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1 Aula 1: Formação Econômica do Brasil colonial - Por que o estudo de Formação Econômica é importante para o curso de graduação em Administração? Porque permite conhecimento da estrutura econômica e dos negócios que sustentaram o país em sua etapa inicial de desenvolvimento. - Que habilidades o estudante de Administração desenvolve ao analisar o contexto econômico e os negócios mais rentáveis em cada período histórico? Identificar as relações entre ambiente econômico; Presença e/ou apoio em maior menor grau do governo; Desenvolvimento tecnológico; Mercado de trabalho. Como surgiu a empresa colonial agrícola Iniciou-se com a introdução da monocultura do açúcar no Nordeste pelos portugueses, seu desenvolvimento deu-se a partir da expansão comercial européia, iniciada em fins da Idade Média. A expansão comercial rompeu com o isolamento econômico típico de Período Feudal1,neste período o Mar Mediterrâneo tornou-se a mais importante rota de comércio, o que acabou beneficiando poucas cidades. Como havia grande risco do empreendimento comercial e custo elevado de transporte, apenas produtos de grande valor de mercado, porém com pouco volume e peso (especiarias orientais: canela, pimenta-do-reino e etc.) eram transportados por ser economicamente viável. Portanto quando Constantinopla foi tomada pelos turcos, aumentou a dificuldade em manter a rota comercial que ligava as cidades mediterrâneas às fontes de especiarias, pois com os turcos no comando, espanhóis e portugueses tiveram o acesso proibido a estas terras. Sendo assim, se viram obrigados a descobrir novas rotas comerciais, dando início então em 1453 a era moderna e marcando o fim do feudalismo. 1 Período Feudal (Feudalismo) – Forma ao qual a sociedade européia vivia na Idade Média, tendo como base o poder descentralizado, economia agropastoril e trabalho dos servos. Sua organização social era dividida em três estamentos: Clero, Nobreza e Servos. 2 Portugal entra em cena Os portugueses já vinham explorando a rota do Atlântico desde os meados do século XV, se estabelecendo em algumas localidades a costa africana e cultivando a cana-de-açúcar. O principal objetivo era alcançar fornecedores de especiarias localizados na Índia usando a rota do Atlântico, porém para isto foi necessário que eles aprimorassem a tecnologia de construção dos navios. Este aprimoramento permitiu vencer a travessia do chamado “Mar tenebroso2”, o que marcou a cultura do país, já que aconteceu no auge do império marítimo português. A ocupação portuguesa na colônia O descobrimento do Brasil foi uma etapa da conquista do oceano Atlântico, fazendo parte do grande movimento deflagrado pelas Grandes Navegações3, com isto o Mediterrâneo perdeu a centralidade no comércio mundial, que se deslocou para o Atlântico. Portugal era nesta época uma monarquia absolutista, surgindo como estrutura política que a burguesia encontrava para garantir apoio a seus interesses comerciais, caracterizados como Mercantilismo (base acúmulo de capital), o que eu garantia lucros do comércio por meio de um modelo de comércio exterior protecionista. Estados Absolutistas Burguesia Organização política que surgiu a partir do século XV; Surgido na Europa, com o renascimento comercial e das cidades com fim do período feudal; Alicerçados no poder do rei e da Igreja; Burgueses: médicos, artesãos, comerciantes que viviam aglomerados à volta dos castelos medievais; Centralização do poder; Sempre associada ao poder, ajudou a diminuir a influência do clero e da nobreza a sociedade; Crescimento do nacionalismo; Passou a dominar a vida social, política e econômica após a Revolução Francesa, no século XVIII. Unificação territorial 2 Mar tenebroso – conhecido por ser mais difícil de navegar do que as águas calmas do Mar Mediterrâneo. 3 Grandes navegações – expansão marítima ocorrida entre os séculos XV e XVI que ampliou as rotas comerciais, unindo Europa à África e Ásia. 3 A consolidação de Portugal como Estado Nacional moderno ocorreu no século XVI, quando o governo lusitano financiou as grandes navegações, que permitiu conquistar novos territórios e assim submetendo-se ao Pacto Colonial4. A ocupação do Brasil no período colonial (1500-1822) esta ligada a expansão comercial e colonial européia Portugal como não encontrou metais preciosos em seus domínios, implantou uma atividade lucrativa a fim de financiar a defesa da própria colônia, além de permitir a transferência de lucros mercantis para a metrópole. Introduziu então o cultivo de um produto tropical, a cana-de- açúcar, que já era um produto explorado em outras ilhas e tinha um mercado em expansão na Europa. O que garantiu a lucratividade do empreendimento foi o monopólio comercial, determinado pela metrópole. Características da colonização portuguesa no Brasil O sentido de colonização era cultivar produtos tropicais de forma lucrativa para o comércio europeu, de modo a não competir com as culturas de clima temperado existentes na Europa. Os produtos seriam tropicais porque a produção colonial deveria ser complementar, e nunca competitiva, à produção européia. De acordo com Caio Prado Júnior a estrutura da economia colonial é baseada em três elementos principais: o latifúndio, a monocultura e o trabalho escravo. Tendo sido pensada com único sentido: fornecer gêneros tropicais ao comércio europeu. Latifúndio: necessário para permitir o crescimento extensivo da produção, tendo em vista eu a atividade não se expandia com base no aumento da produtividade e sim no uso extensivo de terras; Monocultura: tendo em vista que o foco era a lucratividade comercial, tornou-se mais interessante para o colonizador mobilizar seus recursos para o plantio de um produto destinado à exportação; Trabalho escravo: com a dificuldade de se conseguir mão-de-obra barata, a fim de conter custos de produção,introduziu-se a escravidão na colônia. Economia canavieira: Elemento-chave no sucesso da empresa colonial agrícola A cultura da cana-de-açúcar foi o maior êxito experimentado pela economia colonial agrícola, pois permitiu associar a experiência portuguesa da cana nas ilhas do Atlântico Sul à utilização de mão-de-obra escrava nas colônias 4 Pacto Colonial – conjunto de relações econômicas e políticas que subordinavam a colônia à metrópole. 4 africanas, e ao uso de terras férteis da costa do Nordeste para a produção de uma cultura tropical que desfrutava de crescente mercado consumidor na Europa. Um elemento fundamental que explica este sucesso foi a implementação de uma rota comercial entre as colônias da Coroa portuguesa, criando uma interdependências entre os dois negócios: exploração de produtos primários da colônia brasileira voltados pata mercado externo e a exportação de escravos pelas colônias africanas. Por volta da metade do século XVI, a produção de açúcar passou a ser cada vez mais um empreendimento conjunto entre portugueses e holandeses. Eles recolhiam os produtos em Lisboa, o refinavam e distribuíam por toda a Europa. Porém a parceria com holandeses terminou a partir do momento em que Portugal foi anexado pela Espanha e em meio as lutas a Holanda resistiu à perda do negócio do açúcar e invadiu o Brasil em 1630, estabelecendo-se no Nordeste, mas a expulsão dos holandeses em 1654, trouxe conseqüências econômicas graves e duradouras. Como haviam adquirido conhecimento da cultura da cana-de-açúcar, se estabeleceram em um empreendimento concorrente nas Antilhas e acabaram como o monopólio na oferta di produto pelos colonos do Nordestebrasileiro, o que fez entrar em declínio o preço da cana no mercado externo, deixando então a economia canavieira de ser lucrativa. A colônia enfrentou uma crise devido a queda dos preços da cana, o que favoreceu a economia da metrópole, isso ocorreu até que a mineração substituísse a cultura de cana-de-açúcar como principal fonte de renda de exportações. Economia de Subsistência X Economia Mercantil Economia de Subsistência é aquela produzida para autoconsumo, em que o produtor não se distingue do consumidor, sendo desnecessário o uso do dinheiro. Economia mercantil é aquela em que o produto e direcionado para o mercado, tornando assim necessário a separação entre produtores e consumidores, o que torna possível a intermediação monetária. 5 Aula 2: Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o povoamento do interior O primeiro critério de distribuição do solo da colônia portuguesa na América foi o regime de concessão de sesmarias. O interesse primordial do processo de colonização portuguesa estava aliado à extensiva exploração do território, com intuito de campear recursos minerais, principalmente ouro. Porém este propósito foi totalmente frustrado, pois durante todo século XVI não houve ocorrência de descoberta de metais preciosos nos solos coloniais americanos de possessão portuguesa. Mas a empresa colonial percebeu que a colônia poderia produzir outros tipos de riquezas, portanto em 1557 foi instalado o primeiro engenho de açúcar no Brasil e como os portugueses dominavam esta técnica de plantio e fabricação do açúcar devido as experiências adquiridas nas ilhas do Atlântico, puderam introduzir e incentivar a produção, já que era algo que possuía grande valor comercial. Busca por metais preciosos e apresamento de índios: os bandeirantes ampliaram os domínios portugueses na América Para falarmos da expansão territorial é necessário ressaltar sobre o Tratado de Tordesilhas5, tratado este que determinava a divisão do recém-descoberto continente americano entre Espanha e Portugal. Acontece que este tratado não foi respeitado, devido: Potências européias excluídas da divisão nunca deixaram de lutar pelas conquistas de territórios; Franceses, ingleses e holandeses conseguiram se estabelecer ao norte da América do Sul, fundando a Guiana Francesa, a Guiana e o Suriname; As fronteiras entre América portuguesa e espanhola foram modificadas devidas as bandeiras6. 