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06_-_Julho_de_2018


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Transportes no Brasil
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J u l – 2 0 1 8
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Edição
Rotina nas estradas
A greve dos caminhoneiros trouxe prejuízos à 
sociedade, mas também mostrou a precariedade do 
trabalho desses profissionais.
Monopólio do asfalto 
Cresce a necessidade de pensarmos em 
novas alternativas para o transporte 
de cargas e passageiros no país. 
Carreira: Engenharia de Transportes
 e Logística 
A profissão que exige aptidões para a resolução de 
problemas que envolvem tráfego, mobilidade urbana 
e cadeia de suprimentos.
A paralisação do transporte rodoviário de cargas 
mostrou o quanto somos dependentes da logística 
operada sobre rodovias e funcionou como alerta de 
que soluções efetivas ainda podem estar distantes 
Editorial
Nesta edição
E x p e d i e n t e
Transportes no Brasil
Adentramos o terceiro milênio com uma predominância de rodovias, em detrimento das estradas de ferro e do escoamento de cargas por hidrovias. Atualmente, o Brasil tem mais de 1,6 milhão de quilômetros de rodovias 
e estradas, enquanto a malha ferroviária, que já foi o principal modal do território 
nacional, encolheu para 30 mil quilômetros de extensão. Quando o sistema rodoviário 
passou a se desenvolver em uma escalada incessante a partir dos anos 1950, ainda 
não havia problemas colaterais graves para nosso desenvolvimento econômico.
O Brasil Colônia tinha como malha mais importante os rios e a costa marítima. 
Fora d’água, havia trilhas limitadas pelas quais produtos diversos, incluindo a rica 
mineração, eram levados no lombo de burros ou em carroças.
No período imperial, um grande avanço tecnológico tomou conta do país: as 
ferrovias começaram a mudar a cara do Brasil com o empreendedorismo do Barão 
de Mauá, a partir de 1854. O Ciclo do Café, de meados do século XIX até início do 
século XX, exigiu uma rede de transportes rápida e muito eficiente. E isso se deu 
com a ferrovia, que passou a ser o principal meio de transporte brasileiro. 
O Ciclo do Café, porém, teve sua queda, e o tráfego de trens de carga foi 
drasticamente reduzido. Não demorou para que o presidente Washington Luís, na 
década de 1920, decidisse investir em estradas, ainda que timidamente. Foi no 
governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) que as rodovias ganharam terreno. 
O motivo: Juscelino investiu muito para que grandes fabricantes de automóveis 
se instalassem no Brasil (e para que os que já existiam incrementassem seus 
investimentos). Assim, na década de 1950, as rodovias trouxeram uma ideia de 
modernidade, enquanto as ferrovias passaram a ser consideradas “coisa do 
passado”.
Depois de cinco décadas, ainda temos um sistema de transporte 
majoritariamente rodoviário, do qual nos tornamos dependentes. Assim, surge a 
necessidade de buscar novas alternativas, como o resgate das ferrovias e até 
mesmo das hidrovias, para diversificar os meios de transporte no país.
Inspirada pela crise do combustível e pela paralisação do transporte rodoviário 
de cargas, esta edição do Leia Agora traz uma análise acerca da atual situação dos 
transportes no Brasil e nos convida a abrir uma reflexão sobre o nosso futuro. Cada 
seção faz sua abordagem sobre o tema, e, no final, temos condições de visualizar 
um panorama desse assunto tão importante. Boa leitura!
Equipe Leia Agora
Direção geral
Nicolau Arbex Sarkis
Gerente editorial
Emilia Noriko Ohno
Coord. de projetos editoriais
Marília L. dos Santos G. Ribeiro
Analista de projetos editoriais
Brunna Mayra Vieira da Conceição
Edição / Texto
Anaiza Castellani Selingardi
Bruno Freitas
Cláudio Leyria
Edilene Faria
Érica M. Bettoni Hayashibara
Thaís Inocêncio
Projeto gráfico
Willyam Gonçalves
Revisão
Ana Paula Candelária
Kemi Tanisho
Márcia de Paiva Fernandes
Diagramação
Débora Guedes
Licenciamento
Jade Cristina Bernardino
7 ROTINA NAS ESTRADAS
ENTRELINHAS
Paralisação no transporte rodoviário de cargas trouxe problemas à sociedade, 
mas evidenciou as precariedades com as quais os profissionais da área 
convivem diariamente. 
9 A REALIDADE DO TRANSPORTE BRASILEIROCONTEXTO
A dependência da malha rodoviária e a necessidade de investir em novas 
alternativas para o transporte de cargas e passageiros.
12 ENGENHARIA DE TRANSPORTES E LOGÍSTICA
ENTREVISTA
A profissão que exige aptidões para a resolução de problemas que 
envolvem tráfego, mobilidade urbana e cadeia de suprimentos.
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Meio ambiente
Educação
Internacional
Esporte
Brasil
O talento de origem africana 
conquista a Copa
No restaurante Les Ambassades, de Dacar, a 
capital do Senegal, explode uma algazarra de 
júbilo. O jogador francês Pogba acaba de marcar 
o terceiro gol contra a Croácia na final da Copa da 
Rússia. No final da disputa, muitos senegaleses 
celebram como se uma equipe africana tivesse 
conquistado a vitória. E o fato é que praticamente 
foi: 14 dos 24 jogadores da seleção francesa têm 
sua origem familiar neste continente, quase todos 
filhos de emigrantes chegados à França. 
16 jul. 2018 – El País
Estudantes do Fies terão até 18 
meses para quitar dívida com escolas 
Os estudantes beneficiados pelo Fundo de 
Financiamento Estudantil (Fies) que estiverem devendo 
às instituições de ensino nas quais estão matriculados 
poderão negociar o parcelamento da dívida em até 
18 meses, de acordo com resolução publicada em 
13 de junho pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento 
da Educação (FNDE), no Diário Oficial da União. 
Segundo o FNDE, até o ano passado era preciso estar 
quite para fazer a renovação do contrato do Fies, agora 
basta que o estudante faça uma negociação do 
pagamento antes da renovação.
13 jun. 2018 – Agência Brasil
Evento internacional discute no Rio 
economia da bicicleta 
Interessados em ciclismo de todo o mundo estão 
reunidos no Velo-City, fórum que pela primeira vez 
acontece na América Latina, com uma pauta sobre a 
bicicleta e suas conexões com educação, transporte, 
turismo, lazer, cultura, inovação, sustentabilidade e 
políticas públicas. A indústria empregou mais de 7 mil 
pessoas em 2016 na fabricação de bicicletas, peças e 
componentes diversos, em 296 estabelecimentos em 
todo o país. Em 2006, essa indústria era responsável 
por pouco mais de 4 mil postos de trabalho.
13 jun. 2018 – Agência Brasil
Kim Jong-un diz que “mundo verá 
grande mudança”
Coreia do Norte e Estados Unidos decidiram 
deixar o passado para trás, e “o mundo verá uma 
grande mudança”, segundo o líder norte-coreano 
Kim Jong-un, que em 12 de junho assinou uma 
declaração ao lado do presidente dos EUA, Donald 
Trump. Em um dos quatro itens do documento, Kim 
se compromete a trabalhar pela desnuclearização 
completa da península coreana, reafirmando o que 
foi determinado pela Declaração de Panmunjon, 
assinada em 27 de abril de 2018 pelas duas Coreias. 
