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MERCADO DE TRABALHO DO TRANSEXUAL tese mestrado SP 2018

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
PUC – SP 
NATHALIA CAROLINI MENDES DOS SANTOS 
MERCADO DE TRABALHO DO TRANSEXUAL – PROIBIÇÃO DA 
DISCRIMINAÇÃO, O TRABALHO DECENTE E AS AÇÕES AFIRMATIVAS COMO 
FORMA DE INCLUSÃO 
MESTRADO EM DIREITO 
SÃO PAULO 
2018 
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
PUC – SP 
NATHALIA CAROLINI MENDES DOS SANTOS 
MERCADO DE TRABALHO DO TRANSEXUAL – PROIBIÇÃO DA 
DISCRIMINAÇÃO, O TRABALHO DECENTE E AS AÇÕES AFIRMATIVAS COMO 
FORMA DE INCLUSÃO 
Dissertação apresentada à Banca 
Examinadora da Pontifícia Universidade 
Católica de São Paulo, como exigência 
parcial para obtenção do título de 
Mestre em Direito do Trabalho, sob a 
orientação da Professora Doutora 
Fabíola Marques. 
SÃO PAULO 
2018 
NATHALIA CAROLINI MENDES DOS SANTOS 
MERCADO DE TRABALHO DO TRANSEXUAL – PROIBIÇÃO DA 
DISCRIMINAÇÃO, O TRABALHO DECENTE E AS AÇÕES AFIRMATIVAS COMO 
FORMA DE INCLUSÃO 
Dissertação apresentada à Banca 
Examinadora da Pontifícia Universidade 
Católica de São Paulo, como exigência 
parcial para obtenção do título de Mestre 
em Direito do Trabalho, sob a orientação 
da Professora Doutora Fabíola Marques. 
Aprovada em: ____/____/_______ 
Banca Examinadora 
Professora Doutora Fabíola Marques (Orientadora) 
Instituição: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC – SP 
Julgamento: ______________________________________________ 
Avaliação: _______________________________________________ 
Professor (a) Doutor (a) ____________________________________ 
Instituição: _______________________________________________ 
Julgamento: ______________________________________________ 
Avaliação: _______________________________________________ 
Professor (a) Doutor (a) ____________________________________ 
Instituição: _______________________________________________ 
Julgamento: ______________________________________________ 
Avaliação: _______________________________________________ 
Agradeço ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 
(CNPq) por ter me concedido bolsa de estudos durante o curso de mestrado, sem a 
qual essa pesquisa não seria desenvolvida. 
DEDICATÓRIA 
Dedico o presente trabalho, primeiramente, a Deus, que permitiu a conquista 
de um grande sonho, concedendo garra e coragem para superar todos os desafios. 
Aos meus amados pais, que sempre estiveram ao meu lado e foram força nos 
momentos difíceis, paz durante a tormenta e amor em todos os dias da minha vida. 
Aqueles que jamais permitiram que eu, sequer, cogitasse desistir dos meus objetivos 
e sempre me mostraram que tudo na vida é fruto de muita dedicação e 
determinação. Palavras jamais serão suficientes para demonstrar minha eterna 
gratidão. 
À minha família, que por diversas vezes compreendeu minha ausência no 
período do mestrado. 
À minha orientadora, Professora Doutora Fabíola Marques, a quem agradeço 
profundamente a oportunidade de ingresso no curso de mestrado da Pontifícia 
Universidade Católica de São Paulo, além de toda atenção, paciência, carinho e 
presteza no desenvolvimento e conclusão do presente trabalho. 
À Professora Doutora Suely Ester Gitelman, que abriu as portas para essa 
conquista ao permitir minha participação na condição de aluna ouvinte em suas 
aulas ministradas no curso de mestrado, como assistente nas aulas da graduação e 
posteriormente por me assentir frequentar suas aulas como aluna regular. 
Aos grandes amigos conquistados durantes esta trajetória, que por vezes 
tornaram meus dias mais leves, apenas pela presença e sorriso. 
Agradeço ao amigo Francisco Simões Pacheco Savoia, que sempre 
incentivou o início e o fechamento no curso de mestrado acadêmico. 
Por fim, e não menos importante, agradeço aos funcionários da secretária de 
Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em 
especial ao amigo Rui de Oliveira Domingos, atencioso e solícito a todas as dúvidas 
e prestativo em todos os momentos do curso. 
RESUMO 
Apesar de ainda faltar muito para que os transexuais tenham seus direitos 
plenamente assegurados no Brasil, nos últimos anos, muitas conquistas foram 
alcançadas. A agenda política nacional e internacional incluiu a luta encadeada por 
anos dos movimentos sociais na busca de igualdade de condições, respeito, 
liberdade, vida digna e pleno exercício da cidadania para a população LGBTI+. O 
ordenamento jurídico brasileiro é falho e não regulamenta, de forma específica, a 
proteção e a defesa dos transexuais que, no intuito de eliminar a invisibilidade e a 
perseguição, encontraram na evolução dos direitos humanos e princípios 
constitucionais a chance de reconhecimento perante a coletividade, deixando, 
paulatinamente, de fazer parte de um grupo que sobrevive à margem da sociedade, 
considerado de forma constante como rés ou “algo” que não deveria existir, por 
vezes habitando o submundo da prostituição em busca, ao menos, de sustento. No 
entanto, esse caminho não foi fácil e ainda restam inúmeras dificuldades na 
efetividade desses direitos, pois o preconceito, a discriminação e a intolerância 
criam numerosos obstáculos. Em vista disso, o presente estudo analisou a proteção 
jurídica dos transexuais e sua efetividade, por meio de ações afirmativas de 
combate à discriminação como forma de assegurar o mínimo existencial, garantindo 
a inclusão no mercado de trabalho e em todos os segmentos sociais, frisando a 
necessidade de lei regulamentar que criminalize práticas discriminatórias, 
intolerância ou violem os direitos fundamentais e, por fim, o fortalecimento da 
atuação do Ministério Público do Trabalho na fiscalização do cumprimento da 
legislação trabalhista, acompanhando denúncias e estimulando a sua realização. 
Palavras-chave: Transexualidade. Inclusão social. Preconceito. Discriminação. 
Efetividade do direito. 
ABSTRACT 
Although there is still a long way for transsexuals to have their rights fully assured in 
Brazil, in recent years many achievements have been achieved. The national and 
international political agenda included the struggle linked by years of social 
movements in the pursuit of equality of conditions, respect, freedom, dignified life and 
full exercise of citizenship for the LGBTI + population. The Brazilian legal system is 
flawed and does not specifically regulate the protection and defense of transsexuals 
who, in order to eliminate invisibility and persecution, have found in the evolution of 
human rights and constitutional principles the chance of recognition before the 
community, leaving gradually to be part of a group that survives on the fringes of 
society, consistently considered as rests or "something" that should not exist, 
sometimes inhabiting the underworld of prostitution in search of at least sustenance. 
However, this path has not been easy and there are still many difficulties in the 
effectiveness of these rights, since prejudice, discrimination and intolerance create 
many obstacles. In view of this, the present study analyzed the legal protection of 
transsexuals and their effectiveness, through affirmative actions to combat 
discrimination as a way to ensure the existential minimum, guaranteeing inclusion in 
the labor market and in all social segments, stressing the the need for a regulatory 
law that criminalizes discriminatory practices, intolerance or violates fundamental 
rights, and finally, the strengthening of the work of the Public Labor Ministry in 
monitoring compliance with labor legislation, following up on complaints and 
stimulating their implementation. 
Keywords: Transsexuality. Social Inclusion. Preconcepion. Discrimination. 
Effectiveness of Law. 
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS 
ABGLT Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e 
Transexuais 
ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade 
AMAPO-SP Associação de Travestis, Mulheres Transexuais e Homens Trans 
– LGBT do Estado de SãoPaulo
ANTRA Associação Nacional de Transexuais e Travestis 
ART. Artigo 
CID-10 Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas 
Relacionados a Saúde 
CF Constituição Federal 
CLT Consolidação das Leis do Trabalho 
DSM – 5 Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5ª 
edição 
LGBT Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou 
Transgêneros 
LGBTI+ Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Intersexuais 
e outras identidades de gênero e sexualidade 
MtF Male to Female (Masculino para o Feminino) 
FtM Female to Male (Feminino para o Masculino) 
MPT Ministério Público do Trabalho 
OIT Organização Internacional do Trabalho 
OMS Organização Mundial de Saúde 
ONU Organização das Nações Unidas 
PL Projeto de Lei 
REDETRANS Rede Nacional de Pessoas Trans 
TAC Termo de Ajuste de Conduta 
SUMÁRIO 
INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 12 
1 DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS ..................................... 16 
1.1 A ideia de gerações e dimensões dos direitos humanos ................................... 17 
1.1.1 Primeira dimensão dos direitos humanos: as liberdades públicas e os direitos 
políticos ............................................................................................................... 18 
1.1.2 Segunda dimensão dos direitos humanos: direitos sociais, econômicos e 
culturais ............................................................................................................... 19 
1.1.3 Terceira dimensão dos direitos humanos: os direitos de solidariedade .......... 20 
1.1.4 As novas dimensões dos direitos humanos - quarta dimensão de direitos .... 22 
1.2 Diferença entre Direitos Humanos e Direitos Fundamentais ............................. 25 
1.3 A Constituição Brasileira de 1988 e a Proteção dos Direitos Humanos – 
Constituição Cidadã............................................................................................. 28 
2 TRANSEXUALIDADE - SEXO, GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL E 
IDENTIDADE DE GÊNERO ................................................................................ 31 
2.1 Conceito de sexo ............................................................................................... 32 
2.1.1 Gênero ............................................................................................................ 33 
2.1.2 Orientação sexual ........................................................................................... 33 
2.1.3 Identidade de gênero ...................................................................................... 34 
2.2 Transexualidade ................................................................................................ 35 
2.2.1 Conceito ......................................................................................................... 35 
2.3 Cirurgia de readequação de sexo - transgenitalização ...................................... 42 
2.4 Transexualidade bioética e biodireito ................................................................ 44 
2.5 Necessidade de despatologização da transexualidade ..................................... 45 
3 A TRANSEXUALIDADE À LUZ DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS .................. 48 
3.1. Os direitos fundamentais e o sistema constitucional de direitos e garantias .... 49 
3.1.1 Princípio da dignidade da pessoa humana ..................................................... 50 
3.1.2 Liberdade ........................................................................................................ 52 
3.1.3 Igualdade ........................................................................................................ 54 
3.2 Direito ao livre desenvolvimento da personalidade como direito autônomo ...... 58 
4 TRABALHO DECENTE ...................................................................................... 63 
4.1 Preconceito e discriminação .............................................................................. 63 
4.2 Trabalho decente ............................................................................................... 65 
4.3 Formas de exclusão social – mercado de trabalho ........................................... 68 
4.4 O trabalho decente e o direito internacional ...................................................... 71 
5 PROIBIÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO POR ORIENTAÇÃO SEXUAL NO DIREITO 
INTERNACIONAL ............................................................................................... 74 
5.1 Os tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento jurídico 
nacional ............................................................................................................... 76 
5.2 A proteção da transexualidade no sistema internacional de direitos humanos . 78 
5.3 Princípios de Yogyakarta – combate à violência e discriminação por identidade 
de gênero ............................................................................................................ 80 
6 AÇÕES AFIRMATIVAS E O COMBATE À DISCRIMINAÇÃO DE 
TRANSEXUAIS ................................................................................................... 84 
6.1 Grupos minoritários ou minorias - conceito ....................................................... 85 
6.2 Diferença entre minorias e grupos vulneráveis .................................................. 87 
6.3 Ações Afirmativas .............................................................................................. 89 
6.4 Ações afirmativas x discriminações positivas .................................................... 91 
6.5 Ações Afirmativas como forma de combate à discriminação dos transexuais – 
conscientização ................................................................................................... 94 
6.6 A ação do Estado e as Políticas Públicas junto ao combate à discriminação de 
transexuais .......................................................................................................... 96 
6.6.1 Atos do Poder Executivo: ............................................................................... 96 
6.6.2 Planos e Programas ....................................................................................... 97 
7 O COMBATE À DISCRIMINAÇÃO NO AMBIENTE DE TRABALHO – O 
MINISTÉRIO PÚBLICO E OS INSTRUMENTOS DE PROTEÇÃO E DEFESA 
DOS TRANSEXUAIS .......................................................................................... 99 
7.1 Atuação extrajudicial do Ministério Público ...................................................... 101 
7.1.1 Inquérito civil ................................................................................................. 102 
7.1.2 Termo de Ajuste de Conduta ........................................................................ 102 
7.1.3 Atuação do Ministério Público do Trabalho na promoção de interesses – 
Exercício de cidadania....................................................................................... 104 
7.2 Atuação judicial do ministério público do trabalho ........................................... 105 
7.2.1 Ação civil pública .......................................................................................... 106 
CONCLUSÃO ....................................................................................................... 107 
REFERÊNCIA ....................................................................................................... 110 
12 
INTRODUÇÃO 
Há anos que questões relacionadas à sexualidade humana despertam 
curiosidade, dúvidas, controvérsias e grandes polêmicas. A ausência de legislação 
que verse de maneira exclusiva sobre o tema dificulta a discussão de direitos e 
punição ao descumprimento destes. Mesmo com a omissão do Estado em criar 
norma jurídica regulamentadora a respeito, o tema começa a ganhar novos 
contornos. 
Facea esse cenário, o presente trabalho tem por objetivo a análise da 
proteção jurídica das pessoas transexuais dentro do mercado de trabalho, 
examinando formas de proibição da discriminação, inclusão social e condições 
dignas que garantam e as aproximem do trabalho decente. 
De tantos pontos controversos, a pesquisa debruça-se na análise de tratados 
e convenções internacionais, que, se ratificados, incorporam direitos na Constituição 
Federal Brasileira e a promoção social, que vem despertando, inclusive, o interesse 
de particulares na criação de medidas de apoio e incentivo aos transexuais na busca 
de colocação no mercado trabalho e algumas auxiliando no recomeço da vida, a 
abrigar aqueles expulsos de casa pelas famílias. 
A pesquisa reflete a preocupação com questões atinentes ao preconceito, 
discriminação e intolerância a que estão submetidas às pessoas trans1. O 
estereótipo arraigado bloqueia a percepção das pessoas que, em decorrência de 
juízo pré-concebido, não se preocupam com o sofrimento ou dor do outro, afastando 
e, por muitas vezes, impedindo o convívio, a inclusão, o crescimento e o 
desenvolvimento pessoal, limitando possibilidades, pelo simples fato de não 
aceitarem a diferença. Tal comportamento desencadeia repúdio e violência, a 
aumentar a barreira da exclusão social, que passa a ser considerada legítima dentro 
de uma sociedade que rejeita a identidade diversa daquela julgada como correta. 
Em razão da segregação social e omissão do Estado, frente à ausência de 
Lei específica para a regulamentação, o cenário atual denota uma lacuna jurídica na 
tutela de direitos. 
1 Importante ressaltar que especialistas e estudiosos sobre o tema em questão costumam utilizar a terminologia 
pessoa trans como “guarda chuva”, isto quer dizer, de forma ampla, abarcando vários conceitos, entre eles os 
transgêneros , que não são o foco da pesquisa, pois não se enquadram na transexualidade, mas sofrem com a 
discriminação e intolerância como toda a população LGBTI+. 
 13 
O assunto é de grande relevância. A invisibilidade do transexual a e 
heteronormatividade pregada disseminam o ódio. De acordo com um relatório da 
Organização Civil Europeia Transgender Europe, o Brasil é o país que mais mata 
transexuais no mundo.2 Outro relatório, dessa vez, elaborado pelo Ser Trans na EU, 
por meio de análise comparativa de dados do inquérito LGBTI europeu e com base 
na realidade vivida por 6.579 (seis mil quinhentos e setenta e nove) pessoas 
autodeclaradas trans, descreveu que as violações de direitos fundamentais são mais 
intensas e frequentes contra estas pessoas do que por lésbicas, gays ou 
bissexuais.3 
Considerando o objeto de análise delimitado, o trabalha tem início com 
apontamentos sobre a evolução dos Direitos Humanos e Fundamentais, passando 
por toda a parte histórica de lutas e movimentos sociais até a consagração dos 
direitos hoje existentes. Esta primeira etapa ainda traça as novas dimensões dos 
direitos humanos, com foco e análise em uma quarta dimensão, defendida pela 
doutrina majoritária como já consagrada no Direito Internacional, passando pela 
controversa diferença entre direitos humanos e fundamentais e enaltecendo a Carta 
Constitucional Brasileira de 1988 como Cidadã, em referência ao destaque ao 
grande número de direitos e garantias em seu bojo. 
Em uma segunda etapa do trabalho, é abordado o tema transexualidade. 
Todavia, apresenta-se de suma relevância para a compreensão da pesquisa, antes 
de definir a terminologia e abordar a questão, distinguir sexo, gênero, orientação 
sexual e identidade de gênero, pois as constantes evoluções e utilização de várias 
expressões como sinônimas são causadoras de grande confusão. 
Partindo da premissa que a despatologização da transexualidade deve se 
tornar uma realidade, o capítulo segundo ainda ganha destaque e é assunto de 
reflexão e defesa, visto que, mesmo com inúmeros movimentos e projetos de Lei, a 
pessoa transexual ainda é considerada doente, classificada como portadora de 
transtorno de identidade junto à CID 10 e inserida no Manual Diagnóstico e 
Estatístico de Transtornos Mentais de estudos biomédicos, com diagnóstico de 
disforia de gênero. A manutenção da transexualidade como uma enfermidade 
 