5 Tratado de Tordesilhas – Tratado criado sob a mediação do papa da época, ao qual convencionou que a terra do oeste do meridiano que corta o Brasil ficaria sob o domínio da Espanha e os portugueses ficaram com as terras situadas a leste da linha imaginária. 6 Bandeiras – Expedição armada que desbravava os sertões a fim de escravizar indígenas ou descobrir ouro. 6 Ocupação do Sudeste A ocupação do Sudeste foi feita por colonos que logo perceberam que não podiam utilizar as terras para produção de cana-de-açúcar pois não eram férteis o suficiente para este tipo de produção, porém nas terras do sudeste havia muitos índios e logo perceberam que poderiam começar outra atividade, a escravização do trabalho indígena. Além deste colonos também se instalaram jesuítas que tinham o intuito de catequizar os índios existentes naquela região. A ocupação do Vale Amazônico Região que tinha rios e afluentes como facilitador de incursões, sendo assim espanhóis, holandeses e ingleses conseguiram se estabelecer no norte do continente em 1596 e desenvolveram comércio com a produção extraída da floresta (madeiras e urucum, que era utilizado para tingir tecidos e pescados). Na parte pertencente a Portugal, houve também tentativas de invasão, porém os portugueses expulsaram franceses, ingleses e holandeses das margens do rio Amazonas. Para fins de defesa, Portugal construiu o forte do Presépio na cidade portuária de Belém, que era local estratégico o que impedia a entrada de invasores. Sul: as missões jesuítas Os jesuítas tiveram papel fundamental na ocupação de outras partes do país, pois formavam núcleos de povoação indígenas que visavam a defender os índios do aprisionamento pelos colonizadores brancos. A retaguarda da expansão agrícola: o grande sertão da pecuária O gado foi o instrumento principal da ocupação do Nordeste, Sudeste e Centro- Oeste, porque atendia principalmente às necessidades das fazendas produtoras de monocultura visando ao mercado externo. No início do século XVII, a criação de gado tornou-se mais independente, e a ocupar cada vez mais terras para o interior, já que o rebanho requeria grandes extensões de terra para pastagens. Esta atividade respondia aos estímulos principalmente da economia canavieira e da mineira, sendo uma atividade móvel pela natureza, portanto a pecuária contribuiu decisivamente para a ocupação do território. 7 O que mudou com a mineração? A economia colonial enfrentou uma longa crise e com a descoberta de ouro iniciou-se um novo ciclo na economia colonial, intensificando as relações entre metrópole e colônia. A mineração então se tornou o centro das atenções de Portugal, o que fez partir fluxos emigratórios para a colônia. Sendo assim, as demais atividades econômicas entraram em declínio, ocorrendo empobrecimento e despovoamento de regiões onde se localizavam. O ouro era prospectado em rios, o que permitia haver sempre a possibilidade de se encontrar novas reservas. A economia mineira permitiu que o Tratado de Methuen7 pudesse ser cumprido, o que proporcionou recursos necessários a Portugal para enfrentar o comércio deficitário com a Inglaterra. Aula 3: A crise da economia colonial no Brasil No período colonial, as atividades produtivas e comerciais na economia brasileira não se esgotavam na empresa colonial agrícola. A ocupação do Sul, o vale amazônico e o movimento das bandeiras foram importantes para o desenvolvimento de atividades econômicas no interior do país, assim como a pecuária e a mineração. As colônias na América foram constituídas no momento de formação dos estados nacionais europeus (absolutistas), em que predominavam as práticas mercantilistas. A empresa colonial nasceu exatamente dessa associação, em que os interesses da burguesia mercantil estavam absolutamente relacionados aos da Coroa. Juntos, os burgueses e monarcas buscavam novas fontes de renda por meio de conquistas coloniais. O sentido da crise A crise da economia colonial agrícola decorreu de dois aspectos complementares, um de caráter interno, e outro, externo. 1º Aspecto: A expansão de mercados na colônia, resultado direto do aumento da população e do incremento da produção. Surgiram, em consequência, conflitos de interesses entre colonos e metrópole. Até então, os colonos sentiam-se portugueses em terras brasileiras, tendo, em um mercado pouco expressivo, privilégios garantidos pelo monopólio (exclusivo) comercial e suas 7 Tratado de Methuen – Acordo comercial entre Portugal e Inglaterra, que estabelecia que Portugal passava a importar os produtos têxteis ingleses, com taxas privilegiadas, enquanto a Inglaterra se comprometia a importar vinhos portugueses taxando-os em apenas dois terços dos tributos de importação pagos pelos vinhos franceses. 8 restrições à concorrência externa. Com o aumento da produção e o crescimento do mercado interno – sobretudo após o início do ciclo do ouro -, os interesses particulares da colônia foram aumentando de maneira significativa. O pacto colonial passou a ser, então, um empecilho à expansão dos negócios e, portanto, ao potencial de ganhos dos colonos. 2º Aspecto: Referente ao planoexterno eram os efeitos da Revolução Industrial 8cada vez mais visível na Europa. O processo de acumulação de capital, naquele contexto, centrava-se fortemente na esfera de produção da indústria, com uma rápida incorporação de novas técnicas produtivas que ampliavam largamente seu horizonte de crescimento. Assim, a necessidade de busca e incorporação de novos mercados pelas unidades industriais em formação tornou-se um traço típico da dinâmica capitalista. É fácil entender, então, que o monopólio comercial e produtivo formalizado no pacto colonial era uma barreira para o capital industrial e para a produção em grande escala. Isto explica o grande interesse da Inglaterra pelos movimentos de independência das Américas hispânica e portuguesa. Essas transformações também estavam representadas no campo institucional e das idéias pela crescente contestação às instituições absolutistas e o avanço do Iluminismo (Movimento cultural originado no Renascimento, a partir do século XVII. Do ponto de vista econômico, seu principal foco era a definição de uma política econômica mais livre das restrições típicas do mercantilismo). As mudanças na metrópole e suas conseqüências para o Brasil No Brasil, o período foi marcado por dificuldades econômicas graves, resultantes da queda das exportações. A exceção, nesse contexto, foi o Maranhão, em virtude dos incentivos do Marquês de Pombal ao criar uma companhia de comércio altamente capitalizada para explorar e ampliar a produção e exportação de algodão, produto em alta substantiva no mercado internacional. O acirramento das crises internas e nas colônias, todavia, obrigou o ministro a demitir-se em 4 de março de 1777. Neste mesmo ano o rei faleceu, e o trono passou a ser ocupado por Dona Maria. Esse conjunto de mudanças não trouxe transformações importantes, pois de maneira geral a Política Pombalina9 ainda prevalecia, graças à tentativa de preservar as estruturas do exclusivo 8 Revolução Industrial – desenvolveu também uma nova sociedade: a capitalista, baseada na divisão dos indivíduos em duas classes: os capitalistas, detentores dos meios de produção, e os trabalhadores, homens livres que vendem sua força de trabalho em troca de um salário. O capitalismo, consolidado com a Revolução Industrial, gerou muita riqueza e um enorme progresso material. 9 Política Pombalina – Conjunto de medidas visando ao fortalecimento do poder real em Portugal. 