O esperado e histórico encontro de Donald Trump 
e Kim Jong-un aconteceu em Singapura.
11 jun. 2018 – G1 
Antártida perde 2,7 trilhões de 
toneladas de gelo em 25 anos
A Antártida está assistindo a um derretimento 
acelerado. Segundo imagens de satélites que 
monitoram o continente gelado, ele está perdendo 
200 bilhões de toneladas de gelo por ano. O 
efeito imediato desse derretimento para o meio 
ambiente é o aumento global do nível do mar em 
aproximadamente 0,6 milímetros anuais – um 
número três vezes maior se comparado com os 
dados de 2012. Cientistas fizeram um levantamento 
da massa do manto de gelo antártico no período de 
1992 a 2017. As informações terão de ser levadas 
em consideração pelos governos para proteger as 
comunidades costeiras de áreas de baixa altitude.
14 jun. 2018 – BBC
Doze meninos e técnico de futebol 
são retirados de caverna na Tailândia
Os 12 meninos de um time de futebol e o técnico 
deles foram retirados da caverna Tham Luang, no 
norte da Tailândia, onde estavam presos desde 23 
de junho. Na terça-feira (10), foram resgatados os 
últimos quatro meninos e o técnico. O terceiro e 
último dia de operação foi o mais desafiador porque 
choviae havia mais pessoas a serem resgatadas. 
Os garotos, que têm entre 11 e 16 anos, e o técnico 
ficaram nove dias sem comer até serem encontrados 
por dois mergulhadores ingleses.
10 jul. 2018 – G1
3
Onde a gasolina é mais cara no mundo?
Preço por litro
Hong Kong: R$ 7,731o
Islândia: R$ 7,70
Noruega: R$ 7,44
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Holanda: R$ 7,114o
Dinamarca: R$ 7,045o
*O Brasil ocupa a 91a posição no ranking mundial, com 
um preço médio de R$ 4,30 por litro de gasolina.
Fonte: <www.globalpetrolprices.com/gasoline_prices/>. 
Acesso em: 10 jul. 2018.
*Todas as notícias foram adaptadas e todos os sites foram acessados em 16 jul. 2018.
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Greve dos caminhoneiros custará 
R$ 15 bilhões para a economia 
Os dez dias de greve dos caminhoneiros custarão 
R$ 15 bilhões para a economia, o equivalente a 0,2% 
do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas 
produzidas no país), informou o Ministério da Fazenda. 
De acordo com a pasta, o ministro Eduardo Guardia 
repassou a estimativa dia 11 de junho em reunião com 
investidores em São Paulo. Por causa da paralisação, 
a previsão oficial de 2,5% de crescimento do PIB para 
este ano poderá ser revista para baixo. O número só 
será divulgado no fim deste mês, e o ministro não 
informou mais detalhes.
13 jun. 2018 – Agência Brasil
Pesquisa diz que 76% dos paulistanos 
aceitam restringir uso de carros
A maior parte da população da cidade de São Paulo, 
76%, apoia a adoção de medidas para restringir a 
circulação de veículos e diminuir a poluição do ar na 
capital, segundo pesquisa divulgada em 13 de junho 
pela Rede Nossa São Paulo. O estudo encomendado 
ao Ibope pela organização não governamental ouviu 
800 pessoas de todas as regiões da cidade em abril. 
Entre os favoráveis a essas ações, 30% acreditam que 
a inspeção veicular, verificando os níveis de emissões 
de poluentes dos automóveis, é a melhor opção.
13 jun. 2018 – Agência Brasil
Apicultor faz etanol a partir de mel e 
dribla crise dos combustíveis
O apicultor Luiz Jordans Ramalho Alves, de Vitória 
da Conquista (BA), é autossuficiente em etanol 
desde 2015, quando, por insistência em aproveitar 
todo o descarte do mel, acabou descobrindo 
que era possível obter o combustível a partir do 
produto. “Fiz um teste com meu carro e funcionou”, 
disse Jordans. Ele possui um entreposto por onde 
passam cerca de 10 toneladas de mel por mês. Por 
semana, ele produz cerca de 50 litros de etanol. 
Durante a greve dos caminhoneiros, quando não 
havia combustível na maioria dos postos, Jordans 
“ostentava” 200 litros de etanol de mel em casa.
5 jun. 2018 – BBC
Meio ambiente
Educação
Internacional
Esporte
Brasil
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Preço médio dos combustíveis – Brasil (2018)
De janeiro a junho, o preço médio da gasolina aumentou 9,5%; o do diesel
chegou a variar 7,5% de janeiro a maio.
R$ 0,00
JAN FEV MAR ABR MAIO JUN
DIESELGASOLINAETANOL
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Fonte: <http://anp.gov.br/preco/>. 
Acesso em: 10 jul. 2018.
Iconic Parisian Bistros Are Under Threat 
Alain Fontaine, 60, who worked in bistros all his life before opening Le Mesturet in 2003, is leading about 30 fellow 
owners in a campaign this year. They want UNESCO, the U.N.’s culture agency, to give bistros and terraces “intangible 
cultural heritage” status. In September, they will hand their proposal to France’s Minister for Culture.
11 jul. 2018 – Time
Al menos 75 muertos y 192 desaparecidos 
por el volcán de Fuego en Guatemala
Las brigadas de rescate de Guatemala continúan la búsqueda de desaparecidos tras la erupción del volcán de 
Fuego, que registra ahora explosiones moderadas, mientras las autoridades han confirmado 75 muertos y el 
Gobierno ha anunciado un plan de reconstrucción de la zona de la catástrofe.
[...]
Entre las muertes confirmadas está la de un niño que fue ingresado en el Hospital General 
San Juan de Dios, en la capital.
6 jun. 2018 – Tribuna de Canarias 
GRAN CANÁRIA
Tribuna de Canarias
NEW YORK
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Duas das principais instituições culturais de São Paulo abrem espaço, em iniciativa 
inédita, para a exposição Histórias afro-atlânticas. O Museu de Arte de São Paulo 
Assis Chateaubriand (Masp) e o Instituto Tomie Ohtake apresentam uma seleção 
de 450 trabalhos de 214 artistas, do século 16 ao 21, sobre os fl uxos de pessoas 
entre a África, as Américas, o Caribe e a Europa. A exposição coletiva Histórias 
afro-atlânticas é um desdobramento da exposição Histórias mestiças, realizada em 
2014 no Instituto Tomie Ohtake.
5 jul. 2018 – Agência Brasil
// IMAGEM EM FOCO
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ENTRELINHAS
Rotina nas estradas
Paralisação no transporte rodoviário de cargas trouxe problemas à sociedade, mas evidenciou as 
precariedades com as quais os profissionais da área convivem diariamente 
Em postos de combustível, longas filas, que 
chegavam a congestionar ruas e avenidas, e motoristas 
dispostos a esperar horas para abastecer nos que 
dispunham de gasolina e álcool – apesar de preços 
muitas vezes exorbitantes. Em alguns supermercados, 
faltaram produtos, e houve quem decidisse racionar a 
venda. [...] 
