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EDUCAÇÃO FISICA e Lazer

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A IMPORTÂNCIA DE BRINCAR
Muitas pessoas acreditam que os professores de Educação Física são recreacionistas e “manuais ambulantes” de jogos e brincadeiras, pois conhecem muitos tipos e variações de atividades lúdicas e simplesmente aplicam-nas em suas aulas sem uma razão consciente sobre seus objetivos, sem relação com conteúdo e objetivos, preestabelecidos. Mas será que somos pessoas que só brincam? Certamente que não...
Mas como podemos justificar a opção pelo brincar e pelo lúdico sem pensar apenas na função de divertir? Eles também podem auxiliar na aprendizagem de conteúdo, conceitos, procedimentos e atitudes, como veremos a seguir.
O brincar nem sempre teve o mesmo sentido que encontramos em dia. Por exemplo, no século IV, Santo Agostinho dizia que brincadeiras desviavam a criança do aprendizado correto e que a punição, por meio castigos físicos era adequada para que ela concentrasse em aprender e não em distrações fúteis como o brincar.
Com a Revolução Industrial do século XVIII, o brincar perde muito devido ao grande tempo gasto pelas pessoas no trabalho, diminuindo o tempo em família e comunidade, bem como tempo livre para o lazer, fazendo com que a criança também brincasse cada vez menos. Há estudos que mostram que adultos trabalhavam 70 horas semanais, diferente das cerca de 40 horas semanais comuns no Brasil atualmente.
Atualmente, muitos problemas que ocorrem também prejudicam o tempo disponível para o brincar, como, por exemplo:
· Diminuição de espaço públicos de lazer: poucos espaços disponíveis nas grandes cidades, muitas vezes distantes do local de moradia, ou com problemas de manutenção dos parquinhos e equipamentos de lazer. 
· Falta de segurança: medo de assaltos, sequestros, atropelamentos faz com que as pessoas fiquem cada vez mais em casa, utilizando principalmente a TV como forma de lazer.
· Excesso de atividades extracurriculares: muitas crianças fazem, além das horas diárias na escola, outras atividades, com o balé, judô, natação, inglês, matemática, chegando em casa cansados e sem forças para brincar, depois de um dia estressante.
O Princípio VII da Declaração Universal dos Direitos da Criança, estabelece que toda criança tem direito ao lazer infantil, ao brincar, à educação etc., mas qual a função do brincar para a criança?
Segundo Prado (1988), temos algumas teorias que explicam a função do jogo:
· Teoria do excesso de energia (SCHILLER, 1875) = visa drenar o excesso de energia acumulada. E isso é bem comum hoje em dia, quando as professoras de classe nos pedem: “ façam essas crianças gastarem bastante energia nas suas aulas, para que depois sentem nas cadeiras e prestem atenção a minha aula”. Nem sempre isso ocorre...
· Teoria do instinto (GROSS,1901) = funciona como uma forma natural e instintiva de preparar as crianças para a vida adulta. Isso é comum na comunidade indígena, por exemplo, onde um índio não “brinca” de arco e flecha, pois na verdade já se trata de um treinamento para o futuro caçador que trará alimentos para a aldeia.
· Teoria da recreação e relaxamento (LAZARUS, 1007; PATRICK, 1916) = visa renovar as energias gastas no trabalho ou em excesso. Fazemos algo relaxar, pois a rotina é cansativa e mesmo uma atividade cansativa como um esporte pode ser motivante, pois foge da rotina diária.
· Teoria da recapitulação (STANLEY HAAL, 1904) = recapitulação de comportamentos culturais vividos em fases anteriores. Demonstra a importância dos “jogos tradicionais” aprendidos e passados pelo familiares conforme e cultura local, quando aprendemos coisas antigas e significativas de nossos antepassados. 
· Teoria da autoexpressão (MITCHELL; MASON, 1923) = serve como um meio de os indivíduos desenvolverem suas potencialidades físicas, cognitivas, sociais etc.
· Teorias do jogo como elemento da cultura (HUIZINGÁ, 1954) = o jogo estaria inserido em todos os arquétipos do comportamento humano: trabalho, negócios, ciência política, amor, artes e esportes. Tudo na vida faz parte de um “jogo” e muito jogos teriam a função de ensinar comportamentos aceitos pela sociedade.
