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Entre_a_utopia_e_o_cotidiano_Uma_analise

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Revista Psicolog
Volume 1 Número 1
Editores
Carlos Henrique da Costa Tucci e Andreza Cristiana Ribeiro
Ribeirão Preto - SP - Brasil 2008
Revista Psicolog 1
Expediente
Editores
Andreza Cristiana Ribeiro
(andrezaribeiro@psicolog.com.br)
Carlos Henrique da Costa Tucci
(henriquetucci@psicolog.com.br)
Conselho Editorial
Alice Maria de Carvalho Delitty
Alexandre Dittrich
Almir Del Prette
Antonio Bento Alves de Moraes
Antonio Pedro de Mello Cruz
Deisy das Graças de Souza
Edwiges Ferreira de Mattos Silvares
Emmanuel Zagury Tourinho
Fabiana Ferreira Guerrelhas Gonçalves
Heloísa Helena Ferreira da Rosa
Isaías Pessotti
Jaime Eduardo Cecilio Hallak
João Claudio Todorov
José Alexandre de Souza Crippa
Jose Antonio Damasio Abib
Josele Regina de Oliveira Abreu Rodrigues
Juliana Setem Carvalho Tucci
Julio Cesar Coelho de Rose
Kester Carrara
Laercia Abreu Vasconcelos
Lincoln da Silva Gimenes
Lorismário Ernesto Simonassi
Luiz Alberto Bechelli Hetem
Maira Cantarelli Baptistussi
Maria Martha Costa Hübner
Regina Christina Wielenska
Roberto Alves Banaco
Roosevelt Riston Starling
Rosmeire Borges
Silvio Luiz Morais
Silvio Morato de Carvalho
Sonia Beatriz Meyer
Vera Regina Lignelli Otero
Zilda Aparecida Pereira Del Prette
Capa
Luis Henrique da Silva Cruz
Revista Psicolog 2
Sumário
Editorial 3
A evolução do manejo clínico dos problemas de conduta: do tratamento à pre-
venção
Edwiges Ferreira de Mattos Silvares e Márcia Helena da Silva Melo 4
O problema da “justificação racional de valores” na filosofia moral skinneriana
Alexandre Dittrich 21
Colecionismo: fronteiras entre o normal e o patológico
Mónica Ferreira Gomes Aires Oliveira e Regina Christina Wielenska 27
Entre a utopia e o cotidiano:
uma análise de estratégias viáveis nos delineamentos culturais
Kester Carrara 42
Procedimentos de observação em situações estruturadas para avaliação de ha-
bilidades sociais profissionais de adolescentes
Almir Del Prette e Camila de Sousa Pereira 55
Proposta de interpretação de operantes verbais na relação terapeuta-cliente,
demonstrada em caso de dor crônica
Rodrigo Nardi e Sonia Beatriz Meyer 69
Automonitoramento como técnica terapêutica e de avaliação comportamental
Carlos Henrique Bohm e Lincoln da Silva Gimenes 89
O uso do “Stroop Color Word Test” na esquizofrenia: uma revisão da metodolo-
gia.
Jaime Eduardo Cecilio Hallak, João Paulo Machado de Sousa, Antonio Waldo
Zuardi 102
Normas para submissão de artigos para publicação 120
Revista Psicolog 3
Editorial
Segundo Skinner, em seu livro “O Comportamento Verbal”, os homens agem
sobre o mundo, modificam-no e, por sua vez são modificados pelas consequências de sua
ação. E ainda segundo este mesmo autor, as conseqüências que deveriam seguir a todo
comportamento, público ou privado, deveriam ser os reforçadores positivos. Foi com
estas premissas que buscávamos promover condições para aumentar a probabilidade de
cientistas, como nós, serem reforçados positivamente por difundir seus dados científicos.
E as condições para que esta iniciativa se concretizasse definitivamente se deram com a
união de profissionais com estes mesmos ideais na cidade de Ribeirão Preto. O Psicolog
- Instituto de Estudos do Comportamento de Ribeirão Preto é uma instituição particular
que realiza atividades de ensino, pesquisa e atendimentos psicoterápicos sob o referencial
teórico da Análise do Comportamento. As atividades do instituto são organizadas
com o compromisso de apoiar e promover de forma sistemática o desenvolvimento
da Análise do Comportamento em sua região e no Brasil, por meio de pesquisas e
atividades realizadas por seus alunos e profissionais. Outra maneira encontrada para
contribuir na divulgação de trabalhos científicos desta área do conhecimento foi a criação
da Revista Psicolog. Esta publicação tem como objetivo criar condições para que
alunos, pesquisadores e profissionais, do Brasil e da América Latina, exponham seus
conhecimentos à comunidade científica. A Revista Psicolog terá periodicidade semestral
e a forma de apresentação escolhida é a versão on-line, no intuito levar informações e
conceitos da Análise do Comportamento, de forma dinâmica e irrestrita, a um número
cada vez maior de pessoas. Os textos submetidos à publicação deverão ser originais em
português e/ou espanhol, de qualquer área de aplicação da Análise do Comportamento,
na forma de relatos de pesquisa, revisões teóricas, relatos de caso, comunicações breves
e traduções de artigos científicos clássicos. A montagem do Conselho Editorial, que
endossa a qualidade dos artigos apresentados pela Revista, foi uma tarefa muito prazerosa
que nos permitiu manter contato próximo com um notável grupo de pesquisadores que
generosamente nos apoiou e estimulou a assumir a responsabilidae desta importante
empreitada. Na qualidade de Editores desta Revista, temos o imenso prazer de oferecer
neste primeiro número uma seleta de artigos enviados por estes renomados profissionais.
A partir desta edição, abrimos às comunidades científicas brasileira e latino-americana
nossas páginas para que marquem sua presença e também contribuam para a manutenção
desta tarefa que assumimos de promoção do conhecimento científico.
Contamos com a ativa participação de todos.
Andreza Cristiana Ribeiro e Carlos Henrique da Costa Tucci
Editores
Revista Psicolog 4
A evolução do manejo clínico dos problemas de conduta: do
tratamento à prevenção
Edwiges Ferreira de Mattos Silvares1, Márcia Helena da Silva Melo2
1Professora Titular do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo
Av. Prof. Mello Moraes, 1721, Bloco F, Cidade Universitária, São Paulo – SP
CEP: 05508-900 .
2Pesquisadora do Laboratório de Terapia Comportamental da Universidade de São Paulo.
São Paulo - SP - Brasil.
efdmsilv@usp.br, mmelo@usp.br
Abstract. Clinical works about treatments for conduct problems emphasizes the
need for an early, comprehensive, and preventive intervention. This form of
intervention should involve widespread relevant agents of the child universe.
The present work undertakes a literature review, focusing on theoretical models
adopted since 1950, to clarify the negative factors that affect children’s devel-
opment c. These models are the base for several clinical interventions proposed
since then by behavior therapy, such as parent training, child focused interven-
tion and, more recently, teacher training added to peers intervention. Finally it
is described a study and its dissemination involving an expanded Brazilian inter-
vention model proposal, including parents, peers and teachers to the acquisition
and consolidation of social skills, aiming to early stop children to engage in an-
tisocial conducts.
Keywords: conduct problems, prevention, behavior therapy
Resumo. Os trabalhos clínicos voltados ao tratamento dos problemas de con-
duta têm enfatizado, cada vez mais, a necessidade de uma intervenção precoce,
preventiva e abrangente, envolvendo o maior número de agentes significativos
do universo infantil. O presente artigo empreende uma revisão da literatura,
enfocando os modelos teóricos adotados desde 1950 para esclarecer os fa-
tores que influenciam negativamente o desenvolvimento da criança (aquisição
de comportamentos de baixa competência social). Tais modelos embasam os
diversos tipos de intervenção clínica propostos desde então pela terapia com-
portamental, contemplando a orientação parental, o atendimento à criança e,
mais recentemente, o treinamento de professores somado à intervenção com
pares. Por fim, é apresentada uma proposta de disseminação de um modelo
ampliado de intervenção brasileira (com estudo de disseminação já concluído),
que inclui pais, pares e professores – tão importantes para a aquisição e con-
solidação das habilidades sociais – com vistas a interromper precocemente a
escalada da criança às condutas anti-sociais.
Palavras-chave: problemas de conduta, prevenção, terapia comportamental.
Revista Psicolog 5
Uma breve perspectiva histórica da
TCCI (Terapia Cognitivo - Comporta-
mental Infantil)voltada para o trabalho
com os pais de crianças com problemas
de conduta11
Desde os anos pioneiros de terapia
cognitivo-comportamental infantil, quando
seus objetivos eram menos clínicos e mais
demonstrativos (Silvares, 1991), o trabalho
dos psicólogos clínicos infantis têm en-
volvido os pais no tratamento dos mais di-
versos problemas das crianças que lhes são
encaminhadas para tratamento psicológico.
