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resumo ética e cidadania

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PARTE 1: O QUE TEMOS
1. Ética, então, pode ser referente tanto àquilo que faz o filósofo, quando resolve refletir sobre uma instância da vida humana, que está ligada a uma certa forma como nós nos relacionamos com os outros, construída social e historicamente, quanto se referir às regras, aos princípios e valores e as ações a eles ligadas, que compõem a forma como as pessoas se relacionam umas com as outras em comunidade. Enfocando essa última perspectiva, temos que essas regras, esses princípios e valores são interiorizados naquilo que se chama processo de socialização, o qual paulatinamente vai incutindo na pessoa comando e regras morais para sua existência social. O indivíduo, à medida que vai se desenvolvendo, tem as condições de acatar ou criticar tais regras, princípios e valores de acordo com o contexto e as demandas de seu tempo (isso explica a perspectiva histórica deles). A interiorização quando colocada em prática pode ser chamada de consciência, a qual foi definida como "a interiorização dos comandos e proibições de ordem moral vindos do exterior". O indivíduo ao interiorizar tais comandos, o faz de forma consciente e livre, ou seja, eles passam a ser seus valores, seus princípios, suas regras de ação, as quais são compartilhadas pelos outros componentes de seu grupo/comunidade. A aceitação consciente e a sua prática livre de qualquer coação é o que vai diferenciar a perspectiva ética, por exemplo, da perspectiva jurídica, esta focada mais na regra externa e na coação.
2. O processo de socialização se, por um lado, conforma nossa individualidade, ele também conforma a nossa identidade, a partir da experiência com os diversos papéis sociais que vamos experienciando dentro dos micros e macros espaços sociais. A experimentação desses papéis, vai preparando o indivíduo para se tornar um membro da sociedade em sua plenitude, ou seja, aquele que vai participar das várias instâncias/instituições sociais de acordo com procedimentos previamente estabelecidos. Assim, um mesmo indivíduo, por exemplo, cumpre o papel de homem, de marido, de pai, de professor, de religioso, de jogador, de aluno, de tio, de avô, com cada papel sendo definido previamente, a partir do contexto histórico e social de cada época.
3. Esse processo de formação da identidade é essencial para a preservação da comunidade e, neste sentido, ele tem também a função de formar os dirigentes, ou seja, aqueles que comandarão a comunidade. É aqui que entra a formação do soberano, aquele que se responsabilizará pelos caminhos que a comunidade deverá seguir. Dentro de uma perspectiva democrática, esse soberano é o povo, e sua forma de ação será denominada política, passando ele a ser denominado cidadão, dependendo da forma dele exercer esse poder. Neste sentido, o mesmo processo que forma o indivíduo como ser ético, também o forma como ser político. Isto porque é na comunidade que o indivíduo materializa/exerce suas regras, seus princípios e valores éticos, bem como exerce seus direitos e deveres enquanto cidadão. Neste sentido, nossos aplausos para o velho Aristóteles que, pelas suas ideias, continua vivinho em nossas discussões.
4. Essas considerações levam a discussão para o espaço no qual ética e cidadania são exercidas, ou seja, a comunidade. Na perspectiva ocidental, tem-se o costume de iniciar com os antigos gregos e romanos, o que se mostra um bom caminho. Há séculos eles têm servido de parâmetro para se discutir os caminhos da sociedade ocidental, a tal ponto que alguns dizem que três são os livros bases da cultura ocidental: a Bíblia, a Odisséia e a Ilíada. Pois bem, o começo dessa forma de organização política vai se dar com a constituição das cidades-estado (pólis) e sua forma de exercício do poder. Vimos que o exercício da ética e da cidadania necessita de um espaço geográfico no qual possa vigorar/ser implementado.
5. Dando um grande salto histórico aqui, como estratégia pedagógica, passamos para a atualidade, em que dois modelos de exercício do poder se apresentam como os mais discutidos. Um desses modelos, seguindo o modelo clássico, enfoca a participação direta do cidadão na condução dos destinos da comunidade, agora chamada estado-nação ou estado nacional: assim, o cidadão é aquele que está diretamente envolvido na tomada de decisão política. Outro modelo, mais ligado ao pensamento político do século XVII em diante, vai destacar a posse e exercício de direitos, como formas de diferenciação/status dentro de uma comunidade, diferenciando os que tinham direito de participação política, civil e social. O primeiro modelo chamado de modelo republicano é baseado nos exemplos da Grécia democrática e da Roma republicana; o segundo modelo é baseado nos pensadores do estado nacional do século XVII, como Hobbes e Rousseau. A grande diferença aqui é que no segundo modelo, não há obrigatoriamente a necessidade do cidadão ser aquele que toma as decisões, ou seja que tenha o poder: exemplo aqui é o da Roma Imperialista, na qual a cidadania era muito valorizada, mas era esvaziada de poder, uma vez que as decisões cabiam ao imperador e não ao conjunto dos cidadãos. De qualquer forma, os dois modelos não são carentes de objeções e dificuldades. Como falar em exercício direto do poder, através da participação direta, nas complexas sociedades de hoje, em especial quando se tem que trabalhar, dedicar atenção à família entre outras coisas, o que faz sobrar poucos tempo para a atividade política? Mas também como deixar o poder nas mãos de um grupo que decidirá sobre o futuro de todos os cidadãos? A saída tem sido uma certa mistura dos dois modelos a qual vai se colocando de acordo com a visão dominante ou mais influente de acordo com quem está no poder. De qualquer forma, é necessária uma posição do cidadão sobre como estabelecer o poder, ou como exercer a cidadania em seu território.
6. Até aqui ética, cidadania, território e poder andam juntos, dentro de um espaço geográfico e político chamado estado-nação. Entretanto nas últimas décadas essa relação tem sido posta à prova pelo advento do chamado processo de globalização ou internacionalização (denominação dependente do viés ideológico de quem fala), que reduziu espaço e tempo. Isso evidentemente trouxe desafio à soberania dos estado nacionais, com a qual eles exerciam seu poder sobre seus membros. Com a globalização, tais estados começaram a ver sua autonomia de decisão ser questionada e retirada por posições alheias a seus territórios.
7. O apelo à representatividade/atuação supranacional passa a ser visto como uma forma de sobrevivência para os estados nacionais.  Não é que eles perderam representatividade, acontece que sem uma ação coordenada de nível internacional, dificilmente eles têm condições/poder de fazer frente aos interesses dos países mais poderosos e das grandes corporações internacionais. A ação internacional é a forma de sobrevivência que os estados nacionais têm para atuar com um mínimo de força num cenário não muito colaborativo, em que os interesses do mais forte normalmente prevalecem, quando não são confrontados por uma força maior.
8. Essa nova situação cria o que se chamou de cidadania global, a qual deve ser vista como uma continuidade da cidadania nacional, mais um papel assumido pelo cidadão, entre tantos que ele já tem que cumprir.
9. A ética nesse cenário tem que ser uma ética mais ampla, que, sem desconsiderar os valores locais, seja aplicável em todos eles. Os direitos humanos aqui podem servir como fundamento para essa ética.
 
 
PARTE 2: DIRETO AO PONTO
Tópicos retirados de dúvidas apresentadas por estudantes, com respostas (mais ou  menos) diretas.
 
