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DIREITO EMPRESARIAL Gustavo Henrique de Almeida 126 CHEQUE O cheque é um título cambiariforme regido pela lei n. 7.357/85. Embora alguns autores o definam como mera ordem de pagamento, é possível identificar uma declaração de crédito no referido título, que contém uma ordem de pagamento, sempre à vista. Os requisitos do cheque estão elencados no art. 1o da sua lei de regência e são, a saber: I - a denominação ‘’cheque’’ inscrita no contexto do título e expressa na língua em que este é redigido; II - a ordem incondicional de pagar quantia determinada; III - o nome do banco ou da instituição financeira que deve pagar (sacado); IV - a indicação do lugar de pagamento; V - a indicação da data e do lugar de emissão; VI - a assinatura do emitente (sacador), ou de seu mandatário com poderes especiais. O primeiro requisito se refere à denominação cheque, que deve ser inscrita no contexto do título e expressa na língua portuguesa, considerando-se que as expressões em língua estrangeira que definem o mesmo documento não são válidas, tais como “check”, “echecs”, dentre outras. O segundo requisito se refere à ordem incondicional de pagar quantia determinada. Com efeito, o cheque contém uma ordem de pagamento dirigida contra banco ou instituição financeira que lhe seja equiparada, sob pena de não valer como cheque. É necessário que o emitente tenha um vínculo com tal instituição para que possa ter um talonário de cheques e estar autorizado pela instituição a emiti-los. Portanto, o emitente deve ter fundos disponíveis em poder do sacado (banco) e estar autorizado a emitir cheque, em virtude de contrato expresso ou tácito. Contudo, a infração desses preceitos não prejudica a validade do título como cheque. Vale destacar que este título pode ser emitido contra o próprio sacado, isto é, o banco pode emitir um cheque contra ele mesmo, desde que não seja ao portador. 127 De modo geral, a emissão pressupõe a existência de fundos disponíveis, que é verificada no momento da apresentação do cheque para pagamento. Como fundos disponíveis, são considerados a) os créditos constantes de contracorrente bancária não subordinados a termo; b) o saldo exigível de contracorrente contratual; c) a soma proveniente de abertura de crédito. A quantia determinada, prevista como requisito, deve ser expressa de forma precisa, certa e em moeda corrente nacional, em razão do curso forçado do real, considerando-se que o cheque emitido no Brasil, para aqui produzir seus efeitos entre partes aqui domiciliadas, só tem valor se emitido na moeda corrente, sendo nulo o título emitido em moeda estrangeira. As exceções para emissão do cheque em moeda estrangeira correspondem à emissão dos títulos no exterior para produzir efeitos no Brasil, admitindo- se que a moeda utilizada para a confecção do título seja estrangeira. Outra possibilidade se refere a títulos utilizados para importação ou exportação, para a compra e venda de câmbio em geral e, ainda, para os negócios cujo credor ou devedor seja pessoa residente e domiciliada no exterior. Quanto ao valor indicado no cheque, feita a indicação da quantia em algarismos e por extenso, prevalece esta no caso de divergência. Indicada a quantia mais de uma vez, quer por extenso, quer por algarismos, prevalece, no caso de divergência, a indicação da menor quantia. O terceiro requisito se refere ao nome do banco ou da instituição financeira que deve pagar (sacado). Veja-se que o sacado só paga o cheque mediante a existência de fundos disponíveis nos termos da lei. O quarto requisito exige a menção do lugar de pagamento que, na falta de indicação especial, é considerado o lugar designado junto ao nome do sacado. Caso sejam designados vários lugares, o cheque é pagável no primeiro deles. Entretanto, não existindo qualquer indicação, o cheque é pagável no lugar de sua emissão. Observa-se que o cheque pode ser pagável no domicílio de terceiro, seja na localidade em que o sacado tenha domicílio, seja em outra, desde que se tenha o terceiro como um banco. 