A título ilustrativo, podemos citar um dos
primeiros estudos sobre orientação de pais,
desenvolvido por Williams, em 1959. Não
é demais lembrar, para os que são menos
sintonizados com a história da Terapia
Cognitivo-Comportamental (TCC), ter sido
o procedimento de extinção, executado pe-
los pais e tia da criança, sob orientação de
Williams, que levou ao alcance dos ob-
jetivos de auxiliar uma criança com difi-
culdades de permanecer sozinha no quarto
após ter passado por internação em hospi-
tal, durantes dois meses, em decorrência de
problemas somáticos.
Quase quarenta anos após esse trabalho pi-
oneiro, McMahon (1996) considerou a ori-
entação de pais no auxílio a crianças com
dificuldades comportamentais e emocionais
a estratégia para tratamento psicológico in-
fantil mais extensamente ampliada e avali-
ada nas últimas décadas.
De acordo com Marinho e Silvares
(1998) na primeira revisão crítica dos es-
tudos sobre orientação de pais de crianças
com problemas de comportamento disrup-
tivo, O’ Dell (1974) concluiu que esta abor-
dagem era vista como bem sucedida, o
que foi confirmado em publicações pos-
teriores, da década de noventa (e.g. Eisen-
stadt, Eyberg, McNeil, Newcomb Funder-
burk, 1993; Kazdin, 1991, 1994; Patterson,
Reid Dishion, 1992; Sanders Dadds, 1993;
Serketich Dumas, 1996; Webster-Stratton,
1991, 1994). O mesmo poderia ser dito
para a década inicial do novo milênio (e.g.
Webster Stratton Taylor, 2001).
Nesse sentido, podemos mencionar
o estudo de Frankel (1993), que “comparou
a habilidade de pais, cujos filhos não es-
tavam inscritos em clínicas psicológicas,
mas que receberam orientação sobre como
lidar com seus filhos (tipo 1); com a de
pais de crianças que já haviam sido in-
scritas em clínica psicológica (tipo 2)” (p.
8). Os resultados mostraram melhor de-
sempenho dos pais tipo 1, sugerindo que
estes possuíam melhores condições para
resolução de conflitos com seus filhos. Com
base nestes resultados, pode-se concluir que
quanto mais adequados forem os pais na in-
teração com os filhos, menor é a probabili-
dade destes apresentarem dificuldades com-
portamentais intensas. E, como afirmou
Patterson (1986), quanto mais cedo os pais
aprenderem a lidar com as dificuldades que
têm com suas crianças, as chances destas
desenvolverem comportamentos inadequa-
dos, como por exemplo o comportamento
delinqüente, são minimizadas.
A receptividade a essa estratégia
de tratamento psicológico infantil, pelos
psicólogos clínicos pesquisadores, faz todo
sentido se considerarmos que, além de sua
eficácia demonstrada, dois outros pontos
parecem explicá-la. Em primeiro lugar, a
prevalência – nos Estados Unidos – dos
problemas de comportamento, em idade
pré-escolar e em anos iniciais da escola
elementar é de 10% e de 25%, se a pop-
1Problemas de conduta aqui tem conotação ampla e se refere a uma classe de comportamentos chamada por Achenbach e Rescorla
(2001) de problemas externalizantes, os quais envolvem predominantemente conflitos interpessoais, englobando duas classes: com-
portamento de quebrar regras e comportamento agressivo.
Revista Psicolog 6
ulação considerada for de crianças de nível
socioeconômico desprivilegiado, segundo
Webster-Stratton e Reid (2004). Taxas
semelhantes foram encontradas no Brasil
por Anselmi, Piccinini, Barros e Lopes
(2004). Em segundo lugar, a queixa de dis-
túrbios extemalizantes é a mais freqüente
em clínicas-escola americanas (Achenbach
Rescorla, 2001) e brasileiras (Silvares, San-
tos, Meyer Gerencer, 2006).
Se por um lado, é tácito que a ori-
entação de pais é popular e eficaz, espe-
cialmente no tratamento de crianças com
problemas de conduta, e altamente justi-
ficável em função da alta demanda por ela,
por outro, é também verdadeiro o recon-
hecimento de que o treinamento de pais
no manejo dos problemas dos filhos em
TCC, desde os dias de Williams até hoje,
tem se alterado, alcançando significativa
ampliação (Silvares, 1993), fruto da con-
tínua construção de conhecimento dentro
da própria área.
Apresentar essas transformações e o
caminho trilhado por pesquisadores e clíni-
cos na área da psicologia – que de forma
crescente saem em defesa de ações preven-
tivas –, na direção de práticas que produzam
efeitos mais abrangentes e mais duráveis
no tempo ao lidar com problemas de con-
duta, é o objetivo do presente estudo. Para
tanto, as autoras ancoram sua explanação
em três modelos explicativos sobre os de-
terminantes do comportamento infantil que
fornecem subsídios para o planejamento de
intervenções. Por fim, são referidos como
exemplos de intervenção dois programas,
realizados pelas mesmas autoras, que reme-
tem ao estágio atual dos programas destina-
dos aos problemas de conduta.
Um exame dos percursos de influência
negativa dos agentes sociais sobre a cri-
ança
Quando se fala em ampliação na es-
tratégia de orientação de pais de crianças
com problemas comportamentais e emo-
cionais, significa incluir mais elementos,
tanto na avaliação quanto na intervenção
que se promove, com vistas às melhorias
psicológicas infantis.
Tal ampliação tem sentido especial-
mente se examinarmos os modelos de per-
cursos da influência negativa sobre o com-
portamento problemático em crianças, de-
senvolvidos por estudiosos americanos, no
final da década de noventa e início de 2000.
É bom lembrar que esses percursos são
traçados a partir de estudos metodologica-
mente planejados e com uso de métodos
de regressão estatística, os quais permitem
definir os caminhos que unem variáveis pre-
viamente mensuradas no trabalho de inves-
tigação sobre tais percursos.
Primeiro modelo: a influência negativa
dos déficits de manejo de conflito conju-
gal sobre o comportamento infantil
O primeiro dos estudos sobre mod-
elos de percurso descreve a trajetória da in-
fluência negativa dos pais sobre seus filhos,
delineada por Webster-Stratton e Hammond
(1999). A figura 1 especifica as relações di-
retas e as indiretas do manejo negativo do
conflito marital com os problemas da cri-
ança.
O modelo indireto indica que o
manejo negativo do conflito entre casais
afeta tanto o comportamento crítico ado-
tado na criação dos filhos como a baixa
responsividade emocional dos pais, que por
sua vez influencia no desenvolvimento dos
problemas da criança. O estudo de Webster-
Stratton e Hammond (1999) encontrou al-
gumas diferenças entre pais e mães, princi-
palmente sobre o empoderamento marital.
Analisando o modelo em relação às mães,
Revista Psicolog 7
ficou evidente que essa variável tem efeito
direto sobre os problemas de conduta da cri-
ança enquanto para os pais tal efeito não foi
observado de nenhuma perspectiva. Além
disso, para as mães o manejo negativo do
conflito marital mostrou uma relação direta
significante à criação crítica, sendo que este
comportamento materno não influencia sig-
nificativamente os problemas de conduta da
criança. Já para os pais, o manejo negativo
do conflito conjugal tem impacto significa-
tivo sobre seu comportamento crítico, que
por sua vez interfere nos problemas infantis.
Com o desenvolvimento deste mod-
elo (ilustrado na Figura 1) parece ter sido
resolvida a questão que gerava conflito en-
tre estudiosos de distúrbios psicológicos in-
fantis, acerca do tipo de influência exercida
pelos conflitos conjugais sobre os prob-
lemas psicológicos das crianças. Parece
ter ficado claro que o surgimento das di-
ficuldades infantis tem tanto a influência
direta do conflito marital sobre os proble-
mas, como indireta, pela forma negativa
e crítica de interação e baixa responsivi-
dade emocional dos pais em conflito. Em
decorrência, a ampliação dos programas deorientação de pais se justifica; tem sentido
ir além do desenvolvimento de habilidades
parentais e incluir recursos mais eficientes
de manejo do conflito conjugal.
É para garantir que as crianças que
estão lutando com uma série de problemas
sociais e emocionais recebam o ensino e su-
porte que necessitam para serem bem suce-
didas na escola e na vida, que se tem tra-
balhado com seus pais – tanto para habilitá-
los a ter melhores condições de manejo de
conflito marital como para equipá-los de
estratégias de interação familiar mais pos-
itivas de modo que possam fazer de seus
filhos crianças mais competentes do ponto
de vista social e emocional e com maior
prontidão acadêmica.
Pesquisas (e.g. Cummings Davies,
2002) mostram que crianças com baixa
competência emocional e social provêm
de famílias onde os pais expressam um
modo de criação mais hostil, se engajam
com maior freqüência em conflito com o
cônjuge e prestam maior atenção aos com-
portamentos negativos das suas crianças do
que aos positivos.