Cidadania
Ética e compromisso com a promoção de cidadania
Nesta disciplina, trabalhou-se com o pensamento do filósofo grego Aristóteles sobre a ética e a política. Para Aristóteles a ética era uma forma de excelência que estava ligada à formação do caráter das pessoas, ou seja, estava relacionada a uma certa forma de viver que buscava cumprir no seu máximo aquilo que era considerado o fim últimodo ser humano, aquele fim que é perseguido por ele mesmo e não em vista a outro fim qualquer ou maior, ou seja, a felicidade. E como o ser humano atingia esse fim? Agindo de uma certa forma, de acordo com uma certa excelência, ou seja, virtuosamente. E essa virtuosidade estava ligada a agir sempre numa certa medianidade entre dois excessos. Assim, a virtude da coragem era a medianidade entre a covardia e a temeridade, a virtude da temperança era a medianidade entre a insensibilidade e a libertinagem, a virtude da liberalidade era a medianidade entre a avareza e o esbanjamento.
A boa ação era sempre aquela que seria feita pelo ser virtuoso, e tal ação era conquistada pelo hábito - não nascemos bons ou maus, nos tornamos bons ou maus de acordo nos nossos hábitos. Ora, o ser bom e virtuoso não é uma idealização, ele deve ter um local para agir, para desenvolver seus hábitos, para se tornar virtuoso. E onde seria esse lugar? Justamente na pólis, na cidade. Lembrem-se que a moral necessita das duas dimensões: a dos valores e a das ações, o normativo e o factual. Será na cidade que o ser virtuoso pode exercer a virtude. E uma cidade dirigida por seres virtuosos mais facilmente possibilitará a todos atingirem o fim ao qual estão destinados por natureza, ou, como disse Marilena Chaui, "à vida justa, bela e feliz".
Esta pode ser uma relação básica a ser estabelecida entre a ética e a cidadania. É, até mesmo, a forma do senso comum pensar a relação entre ética e política no seu cotidiano. É claro, ela não é a única, outras são apresentadas no decorrer da história e que podem ser discutidas em uma futura disciplina de ética e política.
 
Ética global e cidadania global
Como vimos, a cidadania global, segundo as Nações Unidas, é "o conceito de que a identidade de alguém transcende, mesmo que respeite, as fronteiras geográficas e nacionais, e que nossas ações sociais, políticas, ambientais e econômicas ocorrem em um mundo interconectado". Além disso, a cidadania global pode ser vista, também, como forma de manter, no nível político, a soberania popular, em contraposição aos interesses das grandes corporações transnacionais e dos países mais poderosos. Uma forma de "assegurar a democracia política, o desenvolvimento social, a proteção ambiental e a diversidade cultural, nos planos local, nacional e global" A proposta aqui é considerar a cidadania global como uma continuidade da cidadania estatal, um continuum, sendo a identidade supranacional uma segunda identidade. Segundo as Nações Unidas, a cidadania global diz respeito, ainda, a "um sentimento de pertencer à comunidade global e à humanidade comum, com seus membros experimentando solidariedade e identidade coletiva entre si e responsabilidade coletiva no nível global". Isso conduz à ideia de Ética global, ou seja, um conjunto de ideias éticas fundamentais (como a dignidade humana) que são aceitas globalmente e que estabelecem uma base sobre a qual as pessoas lidam umas com as outras no mundo. Essa ética tem como pilares alguns princípios, como:
· a boa governança e o respeito às leis, em nível nacional e global;
· a responsabilidade pelo planeta e clima, e as obrigações para com as gerações futuras;
· a responsabilidade humanitária básica pelo outro em situação de vulnerabilidade;
· a erradicação da pobreza extrema;
· o compromisso contra as guerras e defesa da segurança internacional; e
· a eliminação de armas nucleares e outras armas de destruição em massa, entre outros.
Esses princípios têm como base os direitos humanos, enquanto direitos inerentes a todos os seres humanos, independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição.
 
Formas de exercício da cidadania
Vimos que as formas de exercício da cidadania vão depender do tipo de modelo de cidadania que está sendo abordado. Abordamos na disciplina dois modelos. No modelo democrático (ou republicano) o princípio-chave é o autogoverno cívico pela participação direto do cidadão nas instância políticas. No modelo liberal, o enfoque está mais na garantia dos direitos individuais e na liberdade dos cidadãos, sendo o exercício da cidadania ligado ao exercício dos direitos a ela relacionados.
 
Influência da Revolução Francesa no conceito de cidadania
Três são as grandes declarações que têm influência sobre a instituição dos direitos humanos e no desenvolvimento da cidadania no mundo ocidental: a declaração de independência dos Estados Unidos da América, de 1776; a declaração francesa dos direitos do homem e do cidadão, de 1789; e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948.
A primeira começa afirmando:  "Consideramos  estas  verdades  como  evidentes  por  si  mesmas,  que  todos  os homens  são  criados  iguais,  dotados  pelo  Criador  de  certos  direitos  inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade."
A segunda, no seu preâmbulo afirma: "Os representantes do povo francês, reunidos em Assembléia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos governos, resolveram expor, em uma declaração solene, os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que essa declaração, constantemente presente junto a todos os membros do corpo social, lembre-lhes permanentemente seus direitos e deveres...".
A terceira, por sua vez, inicia da seguinte forma: "Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo..."
Sem tirar o mérito histórico de nenhuma delas, pode-se dizer que a mais considerada deve ser a segunda, ou seja a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, nascida da Revolução Francesa. Sobre ela, Lynn Hunt, em seu livro A invenção dos direitos humanos, escreveu:
"Sem mencionar nem uma única vez rei, nobreza ou igreja, declarava que ‘os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem’ são a fundação de todo e qualquer governo. Atribuía à soberania à nação, e não ao rei, e declarava que todos são iguais perante a lei, abrindo posições para o talento e o mérito e eliminando implicitamente todo o privilégio baseado no nascimento. Mais extraordinária que qualquer garantia particular, entretanto, era a universalidade das afirmações feitas. As referências a ‘homens’, ‘homem’, ‘todo homem’, ‘todos os homens’, ‘todos os cidadãos’, ‘cada cidadão’, ‘sociedade’ e ‘toda sociedade’ eclipsavam a única referência ao povo francês".
Essa salvaguarda dos direitos universais era a aurora de uma nova era de liberdade baseada na razão. A declaração passa, então, a ter influência decisiva sobre as discussões sobre os direitos dos cidadãos nos estados nacionais constituídos.
 
Modelos de cidadania e governo (republicano, liberal, neoliberal) com exemplos práticos no Brasil.
Consideramos a existência de dois modelos que se enfrentam na conceitualização da cidadania. No primeiro, o modelo liberal, o papel do cidadão é visto de forma individual e instrumental, os indivíduos são pessoas privadas, externas ao Estado, sendo a cidadania definida como um status concedido àqueles que são membros integrais de uma comunidade, esse status compreende três elementos: o civil, o político e o social. O elemento civil é exercido através dos direitos necessários à liberdade individual, como, por exemplo, a liberdade de ir e vir, a liberdade de imprensa, o direito à propriedade e o direito à justiça. O elemento político é exercido através dos direitos de participar no exercício do poder político. O elemento social é exercido através do direito ao bem-estar econômico, à segurança e a levar a vida de um ser civilizado de acordo com os padrões que prevalecem na sociedade. Segundo Cesar Augusto Ramos, esse modelo de cidadania acaba deslocando a compreensão normativa das ações humanas da política e da ética para o direito: "regramento jurídico da vida e das relações sociais determina os limitesda liberdade individual,  protege os direitos, especialmente as liberdades individuais, e define o alcance do poder político".
No segundo modelo de cidadania, o democrático ou republicano, prevalece uma concepção comunitarista, definindo a participação no governo como essência da liberdade, como componente essencial da constituição do cidadão. O princípio-chave desse modelo é o autogoverno cívico, incorporado em instituições e práticas clássicas como a rotação de cargos. Seu exercício pode ser tanto na participação direta através da atuação nas diversas instâncias de governo, executiva ou legislativa, quanto em colegiados do controle social, como, por exemplo, no caso brasileiro, o Conselho Nacional de Saúde, os conselhos estaduais e municipais de educação entre outros.
Agora, em relação ao termo neoliberal, ele aparece na década de 1980 para designar o velho e conhecido liberalismo, só que agora aplicado ao mundo do pós guerra, mais especificamente aquele fundamentado em diversas teorias liberais desenvolvidas na década de 1970 e implantadas em países como a Inglaterra, de Margareth Thatcher, e o Chile, do general Augusto Pinochet, e que tinham o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial como alguns de seus grandes financiadores. As propostas eram, entre outras: a redução dos gastos públicos; a abertura comercial; privatização de serviços e empresas estatais; flexibilização das regulamentações trabalhistas; redução dos gastos públicos etc.
 
