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Anestro Em termos de disfunção reprodutiva, em algumas circunstâncias não posso considerar doença. O anestro, por exemplo, não posso considerar como uma doença, um distúrbio - se eu pensar pelo lado evolutivo, o anestro é um mecanismo de defesa! Por exemplo, se eu tenho uma condição ambiental desfavorável e uma vaca parida, tendo que amamentar num meio completamente desfavorável, é risco essa vaca ciclar, gestar, lactar! Então, tenho que entender que o anestro também é um mecanismo de defesa! O eixo hipotálamo-hipofisário percebe que as condições não são tão boas, e ele para de ciclar. Ciclar ou não ciclar depende de uma sinalização do ambiente, um sistema que percebe estímulos alheios ao organismo, traduzi-los ao SNC e direcionar à gônada. Portanto, entender esses mecanismos é o que deve ser feito para entender a reprodução. Quando falamos em anestro, estamos literalmente dizendo “não cio”; ou seja, os animais não ciclam. Não espero ciclicidade no período pós-parto na espécie bovina e suína, mas nos equinos sim; animais desnutridos; animais sazonais; animal pré-púbere ou senis, e gestação e amamentação. Assim, quando eu falo em anestro, não estou falando de uma doença de fato. Isso abre uma outra janela, em que tenho que diferenciar o anestro doença do anestro fisiológico. Diagnóstico diferencial de anestro com gestação é muito importante, porque é um erro muito grave se o veterinário induzir aborto por induzir cio em uma fêmea em anestro gestacional! O que leva o proprietário a mais ter prejuízos é a falha na detecção de cio - esse é o principal problema! Então, quando o criador reclama que os animais estão em anestro, o primeiro diagnóstico que devemos fazer é ver se está gestante; não estando gestante, tenho que saber exatamente se estou num caso de detecção de cio ou num caso de anestro. Isso é fundamental! O proprietário vai dizer que as vacas não estão ciclando, e aí eu vou dizer se elas não ciclam mesmo ou se há uma falha na detecção de cio - 80% dos casos onde a reclamação é anestro, não é anestro, é falha na detecção de cio. Isso é difícil fazer o proprietário e o peão entenderem! Se for anestro, como melhorar a situação? No gado de leite, o cio durava em média 11 a 12 horas; hoje em dia o cio de uma vaca de 25kg de leite dura 10 horas; uma vaca com 40kg de leite cai para 5 horas! Ou seja, quanto mais produtiva a vaca, menor a duração do estro! E se tenho esse problema, como é que vou detectar o cio se o intervalo entre detecções é maior do que a duração do próprio evento? Uma vaca consumindo a quantidade de proteína que consome leva à laminite, no piso do free-stall duro, cimentado, molhado; ali escorrega, dói! E a vaca aumenta de tamanho, porque para produzir tudo isso de leite ela tem que pesar 700kg, mas o tamanho do casco não aumentou! Ou seja, colocamos um animal maior com um casco relativamente menor, nas condições adversas citadas, dá para a vaca exibir um comportamento sexual igual? Não! A vaca aceita cada vez menos monta, e isso dificulta a observação de cio! Todo animal tem que ter uma maneira de proporcionar os nascimentos num período em que a natureza forneça mais alimento. O principal fator não genético que regula a reprodução das espécies é a disponibilidade de alimentos. Na década de 80, houve um trabalho nos EUA para estudar o re- breeding, estudando o anestro pós-parto. A gestação de uma vaca é de nove meses e meio, portanto, ela deve ter um intervalo fisiológico após o parto, até porque se ela emprenhasse logo após o parto, o bezerro nasceria no outono! Mas o fato é que as vacas têm condição de parir uma vez ao ano. Os equinos evoluíram de maneira diferente; se a gestação é de 11 meses, tem que emprenhar logo, senão vai parir no inverno! Ou seja, na fêmea, antes dela parir já há um folículo amadurecendo no ovário. Os pequenos ruminantes têm uma gestação de 5 meses; regularam isso com sazonalidade! Vão parir no início da