9 comercial. A diferença fundamental foi a redefinição de alguns laços formais que substanciavam sua existência, realizando ações como: a) Acabar com as companhias de comércio, permitindo uma maior liberdade aos comerciantes; b) Combate ao contrabando; c) Permissão para o comércio intercolonial com a África e o Oriente; d) Liberação do comércio e exploração do sal e da pesca da baleia, terminando o monopólio metropolitano nesse setor; e) Proibição da manufatura têxtil no Brasil. Essas mudanças refletiam, em realidade, a crescente dependência econômica, por parte de Portugal, da colônia brasileira e, portanto, era vantajoso, para a metrópole, fazer concessões. A grande fonte de concorrência estava no contrabando inglês Apesar da flexibilização das relações expostas, as bases do exclusivo comercial estavam mantidas, e as reações no Brasil começavam a ganhar um contorno mais decisivo. Exemplos históricos importantes foram: Inconfidência Mineira: queriam a independência do Brasil e instaurar a República. Pretendiam incentivas as manufaturas, proibidas desde 1785, e fundar uma universidade em Vila Rica. Integrado por membros da elite intelectual e econômica da região – fazendeiros e grandes comerciantes - , o movimento reflete as contradições desses segmentos: sua bandeira traz o lema “libertas quae será tamem (Liberdade ainda que tardia)”, mas não se propõe a abolir a escravidão. O momento escolhido para a eclosão da revolta é o da cobrança da Derrama (Imposto cobrado por Portugal, onde a população é obrigada a entregar seus bens para integralizar o valor da dívida). A Derrama, movimento foi denunciado pelos portugueses Joaquim Silvério dos Reis, Brito Malheiros e Correia Pamplona, em 5 de março de 1789. Devedores de grandes somas ao tesouro real, eles entregam os parceiros em troca do perdão de suas dívidas. Em 10 de maio de 1789, Tiradentes é preso e instaura-se a devassa, para estabelecer a culpa dos conspiradores. Conjuração Baiana: Também conhecida como Revolta dos alfaiates, de caráter social e popular, explode em Salvador (1798) e inspira-se nas idéias da revolução francesa e da inconfidência mineira. O movimento é radical e dirigido por pessoas do povo, como os alfaiates João de Deus e Manoel dos Santos Lira, os soldados Lucas Dantas e Luís Gonzaga das Virgens. Propõe a independência, a igualdade racial, o fim da escravidão e o livre comércio entre os povos. 10 O acirramento dos conflitos de interesses e o processo de independência O processo de separação colônia/metrópole só viria a ser precipitado pela invasão francesa a Portugal e a vinda da corte para o Brasil em 1808, na medida em que determinou uma série de mudanças institucionais de relevo para que a colônia servisse de sede do governo no rio de Janeiro, como a abertura dos portos e a criação do Banco do Brasil. A situação portuguesa de lucros extraordinários no comércio com a colônia foi então rompida, especialmente após a formalização dos tratados com a Inglaterra. No campo externo, dois aspectos sobressaíam: Política direcionada a contrariar os interesses napoleônicos na América do Sul, caracterizando uma estratégia expansionista na invasão da Guiana Francesa, em 1809; Com objetivo de tornar-se regente do império espanhol na América, no período de ocupação da Espanha pelas tropas francesas, D. João VI envia navios para sitiar e ocupar a Banda Oriental, em 1821, como Província Cisplatina, após o período de desagregação do Vice-Reinado do Prata, que seguiu a independência da Argentina em 1816. Do ponto de vista dos colonos brasileiros, a liberalização da economia e dinamização do comércio (resultado da vinda da Corte e da abertura dos portos) modificou fundamentalmente o cenário. A manutenção estrutural do pacto colonial funcionava como um entrave à expansão da economia doméstica, e os grandes agricultores – classe dominante – enxergavam Portugal como um entreposto desnecessário e caro. O descontentamento aumentava internamente, e as medidas associadas ao pacto colonial eram cada vez mais repelidas, como a proibição do comércio entre as províncias, o monopólio de portugueses nos cargos públicos, e, sobretudo, os impostos abusivos cobrados pela Coroa. Adendos: A vinda da corte portuguesa para o Brasil Em novembro de 1807, as tropas francesas invadiram o território português, impondo uma transferência às pressas da corte portuguesa para o Brasil, sua principal colônia, com apoio da esquadra britânica. Esse processo determinou um aprofundamento ainda maior dos laços políticos e econômicos de Portugal e Inglaterra. As primeiras medidas tomadas com a chegada da corte ao Brasil formam: a) Abertura dos portos (1808), já que Portugal estava ocupado e não poderia exercer a função de entreposto comercial para as mercadorias brasileiras; 11 b) Fomento à agricultura e fundação do Horto Real (Jardim Botânico) no Rio de Janeiro; c) Incentivo ao desenvolvimento das manufaturas, concedendo isenção de impostos a matérias-primas importadas; d) Permissão de acesso de estrangeiros às sesmarias, com o objetivo de garantir fronteiras com a expansão do povoamento; e) Criação do Banco do Brasil, com objetivo primordial de financiar os gastos da Coroa. Os Tratados com a Inglaterra Os principais tratados foram: 1.Tratado de Aliança e Amizade: definia as condições de defesa mútua e apoio ao ataque português à Guiana Francesa. Em contrapartida, acordou-se o comprometimento de Portugal com a redução do tráfico de escravos, circunscrito à região abaixo da linha do Equador; 2. Tratado de Comércio e Navegação: definia vantagens tarifárias para a Inglaterra, até mesmo sobre Portugal, no comércio com o Brasil. Esse tratado deu liberdade ao ingleses para criar casas de comércio e negociar livremente tanto os produtos brasileiros no exterior, quanto as vendas de importados para o Brasil. A independência do Brasil Em 7 de setembro de 1822, D. Pedro I proclamou a independência do Brasil em relação a Portugal, tornando-se nosso primeiro imperador. Estava conquistada, então, a autonomia política, mas não a econômica: Portugal exigiu 2 milhões de libras para reconhecer a independência do Brasil. Como o recém-formado império não dispunha de capital suficiente, D. Pedro decidiu pedir um empréstimo à Inglaterra. Em relação aos demais países, México e Estados Unidos foram os primeiros países a reconhecer nossa independência. Transformavam-se também as relações comerciais, com maior autonomia para o Brasil. No plano interno, porém, a independência não provocou grandes mudanças. A estrutura permaneceu inalterada, com base na escravidão, na monocultura e no latifúndio, e a distribuição de renda continuava desigual, beneficiando, principalmente, a elite agrária. O povo permaneceu à margem deste processo. Aula 4: Economia cafeeira escravista O século XIX marcou um importante processo de estagnação da economia brasileira, particularmente no período que se seguiu ao processo de 12 independência do país. No campo externo, crescia o déficit comercial – resultante, sobretudo, de dois fatores. Primeiro, a extensão de vantagens comerciais dadas a outros países além da Inglaterra. Segundo, as culturas da cana-de-açúcar e do algodão, principais fontes de recursos externos (moeda estrangeira, sofriam crescente concorrência no mercado internacional. No caso da cana, o aumento da produção de açúcar, na Europa, a partir da beterraba, e a pesada entrada no mercado de países como Cuba aumentaram sobremaneira a oferta internacional. Como conseqüências, temos a queda do preço no mercado externo e a redução da receita de exportação brasileira. No plano interno, agravava-se rapidamente o déficit público. Isso ocorreu em função do aumento das despesas militares. Os conflitos regionais multiplicaram-se, e houve também disputas territoriais, como as guerras cisplatinas. Além disso, o Brasil se viu obrigado a pagar uma indenização a Portugal para ter sua independência reconhecida. Durante este período, houve uma queda importante das receitas alfandegárias, resultado direto da adoção de medidas direcionadas à prática do Livre Cambismo10, que estendeu a outros países as vantagens comerciais concedidas à Inglaterra quando da assinatura dos tratados comerciais. Nesse cenário de estagnação e dificuldades de crédito, o único fator abundante na economia brasileira era a terra. O início da cafeicultura para exportação no Brasil Cultivado no Brasil desde o início do século XVIII, o café era, até então, um produto direcionado à subsistência e com difusão bastante limitada no país. Apenas no século XIX passou a ser incentivada sua produção para o mercado externo. Alguns fatores contribuíram decisivamente para isto. Pelo lado da demanda, o crescimento dos mercados europeu e norte- americano, em função do avanço da indústria e da urbanização, foi fundamental. Ao mesmo tempo, do lado da oferta, o colapso da produção haitiana ( colônia francesa em processo de independência) determinou um importante aumento dos preços internacionais, estimulando a entrada do Brasil nesse mercado. Contava ainda, a favor do produto, uma característica crucial para o momento: a baixa capitalização requerida para o processo produtivo, bem mais reduzido que na economia açucareira – o maquinário utilizado para a produção de açúcar tinha um custo bem superior. Como resultado, na década de 1830 o café já era o principal produto de exportação do Brasil, superando as receitas das culturas tradicionais de açúcar e algodão. 10 Livre Cambismo – Conjunto de medidas direcionadas para a liberação do comércio internacional – a redução das tarifas alfandegárias, por exemplo. 