128 O lugar do pagamento é de suma importância, pois influencia nos prazos prescricionais. Nesse sentido, o cheque deve ser apresentado para pagamento, a contar do dia da emissão, no prazo de 30 dias, quando emitido na mesma praça de pagamento, ou de 60 dias, quando emitido em praça diversa do pagamento, ou outro lugar do país ou no exterior. Há de se observar, ainda, que se o cheque for emitido para pagamento em lugares com calendários diferentes, considera-se como de emissão o dia correspondente do calendário do lugar de pagamento. O quinto requisito prevê a indicação da data e do lugar de emissão. Por certo, a data de todos os documentos é elemento de suma importância, especialmente em razão dos efeitos que o tempo gera para o direito. A data da emissão do cheque influencia na contagem do prazo de apresentação, assim como dos demais prazos prescricionais. Veja-se que o cheque não tem como requisito a data do vencimento, posto que o vencimento é sempre contra apresentação. O chamado cheque “pré- datado”, que, na verdade, deve ser designado “pós-datado”, não possui amparo na legislação cambiária, posto que a lei n. 7.357/85 é expressa ao afirmar que o cheque contém uma ordem de pagamento à vista. No que diz respeito ao lugar da emissão, tal exigência também se reveste de importância, pois pode influenciar nos prazos de apresentação, assim como na efetivação do pagamento, quando não existir lugar indicado para tanto na cártula. Por consequência, influencia no lugar do protesto e da execução, caso haja. O sexto requisito prevê a assinatura do emitente (sacador), ou de seu mandatário com poderes especiais. Aquele que saca o título e se compromete ao pagamento deve assinar a cártula de forma hológrafa ou por chancela mecânica, isso porque a lei prevê a possibilidade de que a assinatura do emitente ou a de seu mandatário pode ser constituída por chancela mecânica ou processo equivalente. Vale lembrar que se obriga pessoalmente quem assina cheque como mandatário ou representante, sem ter poderes para tal, ou excedendo os que lhe foram conferidos. Trata-se da obrigação sucedânea. Nesse caso, pagando o cheque, tem os mesmos direitos daquele em cujo nome assinou. 129 Sendo estes os requisitos do cheque, cumpre destacar que caso este título esteja incompleto no ato da emissão, e for completado com inobservância do convencionado com o emitente, tal fato não pode ser oposto ao portador, a não ser que este tenha adquirido o cheque de má-fé. Forma O cheque é título de crédito que observa uma forma quanto à sua cártula, que respeita um padrão fixado pela Resolução N. 885, de 22.12.83, do Banco Central (Bacen) do Brasil. Por esta Resolução, alterada várias vezes, o Bacen definiu a altura, o cumprimento, a gramatura do papel, as disposições das declarações, dentre outros elementos do cheque. Juros Considera-se não escrita a estipulação de juros remuneratórios inserida no cheque. Os juros moratórios são os juros legais, de 1 % ao mês. Estes podem ser cobrados do sacador em caso de ação por falta de pagamento, desde o dia da apresentação. Transmissão O cheque pode ser emitido ao portador ou de forma nominal, sendo ou não endossável. O título ao portador se transfere pela mera tradição. Contudo, o título nominal, se for endossável, ou seja, se comportar a cláusula “à ordem”, é transferível por endosso. Por outro lado, se o cheque não for endossável, sua transmissão só será possível se operada pela forma e com os efeitos de cessão. Questão importante se refere ao endosso ao sacado, que equivale apenas como quitação. O endosso se caracteriza pela assinatura do endossante na cártula do cheque ou na folha de alongamento. Se o endosso for em branco, só é válido quando lançado no verso do cheque ou na folha de alongamento. Tal assinatura pode ser hológrafa, por chancela mecânica ou processo equivalente.Pode o endossanteproibir novo endosso e, neste caso, não garante o pagamento a quem seja o cheque posteriormente endossado. 130 Uma regra prevista na lei merece atenção. Tal regra determina que, se desapossado alguém de um cheque, em virtude de qualquer evento, novo portador legitimado não está obrigado a restituí-lo, se não o adquiriu de má- fé. Contudo, sem prejuízo desta regra, são observadas, nos casos de perda, extravio, furto, roubo ou apropriação indébita do cheque, as disposições legais relativas à anulação e substituição de títulos ao portador, no que for aplicável. Por fim, resta esclarecer que o cheque, vinculado a uma causa subjacente por indicar a nota, fatura, conta cambial, ou imposto lançado ou declarado a cujo pagamento se destina, ou outra causa da sua emissão, o endosso pela pessoa a favor da qual foi emitido e a sua liquidação pelo banco sacado provam a extinção da obrigação indicada. Aval A típica garantia cambial, o aval, também encontra previsão na lei do cheque. O aval é considerado como resultante da simples assinatura do avalista, aposta no anverso do cheque, salvo quando se tratar da assinatura do emitente. O aval deve indicar o avalizado. Na falta de indicação, considera-se avalizado o emitente. Apresentação e do Pagamento Para se considerar a apresentação para pagamento, prevê a lei que tal apresentação do cheque se faz à câmara de compensação, de acordo com os trâmites bancários. Após emitido o cheque, que contém uma ordem de pagamento dirigida ao banco, em favor de um beneficiário, pode, o emitente, manifestar-se contrariamente ao pagamento desta ordem, desde que haja justo motivo. Existem duas modalidades pelas quais o emitente se manifesta contrariamente ao pagamento. A primeira é a oposição (ou sustação) ao pagamento. A segunda delas é a contraordem (ou revogação). Pela oposição, o emitente e o portador legitimado podem fazer sustar o pagamento, manifestando ao sacado, por escrito, oposição fundada em relevante razão de direito. A oposição pode ocorrer mesmo durante o prazo de apresentação. Não cabe ao sacado julgar da relevância da razão invocada pelo oponente. 