primavera, tenho o aumento da luminosidade que estimula a lactação, e o eixo hipotálamo-hipofisário está bloqueado. Mas quando eu chego no outono, quando a luz começa a diminuir, é o estímulo para voltar a ciclar. Tenho sempre prenhes no outono e partos na primavera. Mas voltando às vacas: será que o folículo no ovário é sensível ao FSH e ao LH após o parto? Foram feitos experimentos, e detectou-se que há estimulação do ovário normal. Ou seja, o bloqueio não é ovariano, consigo estimular uma ovulação muito precoce! Agora, o útero em involução é um processo lento; com 30 dias pós-parto ainda percebo a cérvix com o diâmetro do mesmo tamanho de um corno ex-gravídico. Se eu dosar prostaglandina no útero em involução, percebo que é elevado na vaca pós-parto! Ou seja, essa PG elevada é uma maneira de não permitir que um corpo lúteo se mantenha, e com isso não consigo manter a gestação. Assim, o útero oferece uma barreira mecânica, porque antes do reestabelecimento histológico, não consigo estabelecer um novo embrião nele; em segundo lugar, há uma barreira química, pois a PG impede o corpo lúteo de manter uma gestação. Qual seria o próximo passo? Estimulei com FSH e os folículos cresceram; dou um pulso de LH, e os folículos crescem e até ovulam. Concluo que não é o ovário, então qual seria meu próximo experimento? Tenho que verificar se tenho nesse período pós-parto a disponibilidade de LH e FSH! Aí eu pego e faço uma dosagem disso no período pós-parto, e verifico que tem FSH no pós-parto, mas não tem LH. Ou seja, consigo recrutar, mas não tenho crescimento até ovulação! Vou ver folículos pequenos, vários; é a imagem de uma vaca no pós-parto. Vou perceber um folículo que não cresce mais que 7mm, começa a involuir e aparecem novos de 5mm... Ou seja, há uma onda mais curta e de folículos com diâmetro menor! Se não tem LH, procuro no eixo HH; será que não tenho LH porque não tenho GnRH? Será que eu tenho estoques de LH? Será que o GnRH liberado consegue induzir receptores de LH? Sempre temos que perguntar! Foi percebido que o hipotálamo tem sim GnRH suficiente para estimular a hipófise. Já que tenho o efetor, será que eu tenho o receptor na hipófise? Observou-se que os receptores para GnRH estavam presentes! Então não é uma incapacidade da hipófise em responder ao GnRH. Mas o FSH é um hormônio secretado à medida em que é sintetizado. Entretanto, o LH é diferente: ele é estocado antes de liberar, até o momento em que tenho LH suficiente para produzir um pico pulsátil. Então, a próxima pergunta é: será que as vacas tem estoque de LH suficiente no pós-parto? Percebeu-se que nos primeiros dias após o parto, o estoque de LH está depletado. Então, a depleção dos estoques de LH é um dos principais fatores para que elas não ciclem! Mas a cada dia estes estoques vão aumentando. Então, à medida que a disponibilidade de LH é maior, os folículos podem atingir tamanhos maiores de desenvolvimento! Ou seja, o desenvolvimento folicular foi proporcional aos estoques de LH dentro da hipófise, até a primeira ovulação pós-parto. Mas outra coisa interessante foi testada: será que quando os folículos crescerem, o estradiol produzido será suficiente para desencadear o pico de LH? Precisamos medir os receptores de estradiol, que estavam muito baixos nos primeiros dias pós-parto, e foram aumentando conforme os estoques de LH foram aumentando. Outra pergunta interessante: por que os estoques de LH se depletam no final da gestação? Hipóteses: progesterona e estradiol; será que no final da gestação tenho elevados valores desses hormônios? Sim! A placenta secreta progesterona, e também adquire capacidade de aromatizar os andrógenos, ou seja, é capaz de ser convertida a andrógenos e, estes aromatizados, convertidos a estradiol. Assim, a seguinte teoria foi montada: a vaca está no final da gestação, a placentasecretando progesterona e convertendo esta em estradiol, tendo muita progesterona e estradiol. Estou proporcionando ao hipotálamo um feedback negativo