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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC – SP NATHALIA CAROLINI MENDES DOS SANTOS MERCADO DE TRABALHO DO TRANSEXUAL – PROIBIÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO, O TRABALHO DECENTE E AS AÇÕES AFIRMATIVAS COMO FORMA DE INCLUSÃO MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO 2018 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC – SP NATHALIA CAROLINI MENDES DOS SANTOS MERCADO DE TRABALHO DO TRANSEXUAL – PROIBIÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO, O TRABALHO DECENTE E AS AÇÕES AFIRMATIVAS COMO FORMA DE INCLUSÃO Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito do Trabalho, sob a orientação da Professora Doutora Fabíola Marques. SÃO PAULO 2018 NATHALIA CAROLINI MENDES DOS SANTOS MERCADO DE TRABALHO DO TRANSEXUAL – PROIBIÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO, O TRABALHO DECENTE E AS AÇÕES AFIRMATIVAS COMO FORMA DE INCLUSÃO Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito do Trabalho, sob a orientação da Professora Doutora Fabíola Marques. Aprovada em: ____/____/_______ Banca Examinadora Professora Doutora Fabíola Marques (Orientadora) Instituição: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC – SP Julgamento: ______________________________________________ Avaliação: _______________________________________________ Professor (a) Doutor (a) ____________________________________ Instituição: _______________________________________________ Julgamento: ______________________________________________ Avaliação: _______________________________________________ Professor (a) Doutor (a) ____________________________________ Instituição: _______________________________________________ Julgamento: ______________________________________________ Avaliação: _______________________________________________ Agradeço ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) por ter me concedido bolsa de estudos durante o curso de mestrado, sem a qual essa pesquisa não seria desenvolvida. DEDICATÓRIA Dedico o presente trabalho, primeiramente, a Deus, que permitiu a conquista de um grande sonho, concedendo garra e coragem para superar todos os desafios. Aos meus amados pais, que sempre estiveram ao meu lado e foram força nos momentos difíceis, paz durante a tormenta e amor em todos os dias da minha vida. Aqueles que jamais permitiram que eu, sequer, cogitasse desistir dos meus objetivos e sempre me mostraram que tudo na vida é fruto de muita dedicação e determinação. Palavras jamais serão suficientes para demonstrar minha eterna gratidão. À minha família, que por diversas vezes compreendeu minha ausência no período do mestrado. À minha orientadora, Professora Doutora Fabíola Marques, a quem agradeço profundamente a oportunidade de ingresso no curso de mestrado da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, além de toda atenção, paciência, carinho e presteza no desenvolvimento e conclusão do presente trabalho. À Professora Doutora Suely Ester Gitelman, que abriu as portas para essa conquista ao permitir minha participação na condição de aluna ouvinte em suas aulas ministradas no curso de mestrado, como assistente nas aulas da graduação e posteriormente por me assentir frequentar suas aulas como aluna regular. Aos grandes amigos conquistados durantes esta trajetória, que por vezes tornaram meus dias mais leves, apenas pela presença e sorriso. Agradeço ao amigo Francisco Simões Pacheco Savoia, que sempre incentivou o início e o fechamento no curso de mestrado acadêmico. Por fim, e não menos importante, agradeço aos funcionários da secretária de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em especial ao amigo Rui de Oliveira Domingos, atencioso e solícito a todas as dúvidas e prestativo em todos os momentos do curso. RESUMO Apesar de ainda faltar muito para que os transexuais tenham seus direitos plenamente assegurados no Brasil, nos últimos anos, muitas conquistas foram alcançadas. A agenda política nacional e internacional incluiu a luta encadeada por anos dos movimentos sociais na busca de igualdade de condições, respeito, liberdade, vida digna e pleno exercício da cidadania para a população LGBTI+. O ordenamento jurídico brasileiro é falho e não regulamenta, de forma específica, a proteção e a defesa dos transexuais que, no intuito de eliminar a invisibilidade e a perseguição, encontraram na evolução dos direitos humanos e princípios constitucionais a chance de reconhecimento perante a coletividade, deixando, paulatinamente, de fazer parte de um grupo que sobrevive à margem da sociedade, considerado de forma constante como rés ou “algo” que não deveria existir, por vezes habitando o submundo da prostituição em busca, ao menos, de sustento. No entanto, esse caminho não foi fácil e ainda restam inúmeras dificuldades na efetividade desses direitos, pois o preconceito, a discriminação e a intolerância criam numerosos obstáculos. Em vista disso, o presente estudo analisou a proteção jurídica dos transexuais e sua efetividade, por meio de ações afirmativas de combate à discriminação como forma de assegurar o mínimo existencial, garantindo a inclusão no mercado de trabalho e em todos os segmentos sociais, frisando a necessidade de lei regulamentar que criminalize práticas discriminatórias, intolerância ou violem os direitos fundamentais e, por fim, o fortalecimento da atuação do Ministério Público do Trabalho na fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista, acompanhando denúncias e estimulando a sua realização. Palavras-chave: Transexualidade. Inclusão social. Preconceito. Discriminação. Efetividade do direito. ABSTRACT Although there is still a long way for transsexuals to have their rights fully assured in Brazil, in recent years many achievements have been achieved. The national and international political agenda included the struggle linked by years of social movements in the pursuit of equality of conditions, respect, freedom, dignified life and full exercise of citizenship for the LGBTI + population. The Brazilian legal system is flawed and does not specifically regulate the protection and defense of transsexuals who, in order to eliminate invisibility and persecution, have found in the evolution of human rights and constitutional principles the chance of recognition before the community, leaving gradually to be part of a group that survives on the fringes of society, consistently considered as rests or "something" that should not exist, sometimes inhabiting the underworld of prostitution in search of at least sustenance. However, this path has not been easy and there are still many difficulties in the effectiveness of these rights, since prejudice, discrimination and intolerance create many obstacles. In view of this, the present study analyzed the legal protection of transsexuals and their effectiveness, through affirmative actions to combat discrimination as a way to ensure the existential minimum, guaranteeing inclusion in the labor market and in all social segments, stressing the the need for a regulatory law that criminalizes discriminatory practices, intolerance or violates fundamental rights, and finally, the strengthening of the work of the Public Labor Ministry in monitoring compliance with labor legislation, following up on complaints and stimulating their implementation. Keywords: Transsexuality. Social Inclusion. Preconcepion. Discrimination. Effectiveness of Law. LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ABGLT Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade AMAPO-SP Associação de Travestis, Mulheres Transexuais e Homens Trans – LGBT do Estado de SãoPaulo ANTRA Associação Nacional de Transexuais e Travestis ART. Artigo CID-10 Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados a Saúde CF Constituição Federal CLT Consolidação das Leis do Trabalho DSM – 5 Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5ª edição LGBT Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros LGBTI+ Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Intersexuais e outras identidades de gênero e sexualidade MtF Male to Female (Masculino para o Feminino) FtM Female to Male (Feminino para o Masculino) MPT Ministério Público do Trabalho OIT Organização Internacional do Trabalho OMS Organização Mundial de Saúde ONU Organização das Nações Unidas PL Projeto de Lei REDETRANS Rede Nacional de Pessoas Trans TAC Termo de Ajuste de Conduta SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 12 1 DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS ..................................... 16 1.1 A ideia de gerações e dimensões dos direitos humanos ................................... 17 1.1.1 Primeira dimensão dos direitos humanos: as liberdades públicas e os direitos políticos ............................................................................................................... 18 1.1.2 Segunda dimensão dos direitos humanos: direitos sociais, econômicos e culturais ............................................................................................................... 19 1.1.3 Terceira dimensão dos direitos humanos: os direitos de solidariedade .......... 20 1.1.4 As novas dimensões dos direitos humanos - quarta dimensão de direitos .... 22 1.2 Diferença entre Direitos Humanos e Direitos Fundamentais ............................. 25 1.3 A Constituição Brasileira de 1988 e a Proteção dos Direitos Humanos – Constituição Cidadã............................................................................................. 