2 https://antrabrasil.org/2018/07/01/sao-86-pessoas-trans-assassinadas-no-primeiro-semestre-de-2018/ acessado 
em 09/10/2018, as 23:45h. 
3 fra.europa.eu/sites/default/files/fra-2015-being-trans-eu-comparative-summary_pt.pdf acessado em 09/10/2018 
as 00:03h. 
https://antrabrasil.org/2018/07/01/sao-86-pessoas-trans-assassinadas-no-primeiro-semestre-de-2018/
http://fra.europa.eu/sites/default/files/fra-2015-being-trans-eu-comparative-summary_pt.pdf
 14 
consiste na redução, retirada e até mesmo supressão da condição digna existencial 
do ser humano, pelo simples fato de ser diferente. 
O terceiro capítulo faz uma abordagem da evolução dos mecanismos de 
proteção dos cidadãos contra os abusos cometidos pelo Estado, passa pela análise 
do surgimento do Estado Democrático de Direito como fruto da redemocratização, 
unindo-se às ideias de democracia e constitucionalismo (Neoconstitucionalismo), 
que trouxeram força normativa à Constituição Federal de 1988. Nos subitens 
seguintes, são abordados os pressupostos de proteção dos transexuais no plano 
constitucional, com destaque aos princípios da Liberdade e da Igualdade, pilares da 
Constituição Federal e protetores da Garantia da Dignidade, a Dignidade da Pessoa 
Humana como supraprincípio, finalizando com a necessidade do direito ao livre 
desenvolvimento da personalidade se tornar direito autônomo, como ocorre em 
diversas constituições internacionais. 
O capítulo seguinte retrata o cenário atual do país, traz à baila o conceito de 
preconceito e o de discriminação, a importância do trabalho decente como garantia 
de vida digna para os transexuais, as formas de exclusão perpetradas no ambiente 
do trabalho, abordando as fases do contrato de trabalho e a penalidade para a 
conduta discriminatória do empregador. Completando o capítulo, há a análise sob o 
prisma da Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho. 
O descomunal aumento da violência e a discriminação praticada contra os 
transexuais chamou a atenção dos órgãos internacionais de proteção dos direitos 
humanos, por tal motivo o quinto capítulo complementa a busca por igualdade e 
aborda a proibição da discriminação por orientação sexual no Direito Internacional, 
analisando os tratados de direitos humanos no ordenamento nacional, explicando 
sua incorporação, hierarquia e aplicação. Em tópico específico, trata os Princípios de 
Yogyakarta, que são referência no Direito Internacional quando o assunto discutido 
está relacionado às violações de direitos humanos, com base na orientação sexual e 
identidade de gênero. 
O sexto capítulo diferencia dois grupos de pessoas excluídas diante do 
Estado e da sociedade, a saber, os grupos minoritários e os grupos vulneráveis, 
estabelecendo a necessidade de proteção diferenciada e as formas de atuação no 
combate à discriminação dos transexuais na efetiva busca pela igualdade material. 
 15 
Por fim, no capítulo sete, são apresentados os instrumentos de defesa 
pertinentes ao Ministério Público do Trabalho, como forma de proteção dos 
transexuais, com análise da atuação judicial e extrajudicial. 
Face à problematização do tema, à dificuldade de inclusão no mercado de 
trabalho dos transexuais, a pesquisa busca elementos que solucionem o cenário 
atual pautado na Constituição Federal de 1988 e seu sistema de direitos e garantias. 
Como método de pesquisa, utiliza-se a forma qualitativa, com a conciliação, 
principalmente, de pesquisas teóricas e históricas. Para tanto, é utilizada doutrina 
nacional e estrangeira, jurisprudência e análise de Convenções Internacionais das 
Nações Unidas ratificadas pelo Brasil.16 
1 DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS 
 