intenso e prolongado. Ou seja, os estímulos tônicos do GnRH estão praticamente bloqueados! Se eu tiver uma liberação basal com síntese diminuída, a hora em que a vaca vai parir os estoques de LH estarão todos depletados. E a retomada cíclica pós-parto? Para parir, houve luteólise; progesterona caiu, e caiu estradiol também. Pariu, houve liberação de placenta. Ou seja, não temos mais fonte de progesterona e estradiol. Os vilões foram eliminados! No eixo HH, o bloqueio que havia não existe mais! Portanto, essas células que secretam GnRH vão secretar mais um pouquinho de GnRH, de maneira tônica. Esses pulsos estimulam a síntese dos hormônios, e estimulação dos receptores. Vou fazendo esse hipotálamo ficar cada vez mais sensível ao GnRH; segundo mensageiro estimula cada vez mais o RNAm dessas células para o receptor de GnRH. À medida que o FSH vai sendo produzido, ele é liberado, então fica fácil entender porque os folículos respondem ao FSH, com ondas foliculares curtas, mas que aumentam o tamanho do folículo ao longo das semanas. O folículo vai se tornando mais macio, com maior flutuação. No comecinho do pós-parto, um ovário mais durinho. Vamos observar o seguinte: o LH estimula a esteroidogênese, a atividade aromatase; os folículos começam a secretar um pouquinho de estradiol e esse estradiol avisa o hipotálamo para colocar mais receptores, ou seja, sensibilizam o hipotálamo para que quando o estoque de LH estiver totalmente recomposto eu tenha receptores aptos a desencadear um pico de LH pela ação do estrógeno (e isso demora em torno de 30 dias). Agora vamos tentar entender a espécie com o nível nutricional. Porque se fosse da maneira mecânica como foi imposto, todos os animais ciclariam no mesmo momento e da mesma forma! Num país como o nosso, em que as vacas passam o terço final da gestação na seca, encontram um pasto que ainda não recuperou do inverno; será que essas vacas retomam essa atividade no mesmo tempo? Não! Mais devagar! Não tenho um bom aporte de propionato no rúmen para reassumir essa atividade rapidamente! Ou seja, tenho uma recomposição muito lenta no sistema extensivo. Se eu alimentar as vacas de acordo com o NRC, eu adianto esse processo! E na Girolando, que tem exigência de vaca leiteira e manejo de vaca de corte? Essas vacas tem um pós-parto muito longo, 5 a 6 meses! Dá para perceber então que a retomada cíclica pós-parto não está ligada muito à genética, não tenho animais geneticamente mais tardios ou mais precoces. Não posso supervalorizar a genética na reprodução, porque o que vai acelerar o processo de recuperação é o manejo! Se eu tiver o bezerro amamentando, ela vai retomar a atividade mais lentamente, por exemplo. Temos que entender agora cada atitude de manejo, cada atitude de alojamento, de tratamentos hormonais, de presença ou ausência de bezerros... Se eu pretendo inseminar as vacas no momento mais precoce possível (se é que isso deve ser feito mesmo), será que é sustentável emprenhar a vaca com 30 dias pós-parto? Será que transfere valor para a sociedade? A resposta atual é atualmente não. O mercado está em evolução, o conhecimento está em evolução, não podemos nos surpreender se daqui alguns anos a resposta mudar. Será que a luminosidade interfere nessa ciclicidade? Se sim, como? Quais são os outros hormônios intermediários? Será que a amamentação interfere? O próprio senso-comum já percebeu que amamentar atrasa a concepção. Será que quando amamenta a ocitocina impede a ciclicidade? Fizeram testes, mas nenhum efeito da ocitocina foi percebido. Deve ser então um próprio estímulo na glândula mamária, pensou-se! Então cortaram todos os nervos aferentes, e percebeu-se que de fato diminuía um pouco o impacto da amamentação. A vaca desnervada com desmame precoce antecipa muito rápido a atividade cíclica. Hoje existe um inibidor do sistema de opióides endógenos, chamado Naloxone. Se bloquear o sistema de opióides, não tenho beta-endorfinas, por exemplo. Assim, elas ciclam mais