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DIREITOS REAIS
206. Os factos constitutivos da posse
No direito português, existem dois factos constitutivos da posse
1684
: o apos-
samento e a inversão do título da posse. Procedemos à análise individualizada
de cada um deles.
207. O apossamento
I. O apossamento designa a apreensão do controlo material da coisa por
aquele que até aí não a tinha em seu poder. Segundo a alínea a) do art. 1263.Q
seriam necessários três requisitos para haver apossamento:
Uma prática de actos materiais (a)),
Reiteração da prática dos actos materiais (b));
— Publicidade dos actos materiais (c)).
A) A prática de actos materiais
1. O apossamento constitui a tomada do controlo material da coisa e
concretiza-se, pois, através dos actos físicos necessários à sua apreensão.
Como 0 que está em causa é a investidura no corpus possessório de alguém
que não tinha a coisa consigo, o agente tem de actuar de molde a tê-la em seu
poder.
aproveita o seu amigo estar distraído e coloca o telemóvel dele no seu bolso,
Com intenção de se apropriar do mesmo. B, sabendo que o andar X está devoluto,
arromba a fechadura e instala-se lá. C furta as chaves do automóvel de no res-
taurante e foge com ele, escondendo-o na sua garagem.
O apossamento ocorre, por conseguinte, num nível fáctico de actuação,
supondo um comportamento através do qual o agente ganha o seu controlo
material.
O controlo material adquirido não tem de ser exclusivo, no sentido de
privar outras pessoas do controlo material que também tenham sobre a coisa.
Mas isto tem de ser bem entendido para não gerar confusões. Um apossamento
nos termos da propriedade singular priva o possuidor anterior nos termos da
propriedade do acesso à coisa; se este continua a poder actuar sobre a coisa é
porque o apossamento não se consumou. No entanto, um apossamento nos
Ou, se se preferir, dois modos. de aquisição originária da posse.
506
A POSSE
termos da propriedade pode coexistir com o controlo material que outros
possuidores nos termos do mesmo direito real, em situações de comunhão,
ou de direitos reais menores16RS exerçam igualmente sobre a coisa.
Se o proprietário de um prédio inicia a sua passagem sistemática pelo
prédio vizinho e o possuidor deste nada faz para o impedir, consumando-se o
apossamento a certa altura com o controlo material da área utilizada, a posse
nos termos da servidão predial de passagem não afasta naturalmente a posse
exercida relativamente à propriedade no prédio serviente.
Por último, o apossamento pode ocorrer nos termos de qualquer direito
real de gozo e não apenas quanto à propriedade. Neste caso, é claro que a
constituição da posse a favor daquele que se apossa da coisa não é incompa-
tível com o controlo material que outros exercem sobre a coisa por referência
a outros direitos reais de gozo, desde logo, a propriedade.
vende o usufruto do prédio X a n, mas recusa-se injustificadamente a fazer
a entrega da coisa ao usufrutuário. instala-se, então, no pédio contra a vontade
de para iniciar o exercício do seu direito. Aferindo a sua actuação ao título
(compra e venda), concretiza um apossamento nos termos de um usufruto e a
sua posse coexistirá com a do proprietário.
2. O apossamento surge ao nível da actuação fisica sobre a coisa; trata-
-se da criação de um estado de facto em que o agente, querendo, passa a ter
a possibilidade de actuar directamente sobre ela. Desde SAVIGNY 1686 que se
acentua que o apossamento supõe a sujeição física da coisa ao agente,
Relativamente à situação de terceiros, importa considerar a posição dos
possuidores cujo corpus é afectado pelo apossamento de outrem. O apossa-
mento só se concretiza com a quebra do corpus de possuidor anterior. Mas é
possível destacar, pelo menos, dois grupos de casos. No primeiro grupo, o
apossamento acarreta a quebra do corpus possessório de todos os possuidores
da coisa, de modo a que o novo possuidor controla a coisa por inteiro, o que é
sinónimo da exteriorização de uma propriedade singular não onerada.
No segundo grupo, o apossamcnto apenas quebra o corpus de uma das
posses, justamente aquela cujo exercício é incompatível com o direito exte-
riorizado pelo novo possuidor, respeitando as outras.
Ou mesmo nos termos de direitos de diferente natureza.
Das Recht Des Besttz.es, cit., pág. 211.