Hospitais privados e filantrópicos de Santa Catarina 
cancelaram cirurgias eletivas. 
“Desabastecimento atinge de mercado a posto de combustível com 
greve”. Folha de S. Paulo, 24 maio 2018. Disponível em: 
<www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/05/desabastecimento-atinge-
de-mercado-a-posto-de-combustivel-com-greve.shtml>. 
Acesso em: 14 jun. 2018. 
Para garantir a redução de R$ 0,46 no litro do 
óleo diesel nas refinarias, o governo retirou recursos de 
áreas sensíveis como a fiscalização de trabalho escravo 
e trabalho infantil, programa Mais Médicos, verba de 
policiamento e até do Sistema Nacional de Transplante. 
Áreas sociais e programas ligados à Educação e ao 
Meio Ambiente também serão afetadas pelos cortes, 
que somam R$ 9,5 bilhões. [...]
Patrik Camporez; Eduardo Bresciani; Bruno Góes. “Para baixar diesel, 
governo corta verba de programas de transplantes e de combate ao 
trabalho escravo”. O Globo, 31 maio 2018. Disponível em: <https://
oglobo.globo.com/economia/para-baixar-diesel-governo-corta-
verba-de-programas-de-transplantes-de-combate-ao-trabalho-
escravo-22736291>. Acesso em: 14 jun. 2018.
Para garantir a redução de R$ 0,46 no litro do Para garantir a redução de R$ 0,46 no litro do 
óleo diesel nas refinarias, o governo retirou recursos de óleo diesel nas refinarias, o governo retirou recursos de 
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chegavam a congestionar ruas e avenidas, e motoristas chegavam a congestionar ruas e avenidas, e motoristas 
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Custo do combustível
Valor do frete
Assaltos e roubos
Riscos de acidentes
Custo do pedágio
Infraestrutura rodoviária
Fadiga e estresse
Baixa demanda de cargas
Autônomos (%) Empregados (%)
Horas trabalhadas por dia, em média
Principais problemas da pro�ssão
Imagem que as pessoas têm dos 
caminhoneiros, segundo eles
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Total de caminhoneiros (%)
9 a 10 11 a 12 13 a 14 15 a 16 + 17 horas
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Irresponsáveis
Imprudentes
Usuário de drogas
Pessoas sem instrução
Importantes para a economia
Solidários na estrada
Comprometidos com a pro�ssão
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Riscos de acidentes
Custo do pedágio
Infraestrutura rodoviária
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Baixa demanda de cargas
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Horas trabalhadas por dia, em média
Principais problemas da pro�ssão
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Importantes para a economia
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Custo do combustível
Valor do frete
Assaltos e roubos
Riscos de acidentes
Custo do pedágio
Infraestrutura rodoviária
Fadiga e estresse
Baixa demanda de cargas
Autônomos (%) Empregados (%)
Horas trabalhadas por dia, em média
Principais problemas da pro�ssão
Imagem que as pessoas têm dos 
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Total de caminhoneiros (%)
9 a 10 11 a 12 13 a 14 15 a 16 + 17 horas
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Usuário de drogas
Pessoas sem instrução
Importantes para a economia
Solidários na estrada
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Responsáveis
De pouco valor
Perfil dos caminhoneiros no Brasil
Fonte: Confederação Nacional do Transporte. Pesquisa CNT de perfil dos caminhoneiros 2016. Brasília: CNT, 2016. Disponível em: <http://
cms.cnt.org.br/Imagens%20CNT/PDFs%20CNT/Pesquisa%20de%20Perfil%20dos%20Caminhoneiros/Pesquisa_CNT_de_Perfil_dos_
Caminhoneiros_2016_Completo.pdf>. Acesso em: 15 jun. 2018.
8
ENTRELINHAS
A N Á L I S E
No primeiro semestre deste ano, durante dez dias, o Brasil parou. No ápice da crise, não havia combustível para abastecer os veículos, os alimentos foram 
impedidos de chegar às prateleiras dos supermercados e 
os hospitais deixaram de receber medicamentos e outros 
insumos necessários para tratar os pacientes. Por outro lado, 
a circulação de mensagens estava a todo vapor. A greve 
dos caminhoneiros, que teve início no dia 21 de maio, foi 
organizada pelo WhatsApp e, segundo Yasodara Córdova, 
pesquisadora da Escola de Governo de Harvard, nos Estados 
Unidos, pode ser considerada a maior mobilização mundial já 
feita por meio desse aplicativo de mensagens instantâneas. 
A greve da categoria também atingiu outro recorde: 
o de maior paralisação já realizada na história do Brasil. 
Regionalmente, em termos de duração, a maior paralisação 
de caminhoneiros aconteceu no Rio Grande do Sul em 1981, 
quando os motoristas ficaram 18 dias parados até que sua 
reivindicação fosse atendida e o preço do frete reajustado. 
No entanto, desta vez, independentemente do número 
de dias que os caminhoneiros ficaram parados, a maneira 
como a população foi afetada é sem precedentes. Greves 
nacionais realizadas por eles anteriormente, ocorridas em 
2015 e 1979, por exemplo, causaram alta dos preços e falta 
de combustíveis, porém nenhuma atingiu níveis tão altos de 
desabastecimento de itens básicos quanto a mais recente. 
Mas o que levou os caminhoneiros a iniciar esse movimento? 
Para responder a essa pergunta, é preciso considerar a 
situação de trabalho desses profissionais. O Texto 1 apresenta 
dados da pesquisa “Perfil dos caminhoneiros”, publicada em 
2016 pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), que 
entrevistou 1.066 caminhoneiros, sendo 729 autônomos e 337 
empregados de frota, ou seja, contratados por transportadoras, 
com carteira assinada. O primeiro gráfico revela que boa 
parte desses profissionais trabalha de 9 a 12 horas por dia, 
muitas vezes sete dias da semana. O gráfico seguinte aponta 
os principais problemas enfrentados pelos caminhoneiros e 
é dividido em dois: um com as respostas dos autônomos e 
outro com as dos empregados de frota. Entre os primeiros, 
as maiores dificuldades são o custo do combustível e o valor 
do frete; já entre os últimos, são os assaltos e roubos e os 
riscos de acidentes. Essas informações vão ao encontro das 
principais reivindicações da categoria durante a última greve: 
diminuição do valor do diesel, combustível que abastece 
veículos pesados; criação de uma tabela de preços mínimos 
do frete, baseada no quilômetro rodado; e obras para melhorar 
as condições das rodovias, principalmente as federais. 
A paralisação dos caminhoneiros ressaltou não só a 
importância do trabalho desses profissionais, muitas vezes 
desvalorizados, como também a dependência do Brasil do 
transporte rodoviário, já que mais da metade das cargas que 
circulam no país é transportada em rodovias. Devido a essa 
grande influência dos caminhoneiros no funcionamento do país, 
quando a categoria decidiu interromper o trabalho, os efeitos 
na dinâmica da economia brasileira foram quase imediatos. 