28 2 TRANSEXUALIDADE - SEXO, GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL E IDENTIDADE DE GÊNERO ................................................................................ 31 2.1 Conceito de sexo ............................................................................................... 32 2.1.1 Gênero ............................................................................................................ 33 2.1.2 Orientação sexual ........................................................................................... 33 2.1.3 Identidade de gênero ...................................................................................... 34 2.2 Transexualidade ................................................................................................ 35 2.2.1 Conceito ......................................................................................................... 35 2.3 Cirurgia de readequação de sexo - transgenitalização ...................................... 42 2.4 Transexualidade bioética e biodireito ................................................................ 44 2.5 Necessidade de despatologização da transexualidade ..................................... 45 3 A TRANSEXUALIDADE À LUZ DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS .................. 48 3.1. Os direitos fundamentais e o sistema constitucional de direitos e garantias .... 49 3.1.1 Princípio da dignidade da pessoa humana ..................................................... 50 3.1.2 Liberdade ........................................................................................................ 52 3.1.3 Igualdade ........................................................................................................ 54 3.2 Direito ao livre desenvolvimento da personalidade como direito autônomo ...... 58 4 TRABALHO DECENTE ...................................................................................... 63 4.1 Preconceito e discriminação .............................................................................. 63 4.2 Trabalho decente ............................................................................................... 65 4.3 Formas de exclusão social – mercado de trabalho ........................................... 68 4.4 O trabalho decente e o direito internacional ...................................................... 71 5 PROIBIÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO POR ORIENTAÇÃO SEXUAL NO DIREITO INTERNACIONAL ............................................................................................... 74 5.1 Os tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento jurídico nacional ............................................................................................................... 76 5.2 A proteção da transexualidade no sistema internacional de direitos humanos . 78 5.3 Princípios de Yogyakarta – combate à violência e discriminação por identidade de gênero ............................................................................................................ 80 6 AÇÕES AFIRMATIVAS E O COMBATE À DISCRIMINAÇÃO DE TRANSEXUAIS ................................................................................................... 84 6.1 Grupos minoritários ou minorias - conceito ....................................................... 85 6.2 Diferença entre minorias e grupos vulneráveis .................................................. 87 6.3 Ações Afirmativas .............................................................................................. 89 6.4 Ações afirmativas x discriminações positivas .................................................... 91 6.5 Ações Afirmativas como forma de combate à discriminação dos transexuais – conscientização ................................................................................................... 94 6.6 A ação do Estado e as Políticas Públicas junto ao combate à discriminação de transexuais .......................................................................................................... 96 6.6.1 Atos do Poder Executivo: ............................................................................... 96 6.6.2 Planos e Programas ....................................................................................... 97 7 O COMBATE À DISCRIMINAÇÃO NO AMBIENTE DE TRABALHO – O MINISTÉRIO PÚBLICO E OS INSTRUMENTOS DE PROTEÇÃO E DEFESA DOS TRANSEXUAIS .......................................................................................... 99 7.1 Atuação extrajudicial do Ministério Público ...................................................... 101 7.1.1 Inquérito civil ................................................................................................. 102 7.1.2 Termo de Ajuste de Conduta ........................................................................ 102 7.1.3 Atuação do Ministério Público do Trabalho na promoção de interesses – Exercício de cidadania....................................................................................... 104 7.2 Atuação judicial do ministério público do trabalho ........................................... 105 7.2.1 Ação civil pública .......................................................................................... 106 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 107 REFERÊNCIA ....................................................................................................... 110 12 INTRODUÇÃO Há anos que questões relacionadas à sexualidade humana despertam curiosidade, dúvidas, controvérsias e grandes polêmicas. A ausência de legislação que verse de maneira exclusiva sobre o tema dificulta a discussão de direitos e punição ao descumprimento destes. Mesmo com a omissão do Estado em criar norma jurídica regulamentadora a respeito, o tema começa a ganhar novos contornos. Facea esse cenário, o presente trabalho tem por objetivo a análise da proteção jurídica das pessoas transexuais dentro do mercado de trabalho, examinando formas de proibição da discriminação, inclusão social e condições dignas que garantam e as aproximem do trabalho decente. De tantos pontos controversos, a pesquisa debruça-se na análise de tratados e convenções internacionais, que, se ratificados, incorporam direitos na Constituição Federal Brasileira e a promoção social, que vem despertando, inclusive, o interesse de particulares na criação de medidas de apoio e incentivo aos transexuais na busca de colocação no mercado trabalho e algumas auxiliando no recomeço da vida, a abrigar aqueles expulsos de casa pelas famílias. A pesquisa reflete a preocupação com questões atinentes ao preconceito, discriminação e intolerância a que estão submetidas às pessoas trans1. O estereótipo arraigado bloqueia a percepção das pessoas que, em decorrência de juízo pré-concebido, não se preocupam com o sofrimento ou dor do outro, afastando e, por muitas vezes, impedindo o convívio, a inclusão, o crescimento e o desenvolvimento pessoal, limitando possibilidades, pelo simples fato de não aceitarem a diferença. Tal comportamento desencadeia repúdio e violência, a aumentar a barreira da exclusão social, que passa a ser considerada legítima dentro de uma sociedade que rejeita a identidade diversa daquela julgada como correta. Em razão da segregação social e omissão do Estado, frente à ausência de Lei específica para a regulamentação, o cenário atual denota uma lacuna jurídica na tutela de direitos. 1 Importante ressaltar que especialistas e estudiosos sobre o tema em questão costumam utilizar a terminologia pessoa trans como “guarda chuva”, isto quer dizer, de forma ampla, abarcando vários conceitos, entre eles os transgêneros , que não são o foco da pesquisa, pois não se enquadram na transexualidade, mas sofrem com a discriminação e intolerância como toda a população LGBTI+. 13 O assunto é de grande relevância. A invisibilidade do transexual a e heteronormatividade pregada disseminam o ódio. De acordo com um relatório da Organização Civil Europeia Transgender Europe, o Brasil é o país que mais mata transexuais no mundo.2 Outro relatório, dessa vez, elaborado pelo Ser Trans na EU, por meio de análise comparativa de dados do inquérito LGBTI europeu e com base na realidade vivida por 6.579 (seis mil quinhentos e setenta e nove) pessoas autodeclaradas trans, descreveu que as violações de direitos fundamentais são mais intensas e frequentes contra estas pessoas do que por lésbicas, gays ou bissexuais.3 Considerando o objeto de análise delimitado, o trabalha tem início com apontamentos sobre a evolução dos Direitos Humanos e Fundamentais, passando por toda a parte histórica de lutas e movimentos sociais até a consagração dos direitos hoje existentes. Esta primeira etapa ainda traça as novas dimensões dos direitos humanos, com foco e análise em uma quarta dimensão, defendida pela doutrina majoritária como já consagrada no Direito Internacional, passando pela controversa diferença entre direitos humanos e fundamentais e enaltecendo a Carta Constitucional Brasileira de 1988 como Cidadã, em referência ao destaque ao grande número de direitos e garantias em seu bojo. Em uma segunda etapa do trabalho, é abordado o tema transexualidade. Todavia, apresenta-se de suma relevância para a compreensão da pesquisa, antes de definir a terminologia e abordar a questão, distinguir sexo, gênero, orientação