Ao brincar, a criança aprende a argumentar, raciocinar. Julgar e muitas outras coisas no relacionamento entre seus pares. Mais um cuidado que precisamos ter é que, na área escolar, se as crianças apenas brincam sozinhas, sem um professor para orientá-las, muitas vezes corre-se o risco de que isso seja apenas um simples passatempo e não uma atividade educativa. O de ser algo próprio para auxiliar o desenvolvimento do aluno.
O brincar muitas vezes é confundido com atividades pedagógicas lúdicas. Muitos acham que brinquedos pedagógicos fazem as crianças se divertirem, mas muitas vezes isso não ocorre. Os brinquedos pedagógicos são utilizados pelos professores para ensinar as crianças a aprenderem conceitos de uma forma mais lúdica, mas não significa que elas brincaram, pois fizeram algo obrigatório e formal, seguindo regras dos professores. Muitas vezes, não puderam fazer algo pelo qual realmente se interessaram, de livre e espontânea vontade. Essa é uma das características do brincar livre e voltado para o lazer; uma atividade de escolha pessoal, que envolve prazer, não obrigações comuns do dia a dia.
Alguns temos comuns utilizados nos estudos sobre o brincar são: lúdico, brincadeira e brinquedo. Segundo alguns autores, esses termos podem ser considerados como um só, pois envolvem o “jogar”. Tanto esportes, como o futebol, e atividades de casinha, de bonecas, ou um pega-pega, podem ser englobados como “jogos”. Aqui dividiremos didaticamente estes termos, que para LARIZZATTI (2005) trazem características próprias, excludentes, que separam uma brincadeira de um jogo.
LÚDICO
O termo lúdico é de difícil definição entre a maioria dos autores, até por não encontrarmos em outras línguas palavra semelhante. Um erro comum é atribuir ao termo lúdico o caráter de se referir apenas a crianças. Ele deve ser comum a todos as idades.
· “...é tudo aquilo que leva uma pessoa somente a se divertir, se entreter, se alegrar, passar o tempo (CAVALLARI; ZACHARIAS, 2001).
· “... referente a, ou que tem o caráter de jogos, brinquedos e divertimentos”. (DICIONÁRIO AURÉLIO, 1986)
· “... a ludicidade é fantasia, imaginação e sonhos que se constroem como um labirinto de teias traçadas com materiais simbólicos”. (SANTIN, 1994).
· “... vivência privilegiada do lazer que materializa experiência cultural, movida pelos desejos de quem joga e coroada pelo prazer. É renovar relações interpessoais, experiências corporais, ambientes, temporalidades e energias; é reencontrar consigo mesmo, com o que gosta”. (PINTO, 1995)
· “...expressão humana de significados da/na cultura referenciada no brincar consigo, com o outro e com o contexto” (GOMES, 2004).
BRINQUEDO 
Tem uma relação íntima com a criança, pois muitas vezes cria vínculos com ela; dificilmente uma criança pequena aceita trocar seus ursinhos velhos por novos. O brinquedo não possui regras quanto à sua utilização. Por exemplo: alguém já comprou uma bola com manual de instrução? Ou uma boneca com instruções de como brincar?
O brinquedo também pode ser um substituto dos objetos reais, para que ao manipulá-los a criança imagine situações do cotidiano dela ou dos adultos. Exemplo: andar de carrinho de rolimã ou empurrar um pneu pode simbolizar dirigir o carro dos pais.
Muitas vezes, é o estimulante visual de muitas brincadeiras, que faz fluir o imaginário infantil. Um pneu pode virar um carro e vários pneus podem ser uma loja de carris, ou uma corrida de Fórmula 1, entre outras.
“Objeto que serve para as crianças brincarem”. (DICIONÁRIO AURÉLIO, 1986)
O brinquedo numa perspectiva adulta leva a um divertimento que o distancia do real. Alguns classificam os brinquedos por faixas etárias, sexo, educativos ou recreativos, mas para as crianças essas classificações muitas vezes inexistem ou não são necessárias.
Um brinquedo pedagógico ou educativo foi criado para um melhor aprendizado na escola, mas às vezes não é o melhor presente que uma criança gostaria de ganhar.
BRINCADEIRA
É o lúdico emação. Uma brincadeira sempre nos lembra algo prazeroso, que a criança faz a fim de se divertir. Muitas vezes, mostra a junção dos brinquedos com regras básicas, gerando brincadeiras...
Normalmente não existem necessariamente vencedores numa brincadeira. Ela acontece enquanto existirem motivação e interesse das pessoas. Por exemplo, quando acaba um pega-pega? Enquanto as crianças ainda não estiverem cansadas. De repente, após uns minutos, elas conversam entre si e falam: vamos parar? e começam outra atividade sem preocupação com a vitória, tempo etc. pode ou não haver regras, mas quando há, são simples. Por exemplo, existem regras para brincar de casinha entre amigas? Não. E quais as regras para se fazerem embaixadinhas com uma bola?