O Texto 2 destaca alguns dos setores mais atingidos pela 
greve e a maneira como a população foi afetada. Nos primeiros 
dias, o impacto mais evidente da greve podia ser observado nos 
postos de combustíveis, que ficaram cercados por extensas 
filas de motoristas dispostos a esperar longas horas e pagar 
muito caro pelo pouco de gasolina e álcool que restava. A falta 
de combustíveis também fez com que a frota de transporte 
público nas ruas fosse reduzida. No entanto, conforme a 
paralisação se estendia, itens essenciais à população, como 
alimentos e remédios, tornavam-se escassos. 
Diante dessa situação de calamidade, o Governo Federal 
decidiu atender a algumas demandas dos caminhoneiros – 
outras ainda estão sendo negociadas. Uma delas foi a redução 
de 46 centavos no litro do óleo diesel, como aponta o Texto 3.
O grande problema é que, para viabilizar esse subsídio, o 
governo cancelou gastos públicos em setores fundamentais 
para o desenvolvimento da sociedade, como educação, saúde 
e segurança. Também houve corte de verbas de programas 
sociais, como políticas para a juventude, políticas sobre drogas, 
violência contra as mulheres e saúde indígena. Mas, afinal, isso 
resolve o problema?
Nesse contexto, que tal produzir uma dissertação sobre 
o que pode ser feito para garantir, efetivamente, condições 
de trabalho dignas aos caminhoneiros, ainda que essas 
medidas apresentem resultados a longo prazo? Para isso, 
é preciso considerar a importância desses profissionais na 
economia brasileira atualmente. Ler notícias e artigos e assistir 
a documentários a respeito desse assunto pode ajudar a 
enriquecer o seu texto. Boa produção textual! 
Editorial
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Para os estudiosos Alessandro 
Serrrano Colavite e Fabio Konishi, o Brasil 
possui uma grande dependência do setor rodoviário, 
pois estima-se que 61,4% de toda a carga transportada 
concentra-se nesse modal, o que afeta diretamente a 
composição dos custos dos produtos. De acordo com o 
Ministério dos Transportes, a oscilação dos preços nos itens 
transportados pelo país afora está diretamente relacionada 
à qualidade das vias pavimentadas, uma vez que elas 
interferem no tempo de entrega das mercadorias e na 
necessidade de manutenção dos veículos.
Uma das opções apresentadas por Colavite e Konishi 
para suprir a demanda do modal rodoviário é o aumento da 
participação do volume de cargas transportadas pelos setores 
aquaviário e ferroviário, desde que esses modais recebam 
investimentos por parte do Governo Federal e da iniciativa 
privada. Nesse contexto, vale ressaltar que o Brasil apresenta 
21 mil quilômetros de hidrovias economicamente navegáveis, 
as quais poderiam ser utilizadas com maior vigor.
Em 2017, o setor portuário brasileiro apresentou crescimento 
de 8,3% se comparado ao ano anterior.
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istoricamente, a construção das ferrovias no 
Brasil está ligada à necessidade econômica de 
exportar as produções agrícolas das principais 
regiões do país até os portos marítimos. Os 
estudiosos Rodrigo Fontanari, Alexandre Macchione Saes 
e Paulo Roberto de Oliveira afirmam que a expansão 
ferroviária assumiu papel de destaque durante o 
desenvolvimento da economia cafeeira brasileira, pois o 
investimento nas ferrovias era considerado algo seguro.
Com o passar dos anos, a política de transportes 
no Brasil foi impulsionada pela priorização do modal 
rodoviário, principalmente a partir de 1950, durante o 
período da industrialização. Uma das consequências 
desse fato é a origem da dependência que temos, ainda 
nos dias atuais,do sistema viário. Para acompanhar o 
crescimento da produção agrícola e industrial no país, o 
escoamento dos produtos precisa ser aprimorado.
As cidades brasileiras estão em constante 
modificação, o que afeta diretamente o sistema viário 
e, sobretudo, a malha urbana que compõe a realidade 
dos municípios. Nesse contexto, o planejamento das 
cidades e dos meios de transporte é algo imprescindível 
para garantir uma boa dinâmica espacial do meio 
urbano.
Segundo o Ministério dos Transportes, Portos e 
Aviação Civil, o sistema operacional do transporte no 
Brasil está dividido entre os setore aeroviário, ferroviário, 
aquaviário e rodoviário, os quais são os mais utilizados 
no país.
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POR FRANCIELY VELOZO ARAGÃO
A realidade do 
transporte 
brasileiro 
A dependência da malha rodoviária e a necessidade de 
investir em novas alternativas para o transporte de cargas 
e passageiros no país.
9
Ademais, os investimentos realizados em novos 
modais ajudariam a evitar nossa dependência do 
transporte de mercadorias pelas rodovias. Essa 
problemática pôde ser percebida com maior intensidade 
durante a paralisação dos caminhoneiros, que chegou 
a durar, no final do mês de maio, 10 dias consecutivos. 
Para Clésio Andrade, presidente da Confederação 
Nacional de Transportes (CNT), esse movimento mostrou 
a vulnerabilidade de todas as instituições brasileiras que 
necessitam do modal rodoviário para enviar e receber 
produtos que fazem parte do dia a dia da população.
Quinto dia de paralisação dos caminhoneiros na Dutra.
Um país competitivo e capaz de atender às 
demandas de escoamento de sua produção conhece 
os diferentes modais que compõem a sua extensão 
territorial, visando, dessa forma, a maneiras de garantir 
que as mercadorias transportadas por diferentes meios 
cheguem ao destino final com qualidade e que, ainda, os 
custos sejam competitivos diante de seus concorrentes. 
Ainda segundo Colavite e Konishi, fatores que 
envolvem o desenvolvimento adequado das malhas 
urbanas devem estar inseridos nas políticas públicas 
governamentais e na cultura dos moradores de cada 
região. Nesse sentido, podemos citar a qualidade da 
malha urbana, que deve ser estudada para minimizar os 
impactos desfavoráveis de uma urbanização acelerada, 
considerando ainda a manutenção periódica das 
rodovias que cortam o país.
Pensar em novas formas que otimizem o transporte de 
cargas por todo o Brasil tem impulsionado pesquisas por 
parte de instituições públicas e privadas, as quais resultam 
em ações inovadoras voltadas à superação das atuais 
limitações existentes. Porém, para que as estratégias de 
planejamento urbano e de transportes sejam eficazes, o 
levantamento e o diagnóstico dos fatores que interferem 
nesse processo devem ser levantados com eficácia.
Diante desses fatores, a implantação do Veículo Leve 
sobre os Trilhos (VLT) indica uma nova esperança para 
o transporte público de passageiros e de cargas. Esse 
novo conceito de locomoção contribui para a gestão 
das cidades, incluindo e integrando todos os recursos 
disponíveis para que possamos dar início à mobilidade 
sustentável em um país com uma estrutura modal tão 
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relevante, mas que não é efetivamente utilizada devido 
a problemas de planejamento urbano que interferem na 
dinâmica das cidades.
