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1 Juan Carlos Pacheco - 83 CICLO SONO-VIGÍLIA Introdução • A Terra tem um ambiente rítmico, então para competir de forma efetiva e sobreviver, o comportamento de um animal deve oscilar segundo o compasso de seu meio. • O encéfalo desenvolveu vários sistemas para o controle rítmico, sendo o sono-vigília o comportamento periódico mais nítido. O Eletroencefalograma (EEG) • Medida de atividade elétrica a partir da superfície do crânio. • Nos permite vislumbrar a atividade generalizada do córtex cerebral. • Em EEG mede, principalmente, a voltagem gerada pelas correntes que fluem durante a excitação de dendritos de neurônios piramidais do córtex cerebral. • Portanto, são necessários muitos milhares de neurônios, ativados conjuntamente, para gerar um sinal de EEG grande o suficiente para ser visualizado. • Isso tem uma consequência interessante: a amplitude do sinal de EEG depende muito do quão sincrônica é a atividade dos neurônios. Apesar de depender também da quantidade de neurônios ativos. Ritmos do EEG • Variam consideravelmente e se relacionam-se frequentemente com determinados estados do comportamento (como níveis de atenção, sono ou vigília) e com patologias (como crises epiléticas ou coma). • O encéfalo pode gerar ritmos que vão de muito lentos a muitos rápidos. Os principais são divididos em categorias em função de suas frequências: o Ritmos delta: são lentos, menos de 4 Hz, geralmente com grande amplitude, caracterizam o sono profundo. o Ritmos teta: de 4 a 7 Hz, podem ocorrer nos estados de sono. o Ritmos alfa: cerca de 8 a 13 Hz, são maiores sobre o córtex occipital e estão associados a estados calmos, de vigília. o Ritmos beta: cerca de 15 a 30 Hz, associados ao córtex ativado. *Ritmos de fusos: breves ondas de 8 a 14 Hz relacionadas ao sono. 2 Juan Carlos Pacheco - 83 Mecanismos e significados dos ritmos encefálicos • Os ritmos elétricos são abundantes no córtex. • Mas como são gerados e quais suas funções? A geração dos ritmos sincrônicos A atividade de um grande número de neurônios produzirá oscilações sincronizadas de duas maneiras fundamentais: 1. Os neurônios podem obter informações de um relógio central (marca-passo), ou 2. Podem compartilhar/distribuir a função de marcador de tempo entre eles • No primeiro caso, o tálamo pode funcionar como esse marca-passo do córtex. o Os neurônios talâmicos podem gerar descargas de potencias de ação muito rítmicas. Esses ritmos coordenados são passados ao córtex. o Desse modo, um grupo pequeno de células do tálamo (trabalhando como líder de uma banda) pode compelir um grupo muito grande de células corticais a seguir o ritmo talâmico. • No segundo caso, o ritmo surge do comportamento coletivo dos próprios neurônios corticais. o Alguns ritmos do córtex não dependem do marca-passo talâmico. o Eles se baseiam nas interações coletivas e cooperativas dos próprios neurônios corticais. o As interações excitatórias e inibitórias dos neurônios resultam de um padrão de atividade sincrônico coordenado, que pode permanecer localizado ou se difundir para regiões maiores do córtex. Função dos ritmos do encéfalo • Não se sabe ao certo para que servem os ritmos, mas hipóteses foram criadas. o Servem para coordenar atividade entre regiões do encéfalo. o Permitem ao encéfalo reunir vários componentes neurais em um construção perceptiva única. o Podem ser subprodutos da tendência de os circuitos cerebrais estarem fortemente interconectados. O SONO • O sono é um estado facilmente reversível de reduzida interação com o ambiente. • Por que dormimos? o Teoria da restauração: repouso e recuperação para uma nova vigília. o Teoria da adaptação: livrarmo-nos de problemas, se esconder de predadores, conservar energia. 3 Juan Carlos Pacheco - 83 Estados funcionais do encéfalo • O sono tem distintas fases ou estados: o Sono de movimento rápido dos olhos (Sono REM): o EEG se parece mais com o estado acordado. “É um encéfalo ativo e alucinado em um corpo paralisado”. o Sono não REM: período de repouso, o encéfalo não gera sonhos complexos. É um sono de ondas lentas, pois o EEG é dominado por ritmos amplos e lentos. Estágios do sono não REM ➢ Estágio 1: sono de transição, quando os ritmos alfa do estado de vigília relaxada se tornam menos regulares e se desvanecem. ➢ Estágio 2: um pouco mais profundo, dura de 5 a 15 minutos. Os movimentos oculares quase cessam. ➢ Estágio 3: o EEG inicia ritmos delta lentos, de grande amplitude. Há poucos movimentos corporais e oculares. ➢ Estágio 4: É o estágio de sono mais profundo, com ritmos de grande amplitude. 