Dependendo da forma como con-
duzem suas divergências, os pais podem
criar um ambiente inadequado para a cri-
ança, seja pela imprevisibilidade dos com-
portamentos, seja pelo oferecimento de
modelos de interação prejudiciais ao de-
senvolvimento emocional dos filhos. As
discussões freqüentes, marcadas por vio-
lência verbal e/ou física, repercutem nas
crianças de duas maneiras: a criação crítica
– que consiste no reforço contínuo aos com-
portamentos negativos dos filhos, em detri-
mento da valorização dos comportamentos
positivos – e a baixa responsividade emo-
cional, que compromete a capacidade dos
pais de observarem e atenderem às neces-
sidades de apoio, carinho e segurança de
seus filhos. Com isso, os comportamentos
negativos das crianças tendem a se tornar
mais freqüentes e generalizados para outros
ambientes, ensejando os futuros problemas
de conduta, uma vez que não aprendem
um repertório comportamental socialmente
mais hábil.
Crianças que têm dificuldades em
prestar atenção, seguir instruções da pro-
fessora, cooperar com seus colegas e que
não têm bom controle das emoções, se
saem pior na escola do que aquelas que dis-
põem dessas habilidades. Além disso, têm
maior probabilidade de serem rejeitadas pe-
los colegas e por seus professores, o que por
sua vez contribui para mantê-las desligadas
Revista Psicolog 8
Figura 1. Modelo de percurso manejo negativo do conflito conjugal sobre as dificuldades de com-
portamento dos filhos (Modelo traduzido e adaptado de Webster-Stratton Hammond, 1999).
das tarefas e com menos tempo na escola.
Estudo realizado por Castro, Melo e Sil-
vares (2003) permitiu verificar que a maior
parte das 13 crianças indicadas para trata-
mento psicológico, por suas professoras,
foi avaliada como rejeitada por seus cole-
gas. Cabe aqui destacar que a rejeição entre
pares pode constituir o início de um cír-
culo vicioso pelo fato de a criança passar a
se relacionar apenas com companheiros re-
jeitados pela sua conduta anti-social, sendo
reforçada pelos valores desse novo grupo.
Nessa perspectiva, importante as-
pecto a ser considerado refere-se ao con-
texto do grupo de pares, em termos do
que valorizam e quais comportamentos são
mais e menos freqüentes entre eles. Isso
porque, à exceção dos comportamentos
pró-sociais - consistentemente associados
a um status positivo entre os pares - out-
ros comportamentos, tais como a agressivi-
dade e o isolamento, poderão ser mais ou
menos aceitos dependendo das caracterís-
ticas de cada grupo. Estudo realizado por
Stormshak, Bierman, Bruschi, Dodge, Coie
e o grupo de pesquisa de prevenção dos
transtornos de conduta (1999) demonstrou
que a maior ou menor competência social,
tanto quanto as normas do grupo, con-
stituem variáveis preditoras da aceitação
entre os pares. A pesquisa compreendeu a
participação de 2895 crianças de 134 salas
de primeira série do ensino fundamental,
avaliadas por seus professores e colegas de
turma (entrevista sociométrica). Os autores
observaram que o comportamento agressivo
mostrava-se consideravelmente mais rela-
cionado à baixa preferência entre os pares
quando não constituía uma característica do
grupo. Particularmente entre os alunos do
sexo masculino, a agressão e a preferência
entre os pares estavam positivamente as-
sociadas nas salas com maiores índices de
agressividade. Da mesma forma, quando
o isolamento era predominante no contexto
da sala (alunos com brincadeiras solitárias e
baixos níveis de interação social), meninos
com este comportamento eram avaliados
positivamente na preferência dos colegas
de classe. As meninas eram mais aceitas
do que os meninos, independentemente dos
níveis de isolamento, o que também sug-
ere a influência do gênero nos resultados
da avaliação entre os pares. Contudo, tanto
para meninos quanto para meninas, os com-
portamentos pró-sociais emergiram como
preditores positivos da preferência entre os
colegas em todas as salas, evidenciando a
Revista Psicolog 9
importância da promoção da competência
social na redução dos índices de rejeição
entre pares.
A compreensão dos fatores que
levam ao aumento da agressividade, sua
estabilidade ou cronificação ao longo do
tempo também pode subsidiar o desenvolvi-
mento de programas preventivos no sentido
de criar condições de atendimento a neces-
sidades específicas. Recente estudo longi-
tudinal empreendido por Schaeffer, Petras,
Ialongo, Poduska e Kellam (2003) identi-
ficou quatro trajetórias de comportamento
agressivo entre 297 meninos, avaliados aos
seis anos de idade e acompanhados durante
todo o primeiro grau. Cerca de um terço dos
meninos (32%) apresentaram baixos níveis
de agressão durante o desenvolvimento,
mantendo baixas as taxas de comportamen-
tos anti-sociais ao final da avaliação. Um
grupo de meninos avaliados como cronica-
mente agressivos (9%) revelou altos níveis
de agressividade, evidenciando situação de
risco ao término da pesquisa. Observou-se
ainda que 7% dos garotos demonstraram
uma agressividade inicial baixa que foi
crescendo ao longo da vida escolar. Mais
da metade dos meninos (52%) apresentou
uma trajetória moderada de agressividade,
com um leve aumento das taxas de com-
portamento anti-social ao longo do tempo,
culminando em uma situação de risco sig-
nificativamente maior em relação aos meni-
nos não agressivos. Os autores sugerem,
por exemplo, que os meninos com trajetória
de agressividade crescente possam ser ben-
eficiados com programas focados em ori-
entação parental ou treinamento para o au-
tocontrole, enquanto os alunos que apre-
sentaram altos níveis de agressividade de-
mandem intervenções multifocais, podendo
incluir psicoterapia e tratamento medica-
mentoso. Sem dúvida, trata-se de um ol-
har sobre o início do desenvolvimento do
comportamento agressivo importante para
a configuração de intervenções preventivas
mais eficazes na área dos transtornos de
conduta.
Com o primeiro modelo de percurso
aqui apresentado, fortaleceu-se, então, a
idéia de que se a capacidade da criança
no manejo de suas emoções e comporta-
mentos pode ajudá-la a fazer amizades sig-
nificativas, o desenvolvimento de tais ca-
pacidades poderá tornar-se, para ela, im-
portante fator protetivo2 contra os possíveis
desajustes no futuro (Rutter, 1995). Tal
aspecto preventivo é significativo, especial-
mente se a criança está exposta a múltip-
los estressores de vida (como por exemplo,
pais em conflito conjugal) configurando-se
a necessidade dos fatores protetivos para
que se aumentem as chances de ocorrên-
cia do sucesso escolar. Na mesma direção
das pesquisas internacionais, as pesquisas
brasileiras têm demonstrado que o ajuste
emocional, social e comportamental é im-
portante para o sucesso na escola bem como
para a preparação acadêmica (e.g. Elias
Marturano, 2003).
Segundo modelo: o abuso de substâncias
Outro modelo de percurso das in-
fluências negativas sobre as crianças com
distúrbios comportamentais e emocionais,
que vai além do modelo de percurso da
influência dos pais em conflito conjugal,
é descritopor Webster-Stratton e Taylor
(2001). Sua análise merece atenção, visto
que eles também trouxeram alteração so-
bre o trabalho de orientação de pais. Um
deles, adaptado de Reid e Eddy (1997) con-
forme os referidos autores, pode ser visto
na figura 2 e se refere à trajetória marcada
pelos preditores do abuso de substância em
2Fatores de proteção podem ser definidos como variáveis que diminuem o risco da criança ter um desenvolvimento negativo.
Aspectos positivos do ambiente próximo à criança podem funcionar como fatores de proteção (Dumka, Roosa, Michaels Suh, 1995).
Revista Psicolog 10
adolescentes.
O uso de substâncias ilícitas por
adolescentes é um problema sério em ter-
mos da escalada em direção à criminalidade
na vida adulta (Patterson cols., 1992). Há
evidências de que é comum na adolescência
haver a comorbidade deste problema com
outros tão sérios quanto o abuso de sub-
stâncias, tais como: distúrbios de conduta,
doença mental, delinqüência e violência.
Por outro lado, conforme mostra o modelo
figura (2), crianças com maior risco para
o uso de substâncias ilícitas ou atos delin-
qüentes na adolescência são aquelas que
fazem parte de grupos de pares desviantes,
cujos pais são ineficientes ao conduzir a cri-
ação dos filhos e ainda não conseguem es-
tabelecer relacionamento positivo com seus
professores nem tampouco atingir um bom
desempenho escolar.
Observa-se, neste modelo, o im-
pacto da interação de variáveis negativas
relacionadas ao contexto familiar e escolar,
como influência do abuso de substâncias na
juventude, evidenciando a relevância dos
elementos ambientais no desenvolvimento
de problemas comportamentais. Este as-
pecto é aprofundado no terceiro modelo,
quando são analisados os fatores de risco
que podem levar ao desencadeamento de
transtornos de conduta.
