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2020 - 03 - 18 Curso de Direito Penal Brasileiro - (v. II) - Parte Especial - Ed. 2018 DECRETO-LEI 2848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940 ART. 158. Extorsão Art. 158. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa. § 1º Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) até 1/2 (metade). § 2º Aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3º do artigo anterior. § 3º Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2º e 3º, respectivamente. 1. Bem jurídico protegido e sujeitos do delito O bem jurídico protegido vem a ser o patrimônio e a liberdade individual (autodeterminação). A extorsão também é um delito complexo, porque atinge a pessoa e o patrimônio. Em consequência, a tutela penal abrange ambos os bens jurídicos violados pela ação delituosa. Protegem-se o patrimônio e a integridade física e psíquica do ser humano. De fato, a extorsão tem uma pluralidade de resultados, um dos quais é próprio da violência privada, e se concretiza no constrangimento físico (violência) ou psíquico (ameaça) da pessoa, causado pela conduta do agente; outro, como consequência posterior da conduta, é a obtenção de proveito injusto em prejuízo alheio.13 Ressalve-se apenas, em face do posicionamento adotado, que não é imprescindível a consecução do proveito, desde que provado o elemento subjetivo do injusto, critério que irá repercutir também em matéria de consumação e tentativa. Sujeito ativo do crime pode ser qualquer pessoa, dispensando-se qualidade especial (delito comum). A ação descrita no tipo pode ser praticada por uma só pessoa ou por várias, em concurso. O sujeito passivo é a pessoa constrangida a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, ou, ainda, a tolerar que se faça algo, proporcionando ao autor uma vantagem ilícita. Mais uma vez, por ser delito complexo, a pessoa que sofre a violência ou a ameaça pode ser distinta daquela que é constrangida a agir ou a não agir. É o caso de alguém que ameaça um filho, a fim de obrigar o pai à prestação da qual resultará prejuízo para terceiro. Aqui, tem-se pluralidade de vítimas, não podendo ser excluída nenhuma delas. A pessoa jurídica pode ser sujeito passivo de extorsão, ao considerar-se que os sócios podem ser constrangidos a praticar algum ato em seu nome, acarretando prejuízo patrimonial, que, por sua vez, converte-se em vantagem econômica indevida para o sujeito ativo. 2. Tipicidade objetiva e subjetiva A conduta típica do artigo 158, caput, consiste em constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa, a fim de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica (tipo autônomo/simples/anormal/incongruente). O verbo constranger deve ser entendido como coação, obrigação determinada pelo sujeito ativo, mediante violência ou grave ameaça.14 Decorrem daí os seguintes requisitos da extorsão: a) constrangimento do sujeito passivo, mediante emprego de violência ou grave ameaça, para que faça, deixe de fazer, ou tolere que se faça alguma coisa; b) finalidade de obter (para si ou para outrem) indevida vantagem econômica. O objeto material imediato do delito é a pessoa, porque sobre si recaem a violência ou a grave ameaça, e, mediato, a vantagem indevida, mesmo porque, se a vantagem é devida, não tem lugar o delito de extorsão. Com efeito, o elemento normativo obtenção de indevida vantagem econômica, distintamente do que ocorre com o furto, exige para sua caracterização o conteúdo econômico, sob pena de configurar outra infração (v.g., art. 146, CP – constrangimento ilegal), ou de conduzir à atipicidade da conduta. O conceito de vantagem contido no artigo 158 é bem mais amplo que o do furto e o do roubo, haja vista que abrange não só a coisa móvel corpórea de outrem, mas todo interesse ou direito patrimonial alheio, tratando-se, destarte, de crime contra o patrimônio em geral.15 O tipo subjetivo é representado pelo dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de usar da violência ou ameaça para constranger alguém. Todavia, reclama ainda um elemento subjetivo do injusto, que é o fim de buscar para si ou para outrem um proveito injusto (delito de intenção). A extorsão é delito de mera atividade, em razão da presença do especial fim de agir expresso pela fórmula com o fim de, daí resultando que o tipo não exige o resultado para sua consumação. Desse modo, o delito consuma-se com o emprego da violência ou grave ameaça16. Admite-se a tentativa, embora de difícil ocorrência, ilustrando-se com o exemplo daquele que faz ameaça por escrito, interceptada antes que chegue ao conhecimento da vítima. A extorsão, apesar de muito semelhante, não se confunde com o roubo. Neste, o autor toma a coisa pessoalmente; naquela, faz com que ela lhe seja entregue ou colocada à sua disposição. A extorsão também difere do estelionato: neste o sujeito passivo é induzido em erro, mediante artifício ou ardil, enquanto, contrariamente, na extorsão é constrangido mediante violência ou grave ameaça. O delito de extorsão pode ser assim classificado: comum, complexo, pluriofensivo, de mera atividade, comissivo, doloso e instantâneo. 3. Causas de aumento de pena O artigo 158, § 1.º, prevê um aumento de pena de um terço até metade, se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com o emprego de arma. As observações feitas ao delito de roubo e furto (este quanto à qualificadora do concurso de pessoas) têm inteira incidência quanto ao crime de extorsão. É sabido que o concurso de pessoas torna a ação delituosa potencialmente mais grave, justamente em face da união de forças, destacando-se que é dispensável que todos estejam presentes no locus delicti, exigindo-se somente os requisitos inerentes ao tema (art. 29, CP). Indiferente, também, a inimputabilidade de um dos agentes. Por outro lado, a utilização de arma reduz sensivelmente a capacidade de resistência do sujeito passivo, alicerçando o aumento da reprimenda. É maior, portanto, a magnitude do injusto. No § 2.