Globalização
Nesta disciplina vimos que, segundo o sociólogo David Held, a globalização é o "processo que engloba uma série de transformações no modo como as relações sociais se organizam espacialmente, gerando fluxos e redes transcontinentais ou inter-regionais de atividades, interações e poder". Para Liszt Vieira, a globalização tem trazido desafios específicos para a cidadania, uma vez que fragiliza aquilo que, até agora, lhe deu fundamentação e garantias, ou seja, o Estado-nação, espaço político e geográfico no qual ela pode ser exercida. Essa fragilização pode ser percebida pelo enfraquecimento progressivo do Estado-nação na sua função de elaborar e decidir projetos políticos nacionais.
 
Teoria de Marshall
Para o sociólogo inglês Thomas H. Marshall, a cidadania é um status concedido àqueles que são membros integrais de uma comunidade, seu desenvolvimento é estimulado tanto pela luta para adquirir os direitos a ela relacionados quanto pelo gozo dos mesmos, uma vez adquiridos. Segundo ele, esse status compreende três elementos: o civil, o político e o social. O elemento civil é composto dos direitos necessários à liberdade individual: liberdade de ir e vir, liberdade de imprensa, pensamento e fé, o direito à propriedade e de concluir contratos válidos e o direito à justiça. Por elemento político se deve entender o direito de participar no exercício do poder político, como um membro de um organismo investido da autoridade política ou como um eleitor dos membros de tal organismo. O elemento social se refere a tudo o que vai desde o direito a um mínimo de bem-estar econômico e segurança ao direito de participar, por completo, na herança social e levar a vida de um ser civilizado de acordo com os padrões que prevalecem na sociedade. No desenvolvimento da cidadania na Inglaterra, esses elementos seguiram uma sequência histórica e lógica, ou seja, primeiro vieram os direitos civis, depois os políticos e por último os direitos sociais.
 
Cidadania transnacional, sem fronteiras, global, planetária
Esses são termos que podem ser utilizados para designar o que chamamos na disciplina de cidadania global.
 
 
Estado
As relações sociais nas cidades-estado (os gregos, os romanos)
Esse não foi um tema abordado diretamente nesta disciplina, que focou mais aspectos éticos e políticos do que sociais. Tais relações estão magistralmente descritas na coleção História da vida privada, dos historiadores franceses Georges Duby e Philippe Ariès, ou mesmo nos trabalhos de Pedro Paulo Funari.
 
Conceito de desterritorialização do Estado?
Nesta disciplina não se falou da questão da desterritorialização do Estado, mas sim da ampliação do conceito de cidadania, a partir do enfraquecimento da soberania do Estado nacional face às forças do processo de globalização: a cidadania global como uma forma de garantir também a manutenção dos direitos da cidadania local.
Uma referência nessa discussão sobre a desterritorialização do estado é o geógrafo Rogério Haesbaert, que em seu livro O mito da desterritorialização escreveu: "O mito da desterritorialização é o mito dos que imaginam que o homem pode viver sem território, que a sociedade pode existir sem territorialidade, como se o movimento de destruição de territórios não fosse sempre, de algum modo, sua reconstrução em novas bases".
 
Diferença entre Estado-nação e Estado-membro, entre cidade-estado e cidade-nação
Aqui, uma distinção se faz necessária: aquela entre cidade-estado e Estado-nação. Como vimos, cidade-estado, ou pólis, é "uma comunidade micro-dimensional, juridicamente soberana e autônoma, de caráter agrário, dotada de um lugar central que lhe serve de centro político, social, administrativo e religioso, o qual é também, frequentemente, sua única aglomeração", a qual tem sua origem na era arcaica das comunidades às margens do mar Mediterrâneo e seu pleno desenvolvimento na era clássica, por volta dos séculos V e IV a.C. Já o Estado-nação, segundo Luís Carlos Bresser-Pereira, vai ser: "o Estado-nação ou país é um tipo de sociedade político-territorial soberana, formada por uma nação, um Estado e um território. É a forma de poder territorial que se impôs nas sociedades modernas a partir da revolução capitalista em substituição aos feudos e principalmente aos impérios antigos". Tem seu início marcado para os finais do século XVIII.
Agora, Estado-membro pode qualificar tanto as entidades regionais de um Estado do tipo federal, quanto um Estado que é membro de uma organização internacional, como, por exemplo, as Nações Unidas. Enquanto cidade-nação é um termo incorreto.
 
 
Questões diversas
Diferença entre moral e ética
Em meados dos anos 2000, havia uma fala, repetida nos quatro cantos deste Brasil varonil por letrados e doutores, segundo a qual o termo “aluno” seria uma composição do prefixo negativo “a” e a palavra “luno”, que queria dizer luz em latim. Assim, aluno seria um ser sem luz, o qual seria iluminado pelo saber do professor. Ora, o aluno não era um sem luz, ou sem saber, ele traz alguma coisa para o processo de ensino e aprendizagem, não é uma tábula rasa. Então, o termo “aluno” não deveria mais ser utilizado, sendo substituído por estudante, educando e outros do gênero. Até que alguém começou a questionar de onde isso tinha saído e fez uma mera consulta ao dicionário de latim, que qualquer um poderia ter feito antes, e descobriu que o termo “aluno” existia no latim (alumnus), com o sentido de discípulo, além disso o “a” (ou alfa) tem sentido privativo no grego, mas não no latim, e por aí vai. Fiz todo esse intróito para demonstrar que, alguma vezes, as pessoas saem por aí repetindo coisas sem saber de onde saíram e se expondo. Pior ainda quando isso é protagonizado por aqueles responsáveis pelo ensino – e o caso acima foi protagonizado por muitos professores doutores (em educação, inclusive!). Na atualidade, essa situação parece ser o caso da tal diferença entre os termos “ética” e “moral”. Existe diferença entre esses termos? Se sim, primeiramente, diga-me de onde ela saiu, para depois me dizer qual é ela. Se não, qual a razão da pergunta? É desalentador ver, em especial no Youtube, uma profusão de professores de cursinho fazendo essa diferenciação e alguns chegando no meio da explicação dizendo: “é, eu sei que é difícil de entender, mas é assim mesmo, coisas da filosofia. O importante é você guardar que...”, e seguem usando um termo pelo outro, em contradição com o que tinham acabado de diferenciar. E, neste ponto, repito o que está escrito acima, ou seja, “alguma vezes, as pessoas saempor aí repetindo coisas sem saber de onde saíram e se expondo. Pior ainda quando isso é protagonizado por aqueles responsáveis pelo ensino – e o caso acima foi [tem sido] protagonizado por muitos professores doutores (em educação [e filosofia], inclusive!)”.
Só por distração, pergunto-me como os filósofos Platão ou Aristóteles diferenciavam a ética da moral. Mas aí, alguém pode lembrar que eles eram gregos e na época em que viviam não conheciam o termo moral. É, bem lembrado! Então, e para um romano como Marco Túlio Cícero, aliás, aquele que traduziu o termo “ética” do grego para “moral” em latim, como ele diferenciava os dois termos? Bom, ele não diferenciava, apenas traduziu um pelo outro. Assim, de onde vem essa tão propalada diferenciação? A resposta mais direta seria “de quem a criou”. O que levaria a acrescentar: e quem a criou? A resposta mais direta seria: “aquele que dela precisava para apresentar seu sistema filosófico/ético”. O que levaria a acrescentar: e quem é esse “aquele”?  A resposta... Bom, é assim que se faz filosofia (não é aceitando tudo que é dito, apenas por ter sido dito – inclusive o que está sendo escrito aqui). Posto isso tudo, digo que não farei essa diferenciação porque ela não foi considerada e nem fez falta nesta disciplina. Apenas recomendo que tomem cuidado com as que aparecem por aí, em especial as da internet, mesmo as feitas por docentes de destaque (é claro, há uma grande possibilidade dessas pessoas saberem de onde ela saiu, mas têm que, por dever ético, deixar isso claro, o que, pelo que vi, a maioria não o faz). Então, cuidado!
 