13 O início da produção de café para exportação no Brasil se deu no Vale do Paraíba. Tratava-se de uma região de condições climáticas propícias para o cultivo desse produto, com terras abundantes para o plantio. É importante ressaltar que o Vale do Paraíba já vinha sendo ocupado, por ser caminho natural da área de mineração para o Rio de Janeiro, que era a capital e principal porto de escoamento das exportações. Desta forma, havia um claro interesse na ocupação e plantio dessa área para abastecer a capital, principalmente após a vinda da corte portuguesa para o país em 1808. Além disso, havia uma razão favorável para esta localização em função da ausência de meios de transporte capazes de garantir o escoamento da produção a ser exportada a partir do porto do Rio de Janeiro. O café era então transportado por mulas, disponíveis em grande quantidade e bastante resistentes para a atividade. O sistema de ocupação, como em geral ocorria à época, foi realizado por meio do sistema de Sesmarias: as terras eram distribuídas e entregues aos fazendeiros de acordo com o número de escravos possuídos por eles, este ponto foi um dos determinantes do processo de concentração fundiária no Brasil. Neste caso, quando o a produção de café começou a ganhar peso e importância, elevando substancialmente a capacidade de geração de renda e lucros no setor, os grandes fazendeiros expulsaram os pequenos proprietários – sobretudo por meio de falsificação dos registros. Isso obrigava os minifundiários a migrar para as cidades ou a partir para regiões periféricas, formando cordões agregados aos grandes latifúndios. Bases e características da produção de café O café era cultivado em latifúndios monocultores de base escravista, utilizando- se técnicas absolutamente precárias para a plantação, o que destacava a forma extensiva do processo produtivo. Tradicionalmente, o “preparo” da terra para o plantio baseava-se na derrubada e queimada da Mata Atlântica que cobria a região, utilizando o método vertical de plantação nas encostas, quando o recomendado para solos montanhosos seria a plantação das mudas em platôs ao longo da encosta. A intenção explícita dos cafeicultores era facilitar o trabalho dos escravos, desprovidos de qualquer experiência com o plantio do café – oriundos, em sua maioria, da atividade de mineração. É importante perceber que essa forma de utilização da terra impôs uma produção que ocupava áreas cada vez mais extensas, PIS a deterioração do solo tornava-se acelerada. O crédito e a comercialização do café seguiam um esquema semelhante ao apresentado na cultura do açúcar. Destacava-se, assim, a figura do comissário intermediando as transações entre fazendeiros, exportadores e importadores. A 14 maior parte do lucro resultante do café girava em torno da comercialização do produto, a cargo dos exportadores e dos intermediários. Além disso, no que se referem ao crédito, os bancos nunca forneciam empréstimos diretamente aos fazendeiros, que ficavam dependentes dos comissários para auferir os recursos necessários para a produção. Os comissários, por sua vez, seriam responsáveis pela venda do café, recebendo uma comissão remuneradora. Inicialmente, o café era transportado por mulas, em estradas precárias, causando perdas importantes de café e de escravos. Essa prática era possível em função da proximidade entre as áreasiniciais de plantio no Vale e o porto do Rio de Janeiro. À medida que a produção se expandia. E considerando sua natureza extensiva, outra forma de transporte tornava-se necessária. A Estrada de Ferro D. Pedro II foi um exemplo: foi financiada com capitais antes empregados no tráfico de escravos e que ficaram sem aplicações após a Lei Eusébio de Queiroz. O Declínio da produção de café no Vale do Paraíba A decadência da cultura do café no Vale é explicada diretamente pelas bases assumidas no seu processo de produção, sobretudo no que diz respeito à utilização das terras e à mão-de-obra escrava insistentemente empregada ao longo da segunda metade do século XIX, quando sua oferta tornou-se definitivamente escassa. Ao mesmo tempo, a decadência da cafeicultura implicou a inadimplência crescente dos produtores junto aos comissários levando-os também a uma situação financeira complicada. A quebra de casas comissárias, por sua vez, atingiu também bancos em que os comissários descontavam títulos para obter recursos. Esse processo foi responsável por uma importante redução da disponibilidade de crédito para a produção, o que dificultou ainda mais a continuidade do negócio. Como resultado, a produção do café passou a se concentrar, definitivamente, na região conhecida como Oeste Paulista. Aula 5: Economia cafeeira com trabalho livre A segunda metade do século XIX marcou o assentamento definitivo do café como principal produto de exportação do Brasil. As condições precárias do uso as terra caracterizavam a produção no Vale do Paraíba, causando rápida destruição do solo da região. Porém, o principal obstáculo para a continuidade do processo produtivo estava na mão-de-obra. A grande dispersão dos escravos era decorrente da própria estrutura sociopolítica brasileira, ou seja, de uma estrutura na qual não havia integração entra várias regiões do país. Esta falta de integração acontecia tanto em aspectos físicos (dificuldade de trânsito entre as regiões) quanto sociais e 15 políticos, tornando o recrutamento dos escravos uma tarefa bastante complicada. A utilização desse tipo de mão-de-obra disponível nas áreas urbanas, por outro lado, encontrava obstáculos na reduzida capacidade de adaptação dos escravos aos métodos e à disciplina exigidos pela lavoura agrícola. A utilização da mão-de-obra imigrante foi a solução adotada por alguns fazendeiros do oeste paulista como forma alternativa de superar o problema da mão-de-obra. A lavoura paulista do café inaugurou a inserção do imigrante na monocultura de exportação, permitindo a continuidade do forte ritmo de crescimento da cafeicultura no Brasil. O café no Oeste Paulista Alguns fatores importantes contribuíram para o deslanche da produção de café no oeste paulista, com destaque para: a) A existência dos solos de melhor qualidade que os do Vale do Paraíba e a possibilidade de utilização de técnicas mais modernas e adequadas para o plantio e o beneficiamento do café; b) O início de uma época em que as restrições ao uso da mão-de-obra escrava estavam cada vez mais evidentes, permitindo uma percepção mais clara do problema associado à inevitável escassez de escravos – e da necessidade de uma alternativa; c) A coincidência de sua expansão com um forte crescimento dos investimentos britânicos na América Latina, em particular na construção de ferrovias. Esses investimentos permitiram uma sensível redução dos custos de transporte dos produtos para exportação; d) O aumento da população dos Estados Unidos, provocado pela grande imigração que houve para esse país. Os norte-americanos passaram a impor muito, incrementando significativamente o mercado para as exportações brasileiras. Os Estados Unidos chegaram a ser responsáveis por cerca de 60% das compras internacionais do café brasileiro; e) A garantia, por parte do empreendimento cafeeiro concentrado nessa região, das condições básicas para o nascimento de uma nova classe, assentada em relações de produção tipicamente capitalistas e capazes de organizar com maior desembaraço seus interesses políticos e econômicos, cujo papel consolidou-se na República Velha. Informações adicionais: Abolição da Escravatura: Em 1888, foi abolida a escravidão no Brasil. As conseqüências econômicas deste ato logo se fizeram sentir na economia e na política nacional. 16 Dois conceitos são entendidos por abolição da escravatura: O conjunto de manobras sociais e políticas empreendidas entre período de 1870 a 1888 em prol da libertação dos escravos e a própria promulgação da Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel em 13 de maio de 1888, promovendo a oficialização da abolição do regime escravista; A mão-de-obra proveniente de novas correntes imigratórias passou a ser empregada. Os negros, por um lado libertos, não possuíam instrução educacional ou especialização profissional que passou a ser exigida, decorrendo desses aspectos a permanência dos negros à margem da sociedade frente à falta de oportunidades a eles oferecidas. A liberdade dada aos negros anteriormente escravizados é relativa: embora não mais escravizados, nenhuma estrutura que garantisse a ascensão social ou a cidadania dos negros foi oferecida. A produção do café no oeste paulista apresentou duas formas bem marcada de utilização de mão-de-obra imigrante. Primeiro acontecei o sistema de parceria, marcando o chamado oeste velho paulista, momento inicial de inserção de imigrantes. A segunda forma, o sistema de colonato, no oeste novo paulista, inaugurou a formação das bases de relações capitalistas de produção. O Oeste Velho Paulista: O sistema de parceria O ano de 1845 marca a primeira experiência de utilização da mão-de-obra de imigrantes na monocultura exportadora do café, na fazenda Ibicaba. O sistema consistia de uma proposta divulgada na Europa por agentes contratados por Vergueiro visando contratar trabalhadores dispostos ao serviço na lavoura, recebendo em troca lotes de pés de café adultos – preparados, portanto, para a produção. Metade do valor da colheita (cotas de pagamento) seria dos imigrantes, logicamente após a dedução dos custos de transporte, impostos e comissões – daí