131 Pela contraordem, o emitente revoga a ordem de pagamento dada, bastando, para tanto, mero aviso epistolar, ou por via judicial ou extrajudicial, com as razões motivadoras do ato. Por sua vez, a revogação ou contraordem só produz efeito depois de expirado o prazo de apresentação e, não sendo promovida, pode o sacado pagar o cheque até que decorra o prazo de prescrição. Vale lembrar que a oposição do emitente e a revogação não coexistem e se excluem reciprocamente. Pagamento O pagamento do cheque se perfaz completamente pelo sacado, embora o sacador possa resgatá-lo junto ao portador e, de posse da cártula, inutilizá- la. Não obstante, o sacado pode exigir, ao pagar o cheque, que este lhe seja entregue quitado pelo portador. Regra importante para o cheque consiste na hipótese do pagamento parcial. Prevê a lei que o portador não pode recusar pagamento parcial, e, nesse caso, o sacado pode exigir que esse pagamento conste do cheque e que o portador lhe dê a respectiva quitação. Para que haja o pagamento do cheque emitido à ordem, deve o sacado que o paga verificar a regularidade da cadeia de endossos, mas não a autenticidade das assinaturas dos endossantes. A mesma obrigação incumbe ao banco apresentante do cheque à câmara de compensação. Não teria o banco como verificar a autenticidade das assinaturas de endossantes que, eventualmente, sequer contas bancárias possuam. O pagamento do cheque se faz na medida em que fora presentado e, caso dois ou mais forem apresentados simultaneamente, sem que os fundos disponíveis bastem para o pagamento de todos, terão preferência os de emissão mais antiga e, se da mesma data, os de número inferior. Responsabilidade pelo pagamento O responsável pelo pagamento do cheque é o sacado e, para tanto, deve ter em sua conta fundos disponíveis para a liquidação do título. Contudo, o banco 132 sacado responde pelo pagamento do cheque falso, falsificado ou alterado, salvo dolo ou culpa do correntista, do endossante ou do beneficiário, dos quais pode o sacado, no todo ou em parte, reaver o que pagou. Por conta da sua responsabilidade civil, o sacado pode pedir explicações ou garantia para pagar cheque mutilado, rasgado ou partido, ou que contenha borrões, emendas e dizeres que não pareçam formalmente normais. Cheque visado O cheque visado é aquele em que o sacado reconhece na conta do emitente o valor de face do título e debita esse valor para que seja reservado para pagamento do cheque. Por sua vez, este cheque deve receber o visto, certificação ou outra declaração equivalente, datada e por quantia igual à indicada no título. Esta aposição de visto, certificação ou outra declaração equivalente obriga o sacado a reservar o valor em benefício do portador legitimado, durante o prazo de apresentação, sem que fiquem exonerados o emitente, endossantes e demais coobrigados. De emissão e pagamento e, de 60 dias se diferentes, sobrevirá o pagamento. Contudo, o sacado credita à conta do emitente a quantia reservada, uma vez vencido o prazo de apresentação sem que o título tenha sido apresentado, e de igual modo ocorre se o título lhe for entregue para inutilização. Por fim, vale lembrar que a aposição de visto pelo sacado no título não faz com que haja obrigação diversa da reserva de valores pelo prazo de apresentação. Portanto, não há que se falar sobre aval prestado pelo banco em favor do sacado. Do cheque cruzado O cheque na modalidade cruzado, que assim é emitido para evitar inseguranças quanto ao pagamento ou mesmo para restringir a circulação, comporta algumas nuances. Inicialmente, cabe dizer que o emitente ou o portador podem fazer o cruzamento do cheque, que assim se caracteriza mediante a aposição de dois traços paralelos na face do título. 