A disciplina trata das visões clássicas da ética e cidadania (Grécia e Roma). As nações africanas (Egito, por exemplo) e as não-ocidentais são semelhantes às vistas na disciplina? Podemos encontrar referências para conhecer mais sobre essas outras visões?
Como ocidentais, somos extremamente bairristas, ou seja, consideramos o mundo a partir de nossa visão, nossa perspectiva de mundo. Civilização é aquilo que determinamos que seja civilização, o resto é excentricidade ou barbarismo (seria este uso um barbarismo?). O que não está equivocado, para nós, enquanto ocidentais. Fomos socializados a partir de regras, princípios e valores da sociedade ocidental. Acreditamos nessas regras, nesses princípios e valores. Nos baseamos neles nas nossas tomadas de decisão sobre o nosso dia a dia. Ficamos tocados quando eles são respeitados e materializados corretamente no cotidiano. Gritamos e nos revoltamos quando eles são desrespeitados ou pervertidos. Acreditamos tanto neles que queremos que outras culturas também os aceitem, até chegamos a elevá-los à categoria universal. Ora, como vimos, o conceito de cidadania é referente a uma forma específica de participação política, que tem o cidadão como centro do processo de decisão sobre os destinos da comunidade. Tal processo tem data e local de nascimento e renascimento, quer seja no mundo clássico, com a cidade-estado (pólis), quer seja no mundo moderno (com o estado-nação). De qualquer forma, a ideia central é a possibilidade de um grupo de indivíduos dotar-se de seus próprios instrumentos de governo e de organização em todos os níveis, sem a influência de forças divinas. É a saída da situação de servilismo para a de autonomia/liberdade/cidadania.
Agora, outras culturas apresentam diferentes formas de participação no poder. Só citando um caso histórico interessante: Alexandre da Macedônia, aquele que foi aluno de Aristóteles e que ficou conhecido também como “O Grande”, na progressão de suas conquistas, era tido como general pelo gregos, imperador pelo persas, messias pelos judeus e um deus para os egípcios. Cada cultura, cada forma de exercício do poder, considerava o conquistador de acordo com seu contexto. E Alexandre era esperto o suficiente para usar isso a seu favor. Agora, as referências a essas culturas estão nos livros de história, mesmo nos de ensino médio, quando tratam das formas de governo e das relações políticas.
 
Qual a relação existente entre direitos humanos e democracia?
A ideia de direitos humanos vista na disciplina foi a expressada pelas Nações Unidas, segundo a qual “os direitos humanos são direitos inerentes a todos os seres humanos, independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição”.  A democracia, por sua vez, pode ser entendida como uma forma de governo no qual o povo exerce a soberania através da tomada de decisão coletiva. Pode envolver a participação direta dos membros de uma sociedade na decisão sobre as leis e políticas públicas ou pode envolver a participação desses membros na seleção de representantes para tomar as decisões. Sobre ela um dos presidentes americanos, Abraham Lincoln, disse: “A democracia é o governo do povo, pelo povo, para o povo”.  Uma das falas mais famosas sobre a democracia é a do inglês Winston Churchill: “Muitas formas de governo foram tentadas, e serão testadas neste mundo de pecado e aflição. Ninguém finge que a democracia é perfeita ou onisciente. De fato, diz-se que a democracia é a pior forma de governo exceto todas as outras formas que foram testadas de tempos em tempos”. Pelas suas características, a democracia pode ser considerada o terreno ideal para o desenvolvimento da cidadania, bem como dos direitos humanos, a partir de sua inclusão nos direitos fundamentais do cidadão, os quais devem ser garantidos pelo estado.
 
Quais os meios disponíveis para que o cidadão possa reivindicar a aplicação dos direitos humanos numa sociedade onde eles são constantemente ignorados?
Uma das exigências para a efetivação dos direitos humanos é que eles sejam legitimados no ordenamento jurídicos dos países membros das Nações Unidas que aprovaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Neste sentido, o meio clássico para que o cidadão faças suas reivindicações está nas leis de seu próprio país, ou seja, é fazendo com que os direitos que estão no papel sejam efetivamente implantados na prática. Um jornalista chamado Gilberto Dimenstein publicou um livro com o título Cidadão de papel para denunciar essa dessintonia. Um exemplo bem conhecido é o do pastor americano Martin Luther King Jr e sua luta para que os direitos expressos na constituição americana realmente valessem para todos os americanos, e os negros eram americanos, assim deveriam ser respeitados igualmente. 
 
Conceito de racismo institucional, em Silvio de Almeida
Silvio de Almeida é uma grata surpresa no cenário intelectual nacional, pela sua postura acadêmica na discussão de um tema tão sensível como o racismo. Ele se insere como um intelectual que tem algo original a dizer, que tem uma tese a defender, coisa difícil hoje, em especial no nosso sistema industrial de pós-graduação. Concorde-se ou não com sua tese, ela nos provoca a pensar e a repensar muito do que achávamos que sabíamos sobre o racismo. E esse é o trabalho do intelectual: incomodar, abrir novas portas de reflexão. Bom, em sua apresentação disponibilizada na disciplina, ele esclarece que racismo estrutural é um processo histórico e político no qual são atribuídas vantagens associadas a certos grupos e desvantagens associadas a outros. Já o racismo institucional é a forma como o racismo estrutural se manifesta nas instituições estatais e sociais, as quais vão reproduzir certos tipos de comportamentos, naturalizar a existência da raça e de limites jurídicos e econômicos à sua atuação. Essa distinção é importante, segundo Almeida, porque quando se considera o racismo como algo apenas institucional, aí já se tem a forma de combatê-lo, ou seja, através da mudança no funcionamento da instituição. Um exemplo são as políticas de ação afirmativa. Entretanto isso é mais uma forma de distensionar as relações conflituosas do momento, sem solucionar realmente o problema.
 
Relação entre participação, companheirismo, poder, imposição, sociedade servil com a política e a cidadania
Aqui, novamente, tem-se uma série de termos que pedem um exercício de serem juntados. Então vamos,lá. Seguinte: uma sociedade servil é aquela na qual os indivíduos desistiram, ou nunca tiveram condições, de exercer a liberdade de poder escolher os próprios caminhos a serem trilhados pelo grupo do qual fazem parte. Preferiam ou foram obrigados a serem dirigidos por uma personalidade cuja vontade passa a ser a lei, a regra, pela qual tudo é considerado. Neste sentido, tendo em vista que a liberdade para a participação política nas diversas instâncias do poder constituído é condição essencial para o exercício da cidadania, sua ausência é a ausência também da figura do cidadão, pela imposição do servo. O famoso texto de Étienne de La Boétie, sobre a servidão voluntária, caracteriza bem esse tipo de sociedade.
 