a definição parceria. Ao trabalhador caberia ainda a exploração de lotes de subsistência – e, se houvesse excedentes, seriam também repartidos com o proprietário. Apesar do conceito de parceria, todo o processo de comercialização e contabilidade ficava a cargo do proprietário. No entanto, o que acontecia era uma situação completamente distinta daquela apregoada pelos agentes de Vergueiro no recrutamento dos imigrantes na Europa. Começava pelas péssimas condições de traslado, muitos imigrantes morreram antes de chegar ao Brasil, devido à falta de higiene, que proporcionava o desenvolvimento de uma série de doenças. Ao chegar, a primeira novidade para os “colonos” (como o Senador denominava esses imigrantes) era a obrigação de pagamento de todo o custo de seu transporte, além do pagamento de juros de 6% ao ano pelo adiantamento oferecido para a manutenção dos trabalhadores durante o primeiro ano de sua chegada. Os imigrantes eram obrigados, por contrato, a 17 permanecer pelo menos quatro anos na fazenda. Além disso, a família imigrante era a responsável legal por cada um de seus membros, de maneira que, se algum morresse, os outros deveriam arcar com o pagamento de sua dívida. Apesar destas condições extremamente desfavoráveis, incluindo as mortes e doenças decorrentes dos maus-tratos e da longa e contínua jornada de trabalho, as safras foram abundantes e os termos de contrato estavam sendo cumpridos. Sistema de Parceria: A escravidão disfarçada e seus limites O grande problema do sistema de parceria dizia respeito à relação fazendeiros/colonos, que era na verdade uma continuação das condições de escravidãonas bases do trabalho e do nível de vida. Não houve uma mudança ideológica por parte dos fazendeiros no que se refere ao trabalho: consideravam e tratavam os imigrantes realmente como escravos. Para isso, utilizavam má-fé nos contratos, já altamente desvantajosos para os imigrantes, de maneira que a insatisfação tornava-se crescente tanto para os colonos quanto para os fazendeiros. As cláusulas contratuais, em realidade, prendiam os imigrantes à fazenda eternamente, sob rigoroso controle e supervisão dos fazendeiros – como era a função dos capatazes para os escravos africanos. Diversos direitos do colono, mesmo previstos em contrato, eram suprimidos sem qualquer pudor. Como exemplo, sair da fazenda e receber visitas era atividades proibidas. A moradia dos imigrantes era, em geral, uma “adaptação” das antigas instalações das senzalas. Os fazendeiros impunham ainda rigorosas punições aos colonos, sob a argumentação de vadiagem, embriaguez e outras situações semelhantes. Tudo isso apoiado em uma situação de endividamento eterno dos imigrantes junto aos patrões fazendeiros – à custa de manipulação desonesta dos livros de contabilidade da fazenda, práticas de subfaturamento da produção e até aumento indiscriminado da dívida registrada. Para os fazendeiros, os colonos representavam a ralé da população dos países de origem, gente desordeira e pouco afeita ao trabalho – como os escravos, mas agora disfarçados na pele branca. Tratava-se, portanto, de uma situação insustentável. O Oeste Novo Paulista e o Sistema de Colonato Apesar dos conflitos internos do sistema de parceria e da impossibilidade de continuação daquele processo de recrutamento da mão-de-obra imigrante, a “falta de braços” para a expansão da lavoura agrícola cafeeira persistia. O problema residia no fato de que a imagem do Brasil como um possível espaço para a realização de homens pobres europeus vinha sendo desfeita a passos 18 largos. A divulgação na Europa dos maus-tratos conferidos aos imigrantes em São Paulo repercutia de maneira bastante negativa. Ao mesmo tempo, a empresa cafeeira ascendente começava a dar mais corpo político aos fazendeiros (os barões do café), cuja participação no processo de decisões tornava-se cada vez mais decisivas. A capacidade de vislumbrar com clareza o problema da escassez de mão-de-obra em um ambiente hostil para a imigração exigiu a definição de novas formas de atração dos estrangeiros. No entorno de 1870, o colonato aparecia como o novo formato encontrado para garantir os fluxos de imigração para a cafeicultura, trazendo mudanças significativas em relação ao sistema de parceria. Além da criação de uma forma de pagamento direto ao colono, pelo menos em parte do total que era devido pelo seu trabalho na lavoura, o fazendeiro foi obrigado a arcar com despesas de viagem e do primeiro ano de trabalho. Também era concedida ao imigrante uma fatia de terra para o plantio de artigos para a subsistência. Um passo fundamental para a dinamização do sistema de colonato foi a utilização do governo da província de São Paulo para custear o transporte para o Brasil, além da instalação dos estrangeiros. O governo paulista participava diretamente na contratação de imigrantes, principalmente através da Sociedade Promotora de Imigração, em 1886, por iniciativa de Antônio de Queiroz Telles, o conde de Parnaíba. Nesse período, o contingente mais importante de imigração era de italianos, vindos principalmente devido ao violento processo de unificação das Itália. No último quartel do século XIX, algo em torno de 800 mil imigrantes entrou no Brasil para produção de café, garantindo definitivamente as condições básicas do crescimento de sua produção. Aula 6: Políticas de sustentação da renda da cafeicultura na República Velha A república Velha (ou Primeira República 1889-1930) começou com a proclamação da República e teve fim na Revolução de 1930. No novo regime, duas mudanças foram muito expressivas: o povo passou a escolher os governantes, ainda que sujeito a grandes restrições, e a Igreja foi legalmente separada do Estado, por meio de uma Constituição. No entanto, a República Velha não mudou o fato de o Brasil ser o país do café e dos grandes latifúndios. Os donos destas propriedades, chamados coronéis, impunham seu poder sobre os empregados, submetendo-os ao voto de cabresto. Isso fazia com que o poder político da região também estivesse sob seu domínio. Esse período da História ficou conhecido como República do Café-com-leite, pois o poder político se concentrou nas mãos das oligarquias paulista (responsável por produzir o café) e mineira (responsável pela produção de leite). 19 O início da República Velha foi caracterizado por condições altamente favoráveis para a acumulação de capital na cafeicultura. O final do século XIX marcou um importante fluxo de imigrantes europeus para o país, atraídos particularmente pela cultura cafeeira desenvolvida em São Paulo. Isso aconteceu porque o governo brasileiro criou uma série de estímulos para a vinda desses estrangeiros (em sua maioria européia) e porque a Argentina, concorrente de peso para o Brasil no abrigo de imigrantes, passou por um período de estagnação econômica durante toda a década de 1890. Além desses motivos, os chamados fatores de expulsão na Europa (como o violento processo de unificação na Itália e na Alemanha), bem como a crise econômica que se iniciou nos Estados Unidos a partir de 1893, contribuíram para o processo de imigração. A cafeicultura encontrou uma situação especial de ampliação das terras disponíveis para o cultivo, decorrente da importante expansão da malha ferroviária no espaço paulista. Esses fatores conjugados (espaço e mão-de- obra) permitiram um relevante aumento da capacidade produtiva do café. A grande entrada de mão-de-obra imigrante garantiu a manutenção de taxas salariais em um nível bastante reduzido. Como mão-de-obra é um dos principais determinantes do preço de um produto, foi possível haver aumento da produção sem aumento associado dos custos médios. Dessa forma, a cafeicultura experimentou grande aumento na acumulação de capital, persistindo, em consequência, o aumento sistemático da população. 