sexual e identidade de gênero, pois as constantes evoluções e utilização de várias expressões como sinônimas são causadoras de grande confusão. Partindo da premissa que a despatologização da transexualidade deve se tornar uma realidade, o capítulo segundo ainda ganha destaque e é assunto de reflexão e defesa, visto que, mesmo com inúmeros movimentos e projetos de Lei, a pessoa transexual ainda é considerada doente, classificada como portadora de transtorno de identidade junto à CID 10 e inserida no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais de estudos biomédicos, com diagnóstico de disforia de gênero. A manutenção da transexualidade como uma enfermidade 2 https://antrabrasil.org/2018/07/01/sao-86-pessoas-trans-assassinadas-no-primeiro-semestre-de-2018/ acessado em 09/10/2018, as 23:45h. 3 fra.europa.eu/sites/default/files/fra-2015-being-trans-eu-comparative-summary_pt.pdf acessado em 09/10/2018 as 00:03h. https://antrabrasil.org/2018/07/01/sao-86-pessoas-trans-assassinadas-no-primeiro-semestre-de-2018/ http://fra.europa.eu/sites/default/files/fra-2015-being-trans-eu-comparative-summary_pt.pdf 14 consiste na redução, retirada e até mesmo supressão da condição digna existencial do ser humano, pelo simples fato de ser diferente. O terceiro capítulo faz uma abordagem da evolução dos mecanismos de proteção dos cidadãos contra os abusos cometidos pelo Estado, passa pela análise do surgimento do Estado Democrático de Direito como fruto da redemocratização, unindo-se às ideias de democracia e constitucionalismo (Neoconstitucionalismo), que trouxeram força normativa à Constituição Federal de 1988. Nos subitens seguintes, são abordados os pressupostos de proteção dos transexuais no plano constitucional, com destaque aos princípios da Liberdade e da Igualdade, pilares da Constituição Federal e protetores da Garantia da Dignidade, a Dignidade da Pessoa Humana como supraprincípio, finalizando com a necessidade do direito ao livre desenvolvimento da personalidade se tornar direito autônomo, como ocorre em diversas constituições internacionais. O capítulo seguinte retrata o cenário atual do país, traz à baila o conceito de preconceito e o de discriminação, a importância do trabalho decente como garantia de vida digna para os transexuais, as formas de exclusão perpetradas no ambiente do trabalho, abordando as fases do contrato de trabalho e a penalidade para a conduta discriminatória do empregador. Completando o capítulo, há a análise sob o prisma da Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho. O descomunal aumento da violência e a discriminação praticada contra os transexuais chamou a atenção dos órgãos internacionais de proteção dos direitos humanos, por tal motivo o quinto capítulo complementa a busca por igualdade e aborda a proibição da discriminação por orientação sexual no Direito Internacional, analisando os tratados de direitos humanos no ordenamento nacional, explicando sua incorporação, hierarquia e aplicação. Em tópico específico, trata os Princípios de Yogyakarta, que são referência no Direito Internacional quando o assunto discutido está relacionado às violações de direitos humanos, com base na orientação sexual e identidade de gênero. O sexto capítulo diferencia dois grupos de pessoas excluídas diante do Estado e da sociedade, a saber, os grupos minoritários e os grupos vulneráveis, estabelecendo a necessidade de proteção diferenciada e as formas de atuação no combate à discriminação dos transexuais na efetiva busca pela igualdade material. 15 Por fim, no capítulo sete, são apresentados os instrumentos de defesa pertinentes ao Ministério Público do Trabalho, como forma de proteção dos transexuais, com análise da atuação judicial e extrajudicial. Face à problematização do tema, à dificuldade de inclusão no mercado de trabalho dos transexuais, a pesquisa busca elementos que solucionem o cenário atual pautado na Constituição Federal de 1988 e seu sistema de direitos e garantias. Como método de pesquisa, utiliza-se a forma qualitativa, com a conciliação, principalmente, de pesquisas teóricas e históricas. Para tanto, é utilizada doutrina nacional e estrangeira, jurisprudência e análise de Convenções Internacionais das Nações Unidas ratificadas pelo Brasil.16 1 DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS Os Direitos Humanos são resultado de um longo período de evolução. A origem dos direitos individuais do homem, de acordo com Alexandre de Moraes, pode ser encontrada no Egito e na Mesopotâmia, onde já existiam formas de proteção ao cidadão, isso, mesmo no terceiro milênio a.C. 4 O primeiro código a consagrar direitos comuns a todos os homens que se tem notícia surgiu na Babilônia, conhecido como Código de Hammurabi, nome que o rei da Babilônia Khammu-rabi era conhecido entre os povos do Ocidente. O código, titulado com o nome do rei, no século XVIII a.C, foi erguido em pedra de basalto, contendo vinte e uma colunas e duzentas e oitenta e duas cláusulas gravadas, as quais regiam a vida da população e sociedade trazendo, dentre seu rol, direitos como a vida, a propriedade, a honra, a dignidade, a família e a supremacia das leis em relação aos governantes. 5 Outro importante direito conquistado sobreveio no período Republicano de Roma, com a Lei das XII Tábuas, que possibilitou o acesso de todos os cidadãos ao conteúdo das Leis, as quais ficavam expostas no Fórum Romano, trazendo igualdade entre os romanos. Antes, os plebeus, classe oprimida, eram privados dos mandamentos, aplicados conforme conveniência daqueles que detinham o poder, pontífices e patrícios. A trajetória dos Direitos Sociais, como nos traz Arnaldo Süssekind, mencionado Raul Machado Horta, atingiu, no final do século XX, o ponto de conexão e de coexistência entre Direitos Individuais e Direitos Sociais: “A trajetória dos Direitos Sociais atingiu neste final de século, o ponto de conexão e de coexistência entre os Direitos Individuais e Direitos Sociais (...) nesta perspectiva aglutinadora, os Direitos Fundamentais representam o coroamento de uma evolução histórica e oferecem os instrumentos adequados à edificação do humanismo constitucional na sociedade contemporânea”. 6 4 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. 10ª ed. São Paulo: Atlas. 2013, p. 6/7. 5 SIQUEIRA JR, Paulo Hamilton, OLIVEIRA, Miguel Augusto de. Direitos humanos: liberdades públicas e cidadania. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 18. 6 HORTA, Raul Machado. “O sino de Samuel”, mensário da faculdade de direito UFMG de outubro de 1988, Belo Horizonte, p. 7 apud SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. 4ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2010, p. 16. 17 O coroamento do movimento dos Direitos Humanos se deu em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, impulsionada pelo fim da Segunda Guerra Mundial e a necessidade de reconstrução da sociedade. A evolução dos direitos humanos ao longo da história mundial passou por três marcos que, nos próximos subitens, são analisados de forma detalhada. No Brasil, o início de tais direitos passou a ser resguardado com a promulgação da Constituição Federal de 1988, instituída com o fim do regime militar ditatorial e a redemocratização do país. 1.1 A ideia de gerações e dimensões dos direitos humanos Os direitos humanos hoje garantidos são fruto de grande evolução no transcurso do tempo. Marcados por conquistas históricas, passaram por muitas transformações, lutas de movimentos sociais, revoluções e guerras. Essas mudanças são denominadas como fases, gerações ou dimensões dos direitos humanos. Quanto à terminologia utilizada para retratar a mutação dos direitos humanos, é de se ressaltar que há diversas críticas dirigidas à expressão “gerações”. Isto porque o termo pode ensejar a ideia de substituição gradativa de uma geração por outra, sucessão temporal, o que não ocorre, visto reconhecimento progressivo e cumulativo dos mencionados direitos.7 Paulo Hamilton Siqueira Jr. enfatiza o fato de o Direito ser uma ciência e, por tal motivo, apresentar construção própria, não decorrendo a diferença gramatical utilizada entre os diversos doutrinadores, comprometedora do conceito e análise do objeto, podendo, inclusive, as expressões serem consideradas como sinônimas, vejamos: “Muito se discute se o correto seria tratar o assunto como gerações de Direitos Humanos ou como dimensões de Direitos Humanos, contudo, a nosso ver, esse debate sobre o pacto semântico é inócuo, desnecessário. Ao nos lembrar de que o Direito é uma ciência, e, como ciência que é, possui acepções próprias, as quais por vezes se diferenciam da gramática, sem que isso comprometa o conceito. 7 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 21. 18 Assim, denominar-se dimensões ou gerações em nada compromete a análise do seu objeto, podendo ser até mesmo tidas como expressões jurídicas sinônimas. 8 Em que pese a divergência, esta possui apenas caráter semântico, pois no que diz respeito ao conteúdo das respectivas fases há consenso. Discordância ocorre apenas no que diz respeito às possíveis novas dimensões dos Direitos Humanos, além das três existentes e pacificadas pela doutrina. Alguns pesquisadores, em decorrência do crescente desenvolvimento social, abordam a necessidade de proteção de novos direitos e falam em até sete dimensões, que não são reconhecidas internacionalmente e, ao menos, por enquanto, não passam de aspirações. 