Os Direitos Humanos são resultado de um longo período de evolução. 
A origem dos direitos individuais do homem, de acordo com Alexandre de 
Moraes, pode ser encontrada no Egito e na Mesopotâmia, onde já existiam formas 
de proteção ao cidadão, isso, mesmo no terceiro milênio a.C. 4 
O primeiro código a consagrar direitos comuns a todos os homens que se tem 
notícia surgiu na Babilônia, conhecido como Código de Hammurabi, nome que o rei 
da Babilônia Khammu-rabi era conhecido entre os povos do Ocidente. O código, 
titulado com o nome do rei, no século XVIII a.C, foi erguido em pedra de basalto, 
contendo vinte e uma colunas e duzentas e oitenta e duas cláusulas gravadas, as 
quais regiam a vida da população e sociedade trazendo, dentre seu rol, direitos 
como a vida, a propriedade, a honra, a dignidade, a família e a supremacia das leis 
em relação aos governantes. 5 
Outro importante direito conquistado sobreveio no período Republicano de 
Roma, com a Lei das XII Tábuas, que possibilitou o acesso de todos os cidadãos ao 
conteúdo das Leis, as quais ficavam expostas no Fórum Romano, trazendo 
igualdade entre os romanos. Antes, os plebeus, classe oprimida, eram privados dos 
mandamentos, aplicados conforme conveniência daqueles que detinham o poder, 
pontífices e patrícios. 
A trajetória dos Direitos Sociais, como nos traz Arnaldo Süssekind, 
mencionado Raul Machado Horta, atingiu, no final do século XX, o ponto de conexão 
e de coexistência entre Direitos Individuais e Direitos Sociais: 
 
“A trajetória dos Direitos Sociais atingiu neste final de século, o ponto 
de conexão e de coexistência entre os Direitos Individuais e Direitos 
Sociais (...) nesta perspectiva aglutinadora, os Direitos Fundamentais 
representam o coroamento de uma evolução histórica e oferecem os 
instrumentos adequados à edificação do humanismo constitucional 
na sociedade contemporânea”. 6 
 
 
4 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. 10ª ed. São Paulo: Atlas. 2013, p. 6/7. 
5 SIQUEIRA JR, Paulo Hamilton, OLIVEIRA, Miguel Augusto de. Direitos humanos: liberdades públicas e 
cidadania. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 18. 
6 HORTA, Raul Machado. “O sino de Samuel”, mensário da faculdade de direito UFMG de outubro de 1988, 
Belo Horizonte, p. 7 apud SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. 4ª ed. Rio de Janeiro: 
Renovar, 2010, p. 16. 
 17 
O coroamento do movimento dos Direitos Humanos se deu em 1948, com a 
Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia Geral da 
Organização das Nações Unidas, impulsionada pelo fim da Segunda Guerra Mundial 
e a necessidade de reconstrução da sociedade. 
A evolução dos direitos humanos ao longo da história mundial passou por três 
marcos que, nos próximos subitens, são analisados de forma detalhada. 
No Brasil, o início de tais direitos passou a ser resguardado com a 
promulgação da Constituição Federal de 1988, instituída com o fim do regime militar 
ditatorial e a redemocratização do país. 
 
1.1 A ideia de gerações e dimensões dos direitos humanos 
 
Os direitos humanos hoje garantidos são fruto de grande evolução no 
transcurso do tempo. Marcados por conquistas históricas, passaram por muitas 
transformações, lutas de movimentos sociais, revoluções e guerras. Essas 
mudanças são denominadas como fases, gerações ou dimensões dos direitos 
humanos. 
Quanto à terminologia utilizada para retratar a mutação dos direitos humanos, 
é de se ressaltar que há diversas críticas dirigidas à expressão “gerações”. Isto 
porque o termo pode ensejar a ideia de substituição gradativa de uma geração por 
outra, sucessão temporal, o que não ocorre, visto reconhecimento progressivo e 
cumulativo dos mencionados direitos.7 
Paulo Hamilton Siqueira Jr. enfatiza o fato de o Direito ser uma ciência e, por 
tal motivo, apresentar construção própria, não decorrendo a diferença gramatical 
utilizada entre os diversos doutrinadores, comprometedora do conceito e análise do 
objeto, podendo, inclusive, as expressões serem consideradas como sinônimas, 
vejamos: 
 
“Muito se discute se o correto seria tratar o assunto como gerações 
de Direitos Humanos ou como dimensões de Direitos Humanos, 
contudo, a nosso ver, esse debate sobre o pacto semântico é inócuo, 
desnecessário. Ao nos lembrar de que o Direito é uma ciência, e, 
como ciência que é, possui acepções próprias, as quais por vezes se 
diferenciam da gramática, sem que isso comprometa o conceito. 
 
7 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 
21. 
 18 
Assim, denominar-se dimensões ou gerações em nada compromete 
a análise do seu objeto, podendo ser até mesmo tidas como 
expressões jurídicas sinônimas. 8 
 
Em que pese a divergência, esta possui apenas caráter semântico, pois no 
que diz respeito ao conteúdo das respectivas fases há consenso. 
Discordância ocorre apenas no que diz respeito às possíveis novas 
dimensões dos Direitos Humanos, além das três existentes e pacificadas pela 
doutrina. Alguns pesquisadores, em decorrência do crescente desenvolvimento 
social, abordam a necessidade de proteção de novos direitos e falam em até sete 
dimensões, que não são reconhecidas internacionalmente e, ao menos, por 
enquanto, não passam de aspirações. 
 
1.1.1 Primeira dimensão dos direitos humanos: as liberdades públicas e os direitos 
políticos 
 
A primeira dimensão dos direitos humanos, considerada símbolo na busca 
dos direitos do homem, é resultado da Independência Norte-Americana, Revolução 
Francesa e Declaração dos Direitos do Homem em 1789. 
O Estado era visto como inimigo das liberdades públicas, dos Direitos do 
Homem e do Cidadão, pois não havia limite ou regras, prevalecendo uma injusta 
ordem social. 
O início da conquista de uma justa ordem social sucedeu em razão do cunho 
individualista do pensamento burguês, que concentrava todo poder econômico do 
Estado que, por sua vez, empregava-o sem qualquer limitação, com leis arbitrárias 
para a manipulação dos cidadãos em prol dos próprios interesses, gerando 
excessos. 
Isso fez que população se rebelasse contra a arbitrariedade e o autoritarismo 
dos governantes, em busca de melhores condições de vida e uma ordem social 
justa, que possibilitasse situações idênticas. 
 
“Reagindo ao absolutismo do Antigo Regime, o Estado Liberal 
firmou-se entre o século XVIII e início do século XX amparando-se no 
individualismo e na harmonia natural do mercado, tendo como 
 
8 SIQUEIRA JR., Paulo Hamilton, OLIVEIRA, Miguel Augusto Machado de. Direitos humanos: liberdades 
públicas e cidadania. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 30. 
 19 
funções a garantia da ordem pública e da segurança, com poucas 
funções sociais. Seu fundamento, portanto, era assegurar o princípio 
da legalidade contra todos, garantindo os direitos individuais, com a 
mínima intervenção estatal”. 9 
 
Neste período, nasceu a primeira dimensão dos direitos humanos, que 
representou o fim do antigo regime, com a queda da monarquia e privilégios feudais, 
dando origem ao Estado de Direito Liberal, cujo princípio era assegurar a legalidade 
com intervenção estatal mínima, garantindo as liberdades públicas e os direitos 
políticos assegurados como fundamentais. 
 