rápido, pois as beta- endorfinas inibem a síntese de GnRH. Quanto ao estresse, as beta-endorfinas estarão altas! Ou seja, o quanto o bem estar animal pode estar prejudicando a fertilidade? Se estiver, como? Que nível de estresse é suficiente para prejudicar economicamente? Quais atividades de manejo que eu posso introduzir para reduzir o estresse e melhorar o desempenho reprodutivo? A reprodução saiu do LH, FSH, estradiol, GnRH... Tenho que falar hoje em dia de endorfinas, de neuropeptídeo Y, que estão relacionados ao estresse e à alimentação, respectivamente! Sabemos que os ácidos graxos não esterificados são tóxicos, e vacas com balanço energético negativo prolongado não tem energia, tecido adiposo suficiente, e nem leptina! Se não tem leptina, não tem peso para ciclar! Isso interfere com melhoramento genético? Sim, pois sabemos que se selecionarmos animais para ganho de peso, esses animais são maiores, e portanto são mais tardios do ponto de vista sexual. Será que vale a pena acelerar o ganho médio diário? Isso pode estar atrasando a puberdade! Se privilegio animais com eficiência alimentar melhor, tenho novilhas mais tardias. Ou seja, não dá para ser simplista! E mais: será que não deveríamos selecionar animais mais termorresistentes? Como vou diferenciar uma vaca em anestro de uma vaca que está ciclando? Vamos levar em consideração que nenhuma está prenhe. Se eu encontrar vacas com corpo lúteo, elas estão ciclando! Então é problema de detecção de cio. Agora, só a vaca com corpo lúteo está ciclando? E as vacas com folículos grandes, muito próximos da ovulação? Percebo um útero mais túrgido, porque o estradiol contrai a musculatura uterina. Então, vacas com corpo lúteo e/ou útero túrgido, a vaca está ciclando! Mas e a vaca em anestro? Ela não tem corpo lúteo, nem útero túrgido. E quando eu toco os ovários eles estão menores; se além de menores estiverem duros e lisos, é porque o anestro é de longo tempo! Mas caso estiverem relativamente macios, é a maneira mais comum de anestro que tem, aquelas ondas foliculares normais, recrutamento, seleção, dominância, atresia! Só faltou ovulação, essa é a forma de anestro mais comum que temos. Vaca magra, ovário duro, liso, pequeno, sem CL; é um anestro profundo. Anestro comum tenho folículos de até 8 a 10 milímetros, só não tem ovulação. E vacas ovulando tem CL e útero túrgido. No fundo no fundo, se eu tiver só LH estimulando, mas sem pico, eu terei crescimento folicular sem ovulação. Degeneração Cística dos Ovários Cisto, embora hoje em dia esse conceito não se aplique de maneira tão correta, é uma estrutura folicular, com diâmetro superior a 2cm, anovulatória, que acomete um ou ambos ovários, permanecendo no ovário por pelo menos 10 dias na ausência de atividade luteínica. Mas encontramos cistos em vacas menores que 2cm, e alguns autores relatam que o cisto tem diâmetro maior. Ou seja, diâmetro não é algo tão importante assim, varia. Outra coisa, permanecer 10 dias: será mesmo que acompanhamos um cisto por 10 dias num animal? Será que não é outro? E quanto ao corpo lúteo, já encontrou-se cistos de 2,5cm em vacas com corpo lúteo, mas não atrapalha em nada o corpo lúteo. Assim, temos que tomar cuidado nessa coisa de conceito. Cerca de 60% das vacas leiteiras de hoje, em algum momento do pós- parto, apresentam cistos. Cistos foliculares, cistos luteinizados, cistos únicos, múltiplos... Que tipo de prejuízo traz? Atrasa a retomada cíclica pós-parto, portanto atrasa o IEP. E mais, depois que voltam a ciclar, preciso de um maior número de serviços por concepção para emprenhar. E estão relacionados a infecções uterinas: mas a infecçãoque leva ao cisto ou o cisto leva à infecção? Uma coisa é perceber uma correlação, outra é verificar se existe entre essas variáveis uma relação de causa e efeito. A terceira etapa é descobrir quem é a causa e quem é o efeito. É uma doença muito prevalente, e correlacionada com muita coisa. Por exemplo, endometrites: Quando eu tenho a endometrite, a