 
ENCERRANDO
Ética e cidadania são temas centrais para discutirmos não apenas o mundo atual, mas, acima de tudo, nossa presença neste mundo, enquanto indivíduos e enquanto coletividade. Como escreveu Aristóteles: uma andorinha não faz verão. O indivíduo é importante, mas sem o coletivo ele é fraco frente aos poderes que se levantam contra ele, dependendo dos interesses em jogo - nesse sentido a ação coletiva é fundamental. E temos ainda o dever de pensar na formação/educação para este mundo e para o mundo futuro. Mas, para isso, temos que saber/conhecer que mundo é "este". Os desafios são muitos, mas o primordial é não ficar parado.
PARTE 1: O QUE TEMOS
1. Ética, então, pode ser referente tanto àquilo que faz o filósofo, quando resolve refletir sobre uma instância da vida humana, que está ligada a uma certa forma como nós nos relacionamos com os outros, construída social e historicamente, quanto se referir às regras, aos princípios e valores e as ações a eles ligadas, que compõem a forma como as pessoas se relacionam umas com as outras em comunidade. Enfocando essa última perspectiva, temos que essas regras, esses princípios e valores são interiorizados naquilo que se chama processo de socialização, o qual paulatinamente vai incutindo na pessoa comando e regras morais para sua existência social. O indivíduo, à medida que vai se desenvolvendo, tem as condições de acatar ou criticar tais regras, princípios e valores de acordo com o contexto e as demandas de seu tempo (isso explica a perspectiva histórica deles). A interiorização quando colocada em prática pode ser chamada de consciência, a qual foi definida como "a interiorização dos comandos e proibições de ordem moral vindos do exterior". O indivíduo ao interiorizar tais comandos, o faz de forma consciente e livre, ou seja, eles passam a ser seus valores, seus princípios, suas regras de ação, as quais são compartilhadas pelos outros componentes de seu grupo/comunidade. A aceitação consciente e a sua prática livre de qualquer coação é o que vai diferenciar a perspectiva ética, por exemplo, da perspectiva jurídica, esta focada mais na regra externa e na coação.
2. O processo de socialização se, por um lado, conforma nossa individualidade, ele também conforma a nossa identidade, a partir da experiência com os diversos papéis sociais que vamos experienciando dentro dos micros e macros espaços sociais. A experimentação desses papéis, vai preparando o indivíduo para se tornar um membro da sociedade em sua plenitude, ou seja, aquele que vai participar das várias instâncias/instituições sociais de acordo com procedimentos previamente estabelecidos. Assim, um mesmo indivíduo, por exemplo, cumpre o papel de homem, de marido, de pai, de professor, de religioso, de jogador, de aluno, de tio, de avô, com cada papel sendo definido previamente, a partir do contexto histórico e social de cada época.
3. Esse processo de formação da identidade é essencial para a preservação da comunidade e, neste sentido, ele tem também a função de formar os dirigentes, ou seja, aqueles que comandarão a comunidade. É aqui que entra a formação do soberano, aquele que se responsabilizará pelos caminhos que a comunidade deverá seguir. Dentro de uma perspectiva democrática, esse soberano é o povo, e sua forma de ação será denominada política, passando ele a ser denominado cidadão, dependendo da forma dele exercer esse poder. Neste sentido, o mesmo processo que forma o indivíduo como ser ético, também o forma como ser político. Isto porque é na comunidade que o indivíduo materializa/exerce suas regras, seus princípios e valores éticos, bem como exerce seus direitos e deveres enquanto cidadão. Neste sentido, nossos aplausos para o velho Aristóteles que, pelas suas ideias, continua vivinho em nossas discussões.
4. Essas considerações levam a discussão para o espaço no qual ética e cidadania são exercidas, ou seja, a comunidade. Na perspectiva ocidental, tem-se o costume de iniciar com os antigos gregos e romanos, o que se mostra um bom caminho. Há séculos eles têm servido de parâmetro para se discutir os caminhos da sociedade ocidental, a tal ponto que alguns dizem que três são os livros bases da cultura ocidental: a Bíblia, a Odisséia e a Ilíada. Pois bem, o começo dessa forma de organização política vai se dar com a constituição das cidades-estado (pólis) e sua forma de exercício do poder. Vimos que o exercício da ética e da cidadania necessita de um espaço geográfico no qual possa vigorar/ser implementado.
5. Dando um grande salto histórico aqui, como estratégia pedagógica, passamos para a atualidade, em que dois modelos de exercício do poder se apresentam como os mais discutidos. Um desses modelos, seguindo o modelo clássico, enfoca a participação direta do cidadão na condução dos destinos da comunidade, agora chamada estado-nação ou estado nacional: assim, o cidadão é aquele que está diretamente envolvido na tomada de decisão política. Outro modelo, mais ligado ao pensamento político do século XVII em diante, vai destacar a posse e exercício de direitos, como formas de diferenciação/status dentro de uma comunidade, diferenciando os que tinham direito de participação política, civil e social. O primeiro modelo chamado de modelo republicano é baseado nos exemplos da Grécia democrática e da Roma republicana; o segundo modelo é baseado nos pensadores do estado nacional do século XVII, como Hobbes e Rousseau. A grande diferença aqui é que no segundo modelo, não há obrigatoriamente a necessidade do cidadão ser aquele que toma as decisões, ou seja que tenha o poder: exemplo aqui é o da Roma Imperialista, na qual a cidadania era muito valorizada, mas era esvaziada de poder, uma vez que as decisões cabiam ao imperador e não ao conjunto dos cidadãos. De qualquer forma, os dois modelos não são carentes de objeções e dificuldades. Como falar em exercício direto do poder, através da participação direta, nas complexas sociedades de hoje, em especial quando se tem que trabalhar, dedicar atenção à família entre outras coisas, o que faz sobrar poucos tempo para a atividade política? Mas também como deixar o poder nas mãos de um grupo que decidirá sobre o futuro de todos os cidadãos? A saída tem sido uma certa mistura dos dois modelos a qual vai se colocando de acordo com a visão dominante ou mais influente de acordo com quem está no poder. De qualquer forma, é necessária uma posição do cidadão sobre como estabelecer o poder, ou como exercer a cidadania em seu território.
6. Até aqui ética, cidadania, território e poder andam juntos, dentro de um espaço geográfico e político chamado estado-nação. Entretanto nas últimas décadas essa relação tem sido posta à prova pelo advento do chamado processo de globalização ou internacionalização (denominação dependente do viés ideológico de quem fala), que reduziu espaço e tempo. Isso evidentemente trouxe desafio à soberania dos estado nacionais, com a qual eles exerciam seu poder sobre seus membros. Com a globalização, tais estados começaram a ver sua autonomia de decisão ser questionada e retirada por posições alheias a seus territórios.
7. O apelo à representatividade/atuação supranacional passa a ser visto como uma forma de sobrevivência para os estados nacionais.  Não é que eles perderam representatividade, acontece que sem uma ação coordenadade nível internacional, dificilmente eles têm condições/poder de fazer frente aos interesses dos países mais poderosos e das grandes corporações internacionais. A ação internacional é a forma de sobrevivência que os estados nacionais têm para atuar com um mínimo de força num cenário não muito colaborativo, em que os interesses do mais forte normalmente prevalecem, quando não são confrontados por uma força maior.
8. Essa nova situação cria o que se chamou de cidadania global, a qual deve ser vista como uma continuidade da cidadania nacional, mais um papel assumido pelo cidadão, entre tantos que ele já tem que cumprir.
9. A ética nesse cenário tem que ser uma ética mais ampla, que, sem desconsiderar os valores locais, seja aplicável em todos eles. Os direitos humanos aqui podem servir como fundamento para essa ética.
 
 
PARTE 2: DIRETO AO PONTO
Tópicos retirados de dúvidas apresentadas por estudantes, com respostas (mais ou  menos) diretas.
 
