Buscar

Etnocentrismo e suas implicações socioculturais

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 14 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 14 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 14 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

ANTROPOLOGIA 
SOCIAL
Gabriela Felten da Maia
O etnocentrismo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
 � Descrever o etnocentrismo.
 � Relacionar o contexto colonialista europeu ao conceito de 
etnocentrismo.
 � Reconhecer os efeitos do modelo etnocentrista na modernização dos 
países emergentes e suas contrapropostas antropológicas.
Introdução
O contato com a diversidade cultural e a reação a ela integram a história 
das relações entre diversas sociedades. Desse contato, surgiu o estranha-
mento diante de diferentes costumes, valores e comportamentos quando 
comparados aos de outro grupo, portanto, provavelmente uma situação 
nova ou estranha causará algum choque em quem não participa dela, 
pois cada cultura possui noções próprias de comportamento, condutas 
e valores. Essa condição se chama etnocentrismo.
Neste capítulo, você estudará o etnocentrismo, como esse conceito 
ajuda a compreender as práticas cotidianas de relação com a diferença, 
sua ligação com o contexto colonialista, seus efeitos na modernização 
dos países emergentes e suas contrapropostas antropológicas.
Diferença e mal-entendido sociológico
O etnocentrismo representa uma forma de sentir, pensar e perceber que adota 
um grupo, valores e modelos como o centro. Ele parte de uma relação entre 
eu-outro, em que se utiliza os referenciais culturais da própria sociedade para 
avaliar os modos de vida distintos de sua cultura. O cotidiano é permeado de 
situações em que há comportamentos que causam estranheza ou rechaço, como 
diferenças na experiência da sexualidade, de classe, geracionais, religiosas 
ou geográficas.
A percepção sobre infância e família a partir de um modelo de família 
nuclear e da experiência de infância conforme o modelo médico-psicológico 
formou o olhar e as intervenções realizadas em diferentes políticas públicas 
na atenção às populações em situação de vulnerabilidade social. Assim, é 
comum que a noção de crianças e adolescentes nessa situação seja orientada 
pela dimensão da carência a partir da comparação com jovens que pertencem 
às outras camadas sociais. Do mesmo modo, a ideia de família desestruturada 
emerge em contextos de intervenção associados às condições de habitação, ao 
número de filhos, emprego irregular, entre outras questões sociais adotadas 
como critérios para avaliar o que é uma família “normal”. 
Em ambas as situações, os modos de vida são valorizados a partir dos 
padrões culturais compartilhados pelo grupo avaliador sobre o avaliado, 
desconsiderando os fenômenos históricos resultados de determinadas circuns-
tâncias econômicas, políticas e sociais que constituem as condições concretas 
da vida das pessoas e as formas como elas organizam seu cotidiano.
A intolerância às religiões de matriz afro-brasileiras é outro exemplo, nas 
quais a compreensão de mundo e suas simbologias são experimentadas de 
modo diferente das outras religiões, como a católica. As práticas religiosas, 
por exemplo, o sacrifício de animais, são alvo de controvérsias, consideradas 
absurdas, bárbaras e cercadas por temores. Contudo, elas compreendem uma 
outra cosmovisão sobre o ser humano, a natureza e os espíritos, devendo ser 
entendidas a partir da experiência daqueles que a praticam. Portanto, entende-se 
que o preconceito que tais religiões enfrentam está relacionado à sua matriz 
africana e vinculado a um grupo tradicionalmente estigmatizado, os negros.
No encontro com a alteridade, a existência de uma valoração sobre os 
outros pode ser considerada como etnocêntrica quando há julgamento das 
práticas sociais como certas ou erradas, boas ou ruins, normais ou anormais. 
De acordo com Rocha (1988, p. 6–7):
Como uma espécie de pano de fundo da questão etnocêntrica temos a expe-
riência de um choque cultural. De um lado, conhecemos um grupo do “eu”, 
o “nosso” grupo, que come igual, veste igual, gosta de coisas parecidas, 
conhece problemas do mesmo tipo, acredita nos mesmos deuses, casa igual, 
mora no mesmo estilo, distribui o poder da mesma forma, empresta à vida 
significados em comum e procede, por muitas maneiras, semelhantemente. 
Aí, então, de repente, nos deparamos com um “outro”, o grupo do “diferente” 
que, às vezes, nem sequer faz coisas como as nossas ou quando as faz é de 
forma tal que não reconhecemos como possíveis. E, mais grave ainda, este 
“outro” também sobrevive à sua maneira, gosta dela, também está no mundo 
e, ainda que diferente, também existe.
O etnocentrismo2
Segundo o autor, a dificuldade em pensar na diferença implica em um 
mal-entendido sociológico que se manifesta tanto no plano intelectual como 
no plano afetivo, porque se refere a uma dificuldade em se pensar a diferença 
e os sentimentos de estranheza, medo ou hostilidade.