1.1.1 Primeira dimensão dos direitos humanos: as liberdades públicas e os direitos políticos A primeira dimensão dos direitos humanos, considerada símbolo na busca dos direitos do homem, é resultado da Independência Norte-Americana, Revolução Francesa e Declaração dos Direitos do Homem em 1789. O Estado era visto como inimigo das liberdades públicas, dos Direitos do Homem e do Cidadão, pois não havia limite ou regras, prevalecendo uma injusta ordem social. O início da conquista de uma justa ordem social sucedeu em razão do cunho individualista do pensamento burguês, que concentrava todo poder econômico do Estado que, por sua vez, empregava-o sem qualquer limitação, com leis arbitrárias para a manipulação dos cidadãos em prol dos próprios interesses, gerando excessos. Isso fez que população se rebelasse contra a arbitrariedade e o autoritarismo dos governantes, em busca de melhores condições de vida e uma ordem social justa, que possibilitasse situações idênticas. “Reagindo ao absolutismo do Antigo Regime, o Estado Liberal firmou-se entre o século XVIII e início do século XX amparando-se no individualismo e na harmonia natural do mercado, tendo como 8 SIQUEIRA JR., Paulo Hamilton, OLIVEIRA, Miguel Augusto Machado de. Direitos humanos: liberdades públicas e cidadania. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 30. 19 funções a garantia da ordem pública e da segurança, com poucas funções sociais. Seu fundamento, portanto, era assegurar o princípio da legalidade contra todos, garantindo os direitos individuais, com a mínima intervenção estatal”. 9 Neste período, nasceu a primeira dimensão dos direitos humanos, que representou o fim do antigo regime, com a queda da monarquia e privilégios feudais, dando origem ao Estado de Direito Liberal, cujo princípio era assegurar a legalidade com intervenção estatal mínima, garantindo as liberdades públicas e os direitos políticos assegurados como fundamentais. 1.1.2 Segunda dimensão dos direitos humanos: direitos sociais, econômicos e culturais Embora algumas manifestações na Inglaterra, já tivessem ocorrido com a Magna Carta Libertatum de 1215 – Constituição de João Sem Terra -, o Petition of Rights de 1628, o Habeas Corpus Act de 1679 e o Bill PF Rights de 1689, seguidas de outras na América do Norte, com a Declaração dos Direitos da Virgínia, de 12 de junho de 1776 e a Declaração de Independência dos Estados Unidos,em 04 de julho de 1776, foi apenas em decorrência da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada em 26 de agosto de 1789, na França, que inspirou inclusive o lema da República Francesa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade, que o homem na qualidade de ser humano passou a ter como inerentes os direitos de liberdade e igualdade. Não havia previsão de direitos sociais de forma específica e o princípio que permitia a liberdade contratual, com a não interferência do Estado nas relações, fez que os trabalhadores e suas famílias fossem oprimidos e explorados. A igualdade absoluta e teórica do Estado Liberal fez surgir a desigualdade real, o que passou a gerar injustiças sociais. No Estado onde tudo é permitido, o mais forte passou a oprimir o mais fraco.10 “Destes processos, surge a noção de Estado de Direito e os pressupostos do Estado Liberal (abstencionista, neutro ou de mínima intervenção), garantindo formalmente a igualdade de todos, deixando 9 SAVOIA, Francisco Simões Pacheco. Colaboração premiada e o princípio da imparcialidade. Curitiba: Juruá, 2018, p. 19. 10 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 119. 20 a sociedade, formada pela soma de indivíduos moral e economicamente competentes, a realização de seu sucesso e felicidade. No entanto, a conseqüência desta abstenção estatal culminou na desigualdade real e nas injustiças sociais (...)”. 11 Com o Estado atuando de forma neutra, mantendo uma postura negativa quanto aos problemas sociais e econômicos e se abstendo de qualquer intervenção, desencadeou-se o surgimento do capitalismo desumano. “O aparecimento de uma nova classe social numerosa, que trabalhava em condições desumanas, nas fábricas, fez surgir novas reivindicações em prol da dignidade da pessoa humana, os direitos socais. A crise econômica de 1929 demonstra a ineficiência da passividade do Estado Liberal, gerando exigências de intervenção do Estado na economia. O liberalismo econômico traduzia-se no laissez- faire, laissez-passer, possibilitando um egoísmo econômico”.12 Impulsionada pela inércia estatal, a classe operária, somada ao episódio da Revolução Industrial, insurgiu-se, exigindo posição positiva do Estado frente aos problemas e cobrando intervenção política para a implementação de direitos econômicos e sociais. Diante desse quadro, tornou-se necessária a readequação do Estado Liberal. Desse modo, o comportamento neutro foi abandonado e cedeu lugar a uma postura ativa. Assim, a pressão para a nova adequação do Estado resultou no surgimento dos direitos de 2ª dimensão, transformando o Estado Liberal em Estado Social. Os direitos humanos de 2ª geração reforçam e consagram a plenitude da dignidade da pessoa humana, que é o ponto nevrálgico dos direitos.13 1.1.3 Terceira dimensão dos direitos humanos: os direitos de solidariedade A terceira dimensão dos direitos humanos inclui direitos reconhecidos ao longo do curso histórico, com o reconhecimento de promoção dos meios para a subsistência dos indivíduos, com a materialização de valores e a ampliação dos direitos humanos fundamentais para todos os seres humanos. 11 SAVOIA, Francisco Simões Pacheco. Colaboração premiada e o princípio da imparcialidade. Curitiba: Juruá, 2018, p. 20. 12 SIQUEIRA JR., Paulo Hamilton. A dignidade da pessoa humana no contexto da pós modernidade. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 260. 13 RAMOS, André de Carvalho. Direitos humanos em juízo: comentários aos casos contenciosos e consultivos da corte interamericana de direitos humanos. São Paulo: Max Limond, 2001, p. 31. 21 Não há dúvidas de que os horrores da Segunda Guerra Mundial e os traumáticos acontecimentos propagados à humanidade pelo nazismo exigiram renovação do Estado Social que, logo após o término da Guerra, criou a Organização das Nações Unidas, em vinte e quatro de outubro de 1945, com o objetivo de manter a paz entre os países.14 A proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos foi um marco de abertura para a reafirmação e a ampliação da dignidade da pessoa humana, afirmando os direitos de primeira e segunda geração e inserindo direitos à liberdade pessoal, à igualdade, à proibição de discriminações, à proibição de prisões arbitrárias sem o devido processo legal, direitos à vida, à segurança pessoal, à liberdade de locomoção, além de muitos outros, vistos como mínimos para a existência digna de um ser humano. Com relação aos direitos que integram a terceira dimensão de direitos humanos, Marco Antonio Marques da Silva aduz: “A terceira geração de direitos fundamentais regula os interesses difusos e coletivos15 e “são materializados poderes de titularidade coletiva, atribuídos genericamente a todas as formações sociais e consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais, indisponíveis, nota ou uma essencial inexauribilidade”. 16 A categoria de direitos que envolve a terceira dimensão dos direitos humanos é coletiva e isso a diferencia das demais. Está relacionada à solidariedade e à fraternidade, decorre da luta contra a deterioração da qualidade da vida humana, como meio ambiente equilibrado, vida saudável, progresso, entre outros.17 Em um apanhado geral e conciso, Celso Antonio de Mello, na ADI 3.540 MC, apresenta as seguintes considerações: 14 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. A história da Organização. Disponível em: https://nacoesunidas.org/conheca/historia/ acessado em 25/09/2019 as 10:43h. 15 DA SILVA, Marco Antonio Marques. Cidadania e democracia: instrumentos para efetivação da dignidade humana. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 226. 16 MELLO, Celso Antonio, STF, MS 22.164-SP, dju 17.11.1995 apud DA SILVA, Marco Antonio Marques. Cidadania e democracia: instrumentos para efetivação da dignidade humana. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 226. 17 DA SILVA, Marco Antonio Marques. Cidadania e democracia: instrumentos para efetivação da dignidade humana. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 226. https://nacoesunidas.org/conheca/historia/ 22 “Vale referir, (...) até mesmo em face da justa preocupação revelada pelos povos e pela comunidade internacional em tema de direitos humanos, que estes, em seu processo de afirmação e consolidação, comportam diversos níveis de compreensão e abordagem, que permitem distingui-los em ordens, dimensões ou fases sucessivas resultantes de sua evolução histórica. Nesse contexto, (...) impende destacar, na linha desse processo evolutivo, os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos), que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais, e que realçam o princípio da liberdade. Os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais), de outro lado, identificam-se com as liberdades positivas, reais ou concretas, pondo em relevo, sob tal perspectiva, o princípio da igualdade. Cabe assinalar (...) que os direitos de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos, genericamente, e de modo difuso, a todos os integrantes dos agrupamentos sociais, se consagram como princípio da solidariedade (...)”