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Abordagens Humanistas em Psicologia NP1 NP2

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MÓDULO 01: BASES HISTÓRICO-FILOSÓFICAS DO HUMANISMO EM PSICOLOGIA
 Humanismo como movimento recorrente no pensamento ocidental 
 
Bibliografia Básica: HOLANDA, A. Fenomenologia e Humanismo, Parte II, pp. 105 – 118 (Introdução; 1. Há uma “questão” humanista; 2. O que é o Humanismo)
 
    O Humanismo não é exclusividade da Psicologia. Pelo contrário, sua história remonta ao nascimento da filosofia. Segundo o historiador Holanda (2015), o primeiro humanista foi Sócrates, filósofo conhecido pela frase “só sei que nada sei”. Nessa frase paradoxal está contida uma das principais características do Humanismo ao longo da história do pensamento ocidental: a afirmação da capacidade de pensar-se do homem. Na história da filosofia, Sócrates é o filósofo que, dialogando, revela que verdades defendidas por seus interlocutores eram pressupostos adquiridos de outrem. Dessa primeira desconstrução, surge a possibilidade de uma verdade própria, fruto do próprio raciocínio. Isso é possível, pois o homem é capaz de pensar e refletir sobre si mesmo e seu mundo ao redor.
    Ao longo da história, surgem em vários momentos movimentos que buscam resgatar a dignidade do homem, ou seja, seu lugar peculiar na natureza, caracterizado pela capacidade de conhecer(-se). Desse modo, não é possível falar de um Humanismo, mas, sim, de uma atitude humanista de pensamento, que se dedica à questão crucial: quem sou eu?
    Holanda (2015, p.108) indica como características essenciais do humanismo: 1) “a luta do homem que reflete sobre si mesmo; é refletir sobre o embate do ser humano que pensa a natureza e a realidade incluindo-se em relação a estas”; 2) a reflexão sobre a “constituição da subjetividade”, do “sujeito no mundo que habita”; 3) a reflexão do “lugar do sujeito que pensa” no mundo e no conhecimento. Isso está presente no pensamento grego e latino dos séculos antes de Cristo, reaparece no final da Idade Média, no chamado Renascimento, preparando a época moderna, quando novamente anima as reflexões do homem sobre si mesmo e seu mundo. 
    O historiador Abbagnano (1992, apud Holanda, 2015), nessa mesma direção, resume o Humanismo como o movimento literário e filosófico Renascentista, que acontece no final do século XIV, na Itália, assim como toda filosofia que tome o homem como “a medida de todas as coisas”. Esta concepção – de que o homem é a medida de todas as coisas –, remonta ao filósofo Heráclito de Éfeso (535 a.C. – 475 a.C.), mas foi assim enunciada por Protágoras de Abdera (490 a.C. – 415 a.C.). O sentido dessa afirmação aponta para a interligação de homem e realidade e para o alcance do conhecimento, que é possibilidade humana. 
O Renascimento: movimento humanista medieval
Bibliografia Básica: HOLANDA, A. Fenomenologia e Humanismo, Parte II, pp. 105 – 118 (Introdução; 1. Há uma “questão” humanista; 2. O que é o Humanismo)
     Todo mundo conhece a imagem do homem vitruviano, elaborada por Leonardo da Vinci (1452 – 1519). Para muitos, é um símbolo do Renascimento, pois retrata a homem como parte da natureza, tal como conhecido e conhecível pelo esforço racional humano. Ou seja, contrapõe a representação do homem elaborada por ele mesmo, recorrendo aos instrumentos e cálculos humanos, às representações alegóricas bíblicas. Nesse desenho, retrata, cuidando para revelar com clareza, o corpo humano na sua simétrica e bela perfeição. Os gregos e os latinos, antecedentes do pensamento cristão que domina a cultura (arte, filosofia) já nos primeiros cinco séculos d.C., também buscavam conhecer e representar o corpo humano tal como pode ser (e muitas vezes é) na sua humana perfeição. 
     Os historiadores são unânimes ao apontar como característica do Renascimento o resgate dos gregos e latinos clássicos. O Renascimento é movimento cultural que acontece na Europa Ocidental, tendo seu berço na Itália, entre a segunda metade do XIV e o começo do XVII. Retoma os clássicos, pois recoloca o homem na sua vida terrena no centro das preocupações. Anteriormente, o homem era pensado como parte da criação divina e sua existência e trajetória terrenas como preparação para a vida após a morte. Ou seja, na Idade Média preocupava-se mais com a alma imortal do homem do que como sua vida mortal. No lugar da vida monástica, tida como máximo valor humano, o Humanismo renascentista cede espaço para os prazeres humanos ordinários. Ao invés de pesquisar a vida após a morte, o interesse científico se volta para a vida mundana. 
    O termo HUMANISMO está relacionado com o professor ou aluno de studia humanitatis (humanidades), isto é, textos clássicos sobre gramática, retórica, poética, filosofia moral (ser humano e suas relações com os demais) e história. O conhecimento de latim e grego levou humanistas a traduzirem a filosofia grega para um latim elegante. É neste período que se inicia 
    Os humanistas acreditavam no poder do homem de planejar sua vida, comandar seu destino e direcioná-lo para a liberdade, a justiça e a paz. É nesta época que surge a ideia de “livre arbítrio” como dádiva divina ao homem, que o torna responsável por suas escolhas. Assim como a liberdade, a dignidade do homem volta a ser tema filosófico, como fora outrora com os gregos e os latinos a.C. 
    No pensamento humanista renascentista, o homem era responsável por tornar o mundo seu lar, reconhecendo as necessidades que o ligam a ele. Apareceram discussões sobre a felicidade humana, sobre o livre arbítrio, o destino, a fortuna, sobre o lugar do homem no cosmos. 
As mesmas questões e preocupações reaparecem na fenomenologia, no início do XX. Edmund Husserl descreve a crise das ciências, que assumem o modelo científico-natural, que abstrai o homem, para o conhecer. Ao fazerem isso, deixam de lado a especificidade humana, que é sua condição de conhecedor do mundo e de si. Perguntando “o que é o homem?”, as ciências-naturais tornam-no um “que”, um objeto, perdendo de vista subjetividade (sujeito). De maneira semelhante, os psicólogos humanistas nos EUA criticaram as abstrações e o cientificismo do behaviorismo e da psicanálise em voga na época. Recolocaram no centro das preocupações a saúde, o potencial e a liberdade humanos, esquecidos pelas pesquisas do homem doente (psicopatologia).
MÓDULO 02: PSICOLOGIA HUMANISTA NORTEAMERICANA – A “TERCEIRA FORÇA”
Bibliografia básica: HOLANDA, A. Fenomenologia e Humanismo, Parte II, pp.146 – 172 
 