Ao receber a missão de ir pregar junto aos selvagens um pastor se pre-
parou durante dias para vir ao Brasil e iniciar no Xingu seu trabalho de 
evangelização e catequese. Muito generoso, comprou para os selvagens 
contas, espelhos, pentes, etc.; modesto, comprou para si próprio apenas 
um moderníssimo relógio digital capaz de acender luzes, alarmes, fazer 
contas, marcar segundos, cronometrar e até dizer a hora sempre abso-
lutamente certa, infalível. Ao chegar, venceu as burocracias inevitáveis 
e, após alguns meses, encontrava-se em meio às sociedades tribais do 
Xingu distribuindo seus presentes e sua doutrinação. Tempos depois, 
fez-se amigo de um índio muito jovem que o acompanhava a todos os 
lugares de sua pregação e mostrava-se admirado de muitas coisas, espe-
cialmente, do barulhento, colorido e estranho objeto que o pastor trazia 
no pulso e consultava frequentemente. Um dia, por fim, vencido por 
insistentes pedidos, o pastor perdeu seu relógio dando-o, meio sem jeito 
e a contragosto, ao jovem índio. 
A surpresa maior estava, porém, por vir. Dias depois, o índio chamou-o 
apressadamente para mostrar-lhe, muito feliz, seu trabalho. Apontando 
seguidamente o galho superior de uma árvore altíssima nas cercanias 
da aldeia, o índio fez o pastor divisar, não sem dificuldade, um belo 
ornamento de penas e contas multicolores tendo no centro o relógio. O 
índio queria que o pastor compartilhasse a alegria da beleza transmitida 
por aquele novo e interessante objeto. Quase indistinguível em meio 
às penas e contas e, ainda por cima, pendurado a vários metros de 
altura, o relógio, agora mínimo e sem nenhuma função, contemplava 
o sorriso inevitavelmente amarelo no roso do pastor. Fora-se o relógio. 
Passados mais alguns meses o pastor também se foi de volta para casa. Sua 
tarefa seguinte era entregar aos superiores seus relatórios e, naquela manhã, 
dar uma última revisada na comunicação que iria fazer em seguida aos 
seus colegas em congresso sobre evangelização. Seu tema: “A catequese 
e os selvagens”. Levantou-se, deu uma olhada no relógio novo, quinze 
para as dez. Era hora de ir. Como que buscando uma inspiração de última 
hora examinou detalhadamente as paredes do seu escritório. Nelas, arcos, 
flechas, tacapes, bordunas, cocares, e até uma flauta formavam uma bela 
decoração. Rústica e sóbria ao mesmo tempo, trazia-lhe estranhas lembran-
ças. Com o pé na porta ainda pensou e sorriu para si mesmo. Engraçado 
o que aquele índio foi fazer com o meu relógio (ROCHA, 1988, p. 9–11).
3O etnocentrismo
As apreciações aos padrões culturais de outros grupos podem provocar 
o que Rocha (1988) nomeia de etnocentrismo cordial, quando não existem 
maiores consequências às relações entre esses grupos. Portanto, o estra-
nhamento diante da diferença nem sempre será vivido como racismo, pois 
pode ser vivenciado como encantamento e curiosidade, mas também causa 
uma reação depreciativa que considera o comportamento do outro absurdo, 
imoral ou desviante.
Apesar de o etnocentrismo ser uma reação que acomete a todos em dife-
rentes épocas e lugares, ele pode produzir reações negativas, tanto configu-
rando uma depreciação das práticas estranhas como uma negação do status 
de humanoao outro. Há exemplos na história das consequências deletérias 
dessa reação, como a perseguição aos judeus, na Segunda Guerra Mundial, 
pelos alemães, porque não correspondiam à visão que estes possuíam de 
pureza racial.
Portanto, ele pode aproximar-se do preconceito quando, na convivência 
cotidiana e no contato com uma diversidade de outros com os quais se tem 
familiaridade, rotula e aplica os estereótipos que guiam a relação com a dife-
rença. Em algumas situações, essa apreensão reveste-se de uma forma muito 
violenta e constitui o racismo, a intolerância, a xenofobia e os etnocídios, 
justificando a violência praticada contra os demais (THOMAZ, 1995).
Etnocídio é a destruição sistemática de minorias étnicas a partir da eliminação ou proi-
bição das manifestações culturais e sua assimilação à cultura nacional (THOMAZ, 1995).
A história como Ocidente é marcada por esta experiência de apreensão e 
relação com o outro. Embora o etnocentrismo não seja propriedade exclusiva 
de uma sociedade, a reação diante da alteridade no contexto ocidental revestiu-
-se de um caráter de superioridade cultural que possibilitou a colonização de 
outros povos.