1.1.2 Segunda dimensão dos direitos humanos: direitos sociais, econômicos e 
culturais 
 
Embora algumas manifestações na Inglaterra, já tivessem ocorrido com a 
Magna Carta Libertatum de 1215 – Constituição de João Sem Terra -, o Petition of 
Rights de 1628, o Habeas Corpus Act de 1679 e o Bill PF Rights de 1689, seguidas 
de outras na América do Norte, com a Declaração dos Direitos da Virgínia, de 12 de 
junho de 1776 e a Declaração de Independência dos Estados Unidos,em 04 de 
julho de 1776, foi apenas em decorrência da Declaração dos Direitos do Homem e 
do Cidadão, promulgada em 26 de agosto de 1789, na França, que inspirou inclusive 
o lema da República Francesa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade, que o homem 
na qualidade de ser humano passou a ter como inerentes os direitos de liberdade e 
igualdade. 
Não havia previsão de direitos sociais de forma específica e o princípio que 
permitia a liberdade contratual, com a não interferência do Estado nas relações, fez 
que os trabalhadores e suas famílias fossem oprimidos e explorados. 
A igualdade absoluta e teórica do Estado Liberal fez surgir a desigualdade 
real, o que passou a gerar injustiças sociais. No Estado onde tudo é permitido, o 
mais forte passou a oprimir o mais fraco.10 
 
“Destes processos, surge a noção de Estado de Direito e os 
pressupostos do Estado Liberal (abstencionista, neutro ou de mínima 
intervenção), garantindo formalmente a igualdade de todos, deixando 
 
9 SAVOIA, Francisco Simões Pacheco. Colaboração premiada e o princípio da imparcialidade. Curitiba: Juruá, 
2018, p. 19. 
10 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 119. 
 20 
a sociedade, formada pela soma de indivíduos moral e 
economicamente competentes, a realização de seu sucesso e 
felicidade. No entanto, a conseqüência desta abstenção estatal 
culminou na desigualdade real e nas injustiças sociais (...)”. 11 
 
Com o Estado atuando de forma neutra, mantendo uma postura negativa 
quanto aos problemas sociais e econômicos e se abstendo de qualquer intervenção, 
desencadeou-se o surgimento do capitalismo desumano. 
 
“O aparecimento de uma nova classe social numerosa, que 
trabalhava em condições desumanas, nas fábricas, fez surgir novas 
reivindicações em prol da dignidade da pessoa humana, os direitos 
socais. A crise econômica de 1929 demonstra a ineficiência da 
passividade do Estado Liberal, gerando exigências de intervenção do 
Estado na economia. O liberalismo econômico traduzia-se no laissez-
faire, laissez-passer, possibilitando um egoísmo econômico”.12 
 
Impulsionada pela inércia estatal, a classe operária, somada ao episódio da 
Revolução Industrial, insurgiu-se, exigindo posição positiva do Estado frente aos 
problemas e cobrando intervenção política para a implementação de direitos 
econômicos e sociais. 
Diante desse quadro, tornou-se necessária a readequação do Estado Liberal. 
Desse modo, o comportamento neutro foi abandonado e cedeu lugar a uma postura 
ativa. Assim, a pressão para a nova adequação do Estado resultou no surgimento 
dos direitos de 2ª dimensão, transformando o Estado Liberal em Estado Social. 
Os direitos humanos de 2ª geração reforçam e consagram a plenitude da 
dignidade da pessoa humana, que é o ponto nevrálgico dos direitos.13 
 
1.1.3 Terceira dimensão dos direitos humanos: os direitos de solidariedade 
 
 A terceira dimensão dos direitos humanos inclui direitos reconhecidos ao 
longo do curso histórico, com o reconhecimento de promoção dos meios para a 
subsistência dos indivíduos, com a materialização de valores e a ampliação dos 
direitos humanos fundamentais para todos os seres humanos. 
 
11 SAVOIA, Francisco Simões Pacheco. Colaboração premiada e o princípio da imparcialidade. Curitiba: Juruá, 
2018, p. 20. 
12 SIQUEIRA JR., Paulo Hamilton. A dignidade da pessoa humana no contexto da pós modernidade. In: Tratado 
luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 260. 
13 RAMOS, André de Carvalho. Direitos humanos em juízo: comentários aos casos contenciosos e consultivos 
da corte interamericana de direitos humanos. São Paulo: Max Limond, 2001, p. 31. 
 21 
 Não há dúvidas de que os horrores da Segunda Guerra Mundial e os 
traumáticos acontecimentos propagados à humanidade pelo nazismo exigiram 
renovação do Estado Social que, logo após o término da Guerra, criou a 
Organização das Nações Unidas, em vinte e quatro de outubro de 1945, com o 
objetivo de manter a paz entre os países.14 
A proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos foi um marco 
de abertura para a reafirmação e a ampliação da dignidade da pessoa humana, 
afirmando os direitos de primeira e segunda geração e inserindo direitos à liberdade 
pessoal, à igualdade, à proibição de discriminações, à proibição de prisões 
arbitrárias sem o devido processo legal, direitos à vida, à segurança pessoal, à 
liberdade de locomoção, além de muitos outros, vistos como mínimos para a 
existência digna de um ser humano. 
Com relação aos direitos que integram a terceira dimensão de direitos 
humanos, Marco Antonio Marques da Silva aduz: 
 
“A terceira geração de direitos fundamentais regula os interesses 
difusos e coletivos15 e “são materializados poderes de titularidade 
coletiva, atribuídos genericamente a todas as formações sociais e 
consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento 
importante no processo de desenvolvimento, expansão e 
reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto 
valores fundamentais, indisponíveis, nota ou uma essencial 
inexauribilidade”. 16 
 
 A categoria de direitos que envolve a terceira dimensão dos direitos humanos 
é coletiva e isso a diferencia das demais. Está relacionada à solidariedade e à 
fraternidade, decorre da luta contra a deterioração da qualidade da vida humana, 
como meio ambiente equilibrado, vida saudável, progresso, entre outros.17 
 Em um apanhado geral e conciso, Celso Antonio de Mello, na ADI 3.540 MC, 
apresenta as seguintes considerações: 
 
 
14 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. A história da Organização. Disponível em: 
https://nacoesunidas.org/conheca/historia/ acessado em 25/09/2019 as 10:43h. 
15 DA SILVA, Marco Antonio Marques. Cidadania e democracia: instrumentos para efetivação da dignidade 
humana. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 226. 
16 MELLO, Celso Antonio, STF, MS 22.164-SP, dju 17.11.1995 apud DA SILVA, Marco Antonio Marques. 
Cidadania e democracia: instrumentos para efetivação da dignidade humana. In: Tratado luso-brasileiro da 
dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 226. 
17 DA SILVA, Marco Antonio Marques. Cidadania e democracia: instrumentos para efetivação da dignidade 
humana. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 226. 
https://nacoesunidas.org/conheca/historia/
 22 
“Vale referir, (...) até mesmo em face da justa preocupação revelada 
pelos povos e pela comunidade internacional em tema de direitos 
humanos, que estes, em seu processo de afirmação e consolidação, 
comportam diversos níveis de compreensão e abordagem, que 
permitem distingui-los em ordens, dimensões ou fases sucessivas 
resultantes de sua evolução histórica. Nesse contexto, (...) impende 
destacar, na linha desse processo evolutivo, os direitos de primeira 
geração (direitos civis e políticos), que compreendem as liberdades 
clássicas, negativas ou formais, e que realçam o princípio da 
liberdade. Os direitos de segunda geração (direitos econômicos, 
sociais e culturais), de outro lado, identificam-se com as liberdades 
positivas, reais ou concretas, pondo em relevo, sob tal perspectiva, 
o princípio da igualdade. Cabe assinalar (...) que os direitos de 
terceira geração (ou de novíssima dimensão), que materializam 
poderes de titularidade coletiva atribuídos, genericamente, e de 
modo difuso, a todos os integrantes dos agrupamentos sociais, se 
consagram como princípio da solidariedade (...)”.18 
 
 Assim, temos como a primeira dimensão de direitos humanos a relação do 
indivíduo com o próprio indivíduo, a segunda dimensão trata do indivíduo e a 
sociedade e a terceira do indivíduo e tudo que garante e envolvedireitos a 
existência digna. 
 