vaca apresenta cistos, porque os lipopolissacarídeos das bactérias têm capacidade de passar pela corrente sanguínea, passar pela barreira hematoencefálica e induzir algum problema no eixo HH. E, de fato, lipopolissacarídeos bacterianos causam os cistos. Mas dieta, estresse térmico e, como dito, infecções, podem induzir os cistos. Ou seja, é multicausal! Os cistos não são iguais. Podemos encontrar cistos únicos, múltiplos, finos, grossos. Assim, hoje em dia dividimos os cistos em: a) Cistos foliculares b) Cistos luteinizados/luteínicos c) Cistos do corpo lúteo (não são patológicos). Cisto do corpo lúteo e luteínico não seriam semanticamente a mesma coisa? Com o advento da ultrassonografia, verificou-se que o corpo lúteo é cavitário nos primeiros dias. E descobriu-se que o cisto do corpo lúteo nada mais é do que o corpo lúteo nessa fase inicial – ele tem um centro não ecogênico, e é absolutamente normal. Então, esquece cisto do corpo lúteo. E também não chamamos mais de cistos luteínicos, porque na verdade eles são luteinizados. a) Cisto folicular: Costumam ser únicos ou múltiplos, acometem um ou ambos os ovários e possuem a parede fina, delgada. É só um “folículo que cresceu um pouco mais”. b) Cisto luteinizados: São geralmente únicos e acomete apenas um dos ovários. É uma etapa posterior ao cisto folicular. Mas como aqui só encontramos cistos únicos e em um lado só? Eu encontro também dos dois lados, mas na maioria das vezes não! Então, o cisto que evolui para luteinizado não é o mesmo que permanece folicular! Os luteinizados possuem uma parede bem espessa, quase 1cm de espessura. Na palpação, percebemos que o ovário parece uma laranja, flutua menos. Ao contrário dos foliculares, percebemos que o ovário aumenta de tamanho, mas flutua mais. Existem vacas mais predispostas geneticamente? Sim, embora a herdabilidade seja baixa. Isso foi descoberto logo no pós-guerra, nos rebanhos suecos. É bem verdade que se eu tenho touros que transmitem essa característica eu encisto muito as vacas. Mas por que aparecem os cistos, e como vamos encarar isso? No século 19, um estudioso percebeu que administrar extrato de urina de mulheres grávidas fazia curar os cistos. Hoje se sabe que a urina de mulheres grávidas tem hCG. Uma das teorias para a origem é: elevação de FSH. A outra foi falta de LH. As duas foram refutadas, na questão do LH descobriu-se que a vaca libera até mais LH, mas não no padrão que deve ser! Picos de baixa frequência estimulam o crescimento folicular, as células da granulosa, produção de estradiol; mas num determinado momento, preciso ter um aumento de frequência tal que me permita um pico. No caso dos cistos, ou o pico é menor, adiantado ou atrasado. Alguma coisa acontece no pico de LH. Mas será que esse problema é hipotalâmico ou hipofisário? Se eu injetar GnRH, ele tem que atuar na hipófise e ela deve liberar um pico de LH. Fazendo-se o teste, verificou-se que as vacas encistadas liberavam um pico de LH tão bom quanto o das vacas saudáveis. Assim, há um problema hipofisário nítido? Não! Assim, o problema pode estar no hipotálamo, não está liberando GnRH de maneira correta, por exemplo. Da década de 80 para frente, se culpou muito o hipotálamo por esse problema. Como eu posso testar e saber se é ele? Injeto estradiol para estimular o feedback positivo. Percebeu-se que a vaca normal, na hora que se aplica, responde com um pico de LH, e a vaca com cisto responde com um pico menor, menos pontual de LH. Conclusão: reforça a ideia de que o problema é hipotalâmico. Não estou pensando mais em estradiol ou GnRH, estou pensando em neurônios. As endorfinas têm ligação com esses hormônios. O endométrio se contamina, sobra lipopolissacarídeos à vontade, libera endorfina, e endorfinas condicionam sensibilidade a esses neurônios ao estradiol, e a vaca encista. Cada vez que eu der corticosteroides nas vacas elas encistam também. E nem preciso dar, o estresse pode me causar. Então, estresse, beta-endorfinas, alterações