47) João Augusto Pompeia recorre ao conceito de Heidegger de Era da Técnica para se referir à nossa contemporaneidade. Considere as afirmações abaixo sobre Mundo da Era da Técnica e assinale a alternativa correta: I – No mundo da técnica, um mundo que quem manda é quem controla as situações é necessário controlar a si mesmo, é necessário ter autodomínio, controlar inclusive o corpo (emagrecer, vontades, desejos, impulsos, dores, emoções, fantasias, etc.), e o psicólogo fenomenológico-existencial (daseinsanalítico) tenta fugir dessa necessidade. II – Mesmo no mundo da técnica o psicólogo fenomenológico-existencial (daseinsanalítico) entende que o ser-aí é chamado a ser o poder ser que ele é, que ele não se limita a corresponder às solicitações feitas pela técnica e, portanto esse poder-ser abre-se para muito além disso. III – Que o psicólogo fenomenológico-existencial (daseinsanalítico) entende que para dominar as emoções e os comportamentos é necessário ouvir o que eles estão dizendo, é olhar para o que está aparecendo e com isso abandonar um jeito conhecido de ser para vir-a-ser de outro jeito ou aprender a ficar com o jeito velho de ser enquanto o novo jeito não chegar. IV – Que o psicólogo fenomenológico-existencial (daseinsanalítico) acredita que o modo de ser temporal do Dasein é sempre calculado, medido, quantificado. Que tempo perdido para ele é prejuízo e que o Dasein por ser um ser-aí vive preso no tempo linear (relógio, calendário, etc...). Estão corretas somente as afirmações: (A) II, III e IV. (B) I, II e III. (C) I, II e IV. (D) I e II. (E) I, III e IV. (48) BARRETO & MORATO (2010) pensam a ação clínica do psicólogo fundamentadas na psicologia fenomenológico-existencial, de acordo com a concepção de Jardim (2015). Afirmam elas: “Esse novo olhar, ao desalojar o homem da sua habitual relação com o mundo e a consciência, abre um espaço que só aparece quando o habitual é desconstruído e o homem(Dasein) se descobre entregue à tarefa inexorável de “ter-que-ser”. Essa quebra do habitual pode vir a acontecer quando o homem começa a ceder ao apelo dos traços fundantes e constitutivos (ontológicos) do nosso modo de ser.” (p.50). Este trecho nos apresenta uma reflexão sobre o novo olhar que surge a partir da ação clínica na Fenomenologia. Considere as afirmações abaixo a respeito de ação clínica e indique a alternativa correta. I – A ação clínica pode ser pensada como um espaço que abre para novas formas de existir. II – A ação clínica busca reestabelecer o equilíbrio do existir diário que havia antes da crise. III – Espaço de reflexão de quebra do estabelecido IV – Trata-se de um espaço onde se pode perceber os erros e acertos da vida. V – Espaço de acolhimento da constituição originária do homem. Estão corretas somente as afirmações: (A) I, III e V. (B) I, III e IV. (C) II, IV e V. (D) I e III. (E) III, IV, e V. (49) Segundo JARDIM (2015), Por um lado, na familiaridade da queda (Verfallen) o fazer repetitivo é constitutivo e indispensável para o existir, tornando desnecessário que as atitudes sejam pensadas e percebidas a todo o momento; por outro, essa mesma repetição pode se tornar um aprisionamento quando restringe a possibilidade de surgimento de um novo modo de ser, isto é, de uma ação propriamente dita que abra outros caminhos para lidar com os questionamentos próprios de cada um. (p.69-70) Na terapia daseinsanalítica isso implica em: I – O terapeuta deve retirar o paciente da familiaridade da queda. II – Não se pode falar de ‘neurose’ na Daseinsanalyse, mas, sim, de modos repetitivos de ser. Assim o Dasein pode ter uma estrutura repetitiva, isto é, uma essência que tende a repetir. Cabe ao terapeuta descrever essa estrutura e o paciente assumi-la como sua. III – O sofrimento existencial está relacionado a uma queda no fazer repetitivo que fecha para novos modos de ser. IV – O sentido da ação clínica é resgatar a condição de agente, isto é, iniciante na própria vida, recuperando a liberdade para projetar-se adiante. Estão corretas somente: (A) I, II e III. (B) II, III e IV. (C) III e IV. (D) I e III. (E) I e II. (50) Ao refletir a respeito da ação clínica como modo específico de agir do psicólogo fenomenológico-existencial, BARRETO E MORATO (2009) afirmam que: “Cada ser humano é único e singular; exige do profissional de Psicologia abertura ao inusitado, à reinvenção da sua forma de trabalhar, à revisitação da teoria psicológica e da concepção de subjetividade que sustenta sua proposta de intervenção clínica.” (p.50). [Referência bibliográfica: BARRETO, C. & MORATO, H. T. P. “A ação clínica e a perspectiva fenomenológica existencial” In: MORATO, H. T. P. et al. Aconselhamento Psicológico numa perspectiva fenomenológica existencial, p.41 – 51.] Sobre a ação clínica como modo de agir do psicólogo fenomenológico-existencial está correto afirmar: (A) Escutar, intervir e interpretar o fenômeno que ali se apresenta considerando a singularidade de cada paciente. (B) Deixar que as coisas apareçam com seus significados, reuni-los e permitir que sentidos se articulem, auxiliando o paciente a projetar a responsabilidade de seu sofrimento no outro. (C) Possibilitar que o ato terapêutico se manifeste em um ato criativo numa busca a dois, numa procura paciente de descrever, compreender e analisar a realidade como vem ao encontro do paciente. (D) Buscar compreender a angústia do paciente, facilitando a superação da insegurança que existe nele e que o impede de realizar-se em todas suas potencialidades. (E) Compreender o paciente, a partir do mundo próprio dele, a fim de explicitar as normas, valores que sua existência se apoia e, a partir dessa compreensão, oferecer caminhos para que ele possa seguir em direção à solução de uma situação difícil. (51) POMPÉIA (2012) afirma: “A existência é acompanhada por transformações constantes, muitas das quais nós mal percebemos, porque vêm aos poucos; outras são repentinas, inesperadas. Tudo em nós é sujeito a mudanças: nosso corpo, nossas relações com os outros, nossas condições de vida em geral. São mudanças que tanto podem ser aquelas que representam um desenvolvimento, quanto aquelas que significam perda. Poder sofrer perdas pertence à condição da existência, que se caracteriza pela fragilidade, pelo poder ser atingida por acontecimentos de todos os tipos.” (p. 93). Sobre as alterações que afetam diretamente o corpo, como por exemplo, amputações, perda de funções, de habilidades, entre outras, analise as afirmações abaixo e indique a alternativa correta: I – Uma perspectiva fenomenológico-existencial compreende que alterações drásticas no corpo de uma pessoa implicam em alterações drásticas em seu modo de ser-no-mundo. II – Uma perspectiva fenomenológico-existencial compreende que a amputação de uma perna, por exemplo, implicará em mudanças nas relações da pessoa consigo mesma, com os outros e com as coisas. Isso porque, certas mudanças corporais podem inviabilizar ou restringir a execução de algumas atitudes que dizem respeito à realização daquilo que faz parte do caminho da pessoa em direção ao que dá sentido à sua vida. III – Uma perspectiva fenomenológico-existencial compreende que perdas de funções corporais podem afetar a existênciade uma pessoa, pois, por serem corpo e psique dois opostos que se encontram em intrínseca relação, a alteração em um interfere diretamente no funcionamento do outro. Estão corretas somente: (A) I e II. (B) I e III. (C) II e III. (D) II. (E) III. (52) Segundo Jardim (2015), “[...] é o sentido que pode se revelar no aí compartilhado da terapia para o terapeuta e para o paciente, com base no qual se articula o modo de ser deste último. [...] O sentido desvela as próprias relações de mundo do paciente e como ele as compreende” (p.56). Com base nos fundamentos da prática da Daseinsanalyse, está correto afirmar que: I – O desvelamento e a compreensão dos modos de ser do paciente são um convite para a possibilidade de ele se aproximar de si mesmo. II – O terapeuta caminha lado a lado com o paciente. No entanto, não cabe ao primeiro