.18 Assim, temos como a primeira dimensão de direitos humanos a relação do indivíduo com o próprio indivíduo, a segunda dimensão trata do indivíduo e a sociedade e a terceira do indivíduo e tudo que garante e envolvedireitos a existência digna. 1.1.4 As novas dimensões dos direitos humanos - quarta dimensão de direitos Traçamos as dimensões dos direitos humanos até a terceira dimensão, de forma individualizada, pois estão consagradas no direito internacional. Todavia, há de se esclarecer as discussões sobre as novas dimensões no âmbito jurídico. As dimensões dos direitos humanos vêm causando grandes discussões entre os estudiosos há muitos anos, e isso inclui, inclusive, a terminologia “correta” a ser empregada. Alguns doutrinadores defendem até sete dimensões de direitos humanos. Entretanto, não serão abordadas todas as discussões sobre o tema, pois se faz relevante para o estudo em questão somente da primeira à quarta dimensões. Sendo esta a nova dimensão de direitos e, inteiramente, complementar às demais no constante processo de evolução dos direitos e garantias dos seres humanos. Os direitos posteriores aos de terceira dimensão são apresentados como novos direitos e a doutrina majoritária defende a bioética como a quarta dimensão 18 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE nº 3.540 MC, voto do rel. min. Celso de Mello, j.1º-9- 2005, p, DJ de 3-2-2006. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoPublicacao Tematica/anexo/CTJDireitos Humanos.pdf. Acessado em 12 de abril de 2018, as 16:05h. http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoPublicacao%20Tematica/anexo/CTJDireitos%20Humanos.pdf http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoPublicacao%20Tematica/anexo/CTJDireitos%20Humanos.pdf 23 de direitos humanos, baseada na proteção dos valores éticos, morais e na integridade da pessoa por meio da bioética, biodireito e biotecnologia. Representam o direito à vida das gerações futuras, o direito à vida saudável, ao desenvolvimento sustentável, à informação, à democracia, ao patrimônio genético, a identidade sexual. Embora não haja consenso quanto à existência dos direitos humanos de quarta dimensão, Celso Lafer filia-se à corrente que a aceita, afirmando que “os direitos de terceira e quarta dimensão transcendem os interesses individuais, situando-se numa seara social”. 19 A biotecnologia e bioética vêm sendo largamente discutida por diversos campos de estudo, a exemplo da Medicina, o Direito, da Biologia, da Psicologia entre outros. Tal estudo ocorre de maneira especial pelas descobertas científicas e a sua estrita relação com o direito à vida, de personalidade e direitos humanos. Além da preocupação com o equilíbrio do meio ambiente, sempre levando a dignidade da pessoa humana em consideração. Segundo Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus Maluf, a bioética é: “o estudo transdisciplinar entre biologia, medicina, filosofia (ética) e direito (biodireito) que investiga as condições necessárias para uma administração responsável da vida humana, animal e responsabilidade ambiental. Considera, portanto, questões onde não existe consenso moral, como a fertilização in vitro, o aborto, a clonagem, a eutanásia, os transgênicos e as pesquisas com células- tronco, bem como a responsabilidade moral de cientistas em suas pesquisas e suas aplicações.” 20 Para Norberto Bobbio, a quarta dimensão de direitos humanos compreenderia os direitos ligados à vida e à proteção do patrimônio genético. O autor externa sua preocupação com efeitos cada vez mais traumáticos de pesquisas biológicas, “que permitirão a manipulação do patrimônio genético de cada indivíduo”. 21 Rodrigo da Cunha Pereira ressalva que: 19 LAFER, Celso. A ruptura totalitária e a reconstrução dos direitos humanos. São Paulo: Companhia das Letras, 1988. p. 124 ss. apud MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de bioética e biodireito. 3ª ed. São Paulo: Grupo Gen., 2015, p. 117. 20 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de bioética e biodireito. 3ª ed. São Paulo: Grupo Gen, 2015, p. 07. 21 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 7ª tir. Rio de Janeiro: Elsevier. 2004, p. 08. 24 “tendo por fim a cidadania plena, a reflexão bioética se consolida mediante a incorporação dos direitos humanos de quarta e quinta gerações à consciência insurgentes da sociedade moderna, daí porque a sua conformação histórica marca a transição do Estado de direito formal (positivo legalista) ao Estado de justiça social (...). Assim, a democracia, instaurando-se com efetividade radical, porque se propõe à concretização de todas as gerações de direitos humanos, não se compromete somente com o direito individual e negativo à saúde e com direito social e positivo à assistência sanitária, senão com o conjunto das obrigações humanitárias que a reflexão bioética impõe, seja frente às demandas presentes da vida humana ameaçadas (fome em escalada global, projeto genoma, catástrofes ecológicas, instabilidades nucleares etc), seja frente aos direitos humanos das futuras gerações”. 22 Estamos vivendo uma realidade complexa, com grande teor social e valores em torno da bioética, as questões compreendidas são de suma importância e envolvem temas delicados como valores científicos e religiosos. Maria Helena Diniz ressalta que a bioética necessita de um paradigma de referência antropológico-moral em busca de uma qualidade de vida digna, dando prioridade ao ser humano, buscando sempre o valor supremo da pessoa humana, de sua vida, dignidade e liberdade ou autonomia: “Com o reconhecimento do respeito à dignidade humana, a bioética e o biodireito passam a ter um sentido humanista, estabelecendo um vínculo com a justiça. Os direitos humanos, decorrentes da condição humana referem-se à preservação da integridade e da dignidade dos seres humanos e à plena realização de sua personalidade. A bioética e o biodireito andam necessariamente juntos com os direitos humanos, não podendo, por isso, obstinar-se em não ver as tentativas da biologia molecular ou da biotecnociência de manterem injustiças contra a pessoa humana sob a máscara modernizante de que buscam o progresso científico em prol da humanidade. Se em algum lugar houver qualquer ato que não assegure a dignidade humana, ele deverá ser repudiado por contrariar a exigências ético- jurídicas dos direitos humanos. Assim sendo, intervenções científicas sobre a pessoa humana que possam atingir sua vida e a integridade físico-mental deverão subordinar-se a preceitos éticos e não poderão contrariar os direitos humanos. As práticas das “ciências da vida”, que podem trazer enormes benefícios à humanidade, contêm riscos potenciais muito perigosos e imprevisíveis, e, por tal razão, os profissionais da saúde devem estar atentos para que não transponham os limites éticos impostos pelo respeito à pessoa humana e à sua vida, integridade e dignidade”.23 22 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A sexualidade vista pelos tribunais. 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011, p. 23. 23 DINIZ, Maria Helena. O respeito à dignidade humana como paradigma da bioética e do biodireito. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 1019. 25 Inúmeros são os documentos internacionais relativos aos direitos humanos e à bioética, como a Convenção sobre os Direitos Humanos e Biomedicina, Projeto Genoma, Declaração Universal sobre o Genoma Humano e dos Direitos Humanos, Convenção das Nações Unidas Sobre a Diversidade Biológica, Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos, Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos e no âmbito nacional a Lei de Biossegurança – 11.105, de 24 de março de 2005, além de projetos de lei sobre biodiversidade e patrimônio genético. É necessário ter consciência de que os direitos do homem são direitos históricos, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades e contra velhos poderes. Nascidosde modo gradual, não todos de uma vez nem de uma vez por todas; nascem quando devem ou podem nascer. 24 1.2 Diferença entre Direitos Humanos e Direitos Fundamentais Para os fins objetivados neste estudo, e, como serão mencionados no decorrer de toda a construção de ideias, faz-se necessário diferenciar Direitos Humanos e Direitos Fundamentais, uma vez que as expressões são utilizadas como intercambiáveis, o que não são. Em verdade, estão intimamente ligadas, mas não se confundem. Com a evolução dos direitos do homem, como ser humano, ao longo dos anos e a constante mutação e aperfeiçoamento desses direitos, tornou-se difícil definir as expressões e ter somente uma denominada como correta. José Afonso da Silva enfatiza a dificuldade terminológica: “A ampliação e transformação dos direitos fundamentais do homem no evolver histórico dificulta definir-lhes um conceito sintético. Aumenta essa dificuldade a circunstância de se empregarem várias expressões para designá-los (...)”.25 Diversos são os termos empregados para a denominação desses direitos e de suas derivações, quais sejam: direitos naturais; direitos humanos; direitos do 24 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 7ª tir. Rio de Janeiro: Elsevier. 2004. 25 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 179. 