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Papel e lugar da Linguagem na Constituição do sujeito a partir das contribuições de Freud e Lacan

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
DISCIPLINA: PROCESSOS PSICOLÓGICOS III
PROFESSOR: CARLOS ALBERTO BRITO
ALUNAS: MARIA CAROLINA RODRIGUES e PASTÊNOPE MAÍRA CAMPOS
PAPEL E LUGAR DA LINGUAGEM NA CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO A PARTIR DAS CONTRIBUIÇÕES DE FREUD E LACAN
 “Não imaginam que as pulsões são, no corpo, o eco do fato de que há um dizer” Jacques Lacan
Quando Freud publica A Interpretação dos Sonhos em 1900, ele inaugura a Psicanálise “com o propósito de desrecalcamento da que advirá pela fala”[footnoteRef:1], a qual é regida segundo os fundamentos da linguagem, ou seja, através de condensação (metáfora) e deslocamento (metonímia), tal qual os sonhos. Mais à frente Lacan se apoiaria no estudo das pulsões, a associação livre de Freud e ainda pela linguística de Saussure para ir além. [1: LONGO, Leila. Linguagem e psicanálise. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Ed. 2006. p 20.] 
Lacan entende que o inconsciente é estruturado como linguagem, e, portanto, está submetido às mesmas leis da linguagem, como uma cadeia de significantes em constante movimento, produzindo efeitos de linguagem: um significante sempre remete a outro significante na direção de um sentido (para constituir significados). Portanto, a linguagem se apresenta como “condição de possibilidade do próprio inconsciente, pois não é possível concebê-lo independente da linguagem, o meio em que se manifesta[footnoteRef:2]. Para entender o acesso ordem simbólica na constituição do sujeito, ou seja, o ingresso do sujeito na linguagem Lacan retorna a Freud, numa reelaboração da teoria freudiana, tomando como ponto de partida a criança e o processo de constituição do sujeito. [2: SOUZA, Elizandra. A linguagem e seus efeitos na constituição do sujeito.] 
O sujeito se constitui através das suas relações com o mundo e com o outro. Desde o nascimento, é a partir da relação com o seu cuidador que a criança apreende seus elementos constitutivos. Primeiramente, a criança tem um contato especular com a mãe, ou seja, ela não ver a diferença entre ela e a mãe, uma é parte da outra, uma simbiose. E assim sendo, a criança depende totalmente da mãe, que abrange integralmente os cuidados dessa criança (fisiológicos e afetivos). É através também dessa mãe que a criança é imersa num mundo social, onde a atividade humana é mediada pela linguagem, pelo prolongamento do corpo materno. Sendo essa criança fruto do desejo, ou seja, objeto do desejo da mãe, sobretudo da mãe para que possa existir. O desejo é sempre inconsciente.
“...a criança não tem relação simplesmente com um objeto que a satisfaz ou não a satisfaz, mas graças ao mínimo de espessura de irrealidade dado pela primeira simbolização, já existe um referenciamento triangular da criança, uma relação não com aquilo que traz satisfação para a sua necessidade, mas uma relação com o desejo do sujeito materno que ela tem diante de si.” (Lacan, 1999, p.232). 
No entanto, para que a criança se torne sujeito, é preciso que ocorra a separação (a quebra da relação simbiótica) a partir da entrada de um terceiro na relação, muitas vezes figurado pelo pai, o qual, exercendo a função paterna, faz como que a criança deixe de ser o objeto integral do desejo da mãe. Com a entrada do pai na relação, a mãe se separa, dando a criança a possibilidade de perceber que ela não é a extensão do corpo materno e sendo inscrita na linguagem. Nesse processo de separação, a castração, o complexo de Édipo, ideal de eu, nome do pai, são movimento que se complementam e permitem que a criança se insira na dimensão simbólica - Linguagem - e, portanto, são essenciais para a construção do sujeito. Só haverá sujeito social a partir da conquista da dimensão simbólica da linguagem, isto é, se houver internalização de regras, valores, normas - Lei. É a Lei, representada pelo pai, que possibilita que o sujeito adquira a capacidade de abstração: como a castração não acontece de fato, o sujeito é inserido no simbólico para poder entender o mundo, os outros sujeitos e a si mesmo de forma abstrata.
 Outro ponto importante para psicanálise na constituição do sujeito, é a identificação, fundamental para o surgimento da subjetividade, que se coloca entre o individual e o social, como um elo entre o “eu” e o “outro”. Por isso, em determinados momentos não sabemos o que é nosso ou o que é do outro e o que há do outro em nós. São movimentos sofisticados, sutis, que ocorrem sem que nos demos conta, tanto que são apreendidos inconscientemente.