Para dar suporte a essa implantação, a Associação 
Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre 
Trilhos (ANPTrilhos) promove o desenvolvimento 
e o aprimoramento do transporte de cargas e de 
passageiros sobre trilhos no Brasil. Para se ter ideia, 
em 2017, foram instalados no país 30,2 quilômetros de 
trilhos, superando a expectativa dos operadores desse 
tipo de serviço, que era de 29 quilômetros de extensão. 
Essa nova realidade reforça a ideia de desenvolvimento 
de uma rede de metrô eficaz, ágil e sustentável. Essa 
concepção de transporte deve pautar também a agenda 
governamental dos administradores públicos para que 
haja mais agilidade nos sistemas de transportes que 
constituem o nosso país.
Os operadores que desenvolvem esse tipo de 
transporte buscam ainda ações que reduzam o consumo 
de energia, como a utilização de lâmpadas de LED, que 
são mais econômicas se comparadas aos outros modelos 
de iluminação existentes. Outra medida está na troca dos 
motores dos trens de corrente contínua por alternada, 
reduzindo em até 20% a energia de tração consumida 
por esse tipo de veículo. Tais fatores reforçam o aspecto 
sustentável desse novo sistema de transporte, que aos 
poucos está sendo incluso no Brasil. 
Em 2016, a cidade do Rio de Janeiro foi a primeira do país a 
contar com VLT.
Segundo dados do Balanço do setor Metroferroviário 
da ANPtrilhos, o país tem um banco de projetos de 
mais de 540 quilômetros de linhas de sistemas de 
transporte (VLT) aguardando a contratação para que 
possam sair do papel. Parte desses projetos está em 
estudos para ter início até o ano 2023.
Para que maiores crises sejam evitadas, o presidente 
do Conselho Nacional de Transportes ressalta que é 
necessário ter sensibilidade para os problemas do país. 
Assim, é preciso pensar em iniciativas públicas e privadas 
que estão ligadas aos setores que compõem o transporte 
de cargas e de passageiros, garantindo, ainda que de 
forma progressiva, um desenvolvimento eficaz.
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O crescimento da utilização dos modais aeroviário, 
ferroviário, aquaviário e rodoviário estará sempre em evidência, 
pois o aumento da produção é reflexo das necessidades de 
desenvolvimento para suprir toda essa demanda. Para isso, 
é necessário que pesquisadores, estudiosos, sociedade e 
órgãos públicos considerem as características territoriais 
brasileiras. Cabe também aos profissionais que atuam 
no transporte de cargas e passageiros e às pessoas que 
dependem desse serviço auxiliar nesse desenvolvimento e 
incentivar novas pesquisas, investigar a maneira como os 
novos projetos estão sendo conduzidos e, por fim, conhecer 
a funcionalidade do sistema de transporte brasileiro. 
Arquivo pessoal/Franciely 
Velozo Aragão
Graduada em Engenharia de Produção pela 
Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo 
Mourão. Mestre em Engenharia Urbana pela 
Universidade Estadual de Maringá. Doutoranda 
em Engenharia de Produção pela Universidade 
Tecnológica Federal do Paraná. Atualmente, é 
docente do Curso de Engenharia de Produção da 
Universidade Estadual de Maringá.
Aparalisação dos caminhoneiros, ocorrida no mês de maio em todo o Brasil, trouxe à tona a discussão sobre a dependência nacional do transporte rodoviário de insumos e mercadorias. 
Em meio à crise, o governo teve que negociar com os grevistas e a 
população precisou de paciência para enfrentar filas, principalmente 
as dos postos de combustíveis.
O desabastecimento dos postos levou parte dos brasileiros 
a deixar os veículos na garagem e a buscar outros meios de 
locomoção durante os dias de greve. Diante desse cenário, 
dados sobre a qualidade do ar coletados pela Companhia 
Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) chamam a 
atenção. Segundo a agência, devido à queda no tráfego de 
veículos durante os dias de paralisação, a redução da poluição 
atmosférica na cidade de São Paulo chegou a 50%. 
Nos dias atuais, a sustentabilidade é um assunto cada 
vez mais debatido, e é amplamente conhecido que a queima 
de combustíveis, sobretudo os fósseis, é uma das grandes 
fontes de emissões de poluentes atmosféricos. Basta analisar 
os dados apresentados, que apontam que apenas alguns 
dias de frota reduzida nas ruas foram suficientes para que 
se registrasse uma significativa melhora na qualidade do 
ar na capital paulista. Ainda assim, a sociedade continua 
amplamente dependente dos combustíveis fósseis para a 
geração de energia, e mudanças na matriz energética têm 
ocorrido de forma lenta, exigindo a superação de uma série 
de desafios. 
Nesse contexto, algumas conquistas já são realidade,como o desenvolvimento de veículos que utilizam células 
a combustível movidas a hidrogênio, que têm a água como 
produto de seu funcionamento, em contraste com os 
combustíveis fósseis que despejam na atmosfera grande 
carga de óxidos poluentes, materiais particulados e 
outras substâncias. Porém, ainda são necessários altos 
investimentos financeiros, desenvolvimento de novas 
tecnologias e aprimoramento das existentes. Também é 
essencial a consolidação de políticas públicas alinhadas com 
o desenvolvimento sustentável.
Os dias de paralisação dos caminhoneiros revelaram uma 
série de problemas estruturais do país, mas, por outro lado, 
trouxeram algumas reflexões importantes sobre nossa atuação 
diária na busca pela sustentabilidade. A análise dos dados 
coletados na cidade de São Paulo sugere que o uso racional 
dos automóveis é uma forma concreta de contribuição para 
que possamos traçar esse novo caminho.
Na contramão da sustentabilidade?
T O Q U E D O
E S P E C I A L I S T A
Ciências da Natureza e suas Tecnologias
Química
HA
BILI
DA
DES
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) estabelece 
competências e habilidades norteadoras do estudo 
dos conteúdos exigidos para o Ensino Médio. Por meio 
do texto “A realidade do transporte brasileiro”, foram 
trabalhadas as seguintes competências e habilidades 
da área de Ciências Humanas e suas Tecnologias:
C4 – Entender as transformações técnicas e tecnológi-
cas e seu impacto nos processos de produção, no de-
senvolvimento do conhecimento e na vida social.
H18 – Analisar diferentes processos de produção 
ou circulação de riquezas e suas implicações 
socioespaciais.
H19 – Reconhecer as transformações técnicas e 
tecnológicas que determinam as várias formas de uso 
e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 – Selecionar argumentos favoráveis ou contrários 
às modificações impostas pelas novas tecnologias à 
vida social e ao mundo do trabalho.
C6 – Compreender a sociedade e a natureza, 
reconhecendo suas interações no espaço em diferentes 
contextos históricos e geográficos.
H26 – Identificar em fontes diversas o processo de 
ocupação dos meios físicos e as relações da vida 
humana com a paisagem.
H27 – Analisar de maneira crítica as interações da 
sociedade com o meio físico, levando em consideração 
aspectos históricos e/ou geográficos.