Segundo Webster-Stratton e Tay-
lor (2001), já fizeram uso de drogas ilíc-
itas 15% dos adolescentes americanos até
a oitava série e 27% até o final do se-
gundo grau. Quadro bem pior é apre-
sentado no Brasil por Ferigolo, Barbosa,
Arbo, Malysz, Stein e Barros (2004). Os
autores encontraram um alto consumo de
sustâncias ilícitas a partir das respostas a
um questionário elaborado pela Organiza-
ção Mundial da Saúde, anônimo, sobre o
uso de drogas e sua quantificação, auto-
aplicado em salas de aula, respondido pela
população de crianças e adolescentes al-
fabetizados que cumpriam medidas sócio-
educativas ou medidas protetivas em es-
colas públicas e por internos da FEBEM
de Porto Alegre, RS (N=382 indivíduos).
As substâncias mais experimentadas foram:
álcool (81,3%), tabaco (76,8%), maconha
(69,2%), cocaína (54,6%) e solventes
(49,2%). As crianças albergadas por atos
infracionais mostraram uso significativa-
mente mais freqüente de álcool, maconha,
cocaína e solventes. Em média, o início do
uso de álcool e tabaco ocorreu antes dos 12
anos; maconha e solventes, antes dos 13, e
cocaína, antes de completar 14 anos.
Outro estudo brasileiro de levanta-
mento de uso de drogas ilícitas, mais antigo,
feito com uma população mais velha, re-
trata quadro igualmente negativo. O de
Baus, Kupek e Pires (2002), um estudo
que abrangeu 478 estudantes de escola
pública de primeiro e segundo graus, de
Florianópolis, SC, os quais responderam
aos questionários aplicados por univer-
sitários, devidamente treinados. Entre os
estudantes pesquisados, 43% e 32% foram
de faixa etária entre 13 e 15 anos e entre
16 e 18 anos, respectivamente, com pre-
domínio de classes socioeconômicas mais
altas. A prevalência de uso de maconha
na vida (19,9%), solventes (18,2%), anfe-
tamínicos (8,4%) e álcool (86,8%) foi con-
siderada elevada. Notou-se elevado e fre-
qüente uso (seis ou mais vezes por mês) de
álcool (24,2%).
A compreensão fornecida pelo
modelo exemplificado na figura 2, acerca
dos percursos para o consumo de drogas,
acarreta uma grande preocupação com o
problema tendo em vista a ausência de pro-
gramas preventivos e em virtude de levan-
tamentos estrangeiros e brasileiros acerca
Revista Psicolog 11
Figura 2. Preditores de uso de substancias ilícitas por adolescentes (Modelo traduzido e adaptado
de Webster-Stratton Taylor, 2001).
do alarmante consumo de drogas por ado-
lescentes, nos dias atuais.
Embora não tenhamos no Brasil es-
tudos de percurso da influência negativa so-
bre os problemas infantis e de adolescentes,
face aos dados apresentados, acreditamos
ser possível aproximar os percursos dos es-
tudos americanos aos da cultura brasileira.
Terceiro modelo: a interação negativa
entre os fatores da criança, da família e
do meio escolar
A seguir analisamos outro modelo
de percurso proposto por Webster-Stratton
e Taylor (2001), derivado do segundo, que
enfatiza os fatores de risco contextuais no
desenvolvimento dos problemas infantis de
conduta em idade posterior, de maneira cu-
mulativa, como pode ser visto na figura 3.
Dumka, Roosa, Michaels Suh
(1995) definiram fatores de risco como var-
iáveis que aumentam as chances da cri-
ança de ter um desenvolvimento deficiente.
Muitos destes fatores exercem influência
indireta sobre o desenvolvimento infantil
(p.ex. abuso de álcool pelos pais). Alguns
fatores (p.ex. divórcio) são difíceis ou im-
possíveis de modificar. Ao mesmo tempo,
sabe-se que muitas crianças que estão ex-
postas a fatores de risco não terão efeitos
negativos em seu desenvolvimento. Além
disso, a variabilidade na susceptibilidade
aos fatores de risco pode ser devido a in-
fluência de fatores de proteção.
Nota-se na figura 3 o agrupa-
mento desses fatores em quatro categorias
- parentais, infantis, familiares e escolares
– descrevendo, respectivamente, a reper-
cussão do estilo de criação, das caracterís-
ticas pessoais da criança, do ambiente fa-
miliar e do contexto escolar, incluindo a
relação com professores e pares.
Entre os fatores parentais, pode-se
destacar a maior ou menor capacidade dos
pais de monitorarem seus filhos, bem como
suas habilidades para ensinarem as crianças
um repertório de comportamentos sociais
positivos. A criança também apresenta car-
acterísticas que vão facilitar ou dificultar
sua interação com o ambiente, quais sejam:
o nível de suas habilidades sociais, de sua
capacidade de manejar conflitos, sua im-
pulsividade e temperamento, assim como
eventuais atrasos na linguagem e no apren-
dizado.
Revista Psicolog 12
No tocante aos fatores ambientais,
há eventos estressores na família que po-
dem influenciar profunda e negativamente
a criação dos filhos, a exemplo do estresse
causado pela falta de recursos financeiros,
atividade criminal de um ou ambos os pais,
doença mental e, conforme dito anterior-
mente, os conflitos conjugais.
Durante a vida escolar da criança,
todos os fatores anteriores poderão agravar-
se caso sejam observadas respostas inefi-
cientes dos professores, a rejeição da cri-
ança por seus pares, seu envolvimento com
pares desviantes e a falta de parceria entre
os pais e a instituição escolar.
De acordo com os dois últimos
modelos, pode-se afirmar que o quanto
antes os programas voltados para redução
dos problemas infantis incidirem sobre as
crianças, seja reforçando os fatores de pro-
teção, seja minimizando os fatores de risco,
tanto melhor o alcance da prevenção.
Webster Stratton e Taylor (2001) re-
viram 12 programas parentais americanos
voltados para redução dos problemas de
conduta e nos quais o resultado foi bastante
favorável, tanto no sentido imediato da
redução de problemas de comportamento
de pelo menos 2/3 das crianças tratadas,
quanto em longo prazo no sentido da pre-
venção do recrudescimento de tais proble-
mas.
Com o aprofundamento dos estu-
dos sobre competência social na década
de 90, verificou-se que os programas de
intervenção poderiam se tornar mais efi-
cazes com a inserção de pares e profes-
sores. Isso porque a forma como se esta-
belece e se desenvolve o relacionamento
infantil, seja com adultos significativos,
seja com os pares, tem um impacto sig-
nificativo no desenvolvimento, existindo
bastante evidência de que interações neg-
ativas compares e adultos do ambiente
escolar estão associadas com problemas
como a delinqüência, abuso de drogas e
fracasso escolar, comprometendo o desen-
volvimento de relações interpessoais sat-
isfatórias e desejáveis (Coie, Dodge Ku-
persmidt, 1990; Criss, Petit, Bates, Dodge
Lapp, 2002; Donohue, Perry, Weinstein,
2003; McFadyen-Ketchum Dodge, 1998;
Patterson e cols., 1992; Webster-Stratton,
1998).
Uma criança exposta a padrões
de comportamentos coercivos em casa
provavelmente os reproduzirá nas relações
com colegas e professores e, terá dificul-
tado seu ingresso neste novo ambiente. Van
Lier, Muthén, van der Sar e Crijnem (2004)
esclarecem essa trajetória, descrevendo o
impacto das relações com pares e profes-
sores para a manifestação e manutenção
dos comportamentos disruptivos. Os au-
tores mencionam dois aspectos importantes
do contexto social infantil. Primeiramente,
reportam o fato de crianças pequenas, in-
gressantes no ambiente escolar, já serem ca-
pazes de reconhecer os diferentes níveis de
comportamento disruptivo de seus colegas.
Em segundo lugar, mencionam o quanto
essas crianças podem reforçar as condutas
externalizantes de seus colegas pelo fato de
recuarem perante o comportamento agres-
sivo ou permitirem que ele aconteça. Desse
modo, a conduta disruptiva faz crer que é
possível obter conseqüências positivas com
a coerção. Além disso, à medida que as cri-
anças com conduta externalizante crescem,
são reconhecidas pelos pares como des-
viantes e, por isso mesmo, rejeitadas no
grupo, o que lhes restringe as possibilidades
de permanecer em um contexto reforçador
de comportamentos pró-sociais. Sua inter-
ação com os professores, da mesma forma,
é caracterizada cada vez mais pela desobe-
Revista Psicolog 13
Figura 3. Modelos de percurso dos preditores contextuais de distúrbios de conduta em tenra idade
(Adaptado de Webster-Stratton Taylor, 2001).
diência, coerção e um círculo vicioso de
correções e punições, prejudiciais ao de-
senvolvimento da competência social e ao
próprio desempenho na escola.