1889/1898: Desvalorização cambial e sustentação da renda da cafeicultura No final da década de 80 do século XIX, os preços internacionais do café seguiram uma trajetória sistemática de alta, ampliando as margens de lucro do setor. Isso era resultado do crescimento as demanda norte-americana, responsável por cerca de 60% das compras de café no mercado internacional e pela quebra da safra brasileira em 1887/88 e 1889/90, o que reduziu significativamente a oferta. É importante salientar que a produção brasileira representava, naquele momento, algo em torno de ¾ da oferta total de exportações do café no mundo. Informações Adicionais: Taxa de Câmbio e Mercado Cambial Antes de entender o que significam estes dois conceitos, você precisa ter em mente que as transações financeiras e comerciais entre países diferentes sempre acontecem usando uma moeda como referência. Nos dias de hoje, o dólar é esta moeda, por ser o dinheiro do país economicamente mais forte do mundo, os EUA. Na época da Primeira 20 República, as negociações aconteciam em libras, pois estas eram (e ainda são) a moeda da Inglaterra. Taxa de Câmbio é o valor da moeda nacional em relação a uma moeda estrangeira (quantos reais custam um dólar, por exemplo). Ela é determinada, fundamentalmente pelas transações de compra e venda de moeda estrangeira, que acontecem em um “ambiente virtual”, o mercado de câmbio. Os agentes envolvidos neste mercado são, em geral, demandantes e ofertantes de moeda estrangeira. As fontes de demanda por moeda estrangeira são: Gastos com importações de bens e serviços; Pagamentosde dívidas contraídas anteriormente com outros países; Remessas de lucros para matriz de empresa multinacional; Aplicações financeiras no exterior. A oferta de moeda estrangeira caracteriza-se por: Receitas de exportação de bens e serviços; Dívidas contraídas; Rendas recebidas; Aplicações financeiras de estrangeiros no Brasil. O Banco Central é o gestor da política cambial, pois aumenta ou diminui a oferta de moeda estrangeira, podendo controlar, por esse mecanismo de oferta e procura as taxas de câmbio. Suas principais atribuições no mercado de câmbio são: A regulamentação do mercado cambial; A aplicação de medidas relativas ao regime cambial (fixo ou flutuante) definidas pela política governamental. Uma desvalorização da taxa de câmbio representa o aumento do preço da moeda estrangeira, encarecendo os produtos importados e aumentando as receitas de exportações em moeda nacional. O principal instrumento de análise dos efeitos das operações no mercado cambial para o país é o Balanço de Pagamentos. É uma razão entre as operações de bens e serviços (transações correntes) e as de natureza financeira (conta de capital e conta financeira). A partir de 1891, no entanto, o contínuo avanço da produção entrou em descompasso com o crescimento do mercado externo, principalmente após o 21 início da prolongada crise econômica que passou a assolar a economia norte- americana em 1893. Nosso país produzia mais café (aumentava a oferta) e não havia resposta da economia mundial na mesma medida. Houve uma queda sensível do preço internacional do café, revertendo a tendência de alta dos preços até então registrada, determinando uma redução da receita das exportações, que era nosso principal produto de exportação desde a metade do século XIX. Em decorrência da queda de preços do café, o Balanço de Pagamentos sofreu um impacto importante, promovendo mudanças na condução da política econômica do Brasil. Esse movimento provocou o início de um ciclo de desvalorização da taxa de câmbio que marcou de maneira expressiva os primeiros anos da República Velha. O círculo vicioso da desvalorização cambial e suas principais conseqüências A desvalorização cambial era uma realidade decorrente de dois fatores: 1. Redução da entrada de moeda estrangeira no país, devido à queda do preço internacional do café; 2. Pressão política exercida pelos cafeicultores, visando preservar seus ganhos em moeda nacional; O uso do imigrante substituindo o trabalho escravo estava cristalizado apenas na produção de café, de maneira que as demais atividades produtivas necessitavam de recursos para sua recuperação. Nessa direção, foi implementada uma política de emissão monetária na gestão de Rui Barbosa como ministro da Fazenda do governo provisório de Deodoro da Fonseca que ficou conhecida como Encilhamento11. Essa política, entretanto, causou uma profunda desordem financeira na economia brasileira. O encilhamento teve efeitos diretos sobre a taxa de câmbio e contribuiu fortemente para uma desvalorização cambial mais intensa. Este processo, todavia, determinava a formação de um círculo vicioso, na medida em que, apesar da queda do preço internacional do café, a sustentação das receitas em mil-réis para os produtores e exportadores de café os estimulava a aumentar ainda mais a produção. 11 Encilhamento – política financeira de estímulo à indústria, adotada por Rui Barbosa. Baseava-se no incremento do meio circulante com a criação de bancos emissores. 22 Processo de manutenção das receitas dos produtores e exportadores de café A depreciação do câmbio invertia a trajetória dos preços internacionais quando convertidos para os preços em mil-réis: enquanto os preços internacionais do café caíam expressivamente, os cafeicultores recebiam mais, em mil-réis, pela venda do produto. A longo prazo, manter essas condições mostrava-se inviável. A desvalorização cambial determinava uma elevação dos preços dos produtos importados – base da cesta de consumo brasileira, uma vez que pouco era produzido para o mercado interno. Assim, a subsistência tornava-se mais cara em moeda nacional, forçando o aumento dos salários, base dos custos de produção da cultura cafeeira. Seguindo esta tendência, o aumento dos custos seria responsável pela redução da margem de lucro da cafeicultura, reduzindo seu espaço para acumulação de capital em longo prazo. As conseqüências da desvalorização cambial em longo prazo. Aumento da produção brasileira de café. Elevação da oferta internacional do café. Redução do preço internacional do café. Queda da receita de exportações do café. Redução da oferta de moeda estrangeira no Brasil. Desvalorização cambial Aumento dos preços internos e da receita em moeda nacional. Queda dos preços do café em moeda estrangeira. Desvalorização cambial – aumento do preço do café em moeda nacional. Perda do poder de compra de produtos importados com moeda nacional, Necessidade de aumento dos salários. Aumento nos custos da produção do café. Redução dos lucros dos cafeicultores. 23 De maneira mais dramática em curto e médio prazo, a desvalorização cambial afetava também as finanças públicas. A redução nas importações diminuía sistematicamente a receita do governo, que tinha nas arrecadações de impostos sobre os produtos importados sua maior fonte. O fim da tarifa-ouro12 aplicada sobre as importações em 1891 agravava esse quadro, corroendo a capacidade da arrecadação do Estado. Ao mesmo tempo, a maior fonte de financiamento público era o endividamento externo, cujo pagamento é efetivado em moeda estrangeira – a desvalorização cambial implicava, portanto, aumento das necessidades de gasto do governo. Quanto menor a entrada de moeda estrangeira no país, maior o risco de não pagar as dívidas e, obviamente, menor a oferta de novos empréstimos. O governo Campos Sales (1898-1902) e o “Saneamento Monetário” de Joaquim Murtinho Quando a República foi proclamada, instaurou-se um governo provisório, comandado pelo marechal Deodoro da Fonseca. Deodoro se manteve no poder até novembro de 1891, quando tentou dar um golpe de Estado e dissolver o Congresso. A campanha legalista de Floriano Peixoto, outro militar, derrotou as pretensões de Deodoro colocando Floriano Peixoto no poder, o que prolongou até 1894 a República da Espada. Prudente de Moraes deu início ao período que ficou conhecido como República Café-com-Leite e consolida a presença dos civis no governo do país. Foi substituído, ao final de seu mandato, por Campos Sales, também representante da oligarquia cafeeira paulista. Apoiada em um discurso de base liberal, que valorizava o papel do mercado e os efeitos negativos da intervenção governamental, a política econômica do grupo Campos Sales citava a ineficiência produtiva no Brasil (tanto no campo quanto na indústria nascente) como justificativo para uma mudança radical nos rumos do país. O principal mentor desse governo era o ministro da Fazenda, Joaquim Murtinho. Na verdade, a meta primordial do presidente era a obtenção de novos recursos externos para resolver o problema da solvência das finanças públicas. Logo ao tomar posse, o novo presidente foi à Europa em busca desses recursos. Campos Sales assinou o II Funding Loan13, negociando uma consolidação da dívida externa brasileira com novas condições (mais favoráveis) de pagamento. Em contrapartida, firmou uma série de compromissos para a condução da política econômica do país. 12 Tarifa-ouro: Imposto cobrado pelo governo em ouro, evitava que o governo perdesse dinheiro natroca de moeda, aumentando as reservas do Estado. 13 Funding Loan: Moratória concedida pelos credores a um Estado devedor. Em troca, são emitidos novos títulos correspondentes aos encargos da dívida e das operações com excedentes comerciais. 24 O objetivo principal da nova política econômica era bastante claro: definir uma trajetória de saneamento monetário capaz de impor uma inversão dos movimentos da taxa cambial, permitindo a valorização da moeda nacional. Por trás disso estava o firme propósito de garantir condições para o pagamento da dívida externa consolidada no início do governo. Para isso, o governo empreendeu esforços significativos buscando a redução do déficit e a retirada de circulação de moeda no valor equivalente à dívida a ser paga (de acordo com a taxa cambial definida na época). Havia ainda a necessidade de depositar esse montante em bancos estrangeiros predeterminados no acordo firmado com os credores. Do ponto de vista fiscal, foi novamente aplicado a tarifa-ouro para as compras de importados, o que garantia para o governo uma receita em moeda estrangeira. Essa tarifa sofreu aumentos importantes a partir de 1990. Os efeitos dessa política foram bastante sentidos pela população, com destaque para uma pesada diminuição do nível de atividade econômica decorrente de uma forte retração da oferta de moeda e crédito e da Deflação 14associada a essa retração (cerca de 30%). Em consequência, o câmbio foi efetivamente valorizado e mantido sob controle durante a vigência dessas medidas de política econômica. Em contrapartida, a economia brasileira acabou sofrendo os efeitos dessa política com o Pânico Bancário do Rio de Janeiro em 1900 ( dada a retração da oferta de moeda) e uma importante recessão – afetando os negócios em geral e, particularmente, os cafeicultores, que pressionavam para uma mudança nos rumos da política adotada. Informações Adicionais: Pânico Bancário no Rio de Janeiro e 1900 Quando o Brasil assinou o Funding Loan, houve a retirada de muito papel- moeda de circulação. Isto aconteceu devido às condições do contrato assinado, que solicitava que parte da dívida fosse depositada em bancos internacionais como garantia. A retirada de dinheiro de circulação causou uma enorme crise econômica. Diante da impossibilidade de uma nova política de emissão (considerando a perturbação econômica gerada pelo Encilhamento), o governo resolveu utilizar o dinheiro do principal banco brasileiro dessa época, O Banco Republicano Brasileiro (BRB), este fato gerou muita preocupação na sociedade. 