Psicologias Humanistas
     Reunimos sob o nome de “Psicologias Humanistas” vários modelos de compreensão de homem que, embora divirjam entre si, convergem na ênfase dada ao sentido das vivências humanas e na liberdade como condição ontológica. Tomaremos como foco de nossos estudos a Abordagem Centrada na Pessoa, desenvolvida por Carl Rogers a partir da década de 1950, a Gestalt-Terapia, por Fritz Perls na mesma época e a Psicologia Existencial-Humanista, desenvolvida por Carl Rogers.
     As Psicologias Humanistas florescem nos Estados Unidos a partir da década de 1950. Esse período que seguiu a Segunda Guerra Mundial estava marcado pelos horrores provocados pela humanidade, assim como pelo temor constante da autodestruição atômica na Guerra Fria. Nas décadas seguintes cresceram as tensões e disputas raciais em busca do fim da discriminação e os Estados Unidos se envolveram com a Guerra do Vietnã, que resultou na morte de milhares de jovens soldados e na mobilização de parcela considerável da sociedade pela paz.
     Nesse momento histórico, a Psicologia estava dividida entre duas “forças”: A Psicanálise freudiana, que apresenta o homem como um organismo determinado por impulsos inconscientes que buscam a satisfação do prazer ou a evitação do desprazer, e o Behaviorismo, que é a aplicação do modelo científico-natural de conhecimento, apresentando o homem como um organismo determinado por sua história de modelagem e pelo ambiente.
     Assim, a Psicologia Humanista surge como a Terceira Força na psicologia. A Terceira Força considera as psicologias de sua época deterministas, pois buscam determinar a causa dos
comportamentos humanos. Para isso, recorrem a modelos explicativos que não abarcam aquilo que o humano tem de mais peculiar: a liberdade. Ao posicionar a questão do sentido da vida como a mais importante, estão afirmando que a existência humana é livre e capaz de fazer escolhas em direção ao que é significativo em sua vida. Proclamam também que o ser humano é animado por uma força vital, que o impulsiona ao crescimento e à complexificação da existência. (Figueiredo, 2012)
 
A “Terceira Força” em Psicologia 
Bibliografia básica: HOLANDA, A. Fenomenologia e Humanismo, Parte II, pp.146 – 172 
            A Psicologia Humanista é crítica em relação à hegemonia do conhecimento científico na investigação sobre o humano. Coloca como questão para a Psicologia se não há outras formas de conhecimento sobre o seu “objeto”, o humano.
           O conhecimento científico trabalha com fatos, que são mensuráveis. Segue regras precisas de observação e investigação, que recebem o nome de ‘método’, para assegurar a veracidade do conhecimento produzido. Apesar da pretensa objetividade, há um pressuposto que fundamenta esse modelo de investigação. A ciência pressupõe que a natureza funciona de acordo com leis gerais e que o homem pode descobri-las através de rigoroso método de investigação. Opera sobre a cisão Sujeito – Objeto; os objetos são as partes da natureza e o Sujeito é o pesquisador, aquele que é capaz de investigar e explicar o funcionamento da natureza.
           A cisão Sujeito - Objeto pode ser retraçada à obra do filósofo René Descartes (1596 – 1650). Ele propõe à filosofia que supere o conhecimento vago e especulativo que a dominou por séculos, buscando uma fundamentação sólida e certa. Encontra-a no conhecimento preciso da matemática, para a qual 2 + 2 sempre serão igual a 4. No início do Discurso do Método (1637), ele aponta a insuficiência do senso comum para o conhecimento certo. Escreve:
... a diversidade de nossas opiniões não provém do fato de serem uns mais racionais do que os outros, mas somente de conduzirmos nossos pensamentos por vias diversas e não considerarmos as mesmas coisas. Pois não é suficiente ter o espírito bom, o principal é aplicá-lo bem. As maiores almas são capazes dos maiores vícios, tanto quanto das maiores virtudes, e os que só andam muito lentamente podem avançar muito mais, se seguirem sempre o caminho reto, do que aqueles que correm e dele se distanciam. (p.41)
           
A partir da consideração de um método preciso de conhecimento racional, Descartes formula a divisão da natureza em dois tipos de substâncias: res cogitans (coisa pensante) e res extensa (coisa extensa). Podemos identificar nessa dualidade a divisão presente no nosso modelo científico entre Sujeito (res cogitans) e Objeto (res extensa).
            A Psicologia enquanto ciência padece de um difícil problema. O “objeto” de suas pesquisas é também o sujeito que investiga. Para a Psicologia Humanista está claro que o “objeto” de pesquisa da Psicologia é o Ser Humano. Sendo assim, a investigação não pode seguir os mesmos métodos e critérios de investigação de objetos naturais, mensuráveis.
            Assim, as Psicologias Humanistas surgem como um novo caminho – uma mudança de paradigma – na investigação sobre o humano. No início, desenvolvem-se a partir da prática de psicólogos norteamericanos. Carl Rogers é o maior exemplo disso. Mas são vários autores com contribuições às vezes divergentes entre si, que converge na compreensão do humano como livre e responsável. Num segundo nomento, esses psicólogos humanistas encontram nas filosofias fenomenológicas e existenciais alguns fundamentos para esta abordagem vanguardista. Resume Holanda (2015, p.166):
O movimento humanista foi sendo enriquecido com contribuições de um pensamento “fenomenológico-existencial” , que confere um “aplicativo-existencial” ao movimento. (Gonzalez, 1988). Um ilustrativo do significado do movimento humanista e do que representou, podemos encontrar nas palavras de Matson (1978): “A Psicologia Humanista não é apenas o estudo do ‘ser humano’; é um compromisso com o devir humano” (p.69). Isto demonstra o que realmente “unia” a diversidade desse autores.
 
     Como já visto, a Psicologia Humanista do século XX encontra no Renascimento, movimento artístico e filosófico iniciado no século XV de revalorização do humano, em oposição ao Escolasticismo. Os filósofos Humanistas introduziram a noção de livre-arbítrio, pois acreditavam no poder do homem de planejar sua vida, comandar seu destino e direcioná-lo para a liberdade, a justiça e a paz. Além do Humanismo filosófico, a Psicologia Humanista encontra fundamentação teórica no Existencialismo (Kierkegaard, Sartre).
     Sob a categoria “Psicologia Humanista” encontraremos o pensamento de autores diversos, como Kurt Goldstein, Abraham Maslow, Thomas Greening, Karen Horney e Erich Fromm. Além destas influências, Holanda (2015) indica a fenomenologia de Husserl e a fenomenologia-existencial de Heidegger como as mais importantes fundamentações teóricas. Os humanistas compartilham, portanto, da ênfase no conhecimento da singularidade, assim como na postulação de uma força criativa, tendente à autorrealização e ao crescimento.
     Em todos os autores mencionados acima também encontramos a ênfase na liberdade para fazer escolhas e na responsabilidade pela própria vida. Também compartilham a ênfase no conhecimento da singularidade, assim como na postulação de uma força criativa, tendente à autorrealização e ao crescimento. Por exemplo, Maslow ficou conhecido pela Pirâmide das Necessidades, na qual expõe que estamos sempre em direção a experiências e realizações mais complexas, pois o ser humano, diferentemente dos animais, não vive apenas em função da realização das necessidades.
     Nós fazemos escolhas em nome de nossa realização existencial. Quanto maior o nosso grau de liberdade, mais criativos serão nossos recursos para lançarmo-nos em direção ao nosso futuro. Como afirma Holanda (2015, p.169), “As propostas das psicologias humanista (americana) e existencial (europeia) foram reações aos reducionismos vigentes; ambas valoram as dimensões ‘superiores’ da personalidade – coo razão, liberdade, autonomia, criatividade, responsabilidade, dentre outras [...]”
 