Cidadania
Ética e compromisso com a promoção de cidadania
Nesta disciplina, trabalhou-se com o pensamento do filósofo grego Aristóteles sobre a ética e a política. Para Aristóteles a ética era uma forma de excelência que estava ligada à formação do caráter das pessoas, ou seja, estava relacionada a uma certa forma de viver que buscava cumprir no seu máximo aquilo que era considerado o fim último do ser humano, aquele fim que é perseguido por ele mesmo e não em vista a outro fim qualquer ou maior, ou seja, a felicidade. E como o ser humano atingia esse fim? Agindo de uma certa forma, de acordo com uma certa excelência, ou seja, virtuosamente. E essa virtuosidade estava ligada a agir sempre numa certa medianidade entre dois excessos. Assim, a virtude da coragem era a medianidade entre a covardia e a temeridade, a virtude da temperança era a medianidade entre a insensibilidade e a libertinagem, a virtude da liberalidade era a medianidade entre a avareza e o esbanjamento.
A boa ação era sempre aquela que seria feita pelo ser virtuoso, e tal ação era conquistada pelo hábito - não nascemos bons ou maus, nos tornamos bons ou maus de acordo nos nossos hábitos. Ora, o ser bom e virtuoso não é uma idealização, ele deve ter um local para agir, para desenvolver seus hábitos, para se tornar virtuoso. E onde seria esse lugar? Justamente na pólis, na cidade. Lembrem-se que a moral necessita das duas dimensões: a dos valores e a das ações, o normativo e o factual. Será na cidade que o ser virtuoso pode exercer a virtude. E uma cidade dirigida por seres virtuosos mais facilmente possibilitará a todos atingirem o fim ao qual estão destinados por natureza, ou, como disse Marilena Chaui, "à vida justa, bela e feliz".
Esta pode ser uma relação básica a ser estabelecida entre a ética e a cidadania. É, até mesmo, a forma do senso comum pensar a relação entre ética e política no seu cotidiano. É claro, ela não é a única, outras são apresentadas no decorrer da história e que podem ser discutidas em uma futura disciplina de ética e política.
 
Ética global e cidadania global
Como vimos, a cidadania global, segundo as Nações Unidas, é "o conceito de que a identidade de alguém transcende, mesmo que respeite, as fronteiras geográficas e nacionais, e que nossas ações sociais, políticas, ambientais e econômicas ocorrem em um mundo interconectado". Além disso, a cidadania global pode ser vista, também, como forma de manter, no nível político, a soberania popular, em contraposição aos interesses das grandes corporações transnacionais e dos países mais poderosos. Uma forma de "assegurar a democracia política, o desenvolvimento social, a proteção ambiental e a diversidade cultural, nos planos local, nacional e global" A proposta aqui é considerar a cidadania global como uma continuidade da cidadania estatal, um continuum, sendo a identidade supranacional uma segunda identidade. Segundo as Nações Unidas, a cidadania global diz respeito, ainda, a "um sentimento de pertencer à comunidade global e à humanidade comum, com seus membros experimentando solidariedade e identidade coletiva entre si e responsabilidade coletiva no nível global". Isso conduz à ideia de Ética global, ou seja, um conjunto de ideias éticas fundamentais (como a dignidade humana) que são aceitas globalmente e que estabelecem uma base sobre a qual as pessoas lidam umas com as outras no mundo. Essa ética tem como pilares alguns princípios, como:
· a boa governança e o respeito às leis, em nível nacional e global;
· a responsabilidade pelo planeta e clima, e as obrigações para com as gerações futuras;
· a responsabilidade humanitária básica pelo outro em situação de vulnerabilidade;
· a erradicação da pobreza extrema;
· o compromisso contra as guerras e defesa da segurança internacional; e
· a eliminação de armas nucleares e outras armas de destruição em massa, entre outros.
Esses princípios têm como base os direitos humanos, enquanto direitos inerentes a todos os seres humanos, independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição.
 
Formas de exercício da cidadania
Vimos que as formas de exercício da cidadania vão depender do tipo de modelo de cidadania que está sendo abordado. Abordamos na disciplina dois modelos. No modelo democrático (ou republicano) o princípio-chave é o autogoverno cívico pela participação direto do cidadão nas instância políticas. No modelo liberal, o enfoque está mais na garantia dos direitos individuais e na liberdade dos cidadãos, sendo o exercício da cidadania ligado ao exercício dos direitos a ela relacionados.
 
Influência da Revolução Francesa no conceito de cidadania
Três são as grandes declarações que têm influência sobre a instituição dos direitos humanos e no desenvolvimento da cidadania no mundo ocidental: a declaração de independência dos Estados Unidos da América, de 1776; a declaração francesa dos direitos do homem e do cidadão, de 1789; e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948.
A primeira começa afirmando:  "Consideramos  estas  verdades  como  evidentes  por  si  mesmas,  que  todos  os homens  são  criados  iguais,  dotados  pelo  Criador  de  certos  direitos  inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade."
A segunda, no seu preâmbulo afirma: "Os representantes do povo francês, reunidos em Assembléia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos governos, resolveram expor, em uma declaração solene, os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que essa declaração, constantemente presente junto a todos os membros do corpo social, lembre-lhes permanentemente seus direitos e deveres...".
A terceira, por sua vez, inicia da seguinte forma: "Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo..."
Sem tirar o mérito histórico de nenhuma delas, pode-se dizer que a mais considerada deve ser a segunda, ou seja a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, nascida da Revolução Francesa. Sobre ela, Lynn Hunt, em seu livro A invenção dos direitos humanos, escreveu:
"Sem mencionar nem uma única vez rei, nobreza ou igreja, declarava que ‘os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem’ são a fundação de todo e qualquer governo. Atribuía à soberania à nação, e não ao rei, e declarava que todos são iguais perante a lei, abrindo posições para o talento e o mérito e eliminando implicitamente todo o privilégio baseado no nascimento. Mais extraordinária que qualquer garantia particular, entretanto, era a universalidade das afirmações feitas. As referências a ‘homens’, ‘homem’, ‘todo homem’, ‘todos os homens’, ‘todos os cidadãos’, ‘cada cidadão’, ‘sociedade’ e ‘toda sociedade’ eclipsavam a única referência ao povo francês".
Essa salvaguarda dos direitos universais era a aurora de uma nova era de liberdade baseada na razão.A declaração passa, então, a ter influência decisiva sobre as discussões sobre os direitos dos cidadãos nos estados nacionais constituídos.
 
Modelos de cidadania e governo (republicano, liberal, neoliberal) com exemplos práticos no Brasil.
Consideramos a existência de dois modelos que se enfrentam na conceitualização da cidadania. No primeiro, o modelo liberal, o papel do cidadão é visto de forma individual e instrumental, os indivíduos são pessoas privadas, externas ao Estado, sendo a cidadania definida como um status concedido àqueles que são membros integrais de uma comunidade, esse status compreende três elementos: o civil, o político e o social. O elemento civil é exercido através dos direitos necessários à liberdade individual, como, por exemplo, a liberdade de ir e vir, a liberdade de imprensa, o direito à propriedade e o direito à justiça. O elemento político é exercido através dos direitos de participar no exercício do poder político. O elemento social é exercido através do direito ao bem-estar econômico, à segurança e a levar a vida de um ser civilizado de acordo com os padrões que prevalecem na sociedade. Segundo Cesar Augusto Ramos, esse modelo de cidadania acaba deslocando a compreensão normativa das ações humanas da política e da ética para o direito: "regramento jurídico da vida e das relações sociais determina os limites da liberdade individual,  protege os direitos, especialmente as liberdades individuais, e define o alcance do poder político".
No segundo modelo de cidadania, o democrático ou republicano, prevalece uma concepção comunitarista, definindo a participação no governo como essência da liberdade, como componente essencial da constituição do cidadão. O princípio-chave desse modelo é o autogoverno cívico, incorporado em instituições e práticas clássicas como a rotação de cargos. Seu exercício pode ser tanto na participação direta através da atuação nas diversas instâncias de governo, executiva ou legislativa, quanto em colegiados do controle social, como, por exemplo, no caso brasileiro, o Conselho Nacional de Saúde, os conselhos estaduais e municipais de educação entre outros.
Agora, em relação ao termo neoliberal, ele aparece na década de 1980 para designar o velho e conhecido liberalismo, só que agora aplicado ao mundo do pós guerra, mais especificamente aquele fundamentado em diversas teorias liberais desenvolvidas na década de 1970 e implantadas em países como a Inglaterra, de Margareth Thatcher, e o Chile, do general Augusto Pinochet, e que tinham o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial como alguns de seus grandes financiadores. As propostas eram, entre outras: a redução dos gastos públicos; a abertura comercial; privatização de serviços e empresas estatais; flexibilização das regulamentações trabalhistas; redução dos gastos públicos etc.
 