4 Juan Carlos Pacheco - 83 O ciclo do sono • Mesmo uma noite boa noite de sono não é uma jornada estável e ininterrupta. • O sono leva o encéfalo por uma corrida em montanha russa: o 75% do tempo total do sono é não REM (dividido em 4 estágios). o 25% é sono REM. • Ocorre ciclos periódicos entre esses estágios durante toda a noite: o Passamos primeiro ao longo dos estágios do não REM, depois pelo REM e então de volta aos estágios do não REM. o Repetimos esse ciclo a cada 90 minutos, aproximadamente. • Ao longo da noite, ocorre uma redução geral na duração do sono não REM e um aumento do sono REM. • Metade do sono REM ocorre durante o último terço da noite e os ciclos REM mais longos podem durar de 30 a 50 minutos. • Ainda assim, existe um período refratário obrigatório, de 30 minutos, entre os períodos REM. Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4 Sono REM Estágio 2 Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4 Fim de um ciclo 5 Juan Carlos Pacheco - 83 Funções dos sonhos e do sono REM • O que é o sonho? o São vistos como associações e memórias do córtex cerebral, causadas por descargas aleatórias da ponte durante o sono REM. o Os neurônios da ponte, via tálamo, ativam várias áreas do córtex cerebral, suscitam imagens ou emoções bem conhecidas. o O córtex tenta sintetizar as imagens disparadas em um produto sensato. o Porém, o produto final pode ser completamente estranho ou sem sentido, pois é disparado por atividade semialeatória da ponte. • O sono REM pode ter um papel importante na consolidação da memória o Seres humanos privados de sono REM podem ter prejuízo na capacidade de aprender uma variedade de tarefas. Mecanismos neurais do sono • Antes, acreditava-se que o sono era um processo passivo: prive o encéfalo de entradas sensoriais e ele cairá no sono. • No entanto, hoje sabemos que se o encéfalo deixar de receber estímulos sensoriais, ele continua realizando o ciclo sono-vigília. • Logo, o sono é um processo ativo e requer a participação de uma variedade de regiões encefálicas. As áreas do córtex são controladas por coleções de neurônios que alteram a excitabilidade cortical e controlam a passagem de fluxo de informação sensorial para ele: • Os neurônios mais críticos para o controle do sono e da vigília fazem parte dos sistemas modulatórios difusos de neurotransmissores: [vimos na última aula] o Neurônios modulatórios do tronco encefálico que usam noradrenalina e serotonina disparam durante a vigília e acentuam o estado acordado. o Os sistemas modulatórios difusos controlam os comportamentos rítmicos do tálamo, os quais, controlam muitos ritmos do EEG. Os ritmos lentos do tálamo boqueiam o fluxo de informação sensorial até o córtex. o Ramos descendentes dos sistemas modulatórios difusos podem inibir a ação dos neurônios motores durante o sono. 6 Juan Carlos Pacheco - 83 A vigília e o sistema ativador reticular ascendente(SARA) • O SARA é composto pela junção do Locus Ceruleus com os Núcleos da Rafe. Sua atividade é essencial para nos manter acordados. • Vários conjuntos de neurônios aumentam suas taxas de disparos quando acordamos, para manter o nível de alerta, dentre eles: o Locus Ceruleus: usam noradrenalina o Núcleos da Rafe: usam serotonina o Prosencéfalo basal e Tronco encefálico: acetilcolina o Neurônios do mesencéfalo: usam histamina o Neurônios do hipotálamo: usam hipocretina. Esse neurotransmissor excitam fortemente células dos sistemas moduladores. Promove vigília e inibe o sono REM. • Coletivamente, esses neurônios estabelecem sinapses diretamente em todo o tálamo, córtex cerebral e em muitas outras regiões. • Seus efeitos gerais são a despolarização de neurônios e um aumento de sua excitabilidade. O ato de adormecer e o estado não REM • Adormecer envolve uma serie de mudanças que culminam no estado não REM. • O que inicia o sono REM é a redução geral na frequência de disparo da maioria dos neurônios moduladores (Aqueles que usam NA, serotonina, ACh). • Um conjunto de neurônios colinérgicos do prosencéfalo aumenta sua frequência de disparo com o início do sono REM, ficando silenciados durante a vigília. • À medida que o sono não REM progride, os fusos desaparecem e dão lugar aos ritmos delta. • A sincronização da atividade durante os ritmos de fuso ou delta deve-se às interconexões neurais dentro do tálamo e entre o tálamo e o córtex. 