26 homem; direitos individuais; direitos do cidadão; direitos civis; direitos públicos subjetivos; liberdades fundamentais; liberdades públicas; liberdades individuais; direitos fundamentais do homem, entre outros. Julio Ricardo de Paula Amaral traz o entendimento de Gregório Robles, com vista a diferenciar as expressões: “Segundo este, a expressão “direitos humanos” ou “direitos do homem”, também denominados de forma clássica “direitos naturais”, e, atualmente, concebidos como “direitos morais”, na realidade não são verdadeiros direitos – protegidos por meio de ações processuais perante um juiz -, mas servem de critérios norteadores à boa convivência dos indivíduos, tendo em vista que os direitos humanos, ou melhor, dizendo, determinados direitos humanos, positivam-se, adquirindo a categoria de verdadeiros direitos protegidos processualmente e passam a ser direitos fundamentais, no âmbito de determinado ordenamento jurídico”. 26 José Joaquim Gomes Canotilho27 analisa as várias expressões e se esforça para diferenciá-las: - Direitos do Homem e Direitos do Cidadão – distinção presente na “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” de 1789, editada como corolário da Revolução Francesa, segunda a qual os Direitos do Homem são direitos individuais, pertencendo-lhe “enquanto tal”, ou seja, são inerentes à condição humana, ao passo que os Direitos dos Cidadãos são direitos políticos, que pertencem ao homem “enquanto ser social, isto é, como indivíduo vivendo em sociedade”, e perante o Estado; - Direitos Naturais e Direitos Civis – distinção próxima da anterior, encontrada no Título I da Constituição Francesa de 1791, consoante a qual os Direitos Naturais são inerentes ao indivíduo e os Direitos Civis são os que lhe cabem enquanto cidadão, encontrando-se proclamados nas constituições e leis infraconstitucionais; - Direitos Políticos e Direitos Individuais, entre os Direitos Civis, destacam- se, de um lado, os Direitos Políticos, correspondentes a uma parcela atribuída apenas a determinado grupo de indivíduos, dotando-se de aptidão para “tomar parte 26 ROBLES, Gregório, Los derechos fundamentales y La ética en La sociedad actual, Madri: Civitas, 1997, p. 20 e seguintes. apud AMARAL, Julio Ricardo de Paula, Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações de Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTR, 2014, p.28 27 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, 7ª ed. Coimbra: Almedina, p. 393-398. 27 ativa na formação dos poderes públicos”, o que remanesce, naquela categoria, depois de apartados dela, os Direitos Políticos, que são Direitos Individuais. - Direitos e Liberdades Públicas – os Direitos Civis admitem, ainda, um ou outro tipo de categorização, que coloca, de um lado, as Liberdades Públicas, consistentes em direitos dos indivíduos contra a intervenção do Estado (e são também conhecidos como “direitos negativos” ou “direitos de abstenção”) e, de outro, simplesmente os Direitos (ou “direitos positivos”), que conferem ao indivíduo status ativo frente ao Estado, quer porque tenha a prerrogativa de participar ativamente da vida política (direito a votar e ser votado), quer porque goze de estabilidade de exigir as “prestações necessárias ao desenvolvimento pleno da existência individual” (denominados “direitos à prestação). São várias as expressões e as mais utilizadas são Direitos Humanos, Direitos do Homem e Direitos Fundamentais. José Afonso da Silva, em sua obra Curso de Direito Constitucional Positivo, conclui que a melhor definição seria Direitos Fundamentais do Homem, vejamos: “Direitos fundamentais do homem constitui a expressão mais adequada a este estudo, porque, além de referir-se a princípios que resumem a concepção do mundo e informam a ideologia política de cada ordenamento jurídico, é reservada para designar, no nível do direito positivo, aquelas prerrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas a pessoas. No qualitativo fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados. Do homem, não como macho da espécie, mas no sentido de pessoa humana. Direitos fundamentais do homem significa direitos fundamentais da pessoa humana ou direitos fundamentais (...).”28 Norberto Bobbio está entre aqueles que creem na efetiva proteção e desfrute do direito, afirmando ser inteiramente mais importante do que a sua definição. 29 Jair Teixeira dos Reis adota uma terminologia para cada expressão e as diferencia como sendo Direitos Humanos o gênero, do qual Direitos Fundamentais 28 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 182. 29 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 7ª tir. São Paulo: Elsevier, 2004, p. 36/37. 28 seriam a espécie, enquanto um está em Tratados Internacionais, os outros aparecem nas Cartas Constitucionais.30 Assis Moreira Silva Junior parte da mesma vertente e complementa o entendimento: “Enquanto os direitos humanos são aqueles reconhecidos na órbita internacional a todos os homens e mulheres pela sua mera condição humana, independente de pertencerem a um ou outro Estado, os direitos fundamentais consistem nos direitos humanos positivados em uma determinada ordem constitucional”.31 Dessa forma, os Direitos Humanos são aqueles inerentes a todos os seres humanos e positivados no plano internacional, por meio de Documentos, Tratados, Acordos. Já os Direitos Fundamentais são os Direitos Humanos positivados no ordenamento jurídico de cada país, em sua norma fundamental, a Constituição. Como característica, quando positivados no plano constitucional de cada país, ambos possuem o mesmo conteúdo, mas consagrados em planos diferentes. 1.3 A Constituição Brasileira de 1988 e a Proteção dos Direitos Humanos – Constituição Cidadã A Constituição Brasileira de 1988 se destacou por conter grande número de direitos e garantias em seu corpo. Além daqueles relativos à cidadania civil e política, foram consagrados direitos de cidadania social, como a saúde, previdência e assistência social, acesso a bens culturais,dentre outros. 32 A Constituição Federal, promulgada em 05 de outubro de 1988, é assim chamada, porque, além de ser o marco entre o fim da ditadura militar e a democracia, após 21 (vinte e um) anos, conferiu a todos os cidadãos brasileiros garantias individuais e direitos sociais ampliados. Determinou o fim de penas cruéis, garantiu liberdade de expressão, antes reprimida pela censura, garantiu direito ao voto. A Constituição de 1988 tornou-se o documento da Liberdade, Igualdade e Democracia. 30 REIS, Jair Teixeira dos. Subordinação Jurídica e o Trabalho a Distância. São Paulo: LTR, 2007. p. 74. 31 SILVA JUNIOR, Assis Moreira. Diversidade Sexual e Inclusão Social: uma tarefa a ser completada. Franca: Lemos e Cruz, 2014, p. 38/39. 32 GOULART, Marcelo Pedroso. Ministério público e democracia. Leme: Editora de Direito, 1998, p. 136, apud ARRUDA, Eloísa de Sousa. O papel do ministério público na efetivação dos tratados internacionais de direitos humanos. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 378. 29 “O momento político vivido com o final do regime militar e o início da democratização trouxe à lume, na época da constituinte, todos os receios de que o país pudesse voltar a ser dominado por uma ditadura. Atendendo a essa preocupação, a Carta Constitucional foi elaborada de forma extremamente garantista, e até mesmo nomeada de “Constituição Cidadã” ”. 33 Nas palavras de José Afonso da Silva, é a Constituição Cidadã, porque teve ampla participação popular em sua elaboração e, em especial, porque se volta decididamente para a plena realização da cidadania. 34 A Constituição Democrática Brasileira teve implantação tardia, mas se tornou uma das Constituições mais avançadas do mundo, como nos ensina Flavia Piovesan: “Cabe considerar a Carta de 1988, como marco jurídico da transição ao regime democrático, que alargou significativamente o campo dos direitos e garantias fundamentais, colocando-se entre as Constituições mais avançadas do mundo no que diz respeito à matéria. 35 Desde o preâmbulo, a Carta de 1988 estabelece a instituição de um Estado Democrático de Direito: “destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais; a liberdade; a segurança; o bem-estar; o desenvolvimento; a igualdade e a justiça, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos (...)”. A Constituição Cidadã acolhe a concepção contemporânea de cidadania na medida em que consagra a indivisibilidade dos direitos humanos: “Em relação à universalidade dos direitos humanos, tendo o texto da constituição declarado a dignidade da pessoa humana como um fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, III), já assegurou disso a inviolabilidade dos direitos e garantias fundamentais a toda e qualquer pessoa sem discriminação. Além disso, consagrou a prevalência dos direitos humanos como um dos princípios a reger o Brasil na ordem internacional (art. 4º, II) e estabeleceu cláusula constitucional aberta a receber outros direitos, inclusive decorrentes de tratados internacionais (art. 5º, §2º), 33 ARRUDA, Eloísa de Sousa. O papel do ministério público na efetivação dos tratados internacionais de direitos humanos. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 378. 34 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 80. 35 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 25. 30 realçando que os direitos humanos são tema de legítimo interesse da comunidade internacional, transcendendo as fronteiras do Estado”. 36 A Constituição de 1988 é a sétima, desde a independência do país, e a que registra maior período democrático após a Constituição de 1946, cujo início ocorreu com o fim do Estado Novo. 36 ARRUDA, Eloísa de Sousa. O papel do ministério público na efetivação dos tratados internacionais de direitos humanos. In: Tratado luso-brasileiro da dignidade humana. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 381. 31 2 TRANSEXUALIDADE - SEXO, GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL E IDENTIDADE DE GÊNERO Relevante, para a compreensão do estudo, esclarecer as diversas definições de sexo, gênero, orientação sexual e identidade de gênero. Tais conceitos não são unânimes e, com o passar dos anos e as constantes evoluções sobre o tema, as expressões passaram a ser usadas de forma sinônima, gerando confusão. O objetivo do presente trabalho não é esgotar o assunto e a diversidade de abordagens terminológicas existentes; antes, porém, visa estabelecer conceitos fundamentais para a compreensão, análise e definição da pessoa transexual, que será abordada em tópico próprio. A definição de transexual, com os conceitos de sexo, gênero, orientação sexual e identidade de gênero bem definidos e inteiramente esclarecidos, apresenta- se mais clara, facilitando a análise do tema, calcado na dificuldade de inclusão no mercado de trabalho e na sociedade em si, de um grupo reprimido e constantemente desrespeitado pela heteronormatividade37 do Estado. No estudo do presente capítulo, optamos pela utilização de algumas definições trazidas nos Princípios de Yogykarta38, elaboradas por especialistas do tema em questão. Tais princípios refletem o estado da legislação internacional atual de Direitos Humanos em relação à orientação sexual e à identidade de gênero; ainda, promovem a igualdade, a dignidade, a fruição e o exercício de direitos sem discriminação. Os conceitos trazidos pelos Princípios de Yogyakarta são adotados pela Comissão Internacional de Direitos Humanos, que reconheceu especificidade sobre o assunto. 37 O termo heteronormatividade, cunhado em 1991 por Michael Warner, é compreendido e problematizado como um padrão de sexualidade que regula o modo como as sociedades ocidentais estão organizadas. Em sua maioria, a sociedade brasileira é heteronormativa e cisnormativa. Ela considera que o normal é ser heterossexual e cisgênero. Quem foge do padrão seria anormal, esquisito ou até mesmo doente. “Heteronormatividade é um termo que permeia a ideia de binarismo e convenções sociais em relação à orientação sexual”. Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Cartilhas/Direito_Diversidade.pdf. Acessado em 24/09/2018 as 22:50h. 38 Princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação à orientação sexual e identidade de gênero. Os princípios de Yogyakarta serão abordados no Capítulo 5 – Proibição da discriminação por orientação sexual no direito internacional, em item próprio. http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Cartilhas/Direito_Diversidade.pdf.%20Acessado%20em%2024/09/2018 32 2.1 Conceito de sexo Segundo o dicionário, sexo tem como conceito o conjunto de características anatomofisiológica que distinguem o homem e a mulher: sexo masculino; sexo feminino.39 Inserida na questão da sexualidade há, também, a intersexualidade, que surge como uma condição genética, física ou anatômica do sujeito, que apresenta um fenótipo que não permite a clara definição entre a conceituação binária homem/mulher, seja por apresentar estrutura genital que não autoriza a sua alocação em grupos, ou em face de presença de aspectos de genitália condizentes com os dois conceitos.40 A atual concepção da palavra sexo passa por uma percepção que vai desde o ato sexual em si, até a indicação da configuração anatômica das pessoas, tocando ainda na ideia da indicação distintiva das pessoas como pertencentesao grupo dos homens (gênero masculino) ou das mulheres (gênero feminino). Seja qual for a acepção tomada, fato é que o conceito de sexo é parte integrante da vida das pessoas, podendo certamente ser tido como um dos caracteres mais elementares de identificação da pessoa natural.41 Partindo do viés classificatório ou distintivo do qual a expressão sexo é dotada, é possível entendê-la como parâmetro de divisão dos seres, em regra entre machos e fêmeas, ou homens e mulheres, atrelada a uma perspectiva mais voltada ao fenótipo ou à estrutura genital. Ainda há grande confusão com a terminologia sexo, que é muito empregada como gênero; porém, o sexo está na perspectiva biológica (da sexualidade), atrelado à dicotomia binária. Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus Maluf nos reafirma que o conceito de sexo em nada tem a ver com outras terminologias que ainda geram conflitos, ao deixar claro que sexo pode ser definido como conjunto de características biológicas, contidas nos aparelhos reprodutores masculino e feminino e que, por sua vez, não 39 http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/sexo/ 40 CUNHA, Leandro Reinaldo da. Identidade e redesignação de gênero aspectos da personalidade, da família e da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 29 41 CUNHA, Leandro Reinaldo da. Identidade e redesignação de gênero aspectos da personalidade, da família e da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 21. 33 determina a identidade de gênero nem a orientação sexual do indivíduo.42 A concepção de sexo nos remete à simplicidade de conceituação; todavia, é algo extremamente complexo, que resulta de influência biológica, psicológica, sociológica e jurídica. 2.1.1 Gênero O gênero tem caráter construído cultural e socialmente, antes mesmo do nascimento, atribuído pelas diferenças biológicas do homem e da mulher. Com o nascimento, a sociedade exige que seja adotado determinado padrão de comportamento a partir do sistema binário do sexo biológico. Dessa forma, a mulher deverá se sujeitar a um modo de agir feminino, enquanto o homem, necessariamente, terá de adotar um modo masculino de agir, no que se refere ao jeito de falar, comportamento, hábitos, vestimentas e tudo que se refere ao suposto universo estereotipado “masculino” e “feminino”.43 “Conceito formulado nos anos 1970 com profunda inf luência do movimento feminista. Foi criado para distinguir a dimensão biológica da dimensão social, baseando-se no raciocínio de que há machos e fêmeas na espécie humana, levando em consideração, no entanto, que a maneira de ser homem e de ser mulher é realizada pela cultura. Assim, gênero significa que homens e mulheres são produtos da realidade social e não somente decorrência da anatomia de seus corpos”. 44 Ocorre presunção baseada no sexo morfológico, de que, desde o nascimento, é preciso comportamento condizente com os órgãos sexuais. 2.1.2 Orientação sexual Orientação sexual está ligada ao interesse sexual que uma pessoa pode sentir por outra. 42 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de bioética e biodireito. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 301. 43 MEZA, Juan N. Silva; HERNÁNDEZ, Sergio A. Valls. Transexualidad y matrimonio y adopción por parejas del mismo sexo – criterios de La Suprema Corte de Justiça de La Nación. Cuidad de México: Editorial Porruá, 2011, p.12. 44 GRUPO DIGNIDADE. Manual de Comunicação LGBTI+. Disponível em: http://www.grupodignidade.org.br/wp-content/uploads/2018/05/manual-comunicacao-LGBTI.pdf acessado em 21/10/2018 as 19:25h. http://www.grupodignidade.org.br/wp-content/uploads/2018/05/manual-comunicacao-LGBTI.pdf%20acessado%20em%2021/10/2018 http://www.grupodignidade.org.br/wp-content/uploads/2018/05/manual-comunicacao-LGBTI.pdf%20acessado%20em%2021/10/2018 34 Segundo os Princípios de Yogyakarta, orientação sexual é a capacidade de cada pessoa de ter uma profunda atração emocional, afetiva ou sexual por indivíduos de gênero diferente, do mesmo gênero ou de mais de um gênero, assim como ter relações íntimas e sexuais com essas pessoas. 45 “Basicamente, há três orientações sexuais preponderantes: pelo mesmo sexo/gênero (homossexualidade), pelo sexo/gênero oposto (heterossexualidade) ou pelos dois sexos/gêneros (bissexualidade). Estudos demonstram que as características da orientação sexual variam de pessoa a pessoa”.46 A orientação sexual corresponde à forma pela qual o indivíduo vai viver a sua sexualidade, podendo ser ele heterossexual, homossexual, bissexual ou assexual.47 Não se deve falar em opção sexual, mas em orientação sexual, expressão que significa que o desejo sexual está em direção a determinado gênero.48 2.1.3 Identidade de gênero A identidade de gênero, conforme os princípios de Yogyakarta: “(...) está ligada ao profundamente sentido, de acordo com experiência interna e individual do gênero de cada pessoa, que pode ou não compreender ao sexo atribuído no nascimento, incluindo o senso pessoal do corpo (que pode envolver, por livre escolha, modificação da aparência ou função corporal, por meios médicos, cirúrgicos ou outros) e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta, modo de falar e maneirismo”.49 Assim, a identidade de gênero não tem qualquer relação com o sexo biológico, transpassando o fechado sistema binário e descumprindo o socialmente imposto ao assumir um gênero sexual diverso do sexo físico, a criar a pessoa 45 Princípios de Yogyakarta. Disponível em: www.clam.org.br/pdf/principios_de_yogyakarta.pdf. Acessado em 21/04/2018 às 19:06h. 46 GRUPO DIGNIDADE. Manual de Comunicação LGBTI+. Disponível em: http://www.grupodignidade.org.br/wp-content/uploads/2018/05/manual-comunicacao-LGBTI.pdf. Acessado em 21/10/2018 as 19:34h. 47 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de bioética e biodireito. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 301. 