do hipotálamo por estresse térmico e metabólico são problemas que podem me levar a vacas com cistos. Se o hipotálamo recebe uma dose de estradiol e não responde com pico normal, é um problema, claro; mas posso garantir que as vacas císticas são capazes de estimular corretamente o hipotálamo? Será que o folículo é absolutamente normal? O estresse metabólico pode alterar o funcionamento ovariano! Há caminhos para que o estresse térmico altere a síntese de estradiol. Então, eu tenho folículos que sofrem algum tipo de alteração, e essas alterações foliculares podem levar a uma síntese não adequada de estradiol; portanto, eu não estimulo adequadamente o estradiol, e acabo tendo picos alterados. Assim, o problema pode ser hipotalâmico, mas pode ser folicular! Tenho que estudar os cistos por duas óticas! A etiopatogenia dos cistos é diferente se eu tenho problemas hipotalâmicos ou problemas ovarianos. Nós temos as vacas com o folículo se desenvolvendo, dominância, deveria secretar estradiol, esse estradiol deveria ir até o hipotálamo estimular o pico de LH. O que se percebe é que os cistos liberam muito estradiol, devido à expressão de comportamento ninfomaníaco. Outro sintoma é a presença de cios irregulares. Agora, se tem ninfomania e cio, sinal que tem estradiol! Mas sabe qual o sintoma mais comum dos cistos? O anestro! A vaca não dá cio! Vacas no piquete maternidade que não entram em trabalho de parto; quando vai se fazer a palpação, percebe-se que, além de não estar gestante, está encistada! Mas nesse caso, os cistos não secretam estradiol! Vacas com ninfomania e cios irregulares os cistos têm células da teca e granulosa; vacas em anestro os cistos só tem teca! Preciso de teca e granulosa para que eu tenha síntese de progesterona, andrógeno e estrógeno. Uma vaca com cisto assintomático (80% dos casos) só vou ver teca. Então, é normal que não tenha estradiol mesmo! Vai ter progesterona? Não porque não tem granulosa. Vai ter andrógeno? Não, porque não tem progesterona. Vai ter estrógeno? Não, porque sem granulosa não tem aromatase e nem conversão. Ou seja, não tem estradiol, nem progesterona, nem andrógeno, nem estrógeno. Uma coisa comum que alguns autores começaram a observar é que algumas vacas encistadas possuem teores baixos de progesterona. Progesterona essa que durante a fase luteínica deveria ser elevada, na fase de luteólise teores indetectáveis. Aqui, os valores são detectáveis, mas baixos. Assim, o estradiol não produz pico, pois a progesterona é suficiente para bloquear o pico de LH, mas insuficiente para bloquear a frequência de LH. Não ovula porque não tem pico. Mas então porque não sofre atresia? Porque a frequência do LH é alta o suficiente para mantê-lo na dominância, mais alta que o normal. Consigo enxergar uma maneira de tratar essas vacas? Se eu der progesterona, posso corrigir o problema? Se eu der progesterona, a frequência de LH diminui, passa para a frequência normal. Portanto, eu reestabeleço um padrão que é normal. E, assim, o folículo para de crescer, ele entra em atresia e eu tiro a vaca da situação. Nas vacas de alta produção, pelo maior teor de alimentação, eu degrado mais progesterona no fígado. O quadro de hipoprogesteronemia vai me levar a um padrão de LH próximo ao de vacas encistadas. As vacas de alta produção, assim, estão mais predispostas a ter cistos! Se eu estimular o LH um pouco adiantadoe o folículo não está no pré-ovulatório, eu induzo cistos! Por isso que eu tenho que proteger a vaca com progesterona, o próprio tratamento com protocolos me leva a encistar mais as vacas. Vacas no pós-parto não possuem um estoque de LH recomposto ainda, portanto, essas vacas muitas vezes encistam. Outra questão: as vacas leiteiras de alta produção estão no free-stall. Num dia quente tem free-stall que passa de 45º. Vacas são ruminantes, ocorre uma fermentação lá dentro. A fermentação produz calor. Esse animal tem muita dificuldade de perder calor numa cobertura que não permite a vaca perder