Dessa forma, tem se observado
a realização de vários estudos preven-
tivos pautados por uma intervenção clínica
abrangente. Em nível nacional, destacam-
se os trabalhos empreendidos por Melo
(1999, 2003) na comunidade. Voltada ini-
cialmente na orientação de pais e atendi-
mento às crianças, a intervenção adquiriu
um caráter multifocal, com a introdução de
um programa de desenvolvimento de habil-
idades sociais em sala de aula, beneficiando
as crianças, seus pares, pais e professores.
O estudo é descrito no presente artigo, ilus-
trando esta nova perspectiva de intervenção
clínica.
Deve-se ressaltar a preocupação
das pesquisas atuais em prevenção dos
transtornos de conduta no que diz respeito
ao local de intervenção, buscando-se cada
vez mais a inserção do psicólogo na comu-
nidade. Esta tendência vem ao encontro dos
estudos de Biglan, Metzler e Ary (1994) e
Biglan e Smolkowski (2002).
Assim, predomina a compreensão
de que há necessidade de prevenir e/ou re-
duzir o comportamento agressivo, inter-
vindo o quanto antes, preferencialmente
no ambiente em que a criança está in-
serida e envolvendo o máximo de partici-
pação daqueles que a cercam. Quando o
comportamento da criança torna-se mais
maleável é benéfico e, portanto, interrompe
a progressão dos comportamentos de con-
duta na primeira infância e não permite o
desenvolvimento da delinqüência e falha
acadêmica em anos futuros. Não é de se
estranhar, portanto, que dos 12 estudos de
Webster Stratton e Taylor (2001) a faixa
etária de destino do programa em 3/12 seja
de crianças com menos de oito anos com-
pletos e que o limite inferior da faixa de
crianças envolvidas em todos os progra-
mas abranja crianças com menos de oito
anos, um quarto contemple crianças com
menos de oito anos completos e todos eles
envolvam crianças a partir dessa idade. No
que diz respeito ao envolvimento de out-
ros agentes importantes para o desenvolvi-
mento infantil, em 26 estudos relatados, 12
envolvem somente os pais, enquanto 14 in-
cluem também pares e professores.
Revista Psicolog 14
Um modelo de intervenção preventiva
multifocal, realizado na comunidade com
a participação de crianças, pais, pares e
professores
A proposição que embasa a inter-
venção, que aqui ilustra o presente trabalho,
se aproxima do terceiro modelo na medida
em que está inserida no ambiente social da
escola, já que reconhecidamente é onde a
criança põe em prática os comportamentos
aprendidos no âmbito familiar, além de ser
um local que favorece mais interações soci-
ais e, por conseguinte, a ampliação de seu
repertório comportamental. As crianças in-
seridas no estudo faziam parte de grupo de
risco, apresentando já algumas dificuldades
tanto no que se refere aos comportamentos
externalizantes (p.ex. conduta agressiva)
como aos comportamentos internalizantes
(p.ex. retraimento social) e ao desempenho
acadêmico insuficiente.
Durante um ano, participaram da
intervenção 26 crianças (12 meninas e
14 meninos), entre sete e oito anos de
idade, divididas em dois grupos: o grupo
de atendimento infantil, incluindo aquelas
indicadas pela escola para o treinamento
de habilidades sociais e o grupo de val-
idação social, contemplando aquelas que
não apresentavam dificuldades interativas.
Além das crianças, foram envolvidas no tra-
balho clínico suas mães, suas professoras
e seus colegas de classe, integrando mais
de 240 pessoas. Note-se, nesse sentido, a
abrangência clínica e social da intervenção,
pois embora voltada para o atendimento de
determinadas crianças, não se restringiu a
este grupo, podendo beneficiar amplamente
outros membros do mesmo ambiente.
Sobre as intervenções
Professoras. 39 encontros foram realizados
com as professoras durante o ano letivo, a
fim de trabalhar suas expectativas, orientá-
las em relação a dificuldades de manejo da
turma, treiná-las para a aplicação de ativi-
dades voltadas à melhoria do clima em sala
de aula e ao desenvolvimento da competên-
cia social da classe. As atividades pro-
postas, inseridas no Programa de Educação
Social e Afetiva, elaborado por Trianes e
Muñoz (1994), enfocavam a integração dos
alunos, o aprendizado da cooperação e res-
olução de conflitos.
Propiciou-se um espaço de reflexão, onde
as professoras puderam avaliar a quali-
dade do relacionamento que estabeleciam
com seus alunos, analisando funcional-
mente suas condutas em sala de aula, in-
cluindo seus sentimentos em relação às cri-
anças. As discussões motivaram o inter-
esse pelo desenvolvimento infantil, sensibi-
lizando para a criatividade e a empatia na
interação com os alunos.
Crianças. Foram realizadas 22 sessões de
atendimento psicológico, em grupo, com
as crianças indicadas para atendimento
por suas professoras, pautadas no desen-
volvimento de habilidades sociais (Del
Prette Del Prette, 1999) e solução de
problemas (Kazdin, 1995). A ludoterapia
cognitiva-comportamental infantil permitiu
às crianças a aquisição de comportamen-
tos essenciais na relação com o outro, tais
como a auto-observação, a identificação e
expressão de comportamentos encobertos,
a identificação de situações antecedentes,
conseqüentes e de respostas alternativas.
Além disso, puderam vivenciar situações
focadas no aprendizado de interações onde
o modo de expressão do comportamento é
fundamental para assegurar a qualidade das
relações, tais como dar e receber feedback,
críticas e elogios.
Pares. Todos os colegas dos alunos
indicados para intervenção participaram
das atividades do programa de educação
Revista Psicolog 15
sócio-afetiva, aplicadas em sala de aula.
Tais atividades possibilitaram maior en-
trosamento da turma, dado o trabalho de
engajamento da classe na aquisição de um
repertório comportamental mais flexível e
tolerante. Como as atividades eram real-
izadas em grupo, enfocando as dificuldades
relativas às habilidades sociais, todos pud-
eram usufruir da intervenção, no sentido de
refletir, discutir e adequar os comportamen-
tos para o convívio com as diferenças.
Orientação parental.Durante 12
sessões de atendimento, as mães foram en-
sinadas a observar o comportamento de
suas crianças, aprendendo a discriminar
aqueles que deveriam ser reforçados pos-
itivamente. Assim como o espaço ofere-
cido para as professoras, o trabalho de ori-
entação parental mostrou-se fértil para o
aprendizado de comportamentos mais ad-
equados na relação com os filhos, sendo
trabalhadas dificuldades no sentido de
fornecer instruções claras e consistentes,
evitar a rotulação da criança e aumentar a
freqüência da utilização de punição neg-
ativa (p. ex. retirar privilégios) no lugar
dos castigos físicos, bastante comuns no
grupo. As mães puderam refletir sobre o
modo de criação dos filhos, verificando o
nível de empatia mantido com suas crianças
e identificando os fatores que dificultavam
a manutenção de uma conduta de aceitação
e valorização no dia-a-dia. Desse modo, a
intervenção propiciou-lhes rever as inter-
ações inadequadas presentes no convívio
diário com suas crianças, bem como a dis-
criminar as possibilidades de promoção e
estimulação da competência social, asse-
gurando condições para um relacionamento
mais saudável e construtivo com seus filhos.
O estudo em questão evidencia re-
sultados favoráveis (especificados em Melo
e Silvares, 2003) demonstrando que, de um
modo geral, os comportamentos exibidos
pelas crianças submetidas a atendimento
psicológico passaram a favorecer sua maior
integração na dinâmica da sala de aula,
visto que interagiam mais do que antes com
suas professoras, sendo mais notadas por
estas. Mostraram-se também mais concen-
tradas nas atividades acadêmicas propostas,
ficando mais tempo em suas carteiras, re-
alizando suas tarefas e perturbando menos
os demais. Nas relações com os colegas,
as crianças também passaram a manifes-
tar mais comportamentos pró-sociais como
cooperação e receptividade, ao tempo em
que também apresentaram menos compor-
tamentos agressivos, hostis ou de intimi-
dação.
Todos estes ganhos foram corrobo-
rados pela percepção dos pais e professores
das crianças, refletindo o aumento de sua
competência social. Se antes do atendi-
mento todas as crianças apresentavam dé-
ficits em sua competência social e no de-
sempenho escolar, esta situação modifi-
cou significativamente ao final da inter-
venção. Ainda foi possível verificar os gan-
hos obtidos na intervenção em termos de
inclusão entre os pares, verificando-se que
o percentual de crianças rejeitadas diminuiu
mais de 30% após a intervenção.