Globalização
Nesta disciplina vimos que, segundo o sociólogo David Held, a globalização é o "processo que engloba uma série de transformações no modo como as relações sociais se organizam espacialmente, gerando fluxos e redes transcontinentais ou inter-regionais de atividades, interações e poder". Para Liszt Vieira, a globalização tem trazido desafios específicos para a cidadania, uma vez que fragiliza aquilo que, até agora, lhe deu fundamentação e garantias, ou seja, o Estado-nação, espaço político e geográfico no qual ela pode ser exercida. Essa fragilização pode ser percebida pelo enfraquecimento progressivo do Estado-nação na sua função de elaborar e decidir projetos políticos nacionais.
 
Teoria de Marshall
Para o sociólogo inglês Thomas H. Marshall, a cidadania é um status concedido àqueles que são membros integrais de uma comunidade, seu desenvolvimento é estimulado tanto pela luta para adquirir os direitos a ela relacionados quanto pelo gozo dos mesmos, uma vez adquiridos. Segundo ele, esse status compreende três elementos: o civil, o político e o social. O elemento civil é composto dos direitos necessários à liberdade individual: liberdade de ir e vir, liberdade de imprensa, pensamento e fé, o direito à propriedade e de concluir contratos válidos e o direito à justiça. Por elemento político se deve entender o direito de participar no exercício do poder político, como um membro de um organismo investido da autoridade política ou como um eleitor dos membros de tal organismo. O elemento social se refere a tudo o que vai desde o direito a um mínimo de bem-estar econômico e segurança ao direito de participar, por completo, na herança social e levar a vida de um ser civilizado de acordo com os padrões que prevalecem na sociedade. No desenvolvimento da cidadania na Inglaterra, esses elementos seguiram uma sequência histórica e lógica, ou seja, primeiro vieram os direitos civis, depois os políticos e por último os direitos sociais.
 
Cidadania transnacional, sem fronteiras, global, planetária
Esses são termos que podem ser utilizados para designar o que chamamos na disciplina de cidadania global.
 
 
Estado
As relações sociais nas cidades-estado (os gregos, os romanos)
Esse não foi um tema abordado diretamente nesta disciplina, que focou mais aspectos éticos e políticos do que sociais. Tais relações estão magistralmente descritas na coleção História da vida privada, dos historiadores franceses Georges Duby e Philippe Ariès, ou mesmo nos trabalhos de Pedro Paulo Funari.
 
Conceito de desterritorialização do Estado?
Nesta disciplina não se falou da questão da desterritorialização do Estado, mas sim da ampliação do conceito de cidadania, a partir do enfraquecimento da soberania do Estado nacional face às forças do processo de globalização: a cidadania global como uma forma de garantir também a manutenção dos direitos da cidadania local.
Uma referência nessa discussão sobre a desterritorialização do estado é o geógrafo Rogério Haesbaert, que em seu livro O mito da desterritorialização escreveu: "O mito da desterritorialização é o mito dos que imaginam que o homem pode viver sem território, que a sociedade pode existir sem territorialidade, como se o movimento de destruição de territórios não fosse sempre, de algum modo, sua reconstrução em novas bases".
 
Diferença entre Estado-nação e Estado-membro, entre cidade-estado e cidade-nação
Aqui, uma distinção se faz necessária: aquela entre cidade-estado e Estado-nação. Como vimos, cidade-estado, ou pólis, é "uma comunidade micro-dimensional, juridicamente soberana e autônoma, de caráter agrário, dotada de um lugar central que lhe serve de centro político, social, administrativo e religioso, o qual é também, frequentemente, sua única aglomeração", a qual tem sua origem na era arcaica das comunidades às margens do mar Mediterrâneo e seu pleno desenvolvimento na era clássica, por volta dos séculos V e IV a.C. Já o Estado-nação, segundo Luís Carlos Bresser-Pereira, vai ser: "o Estado-nação ou país é um tipo de sociedade político-territorial soberana, formada por uma nação, um Estado e um território. É a forma de poder territorial que se impôs nas sociedades modernas a partir da revolução capitalista em substituição aos feudos e principalmente aos impérios antigos". Tem seu início marcado para os finais do século XVIII.
Agora, Estado-membro pode qualificar tanto as entidades regionais de um Estado do tipo federal, quanto um Estado que é membro de uma organização internacional, como, por exemplo, as Nações Unidas. Enquanto cidade-nação é um termo incorreto.
 
 
Questões diversas
Diferença entre moral e ética
Em meados dos anos 2000, havia uma fala, repetida nos quatro cantos deste Brasil varonil por letrados e doutores, segundo a qual o termo “aluno” seria uma composição do prefixo negativo “a” e a palavra “luno”, que queria dizer luz em latim. Assim, aluno seria um ser sem luz, o qual seria iluminado pelo saber do professor. Ora, o aluno não era um sem luz, ou sem saber, ele traz alguma coisa para o processo de ensino e aprendizagem, não é uma tábula rasa. Então, o termo “aluno” não deveria mais ser utilizado, sendo substituído por estudante, educando e outrosdo gênero. Até que alguém começou a questionar de onde isso tinha saído e fez uma mera consulta ao dicionário de latim, que qualquer um poderia ter feito antes, e descobriu que o termo “aluno” existia no latim (alumnus), com o sentido de discípulo, além disso o “a” (ou alfa) tem sentido privativo no grego, mas não no latim, e por aí vai. Fiz todo esse intróito para demonstrar que, alguma vezes, as pessoas saem por aí repetindo coisas sem saber de onde saíram e se expondo. Pior ainda quando isso é protagonizado por aqueles responsáveis pelo ensino – e o caso acima foi protagonizado por muitos professores doutores (em educação, inclusive!). Na atualidade, essa situação parece ser o caso da tal diferença entre os termos “ética” e “moral”. Existe diferença entre esses termos? Se sim, primeiramente, diga-me de onde ela saiu, para depois me dizer qual é ela. Se não, qual a razão da pergunta? É desalentador ver, em especial no Youtube, uma profusão de professores de cursinho fazendo essa diferenciação e alguns chegando no meio da explicação dizendo: “é, eu sei que é difícil de entender, mas é assim mesmo, coisas da filosofia. O importante é você guardar que...”, e seguem usando um termo pelo outro, em contradição com o que tinham acabado de diferenciar. E, neste ponto, repito o que está escrito acima, ou seja, “alguma vezes, as pessoas saem por aí repetindo coisas sem saber de onde saíram e se expondo. Pior ainda quando isso é protagonizado por aqueles responsáveis pelo ensino – e o caso acima foi [tem sido] protagonizado por muitos professores doutores (em educação [e filosofia], inclusive!)”.
Só por distração, pergunto-me como os filósofos Platão ou Aristóteles diferenciavam a ética da moral. Mas aí, alguém pode lembrar que eles eram gregos e na época em que viviam não conheciam o termo moral. É, bem lembrado! Então, e para um romano como Marco Túlio Cícero, aliás, aquele que traduziu o termo “ética” do grego para “moral” em latim, como ele diferenciava os dois termos? Bom, ele não diferenciava, apenas traduziu um pelo outro. Assim, de onde vem essa tão propalada diferenciação? A resposta mais direta seria “de quem a criou”. O que levaria a acrescentar: e quem a criou? A resposta mais direta seria: “aquele que dela precisava para apresentar seu sistema filosófico/ético”. O que levaria a acrescentar: e quem é esse “aquele”?  A resposta... Bom, é assim que se faz filosofia (não é aceitando tudo que é dito, apenas por ter sido dito – inclusive o que está sendo escrito aqui). Posto isso tudo, digo que não farei essa diferenciação porque ela não foi considerada e nem fez falta nesta disciplina. Apenas recomendo que tomem cuidado com as que aparecem por aí, em especial as da internet, mesmo as feitas por docentes de destaque (é claro, há uma grande possibilidade dessas pessoas saberem de onde ela saiu, mas têm que, por dever ético, deixar isso claro, o que, pelo que vi, a maioria não o faz). Então, cuidado!
 