calor! Estou provocando estresse na vaca! Nós vivemos num país tropical, nosso amido é de índice glicêmico alto, rapidamente fermentável. A vaca come um alimento desse e sofre muito com o calor, rapidamente ele fermenta. A fermentação produz calor e ácido. Tenho uma vaca em acidose lática ruminal e ao mesmo tempo aquecida; é tudo o que eu preciso para afetar os neurônios secretores de LH. Problemas metabólicos: Nem sempre a produção de leite predispõe aos cistos. Então seria a questão de balanço energético positivo? Seria isso genético? Não, o mais comum é manejo ruim das vacas, elas não têm um balanço energético positivo, e encista as vacas. O balanço energético negativo encista as vacas porque uma vaca assim utiliza suas reservas corporais para produzir leite, na forma de triacilgliceróis. Os radicais são de ácidos graxos, que estão esterificados nos triacilgliceróis. Isso está no tecido adiposo, e vai mobilizar de lá para a corrente circulatória pela beta-oxidação dos lipídeos. A lipase tira uma cadeia acilica, sobre um diacilglicerol; até a hora que eu tiro as três cadeias acil, e queimo tudo em CO2 e água. Mas esses ácidos graxos não esterificados que são liberados são tóxicos para a maioria das células! Se eu cultivar células da granulosa num meio assim, as células da granulosa morrem! Isso reforça minha hipótese de que o folículo não é capaz de secretar estrógeno para liberar um pico de LH. Por isso que vacas de alta produção em lactação não produz embrião de FIV! Elas têm o oócito intoxicado! E quando o processo de queima de carboidratos e gordura é muito intenso, eu gero radicais livres! Tenho alguns indicadores, por exemplo, o BHB. O BHB ninguém sabe muito bem se é só um marcador ou se tem influência, mas o fato é que sua presença indica uma predisposição ao cisto e uma diminuição na taxa de concepção. Isso tudo temperado com uma temperatura ambiente alta, piso ruim, fermentação levando à acidose lática ruminal, laminite, estresse... Estamos num caldeirão, não é possível chegar numa fazenda, não olhar isso tudo e querer mexer com reprodução. E mais: as vacas atrasam para parir, seca o leite, e demora mais três ou quatro meses para ela parir, a vaca engorda e aí, no parto, ela vai ter dificuldades! E se tiver febre no parto, dor, ela não come. Se não come, olha os ácidos graxos não esterificados aí! O fígado não tem função de desintoxicação? Boa parte vai para o fígado onde será esterificado novamente; para isso, preciso estocar esses ácidos graxos em micelas associados a fosfolipídeos do tipo fosfoglicerídeos. Mas uma vaca em balanço energético negativo não secreta fosfoglicerídeos adequadamente, vamos formar micelas cada vez maiores de ácidos graxos não esterificados. O hepatócito vai ficar entupido, e isso leva a um problema hepático! 90% das vacas no pós-parto tem problemas hepáticos. Para finalizar, falta um tratamento. Mas a terapêutica está na solução de um manejo geral! A progesterona, como foi citado, ajuda! No experimento do século 19, o hCG faz com que os cistos se luteinizem, e as ondas foliculares continuam, o folículo do lado ovula, eu aumento progesterona e volto a ciclicidade normal! Posso tratar com GnRH também, acreditava-se que o cisto ovulava. Mas na verdade eles não ovulam, pois são anovulatórios! O que ovula são os outros cistos. Se eu tenho os cistos luteinizados, o que tenho que fazer para lisar tudo isso aí e ela voltar para o cio? OVSYNCH! O principal tratamento para as vacas encistadas é fazer um OVSYNCH nelas, e se eu quero que elas aumentem progesterona, posso simplesmente adicionar um implante entre a administração do primeiro GnRH e a PGF. Se no pós-parto a vaca tem cisto, faço uma percussão auscultatória; ela deve ter um deslocamento de abomaso! Opero a vaca, trato o útero e o ovário. O objetivo, portanto, é reestabelecer progesterona por um período para que o hipotálamo reestabeleça sua capacidade de liberar GnRH.
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