Referências bibliográficas
DESCARTES, René. Obra Escolhida. Trad. Guinsburg, J e Prado Jr., B. 3ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1994.
MÓDULO 03: OS PRESSUPOSTOS EPISTEMOLÓGICOS E ONTOLÓGICOS DA ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA, DESENVOLVIDA POR ROGERS.
Compreensão do conceito de Pessoa presente na obra de Carl Rogers
 
Bibliografia básica: ROGERS, C. “Ser o que realmente se é: Os objetivos pessoais vistos por um terapeuta.” Tornar-se Pessoa. São Paulo: Martins Fontes, 2009.
Bibliografia complementar: AMATUZZI, M. “Abordagem Centrada na Pessoa e Psicoterapia” Rogers: Ética Humanista e Psicoterapia. Campinas, SP: Editora Alínea, 2010.
 
Carl Rogers, o fundador dessa abordagem, nasceu em 8 de janeiro de 1902 em Oak Park, Illinois, nos Estados Unidos. Trabalha como psicólogo desde 1927 realizando psicodiagnóstico infantil, aconselhamento de pais, estudantes e adultos e psicoterapia no Centro de Prevenção de Violência contra a Criança (NY). Rogers falece em 4 de fevereiro de 1987. Visita o Brasil algumas vezes na década de 1970.
Nessa época, a Psicologia norteamericana está dividida entre behaviorismo e psicanálise, ambas apoiadas nas ciências naturais. Para Rogers, a metade do século XX é uma época que valoriza a tecnologia como valor máximo, aplicando esse valor às relações humanas. Com isso, visando um tratamento eficiente, o psicólogo mantém uma postura distanciada de seu “objeto de estudo”, o paciente. Além disso, o ser humano é visto como “vítima passiva de forças”, sejam elas impulsos inconscientes, pressões sociais ou condicionamentos.
Através de seu trabalho como psicólogo no Centro de Prevenção, Rogers percebe os efeitos positivos de uma postura acolhedora e respeitosa com seus clientes. Essa postura se
contrapõe à postura distanciada, científica, dos psicólogos da época. Colocando-se assim na relação com os clientes, Rogers descobre que todo indivíduo tem a capacidade de descobrir e buscar o que é melhor para si mesmo. Essa ideia está em sintonia com a compreensão humanista, que, como já discutido, enfatiza a liberdade e a responsabilidade essenciais do homem.
A hipótese sobre o ser humano formulada por Rogers é a seguinte: “Os indivíduos possuem dentro de si vastos recursos para a autocompreensão e para a modificação de seus autoconceitos, de suas atitudes e de seu comportamento autônomo. Esses recursos podem ser ativados se houver um clima, passível de definição, de atitudes psicológicas facilitadoras.” (p.38) Em outras palavras, as pessoas são capazes de perceber e compreender o que acontece em suas vidas e de se posicionarem em relação a esses acontecimentos. Para isso, precisam dispor de liberdade e criatividade diante das situações da vida.
            O termo “responsabilidade” tem dois significados aqui. O primeiro é o significado mais corrente do termo: os acontecimentos de minha vida estão sob meu encargo. O segundo significado enfatiza a etimologia da palavra, indicando a capacidade de responder. Ser responsável significa ser capaz de responder ao que me solicita. Esse responder não é um mero reflexo, mas um posicionamento do indivíduo em relação ao que lhe advém. É, portanto, um ato de livre determinação do homem, mas que exige criatividade.
A psicologia da época de Rogers estuda o ser humano visando descobrir as causas determinantes de seu comportamento. A psicanálise hipotetiza as pulsões como princípio dos comportamentos. Ademais, explica que as pulsões, correlatos psíquicos dos instintos, objetivam a satisfação do prazer ou alívio do desprazer. Na vida em sociedade, esses impulsos, que facilmente nos levariam a destruir o próximo para satisfazer nossos desejos, precisariam ser reprimidos. A partir de sua experiência no contato com pessoas que atendia, Rogers vê-se obrigado a contestar essa hipótese. Segundo ele, “O ser humano é, em seu cerne, um organismo em que se pode confiar.” (p.41)
 
A Tendência Atualizante
 
Bibliografia básica: ROGERS, C. “Ser o que realmente se é: Os objetivos pessoais vistos por um terapeuta.” Tornar-se Pessoa. São Paulo: Martins Fontes, 2009.
Bibliografia complementar: AMATUZZI, M. “Abordagem Centrada na Pessoa e Psicoterapia” Rogers: Ética Humanista e Psicoterapia. Campinas, SP: Editora Alínea, 2010.
 
O ser humano não é determinado por forças que o impelem a destruir o outro ou si mesmo. Pelo contrário, todo organismo busca a autorrealização e o crescimento cada vez mais plenos. Realizar-me como indivíduo significa também ajudar os outros na busca da autorrealização. Assim, Rogers formula que todo organismo possui uma tendência natural a um desenvolvimento mais completo e mais complexo. Isso pode ser observado em todos os organismos e não seria diferente com o ser humano. Nossos processos naturais também estão voltados para a manutenção, para o crescimento e para reprodução do organismo que somos. Essa tendência natural ao desenvolvimento mais completo e mais complexo recebe o nome de Tendência à Autorrealização (ou Tendência Atualizante).
Na Abordagem Centrada na Pessoa, todos os comportamentos humanos são manifestação dessa tendência à autorrealização, o que significa que buscam a manutenção e o crescimento do organismo. Todas as pessoas possuem essa tendência intrínseca para buscar estados novos de maior complexividade afetividade e cognitiva.
A compreensão da tendência atualizante intrínseca às pessoas é o fundamento da proposta rogeriana para a psicoterapia.  
O objetivo da Psicoterapia e o lugar do terapeuta na Terapia Centrada na Pessoa
 
Bibliografia básica: ROGERS, C. “'Ser o que realmente se é': Os objetivos pessoais vistos por um terapeuta.” Tornar-se Pessoa. São Paulo: Martins Fontes, 2009.
Bibliografia complementar: AMATUZZI, M. “Abordagem Centrada na Pessoa e Psicoterapia” Rogers: Ética Humanista e Psicoterapia. Campinas, SP: Editora Alínea, 2010.
 