H28 – Relacionar o uso das tecnologias com os 
impactos socioambientais em diferentes contextos 
histórico-geográficos.
 
POR ANA LUIZA ARÊAS MATOS ALVES
11
CARREIRA:
Engenharia de 
Transportes e Logística
Elisete Santos da Silva Zagheni é doutora 
em Engenharia de Produção e mestre 
em Administração pela Universidade 
Federal de Santa Catarina e graduada 
em Administração pela Universidade do 
Vale do Itajaí. Atualmente, é docente da 
Universidade Federal de Santa Catarina, 
no Centro Tecnológico de Joinville, e 
atua nas áreas de: planejamento e 
operação de sistemas de transportes, 
logística empresarial, planejamento 
estratégico, empreendedorismo, canais 
de distribuição e turismo. Participa do 
Grupo de Pesquisa em Infraestrutura e 
Transportes (GIT) e do Grupo de Pesquisa 
em Operações e Sistemas de 
Transporte. 
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E N T R E V I S TA | Elisete Zagheni
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de transportes, como Engenharia de Tráfego, Sistemas 
Inteligentes de Transportes, Planejamento Integrado dos 
Transportes e Uso do Solo, Transportes Não Motorizados, 
Planejamento de Transportes Públicos, Sistemas de 
Informações Geográficas para Transportes, entre outras. 
Já em Logística, destacam-se as disciplinas de Logística 
de Suprimentos, Logística de Distribuição, Pesquisa 
Operacional e Custos Logísticos. Há, ainda, disciplinas 
que discutem ambas as áreas e que proporcionam 
um fechamento, interligando os diversos conteúdos 
estudados. São elas: Roteirização e Programação em 
Transportes, Planejamento Estratégico e Simulação em 
Transportes e Logística.
O curso prevê, ainda, uma carga horária para 
atividades complementares, com as quais é possível 
integralizar o currículo a partir de práticas extraclasse 
relevantes para o saber e as habilidades necessárias 
à formação do estudante. Por meio dessas atividades 
complementares, busca-se estimular o aluno a 
participar de ações independentes, transversais, 
opcionais e de interdisciplinaridade, realizadas tanto 
no âmbito universitário quanto fora dele, de forma que 
possam contribuir para seu aprimoramento pessoal e 
profissional. Entre essas ações, estão a participação 
do estudante em estágios não obrigatórios, projetos 
de pesquisa e de extensão, cursos, palestras e 
monitorias. 
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Equipe Leia Agora: O estudante que pretende 
cursar Engenharia de Transportes e Logística (ou 
Mobilidade) deve ter quais interesses?
O interessado em cursar Engenharia de Transportes 
e Logística deve ter aptidões para a resolução de 
problemas que envolvem as áreas de transportes 
(tráfego, mobilidade urbana, entre outros) e logística 
(cadeia de suprimentos, estoque, armazenagem, 
otimização de processos, entre outros). Elementos 
importantes para a resolução desses problemas estão 
relacionados a conteúdos quantitativos (matemática, 
física e programação computacional) e qualitativos 
(comunicação, trabalho em equipe, observação e 
criatividade). Além disso, o ambiente da Engenharia 
é de tecnologia e inovação, vasto em possibilidades, 
seja para solucionar problemas existentes, seja para a 
criação de novos modelos de negócio. 
Equipe LA: O que é estudado durante a graduação? 
Além da área de Exatas, o curso também apresenta 
interdisciplinaridade? 
O estudante terá uma formação consistente na área de 
Exatas, com destaque para a programação computacional, 
cujo conhecimento, nos dias atuais, vem sendo um 
diferencial para o ingresso do engenheiro no mercado 
de trabalho. Além dessas áreas, o estudante também 
terá uma formação gerencial, com disciplinas nas áreas 
1313
Equipe LA: De que forma o estudante de Engenharia 
de Transportes e Logística pode ingressar no 
mercado? O estágio é obrigatório? 
O curso de Engenharia de Transportes e Logística 
possui estágio obrigatório, com o objetivo de 
proporcionar ao estudante a vivência em instituições do 
setor público ou privado e de conteúdos técnicos que 
compõem o curso, além de buscar o desenvolvimento 
ou o aperfeiçoamento do relacionamento profissional 
e humano. 
Equipe LA: Qual é a diferença entre a Engenharia de 
Transportes e Logística e a Engenharia Civil, já que 
ambas atuam com projetos de infraestrutura? 
A formação do engenheiro de transportes e logística 
está pautada em capacitar o estudante na operação, 
análise, otimização e gerenciamento de redes de 
transportes, de organizações e das chamadas cadeias 
de suprimentos. Já a formação do engenheiro civil 
é direcionada a capacitar o estudante para elaborar 
projetos e executar obras civis de engenharia. 
Equipe LA: Quais são as principais áreas de atuação 
do profissional de Transportes e Logística? 
O engenheiro de Transportes e Logística poderá atuar 
no âmbito público e privado, como em empresas dos 
diversos setores industriais, empresas ligadas aos 
setores de transportes (rodovias, portos, ferrovias, 
metrovias, aeroportos), departamentos federais, 
estaduais e municipais de transportes, universidades 
e institutos tecnológicos e consultorias nas áreas de 
transportes e logística. 
Esse profissional é capaz de determinar as condições 
ideais para a movimentação de pessoas, bens e 
informações, bem como para a alocação de recursos; 
estará preparado para interpretar, de maneira dinâmica, 
a realidade e para nela interferir, identificando, 
formulando e solucionando problemas, bem como 
produzindo, aprimorando e divulgando conhecimentos, 
tecnologias, serviçose operações. 
Equipe LA: Nos últimos meses, acompanhamos uma 
crise nos transportes brasileiros, devido à greve dos 
caminhoneiros e à alta dos combustíveis. Como evitar 
esse tipo de crise por meio da Engenharia?
Sabe-se que os currículos das engenharias, de 
maneira geral, tendem à multidisciplinaridade e à 
interdisciplinaridade, e esses aspectos fazem com que 
os egressos compreendam de que forma o ambiente 
econômico, político, demográfico, ambiental e 
tecnológico impactam no desempenho das empresas 
e do cidadão brasileiro. Esses aspectos são essenciais 
para que se possa diagnosticar as principais causas 
dos problemas vivenciados recentemente pela 
população brasileira e apresentar soluções para curto, 
médio e longo prazos. Evitar determinadas crises, 
muitas vezes, foge do alcance da população, mas é 
possível atuar para mitigar esse processo e até mesmo 
atingir determinadas metas preestabelecidas. 
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Equipe LA: Em sua opinião, quais seriam os principais 
investimentos brasileiros necessários no setor de 
transportes e logística? 
Sabemos que o Brasil é o quinto maior país do mundo 
em extensão territorial, possuindo um amplo litoral e 
quantidade significativa de rios. No entanto, o país ainda 
fica bastante atrás nos indicadores, se comparado a 
outros países com características semelhantes, quando o 
assunto é redes de transportes.
