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Fichamento - O sistema saussureano

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
DISCIPLINA: PROCESSOS PSICOLÓGICOS III
PROFESSOR: CARLOS ALBERTO BRITO
ALUNA: PASTÊNOPE MAÍRA CAMPOS
FICHAMENTO 
BARROS, Isabela Barbosa do Rêgo. O SISTEMA SAUSSUREANO: discussões em torno dos eixos linguísticos no autismo. In: AZEVEDO, Nadia Pereira da Silva Gonçalves de (org.). LINGUAGEM: entre o sistema, o texto e o discurso. Curitiba: Editora Crv, 2015. Cap. 1. p. 11-19.
Saussure, através do Curso de Linguística Geral, criou a Semiologia, a qual possibilitou a análise dos sistemas de convenções que dão significado ao comportamento humano. Qualquer forma de comunicação utilizada pelo homem (gestos, ruídos) é feita através de combinações de signos que exprimem significados. Dessa forma, para que seja possível entender esses significados, a Semiologia parte da hipótese de que há um sistema de convenções subjacente. Nesse sentido, a linguagem, por ser composta por um sistema de signos que produzem significados também seria objeto da Semiologia.
Contudo, Saussure dedicou-se ao estudo da língua, como uma das formas de manifestação da linguagem, atribuindo à Linguística o papel de estudar de esgotá-la e “definir o que faz da língua um sistema especial”. Saussure define a língua como de natureza concreta, homogênea e arbitrária, pois acredita na impossibilidade dos signos terem um significado intrínseco, ou seja, o significado de um signo não está atrelado à sua essência, mas à relação e valor que estabelece com outros signos. Dessa forma, a língua por ser o principal sistema de signos, cujos significados é resultado das convenções sociais, serve de parâmetro para outras formas de manifestação da linguagem.
“embora a língua exista na consciência de cada indivíduo, ela constitui um sistema supra individual, na medida em que não é definida por ele, mas pelo grupo a que o indivíduo pertence”.
A língua, como sistema de signos convencional, possui uma ordem interna própria, onde o valor do signo depende das relações de identidade e diferença que estabelece com outros signos. Assim, o valor de um termo (signo) se dá nas relações em que os signos podem (ou não) ser substituídos numa sentença (relação associativa ou paradigmática) ou nas relações com os termos (signos) que os sucedem ou antecedem (relação sintagmática).
“As relações sintagmáticas definem as possibilidades combinatórias: as relações entre elementos que se poderiam combinar numa sequência. As relações paradigmáticas são as oposições ente elementos que se podem substituir uns aos outros”
O eixo sintagmático corresponde à fala, à possibilidade que o indivíduo tem de fazer as combinações entre os termos que se antecedem e sucedem de maneira linear. Enquanto o eixo paradigmático corresponde às relações que o falante faz entre os elementos linguísticos (signo) para além da fala, ou seja, não é preciso a presença concreta de termos para que haja associação entre eles.
Ao tomar como plano de fundo o sistema linguístico composto por dois eixos, é possível entender a dificuldade de linguagem do autista. Segundo Rêgo Barros, a dificuldade da linguagem do autista é caracterizada pela reprodução do discurso ouvido de outra pessoa (ecolalia) e a pela dificuldade em fazer combinações com os elementos linguísticos e expandir sua fala, e está relacionada à rigidez no eixo sintagmático. Na ecolalia, portanto, há uma combinação de elementos linguísticos que se sucedem no eixo sintagmático, mas não há avanço no eixo paradigmático. Ou seja, o autista consegue “formular” sentenças, pois há a necessidade apenas de seguir uma ordem de aparição, mas não consegue fazer substituições aos elementos dessas sentenças, pois as associações (que ocorrem na mente no sujeito) são imprevisíveis e de múltiplas possibilidades de arranjos, o que geram um desconforto ao não poder antecipar as reações dos sujeitos da linguagem.
Para Rêgo Barros, o fato de o autista não conseguir lidar com a imprevisibilidade dos arranjos linguísticos pode ser comparada com a resistência que tem às mudanças de rotina e de ambiente, pois em ambas situações o autista não tem controle sobre o que pode acontecer. No eixo paradigmático não é possível prever e controlar as associações mnemônicas entre os sujeitos da linguagem. Dessa forma, para o autista se sentir confortável na fala e reforçar o seu lugar de isolamento frente ao mundo exterior, é necessário que tenha presenciado ou dito por outra pessoa, pois essa é a única forma de associação linguística possível, por isso se detém ao eixo sintagmático.
As relações sintagmáticas e paradigmáticas são essenciais para a língua, por isso também está presente no autismo, mas de forma distorcida devido à ação do sujeito. Embora o uso da linguagem do autista pareça descontextualizado, ele se apropria e utiliza a língua de uma forma especial. Nesse sentido, a autora acredita que, no autismo, “o sujeito seleciona as unidades que farão parte do seu estado e língua no universo inconsciente ou consciente de outrem, para em seguida usá-las igualmente ou parcialmente em contextos distintos”.
Por outro lado, Rêgo Barros considera o neologismo usado pelo autista em algumas situações, como uma forma de escape à resistência no eixo sintagmático, haja vista a existência de associações individuais de signos linguísticos. Contudo, ressalta que os neologismos do autista, apesar de representar uma forma de liberdade nas associações dos termos linguísticos, provoca a incompreensão da sua fala e a possibilidade de não reconhecimento dos fonemas utilizados, devido à criação de infinitos arranjos cada vez mais particulares. 
Nesse sentido, afirma que “ao sair de uma rigidez no eixo sintagmático e encontrar o universo do eixo paradigmático, parece que o autista não tem controle para limitar suas associações, resultando na criação dos neologismos”. No autismo, portanto, há um desequilíbrio no sistema linguístico que colocam o sujeito em posições extremas, preso ao eixo sintagmático (ecolalia) ou solto no eixo paradigmático (neologismos e vocalizações). 
O sistema saussureano implicado em dois eixos favorece uma análise da linguagem do autista, não como um problema de comunicação, mas como uma dificuldade na comunicação devido a uma maneira bem particular de se relacionar com a língua e com a linguagem.

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