Todos estes resultados demonstram
a eficiência do modelo de intervenção mul-
tifocal no alcance dos objetivos propostos,
promovendo melhoras não apenas na es-
fera familiar, mas também escolar, asse-
gurando interações mais positivas destas
crianças com seus pares e professores. A
repercussão desses ganhos torna-se ainda
maior quando traduzido no aprendizado
obtido por todos os que participaram do
trabalho clínico. Na prática, mães, profes-
sores, crianças e pares aprenderam novas
formas de ler o ambiente, bem como al-
ternativas de conduta mais flexíveis e tol-
erantes, de modo a apresentar respostas
Revista Psicolog 16
mais saudáveis em seus relacionamentos.
Além disso, este modelo de intervenção
forneceu uma nova forma de intervenção
psicológica, rompendo os limites impostos
pela clínica tradicional – restrita no máximo
ao ambiente familiar – na medida em que
promoveu o envolvimento efetivo da escola
que sabidamente tem um destacado papel
no desenvolvimento infantil.
Diante de tais condições, deu-se um
passo além do estudo multifocal, ao im-
plantar, posteriormente, uma pesquisa de
disseminação (Melo, 2006), indo ao en-
contro da proposição de Dumka e cols.
(1995) de que todos os programas preven-
tivos, uma vez testados e demonstrada sua
eficácia, deveriam ser disseminados. Foi,
assim, executado um programa de treina-
mento no qual psicólogos da área e profes-
sores do ensino fundamental puderam ter
acesso à forma de atuação implementada
por Melo (2003), contribuindo assim para
ampliar as possibilidades de intervenções
fora do consultório, atendendo a necessi-
dades da comunidade (Biglan Smolkowski,
2002). Este foi o objetivo do trabalho dis-
seminativo (Melo, 2006), voltado ao treina-
mento de psicólogos para atuar no ambi-
ente escolar, promovendo competências em
crianças, aprimorando as habilidades de
manejo das professoras e rompendo o ciclo
de desenvolvimento dos comportamentos
anti-sociais.
Os resultados foram visíveis, par-
ticularmente no ambiente escolar. Além
de melhorar o clima em sala de aula,
observaram-se mudanças positivas na per-
cepção de professores, apontando para re-
lações mais flexíveis com os alunos. Mu-
danças significativas não foram encon-
tradas na percepção de pais e pares, demon-
strando que somente uma intervenção mais
abrangente, envolvendo o atendimento psi-
cológico às crianças com dificuldades inter-
ativas e a orientação parental, poderia trazer
modificações mais profundas.
Salvaguardada a relevância dos re-
sultados alcançados por Melo (2003 e
2006), há de se destacar o percurso dessas
intervenções que exemplificam a tendên-
cia dos estudos preventivos provenientes
da psicologia clínica e realizados na comu-
nidade brasileira; tendência essa seguida já
há algumas décadas por pesquisadores in-
ternacionais.
Do exposto, pode-se dizer, em sín-
tese, que a ampliação do tratamento dos
problemas de conduta na infância envol-
vendo pais primeiramente se deu pela in-
clusão de estratégias voltadas para o ensino
às famílias do manejo do conflito conjugal,
associado ao movimento da inclusão das
próprias crianças no tratamento, além dos
seus pais. Ainda na busca de ampliação do
alcance das estratégias para melhorias psi-
cológicas dessas crianças, com freqüência,
elas passaram a se voltar para a população
infantil cada vez mais jovem, com a partic-
ipação de seus pares e seus professores.
Diante de tais argumentos, entende-
se que o alcance da intervenção clínica
tradicional se mostra restrita, mesmo
quando inclui a orientação parental, ao
se pensar em resultados em nível de pre-
venção. O fato torna imperiosa a necessi-
dade de ampliar o enfoque do tratamento
psicoterápico, pois quanto maior a partici-
pação dos agentes significativos para a cri-
ança nessa intervenção, maiores as possibil-
idades de sucesso da atuação do psicólogo.
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Revista Psicolog 21
O problema da “justificação racional de valores” na filosofia
moral skinneriana
Alexandre Dittrich1
1UFPR
Curitiba - PR - Brasil.
aledittrich@ufpr.br
Resumo. Este artigo visa: 1) abordar, de um ponto de vista behaviorista radi-
cal, o problema da “justificação racional de valores”; 2) a partir da abordagem
desse problema, oferecer algumas sugestões sobre como os behavioristas rad-
icais podem se posicionar diante de debates éticos e políticos. Argumenta-se
que, de um ponto de vista behaviorista radical, valores não podem ser justifi-
cados, pelo menos em termos lógicos: a única justificativa possível remete à
história de seleção do comportamento por suas conseqüências de quem defende
certos valores. A despeito disso, argumenta-se que debates éticos e políticos
não devem ser meramentedesprezados. Ainda que isso não esgote tais debates,
cabe àqueles que deles tomam parte – e em especial, aos behavioristas radi-
cais – apontar tão claramente quanto possível os objetivos que buscam produzir.
Palavras-chave: behaviorismo radical; ética; filosofia moral; B. F. Skinner
Introdução
Desde Sócrates, a filosofia moral
entende como sendo uma de suas principais
tarefas justificar racionalmente a adoção de
valores, sejam eles quais forem. Este texto
tem dois objetivos: 1) abordar, de um ponto
de vista behaviorista radical, o problema da
“justificação racional de valores”; 2) a par-
tir da abordagem desse problema, oferecer
algumas sugestões sobre como os behavior-
istas radicais podem se posicionar diante de
debates éticos e políticos.
Tratemos do primeiro problema. Eis
a pergunta que queremos responder: é pos-
sível, de um ponto de vista behaviorista rad-
ical, justificar racionalmente os valores que
adotamos (quaisquer que sejam)? Comece-
mos apontando alguns pressupostos via de
regra sustentados pela filosofia moral tradi-
cional: 1) valores fazem parte de um uni-
verso mental à parte do comportamento (e,
ainda mais, determinam o comportamento);
2) valores são escolhidos por agentes livres
para adotá-los ou rejeitá-los; 3) a justifi-
cação de valores depende de argumentação
lógica.
Não é difícil perceber que o behav-
iorismo radical discorda frontalmente de
todas essas afirmações. Em primeiro lugar,
para o behaviorismo radical, valores não es-
tão em nossas mentes. O que chamamos de
valores são conseqüências do nosso com-
portamento: são os objetos ou eventos que
chamamos de “bons” ou “ruins” – e, de
acordo com Skinner, “fazer um julgamento
de valor chamando algo de bom ou ruim
é classificá-lo em termos de seus efeitos
reforçadores” (1971b, p. 105). Em se-
gundo lugar, o behaviorismo radical ques-
tiona a autonomia normalmente atribuída
aos agentes morais (Skinner, 1971b).
Revista Psicolog 22
Resta-nos a terceira questão: é pos-
sível justificar valores, sejam eles quais
forem? “Justificar”, em sua definição tradi-
cional, é dar razões para algo. Se afirmo
que a felicidade deveria ser o principal ob-
jetivo das ações humanas, minha afirmação
não basta – seria preciso oferecer razões
que a apóiem.
Lembremo-nos que valores são
conseqüências de nosso comportamento.
Poderíamos oferecer algum subsídio que
permita-nos afirmar, de forma inequívoca,
que uma conseqüência (ou conjunto de con-
seqüências) que buscamos produzir é mel-
hor do que uma outra conseqüência (ou
conjunto de conseqüências) qualquer? Da
perspectiva behaviorista radical, a resposta
é não. Não há nenhuma forma de justificar
a adoção de um valor – pelo menos não de
modo que nos permita afirmar que aquele
valor é o único que devemos promover, ou
que ele é indiscutivelmente melhor do que
qualquer outro valor. A “justificação” fi-
nal para a adoção de um valor é sempre de
ordem histórica: se eu persigo ou defendo
este ou aquele valor (ou conjunto de val-
ores), faço isso em função de minha história
comportamental.
A sobrevivência das culturas figura,
na obra de Skinner (1953/1965; 1971b),
como um valor fundamental: um objetivo
que deve ser promovido em detrimento de
qualquer outro, (ainda que possa ser conju-
gado a outros valores)1 Afirmar que Skinner
promove a sobrevivência das culturas como
valor fundamental equivale tão-somente a
afirmar que ele busca persuadir sua audiên-
cia a comportar-se de formas que, provavel-
mente, contribuirão para tal conseqüên-
cia. Contudo, se perguntarmos a Skinner
como ele justifica a adoção deste valor,
ele responderá da seguinte forma: “Não
me pergunte por que eu quero que a hu-
manidade sobreviva. Eu posso lhe dizer o
porquê apenas no sentido em que o fisiól-
ogo pode lhe dizer porque eu quero respi-
rar” (1956/1972b, p. 36).