º do artigo 158, vem disposto que “aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3.º do artigo anterior”. Incide, pois, a regra pertencente ao delito de roubo com lesão corporal grave ou morte. Assim, dá-se tratamento semelhante para figuras típicas também semelhantes, sendo que este último caso (extorsão qualificada pela morte) é considerado crime hediondo, por força do que estabelece o artigo 1.º, III, da Lei 8.072/1990. Nesse caso é insuscetível de anistia, graça, indulto e fiança (art. 2.º, I e II, Lei 8.072/1990, com a nova redação dada pela Lei 11.464/2007, e art. 5.º, XLIII, CF). A pena deve ser cumprida inicialmente em regime fechado (art. 2.º, § 1.º, Lei 8.072/1990, alterado pela Lei 11.464/2007). A prisão temporária (art. 1.º, III, d, Lei 7.960/1989) tem o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade (art. 2.º, § 4.º, Lei 8.072/1990). O § 3.º, do artigo 158 do Código Penal, acrescido pela Lei 11.923, de 17 de abril de 2009, prevê uma qualificadora, com modificação das margens penais – de seis a doze anos de reclusão, além da multa – para o caso em que o delito é praticado mediante restrição da liberdade da vítima, sendo esse fato condição necessária para a obtenção da vantagem econômica (“sequestro relâmpago”). No mesmo parágrafo insere-se outra qualificadora, com remissão às penas previstas no artigo 159, §§ 2.º e 3.º, se do crime resulta lesão corporal de natureza grave ou morte (tipos derivados/simples/anormais/incongruentes) De primeiro, destaca-seo equívoco existente na ementa da Lei 11.923/2009, que estabelece o seguinte: “Acrescenta parágrafo ao art. 158 do Decreto-lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para tipificar o chamado ‘sequestro relâmpago’”. Na realidade, não houve uma efetiva tipificação de uma nova modalidade de sequestro, mas apenas a inserção de uma qualificadora para o delito de extorsão na hipótese de restrição da liberdade da vítima, sem nenhuma delimitação conceitual. A segunda parte do dispositivo prevê que, se da extorsão, praticada mediante restrição da liberdade da vítima, advém lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas estabelecidas para esses casos na hipótese do crime de extorsão mediante sequestro (art. 159, §§ 2.º e 3.º). Por fim, cabe salientar que a realidade do “sequestro relâmpago” subsume-se de forma mais correta à hipótese fática prevista no artigo 157, § 2.º, V, uma vez que não há, na verdade, extorsão, mas sim roubo, pois o agente subtrai da vítima pessoalmente a coisa que lhe confere vantagem econômica. A violência, nesses casos, além de física e imediata, prolonga-se um pouco mais no tempo, a ponto de constituir verdadeira restrição da liberdade individual. Nada mais. 4. Pena e ação penal Cominam-se penas de reclusão, de quatro a dez anos, e multa (art. 158, caput, CP). “Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade” (art. 158, § 1.º, CP). Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa (art. 158, § 2.º, CP). As margens penais passam a ser de seis a doze anos (de reclusão), além da multa, se o crime é cometido mediante a restrição de liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica (“sequestro relâmpago”). Se do crime resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no artigo 159, §§ 2.º e 3.º, respectivamente. A ação penal é pública incondicionada. QUADRO SINÓTICO QUADRO SINÓTICO EXTORSÃO Bem jurídico Patrimônio e liberdade individual. Sujeitos Ativo – qualquer pessoa (delito comum). Passivo – qualquer pessoa, inclusive quem sofre o constrangimento sem lesão patrimonial. Tipo objetivo A ação incriminada é constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa. Tipo subjetivo É o dolo e o elemento subjetivo do injusto consistente no fim de obter indevida vantagem econômica. Consumação e tentativa Consumação – com o emprego da violência ou grave ameaça, independentemente de obtenção da indevida vantagem (delito de mera atividade). Tentativa – admissível. Causa de aumento de pena Aumenta-se a pena de um terço até metade, se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com o emprego de arma (art. 158, § 1.º, CP). Pena e ação penal Cominam-se penas de reclusão, de quatro a dez anos, e multa (art. 158, caput, CP). Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade (art. 158, § 1.º, CP). Estabelece o artigo 158, § 2.º, que se aplica à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3.º do artigo anterior (a regra pertencente ao delito de roubo com lesão corporal grave ou morte). O § 3.º determina que, se o crime é cometido mediante a restrição de liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica (“sequestro relâmpago”), a pena é de 6 (seis) a 12 (doze) anos de reclusão e multa. Se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2.º e 3.º, respectivamente. A ação penal é pública incondicionada. © desta edição [2018] NOTAS DE RODAPÉ 13. Cf. RANIERI, S. Manual de Derecho Penal, VI, p. 73. 14. Vide comentários ao artigo 157 do Código Penal (roubo). 15. Cf. HUNGRIA, N. Comentários ao Código Penal, VII, p. 71. 16. Súmula 96 (STJ): “O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida”.
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