decidir em nome do paciente. III – O desvelamento do sentido permite que o terapeuta se atente para indicar outro sentido a seguir, corrigindo o que não está bem. Estão corretas somente: (A) I. (B) II e III. (C) I e II. (D) I e III. (E) II. MÓDULO 8 (53) A Psicoterapia de orientação fenomenológica propõe para o terapeuta um modo próprio, uma postura no encontro com o cliente que configura um fazer terapêutico peculiar. Assinale a alternativa correta no que se refere à abordagem fenomenológica em psicoterapia: I. O terapeuta inicia a sessão levando consigo um arcabouço teórico explicativo, uma teoria de psicologia que, de antemão, lhe oferece respostas para os fenômenos. II. Trabalhar com a orientação fenomenológica implica em ir direto ao fenômeno, buscar o significado único que se apresenta naquele caso em particular, que pode inclusive contrariar as teorias propostas pela Psicologia. III. O terapeuta não ignora as teorias, pelo contrário, somente reconhecendo-as é capaz de manter o pensamento aberto diante do fenômeno. O referencial básico do pensar fenomenológico está ancorado nos pressupostos de Heidegger acerca do existente. (A) Apenas I é verdadeira. (B) Apenas III é verdadeira. (C) I, II são verdadeiras. (D) II e III são verdadeiras. (E) Apenas II é falsa. (54) Você é contratado como psicólogo na Casa Hope, instituição filantrópica que dá apoio a crianças e adolescentes de baixa renda portadores de câncer. O diretor que te contratou explicou que te dá liberdade para cuidar das várias demandas que aparecem nesse lugar. Logo no seu primeiro dia de trabalho uma mãe o procura. Você nem tem uma sala ainda e a informação que recebeu é que os profissionais dessa instituição não costumam ter salas próprias. A mãe traz seu filho para cadastro e está desesperada, pois ele acaba de receber diagnóstico de um câncer na medula. Como você trabalha fundamentado na abordagem fenomenológico-existencial, são atitudes possíveis nessa situação: I – Receber a mãe e conversar com ela sobre seu sofrimento, buscando esclarecer o que o motiva e que recursos ela tem para lidar com esta situação. Você estará realizando um plantão psicológico. II – Explicar a ela que como você está chegando ainda não tem um consultório, de modo que não pode realizar uma sessão de plantão psicológico nem psicoterapia, pois ambos precisam de um setting delimitado e privacidade. III – Agendar com ela uma triagem para avaliar o grau de urgência do sofrimento relatado, a fim de confirmar a necessidade de encaminhá-la ao plantão psicológico. IV – Buscar uma compreensão com ela a respeito de como está recebendo essa notícia e de como isso esgarça a malha de seu senso comum. V – Acolhê-la e explicar que ela não pode se desesperar, pois isso passará insegurança ao seu filho, que é quem está verdadeiramente sofrendo. Estão corretas apenas as afirmativas: (A) II, III e IV. (B) I e IV. (C) I, III e V. (D) III, IV e V. (E) II e V. (55) Ana é encaminhada ao psicólogo por um psiquiatra. Está com 17 anos. Recentemente teve uma “crise psicótica”, segundo informa. Tinha ido ao shopping para conhecer pessoalmente um rapaz com quem se comunicava pela internet e de quem estava gostando. Sentia que finalmente iria dar seu primeiro beijo. Combinaram às 15:00. Ela chegou às 14:00, sozinha, e ficou o aguardando na praça de alimentação, no 4º andar. Foi uma sugestão dele que ela aceitou, embora sempre se sinta muito mal em ambientes com muita gente e muito barulho. Às 15:45 ele ainda não tinha chegado. “Eu fiquei desesperada, saí chorando da praça da alimentação. Nem lembro o que aconteceu, sei só que de repente tinha um segurança me segurando e dizendo para eu me acalmar e me distanciar do vão central. Fiquei muito nervosa com aquele homem me agarrando, gritei, chutei.” Mais adiante na sessão diz: “Não sou louca. Não sei o que está acontecendo comigo. Não consigo parar de tentar lembrar do que aconteceu. Que vergonha! Que vergonha! Todo mundo estava me olhando como se eu fosse louca! Não consigo tirar isso da