7 Juan Carlos Pacheco - 83 Mecanismos do sono REM • O córtex não é necessário para a produção do sono REM, mas para a produção dos sonhos elaborados nesse período ele é. • Muitas áreas do córtex estão tão ativas no sono REM quanto na vigília. • Algumas evidências sugerem que neurônios colinérgicos induzem o sono REM, e fazem o córtex e o tálamo se comportarem semelhante ao do estado de vigília. Mudanças durante o sono REM em relação à vigília: o Porções do sistema límbico estão mais ativas, estando relacionadas com o componente emocional dos sonhos. o O córtex visual primário está bem menos ativo durante o sono REM. Logo, a excitação que cria as imagens dos sonhos é gerada internamente. o Há baixa atividade no lobo frontal, o que sugere que não pode ocorrer a integração ou a interpretação em nível mais elevado, deixando-nos com uma mescla de imagens visuais não interpretadas. o A atividade do locus ceruleus e dos núcleos da rafe diminuem para níveis mínimos antes do início do sono REM. Fatores promotores do sono • Muitas substâncias promotores do sono foram identificadas. • Algumas das principais são: o Adenosina: promovem o sono ao inibirem os sistemas modulatórios difusos, que tendem a promover vigília. Ao acordar, temos baixo nível de adenosina no corpo, ao longo do dia ela vai aumentando progressivamente. [quanto maior seu nível, maior a vontade de dormir]. Após o sono iniciar, seus níveis caem lentamente. o Óxido nítrico: atingem seus níveis mais altos durante vigília e aumentam rapidamente com a privação do sono. Promove o sono não REM, suprimindo a atividade de neurônios que ajudam a manter a vigília. o Peptídeo muramil: produzidos por bactérias. Facilita a manifestação do sono não REM. o Interleucina 1: sintetizados na glia e por macrófagos, estão envolvidos no sistema imune e na regulação do sono. Seus níveis aumentam durante a vigília e atingem seus picos logo antes do início do sono. Induz fadiga e sonolência quando administrado em seres humanos. o Melatonina: É liberada quando o ambiente está escuro, pois é inibida pela luz. Seus níveis aumentam quando nos tornamos sonolentos, no inicio da noite, apresentando um pico nas primeiras horas da manhã. Caem para o nível basal quando acordamos. Ela ajuda a iniciar e manter o sono. 8 Juan Carlos Pacheco - 83 RITMOS CIRCADIANOS • São os ciclos diários de claridade e escuridão que resultam da rotação da terra. • A maioria dos animais terrestres coordenam seu comportamento de acordo com esse ciclo. Alguns são mais ativos durante o dia, outros só durante a noite. • A maioria dos processos fisiológicos também varia conforme os ritmos diários: o Temperatura corporal o Fluxo sanguíneo o Produção de urina o Níveis hormonais o Crescimento de pelos o Taxas metabólicas • Quando os ciclos de claro-escuro são removidos do ambiente, os ritmos circadianos mantêm continuam funcionando. • Os relógios primários para os ritmos circadianos não são astronômicos, mas biológicos, ocorrendo no encéfalo. • Porém, os relógios do encéfalo são imperfeitos e requerem ajuste ocasional. Estímulos externos, como a luz e o escuro, ou alterações diárias de temperatura, auxiliam a ajustar os relógios do encéfalo para mantê-los sincronizados com o início e o final diários da luz do sol. O núcleo supraquiasmático: um relógio encefálico • Vias aferentes (que trazem os estímulos luminosos) regulam o relógio e mantêm seu ritmo coordenado com os ritmos circadianos do meio. • As vias eferentes permitem controlar certas funções cerebrais e corporais de acordo com a precisão temporal do relógio. O relógio biológico dos seres humanos é o núcleo supraquiasmático (NSQ) • Quando os NSQ são estimulados eletricamente, os ciclos circadianos podem ser alterados de maneira previsível. • Como o comportamento está relacionado com os ciclos claro-escuro, é preciso de um mecanismo fotossensível que regule o relógio encefálico: os axônios ganglionares da retina estabelecem sinapses diretamente com dendritos dos neurônios do NSQ. • As células ganglionares sensíveis à luz expressam um tipo singular de fotopigmento, denominado melanopsina. Eles são excitados muito lentamente pela luz e seus axônios enviam sinais ao NSQ, que pode reajustar o relógio circadiano ali presente. Um relógio biológico que produz ritmos circadianos consiste em vários componentes: 9 Juan Carlos Pacheco - 83 Mecanismos do NSQ Como os neurônios do NSQ fazem para medir o tempo? • Cada célula do NSQ é um minúsculo relógio que mede o tempo com tique-taques regulares de sua própria maquinaria molecular. [ou seja, a expressão gênica dessas células faz com que elas tenham um metabolismo rítmico] • As células do NSQ comunicam sua mensagem para o encéfalo através de axônios eferentes. Os disparos variam de acordo com o ritmo circadiano. • Contudo, potenciais de ação não são necessários para que os neurônios do NSQ mantenham seu ritmo. [os potenciais de ação do NSQ são como os ponteiros de um relógio; a remoção dos ponteiros não faz cessar os mecanismos internos do relógio, mas torna impossível vermos a hora como comumente veríamos] Qual o mecanismo para coordenar milhares de relógios celulares, de forma que o NSQ como um todo forneça uma única e clara mensagem? • A regulação é feita célula a célula. Através da comunicação, elas se ajustam em um mesmo ritmo e passam esse comando para o resto do encéfalo.
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