Mas de modo geral, toda brincadeira possui regras. Um pega-pega simples tem regras. Quem for pego fará isso. O local de/para onde podemos fugir será este. Para não ser pego pode ser feito “isto ou aquilo” e assim por diante.
Nas brincadeiras, as regras podem ser modificadas sem problemas e a qualquer momento, dependendo das necessidades. E o final não é previsível, pois na brincadeira não existe um final obrigatório ou fixo.
Mais em uma brincadeira também pode haver vencedores? Acredito que sim. Por exemplo, num pega-pega, podemos dizer que o último a ser pego seria um vencedor? Sim, sem descaracterizar a brincadeira, pois a ênfase não era a de ganhar ou verificar quem era o melhor, mais rápido etc.
· “Ato ou efeito de brincar”. (DICIONÁRIO AURÉLIO, 1986)
· “Expressão humana de significados da/na cultura referenciada no brincar consigo, com o outro e com o contexto”. (GOMES, 2004)
JOGO
Mas quando a “brincadeira” possui regras mais rígidas, times são separados, vencedores são valorizados e então podemos ultrapassar a barreira do brincar para o jogar.
O jogo busca sempre um vencedor. É só lembrar de um jogo de futebol, vôlei, basquete, queimada etc. Eles possuem equipes definidas que “lutam” ou disputam entre si é o melhor e apenas um terá a vitória. Mas um jogo não pode empatar? Sim, for realmente a final de um campeonato, critérios serão adotados para o desempate. No futebol por exemplo, se uma final termina em empate, será feita uma prorrogação, depois disputa de pênaltis, ou saldo de gols etc., até que alguém seja o campeão.
Um jogo sempre tem começo, meio e fim. Ante o início, sempre sabemos como ele terminará, quais os critérios em caso de empate etc.
Sempre existem regras num jogo. Se não houver, será uma brincadeira.
Sempre há um final previsto, mas modificações possíveis. Caso se queira mudar uma regra, pode-se fazê-lo, mas o jogo deverá ser reiniciado com a nova regra explicada para as duas ou mais equipes.
· “Atividade física ou mental organizada por um sistema de regras que definem a perda ou o ganho”. (DICIONÁRIO AURÉLIO, 1986)
Segundo Brougére e Henriot (apoud KISHIMOTO 2000), os jogos também podem ser:
· Resultado de um sistema linguístico dentro de um contexto social
Não objetiva compreender a realidade, mas montar símbolos que atendam aos desejos do cotidiano.
Cada jogo tem um papel dentro de cada sociedade, por exemplo, o arco e flecha para a criança índia é treinamento para o futuro e, para a criança da cidade, um entretenimento, jogo para treinar a pontaria.
· Um sistema de regras
Cada jogo de baralho tem suas regras diferentes, mesmo que se usem materiais semelhantes.
· Jogo como objeto
Possui peças, tabuleiros feitos de madeira, plásticos, metais etc.
As brincadeiras podem ser classificadas de diferentes formas, dependendo do autor, como veremos abaixo. Segundo Piaget, os jogos e brincadeiras podem ser divididos em:
Jogos/brincadeiras tradicionais – jogos que foram transmitidos por várias gerações, não por livros, mas por observação e transmissão das pessoas, que brincaram em ruas e praças, e que passam de geração em geração. Muitas vezes são chamadas de “brincadeiras folclóricas”, pois sua origem é desconhecida e fazem parte da cultura e tradição daquele povo.
Exemplo: jogo das pedrinhas (5 Marias); pular corda; amarelinha; passa anel; perna de pau; cata-vento; pião; estilingue; bilboquê; jogos de pega-pega; esconde-esconde; cabra-cega; polícia e ladrões; queimada; barra-manteiga; elefante colorido; ioiô; taco etc.
Jogos de exercício sensoriomotor – jogos em que as habilidade e capacidades físicas e motoras são o principal objetivo. Envolvem repetições de gestos e tarefas, como exploração em diferentes áreas, como tátil, visual, sonora, e alguns envolvendo até áreas olfativas, gustativas etc.