          “Tornar-se quem se é” é o objetivo da relação terapêutica. Significa poder experimentar seus sentimentos e se relacionar consigo mesmo e com os outros de modo profundo, complexo e satisfatório. Porém, as relações vivenciadas podem conduzir à direção oposta. Circunstâncias ameaçadoras fazem com que o indivíduo priorize a defesa de sua integridade, ficando limitada na sua capacidade de experimentar a complexidade de sentimentos presentes nas relações humanas. Outras circunstâncias podem levar o indivíduo a falsear ou negar a sua realidade vivenciada, ou ainda a reprimir seus sentimentos e desejos. Por exemplo, uma criança pode sentir inveja diante do nascimento de um irmão, mas esse sentimento é mal visto e repreendido pelos pais. Isso pode levar essa criança a reprimir sentimentos percebidos como errados, ficando limitado na sua capacidade de se relacionar com os demais, pois a inveja é um sentimento humano.
          A Abordagem Centrada na Pessoa compreende que a repetição e o acúmulo de ameaças à integridade ou repressão de sentimentos, que experimentamos na família, na escola e na cultura podem limitar nossa liberdade de nos reconhecermos como somos e nossas necessidades, de experimentarmos nossos sentimentos e de realizarmos escolhas pertinentes ao nosso desenvolvimento pessoal e relacional.
          O terapeuta nesta abordagem é um facilitador do desenvolvimento pessoal. É alguém que se dispõe a compreender o cliente, respeitá-lo e aceitá-lo tal como ele próprio de percebe. Vê o cliente como pessoa, isto é, um ser livre e responsável, capaz de compreender-se e transforma-se, e relaciona-se com ele enquanto tal. A partir dessa relação terapêutica, a pessoa (cliente) começa a afastar-se de modelos falseados de si mesmo, encaminhando-se para maior autonomia. Torna-se progressivamente mais responsável por si mesmo, pois capaz de decidir-se sobre quais são comportamentos e sentimentos significativos e quais não. Encaminha-se, assim, para uma realidade mais fluida, em processo.
 
MÓDULO 04: A GESTALT-TERAPIA DE PERLS. SUAS INTERLOCUÇÕES COM O PENSAMENTO HUMANISTA. FENÔMENOS PSICOLÓGICOS À LUZ DA GESTALT-TERAPIA.
Dados biográficos de Fritz Perls e o desenvolvimento da Gestalt-Terapia
 
Bibliografia Básica: PERLS, F. (1988) “Fundamentos” A Abordagem Gestáltica e Testemunha Ocular da Terapia, cap. 1.
 
Bibliografia complementar: MENDONÇA, M. “A psicologia humanista e a abordagem gestáltica” In: FRAZÃO, L. M. & FUKUMITSU, K. O. (orgs.) Gestalt-terapia.
 
A Gestalt-terapia é uma abordagem terapêutica que enfatiza a responsabilidade e a liberdade essenciais do ser humano perante a sua existência. Seu desenvolvimento deve-se principalmente ao trabalho de Frederik Perls, cujo nome ficou associado a esse modelo de atendimento psicoterápico.
Perls nasce em 1893 na Alemanha, onde forma-se médico sob supervisão de Kurt Goldstein, neurologista estudioso da percepção em pacientes com ferimentos cerebrais. Inicia sua análise com Wilhelm Reich, dissidente da psicanálise freudiana. A influência de Reich faz-se sentir na importância que a Gestalt-terapia atribui ao corpo. Com a ascensão do nazismo, Perls, já casado com Laura Perls, foge para a África do Sul, onde funda um Instituto de Treinamento Psicanalítico. Data dessa época o seu primeiro livro Ego, fome e agressão (Ego, Hunger and Agression, 1947).
Em 1946 muda-se para os EUA, estabelecendo-se em Nova Iorque. Lá tem contato com a psicóloga humanista Karen Horney. Com a contribuição de Laura Perls, que era estudiosa da Psicologia da Gestalt, começa a dar corpo ao modelo de atendimento que realiza em workshops nos EUA. O nome Gestalt-terapia aparece pela primeira vez em 1951 (no livro O Início da Gestalt-terapia). Pouco depois fundam o Instituto de Gestalt-terapia de Nova Iorque.
Seguindo as ideias de Reich, Perls enfatiza a experiência corpórea como possibilidade de expressão. Fritz desenvolve essa compreensão
na Gestalt-terapia através de uma concepção holística de homem. Há um paralelismo entre corpo e mente, de modo que ambos expressam vivencias. O homem é um organismo total que busca constantemente o equilíbrio através de trocas com o meio.
Na Psicologia da Gestalt Perls descobre que o “homem não percebe as coisas isoladas e sem relação, mas as organiza no processo perceptivo como um todo significativo” (Perls, 1988, p.18) a partir de um interesse motivador. Essa mesma teoria fornece outros conceitos importantes: figura-fundo, princípio de pregnância e teoria de campo.
 
Principais conceitos da Gestalt-terapia
 
Bibliografia Básica: PERLS, F. (1988) “Fundamentos” A Abordagem Gestáltica e Testemunha Ocular da Terapia, cap. 1.
 
Bibliografia complementar: FRAZÃO, L.M. “Psicologia da Gestalt” In: FRAZÃO, L. M. & FUKUMITSU, K. O. (orgs.) Gestalt-terapia.
 
A Psicologia da Gestalt estuda a percepção humana. Sua conclusão básica é de que o homem percebe totalidades, e não partes isoladas. Uma séria de pontos sequenciais, próximos uns aos outros, por exemplo, é visto como uma ‘linha’. A Gestalt-terapia busca seu nome no conceito de Gestalt, que se pode traduzir por ‘forma’. Gestalt significa também um ‘todo’. Nesta concepção, o todo é sempre diferente da mera soma das partes. Perls (1988) define esse conceito como: “forma, configuração, modo particular de organização das partes individuais que entram em composição.” (p.18) Disso se desdobra a concepção de que os indivíduos vivenciam totalidades. As totalidades se organizam como figuras sobre um fundo, organizadas de acordo com o interesse do indivíduo.
De acordo com a visão holística que fundamenta a Gestalt-terapia, os indivíduos são totalidades corpo-mente e ambos modos de ação, psíquico ou físico, são formas de expressão. O princípio que rege as ações do organismo é a homeostase, processo por qual busca o equilíbrio. As necessidades orgânicas e psicológicas geram desequilíbrio, que o organismo busca restaurar. Entretanto, a vida é um processo contínuo de desequilíbrio e busca de equilíbrio, nunca atingindo o equilíbrio absoluto. O mesmo processo regula a tendência à sobrevivência de todo organismo.
             Os organismos agem em ‘campos’. Esse é um conceito da Psicologia da Gestalt, desenvolvido pelo psicólogo Kurt Lewin. Um campo é uma totalidade em equilíbrio de forças e todos os acontecimentos no campo são funções desse campo total. Os comportamentos do indivíduo, em resposta a suas necessidades, podem estar em relação mútua com o meio no qual acontecem ou em relação conflituosa. Neste caso, há dispêndio desnecessário de energia e perda da capacidade do indivíduo de interagir com seu meio. Isso pode culminar num processo neurótico: “Se, por alguma alteração no processo homeostático, o indivíduo for incapaz de manipular seu meio a fim de atingi-las [necessidades], comportar-se-á de modo desorganizado e ineficaz.” (Perls, 1988, p. 33)
            A Gestalt-terapia é um processo a partir do qual o organismo (no caso, o cliente) pode recuperar sua capacidade de relação com o meio, reconhecendo suas necessidades e agindo eficazmente de acordo com elas. 
 
A Gestalt-terapia como possibilidade de atuação do psicólogo.
 
Bibliografia Básica: PERLS, F. (1988) “Fundamentos” A Abordagem Gestáltica e Testemunha Ocular da Terapia, cap. 1.
 