“o inconsciente é pura alteridade que se produz incessantemente, por isso mesmo não podemos conhecê-lo toda. o inconsciente vai determinar a postura de cada sujeito ao momento em que ele se abre e se temporaliza no mundo” (LONGO, 2006, p.55)
É pelo inconsciente que assimilamos as informações do mundo e respondemos da forma como acreditamos que deve ser (imaginário). O sujeito da psicanálise é constituído pelo olhar do outro e do Outro, ou seja, ao nascer o indivíduo nada tem a dizer, o que disser virá de fora, como algo que nele se projetou, que será incorporado e vai lhe dar a consistência de uma construção simbólica. O sujeito, portanto, quando fala de si e de seu lugar, ele faz associações e interpretações de seus desejos e vontades, suas fantasias, seus enganos, seus limites, suas maldades, suas falhas. Por isso, a linguagem, se apresenta como primordial da constituição do sujeito, e não pode servir apenas como instrumento de comunicação ou transmissão de informação. A linguagem, portanto, carrega uma rede de significantes. Em outras palavras, a fundação do sujeito se dá a partir de um significante sem qualquer sentido e um significante que pretende ter sentido[footnoteRef:3]. [3: LONGO, Leila. Linguagem e Psicanálise. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed. 2006. p. 55] 
A identificação e inserção simbólica, dessa forma, estão ligadas à linguagem, pois é através dela que apreendemos o mundo como ele é. Falar de linguagem não diz respeito apenas à fala (o discurso do sujeito), mas a qualquer possibilidade de linguagem que o meio oferece. Vale ressaltar que o discurso também é constitutivo do sujeito. Pois, sendo social, o sujeito incorpora em sua linguagem os discursos a que é submetido, antes mesmo de nascer como “um empréstimo, dívida impagável, no campo do Outro”[footnoteRef:4]. Nesse sentido, Lacan afirma que a entrada do sujeito na linguagem é anterior à sua entrada na sociedade. [4: idem, p. 55] 
A linguagem, portanto, constitui o sujeito a partir de um ato externo à criança (metáfora paterna), ou seja, vem de fora, dos outros que já estão no mundo, dependendo do significante que vem do campo do Outro, o qual inscreve o sujeito na ordem simbólica. É na linguagem que sujeito encontra as significações, deslizando de significante em significante para modelar o sentido de realidade. Portanto, “é na linguagem e pela linguagem que o homem se constitui como sujeito. (...) A linguagem é a única possibilidade de subjetividade”[footnoteRef:5]. [5: idem, p. 52] 
Qualquer um é capaz de usar o imaginário para se expressar através de histórias fantástica, dos contos de fada, poesia e tudo isso usando a linguagem para atingir o outro, que por sua vez, fora capturado anteriormente por algo que o fez acessar o inconsciente. Algo quando o capturou, esgarçou, criando brechas para que o dizer deslizasse e criasse um sentido dentro da cadeia de significantes do outro, num processo de reorganização/ressignificação - através de processos metafóricos e metonímicos - mostrando, assim, os traços de formação do sujeito imerso na língua. Quando a mãe lê um conto de fada para seu filho ou quando vemos um filme, quando tentamos contar ou transcrever um sonho, por exemplo, somos levados a realizar, de maneira inconsciente, movimentos metafórico e metonímico, para criarmos um sentido para o outro. É nos sonhos, nos lapsos do discurso, nas lacunas e nas repetições e nos sintomas que vemos o que foi recalcado e que emerge na linguagem que é apreendido o desejo inconsciente e ali onde está o sentido.
O sujeito da psicanálise, o sujeito doinconsciente, é indiscutivelmente dependente da linguagem, pois é o sujeito que deseja, que pela fala e, pelo pensamento inconsciente desliza na cadeia de significante até a morte, “daí repetir-se incansavelmente já que o pensamento inconsciente é inseparável do desejo”. 
O dito esconde sempre um não dito, que revela o efeito da circularidade do sujeito incompleto. A linguagem, dessa forma, surge nas brechas deixadas nos erros, nos lapsos, no ato falho, nos chistes, utilizando aquilo que nos falta para nos impulsionar em busca da verdade. Segundo Cláudia Thereza de Lemos, o conflito entre o que pode ser dito e o dizer que irrompe no dito dá lugar a uma verdade que subtrai ao saber[footnoteRef:6]. Lacan, assim como Freud, dá atenção aos fatos do cotidiano que nos atravessam como discursos comuns, mas cheios de sentido para quem fala, sendo a possibilidade de perdição ou redenção. [6: DE LEMOS, Claudia Thereza Guimarães. Linguisteria: de Freud a Lacan] 
Como seria ouvir um conto ou lê-lo sem acessar o inconsciente? Assim como escrever sobre um sonho e não ter a ânsia de escrever o real? Para isso temos os artistas que tentam através da arte se aproximar do real, como por exemplo Frida Kahlo, Salvador Dalí, Pablo Picasso… No caso de Frida, houve a tentativa de expressar a sua dor após o acidente; Salvador Dalí poderia nos dar a impressão de estarmos em Alice no País das Maravilhas e a terra dos gigantes. Só por fazermos essas observações já acessamos o inconsciente de acordo cada uma com suas próprias experiências, podendo despertar, em cada um, memórias que pareciam esquecidas, mas que ainda são latentes e graças ou não a linguagem das artes, da música, do cinema, da poesia é trazida à tona o que nos faz únicos. 
“o reprimido é apenas uma parte do inconsciente.” FREUD (1914-1916, p.191) 
 Assim, a escrita, a fala, a arte são a marca do inconsciente pois é ele que “vocaciona o homem para o símbolo, para a metáfora e para a grande ficção que é a linguagem, que substitui a “realidade”, criando sempre outra, adiando sempre o sentido”[footnoteRef:7]. [7: LONGO, Leila. Linguagem e Psicanálise. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed. 2006. p. 60]

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