507
DIREITOS REAIS
A possui o prédio X nos termos da propriedade e B nos termos de Usufruto. C
afasta 11 do controlo material da coisa, mas actua respeitando a posse de B neste
caso, apenas a posse de A é posta em causa, não a B, que permanece.
B) Reiteração da prática dos actos materiais
O art. 12639, alínea a) menciona a "prática reiterada" dos actos materiais.
Muito justamente, OLIVEIRA ASCENSÃ0 1687 critica a formulação do preceito,
na medida em que ele induz falsamente a necessidade de uma repetição da
actuação material, quando o que está em causa é somente a tomada do con-
trolo material da coisa, que se pode consumar num único acto.
Na verdade, o controlo material da coisa pode advir somente de um con-
junto de actos repetidos. O proprietário que leva o seu rebanho a pastar um
vez no prédio do vizinho, não tem certamente o controlo material sobre ele,
de modo a se poder falar de uma posse nos termos de uma servidão predial de
pasto. No entanto, a continuação da prática de actos desse tipo pode induzir
um controlo material do imóvel para o exercício da servidão.
Simplesmente, existem muitas outras situações em que um único acto ou
um número muito limitado de actos não repetidos, basta para consumar a
apropriação fisica da coisa e a tomada dc controlo material sobre ela. O car-
teirista que furta a carteira a um passageiro no transporte realiza num único
acto o apossamento da coisa.
Decisivo será, assim, não a repetição da actuação material, que, de resto,
pode ser muito diferenciada, mas a intensidade da actuação sobre a coisa para
consumar o controlo delat688
Um controlo material da coisa que seja episódico, efémero, transitório
não é suficiente para o apossamento. Este requer que o possuidor esteja em
condições de actuar duradouramente sobre a coisa1639, ou seja, de a conservar
debaixo do seu poder. Isto não quer dizer, porém, que a posse tenha de se
manter duradouramente para que haja apossament01690, mas que deve existir
essa possibilidade abstracta.
A circunstancia do possuidor abandonar a coisa logo a seguir à sua apre-
ensão material ou de ser dela privado por um acto de terceiro não obsta ao
Direito Civil — Reais, cit., pág. 81 e seg. Cf. também MENEZES CORDEIRO, A Posse, cit., pág. 104.
OLIVEIRA ASCENSÃO, Direito Civil — Reais, cit., pág. 81 e seg. e MENEZES CORDEIRO, A
Posse, cit., pág. 104.
CE igualmente MENgzzs CORDEIRO, A Posse, cit., pág. 104.
Em sentido contrário, cf. MULLER, Sachenrecht, cit., pág. 28.
508
POSSE
apossamento se o agente chegou a consumar a apreensão material da coisa e
tinha a possibilidade de manter o controlo dela.
O tempo não é assim relevante para o apossamento; o que conta é sempre
a intensidade da actuação para criar o controlo material da coisa pelo sujeito.
SCHWAB/PRÜTING 1691 discordam aparentemente, afirmando que tem de
haver sempre um momento para a aquisição do poder de facto sobre a coisa.
Pensamos, todavia, que isto nada a tem a ver com um significado autónomo
do tempo para a aquisição da posse por apossamento.
encontrou um animal sem dono e pegou nele para o levar para casa. No
caminho surge um terceiro que lhe furta o animal. O apossamento chegou a
consumar-se com a apreensão do animal, pois o possuidor estava em condições
de continuar a actuação material não fora o acto do terceiro. Do mesmo modo,
se imediatamente após ter consumado a apreensão do animal, se arrepende e
solta o mesmo, chegou a haver apossamento.
C) Publicidade dos actos materiais
A referência à publicidade na alínea a) do art. 1263.2 deve igualmente
ser esclarecida1692. Como veremos adiante, a lei portuguesa admite a posse
oculta1693, que não é naturalmente uma posse exercida com publicidade. Comocompatibilizar, assim, a previsão da posse oculta como verdadeira posse com
o requisito de publicidade dos actos materiais do apossamento?