Bibliografia complementar: MENDONÇA, M. “A psicologia humanista e a abordagem gestáltica” In: FRAZÃO, L. M. & FUKUMITSU, K. O. (orgs.) Gestalt-terapia.
 
A gestalt-terapia é um modelo de atendimento terapêutico para crianças, adultos, casais e grupos, que promove a recuperação e/ou a ampliação da capacidade de conscientização (awareness) no aqui-agora, possibilitando contato mais pleno e trocas mais eficientes com o meio. Esta proposta se fundamenta na compreensão de que o sofrimento psicológico é a expressão de dificuldades em perceber as próprias necessidades, as ações voltadas para satisfazê-las e o caráter ‘nutritivo’ ou ‘tóxico’ das trocas com o meio. O campo (indivíduo-meio) muda constantemente de acordo com as mudanças de equilíbrio intrínsecas e geradas pelo organismo em busca de sua homeostase. Nos processos neuróticos há uma confusão entre indivíduo e meio, de modo que o organismo perde a sua capacidade de interagir com eficiência. Segundo Perls (1988), a neurose ocorre quando “a busca do equilíbrio do homem o leva a retirar-se mais e mais, a permitir que a sociedade o influencie demais, a subjugá-lo com suas exigências, ao mesmo tempo a separá-lo do convívio social, a pressioná-lo e moldá-lo.” (p.56) Vale destacar que a Gestalt-terapia reconhece a neurose como um processo, não como uma estrutura. Com a capacidade de autorregulação limitada, cada nova situação propicia ao indivíduo que aumente seu desequilíbrio.
A Gestalt-terapia aproxima-se das terapias humanistas por compreender as pessoas como livres e responsáveis. O termo ‘responsabilidade’ deve ser entendido como capacidade de responder, e não somente como obrigação de responder pelos atos. Nesse contexto, a Gestalt-terapia promove a autonomia através da capacidade de responder às situações vivenciadas pelos pacientes.
O Gestalt-terapeuta é um facilitador da conscientização (awareness) da situação presente, aqui-agora, do paciente. Para isso, oferece condições para o encontro dual EU-TU (tematizado por Martin Buber), no qual cada um reconhece a liberdade e responsabilidade ontológicas do homem. A relação terapêutica é horizontal, isto é, não há um agente de mudanças (terapeuta) e um objeto (paciente). A relação se estabelece entre dois iguais, sendo que um deles (o terapeuta) dispõe-se a facilitar a conscientização (awareness) do outro (paciente).
A Gestalt-terapia reconhece que frequentemente os pacientes procuram o Gestalt-terapeuta esperando que ele provoque transformações, mas cuida para que o paciente torne-se consciente (aware) dessa postura de vitimização, que dificulta a liberdade, a autonomia e a responsabilidade.
 
MÓDULO 05: PSICOLOGIA HUMANISTA COMO ÉTICA
Bibliografia básica: AMATUZZI, M. A Abordagem Centrada na Pessoa como Ética das Relações Humanas. Rogers: Ética Humanista e Psicoterapia. Campinas, SP: Editora Alínea, 2010. 
Abordagem Centrada na Pessoa como ética das relações humanas
    A palavra “ética” é definida no Dicionário Houaiss como:
1.    parte da filosofia responsável pela investigação dos princípios que motivam, distorcem, disciplinam ou orientam o comportamento humano, refletindo esp. a respeito da essência das normas, valores, prescrições e exortações presentes em qualquer realidade social. (Dicionário Houaiss online, 2016)  
Dessa definição deriva o significado de conjunto de regras e valores morais. Ao formar-se psicólogo, você comprometer-se-á com o Código de Ética profissional, que rege os comportamentos aceitos e não aceitos dos psicólogos no exercício profissional.  
    Etimologicamente, ética deriva de duas palavras gregas que compartilham a mesma raiz: éthos e êthos. A primeira significa costume, uso, hábito e a segunda, caráter, maneira de ser de uma pessoa, disposições naturais de alguém. A disciplina filosófica Ética trata da segunda.
    O que significa, então, afirmar, como Amatuzzi (2010), que a Abordagem Centrada na Pessoa, de Carl Rogers, traz contribuições éticas e é, ela própria, uma ética? Significa que as propostas de Rogers não se dirigem a técnicas, manejos e procedimentos do psicólogo, como um código de ética faria, mas, sim, à sua atitude. Significa ainda mais que isso: que, embora a ACP seja tida como uma abordagem psicológica, ela propõe uma atitude, um modo de ser em relação com os outros e consigo mesmo.
    Já foi visto com Holanda (2015) que as Psicologias Humanistas são um acontecimento recente numa história de resgate da ética do pensamento. Assim como o Humanismo renascentista recolocou como centro de preocupação o homem, resgatando sua dignidade, devolvendo-lhe sua responsabilidade por seu ser e se seu mundo, a ACP surge como abordagem psicológica (no
primeiro momento ela é Terapia Centrada no Cliente) para, em seguida, tornar-se uma reflexão sobre as relações humanas. (Amatuzzi, 2010)
    Diferenciando-se das psicologias em voga nos EUA na década de 1940, Rogers assume a crença na orientação positiva e na tendência ao crescimento das pessoas. Tal atitude manifesta-se na relação com o cliente como horizontalidade, ou seja, o psicólogo deixa de ser um “vidente ilustrado” (Amatuzzi, 2010, p.11), que usa teorias psicológicas gerais e causalistas para diagnosticar e intervir, para “facilitar ao o outro o recurso às suas  próprias fontes interiores” (Amatuzzi, 2010, p.12). Contribui, portanto, postulando um modo de acontecer a relação psicólogo-cliente que resguarda (e resgata) sua autonomia e sua responsabilidade.
 
A relação psicólogo – cliente na Abordagem Centrada na Pessoa: Relação ética
 
Bibliografia básica: AMATUZZI, M. A Abordagem Centrada na Pessoa como Ética das Relações Humanas. Rogers: Ética Humanista e Psicoterapia. Campinas, SP: Editora Alínea, 2010. 
 