Essa passagem pode ser interpre-
tada da seguinte forma: “Não pergunte
a mim, enquanto suposto agente moral
autônomo, por que eu quero que a hu-
manidade sobreviva. Eu posso responder
o porquê apenas recorrendo à história de
seleção de meu próprio comportamento por
suas conseqüências – assim como o fisiól-
ogo recorreria à história seletiva de minha
espécie pra explicar porque eu, enquanto
membro da espécie, quero respirar”. Dito
de outra forma: não há nada além de nossa
história (filogenética, ontogenética e cul-
tural) que permita-nos justificar os valores
que defendemos. Que parte dos membros
de uma cultura tenha seu comportamento
reforçado (como Skinner) por eventos que
indiquem possível aumento nas chances de
sobrevivência dessa cultura é um resultado
das próprias contingências atuantes no ter-
ceiro nível seletivo. Se essas contingên-
cias favorecem culturas que promovem sua
própria sobrevivência, é previsível que o
planejamento explícito de práticas que a
promovam (por membros da cultura que
“levam o futuro em consideração”) tam-
bém seja favorecido, visto tornar a cultura
mais eficiente (isto é, mais apta a sobre-
viver)2 Presumivelmente, é isso que leva
Skinner a concluir que “a sobrevivência não
é um critério o qual nós sejamos livres para
aceitar ou rejeitar” (Skinner, 1955/1972a,
1Desenvolvemos este tema em trabalhos anteriores (Dittrich, 2003; 2004a; 2004b; Dittrich Abib, 2004; Dittrich, 2006). O último
trabalho destaca algumas dificuldades decorrentes da subordinação de outros valores (secundários) à sobrevivência das culturas.
2Contudo, a “intencionalidade” não é uma característica necessária das práticas culturais. Mesmo a existência de práticas “inten-
cionais” explica-se seletivamente: “As pessoas não observam determinadas práticas para que o grupo tenha maior probabilidade de
sobreviver; elas as observam porque grupos que induziram seus membros a fazê-lo sobreviveram e transmitiram tais práticas” (Skinner,
1981/1984a, p. 479).
Revista Psicolog 23
p. 22), e que “quer gostemos disso ou não,
a sobrevivência é o critério final” (Skinner,
1956/1972b, p. 36). Se práticas culturais
são, de fato, selecionadas por seu valor de
sobrevivência, pouco importa se consider-
amos a sobrevivência um valor discutível:
culturas sobreviverão ou perecerão, a de-
speito de qualquer discussão que possamos
empreender.
Pouco depois, porém, Skinner
afirma: “Podemos, no entanto, apontar
várias razões pelas quais as pessoas dev-
eriam estar, agora, preocupadas com o bem
de toda a humanidade. Os grandes proble-
mas do mundo são agora globais. Super-
população, o esgotamento de recursos, a
poluição do ambiente e a possibilidade de
um holocausto nuclear – estas são as conse-
qüências não-tão-remotas de nossos cursos
de ação atuais” (1971b, pp. 137-138).
A única “boa razão” para que al-
guém promova a sobrevivência de sua cul-
tura (ou da humanidade), ao que parece, é a
própria perspectiva de que sua cultura (ou a
humanidade) sobreviva. Essa não é, na ver-
dade, uma “boa razão” – no sentido de que
não é uma razão suficientemente persua-
siva, como admite Skinner: “Apontar para
conseqüências não é suficiente. Precisamos
arranjar contingências sob as quais as con-
seqüências tenham um efeito. Como podem
as culturas do mundo fazer com que essas
possibilidades aterrorizantes afetem o com-
portamento de seus membros?” (1971b, p.
138). O planejamento cultural proposto por
Skinner refere-se, exatamente, ao controle
de práticas culturais (através das contingên-
cias de reforço que as integram) orientado
por previsões sobre seu possível valor de
sobrevivência para as culturas. Se a simples
menção da possibilidade do fim de todas as
culturas não é suficiente para que façamos
algo a respeito, o planejamento cultural é
absolutamente necessário.
Permanece, contudo, o fato de que
não pode haver, pelo menos em termos lógi-
cos, qualquer justificativa absoluta para a
adoção da sobrevivência das culturas en-
quanto valor. Em alguns momentos, Skin-
ner torna clara sua rejeição a este tipo de
justificativa: “Não podemos responder a
tais questões [sobre valores] apontando para
absolutos. Não há verdade absoluta em jul-
gamentos de valor. Ninguém possui esse
tipo de verdade ou poderesponder questões
apelando a ela” (Skinner, 1971a, p. 547);
“Seria um erro . . . tentar justificá-las [práti-
cas culturais com valor de sobrevivência]
em qualquer sentido absoluto. Não há nada
fundamentalmente certo na sobrevivência
de uma cultura, como não há nada funda-
mentalmente certo no conjunto de carac-
terísticas que define uma espécie” (p. 550).
Portanto, à questão que nos dirige a
filosofia moral tradicional (é possível justi-
ficar valores?), a resposta do Skinner é neg-
ativa – a não ser que aceitemos a história se-
letiva daquele que defende certo valor como
uma boa justificativa. Notemos, porém, que
essa história não nos permite dizer que um
valor é melhor do que outro, pelo simples
fato de que não existem histórias comporta-
mentais melhores ou piores – existem ape-
nas histórias. O que eu valorizo pode ser
diferente do que aquilo que você valoriza,
mas nenhum de nós está fundamentalmente
certo ou errado – nós simplesmente somos
pessoas diferentes, com histórias diferentes.
É importante sublinhar que o prob-
lema de saber quais valores (ou quais con-
seqüências) são mais ou menos desejáveis
(melhores ou piores) não deve ser con-
fundido com outro problema, igualmente
importante: qual a tecnologia mais efe-
tiva para promover tais conseqüências?
Mesmo os filósofos morais tradicionais ad-
Revista Psicolog 24
mitem que grande parte dos problemas que
surgem em discussões éticas se refere, na
verdade, a questões empíricas (p. ex., Hare,
1997/2003, p. 61). Se duas pessoas con-
cordam quanto ao fato de que certo obje-
tivo (seja ele qual for) deve ser produzido,
o problema resume-se a saber como fazê-lo
– presumivelmente, uma questão empírica.3
Planejar práticas culturais é, obvia-
mente, um empreendimento complexo. O
planejamento cultural exige, em alguma
medida, o recurso à suposição (guess)
(Skinner, 1953/1965, p. 436; 1961/1972c,
p. 49). A ciência, com sua insistência
sobre a “observação cuidadosa, a coleta
de informação adequada e a formulação
de conclusões que contenham um mínimo
de ilusão [wishful thinking]” (1953/1965,
p. 435), parece oferecer o caminho mais
seguro para que tais suposições revelem-
se corretas. Mas nunca poderemos estar
absolutamente certos de que nossas inter-
venções produzirão as conseqüências que
planejamos.
Mesmo que pudéssemos, contudo,
ainda seria possível discordar sobre a con-
veniência de tais conseqüências. Em uma
passagem especialmente interessante de sua
obra, o filósofo alemão Carl Hempel trata
dessa questão de forma instigante:
Vamos assumir, então, que con-
frontados com uma decisão moral, pos-
samos chamar o demônio de Laplace como
consultor. Que ajuda poderemos conseguir
dele? Suponhamos que temos que escol-
her um entre diversos cursos de ação alter-
nativos possíveis, e queiramos saber qual
deles devemos tomar. O demônio poderia
então nos dizer, para cada escolha con-
templada, quais seriam suas conseqüências
para o curso futuro do universo, nos mín-
imos detalhes, não importa quão remotos
no tempo e no espaço. Mas, tendo feito
isso para cada um dos cursos de ação al-
ternativos sob consideração, a tarefa do
Demônio estaria completa; ele nos teria
dado toda a informação que uma ciência
ideal poderia nos dar sob tais circunstân-
cias. E, no entanto, ele não teria resolvido
nosso problema moral, pois isso requer
uma decisão sobre qual dos diversos con-
juntos alternativos de conseqüências ma-
peados pelo demônio é o melhor; qual deles
deveríamos produzir. E o peso da decisão
ainda cairia sobre nossos ombros. (1965,
pp. 88-89)
O argumento de Hempel, portanto,
é este: mesmo que possamos prever o curso
dos acontecimentos com absoluta precisão,
ainda assim a questão dos valores, ou de
quais conseqüências são desejáveis, per-
manecerá aberta à discussão. O problema
diz respeito, é claro, à diversidade de re-
forçadores que podem adquirir controle so-
bre o comportamento de diferentes indiví-
duos. Mas, como diz Skinner, não há nada
além da nossa história que nos permita “jus-
tificar” os valores que defendemos. Não
escolhemos aquilo que reforça nosso com-
portamento.
Diante disso, devemos, os behavior-
istas radicais, rejeitar o debate ético como
uma empreitada inútil? Pensamos que não.