Infelizmente, temos rodovias em estado deplorável e 
malha ferroviária, portos e hidrovias insuficientes para 
atender às demandas atuais – condições que geram 
grandes entraves para alavancar a produtividade e a 
economia nacional. 
Sendo assim, para atingir indicadores de desenvolvimento 
das grandes potências mundiais, a infraestrutura logística 
brasileira tem um grande desafio pela frente. Uma das 
soluções para melhorar a infraestrutura de transportes 
e logística brasileira passa, necessariamente, por 
investimentos, os quais são tímidos, mesmo com algumas 
concessões de trechos de rodovias, ferrovias e portos 
realizadas pelo Governo Federal nos últimos anos. 
Outro aspecto relevante, além dos investimentos, diz 
respeito à elevada quantidade de trâmites burocráticos 
para liberação de mercadorias e produtos, principalmente 
nos terminais portuários e aeroportos de cargas. 
Equipe LA: Qual é a relação entre o Planejamento 
Urbano e a Engenharia de Transportes e Logística?
O Engenheiro de Transportes e Logística poderá atuar na 
elaboração de planos de transporte integrado e uso do 
solo. Assim, torna-se essencial que ele entenda a relação 
existente entre o processo de urbanização e transportes 
e os diferentes instrumentos para o planejamento urbano 
e da mobilidade. Compreender a complexidade dos 
sistemas urbanos e como se dá a interação dinâmica 
entre os sistemas de transportes e o uso do solo torna-
se essencial para a contribuição do engenheiro de 
transportes e logística com as políticas de mobilidade 
urbana sustentáveis, inseridas no planejamento urbano 
das localidades.
Equipe LA: Um dos principais desafios atuais é aliar 
a construção de infraestruturas com a sustentabi-
lidade. Como um profissional da área em questão 
pode atuar em relação ao meio ambiente?
A formação do engenheiro de transportes e logística 
prevê, em sua matriz curricular, conteúdos voltados 
aos chamados impactos ambientais dos transportes. O 
objetivo dessa discussão é fazer com que o engenheiro 
compreenda os impactos ambientais negativos dos 
transportes e elabore estratégias para minimizá-los 
e/ou mitigá-los, permeando o entendimento de que 
tais estratégias são benéficas em termos ambientais, 
econômicos e sociais.
1515
Acontecimentos recentes mostraram o quanto somos dependentes do transporte rodoviário de cargas, 
dos automóveis e de determinados combustíveis. Mas, afinal, se queremos uma vida melhor, também 
precisamos agir! 
No caso da mobilidade, há ações simples que podem reduzir o impacto dessa dependência que 
detectamos – dizemos apenas reduzir porque soluções mais eficientes só virão com investimentos públicos 
e uma vontade política que seja isenta de interesses obscuros. De qualquer maneira, enquanto o poder público 
não faz o papel de diversificar os meios de transporte de cargas e de pessoas, podemos fazer a nossa parte. 
Se usar ônibus para se locomover acaba sendo um exercício de paciência nos grandes centros urbanos, 
praticar a carona solidária e fazer os trajetos possíveis de bicicleta (ou até mesmo caminhando) são formas viáveis 
para que possamos atenuar a condição de reféns absolutos do combustível.
Sobre essas formas alternativas de deslocamento, é importante considerar que o cidadão comum ganha muitos 
benefícios pessoais quando tem a possibilidade e decide se deslocar de bicicleta: além de praticar exercício físico, 
economiza dinheiro, ajuda a reduzir o trânsito de carros e a poluição prejudicial à saúde, e não vai se estressar com 
a preocupação de encontrar uma vaga para estacionar.
Estudos feitos pela SPTrans, empresa que administra o trânsito na cidade de São Paulo, mostram que a 
velocidade média dos ônibus nos horários de pico é de 15 km/h. Uma pessoa comum, não necessariamente um 
atleta, consegue pedalar sem muito esforço a uma média de 20 km/h e ainda tem a opção de utilizar atalhos por 
ruas em que os ônibus não conseguem circular. Resumindo, a bicicleta pode ser mais rápida que o transporte 
coletivo.
Porém, no Brasil, andar de bicicleta nas cidades mais populosas é uma atividade que carece de infraestrutura 
e de mais segurança ao ciclista. Mas, com persistência, pouco a pouco essa cultura vai se desenvolvendo e, por 
consequência, deve haver mais investimentos nesse segmento.
A carona solidária, por sua vez, além de reduzir o número de automóveis nas ruas e o consumo geral de 
combustível, pode promover uma experiência que, muitas vezes, achamos que não aconteceria na correria do dia 
a dia: aquele vizinho com quem você nunca conversou no elevador pode se tornar seu novo amigo. E um amigo 
que ajuda a economizar e a desenvolver hábitos sustentáveis é sempre bem-vindo.
Mas, se você não quer papo com aquele vizinho, tudo bem. Há também vários aplicativos, selecionados por 
região, que indicam quem oferece e quem procura carona solidária. Tudo por um mundo menos individualista.
Claro que ter um automóvel ainda pode ser importante em alguns momentos da rotina: nos percursos mais 
longos, em dias de compras volumosas e em diversas situações de emergência, ele pode ser até mesmo 
indispensável. Mas, fora de situações pontuais, é possível fazermos o exercício de deixá-lo na garagem 
para reduzirmos o volume de veículos nas ruas e desfrutarmos de diversos benefícios. E, se as opções de 
transporte público ficam lotadas em certas ocasiões, as medidas alternativas trazem mais conforto. No fim, 
é isso o que queremos, não é mesmo?
No fim, queremos conforto!
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Márcio Souza. Mad Maria. Rio de 
Janeiro: Record, 2005.
Escrito em 1980, Mad Maria é o segundo 
livro de Márcio Souza. A história se passa no 
interior da Amazônia e relata a construção 
da ferrovia Madeira-Mamoré, entre 1907 e 
1912, expondo os trabalhadores às mais 
variadas formas de perigo, incluindo cobras, 
escorpiões e um surto de malária. No total, 
3.600 pessoas morreram. 
O BARÃO DOS TRANSPORTES
Para entender a origem e a história da ferrovia no Brasil, basta 
acompanhar a vida de Irineu Evangelista de Sousa, o Barão de 
Mauá (1813-1889), um empresário que teve a oportunidade 
de observar o irreversível processo de industrialização da 
Inglaterra no século XIX e que implementou o mesmo 
sistema em um Brasil totalmente rural durante o período 
imperial. Uma das formas de ver a atuação desse grande 
empreendedor é através do filme Mauá − O Imperador 
e o Rei (Brasil, 1999), dirigido por Sérgio Rezende e 
estreladopor Paulo Betti, no papel do Barão. O elenco 
tem ainda Malu Mader, Othon Bastos e Rodrigo Penna.