minha cabeça... o dia todo lembro e me sinto muito mal... não consigo fazer nada.” O psicólogo que a recebe é daseinsanalista. Baseando-se nessa abordagem, considere as compreensões e atitudes do psicólogo nesta abordagem abaixo e indique a alternativa que apresenta as corretas. I – O episódio que Ana relata não está claro nem para ela, nem para o psicólogo. O psicólogo precisa ajudar Ana a entender o que aconteceu. Quando tiver consciência do ocorrido, deixará de ficar atormentada pelo episódio. II – O psicólogo compreende do relato de Ana que o motivo de todo o seu sofrimento foi a ausência do rapaz que ela encontraria. III – Ana está num momento de grande restrição existencial, sentindo-se angustiada e culpada. Essa situação é sua demanda psicológica, que precisa ser acolhida pelo psicólogo. IV – O sentido de uma psicoterapia neste momento é acompanhar Ana na busca de uma compreensão de seu modo de ser-no-mundo, cultivando a abertura para novas formas de existir. V – O sentido da ação clínica psicológica na daseinsanalyse é ajudar Ana a não pensar no que aconteceu no shopping. O motivo de seu sofrimento atual é a ocorrência de pensamentos obsessivos. Estão CORRETAS somente: (A) I, II e V. (B) III, IV e V. (C) II, III e V. (D) I, III e IV. (E) III e IV. (56) Eduardo procura um psicólogo, afirmando que esta infeliz no trabalho e no casamento. Quando o psicólogo pede para ele detalhar seu sofrimento, Eduardo não expõe nada muito claro. Não encontra nada específico que sinta que lhe faz mal no trabalho nem no casamento. Dá-se conta, enquanto fala, que não entende por que se sente infeliz, embora sinta-se assim. Ele opta por iniciar um processo psicoterapêutico. O psicólogo que o atende é fenomenológico-existencial (daseinsanalítico), fundamentando sua atitude de acordo com as descrições de Pompéia (2004) em “Uma caracterização da Psicoterapia”. Sobre o processo psicoterapêutico neste contexto está correto afirmar: I – A ação clínica do psicólogo daseinsanalítico tem como sentido a identificação dos modos de ser da esposa de Eduardo que contribuem para que ele esteja tão infeliz com ela. O psicólogo desvelará para ele suas dificuldades de relacionamento e novas formas de ser-com, tornando-o menos conflituoso e infeliz. II – O daseinsanalista terá como fio-condutor de seus esforços para compreender os modos de ser de Eduardo a pergunta: “que sonhos de Eduardo terão morrido?” III – O daseinsanalista cultivará uma relação com Eduardo na qual o que já lhe foi caro (querido, do coração), mas que perdeu esse vínculo e tornou-se desgastado, possa ser relembrado. IV – O daseinsanalista se comunicará com uma linguagem poietica, que significa que recorrerá a músicas, poemas e outros recursos expressivos para compreender com ele sua experiência. V – O objetivo da psicoterapia daseinsanalítica de Eduardo é recuperar sua liberdade para sonhar, atualmente perdida. Está CORRETO apenas o que se afirma em: (A) II, III, II e V (B) II, III e V. (C) I, II, III e IV.(D) I, III, IV e V. (E) I e IV. (57) Jaime procura terapia e é recebido por um daseinsanalista. O paciente conta: Desde que minha esposa me largou, nunca mais consegui ser feliz. Nem no trabalho, que eu gostava tanto, me realizo mais. Eu trabalhava bastante e estava indo bem; tinha sido promovido a gerente de negócios em todo o estado. Com isso tive um ótimo aumento, de modo que ia conseguir quitar o financiamento de nossa casa. Mas aí, de repente, ela aparece e diz que sou um acomodado, que não faço nada para nós dois, que só penso em trabalhar. E me larga. Meus amigos tentam me levar para happy hours, mas nem sei mais como chegar numa mulher. Sinto saudades da minha esposa. Compreendendo a narrativa de Jaime à luz da fenomenologia-existencial está correto afirmar: I – Jaime está passando por um episódio depressivo. A falta de prazer no trabalho é sintoma de sua depressão, motivada pelo abandono da esposa. II – As frases “nunca mais consegui ser feliz” e “nem sei mais como chegar numa mulher” são ouvidas pelo