1.1.4 As novas dimensões dos direitos humanos - quarta dimensão de direitos 
 
Traçamos as dimensões dos direitos humanos até a terceira dimensão, de 
forma individualizada, pois estão consagradas no direito internacional. Todavia, há 
de se esclarecer as discussões sobre as novas dimensões no âmbito jurídico. 
As dimensões dos direitos humanos vêm causando grandes discussões entre 
os estudiosos há muitos anos, e isso inclui, inclusive, a terminologia “correta” a ser 
empregada. 
Alguns doutrinadores defendem até sete dimensões de direitos humanos. 
Entretanto, não serão abordadas todas as discussões sobre o tema, pois se faz 
relevante para o estudo em questão somente da primeira à quarta dimensões. 
Sendo esta a nova dimensão de direitos e, inteiramente, complementar às demais 
no constante processo de evolução dos direitos e garantias dos seres humanos. 
Os direitos posteriores aos de terceira dimensão são apresentados como 
novos direitos e a doutrina majoritária defende a bioética como a quarta dimensão 
 
18 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE nº 3.540 MC, voto do rel. min. Celso de Mello, j.1º-9-
2005, p, DJ de 3-2-2006. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoPublicacao 
Tematica/anexo/CTJDireitos Humanos.pdf. Acessado em 12 de abril de 2018, as 16:05h. 
http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoPublicacao%20Tematica/anexo/CTJDireitos%20Humanos.pdf
http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoPublicacao%20Tematica/anexo/CTJDireitos%20Humanos.pdf
 23 
de direitos humanos, baseada na proteção dos valores éticos, morais e na 
integridade da pessoa por meio da bioética, biodireito e biotecnologia. Representam 
o direito à vida das gerações futuras, o direito à vida saudável, ao desenvolvimento 
sustentável, à informação, à democracia, ao patrimônio genético, a identidade 
sexual. 
Embora não haja consenso quanto à existência dos direitos humanos de 
quarta dimensão, Celso Lafer filia-se à corrente que a aceita, afirmando que “os 
direitos de terceira e quarta dimensão transcendem os interesses individuais, 
situando-se numa seara social”. 19 
A biotecnologia e bioética vêm sendo largamente discutida por diversos 
campos de estudo, a exemplo da Medicina, o Direito, da Biologia, da Psicologia 
entre outros. Tal estudo ocorre de maneira especial pelas descobertas científicas e a 
sua estrita relação com o direito à vida, de personalidade e direitos humanos. Além 
da preocupação com o equilíbrio do meio ambiente, sempre levando a dignidade da 
pessoa humana em consideração. 
Segundo Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus Maluf, a bioética é: 
 
“o estudo transdisciplinar entre biologia, medicina, filosofia (ética) e 
direito (biodireito) que investiga as condições necessárias para uma 
administração responsável da vida humana, animal e 
responsabilidade ambiental. Considera, portanto, questões onde não 
existe consenso moral, como a fertilização in vitro, o aborto, a 
clonagem, a eutanásia, os transgênicos e as pesquisas com células-
tronco, bem como a responsabilidade moral de cientistas em suas 
pesquisas e suas aplicações.” 20 
 
Para Norberto Bobbio, a quarta dimensão de direitos humanos compreenderia 
os direitos ligados à vida e à proteção do patrimônio genético. O autor externa sua 
preocupação com efeitos cada vez mais traumáticos de pesquisas biológicas, “que 
permitirão a manipulação do patrimônio genético de cada indivíduo”. 21 
Rodrigo da Cunha Pereira ressalva que: 
 
 
19 LAFER, Celso. A ruptura totalitária e a reconstrução dos direitos humanos. São Paulo: Companhia das Letras, 
1988. p. 124 ss. apud MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de bioética e biodireito. 3ª ed. São 
Paulo: Grupo Gen., 2015, p. 117. 
20 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de bioética e biodireito. 3ª ed. São Paulo: Grupo Gen, 
2015, p. 07. 
21 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 7ª tir. Rio de Janeiro: Elsevier. 2004, p. 08. 
 24 
“tendo por fim a cidadania plena, a reflexão bioética se consolida 
mediante a incorporação dos direitos humanos de quarta e quinta 
gerações à consciência insurgentes da sociedade moderna, daí 
porque a sua conformação histórica marca a transição do Estado de 
direito formal (positivo legalista) ao Estado de justiça social (...). 
Assim, a democracia, instaurando-se com efetividade radical, porque 
se propõe à concretização de todas as gerações de direitos 
humanos, não se compromete somente com o direito individual e 
negativo à saúde e com direito social e positivo à assistência 
sanitária, senão com o conjunto das obrigações humanitárias que a 
reflexão bioética impõe, seja frente às demandas presentes da vida 
humana ameaçadas (fome em escalada global, projeto genoma, 
catástrofes ecológicas, instabilidades nucleares etc), seja frente aos 
direitos humanos das futuras gerações”. 22 
 
Estamos vivendo uma realidade complexa, com grande teor social e valores 
em torno da bioética, as questões compreendidas são de suma importância e 
envolvem temas delicados como valores científicos e religiosos. 
Maria Helena Diniz ressalta que a bioética necessita de um paradigma de 
referência antropológico-moral em busca de uma qualidade de vida digna, dando 
prioridade ao ser humano, buscando sempre o valor supremo da pessoa humana, 
de sua vida, dignidade e liberdade ou autonomia: 
 
“Com o reconhecimento do respeito à dignidade humana, a bioética e 
o biodireito passam a ter um sentido humanista, estabelecendo um 
vínculo com a justiça. Os direitos humanos, decorrentes da condição 
humana referem-se à preservação da integridade e da dignidade dos 
seres humanos e à plena realização de sua personalidade. A bioética 
e o biodireito andam necessariamente juntos com os direitos 
humanos, não podendo, por isso, obstinar-se em não ver as 
tentativas da biologia molecular ou da biotecnociência de manterem 
injustiças contra a pessoa humana sob a máscara modernizante de 
que buscam o progresso científico em prol da humanidade. Se em 
algum lugar houver qualquer ato que não assegure a dignidade 
humana, ele deverá ser repudiado por contrariar a exigências ético-
jurídicas dos direitos humanos. Assim sendo, intervenções científicas 
sobre a pessoa humana que possam atingir sua vida e a integridade 
físico-mental deverão subordinar-se a preceitos éticos e não poderão 
contrariar os direitos humanos. As práticas das “ciências da vida”, 
que podem trazer enormes benefícios à humanidade, contêm riscos 
potenciais muito perigosos e imprevisíveis, e, por tal razão, os 
profissionais da saúde devem estar atentos para que não 
transponham os limites éticos impostos pelo respeito à pessoa 
humana e à sua vida, integridade e dignidade”.23 
 
22 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A sexualidade vista pelos tribunais. 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011, p. 
23. 
23 DINIZ, Maria Helena. O respeito à dignidade humana como paradigma da bioética e do biodireito. In: Tratado 
luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 1019. 
 25 
 
Inúmeros são os documentos internacionais relativos aos direitos humanos e 
à bioética, como a Convenção sobre os Direitos Humanos e Biomedicina, Projeto 
Genoma, Declaração Universal sobre o Genoma Humano e dos Direitos Humanos, 
Convenção das Nações Unidas Sobre a Diversidade Biológica, Declaração 
Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos, Declaração Universal sobre 
Bioética e Direitos Humanos e no âmbito nacional a Lei de Biossegurança – 11.105, 
de 24 de março de 2005, além de projetos de lei sobre biodiversidade e patrimônio 
genético. 
É necessário ter consciência de que os direitos do homem são direitos 
históricos, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de 
novas liberdades e contra velhos poderes. Nascidosde modo gradual, não todos de 
uma vez nem de uma vez por todas; nascem quando devem ou podem nascer. 24 
 
1.2 Diferença entre Direitos Humanos e Direitos Fundamentais 
 
Para os fins objetivados neste estudo, e, como serão mencionados no 
decorrer de toda a construção de ideias, faz-se necessário diferenciar Direitos 
Humanos e Direitos Fundamentais, uma vez que as expressões são utilizadas como 
intercambiáveis, o que não são. Em verdade, estão intimamente ligadas, mas não se 
confundem. 
Com a evolução dos direitos do homem, como ser humano, ao longo dos 
anos e a constante mutação e aperfeiçoamento desses direitos, tornou-se difícil 
definir as expressões e ter somente uma denominada como correta. 
José Afonso da Silva enfatiza a dificuldade terminológica: 
 
“A ampliação e transformação dos direitos fundamentais do homem 
no evolver histórico dificulta definir-lhes um conceito sintético. 
Aumenta essa dificuldade a circunstância de se empregarem várias 
expressões para designá-los (...)”.25 
 
Diversos são os termos empregados para a denominação desses direitos e 
de suas derivações, quais sejam: direitos naturais; direitos humanos; direitos do 
 
24 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 7ª tir. Rio de Janeiro: Elsevier. 2004. 
25 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 179. 
 26 
homem; direitos individuais; direitos do cidadão; direitos civis; direitos públicos 
subjetivos; liberdades fundamentais; liberdades públicas; liberdades individuais; 
direitos fundamentais do homem, entre outros. 
Julio Ricardo de Paula Amaral traz o entendimento de Gregório Robles, com 
vista a diferenciar as expressões: 
 
“Segundo este, a expressão “direitos humanos” ou “direitos do 
homem”, também denominados de forma clássica “direitos naturais”, 
e, atualmente, concebidos como “direitos morais”, na realidade não 
são verdadeiros direitos – protegidos por meio de ações processuais 
perante um juiz -, mas servem de critérios norteadores à boa 
convivência dos indivíduos, tendo em vista que os direitos humanos, 
ou melhor, dizendo, determinados direitos humanos, positivam-se, 
adquirindo a categoria de verdadeiros direitos protegidos 
processualmente e passam a ser direitos fundamentais, no âmbito de 
determinado ordenamento jurídico”. 26 
 
José Joaquim Gomes Canotilho27 analisa as várias expressões e se esforça 
para diferenciá-las: 
- Direitos do Homem e Direitos do Cidadão – distinção presente na 
“Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” de 1789, editada como corolário 
da Revolução Francesa, segunda a qual os Direitos do Homem são direitos 
individuais, pertencendo-lhe “enquanto tal”, ou seja, são inerentes à condição 
humana, ao passo que os Direitos dos Cidadãos são direitos políticos, que 
pertencem ao homem “enquanto ser social, isto é, como indivíduo vivendo em 
sociedade”, e perante o Estado; 
- Direitos Naturais e Direitos Civis – distinção próxima da anterior, 
encontrada no Título I da Constituição Francesa de 1791, consoante a qual os 
Direitos Naturais são inerentes ao indivíduo e os Direitos Civis são os que lhe cabem 
enquanto cidadão, encontrando-se proclamados nas constituições e leis 
infraconstitucionais; 
- Direitos Políticos e Direitos Individuais, entre os Direitos Civis, destacam-
se, de um lado, os Direitos Políticos, correspondentes a uma parcela atribuída 
apenas a determinado grupo de indivíduos, dotando-se de aptidão para “tomar parte 
 