A produção relata a vida de Irineu e como ele 
se tornou um dos mais bem-sucedidos empresários 
brasileiros. Sousa foi responsável por uma série de 
serviços ligados à logística que trouxeram ao Brasil 
modernidade e uma economia que colocou o país 
em posição de destaque no cenário internacional. O 
grande feito que tornou famoso o Barão de Mauá (título 
oficial concedido pelo imperador Dom Pedro II) foi a 
implantação da primeira ferrovia da América do Sul (ligando 
Rio de Janeiro a Petrópolis), além da criação de uma linha 
de barcos a vapor no Rio Grande do Sul (sim, ele inaugurou a 
indústria naval brasileira) e da criação do transporte público com 
bondes puxados por burros. Ainda por seu intermédio, as linhas 
ferroviárias se proliferaram, e o trem foi o símbolo do transporte no 
Brasil até a primeira metade do século XX, antes de o país passar a adotar 
a malha rodoviária como principal solução.
Márcio Souza. Márcio Souza. Mad MariaMad Maria. Rio de . Rio de Pump − Histórias do petróleo. Direção: 
Joshua Tickell e Rebecca Tickell, EUA, 2014.
Documentário que revela um 
deprimente cenário de dependência 
americana do petróleo, analisando 
desde as suas origens, há 100 anos, 
até o grande monopólio atual. E 
mostrando os danos que essa situação 
causa em todo o planeta, com o 
aumento da poluição e gerando até 
guerras, como a do Oriente Médio. 
Um pequeno país com grandes ideias 
para se livrar dos combustíveis fósseis
Palestra da engenheira ambiental Monica 
Araya sobre soluções que a Costa Rica 
encontrou para reduzir drasticamente o uso 
de combustíveis fósseis, com a adoção de 
fontes renováveis de energia para suprir a 
eletricidade, força motriz do país. 
Acesse: <www.ted.com/talks/monica_
araya_a_small_country_with_big_ideas_to_
get_rid_of_fossil_fuels#t-922642>.
Mosaico 
 Cultural
• A G E N D A •
MOSTRA 
Museu dos Transportes Públicos
 Permanente
ONDE: São Paulo (SP). 
O Museu dos Transportes exibe relíquias, como 
o primeiro bonde a circular no Brasil e o primeiro 
trólebus de fabricação nacional. Há ainda outros 
sete veículos, cerca de 1.500 fotos e 1.500 
livros, além de móveis, objetos e documentos 
sobre a evolução do transporte urbano. 
INFO: <www.sptrans.com.br/museu>.
ON-LINE
Museu Virtual do Transporte Urbano
 Permanente
ONDE: Internet.
Site que apresenta a história e o desenvolvimento 
do transporte urbano ao longo das civilizações 
da Terra, desde a Pré-história até os anos 
1980, especialmente das cidades brasileiras. 
O site também traz biografias de inventores 
pioneiros que criaram ou colaboraram com o 
desenvolvimento de veículos. 
INFO: <www.museudantu.org.br/principal.asp>.
HISTÓRIA
Associação Brasileira de Preservação Ferroviária
 Permanente
ONDE: Internet.
Site ricamente ilustrado com fotos antigas que 
mostram, com apoio de textos didáticos, a 
história da ferrovia no Brasil, desde o esforço 
do Barão de Mauá até as concessões da malha 
ferroviária a empresas de logística, no fim do 
século XX. A pesquisa é de Plínio Carnier Júnior. 
INFO: <www.abpfsp.com.br/ferrovias.htm>.
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Quatro e meia da manhã. O sol ainda dorme, e a sinfonia dos grilos quebra o 
silêncio do acostamento. Estico os pés na boleia e faço minha oração. O aroma do 
café barato dá sinais de que os companheiros de estrada também já iniciam seu dia. 
Acendo o farol baixo e lavo o rosto com a água do galão. A carga é perecível, não 
posso me atrasar. Confiro as notas fiscais acompanhado de um pão de ontem com 
manteiga; angus, mignon, ancho são nomes que nunca passaram pelo meu prato, 
mas são eles que me alimentam. Desligo o meu silêncio e o motor ruge na estrada.
O sol já dá as caras atrás de uma neblina. A rodovia é minha xará: Fernão Dias. E 
eu lá tenho culpa se meu pai, José Dias, gostava de História? O velho não estudou, 
mas quando aprendeu a ler devorava enciclopédias. Ele justificava a escolha do nome 
dizendo: “filho, seu nome é de desbravador, cai no mundão e corre atrás das suas 
esmeraldas”. Só não sabia que eu iria desbravar estradas, atolar em lama e dormir 
longe de casa sem nenhuma pedra preciosa. O velho sabia menos ainda que meu 
apelido seria Fernão do caminhão. Pelo menos rimava.
Oito horas da manhã, e meu estômago já pede almoço. Engano o ronco com 
um café preto, enquanto pago o pedágio. A viagem está na metade, faltam só 
mais três dias para eu chegar. Nove dias no total, se não chover, e eu já estarei em 
casa com os meus meninos. Tenho uma escadinha de quatro degraus, cada um 
mais bonitinho que o outro. O mais velho também quer ser caminhoneiro; eu não 
brinco com sonho de criança, mas eu queria mesmo é que ele estudasse para 
engenheiro. Já pensou o Fernão com um filho patrão? A rima fica até mais bonita!
Colocar comida dentro de casa não é muito fácil, é por isso que na estrada 
eu não tenho luxo. Se almoço, guardo para a janta; se janto, economizo no café 
da madrugada. A minha mulher também ajuda bastante, trabalhadeira que só ela. 
Não tem medo de faxina e gosta de cuidar de criança, mas tem talento mesmo 
quando resolve ensinar. Um dia ela ainda vai ser professora, e eu vou poder 
encontrar com ela todo dia na porta da escola. Enquanto isso não der certo, vou 
levando a vida na boleia com a foto dela perto do retrovisor. É que, quando eu 
olho para trás, preciso me lembrar de como já venci na vida. 
Gasto boa parte do valor do frete na manutenção do caminhão, mas dá gosto 
de ver quando o restinho do meu salário vira alimento, roupa e calçado lá em 
casa. Falando nisso, já é tarde, preciso encostar no canteiro para lavar umas 
mudas. Aproveito para almoçar e esticar as pernas de novo na boleia. Quinze 
minutos de descanso e mais nove horas de estrada. 
Nesse caminho a gente vê de tudo: acidente, carro importado, gado atolado e 
plantação vistosa. Um dia, quem sabe, vou ter meu pedacinho de terra também. 
Pode ser na cidade ou na roça, desde que seja da minha família. 
Família. Privilégio da vida e pouca gente dá valor. Mas posso dizer, aqui nesse calor, 
que quando falta, falta mesmo. Veja bem, eu não nego que estar sozinho pode ter suas 
vantagens, mas não é muito fácil enfrentar tantos dias de silêncio conversando só com a 
buzina e com os colegas de acostamento. Aliás, já está na hora de parar. 
Onze horas da noite, eu confiro a refrigeração da carga chique e finalmente 
posso me esticar. O sonho vem logo, no primeiro piscar dos meus olhos, e eu 
gosto do que vejo. É meu menino engenheiro, com os irmãos todos formados 
e abraçando sua mãe. É nessa hora que a rima mais me alegra: o Fernão do 
caminhão, que agora tem filho patrão, sabe que tudo valeu a pena.
Vida na boleia
EXTRA!
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