48 DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade e os direitos lgbti, 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p.42 49 Princípios de Yogyakarta. Disponível em: http://www.clam.org.br/uploads/conteudo/principios _de_yogyakarta.pdf . Acessado em 21/04/2018 às 19:06h. http://www.clam.org.br/pdf/principios_de_yogyakarta.pdf.%20Acessado%20em%2021/04/2018 http://www.clam.org.br/pdf/principios_de_yogyakarta.pdf.%20Acessado%20em%2021/04/2018 http://www.clam.org.br/uploads/conteudo/principios%20_de_yogyakarta.pdf%20.%20Acessado%20em%2021/04/2018 http://www.clam.org.br/uploads/conteudo/principios%20_de_yogyakarta.pdf%20.%20Acessado%20em%2021/04/2018 35 identidade com o gênero com que se identifica. 2.2 Transexualidade A primeira referência à palavra transexual foi despretensiosa, sob a forma seelischer Transsexualism, pelo sexólogo alemão Magnus Hirschefeld, em 1923. Contudo, a origem da palavra foi atribuída ao doutor D.O Cauldwell, para indicar genericamente aquele que não se identifica com o sexo biológico, em um artigo para uma revista científica de educação sexual, intitulado Psychopathia transexualis, de 1949, temos o relato do primeiro caso de transexual feminino para masculino. A terminologia, utilizada atualmente, transexualismo, atribuída por Collete Chiland e Catherine Millot a Harry Benjamin, apenas alcançou notoriedade com a publicação do artigo “Fenômeno transexual”, no Jornal Internacional de Sexologia, por Benjamin.50 Muitas são as divergências quanto à expressão, sendo por médicos denominado transexualismo, enquanto pesquisadores, inclusive da área jurídica, transexualidade. Em decorrência das diversas posições e diferenciações, a opção no presente trabalho foi adotar a terminologia utilizada pelos movimentos sociais, utilizando a terminologia transexual, transexualidadeou pessoa trans (conceito amplo), pois o sufixo ISMO é utilizado para doenças, assim, transexualismo é um termo médico, e o fito da pesquisa é não sedimentar a patologização dos transexuais. Dessa forma passaremos a empregar uma das nomenclaturas mencionadas. No âmbito internacional vem sendo utilizada siglas para designar a transformação das pessoas transexuais. A sigla MtF (male to female) vem sendo utilizada para designar a transformação do homem para mulher e FtM (female to male) para designar a transformação da mulher para homem. 2.2.1 Conceito A transexualidade, para a maioria dos doutrinadores, remete à ideia de 50 PEZZINI, Barbara. Transgenere in Italia: Le regole del dualismo di genere e l’uguaglianza. In: POMPEU, Gina Vidal Marcilio, SCAFF, Fernando Facury – Discriminação por orientação sexual – a homosexualidade e a transexualidade diante da experiência constitucional. Florianópolis: Conceito, 2012, p. 327. 36 incompatibilidade do sexo biológico com o sexo psicológico, a metáfora da pessoa que se sente presa em um corpo que não lhe pertence. Maria Helena Diniz define transexualidade como: “(...) a condição sexual da pessoa que rejeita sua identidade genética e a própria anatomia de seu gênero, identificando-se psicologicamente com o gênero oposto. Trata-se de um drama jurídico-existencial, por haver uma cessão entre a identidade sexual física e psíquica. É a inversão da identidade psicossocial, que leva a uma neurose reacional obsessivo-compulsiva, manifestada pelo desejo de reversão sexual integral.51 Não seria caracterizado por um simples incômodo e sim rejeição total ao sexo biológico, levando à automutilação genital ou de seios. Alguns médicos ainda dividem os transexuais em categoria primária e secundária, que seriam os transexuais não verdadeiros com base na estabilidade e desejo de mudança de sexo, como Matilde Josefina Sutter, com o apoio do cirurgião Roberto Farina, vejamos: “(...) o transexual primário apresenta uma obsessão de mudança de sexo ‘compulsiva, precoce, imperativa e perene’, o transexual secundário alterna fases de atividade homossexual e travestismo, “apresentando impulsos transitórios e ocasionais de transexualidade”. 52 O transexual primário tem a clara concepção de inadequações entre a sua identidade de gênero e anatomia, mas não sofrem de nenhuma enfermidade psíquica, e não buscam intervenção cirúrgica objetivando a prostituição ou fins econômicos.53 Os transexuais secundários ou não puros manifestam esporadicamente o interesse de pertencer a outro gênero, não se enquadrando à ideia do transexualismo verdadeiro.54 51 DINIZ, Maria Helena, O estado atual do biodireito, São Paulo, Saraiva, 2011, p. 316. 52 SUTTER, Matilde Josefina, Determinação e mudança de sexo. Aspectos médicos-legais. São Paulo: RT, 1993, p. 109, apud GONÇALVES, Camila de Jesus Mello, Transexualidade e diretos humanos – o reconhecimento da identidade de gênero entre os direitos humanos, Curitiba: Juruá, 2014, p. 69. 53 COSSI, Rafael Kalaf. Transexualismo, psicanálise e gênero, dissertação de mestrado apresentada ao Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo em 2010, p. 33 apud Cunha, Leandro Reinaldo da. Identidade e redesignação de gênero aspectos da personalidade, da família e da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 37. 54 LEITE JÚNIOR, Jorge. Nossos corpos também mudam: Sexo, gênero e a invenção das categorias “travesti” e “transexual” no discurso cientifico, tese de doutorado apresentada ao Departamento de Ciências Sociais da PUC- SP em 2008, p.174 apud Cunha, Leandro Reinaldo da. Identidade e redesignação de gênero aspectos da personalidade, da família e da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 37. 37 Luiz Alberto Davi Araujo defende que, no caso do transexual secundário, não seria conveniente pensar em intervenção médica, pois a condição não se mostra contínua, ocorre de forma totalmente transitória.55 Para Evaldo Souza Couto: “O transexual é aquele que recusa totalmente o sexo que lhe foi atribuído civilmente. Identifica-se psicologicamente com o sexo oposto, embora biologicamente não seja portador de nenhuma anomalia. Geralmente possui genitália perfeita, interna e externa, de um único sexo, mas a nível psicológico responde a estímulos de outro”.56 Segundo Antônio Chaves, “o transexual acredita insofismavelmente pertencer ao sexo contrário à sua anatomia e por isso se traveste”. Tornando-se, assim, a operação de mudança de sexo uma obstinação. Em momento algum vive, comporta-se ou age como homem. Quando o faz é sob condições estressantes, que podem conduzi-lo a consequências neuróticas e até psicóticas. Estas podem chegar ao ponto de induzi-lo à automutilação da genitália e, em certos casos ao suicídio.57 No dicionário jurídico, Maria Helena Diniz define transexual da seguinte forma: Transexual: Medicina legal e psicologia forense. 1. Aquele que não aceita o seu sexo, identificando-se psicologicamente com o sexo oposto (Hodja), sendo, portanto, um hermafrodita psíquico (H. Benjamin). 2. Aquele que, apesar de aparentar ter um sexo, apresenta constituição cromossômica do sexo oposto e mediante cirurgia passa para outro sexo (Othon Sidou). Tal intervenção cirúrgica para a mulher consiste na retirada dos seios, fechamento da vagina e confecção de pênis artificial e, para o homem, na emasculação e posterior implantação de uma vagina (Paulo Matos Peixoto). 3. Para a Associação Paulista de Medicina, é indivíduo com identificação psicossexual oposta aos seus órgão genitais externos, com desejo compulsivo de mudá-los. 4. Aquele que, tendo morfologia genital masculina, sente-se psicologicamente mulher, rejeitando seu papel de gênero masculino até buscar a alteração de sua anatomia para assumir aparência física feminina. Correspondentemente, há mulheres em situação análoga (Aldo Pereira).58 Muitos doutrinadores adotam como necessário diferenciar travestis e 55 ARAUJO, Luiz Alberto Davi. A proteção constitucional do transexual. São Paulo, Saraiva, 2000, p. 34. 56 COUTO, Evaldo Souza, Transexualidade: o corpo em mutação, Salvador: GGB, 1999, p. 26. 57 CHAVES, Antônio. Direito à vida e o próprio corpo: intersexualidade, transexualidade, transplantes. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 140. 58 Dicionário Jurídico, São Paulo: Saraiva, 1998, v.4, p. 604. 38 transexuais em grupos distintos, muitos ainda afirmam que transexuais querem passar por cirurgia de transgenitalização, enquanto os travestis se conformam com o próprio corpo e sentem prazer com isso. Luiz Alberto Davi Araujo afirma que o transexual está inserido em uma condição de sofrimento intenso, causador de conflitos internos, por ter sexo biológico diverso ao que se identifica, sendo que a travesti, por sua vez, vale-se de seus próprios genitais para sentir prazer, mesmo utilizando vestimentas do sexo oposto.59 Na esfera internacional, ainda podemos notar essa distinção, como defende Barbara Pezinni: “O termo transexualismo refere-se à condição de quem realizou procedimento de retificação do sexo atribuído ao nascimento, realizando o “trânsito” de um sexo para o outro. São chamados de trans FtM (“Female to Male”) pessoas que, biologicamente classificadas como mulheres, adaptam à identidade psíquica a masculina e MtF (“Male to Female”), aqueles que executam o processo inverso, isto é, classificados biologicamente como homens e fazem adaptação a identidade psíquica feminina.60 (Tradução Livre) A mesma doutrinadora, também, diferencia a transexualidade de travestismo, afirmando que o travestismo refere-se a comportamentos que implicam uma reformulação do papel de gênero, como cabelo e maquiagem; sendo
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