26 ROBLES, Gregório, Los derechos fundamentales y La ética en La sociedad actual, Madri: Civitas, 1997, p. 20 
e seguintes. apud AMARAL, Julio Ricardo de Paula, Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações de 
Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTR, 2014, p.28 
27 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, 7ª ed. Coimbra: 
Almedina, p. 393-398. 
 27 
ativa na formação dos poderes públicos”, o que remanesce, naquela categoria, 
depois de apartados dela, os Direitos Políticos, que são Direitos Individuais. 
- Direitos e Liberdades Públicas – os Direitos Civis admitem, ainda, um ou 
outro tipo de categorização, que coloca, de um lado, as Liberdades Públicas, 
consistentes em direitos dos indivíduos contra a intervenção do Estado (e são 
também conhecidos como “direitos negativos” ou “direitos de abstenção”) e, de 
outro, simplesmente os Direitos (ou “direitos positivos”), que conferem ao indivíduo 
status ativo frente ao Estado, quer porque tenha a prerrogativa de participar 
ativamente da vida política (direito a votar e ser votado), quer porque goze de 
estabilidade de exigir as “prestações necessárias ao desenvolvimento pleno da 
existência individual” (denominados “direitos à prestação). 
São várias as expressões e as mais utilizadas são Direitos Humanos, Direitos 
do Homem e Direitos Fundamentais. 
José Afonso da Silva, em sua obra Curso de Direito Constitucional Positivo, 
conclui que a melhor definição seria Direitos Fundamentais do Homem, vejamos: 
 
“Direitos fundamentais do homem constitui a expressão mais 
adequada a este estudo, porque, além de referir-se a princípios que 
resumem a concepção do mundo e informam a ideologia política de 
cada ordenamento jurídico, é reservada para designar, no nível do 
direito positivo, aquelas prerrogativas e instituições que ele 
concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de 
todas a pessoas. No qualitativo fundamentais acha-se a indicação de 
que se trata de situações jurídicas sem as quais pessoa humana não 
se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; 
fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem 
ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e 
materialmente efetivados. Do homem, não como macho da espécie, 
mas no sentido de pessoa humana. Direitos fundamentais do homem 
significa direitos fundamentais da pessoa humana ou direitos 
fundamentais (...).”28 
 
 Norberto Bobbio está entre aqueles que creem na efetiva proteção e desfrute 
do direito, afirmando ser inteiramente mais importante do que a sua definição. 29 
Jair Teixeira dos Reis adota uma terminologia para cada expressão e as 
diferencia como sendo Direitos Humanos o gênero, do qual Direitos Fundamentais 
 
28 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 182. 
29 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 7ª tir. São Paulo: Elsevier, 2004, p. 36/37. 
 28 
seriam a espécie, enquanto um está em Tratados Internacionais, os outros 
aparecem nas Cartas Constitucionais.30 
Assis Moreira Silva Junior parte da mesma vertente e complementa o 
entendimento: 
 
“Enquanto os direitos humanos são aqueles reconhecidos na órbita 
internacional a todos os homens e mulheres pela sua mera condição 
humana, independente de pertencerem a um ou outro Estado, os 
direitos fundamentais consistem nos direitos humanos positivados 
em uma determinada ordem constitucional”.31 
 
 Dessa forma, os Direitos Humanos são aqueles inerentes a todos os seres 
humanos e positivados no plano internacional, por meio de Documentos, Tratados, 
Acordos. Já os Direitos Fundamentais são os Direitos Humanos positivados no 
ordenamento jurídico de cada país, em sua norma fundamental, a Constituição. 
Como característica, quando positivados no plano constitucional de cada país, 
ambos possuem o mesmo conteúdo, mas consagrados em planos diferentes. 
 
1.3 A Constituição Brasileira de 1988 e a Proteção dos Direitos Humanos – 
Constituição Cidadã 
 
 A Constituição Brasileira de 1988 se destacou por conter grande número de 
direitos e garantias em seu corpo. Além daqueles relativos à cidadania civil e 
política, foram consagrados direitos de cidadania social, como a saúde, previdência 
e assistência social, acesso a bens culturais,dentre outros. 32 
 A Constituição Federal, promulgada em 05 de outubro de 1988, é assim 
chamada, porque, além de ser o marco entre o fim da ditadura militar e a 
democracia, após 21 (vinte e um) anos, conferiu a todos os cidadãos brasileiros 
garantias individuais e direitos sociais ampliados. Determinou o fim de penas cruéis, 
garantiu liberdade de expressão, antes reprimida pela censura, garantiu direito ao 
voto. A Constituição de 1988 tornou-se o documento da Liberdade, Igualdade e 
Democracia. 
 
30 REIS, Jair Teixeira dos. Subordinação Jurídica e o Trabalho a Distância. São Paulo: LTR, 2007. p. 74. 
31 SILVA JUNIOR, Assis Moreira. Diversidade Sexual e Inclusão Social: uma tarefa a ser completada. Franca: 
Lemos e Cruz, 2014, p. 38/39. 
32 GOULART, Marcelo Pedroso. Ministério público e democracia. Leme: Editora de Direito, 1998, p. 136, apud 
ARRUDA, Eloísa de Sousa. O papel do ministério público na efetivação dos tratados internacionais de direitos 
humanos. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 378. 
 29 
 
“O momento político vivido com o final do regime militar e o início da 
democratização trouxe à lume, na época da constituinte, todos os 
receios de que o país pudesse voltar a ser dominado por uma 
ditadura. Atendendo a essa preocupação, a Carta Constitucional foi 
elaborada de forma extremamente garantista, e até mesmo nomeada 
de “Constituição Cidadã” ”. 33 
 
 Nas palavras de José Afonso da Silva, é a Constituição Cidadã, porque teve 
ampla participação popular em sua elaboração e, em especial, porque se volta 
decididamente para a plena realização da cidadania. 34 
A Constituição Democrática Brasileira teve implantação tardia, mas se tornou 
uma das Constituições mais avançadas do mundo, como nos ensina Flavia 
Piovesan: 
 
“Cabe considerar a Carta de 1988, como marco jurídico da transição 
ao regime democrático, que alargou significativamente o campo dos 
direitos e garantias fundamentais, colocando-se entre as 
Constituições mais avançadas do mundo no que diz respeito à 
matéria. 35 
 
Desde o preâmbulo, a Carta de 1988 estabelece a instituição de um Estado 
Democrático de Direito: “destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e 
individuais; a liberdade; a segurança; o bem-estar; o desenvolvimento; a igualdade e 
a justiça, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem 
preconceitos (...)”. 
A Constituição Cidadã acolhe a concepção contemporânea de cidadania na 
medida em que consagra a indivisibilidade dos direitos humanos: 
 
“Em relação à universalidade dos direitos humanos, tendo o texto da 
constituição declarado a dignidade da pessoa humana como um 
fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, III), já 
assegurou disso a inviolabilidade dos direitos e garantias 
fundamentais a toda e qualquer pessoa sem discriminação. Além 
disso, consagrou a prevalência dos direitos humanos como um dos 
princípios a reger o Brasil na ordem internacional (art. 4º, II) e 
estabeleceu cláusula constitucional aberta a receber outros direitos, 
inclusive decorrentes de tratados internacionais (art. 5º, §2º), 
 
33 ARRUDA, Eloísa de Sousa. O papel do ministério público na efetivação dos tratados internacionais de direitos 
humanos. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 378. 
34 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 80. 
35 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 
2010, p. 25. 
 30 
realçando que os direitos humanos são tema de legítimo interesse da 
comunidade internacional, transcendendo as fronteiras do Estado”. 36 
 
 A Constituição de 1988 é a sétima, desde a independência do país, e a que 
registra maior período democrático após a Constituição de 1946, cujo início ocorreu 
com o fim do Estado Novo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
36 ARRUDA, Eloísa de Sousa. O papel do ministério público na efetivação dos tratados internacionais de direitos 
humanos. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 381. 
 31 
2 TRANSEXUALIDADE - SEXO, GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL E 
IDENTIDADE DE GÊNERO 
 
Relevante, para a compreensão do estudo, esclarecer as diversas definições 
de sexo, gênero, orientação sexual e identidade de gênero. Tais conceitos não são 
unânimes e, com o passar dos anos e as constantes evoluções sobre o tema, as 
expressões passaram a ser usadas de forma sinônima, gerando confusão. 
O objetivo do presente trabalho não é esgotar o assunto e a diversidade de 
abordagens terminológicas existentes; antes, porém, visa estabelecer conceitos 
fundamentais para a compreensão, análise e definição da pessoa transexual, que 
será abordada em tópico próprio. 
A definição de transexual, com os conceitos de sexo, gênero, orientação 
sexual e identidade de gênero bem definidos e inteiramente esclarecidos, apresenta-
se mais clara, facilitando a análise do tema, calcado na dificuldade de inclusão no 
mercado de trabalho e na sociedade em si, de um grupo reprimido e constantemente 
desrespeitado pela heteronormatividade37 do Estado. 
No estudo do presente capítulo, optamos pela utilização de algumas 
definições trazidas nos Princípios de Yogykarta38, elaboradas por especialistas do 
tema em questão. Tais princípios refletem o estado da legislação internacional atual 
de Direitos Humanos em relação à orientação sexual e à identidade de gênero; 
ainda, promovem a igualdade, a dignidade, a fruição e o exercício de direitos sem 
discriminação. 
Os conceitos trazidos pelos Princípios de Yogyakarta são adotados pela 
Comissão Internacional de Direitos Humanos, que reconheceu especificidade sobre 
o assunto. 
 