Pensamos que a explicação se encontra no facto de se pretender negar
a posse àqueles que praticam actos materiais de aproveitamento da coisa às
escondidas do possuidor, sem que, contudo, afastem este do controlo mate-
rial. O carácter oculto da actuação equivale aqui à ausência de um controlo
material, portanto, do corpus e, logo, da própria posse.
leva o seu gado a beber no riacho do prédio vizinho todas as noites, apro-
veitando a escuridão para não tornar notado o seu comportamento ao possuidor.
usa o tractor de C quando este não se encontra no prédio a trabalhar. Nestes
dois exemplos, os actos materiais são praticados às ocultas, mas não é isso que
impede a posse de e B. O que obsta à posse destes é a circunstância de não terem
Sachenrecht, cit., pág. 32.
No sentido que a publicidade é integrante do apossamento, veja-se MANUEL RODRIGUES, A
Posse, cit., pág. 187 e seg.
Cf. inra na Secção
soo
JoaoGasopoN
Realce
JoaoGasopoN
Realce
JoaoGasopoN
Realce
DIREITOS REAIS
o controlo material da coisa e, deste modo, o corpus possessório. Já se levasse
o tractor consigo, apossar-se-ía do mesmo, ainda que C não pudesse conhecer a
pessoa do esbulhador.
Em todo o caso, o carácter oculto da actuação material do agente não obsta
à constituição de uma posse a favor deste, por apossamento, sempre que este
envolva a tomada do controlo material da coisa. Havendo corpus e não desca-
racterizando a lei a situação para mera detenção, há posse, ainda que oculta.
Na Alemanha, tem-se sustentado uma posição diferente, que a obtenção
da posse deve ser reconhecida do exterior1694. Julgamos, no entanto, que esta
posição não se harmoniza com a previsão da posse oculta como verdadeira
posse que ocorre no direito português.
Teria sido preferível não fazer qualquer menção à publicidade em sede de
apossamento. Não se harmoniza bem com o requisito básico da posse, o cor-
pus, que pode existir sem publicidade, e cria uma potencial contradição com
o regime da posse oculta, que também é posse.
II. O animusouvontade de ter a posse tem sido muitas vezes mencionado
como requisito do apossamento, no direito roman0 1695 e no direito actual,
falando, porém, os autores modernos numa vontade naturalística e não numa
vontade jurídico-negocia11696. Os autores referem que uma actuação diriõda ao
controlo da coisa não seria pensável sem a vontade correspondente do sujeito.
Em Portugal, MANUEL RODRIGUES1697 veiO defender que o acto de inves-
tidura na posse «há-de conter um elemento que estabeleça a relação material
da posse com a coisa, e há-de conter um elemento espiritual que signifique
a intenção de exercer um direito no próprio interesse (...) No acto de aquisi-
BAUR/STÜ RNER, Sachenrecht, cie, pág. 60, WIELING, Sachenrecht, cit., pág. SI e 52, MULLER,
Sachenrecht, dt., pág. 27 e seg..
Para o direito romano, cf. MONTEL, "Possesso (Diritto Civile)", cit, pág. 366, BONFANTE, Corso
Di DiriÜ0 Romano, III — Diriüi reali, cit., pág. 277 e seg., CANNATA, "Possesso (Diritto Romano)", cit.,
pág. 326 e segs., BURDESE, "Possesso (dir.rom.)", cit., S., SANTOS JUSTO, Direito Privado Romano,
cit., pág. 158 e seg., MAX KASER, Direito Privado Romano, cit., pág. 130.
SCHWAB/PROTING, Sachenrecht, cit., pág. 32, VIEGWEG/WERNER, Sachenrecht, cit.,
pág. 20, BAUR/STÜRMER, Sachenrecht, cit., pág. 60, WOLF, Sachenrecht, cit, pág. 80, WIELING,
Sachenrecht, cit., pág. 48, LENT/SCHWAB, Sachenrecht, cit., pág. 14, WILHELM, Sachenrecht, cit.,
pág. 182 e segs., ECKERT, Sachenrecht, cit., pág. 43, SCHAPP/SCHVR, Sachenrecht, cit., pág. 29,
BREHM/BERGER, cát„ pág. 39, MÜLLBR, Sachenrecht, cit., pág. 34 e seg.. Na literatura
mals antiga, cf. WOLF/RAISER, Sachenrecht, cit., pág. 38, SORGEL/MOHL, Sachenrecht, SORGEL
Kommentar, cit., pág. 31 e segs.
A Posse, cit., pág. 178 e seg.
SIO
A POSSE
ção há-de haver portanto o corpus e o cnimus, o facto material e a intenção de
exercer o direito no próprio interesse".
PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA 1698 seguiriam o mesmo frilho. 
Comen-
tando a alínea a) do art. 12639, os autores afirmam que "estes actos, de per
si, podem não conduzir à posse se faltar o animuspossidendi. 
(...) Esta alínea
vale assim como um complemento ou uma confirmação do conceito de 
posse
expresso no art. 1251*" O disposto no art. 1266.9 confirmaria, segundo os
autores1699, que o animus é um elemento essencial para a quisição da posse.
Esclareça-se, em todo o caso que o animus referido a propósito do apossa-
mento não é o mesmo que respeita à posse, o animusdomini ou correspondente
ao direito real: é o animuspossidendi ou, mais precisamente,-o animus rem sibi
habendi, a vontade de ter a coisa como possuidor mo.
É de exigir uma intenção ou animus de posse para que haja apossamento?
De modo inteiramente análogo ao que sucede em termos de definição de
posse no art. 1251.2, o Código Civil português omite qualquer referência à
intenção ou animus na alínea a) do art. 1263.2. Neste preceito mencionam-se
apenas os actos materiais, sem alusão à intenção ou animus de possuir.
O que não surpreende. O Código Civil português é na estruturação do
regime da posse profundamente objectivista. Tal como o animus não é ele-
mento constitutivo da posse, ele não é necessário no apossamentoñl .
Basta, pois, a apreensão da coisa que induza o controlo material sobre ela
para que o apossamento esteja consumado e a posse se constitua, se não se
verificar nenhum dos casos previstos no art. 1253.2, e isto seja qual for a vontade
que o agente tenha e ainda que não tenha vontade nenhuma de possuir
i702.
Contrariamente ao que pretendem PIRES DE LIMA/ ANTUNES
VARELA1703, o art. 1266.9 não abona uma posição favorável ao animuspossidendi.
Este preceito, estabelecendo uma regra de capacidade em matéria de aquisição
de posse, começa por dispor que os que não têm uso da razão podem adquirir
posse sobre coisas móveis nullius. Um doente mental pode, assim, apossar-se
Código Anotado, cit., pág. 25 e seg.
Cf. o comentário ao art. 1266.e, em PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código
cit., pág. 31.
1700 Éumasubtoezaquenao aparecenadoutrinaalemã,
Cf. SACCO/CATERINA, II Posseso, cie, pág. 85.
No mesmo sentido, já MENEZES CORDEIRO, Direitos Reais, cit., pág. 460.
1702 Contudo, uma declaração de que nio se pretende exteriorizar nenhum direito real sobre a coisa
afasta a posse, nos termos da alínea a) do art. 1253.9.
Op. ult. cit.
SII
DIREITOS REAIS
de um animal selvagem, por exemplo, adquirindo posse. Se a doença lhe tolda
o discernimento de todo não é possível falar-se numa intenção minimamente
estruturada. Não há aqui qualquer animus de posse a considerari704
Mais claro ainda é o caso de uma posse adquirida por recém-nascido. Apa-
rentemente, seguindo-se à letra o art. 1266.2, um bébé não poderia adquirir
posse de um imóvel por apossamento, pois não tem ainda decerto o uso da
razão. O preceito tem, porém, de ser objecto de uma restrição no seu alcance,
pois não se pretende obviar a uma posse de coisa imóvel adquirida através de
outrem, nomeadamente, um representante. Os pais podem constituir uma
posse de um prédio para o seu filho bébé, nos termos amplos que o art. 1252.2
n.9 1 permite o exercício da posse através de intermediário.
Sempre se poderia, porém, dizer que, não tendo a criança o uso da razão,
o animus possessório residiria nos representantes. E é aqui que o -argumento
falha. Sustentando os autores subjectivistas que a vontade requerida não é
uma vontade jurídico-negocial, mas uma vontade naturalística170s evidenciam
com isto que, afinal, não é necessária a vontade no apossamento. Se a vontade
não é negocial, mas naturalística, não pode ser substituída por esquemas
jurídicos. Voltando ao nosso exemplo, o bébé adquire posse de um imóvel
com a actuação dos seus representantes, ainda que não tenha, não possa ter,
vontade de posse quanto a essa coisa. O que mostra bem que a vontadenão é
precisa para o apossamento.