14 Deflação: queda do índice geral de preços de um país, geralmente associada a uma retração do nível de atividade econômica. 25 O BRB foi liquidado e reestruturado, agora sob controle do governo, que se responsabilizou pelas dívidas e gerou títulos que poderiam ser resgatados mo futuro. Isso, de certa forma, apaziguou a eminente crise da sociedade. A nova forma de valorização do café – o convênio de Taubaté Nesse período, em contrapartida, cresciam as demandas, sobretudo dos cafeicultores, para um direcionamento mais flexível que permitisse a retomada do crescimento econômico. De certa forma, o aumento da população urbana e a necessidade de investimentos em infra-estrutura – principalmente nas áreas de saneamento, urbanização, portos e estradas de ferro – garantiram uma importante retomada do nível de atividade da economia brasileira. A estabilidade monetária e a constante pressão para valorização cambial deixavam insatisfeitos os cafeicultores, que viam suas receitas recorrentemente reduzidas ou ameaçadas. A situação agravava-se toda vez que havia uma previsão de safra excedente na produção de café, Havia, portanto, a ameaça de mais uma crise de superprodução. Exercendo sua enorme capacidade de interferência no poder, especialmente através do governo da província de São Paulo, os cafeicultores conseguiram negociar uma vantajosa solução para o problema. Conhecida como Convênio de Taubaté, esta solução foi firmada em 1906 pelos presidentes das províncias de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, - os três maiores produtores de café -, mesmo contando com a oposição de Rodrigues Alves, o então presidente da República. O Convênio estabeleceu que: a) Haveria a compra de excedentes de produção pelos governos estaduais envolvidos; b) A compra seria viabilizada por meio de um financiamento de 15 milhões de libras esterlinas; c) O gasto com a compra do excedente de café seria coberto pela criação de um imposto em ouro aplicado a cada saca exportada de café; d) Um fundo seria criado para estabilizar a taxa de câmbio, impedindo sua constante valorização – que funcionaria na forma de uma Caixa de Conversão; e) Seriam tomadas medidas para desencorajar a expansão das lavouras no longo prazo, como a definição de taxas proibitivas. Essas medidas mudariam significativamente a orientação da política econômica do país no que diz respeito às exportações de café. O Convênio de Taubaté determinou, nesse sentido, a institucionalização da prática de controle de estoques para regular o preço internacional. Artifício permitido pela enorme parcela do mercado internacional ocupada pela produção brasileira. 26 Todavia, apesar do sucesso alcançado na estabilização dos preços internacionais, a prática acabou induzindo uma forte concentração na atividade cafeeira. Os maiores lucros acabaram direcionados para os operadores do mercado financeiro, com destaque para os banqueiros internacionais e as casas comissárias, que compravam o produto na baixa e vendiam na alta. Os banqueiros internacionais, inclusive, passaram a dominar o comércio do café, credenciados pela dívida externa crescente, e adquiriram grandes fazendas dos produtores nacionais. Além disso, a manutenção de altos preços e da receita de exportação inviabilizava qualquer tentativa de desestimular o crescimento das lavouras, tornando o problema insolúvel no longo prazo. Aula 7: Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil O Brasil faz parte do grupo das 15 maiores economias mundiais, além de já ter representado, na década de 1980, o oitavo maior Produto Interno Bruto (PIB)15 do mundo. Apesar dos resultados tão animadores, é um dos campeões de desigualdade econômica. Os desequilíbrios regionais são uma marca da economia brasileira O desequilíbrio econômico entre as regiões distingue os países mais desenvolvidos dos menos desenvolvidos. Canadá e Estados Unidos, por exemplo, são países onde há pouca discrepância em relação ao desenvolvimento entre os estados e menos desequilíbrios internos. Em nenhum deles, entretanto, um estado tem peso econômico expressivamente superior aos demais, como acontece no Brasil, onde São Paulo participa com um terço do PIB brasileiro. A maneira como a população esta distribuída no território também é um indicador dos desequilíbrios regionais do país. Outro indicador dos desequilíbrios regionais é a distribuição do PIB por regiões. Os desequilíbrios regionais sempre fizeram parte de nossa realidade. Em nosso país, até meados do século XIX, as regiões eram caracterizadas como ilhotas regionais, sem guardar relações econômicas entre si. De 1850 a 1930, a expansão cafeeira e a industrialização romperam este isolamento regional, fazendo surgir uma economia centrada em São Paulo. Isso tornou as demais regiões dependentes do dinamismo paulista. Nordeste: do auge açucareiro à estagnação 15 Produto Interno Bruto: Valor agregado de todos os bens e serviços finais produzidos dentro de um país. É uma medida da riqueza do país em um período de tempo determinado. 27 O Nordeste atravessou um processo secular de estagnação, tornando-se umaárea de emigração. No entanto, foi nessa região que se desenvolveu a primeira atividade econômica importante do país: a agroexportação canavieira. Além da cana-de-açúcar, foram importantes a pecuária e a cultura do algodão, cotonicultura. Nenhuma dessas, todavia, trouxe as condições para a superação da crise. O engenho de açúcar, unidade de produção típica, apresentava grau de auto-subsistência, o que implicava baixa circulação interna de dinheiro, tornando a economia local pouco afetada pelas oscilações observadas na renda das exportações da cana-de-açúcar. No entanto, a partir de meados do século XVII, a rena das exportações caiu devido ao declínio dos preços internacionais do açúcar, e a agroexportação mergulhou em uma crise que impediu o seu processo de desenvolvimento. Segundo Celso Furtado (1971), as necessidades de abastecimento interno no âmbito da economia canavieira referiam-se apenas as fontes de energia: madeira para lenha e animais como meio de transporte. A ocupação extensiva da cana diminuía a disponibilidade desses recursos nos engenhos, levando os grandes proprietários a comprá-los dos pequenos produtores locais. A pecuária e a cultura do algodão (cotonicultura) foram importantes instrumentos de ocupação do interior nordestino. Entretanto, ao se manterem como atividades de baixa produtividade, não contribuíram para a formação de um mercado interno que sustentasse o desenvolvimento industrial da região. Pecuária Em função das relações mercantis, inicialmente no Nordeste, desenvolveu- se uma atividade pecuária, que foi a projeção da economia canavieira. A pecuária foi, portanto, mais importante como atividade de ocupação do território do que por sua contribuição à economia colonial. Por meio dela, foi possível ocupar o interior do país. Esta atividade serviu também como “amortecedor” das crises da cana-de-açúcar, ao abrigar trabalhadores que se tornaram desnecessários para a economia canavieira, durante a crise. Outra vantagem da pecuária em relação às demais atividades voltadas para o mercado externo era não demandar investimento inicial elevado. Tampouco eram necessários gastos operacionais, tratando-se, assim, de uma atividade muito resistente às crises. Como atividade canavieira, a pecuária teve um papel fundamental para a formação do que Furtado chamou “reservatório de mão-de-obra”. Isso explica por que, mesmo com a economia nordestina estagnada, a região participava com 40% da população brasileira ainda em 1900, tendo se tornado a maior região de emigração ao longo do século XX. 28 Algodão: uma alternativa para a cana-de-açúcar Outra importante cultura nordestina foi a do algodão, considerada como uma alternativa à crise da economia canavieira no século XVIII, dada a identificação da Revolução Industrial com a indústria têxtil. Importante matéria-prima industrial, o algodão nordestino somente conheceu desenvolvimento nos