 
 
37 O termo heteronormatividade, cunhado em 1991 por Michael Warner, é compreendido e problematizado como 
um padrão de sexualidade que regula o modo como as sociedades ocidentais estão organizadas. Em sua maioria, 
a sociedade brasileira é heteronormativa e cisnormativa. Ela considera que o normal é ser heterossexual e 
cisgênero. Quem foge do padrão seria anormal, esquisito ou até mesmo doente. “Heteronormatividade é um 
termo que permeia a ideia de binarismo e convenções sociais em relação à orientação sexual”. Disponível em: 
http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Cartilhas/Direito_Diversidade.pdf. Acessado em 24/09/2018 as 
22:50h. 
38 Princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação à orientação sexual e 
identidade de gênero. Os princípios de Yogyakarta serão abordados no Capítulo 5 – Proibição da discriminação 
por orientação sexual no direito internacional, em item próprio. 
http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Cartilhas/Direito_Diversidade.pdf.%20Acessado%20em%2024/09/2018
 32 
 
2.1 Conceito de sexo 
 
Segundo o dicionário, sexo tem como conceito o conjunto de características 
anatomofisiológica que distinguem o homem e a mulher: sexo masculino; sexo 
feminino.39 
Inserida na questão da sexualidade há, também, a intersexualidade, que 
surge como uma condição genética, física ou anatômica do sujeito, que apresenta 
um fenótipo que não permite a clara definição entre a conceituação binária 
homem/mulher, seja por apresentar estrutura genital que não autoriza a sua 
alocação em grupos, ou em face de presença de aspectos de genitália condizentes 
com os dois conceitos.40 
A atual concepção da palavra sexo passa por uma percepção que vai desde 
o ato sexual em si, até a indicação da configuração anatômica das pessoas, tocando 
ainda na ideia da indicação distintiva das pessoas como pertencentesao grupo dos 
homens (gênero masculino) ou das mulheres (gênero feminino). Seja qual for a 
acepção tomada, fato é que o conceito de sexo é parte integrante da vida das 
pessoas, podendo certamente ser tido como um dos caracteres mais elementares 
de identificação da pessoa natural.41 
Partindo do viés classificatório ou distintivo do qual a expressão sexo é 
dotada, é possível entendê-la como parâmetro de divisão dos seres, em regra entre 
machos e fêmeas, ou homens e mulheres, atrelada a uma perspectiva mais voltada 
ao fenótipo ou à estrutura genital. 
Ainda há grande confusão com a terminologia sexo, que é muito empregada 
como gênero; porém, o sexo está na perspectiva biológica (da sexualidade), atrelado 
à dicotomia binária. 
Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus Maluf nos reafirma que o conceito de 
sexo em nada tem a ver com outras terminologias que ainda geram conflitos, ao 
deixar claro que sexo pode ser definido como conjunto de características biológicas, 
contidas nos aparelhos reprodutores masculino e feminino e que, por sua vez, não 
 
39 http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/sexo/ 
40 CUNHA, Leandro Reinaldo da. Identidade e redesignação de gênero aspectos da personalidade, da família e 
da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 29 
41 CUNHA, Leandro Reinaldo da. Identidade e redesignação de gênero aspectos da personalidade, da família e 
da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 21. 
 33 
determina a identidade de gênero nem a orientação sexual do indivíduo.42 
A concepção de sexo nos remete à simplicidade de conceituação; todavia, é 
algo extremamente complexo, que resulta de influência biológica, psicológica, 
sociológica e jurídica. 
 
2.1.1 Gênero 
 
O gênero tem caráter construído cultural e socialmente, antes mesmo do 
nascimento, atribuído pelas diferenças biológicas do homem e da mulher. 
Com o nascimento, a sociedade exige que seja adotado determinado padrão 
de comportamento a partir do sistema binário do sexo biológico. Dessa forma, a 
mulher deverá se sujeitar a um modo de agir feminino, enquanto o homem, 
necessariamente, terá de adotar um modo masculino de agir, no que se refere ao 
jeito de falar, comportamento, hábitos, vestimentas e tudo que se refere ao suposto 
universo estereotipado “masculino” e “feminino”.43 
 
“Conceito formulado nos anos 1970 com profunda inf luência do 
movimento feminista. Foi criado para distinguir a dimensão biológica 
da dimensão social, baseando-se no raciocínio de que há machos e 
fêmeas na espécie humana, levando em consideração, no entanto, 
que a maneira de ser homem e de ser mulher é realizada pela 
cultura. Assim, gênero significa que homens e mulheres são produtos 
da realidade social e não somente decorrência da anatomia de seus 
corpos”. 44 
 
Ocorre presunção baseada no sexo morfológico, de que, desde o 
nascimento, é preciso comportamento condizente com os órgãos sexuais. 
 
2.1.2 Orientação sexual 
 
Orientação sexual está ligada ao interesse sexual que uma pessoa pode 
sentir por outra. 
 
42 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de bioética e biodireito. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, 
p. 301. 
43 MEZA, Juan N. Silva; HERNÁNDEZ, Sergio A. Valls. Transexualidad y matrimonio y adopción por parejas 
del mismo sexo – criterios de La Suprema Corte de Justiça de La Nación. Cuidad de México: Editorial Porruá, 
2011, p.12. 
44 GRUPO DIGNIDADE. Manual de Comunicação LGBTI+. Disponível em: 
http://www.grupodignidade.org.br/wp-content/uploads/2018/05/manual-comunicacao-LGBTI.pdf acessado em 
21/10/2018 as 19:25h. 
 
http://www.grupodignidade.org.br/wp-content/uploads/2018/05/manual-comunicacao-LGBTI.pdf%20acessado%20em%2021/10/2018
http://www.grupodignidade.org.br/wp-content/uploads/2018/05/manual-comunicacao-LGBTI.pdf%20acessado%20em%2021/10/2018
 34 
Segundo os Princípios de Yogyakarta, orientação sexual é a capacidade de 
cada pessoa de ter uma profunda atração emocional, afetiva ou sexual por 
indivíduos de gênero diferente, do mesmo gênero ou de mais de um gênero, assim 
como ter relações íntimas e sexuais com essas pessoas. 45 
 
“Basicamente, há três orientações sexuais preponderantes: pelo 
mesmo sexo/gênero (homossexualidade), pelo sexo/gênero oposto 
(heterossexualidade) ou pelos dois sexos/gêneros (bissexualidade). 
Estudos demonstram que as características da orientação sexual 
variam de pessoa a pessoa”.46 
 
A orientação sexual corresponde à forma pela qual o indivíduo vai viver a 
sua sexualidade, podendo ser ele heterossexual, homossexual, bissexual ou 
assexual.47 
Não se deve falar em opção sexual, mas em orientação sexual, expressão 
que significa que o desejo sexual está em direção a determinado gênero.48 
 
2.1.3 Identidade de gênero 
 
A identidade de gênero, conforme os princípios de Yogyakarta: 
 
“(...) está ligada ao profundamente sentido, de acordo com 
experiência interna e individual do gênero de cada pessoa, que pode 
ou não compreender ao sexo atribuído no nascimento, incluindo o 
senso pessoal do corpo (que pode envolver, por livre escolha, 
modificação da aparência ou função corporal, por meios médicos, 
cirúrgicos ou outros) e outras expressões de gênero, inclusive 
vestimenta, modo de falar e maneirismo”.49 
 
Assim, a identidade de gênero não tem qualquer relação com o sexo 
biológico, transpassando o fechado sistema binário e descumprindo o socialmente 
imposto ao assumir um gênero sexual diverso do sexo físico, a criar a pessoa 
 
45 Princípios de Yogyakarta. Disponível em: www.clam.org.br/pdf/principios_de_yogyakarta.pdf. Acessado em 
21/04/2018 às 19:06h. 
46 GRUPO DIGNIDADE. Manual de Comunicação LGBTI+. Disponível em: 
http://www.grupodignidade.org.br/wp-content/uploads/2018/05/manual-comunicacao-LGBTI.pdf. Acessado em 
21/10/2018 as 19:34h. 
47 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de bioética e biodireito. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 
2015, p. 301. 
48 DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade e os direitos lgbti, 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, 
p.42 
49 Princípios de Yogyakarta. Disponível em: http://www.clam.org.br/uploads/conteudo/principios 
_de_yogyakarta.pdf . Acessado em 21/04/2018 às 19:06h. 
http://www.clam.org.br/pdf/principios_de_yogyakarta.pdf.%20Acessado%20em%2021/04/2018
http://www.clam.org.br/pdf/principios_de_yogyakarta.pdf.%20Acessado%20em%2021/04/2018
http://www.clam.org.br/uploads/conteudo/principios%20_de_yogyakarta.pdf%20.%20Acessado%20em%2021/04/2018
http://www.clam.org.br/uploads/conteudo/principios%20_de_yogyakarta.pdf%20.%20Acessado%20em%2021/04/2018
 35 
identidade com o gênero com que se identifica. 
 