Jogos simbólicos – usados principalmente na chamada infância (até os 6 anos), em que o fator do “faz de conta”, da imitação e da fantasia está envolvido. A criança usa a imaginação e pode realizar sonhos e fantasias, ajudando muitas vezes a resolver conflitos, medos, angústias, frustações etc. também ajudam a “autoexpressão”, pois assumem-se papéis como “ pai – mãe”, animais, super-heróis etc.
Jogos de regras – quando a criança deixa a fase egocêntrica e aprende a se relacionar com os colegas e compartilhar materiais, os jogos são usados. Podem ser classificados em espontâneos (em que as regras são menos rígidas, como no brincar de casinha) ou em regras transmitidas, pois em vários locais do mundo, pode-se jogar com pessoas diferentes, pois as regras geralmente são comuns. São usados principalmente a partir dos 6-7 anos, podendo ser motores (corridas, com bola etc.), intelectuais (xadrez, jogos de tabuleiro) etc.
Jogos cantados – utilizando-se da música, várias são as formas possíveis de brincar, gerando até variações nas classificações, como:
· Cantigas de roda: as crianças em roda, de mãos dadas, cantam melodias simples e folclóricas. São músicas que fazem parte das tradições de um povo, como “Atirei o pau no gato”, “Ciranda, cirandinha” etc. podem incluir outras culturas, como a africana, europeia (principalmente portuguesa e espanhola) e índia. Existem cantigas de ninas, cirandas etc.
· Rodas cantadas: uma brincadeira que envolve música, o corpo, o ritmo, desafios de movimentos e, às vezes, situações engraçadas, usadas até como “quebra-gelo”, integração entre os participantes, trazendo alegria e prazer na realização muitas vezes construídas com objetivos específicos, como movimentos para braço e pernas ou para repetições de palavras ou frases etc.
Jogos de sociabilização – encontramos na literatura diversas subdivisões, como, por exemplo: “quebra-gelo”, socialização, integração. Na verdade, todos eles procuram criar uma união entre a pessoas, a fim de que se sintam ais a vontade para compartilhar situações, para iniciar uma conversa ou amizade etc. muitas são chamadas ou usadas em “dinâmicas de grupo”. Exemplo: bingo de nomes (cada pessoa procura de 6 a 8 assinaturas de pessoas do grupo e, depois, com o nome de todos numa caixa, sorteia-se nome a nome, como num bingo).
Outra classificação de jogos (chamada de sociológica) é a proposta por Roger Callois. Ele os divide em quatro grandes blocos, a saber:
· Agôn: esportes, competições, lutas etc. envolve disputas, vencedoras e vitória de uma das partes. Em grego, agôn significa “disputa”.
· Alea: quando o aleatório e o acaso aparecem. Não existe lógica nem treinamento suficiente para afirmar uma possível vitória. É o caso do jogo de azar (do latim, aleatório). O final do jogo não depende do jogador, pois se trata de vencer o destino, mais do que vencer o adversário. Depende de sorte e o jogador é passivo.
· Mimicry: essa expressão, em inglês, designa mimetismo. Mimicas, disfarces e imitações. Envolve jogos de imitação, mímicas, teatro, encenações etc.
· Ilinx: o termo Ilinx vem do grego e significa “vertigem”. Atividades como esportes de velocidade (moto, carro, etc.) ou de acrobacias, nas quais se abandona por instantes a sensação de segurança (podendo chegar até pânico), são classificadas como ilinx. Henry Wallon classificou os jogos infantis em quatro categorias: 
· Jogos funcionais: caracterizam-se por movimentos simples de exploração do corpo, através dos sentidos. A criança descobre o prazerde executar as funções que a evolução da motricidade lhe possibilita e sente necessidade de pôr em ação as novas aquisições e repeti-las.
· Jogos de ficção: atividades lúdicas caracterizadas pela ênfase no faz de conta, na presença da situação imaginaria. Ela surge com o aparecimento da representação e a criança assume papéis presentes no seu contexto social, brincando de “imitar adultos”, “casinha”, “escolinha” etc.
· Jogos de aquisição: desde que o bebê, todos olhos, todos ouvidos”, como descreve Wallon, se empenha para compreender, conhecer, imitar canções, gestos, sons, imagens e histórias, começam os jogos de aquisição.
· Jogos de fabricação: são jogos em que a criança se entretém com atividades manuais de criar, combinar, juntar e transformar objetos. Os jogos de fabricação são quase sempre as causas ou consequências do jogo de ficção ou se confundem num só, quando a criança cria e improvisa o seu brinquedo: a boneca, os animais que podem ser modelados, isto é, transforma matéria real em objetos dotados de vida fictícia.

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