       “Tornar-se quem se é” é o objetivo da relação terapêutica. Significa poder experimentar seus sentimentos e se relacionar consigo mesmo e com os outros de modo profundo, complexo e satisfatório. Porém, as relações vivenciadas podem conduzir à direção oposta. Circunstâncias ameaçadoras fazem com que o indivíduo priorize a defesa de sua integridade, ficando limitada na sua capacidade de experimentar a complexidade de sentimentos presentes nas relações humanas. Outras circunstâncias podem levar o indivíduo a falsear ou negar a sua realidade vivenciada, ou ainda a reprimir seus sentimentos e desejos. Por exemplo, uma criança pode sentir inveja diante do nascimento de um irmão, mas esse sentimento é mal visto e repreendido pelos pais. Isso pode levar essa criança a reprimir sentimentos percebidos como errados, ficando limitado na sua capacidade de se relacionar com os demais, pois a inveja é um sentimento humano.
     A Abordagem Centrada na Pessoa compreende que a repetição e o acúmulo de ameaças à integridade ou repressão de sentimentos, que experimentamos na família, na escola e na cultura podem limitar nossa liberdade de nos reconhecermos como somos e nossas necessidades, de experimentarmos nossos sentimentos e de realizarmos escolhas pertinentes ao nosso desenvolvimento pessoal e relacional.
     O terapeuta nesta abordagem é um facilitador do desenvolvimento pessoal. É alguém que se dispõe a compreender o cliente, respeitá-lo e aceitá-lo tal como ele próprio de percebe. Vê o cliente como pessoa, isto é, um ser livre e responsável, capaz de compreender-se e transforma-se, e relaciona-se com ele enquanto tal. A partir dessa relação terapêutica, a pessoa (cliente) começa a afastar-se de modelos falseados de si mesmo, encaminhando-se para maior autonomia. Torna-se progressivamente mais responsável por si mesmo, pois capaz de decidir-se sobre quais são comportamentos e sentimentos significativos e quais não. Encaminha-se, assim, para uma realidade mais fluida, em processo.
    Esse modo de compreender a relação terapêutica se desenvolve ao longo da obra de Rogers para uma atitude nas relações humanas, isto é, não exclusivamente na relação terapêutica. O pressuposto humanista – resgate da dignidade humana, afirmação de sua responsabilidade, liberdade e autonomia – aparece na Abordagem Centrada na Pessoa como atitude de reconhecer que “O ser humano tem algum poder sobre as determinações que o afetam, e esse poder é, na verdade, mais relevante para o desenvolvimento do que aquelas determinações.” (Amatuzzi, 2010, p.17) Refere-se a um modo de ser, isto é, de assumir-se e estar com outro, como pessoa, no sentido da relação Eu-Tu descrita por Martin Buber. 
     Rosmaninho (2015) descreve os modos de relação Eu-Tu e Eu-Isso:
Para Buber existem duas formas básicas do homem se relacionar: uma ele chamou de Eu-Isso e outra de Eu-Tu. São modos do homem se relacionar e se colocar diante do outro e do mundo. Na relação Eu-Isso, o homem se coloca diante do mundo como algo objetivo e, nessa atitude, ele se torna capaz de conhecer e habitar o mundo. Já na relação Eu-Tu, o homem se coloca em relação a um outro, que pode ser uma outra pessoa, uma obra artística ou literária, ou, ainda, uma situação vivenciada. A relação Eu-Tu é marcada pelo impacto da presença do outro, é um encontro no qual o homem é atravessado pela potência e pela força da vivência do outro. Este encontro foge às apreensões usuais e se recusa a ser sistematizado ou esquematizado. (Rosmaninho, 2015, p.176-7)
    Na ACP, a relação Eu-Tu descreve o encontro inter-humano, no qual cada participante é aceito como pessoa autônoma, livre, criativa e capaz de dirigir suas ações na direção do crescimento do crescimento, da complexificação e da realização. Isso porque a pessoa que assim se coloca na vida reconhece a existência de uma tendência formativa universal. (Amatuzzi, 2010)
 
Referência bibliográfica: ROSMANINHO, M. A relação Eu – Tu no encontro terapêutico. In: EVANGELISTA, P. (org) Psicologia fenomenológico-existencial – Possibilidades da atitude clínica fenomenológica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Via Verita, 2015, pp. 173 – 182.    
    
MÓDULO 06: O ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO COM PRÁTICA PSICOLÓGICA HUMANISTA
História do Aconselhamento Psicológico
 
Bibliografia básica:SCHMIDT, M. L. S. “O nome, a taxonomia, e o campo do Aconselhamento Psicológico”, In: MORATO, H.T.P. et al. (Coord.) Aconselhamento Psicológico numa perspectiva fenomenológica existencial: uma introdução. Cap. I, p. 1-21.
 
O surgimento do Aconselhamento Psicológico como modelo de intervenção psicológica está vinculado a alguns acontecimentos históricos nos Estados Unidos, como a fundação de Centros de Orientação Infantil e Juvenil para pais e filhos, a criação de serviços de Higiene Mental e Centros de Aconselhamento Pré-Matrimonial e Matrimonial, ao surgimento de instituições de Assistência Social que necessitavam oferecer apoio emocional aos seus clientes e ao desenvolvimento de serviços de assistência psicológica nas empresas.
No começo do século XX, o aconselhamento não é realizado por psicólogos. O conselheiro é um perito no assunto a ser tratado, enquanto o aconselhando, alguém que necessita de orientação. O Aconselhamento pode ser profissional, vocacional, educacional ou marital. Diferencia-se bastante da prática psicoterapêutica, então restrita à psicanálise. Segundo Scheefer (p.16) o Aconselhamento visa a ajudar na tomada de uma decisão e envolve informações objetivas que permitem ao orientando utilizar melhor seus recursos pessoais.
Dentre os principais autores ligados ao início da teorização sobre Aconselhamento Psicológico, destacam-se Parsons e Rogers. O primeiro era engenheiro e compreendia o aconselhamento como o fornecimento de informações e conselhos sobre escolha profissional, baseada na experiência do orientador. A partir da década de 1940, o trabalho como conselheiro leva Carl Rogers a questionar o modelo vigente, propondo em seu lugar o aconselhamento não-diretivo. Concomitantemente, ele desenvolve a Terapia Centrada no Cliente. O Aconselhamento é apresentado como um tipo de contato direto com o indivíduo a fim de lhe fornecer assistência na modificação de suas atitudes.
O Aconselhamento distingue-se da Psicoterapia, pois se trata de um auxílio para o aconselhando maximizar seus recursos pessoais e fazer escolhas. Pode ser útil também como prática educativa, preventiva ou de apoio situacional. Geralmente é um processo de curta duração, diferenciando-se do modelo tradicional de psicoterapia, de longa duração, que visa a reestruturação da personalidade e o tratamento de problemas emocionais e patologias.
  
 
Introdução ao Aconselhamento Psicológico na perspectiva da Psicologia Humanista
 
Bibliografia básica:SCHMIDT, M. L. S. “O nome, a taxonomia, e o campo do Aconselhamento Psicológico”, In: MORATO, H.T.P. et al. (Coord.) Aconselhamento Psicológico numa perspectiva fenomenológica existencial: uma introdução. Cap.
I, p. 1-21.
 