2.2 Transexualidade 
 
A primeira referência à palavra transexual foi despretensiosa, sob a forma 
seelischer Transsexualism, pelo sexólogo alemão Magnus Hirschefeld, em 1923. 
Contudo, a origem da palavra foi atribuída ao doutor D.O Cauldwell, para indicar 
genericamente aquele que não se identifica com o sexo biológico, em um artigo para 
uma revista científica de educação sexual, intitulado Psychopathia transexualis, de 
1949, temos o relato do primeiro caso de transexual feminino para masculino. 
A terminologia, utilizada atualmente, transexualismo, atribuída por Collete 
Chiland e Catherine Millot a Harry Benjamin, apenas alcançou notoriedade com a 
publicação do artigo “Fenômeno transexual”, no Jornal Internacional de Sexologia, 
por Benjamin.50 
Muitas são as divergências quanto à expressão, sendo por médicos 
denominado transexualismo, enquanto pesquisadores, inclusive da área jurídica, 
transexualidade. 
Em decorrência das diversas posições e diferenciações, a opção no 
presente trabalho foi adotar a terminologia utilizada pelos movimentos sociais, 
utilizando a terminologia transexual, transexualidadeou pessoa trans (conceito 
amplo), pois o sufixo ISMO é utilizado para doenças, assim, transexualismo é um 
termo médico, e o fito da pesquisa é não sedimentar a patologização dos 
transexuais. Dessa forma passaremos a empregar uma das nomenclaturas 
mencionadas. 
No âmbito internacional vem sendo utilizada siglas para designar a 
transformação das pessoas transexuais. A sigla MtF (male to female) vem sendo 
utilizada para designar a transformação do homem para mulher e FtM (female to 
male) para designar a transformação da mulher para homem. 
 
2.2.1 Conceito 
 
A transexualidade, para a maioria dos doutrinadores, remete à ideia de 
 
50 PEZZINI, Barbara. Transgenere in Italia: Le regole del dualismo di genere e l’uguaglianza. In: POMPEU, 
Gina Vidal Marcilio, SCAFF, Fernando Facury – Discriminação por orientação sexual – a homosexualidade e a 
transexualidade diante da experiência constitucional. Florianópolis: Conceito, 2012, p. 327. 
 36 
incompatibilidade do sexo biológico com o sexo psicológico, a metáfora da pessoa 
que se sente presa em um corpo que não lhe pertence. 
Maria Helena Diniz define transexualidade como: 
 
“(...) a condição sexual da pessoa que rejeita sua identidade genética 
e a própria anatomia de seu gênero, identificando-se 
psicologicamente com o gênero oposto. Trata-se de um drama 
jurídico-existencial, por haver uma cessão entre a identidade sexual 
física e psíquica. É a inversão da identidade psicossocial, que leva a 
uma neurose reacional obsessivo-compulsiva, manifestada pelo 
desejo de reversão sexual integral.51 
 
Não seria caracterizado por um simples incômodo e sim rejeição total ao 
sexo biológico, levando à automutilação genital ou de seios. 
Alguns médicos ainda dividem os transexuais em categoria primária e 
secundária, que seriam os transexuais não verdadeiros com base na estabilidade e 
desejo de mudança de sexo, como Matilde Josefina Sutter, com o apoio do cirurgião 
Roberto Farina, vejamos: 
 
“(...) o transexual primário apresenta uma obsessão de mudança de 
sexo ‘compulsiva, precoce, imperativa e perene’, o transexual 
secundário alterna fases de atividade homossexual e travestismo, 
“apresentando impulsos transitórios e ocasionais de 
transexualidade”. 52 
 
O transexual primário tem a clara concepção de inadequações entre a sua 
identidade de gênero e anatomia, mas não sofrem de nenhuma enfermidade 
psíquica, e não buscam intervenção cirúrgica objetivando a prostituição ou fins 
econômicos.53 Os transexuais secundários ou não puros manifestam 
esporadicamente o interesse de pertencer a outro gênero, não se enquadrando à 
ideia do transexualismo verdadeiro.54 
 
51 DINIZ, Maria Helena, O estado atual do biodireito, São Paulo, Saraiva, 2011, p. 316. 
52 SUTTER, Matilde Josefina, Determinação e mudança de sexo. Aspectos médicos-legais. São Paulo: RT, 1993, 
p. 109, apud GONÇALVES, Camila de Jesus Mello, Transexualidade e diretos humanos – o reconhecimento da 
identidade de gênero entre os direitos humanos, Curitiba: Juruá, 2014, p. 69. 
53 COSSI, Rafael Kalaf. Transexualismo, psicanálise e gênero, dissertação de mestrado apresentada ao Instituto 
de Psicologia da Universidade de São Paulo em 2010, p. 33 apud Cunha, Leandro Reinaldo da. Identidade e 
redesignação de gênero aspectos da personalidade, da família e da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen 
Juris, 2015, p. 37. 
54 LEITE JÚNIOR, Jorge. Nossos corpos também mudam: Sexo, gênero e a invenção das categorias “travesti” e 
“transexual” no discurso cientifico, tese de doutorado apresentada ao Departamento de Ciências Sociais da PUC-
SP em 2008, p.174 apud Cunha, Leandro Reinaldo da. Identidade e redesignação de gênero aspectos da 
personalidade, da família e da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 37. 
 37 
Luiz Alberto Davi Araujo defende que, no caso do transexual secundário, 
não seria conveniente pensar em intervenção médica, pois a condição não se 
mostra contínua, ocorre de forma totalmente transitória.55 
Para Evaldo Souza Couto: 
 
“O transexual é aquele que recusa totalmente o sexo que lhe foi 
atribuído civilmente. Identifica-se psicologicamente com o sexo 
oposto, embora biologicamente não seja portador de nenhuma 
anomalia. Geralmente possui genitália perfeita, interna e externa, de 
um único sexo, mas a nível psicológico responde a estímulos de 
outro”.56 
 
Segundo Antônio Chaves, “o transexual acredita insofismavelmente 
pertencer ao sexo contrário à sua anatomia e por isso se traveste”. Tornando-se, 
assim, a operação de mudança de sexo uma obstinação. Em momento algum vive, 
comporta-se ou age como homem. Quando o faz é sob condições estressantes, que 
podem conduzi-lo a consequências neuróticas e até psicóticas. Estas podem chegar 
ao ponto de induzi-lo à automutilação da genitália e, em certos casos ao suicídio.57 
No dicionário jurídico, Maria Helena Diniz define transexual da seguinte 
forma: 
 
Transexual: Medicina legal e psicologia forense. 1. Aquele que não 
aceita o seu sexo, identificando-se psicologicamente com o sexo 
oposto (Hodja), sendo, portanto, um hermafrodita psíquico (H. 
Benjamin). 2. Aquele que, apesar de aparentar ter um sexo, 
apresenta constituição cromossômica do sexo oposto e mediante 
cirurgia passa para outro sexo (Othon Sidou). Tal intervenção 
cirúrgica para a mulher consiste na retirada dos seios, fechamento da 
vagina e confecção de pênis artificial e, para o homem, na 
emasculação e posterior implantação de uma vagina (Paulo Matos 
Peixoto). 3. Para a Associação Paulista de Medicina, é indivíduo com 
identificação psicossexual oposta aos seus órgão genitais externos, 
com desejo compulsivo de mudá-los. 4. Aquele que, tendo morfologia 
genital masculina, sente-se psicologicamente mulher, rejeitando seu 
papel de gênero masculino até buscar a alteração de sua anatomia 
para assumir aparência física feminina. Correspondentemente, há 
mulheres em situação análoga (Aldo Pereira).58 
 
Muitos doutrinadores adotam como necessário diferenciar travestis e 
 
55 ARAUJO, Luiz Alberto Davi. A proteção constitucional do transexual. São Paulo, Saraiva, 2000, p. 34. 
56 COUTO, Evaldo Souza, Transexualidade: o corpo em mutação, Salvador: GGB, 1999, p. 26. 
57 CHAVES, Antônio. Direito à vida e o próprio corpo: intersexualidade, transexualidade, transplantes. 2ª ed. 
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 140. 
58 Dicionário Jurídico, São Paulo: Saraiva, 1998, v.4, p. 604. 
 38 
transexuais em grupos distintos, muitos ainda afirmam que transexuais querem 
passar por cirurgia de transgenitalização, enquanto os travestis se conformam com o 
próprio corpo e sentem prazer com isso. 
Luiz Alberto Davi Araujo afirma que o transexual está inserido em uma 
condição de sofrimento intenso, causador de conflitos internos, por ter sexo biológico 
diverso ao que se identifica, sendo que a travesti, por sua vez, vale-se de seus 
próprios genitais para sentir prazer, mesmo utilizando vestimentas do sexo oposto.59 
Na esfera internacional, ainda podemos notar essa distinção, como defende 
Barbara Pezinni: 
 
“O termo transexualismo refere-se à condição de quem realizou 
procedimento de retificação do sexo atribuído ao nascimento, 
realizando o “trânsito” de um sexo para o outro. São chamados de 
trans FtM (“Female to Male”) pessoas que, biologicamente 
classificadas como mulheres, adaptam à identidade psíquica a 
masculina e MtF (“Male to Female”), aqueles que executam o 
processo inverso, isto é, classificados biologicamente como homens 
e fazem adaptação a identidade psíquica feminina.60 (Tradução 
Livre) 
 
A mesma doutrinadora, também, diferencia a transexualidade de 
travestismo, afirmando que o travestismo refere-se a comportamentos que implicam 
uma reformulação do papel de gênero, como cabelo e maquiagem; sendo

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