A disciplina trata das visões clássicas da ética e cidadania (Grécia e Roma). As nações africanas (Egito, por exemplo) e as não-ocidentais são semelhantes às vistas na disciplina? Podemos encontrar referências para conhecer mais sobre essas outras visões?
Como ocidentais, somos extremamente bairristas, ou seja, consideramos o mundo a partir de nossa visão, nossa perspectiva de mundo. Civilização é aquilo que determinamos que seja civilização, o resto é excentricidade ou barbarismo (seria este uso um barbarismo?). O que não está equivocado, para nós, enquanto ocidentais. Fomos socializados a partir de regras, princípios e valores da sociedade ocidental. Acreditamos nessas regras, nesses princípios e valores. Nos baseamos neles nas nossas tomadas de decisão sobre o nosso dia a dia. Ficamos tocados quando eles são respeitados e materializados corretamente no cotidiano. Gritamos e nos revoltamos quando eles são desrespeitados ou pervertidos. Acreditamos tanto neles que queremos que outras culturas também os aceitem, até chegamos a elevá-los à categoria universal. Ora, como vimos, o conceito de cidadania é referente a uma forma específica de participação política, que tem o cidadão como centro do processo de decisão sobre os destinos da comunidade. Tal processo tem data e local de nascimento e renascimento, quer seja no mundo clássico, com a cidade-estado (pólis), quer seja no mundo moderno (com o estado-nação). De qualquer forma, a ideia central é a possibilidade de um grupo de indivíduos dotar-se de seus próprios instrumentos de governo e de organização em todos os níveis, sem a influência de forças divinas. É a saída da situação de servilismo para a de autonomia/liberdade/cidadania.
Agora, outras culturas apresentam diferentes formas de participação no poder. Só citando um caso histórico interessante: Alexandre da Macedônia, aquele que foi aluno de Aristóteles e que ficou conhecido também como “O Grande”, na progressão de suas conquistas, era tido como general pelo gregos, imperador pelo persas, messias pelos judeus e um deus para os egípcios. Cada cultura, cada forma de exercício do poder, considerava o conquistador de acordo com seu contexto. E Alexandre era esperto o suficiente para usar isso a seu favor. Agora, as referências a essas culturas estão nos livros de história, mesmo nos de ensino médio, quando tratam das formas de governo e das relações políticas.
 
Qual a relação existente entre direitos humanos e democracia?
A ideia de direitos humanos vista na disciplina foi a expressada pelas Nações Unidas, segundo a qual “os direitos humanos são direitos inerentes a todos os seres humanos, independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição”.  A democracia, por sua vez, pode ser entendida como uma forma de governo no qual o povo exerce a soberania através da tomada de decisão coletiva. Pode envolver a participação direta dos membros de uma sociedade na decisão sobre as leis e políticas públicas ou pode envolver a participação desses membros na seleção de representantes para tomar as decisões. Sobre ela um dos presidentes americanos, Abraham Lincoln, disse: “A democracia é o governo do povo, pelo povo, para o povo”.  Uma das falas mais famosas sobre a democracia é a do inglês Winston Churchill: “Muitas formas de governo foram tentadas, e serão testadas neste mundo de pecado e aflição. Ninguém finge que a democracia é perfeita ou onisciente. De fato, diz-se que a democracia é a pior forma de governo exceto todas as outras formas que foram testadas de tempos em tempos”. Pelas suas características, a democracia pode ser considerada o terreno ideal para o desenvolvimento da cidadania, bem como dos direitos humanos, a partir de sua inclusão nos direitos fundamentais do cidadão, os quais devem ser garantidos pelo estado.
 
Quais os meios disponíveis para que o cidadão possa reivindicar a aplicação dos direitos humanos numa sociedade onde eles são constantemente ignorados?
Uma das exigências para a efetivação dos direitos humanos é que eles sejam legitimados no ordenamento jurídicos dos países membros das Nações Unidas que aprovaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Neste sentido, o meio clássico para que o cidadão faças suas reivindicações está nas leis de seu próprio país, ou seja, é fazendo com que os direitos que estão no papel sejam efetivamente implantados na prática. Um jornalista chamado Gilberto Dimenstein publicou um livro com o título Cidadão de papel para denunciar essa dessintonia. Um exemplo bem conhecido é o do pastor americano Martin Luther King Jr e sua luta para que os direitos expressos na constituição americana realmente valessem para todos os americanos, e os negros eram americanos, assim deveriam ser respeitados igualmente. 
 
Conceito de racismo institucional, em Silvio de Almeida
Silvio de Almeida é uma grata surpresa no cenário intelectual nacional, pela sua postura acadêmica na discussão de um tema tão sensível como o racismo. Ele se insere como um intelectual que tem algo original a dizer, que tem uma tese a defender,coisa difícil hoje, em especial no nosso sistema industrial de pós-graduação. Concorde-se ou não com sua tese, ela nos provoca a pensar e a repensar muito do que achávamos que sabíamos sobre o racismo. E esse é o trabalho do intelectual: incomodar, abrir novas portas de reflexão. Bom, em sua apresentação disponibilizada na disciplina, ele esclarece que racismo estrutural é um processo histórico e político no qual são atribuídas vantagens associadas a certos grupos e desvantagens associadas a outros. Já o racismo institucional é a forma como o racismo estrutural se manifesta nas instituições estatais e sociais, as quais vão reproduzir certos tipos de comportamentos, naturalizar a existência da raça e de limites jurídicos e econômicos à sua atuação. Essa distinção é importante, segundo Almeida, porque quando se considera o racismo como algo apenas institucional, aí já se tem a forma de combatê-lo, ou seja, através da mudança no funcionamento da instituição. Um exemplo são as políticas de ação afirmativa. Entretanto isso é mais uma forma de distensionar as relações conflituosas do momento, sem solucionar realmente o problema.
 
Relação entre participação, companheirismo, poder, imposição, sociedade servil com a política e a cidadania
Aqui, novamente, tem-se uma série de termos que pedem um exercício de serem juntados. Então vamos, lá. Seguinte: uma sociedade servil é aquela na qual os indivíduos desistiram, ou nunca tiveram condições, de exercer a liberdade de poder escolher os próprios caminhos a serem trilhados pelo grupo do qual fazem parte. Preferiam ou foram obrigados a serem dirigidos por uma personalidade cuja vontade passa a ser a lei, a regra, pela qual tudo é considerado. Neste sentido, tendo em vista que a liberdade para a participação política nas diversas instâncias do poder constituído é condição essencial para o exercício da cidadania, sua ausência é a ausência também da figura do cidadão, pela imposição do servo. O famoso texto de Étienne de La Boétie, sobre a servidão voluntária, caracteriza bem esse tipo de sociedade.
 
 
ENCERRANDO
Ética e cidadania são temas centrais para discutirmos não apenas o mundo atual, mas, acima de tudo, nossa presença neste mundo, enquanto indivíduos e enquanto coletividade. Como escreveu Aristóteles: uma andorinha não faz verão. O indivíduo é importante, mas sem o coletivo ele é fraco frente aos poderes que se levantam contra ele, dependendo dos interesses em jogo - nesse sentido a ação coletiva é fundamental. E temos ainda o dever de pensar na formação/educação para este mundo e para o mundo futuro. Mas, para isso, temos que saber/conhecer que mundo é "este". Os desafios são muitos, mas o primordial é não ficar parado.

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