O aconselhamento psicológico nasce nos anos 1930 nos Estados Unidos como especialidade e área de atuação e saber do psicólogo. No início é estreitamente ligado à orientação vocacional e à psicometria, focando as pesquisas em testes vocacionais e outros meios de medição de aptidões.
A primeira teoria mais expressiva chama-se Traço e Fator e foi desenvolvida pelo engenheiro William Parsons. A teoria Traço e Fator parte do pressuposto de que o aconselhamento deve focar o processo de ensino do aconselhando, pois tem como meta a solução de problemas específicos de adaptação do indivíduo nas áreas educacional e profissional através do desenvolvimento de atitudes e comportamentos (os “traços”) condizentes com o esperado para a realização da atividade proposta (os “fatores”).
Williamson, um dos expoentes do aconselhamento psicológico na Teoria Traço e Fator, define-o como um atendimento que auxilia o indivíduo a aprender determinadas matérias escolares, condutas adequadas de cidadania, valores sociais e todos os outros hábitos, habilidades, atitudes e crenças que constituem um ser humano normal. Em outras palavras, o processo teria o objetivo de eliminar ou modificar comportamentos considerados inadequados. A mudança de comportamentos e atitudes, segundo o autor, seria satisfatória para o aconselhando e para a sociedade em que vivia. Nesse sentido, a Teoria Traço e Fator, articulada à vertente experimental dos estudos psicométricos, dá ao Aconselhamento uma aura de cientificidade e abre espaço para a prática do psicólogo.
A Psicologia ainda não estava regulamentada como profissão nos EUA e aqueles que praticavam a psicologia buscavam delimitar seu campo de atuação. Uma possibilidade era a psicoterapia, que, na época, era prerrogativa dos médicos e encontrava na psicanálise a teoria que a fundamentava. A psicoterapia tinha como público indivíduos que sofriam de distúrbios psicológicos mais graves, exigindo tratamentos prolongados. O Aconselhamento Psicológico surge como possibilidade de prática psicológica voltada para questões de desajustamento, orientando o aconselhando na obtenção das habilidades que o tornam ajustado ao seu meio. Isso pode ocorrer num período mais curto do que a psicoterapia de longa duração.
Em 1942, Carl Rogers publica o livro Aconselhamento e Psicoterapia, lançando as bases da primeira fase de suas ideias: a terapia não-diretiva. A não-diretividade é geralmente associada a total não-interferência do terapeuta (ou conselheiro) no processo do cliente. Sua proposta surge em oposição ao processo de aconselhamento da Teoria Traço e Fator, que é considerada prepotente e autoritária por situar o conselheiro no lugar de quem sabe o caminho certo para modificar os comportamentos desajustados e desadaptados socialmente do aconselhando. Nesse sentido, o conselheiro psicológico que segue a proposta de Rogers coloca-se como “um ouvinte interessado e compreensivo, que, pela técnica da reflexão, queria proporcionar que a esfera de exploração pessoal do cliente ou aconselhando se configurasse o mais proximamente possível de suas vivências e percepções atuais e conscientes.” (Schmidt, 2009, p. 5). Com suas ideias, Rogers elimina a distinção entre aconselhamento e psicoterapia.
 