momentos em que os produtores tradicionais experimentaram crises, como na Guerra Civil norte-americana. Terminado o conflito, as exportações de algodão caíram. No entanto, essa cultura proporcionou o aparecimento de atividades industriais têxteis no início do século XX, sendo abortada na crise de 1929. Passada a crise, a cotonicultura paulista, tecnologicamente mais moderna, limitou o crescimento dessa atividade e, consequentemente, seu dinamismo como fonte de renda da economia nordestina. A região das Minas: a ilusão do ouro Outra região brasileira em que se sentiram intensamente os efeitos da atividade econômica realizada pela colônia foi a região das minas, localizada principalmente no Estado de Minas Gerais, no Sudeste. No século XVIII, a descoberta de ouro na região gerou um grande movimento migratório para o interior, inclusive de portugueses. Por tratar-se de uma atividade que não dependia da propriedade de terras, o garimpo atraiu todo tipo de trabalhadores, até mesmo os ex-escravos que conseguiram comprar sua liberdade. Diferente da fazenda de açúcar, onde havia produção de subsistência, a atividade garimpeira era totalmente voltada para a produção mercantil. Devido a inexistência de agricultura nas áreas de garimpo, o abastecimento da população garimpeira gerou um comércio de longa distância, incluindo desde os produtores primários do Sul do país até os criadores do Nordeste. Outra característica que distinguia a mineração da cultura canavieira era a concentração da população em cidades, necessitando de abastecimento alimentar, o que impulsionou a economia do interior da Colônia. O isolamento geográfico, conjugado ao curto período do chamado “ciclo do ouro”, fez com que as atividades manufatureiras voltadas para o mercado interno não se mostrassem sustentáveis. O Sul: Latifúndio e Indústria Regional A ocupação do que é atualmente o Rio Grande do Sul foi movida pela colonização de povoamento, com o imigrante europeu estabelecendo-se como pequeno proprietário, não estando aí presente o trabalhador escravo. A principal atividade econômica era a pecuária além da produção agrícola, voltadas para o mercado interno. 29 No rio Grande do Sul, o território foi dividido segundo a utilização em distintas atividades. Ao sul, predominava a pecuária, baseada no latifúndio e empregando pequeno número de trabalhadores. Ao norte, predominava a agricultura, com base no trabalho extensivo que a imigração européia propiciou. Diferentemente das economias cafeeira e mineira, a economia do extremo sul encontrou, no mercado interno, sua estratégia de desenvolvimento. Inseriu-se na economia brasileira pela oferta de alimentos, tornando-se o primeiro celeiro do país (grande produtor de alimentos). Amazônia: O “ciclo” da borracha É sempre bom lembrar que falar de ciclos na economia colonial não significa que, ao final do período de predomínio daquele produto, há um retrocesso às condições econômicas anteriores. A experiência dessas atividades quase sempre tem impacto favorável na economia local. Houve, entretanto, um caso de regressão à situação vigente antes do início do ciclo: a do Amazonas, após o ciclo da borracha. De 1870 a 1920, as exportações de látex da Amazônia atingiram tamanha proporção que a região conheceu a prosperidade de que é testemunha o Teatro Amazonas, de Manaus. Em alguns momentos, o valor das exportações de látex atingiu aproximadamente 75% do valor das exportações de café. A atividade extrativista atraiu grande contingente migratório, em grande parte proveniente do Nordeste, onde a estagnação econômica associada às periódicas secas expulsava trabalhadores, que se submetiam a relações de trabalho caracterizadas por grande vulnerabilidade. A economia da borracha era uma atividade nômade, que pouco fixava o trabalhador à terra. Pelo seu caráter extrativista, o trabalhador era contratado sob esquema do avivamento, recebendo em espécie, com pequena parcela em dinheiro, e levado a adentrar o território em busca de novas seringueiras. Tratava-se assim, de uma economia em que havia pouca circulação de dinheiro, não favorecendo o surgimento das cidades – com exceção daquelas portuárias, para onde a borracha era transportada, com fins de exportação. O desenvolvimento de uma agricultura mercantil não era estimulado. Outro fator que limitou o impacto do ciclo econômico da borracha foi o fato de que sua infra-estrutura de transportes era constituída por rios e canais fluviais, abundantes na Região Norte. Não houve, portanto, investimentos em malha ferroviária, ao contrário do ocorrido na região cafeeira. A conjunção desses fatores – atividade extrativista, relações de trabalho baseadas no aviamento e inexistência de investimento no sistema de transporte – não permitiu que a crise do ciclo da borracha pudesse ser 30 superada com o desenvolvimento de outra atividade de maior dinamismo,como aconteceu com a indústria, na região do café. São Paulo: do café à industrialização A cultura do café transformou a economia paulista, proporcionando-lhe as bases para que sua crise fosse superada pela transferência de recursos para a atividade industrial. São Paulo foi a única região em que uma atividade agroexportadora teve sua crise superada pelo surgimento de uma atividade mais dinâmica: a indústria. Esta, por sua vez, transformou São Paulo na “locomotiva” do PIB brasileiro, atingindo um percentual equivalente a 39,4%, em 1970. Tamanha polarização econômica transformou a capital estadual – que, no século XIX, não passava de uma pequena cidade, se comparada com as maiores cidades brasileiras da época – na maior metrópole sul-americana. A partir de 1880, São Paulo tornou-se o maior produtor do país. Esse desempenho está associado a quatro fatores principais: Técnicas de produção que sustentavam a fertilidade do solo por mais tempo do que no cultivo da província fluminense; Disponibilidade de terras; Implantação da malha ferroviária; Mão-de-obra livre. Por ser uma cultura que se instalara inicialmente em terras fluminenses, a economia cafeeira na nova área de expansão da produção pôde ultrapassar o conhecimento técnico acumulado e desfrutar de maior produtividade e, portanto, de maior lucratividade. A oferta de terras ampliou-se com a expansão da malha ferroviária, permitindo o aproveitamento de território mais distante do litoral. Além de proporcionar essa maior disponibilidade de recursos naturais e deslocamento a custos decrescentes, a expansão ferroviária transformou-se em infra-estrutura de apoio à atividade industrial que ia se instalando, sucedendo a cultura do café. Finalmente, o fator mais importante a favor da cultura cafeeira paulista, em relação à fluminense, estava nas relações de trabalho, livre no oeste paulista e escravo no Estado do Rio de Janeiro. A proibição do tráfico negreiro, em 1850, elevou os preços dos escravos, o que estimulou a emigração de trabalhadores europeus, interessados em se tornar pequenos proprietários. A necessidade de poupar fez do emigrante um trabalhador muito mais produtivo do que o escravo. Além disso, o trabalhador livre era consumidor. E o escravo não era, o que impactava significativamente a formação do mercado consumidor, necessário para estimular o surgimento de indústrias. 31 A cultura do café e o surgimento de cidade Por ser uma atividade muito dependente de mão-de-obra, houve estímulo ao surgimento de muitas cidades: ao deslocar-se o plantio de novos cafezais, a terra era reconvertida para outros usos agrícolas, intensificando uma agricultura mercantil iniciada pelos trabalhadores em regime de colonato. Ao receber permissão para cultivar alimentos paralelamente ao café, os trabalhadores produziram uma agricultura mercantil que permitiu o abastecimento das cidades, contribuindo para sua consolidação, e conseqüente não-reversão, como no caso da Amazônia. Quando a economia cafeeira passou a enfrentar crises de superprodução, a partir de 1894, a reação foi o estabelecimento de política de sustentação da renda dos cafeicultores, inicialmente através das desvalorizações cambiais, que permitiam a manutenção da receita das exportações, sustentando-lhe a lucratividade ao mesmo tempo em que encarecia as importações. Isso criava estímulo à industrialização substitutiva de importações. A partir de 1906, a política de sustentação da renda da cafeicultura passou a ter como base a compra dos excedentes de produção, o que continuava a assegurar a renda do negócio e, portanto, o nível de emprego nessa atividade. A manutenção do nível de emprego e o encarecimento das importações levaram à migração dos lucros da atividade cafeeira para financiar os empreendimentos industriais. Portanto, a expansão cafeeira para o oeste paulista criou as bases para a emergência da indústria. A superação da crise cafeeira pela indústria – uma atividade mais dinâmica, geradora de maior produtividade – transformou não só a economia paulista, mas a do país. As indústrias das demais economias regionais tornaram-se zonas de complementação da indústria paulista, especializando-se em fornecer insumos a serem processados por ela.
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