Um último argumento pode ser avançado. O apossamento pode verificar-
-se mesmo sem o conhecimento daquele que se apossa. O proprietário do
imóvel ausente no estrangeiro torna-se possuidor da água da chuva caída no
seu imóvel ainda que desconheça de todo que ela se encontra em seu poder. A
do controlo material sobre a coisa é suficiente para o apossamento,
salvo quando a lei afastar a posse.
Portanto, sempre que a actuação material sobre uma coisa corpórea permita
criar o controlo sobre ela, permitindo que o agente possa renovar a actuação
Como, de resto, reconhecem PIREs DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, cit.,
32.
PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, cit., pág. 31. Na doutrina
estrangeira, SCH WAB/P ROTIN G, Sachenrecht, cit., pág. 32, VIE G WEG/WERNE R, Sachenrecht, cit.,pág. 20, BAUR/STÜRMER, Spchenrecht, cit., pág. 60, WOLF, Sachenrecht, cit., pág. 80, WIELING,Sachenrecht, cit., pág. 48, LENT/SCHWAB, Sachenrecht, cit., pág. 14, WILHELM, Sachenrecht, cit.,pág. 182 e segs., ECKERT, Sachenrecht, cit., pág. 43, SCHAPP/SCHUR, Sachenrecht, cit., pág. 29,BREHM/BERGER, Sachenrecht, cit., pág. 39, MÜLLER, Sachenrecht, cit., pág. 34 e seg., SORGEL//MÜHL, Sachenrecht, SORGEL Kommentar, cit., pág. 31 e segs.
512
A POSSE
sempre que queira, por si ou por representante, há apossamento, sem neces-
sidade de se aferir do animus de posse.
III. O apossamento pode ter lugar através da actuação de alguém que actue
por conta do adquirente da posse1706. Assim, se, por exemplo, os trabalhadores
de uma empresa efectivam o controlo material de uma coisa por conta daquela,
é a empresa, e não os trabalhadores, quem adquire a posse por apossamento.
Trata-se de uma aplicação da regra que dispõe que a posse pode ser exer-
cida através de outrem (art. 1252.Q, n.2 1). Se pode haver posse por intermédio
de outrem, por maioria de razão, tem de se admitir que tal sucede também
com o apossamento.
Nesta ordem de ideias, o apossamento pode ser levado a cabo por uma
pessoa colectiva1707, que adquire posse originariamente nos mesmos termos
de uma pessoa singular.
208. A inversão do título da posse
I. O art. 1263.9 alínea d) dispõe que a posse se adquire por inversão do
título da posse (interversio possessionis). Esta figura vem depois regulada no
art. 1265.9, nos termos do qual, "a inversão do título da posse por oposição
do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía ou por acto de
terceiro capaz de transferir a posse".
O art. 1265.9 do Código Civil teve por fonte próxima 0 parágrafo do art.
1141. do Códice Civile italiano. Segundo este preceito, "se alguém começou
por ter detenção, não pode adquirir a posse a não ser que o título venhaa ser
modificado por causa proveniente de um terceiro ou por força da oposição
daquele contra o possuidor". Esta regra veio a consagrar solução já proclamada
no direito romano, onde se dizia nemo causampossessionissibi ipse mutarepotesB708
Na inversão do título daposse, o detentor da coisa passa a exteriorizar um
direito próprio sobre ela ou, como outros preferem dizer, a afirmar uma posse
em nome própri0 1709. Aquele que até aí actuava sobre a coisa em nome alheio,
1706 Cf., na doutrina portuguesa, MENEZES CORDEIRO, Direitos Reais, cit., pág. 462. Na doutrina
estrangeira, por exemplo, WILHELM, Sachenrecht, cit., pág. 189.
1707 SCHWAB/PRÜTING, Sachenrecht, 32, VIEGWEG/WERNER, Sachenrecht, cit., pág. 20,
WIELING, Sachenrecht, cit., pág. 48, LENT/SCHWAB, Sachenrecht, cit., pág. 14.
1708 SACCO, "Possesso (dir. priv.)", cit., 16. e SACCO/CATERINAII Possesso, cit., pág.230, SILLANI,
"Possesso e Detenzione", cie, pág. 29.
PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civllflnotado,cit., pág. 30, MENEZES CORDEIRO,
A Posse, cit., pág. IOS, ALCARO, II Possesso, cit., pág. "113, B 18Ñcp„ La proprietà, cit., pág. 760, nota
152.
313

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