O Aconselhamento Psicológico fundamentado na Abordagem Centrada na Pessoa
 
O psicólogo norteamericano Carl Rogers não distingue aconselhamento psicológico e psicoterapia, pois considera que ambos consistem em contatos diretos com o indivíduo com o objetivo de facilitar mudanças significativas em suas atitudes e comportamentos. Esses encontros são marcados pelas atitudes facilitadoras – aceitação incondicional, compreensão empática e congruência – que propiciam um ambiente de desenvolvimento psicológico ao indivíduo.
Atualmente, o aconselhamento psicológico é prática exclusiva de psicólogos, caracterizada por centrar-se nas potencialidades e nos aspectos saudáveis dos indivíduos, não nas suas fragilidades ou aspectos psicopatológicos. Além disso, o aconselhamento também tem como foco o modo como a pessoa se percebe e os projetos pessoais que quer realizar para desempenhar um papel social produtivo.
Pode-se também caracterizar o aconselhamento como um atendimento psicológico em períodos de crise, no qual o objetivo é facilitar as escolhas do indivíduo na situação que vive, escolhas essas das quais depende seu desenvolvimento posterior.
Assim, esse atendimento está voltado a questões situacionais, ao apoio e à prevenção, mais comumente dirigido à solução de problemas.
No entanto, como assinala Schmidt logo no início de seu texto, aconselhamento tem dois sentidos: pode indicar os significados de sugestão, recomendação e orientação, mais próximos ao sentido de aconselhamento na perspectiva tradicional; pode ainda denotar a situação em que várias pessoas se reúnem para pensar e decidir com justeza a respeito de algo de seu interesse, o que se aproxima da definição de Rogers da relação de ajuda presente tanto no aconselhamento quanto na psicoterapia.
MÓDULO 07: PLANTÃO PSICOLÓGICO
Bibliografia básica: CHALOM, M. et al. A experiência de implantação de um serviço de plantão psicológico no Projeto esporte-Talento por alunos de graduação do IPUSP. In: MORATO, H. T. P. (Org.) Aconselhamento Psicológico centrado na pessoa: novos desafios, p. 177-185.
 Bibliografia complementar: CAUTELLA, W. Plantão Psicológico em hospital psiquiátrico. In: In: MORATO, H. T. P. (Org.) Aconselhamento Psicológico centrado na pessoa: novos desafios, p. 161-175.
 Introdução ao Plantão Psicológico
O Plantão Psicológico é um modelo de atendimento psicológico que se coloca disponível para acolher a experiência do cliente no momento em que ele se decide por procurar o psicólogo. Seguindo essa mesma orientação, é o cliente que determina o foco da sessão. O objetivo do encontro é propiciar uma compreensão da situação atual e o resgate de liberdade e autonomia. Trata-se, portanto, de um esclarecimento da situação vivenciada.
            Não exige um setting terapêutico como outros modelos de atendimento psicológico, podendo acontecer dentro de instituições. Exige apenas que a instituição e o profissional garantam a sistematicidade do serviço. Nos relatos de experiência de CHALOM et al. (1999) e CAUTELLA (1999), o plantão ocorre em instituições em dias e horários previamente combinados. Sempre nos períodos determinados há psicólogos-plantonistas disponíveis para atender os interessados. Essa sistematicidade e a disponibilidade do psicólogo oferecem àqueles que procuram atendimento um ponto de referência em momentos de necessidade.
            O Plantão, em geral, acontece em apenas um encontro. Existe a possibilidade de ser marcar retornos e follow up, mas o sentido do plantão é resgatar a capacidade de apropriação da situação existencial, o que não necessita de mais do que um encontro bem feito. O agendamento de retornos já é uma modificação em relação à proposta original, pois, nessa situação, o psicólogo determina quando o cliente deve voltar, decidindo por ele.
É um modelo que corresponde bem às possibilidades de prática psicológica em instituições, pois não há agendamento prévio, tampouco fila de espera. Todas essas condições facilitam a implementação do serviço nas instituições e viabilizam o atendimento a um número expressivo de pessoas.
Sentido da intervenção psicológica no Plantão Psicológico
O objetivo do plantão psicológico é o atendimento no momento da procura do cliente, o que possibilita um esclarecimento da situação atual que a motivou e a descoberta dos modos próprios de lida com ela. O psicólogo-plantonista precisa ter disponibilidade para lidar com o não-planejado. Este é um aspecto crucial deste modelo de atendimento, no qual o psicólogo coloca-se a disposição para acolher a demanda que aparecer, no momento em que acontece. Também é necessário que o plantonista compreenda como possível o acontecimento de um único encontro. Como já foi visto, o Plantão pode disponibilizar retornos, mas o objetivo não depende
do prolongamento dos atendimentos. Ademais, o plantonista fica disponível para receber o paciente quando este tomar iniciativa por buscar ajuda, o que deixa de acontecer se o psicólogo indicar se e quando deve retornar.
            As intervenções do psicólogo-plantonista têm o sentido de abrir a compreensão da experiência do cliente, cultivando uma fala própria. Assim, não cabe a ele explicar o que está vendo ou propor alternativas. Fazer isso seria pressupor a incapacidade do cliente de lidar com sua situação, o que, do ponto de vista das abordagens humanistas, seria desconsiderar sua capacidade de autocompreensão e autodeterminação. Em geral, esse é um dos motivos da procura nas instituições, pois estas determinam as possibilidades existenciais de seus agentes, despindo-os de singularidade. (CAUTELLA, 1999) O plantão surge, assim, como resgate da autonomia do cliente para a autoria de sua narrativa.
MÓDULO 08: OFICINAS DE CRIATIVIDADE
Bibliografia básica: SCHMIDT, M.L.; OSTRONOFF, V.H. Oficinas de criatividade: Elementos para a explicitação de propostas teórico-práticas. In: MORATO, H. T. P. (Org.) Aconselhamento Psicológico centrado na pessoa, p. 335-344.
 O termo Oficina remete a ofício, a artesanal. As Oficinas de Criatividade são espaço terapêuticos com o objetivo de resgatar possibilidades criativas na vida dos participantes. A criatividade pode ser descoberta (ou redescoberta), pois é condição humana para as abordagens humanistas em psicologia, e sua (re)apropriação repercute na vida dos participantes das oficinas, pois abre novos modos de se relacionar consigo mesmos e com os demais.
            Historicamente, as Oficinas de Criatividade surgem no contexto das experiências grupais intensivas da Abordagem Centrada na Pessoa e da Gestalt-terapia das décadas de 1960 a 1980. Nessas experiências (chamadas Workshops, que, traduzido literalmente, significa Oficina), os participantes desenvolviam novos modos de se relacionar com os demais. Iniciavam o Workshop desencontrados, estranhando-se, e encerravam o período (que podia durar de 1 a 10 ou mais dias) organizados como grupo.
            As Oficinas de Criatividade conferem organização a essa experiência. Oferecem um ambiente protegido e atividades temáticas que facilitam a confiança no processo e à entrega ao potencial criativo de cada um.
Propõe-se um processo de 6 a 8 sessões. Os facilitadores organizam o grupo e elaboram propostas temáticas. Estas utilizam materiais expressivos e/ou atividades corporais, solicitando que os participantes experimentem-se sensorialmente, sem a referência de “certo” ou “errado” (que frequentemente bloqueiam a criatividade).
São exemplos de recursos usados nas Oficinas de Criatividade: Corporais, que favorecem a sensibilização, conscientização e expressão, ampliando o contato com o próprio corpo e com os sentimentos; Sensibilização sensorial, que abre novos canais de conhecimento do mundo pouco experimentados; Música, que é afetiva, criadora de climas emocionais e convidativa ao ritmo; Recursos plásticos, que concretizam a experiência pessoal.
Lugar e Função do Oficineiro 
Bibliografia básica: SCHMIDT, M.L.; OSTRONOFF, V.H. Oficinas de criatividade: Elementos para a explicitação de propostas teórico-práticas. In: MORATO, H. T. P. (Org.) Aconselhamento Psicológico centrado na pessoa, p. 335-344.
            O Oficineiro é o psicólogo que organiza as atividades da Oficina de Criatividade. Seu papel no grupo é de coordenador e facilitador do processo. Schmidt e Ostronoff (1999) caracterizam as Oficinas como “espaços de elaboração da experiência pessoal e coletiva através do uso de recursos expressivos, tais como movimento corporal e atividades de expressão plástica e de linguagem” (p.335), que revitalizam a vida social ou comunitária tornando-a mais criativa e solidária. Cabe ao Oficineiro facilitar os processos criativos e criadores nos grupos.
            São várias as tarefas do coordenador. Cabe a ele, primeiramente, constituir o grupo, atento às necessidades que motivaram a escolha da Oficina de Criatividade como modelo de atendimento e às peculiaridades da população que atenderá. Feito isso, deve definir se o grupo é aberto ou fechado, o local onde acontecerá, planejar um roteiro de atividades (que será reelaborado ao longo do processo) e disponibilizar os materiais que serão utilizados. Além disso, deve divulgar o início do grupo, de modo que as pessoas se interessem e participem.
            Atento às necessidades do grupo, o Oficineiro escolhe o tema adequado às necessidades identificadas e os recursos que melhor atendam à exploração desse tema.
            Como modelo geral, acontecem de 6 a 8 encontros, que podem ser divididos em: 1. Aquecimento, no qual os participantes se voltam para a experiência imediata e se prepararam para entrar em contato consigo mesmos, com os outros e com o tema proposto; 2. Realização da atividade, que é quando entram em contato com a temática proposta e utilizam os recursos indicados para entrar em contato consigo mesmos e se expressarem; 3. Fechamento, que é ó compartilhar a experiência própria na realização da atividade com os demais e criar um espaço de discussão e socialização.
Oficinas de criatividade, constituição dos grupos e elaboração das experiências
Bibliografia obrigatória:
SCHMIDT, M. L. S. e OSTRONOFF, V. H. “Oficinas de criatividade: elementos para a explicitação de propostas teórico-práticas.” In: MORATO, H. T. P. (Coord.) Aconselhamento Psicológico Centrado na Pessoa: novos desafios. Cap. 20, pp. 329-338.
A constituição dos grupos de participantes é de suma importância numa oficina de criatividade. Há dois modos de formação de grupos: no primeiro o grupo se constitui de um coletivo já existente, como uma equipe de trabalho numa instituição; no segundo, o grupo se forma a partir da divulgação de oficinas oferecidas pelo facilitador.
No primeiro caso, é necessário explicitar-se a demanda do grupo para se saber se as oficinas são a melhor resposta a ela. Nesse sentido, é de suma importância que o psicólogo venha a conhecer as motivações, expectativas e objetivos do grupo, e se o nível de integração do grupo é compatível com a realização das oficinas, uma vez que estas não são o melhor tipo de atendimento psicológico a um grupo desintegrado.
No segundo caso, o grupo é formado circunstancialmente, em função da participação na oficina. Ao oficineiro, neste tipo de coletivo, cabe definir a população-alvo e a temática, a duração, o local e o horário das oficinas. Cabe também a ele saber quais são as expectativas e motivação das pessoas com relação à realização dos trabalhos.
É fundamental também que o oficineiro esteja atento aos efeitos que as oficinas acarretarão na instituição onde elas são oferecidas, tendo em vista certos “transtornos” que elas acarretam, uma vez que quebram a rotina institucional, e que mobilizam não apenas os participantes, mas também aqueles que ficam fora delas.
As oficinas proporcionam a elaboração de experiências pessoais e coletivas através das produções, que se realizam no eixo da aprendizagem significativa. Essas produções testemunham não só a força criativa das pessoas e grupos quando lhes é oferecido condições facilitadoras, mas também o desejo de compartilhamento de experiências. Assim, as oficinas rompem com o isolamento, ativam laços sociais e comunicacionais. Possibilitam também o desenvolvimento de sentimentos de pertença social dos participantes.

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