Debates éticos têm seus limites, mas podem
ser produtivos. (A propósito, as alternati-
vas mais óbvias ao debate – individualismo
e agressão – não são animadoras.) Para
que isso aconteça, pelo menos um requi-
sito deve ser satisfeito: os valores (isto é,
os objetivos) de quem discute devem ser
declarados abertamente, e devem ser tão
bem definidos quanto possível. Os anal-
istas do comportamento têm, de pronto, a
3Em outra ocasião, porém (Dittrich, 2004b), discutimos o problema com mais detalhe. Especialmente quando o objetivo em
questão é a sobrevivência das culturas, saber como produzi-lo pode não ser um problema cuja resposta seja estritamente empírica.
Revista Psicolog 25
vantagem de insistir sobre a necessidade de
planejar e especificar, com a maior precisão
possível, os objetivos da suas intervenções.
Devemos, é claro, estar prontos a considerar
e a avaliar os objetivos de outras pessoas ou
grupos, mas também devemos exigir delas
que sigam nosso exemplo e tornem explíc-
itas as conseqüências que pretendem pro-
duzir.
De uma perspectiva pragmatista, ex-
por objetivos claramente é indispensável
(Hayes, 1993). Não há como avaliar a util-
idade de uma teoria ou de uma tecnologia
sem que se defina o que é “utilidade”. Algo
útil é algo que produz certas conseqüências.
Defina-se, pois, que conseqüências são es-
sas.
Isso não esgota, necessariamente,
o debate ético: a idiossincrasia dos re-
forçadores é um fato. Declarar e definir
objetivos, porém, poupa discussões impro-
dutivas e permite identificar possibilidades
de acordo e colaboração.
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Revista Psicolog 27
Colecionismo: fronteiras entre o normal e o patológico
Mónica Ferreira Gomes Aires Oliveira, Regina Christina Wielenska
Abstract. Compulsive hoarding (CH) is a behavior pattern characterized by
the cluttering of excessive amount of objects without utilitarian or economical
value, accompanied by extreme difficulty to discard those objects, with adverse
consequences to the quality of life of the affected individual. The present
article aims to: distinguish between CH and normal behaviors; present current
classifications of CH, its comorbidities and biological basis; present pharma-
cological treatment and emphasize psychological interventions proposed by
behavior and cognitive theoretical approaches for therapy.
Key-words: compulsive hoarding, compulsion, behavior therapy, cognitive ther-
apy.
Resumo. O colecionismo patológico (CP) é um padrão comportamental
caracterizado pelo acúmulo de quantidades excessivas de itens com pouco ou
nenhum valor utilitário ou material, com dificuldade para fazer o descarte
destes mesmos objetos, resultando, ao longo do tempo, prejuízo da qualidade
de vida do indivíduo. O artigo se propõe a: estabelecer a distinção entre o CP
e o comportamento de colecionar, validado socialmente; apresentar as classifi-
cações atuais do transtorno, suas comorbidades e bases biológicas; descrever
topográfica e funcionalmente o CP; apresentar as propostas terapêuticas
farmacológicas e enfatizar terapias psicológicas baseadas nos fundamentos
teóricos das abordagens comportamental e cognitiva.
Palavras-chave: colecionismo patológico, compulsão, terapia comportamental,
terapia cognitiva.
O colecionismo é considerado um
comportamento normal na infância e na
idade adulta (Greenberg, Witztum e Levy,
1990). Não raramente, encontramos adul-
tos que colecionam objetos relacionados
a temas de seu interesse (por exemplo,
miniaturas de carros de corrida, chaveiros
de times de futebol, caixas de fósforos
de hotéis e restaurantes, etc.). Crianças
guardam seus desenhos e trabalhos de arte,
armazenam objetos (como rochas, folhas,
bolinhas de gude), colecionam álbum de
figurinhas, entre outras possibilidades. São
padrões de comportamento que não prej-
udicam o funcionamento global do indi-
víduo, possuem função de entretenimento,
socialização e convívio entre pessoas com
interesses em comum.
Por outro lado, no colecionismo pa-
tológico (CP) verifica-se que a coleta, or-
denação e disposição de objetos constitu-
intes da coleção ocorrem sem que o indi-
víduo tenha claro entendimento dos mo-
tivos de seu comportamento, com pouco
ou nenhum controle sobre o comporta-
mento de colecionar. Hartl e Frost (1996)
sinalizaram a escassez da literatura acerca
do CP, a despeito de sua relevância como
fenômeno clínico. No intuito de suprir
essa lacuna e facilitar a pesquisa e inter-
venção, propuseram um modelo Cognitivo-
Comportamental do CP.
Revista Psicolog 28
Segundo o modelo de Frost e Hartl
(1996), o CP é conceitualizado como um
problema multifacetado, associado a dé-
ficits no processamento de informações,
na formação de vínculo emocional, com
esquiva comportamental, e controle por
crenças errôneas acerca da função e signifi-
cado dos objetos, fatores que influenciam os
comportamentos de armazenar e descartar.
Evidências anedóticas sugerem que crenças
sobre memória, vínculo, controle e respon-
sabilidade são especialmente importantes
no desenvolvimento e manutenção de com-
portamentos de CP.
Classificações e subtipos clínicos
Frost, Steketee e Williams (2000) subdi-
videm o colecionismo em CP de objetos,
colecionismo de animais e síndrome de
Diógenes. O CP de objetos caracteriza-
se pela emissão de comportamentos de
aquisição (comprar ou recolher/coletar), ar-
mazenamento (saving, no original) sob con-
trole de razões sentimentais, instrumentais,
intrínsecas e, por fim, comportamentos de
acumular e tentativas frustradas de organi-
zar. Este padrão comportamental complexo
é acompanhado por sentimentos de inde-
cisão, preocupação de manter o acúmulo
fora de vista, grande sofrimento e prejuí-
zos. O colecionismo de animais é o subtipo
com maior gravidade e pior prognóstico de
tratamento. A síndrome de Diógenes (SD)
foi descrita pela primeira vez na psiquiatria
em 1975 (Hanon, Pinquier, Gladdour, Said,
Mathis e Pellerin, 2004). Esta síndrome en-
volve a ocorrência simultânea de extremo
descuido pessoal, imundície doméstica e
marcante retraimento social. Considera-
se que a presença de CP uma pista útil
para formulação do diagnóstico da SD
(Montero-Odasso, Shapira, Duque, Cher-
covsky, Fernandez-Otero, Kaplan e Cam-
era, 2005).
Seedat e Stein (2002), como os de-
mais autores, também caracterizaram o CP
como o comportamento de acumular quan-
tidades excessivas de itens com pouco ou
nenhum valor utilitário ou material, com di-
ficuldade para fazer o descarte destes mes-
mos objetos, resultando, ao longo do tempo,
em inúmeros problemas para o indivíduo.
Vale notar que na língua inglesa, no
contexto psiquiátrico, denomina-se “hoard-
ing” ao comportamento patológico de acu-
mular, desorganizadamente, grande quan-
tidade objetos. Em Português não há
consenso de nomenclatura; o termo cole-
cionismo é utilizado tanto para descrever
comportamentos considerados saudáveis
quanto os comportamentos patológicos,
caracterizados por compulsão para a
aquisição e/ou armazenamento de obje-
tos sem funcionalidade aparente. Dentro
do contexto de língua inglesa, Neziroglu,
Bubrick Tobias (2004) salientam que o
comportamento de colecionar não é neces-
sariamente sinônimo de CP. Segundo eles,
os colecionadores não-patológicos geral-
mente sentem orgulho de suas posses e con-
sideram agradável mostrá-las aos demais,
enquanto que no CP ocorre o oposto. Não
raramente, os portadores sentem vergonha
de seus pertences mal armazenados, ten-
tam dissuadir as pessoas de visitarem suas
casas, buscam esconder objetos e dissimu-
lar suas compulsões.
De modo sintético, pode-se afir-
mar que o colecionismo não-patológico
envolveria a interação prazerosa com uma
classe específica de objetos cujas caracterís-
ticas físicas ou funcionais são consideradas
especiais pelos aficionados naqueles obje-
tos. Colecionar é, geralmente, um compor-
tamento socialmente reforçado.
Por sua vez, o comportamento de
Revista Psicolog 29
“hoarding”, aqui denominado como CP,
difere do colecionismo não patológico
por apresentar um aspecto compulsivo; há
pouco ou nenhum controle sobre a tendên-
cia a armazenar indiscriminadamente. O
sofrimento a médio e longo prazo com-
pete com o alívio imediato. Torna-se ex-
tremamente difícil o convívio social. O
indivíduo sofre por colecionar, e também
quando é incitado a se desfazer dos ob-
jetos que acumula compulsivamente. O
portador permanece sob a influência de
um conflito esquiva-esquiva: ao coletar e
armazenar atenua a aversividade da com-
pulsão (palavra que nomeia resumidamente
um complexo estado privado, eliciado por
contingências aversivas). Em decorrência
dos excessos comportamentais, o indivíduo
passa a ser rejeitado pelas pessoas (devido
à sujeira, bagunça, despesas, mentiras, etc.)
e permanece sob contingências aversivas de
natureza interpessoal: teria que se

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