133 O cruzamento pode ser geral ou especial. O cruzamento geral se caracteriza pela aposição de dois traços paralelos na face do título. O efeito do cruzamento geral consiste no fato de que o título só pode ser pago pelo sacado a banco ou a cliente do sacado mediante crédito em conta. Por sua vez, o cruzamento é especial se entre os dois traços existir a indicação do nome do banco. O efeito do cruzamento especial consiste na regra de que este cheque só pode ser pago pelo sacado ao banco indicado, ou, se este for o sacado, a cliente seu, mediante crédito em conta. Pode, entretanto, o banco designado incumbir outro da cobrança. Ação por falta de pagamento do cheque O cheque é um título executivo extrajudicial e, portanto, pode ser cobrado por meio de ação executiva, uma vez que preenche os requisitos da liquidez, certeza e exigibilidade. Os devedores, o emitente ou os coobrigados, podem ser executados, pois todos os obrigados respondem solidariamente em face do portador do cheque. Contudo, no caso dos endossantes e seus avalistas, a execução pode ser promovida se o cheque for apresentado em tempo hábil e a recusa de pagamento for comprovada pelo protesto ou por declaração do sacado, escrita e datada sobre o cheque, com indicação do dia de apresentação, ou, ainda, por declaração escrita e datada pela câmara de compensação. Tais declarações equivalem ao protesto. Vale destacar que o protesto ou as declarações mencionadas devem fazer-se no lugar de pagamento ou do domicílio do emitente, antes da expiração do prazo de apresentação. Se esta ocorrer no último dia do prazo, o protesto ou as declarações podem fazer-se no primeiro dia útil seguinte. Caso o título haja sido endossado, o portador deve dar aviso da falta de pagamento a seu endossante e ao emitente, nos quatro dias úteis seguintes ao do protesto, sendo que cada endossante deve, nos dois dias úteis seguintes ao do recebimento do aviso, comunicar seu teor ao endossante precedente, indicando os nomes e endereços dos que deram os avisos anteriores, e assim pordiante, inclusive para o avalista, até o emitente, contando-se os prazos do recebimento do aviso precedente. 134 Não decai do direito de regresso o que deixa de dar o aviso no prazo estabelecido. Responde, porém, pelo dano causado por sua negligência, sem que a indenização exceda o valor do cheque. Nesse contexto, o portador tem o direito de demandar todos os obrigados, individual ou coletivamente, sem estar sujeito a observar a ordem em que se obrigaram. O mesmo direito cabe ao obrigado que pagar o cheque. A ação contra um dos obrigados não impede sejam os outros demandados, mesmo que se tenham obrigado posteriormente àquele, pois se regem pelas normas das obrigações solidárias as relações entre obrigados do mesmo grau. Prazos prescricionais alusivos ao cheque O cheque tem sua vida útil estabelecida pelos prazos prescricionais definidos em lei. Assim, o primeiro prazo a ser observado é o de apresentação para pagamento, a ser contado da data da emissão. O prazo de é 30 dias, se o cheque for emitido na mesma praça de pagamento, ou de 60 dias caso haja sido emitido em praça diferente daquela definida como a praça de pagamento. A partir do encerramento do prazo de apresentação, que é contado em dias, inicia-se o prazo prescricional da ação executiva, que é de seis meses, tenha ou não sido apresentado ao sacado dentro do referido prazo. No caso de cheque pós-datado apresentado antes da data de emissão ou da data pactuada com o emitente, o termo inicial é contado da data da primeira apresentação. A ação de regresso de um obrigado ao pagamento do cheque contra outro prescreve em seis meses, entretanto, contados do dia em que o obrigado pagou o cheque ou do dia em que foi demandado. Caso prescreva o prazo para ajuizamento da execução, existe a possibilidade de ajuizamento da ação de enriquecimento contra o emitente ou outros obrigados que se locupletaram injustamente com o não pagamento do cheque. Este direito de ação prescreve em dois anos, contados do dia em que se consumar a prescrição da ação executiva. 135 É cabível, ainda, a ação monitória, prevista no art. 1.102-A do Código de Processo Civil, apenas contra o devedor do título e não contra sacador, endossantes e avalistas. Tal ação compete a quem pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel. Considerando que o cheque cuja prescrição da ação executiva haja se consumado consiste em uma prova escrita sem eficácia de título executivo, torna-se o referido título instrumento hábil à propositura da ação monitória. A ação monitória é de rito especial, e a inicial deve ser instruída com uma prova pré-constituída do crédito materializado no cheque, que embasa a constituição de um novo título executivo, desta feita, o judicial, nominadamenta, a sentença. Tal ação tem seu prazo prescricional relativo ao direito material violado. Além das ações e prazos prescricionais mencionados, resta, ainda, ao portador do cheque, o direito de ação fundada na relação causal, feita a prova do não pagamento. O prazo prescricional da ação de cobrança fundada na relação causal deve ser analisado caso a caso, observando-se a regra geral de 10 anos, sem perder de vista a regulamentação sobre a matéria prevista nos arts. 205 e 206.
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