terapeuta como experiências associadas à restrição do poder-ser de Jaime. III – Quando deixa-o, a esposa de Jaime produz um abalo em seu cotidiano, gerando perplexidade e paralisando-o. A única saída para Jaime é se reconciliar com sua esposa para poder recuperar o sentido de sua vida. IV – Ao procurar psicoterapia, Jaime está sinalizando que está questionando-se e marcado por um sofrimento. A terapia oferece a ele o colocar-se diante de sua existência, desafiando-o a ser ele mesmo e partindo em busca de possíveis sentidos dentro do incompreendido. Estão corretas somente as afirmações: (A) I, II e III. (B) II e IV. (C) I e IV. (D) II e III. (E) IV. (58) No livro A existência para além do sujeito, Feijoo (2011) relata a interpretação fenomenológico-existencial do comportamento de Ântonio, menino de sete anos trazido à psicoterapia por indicação de um psiquiatra que diagnosticara cleptomania. O modo de lidar com os fenômenos clínicos nessa situação é característico do processo psicoterapêutico nessa abordagem, que pode ser descrito como: I – Deve-se suspender diagnósticos e quaisquer outras interpretações prévias a fim de que a criança possa se mostrar por si mesma. II – A pergunta que norteia a escuta e a observação do psicólogo é “por que a criança age assim?”, buscando desvelar as causas de seu comportamento. III – Os sintomas ‘psicológicos’ da criança são sempre manifestações de problemas dos pais. A criança absorve e revela os conflitos parentais. Assim, na perspectiva fenomenológico-existencial é essencial que os pais também façam psicoterapia. IV – No processo psicoterapêutico fenomenológico-existencial é mister alternar sessões com os pais com sessões e sessões com a criança a fim de desvelar o diagnóstico correto. Estão corretas somente: (A) I e II. (B) II e III. (C) III e IV. (D) I, II e III. (E) I. (59) Em artigo sobre psicoterapia fenomenológico-existencial infantil, Feijoo (2011, p.189) afirma: "Em síntese, a clínica psicológica infantil com fundamentos existenciais requer primeiramente uma postura fenomenológica [...] Em segundo lugar, cabe dizer que liberdade e responsabilidade na perspectiva existencial dizem respeito ao caráter de indeterminação da existência e ao fato de que, qualquer que seja a etapa da vida, cada um tem de cuidar de sua existência. [...] E, por fim, para pensar em uma clínica fenomenológico-existencial infantil, é preciso partir da ideia de que desde o início a criança é este ente que, por se constituir pela indeterminação, exposto, jogado, lançado para fora dele, livre de determinações, é marcada pelo caráter de poder ser e ter de ser." (FEIJOO, Ana Maria Lopez Calvo de. A clínica psicológica infantil em uma perspectiva existencial. Rev. abordagem gestalt. [online]. 2011, vol.17, n.2, pp. 185-192. ISSN 1809-6867. Considerando a fenomenologia existencial como fundamento de psicoterapia infantil está correto afirmar: I – A postura fenomenológica indicada pela autora exige a suspensão de concepções apriorísticas sobre o desenvolvimento infantil. Assim, o psicoterapeuta daseinsanalítico não pode comparar o comportamento da criança observado em sessão clínica com o ‘esperado’ para essa fase do desenvolvimento. II – Os comportamentos da criança em sessão devem ser compreendidos à luz de seu sentido, isto é, quais são os nexos significativos e as motivações do comportamento. III –Sendo toda criança indeterminada, torna-se necessário que o psicoterapeuta prepare atividades, jogos e situações para propor a ela a fim de explorar como lida com responsabilidade e liberdade existenciais. Estão corretas somente: (A) I e II. (B) II e III. (C) I. (D) I e III. (E) I, II e III. GABARITO MOD 1 MOD 2 MOD 3 24 A 32 C 40 B 48 A 56 B 1 C 9 A 17 D 25 C 33 A 41 D 49 C 57 B 2 D 10 E 18 C 26 E 34 A 42 E 50 C 58 E 3 C 11 D 19 D 27 B 35 C 43 C 51 C 59 A 4 A 12 D 20 D 28 A 36 B 44 B 52 C 5 C 13 D 21 C 29 E MOD 6 MOD 7 MOD 8 6 C 14 C 22 E 30 D 37 E 45 D 53 D 7 C 15 C 23 D 31 D 38 A 46 E 54 B 8 D 16 C MOD 4 MOD 5 39 A 47 B 55 E �PAGE � �PAGE �1