O etnocentrismo4
Nos links a seguir, veja a capa do livro “A massai branca: meu caso de amor com um 
guerreiro africano”, publicado no Brasil pela Geração Editorial em 2007, e assista ao 
trailer do filme de 2005 dirigido por Hermine Huntgeburth, baseado em fatos, que 
conta a história de uma suíça que viaja ao Quênia e se apaixona por um guerreiro 
massai. Essa produção explora a experiência de uma mulher branca europeia em 
outro contexto e o choque cultural.
https://qrgo.page.link/5FBa1
https://qrgo.page.link/ZGudU
Questão da alteridade e expansão colonial
A emergência de refletir sobre a diferença é contemporânea às navegações e à 
descoberta do Novo Mundo; já a questão que surge no pensamento ocidental 
ao estar em contato com a alteridade se trata de saber se as pessoas encon-
tradas pelos europeus pertenciam à humanidade. De acordo com Laplantine 
(2003), o critério utilizado para tal questionamento é religioso: os selvagens 
teriam alma? O pecado original remeteria a eles? Essas questões não foram 
solucionadas nesse período, mas elas começaram o esboço de duas correntes 
que culminariam na ideia do mau selvagem e o bom civilizado e do bom 
selvagem e o mau civilizado.
Na primeira corrente, expulsa-se da cultura para a natureza (ou a animali-
dade) os indivíduos que não são identificados como participantes da humani-
dade à qual o grupo do eu pertence e se identifica. Para isso, no século XIV, 
segundo Laplantine (2003), os europeus usaram não apenas o critério religioso, 
como também a aparência física (nudez), o comportamento alimentar (come-
rem carne crua) e a linguagem ininteligível. Assim, constitui-se o selvagem, 
marcado pela falta, pois não teria moral, religião, lei, Estado, escrita, razão, 
história e cultura. Nesse discurso sobre a alteridade, trata-se de um animal, 
apreendido como uma besta e o inverso do civilizado.
5O etnocentrismo
Contrapondo-se à visão apresentada anteriormente, o bom selvagem seria 
aquele que vive em plenitude, no paraíso. Segundo Laplantine (2003), atribui-
-se a ele à ingenuidade original do estado de natureza, porque não saberia o 
que é o mal, nem a cobiça, livre das características da civilização, marcadas 
como negativas. Havia uma decepção com os benefícios realizados pelo pro-
gresso, tornando o modo de vida dos habitantes dos trópicos ou mares do sul 
como paraísos perdidos, que as sociedades europeias teriam substituído pela 
tecnologia.
As representações produzidas pelo Ocidente em relação à alteridade e a 
si mesmo oscilou desde o século XV. A forma como a colonização moldou 
esse encontro exigiu que se pensasse na diferença e contribuiu para o sen-
timento etnocêntrico ocidental, na medida em que essas imagens operaram 
como objetos que foram mobilizados para exploração econômica, militarismo 
político, conversão religiosa ou emoção estética. Portanto, “o outro não era 
considerado para si mesmo. Mas se olha para ela. Olha-se a si mesmo nele” 
(LAPLANTINE, 2003, p. 36).
Se no século XVI a questão colocada remetia a pensar que tipo de pessoa 
seriam os outros, foi no século XVIII que emergiu a ideia de primitivo. Segundo 
Schwarcz (1993), a partir do naturalista francês Buffon, no século XVIII, uma 
ciência geral dos seres humanos começa a surgir por meio da tensão entre as 
duas imagens apresentadas anteriormente sobre o selvagem. Considerando 
que o ser humano não é composto de espécies diferentes, conforme Todorov 
(1993), a defesa da monogênese marcará a produção do naturalista. Como 
corolário de pensar a existência de apenas uma espécie de seres humanos, a 
diferença será dada entre humano e animais.
Nessa perspectiva, há uma unidade do gênero humano, mas, a partir do 
senso de hierarquia e da diferença, ela começa a ser explicada por meio do 
grau de evolução, observando os critérios que unem a possibilidade de reco-
nhecer as hierarquias. Assim, além da racionalidade, Buffon afirma que um 
dos traços que definem o elevado grau do ser humano será a sociabilidade, 
e qualquer grupo que não possua lei, autoridade, ordem e costumes seria 
bárbaro. Estabelece-se uma hierarquização que vai da selvageria à civiliza-
ção, em que “no cume se encontram as nações da Europa setentrional, logo 
abaixo os outros europeus, depois vêm as populações da Ásia e da África, 
e, na parte mais baixa da escala, os selvagens americanos” (TODOROV, 
1993, p. 115).
Essas descrições focadas nas diferenças culturais também tinham uma 
concepção de raça que influenciou o racialismo do século XIX, havia a con-
O etnocentrismo6
vicção da natureza quase animal dos grupos humanos considerados inferiores. 
Já a variedade na espécie humana era definida a partir de critérios como a 
cor de pele, o tamanho e a forma do corpo e os costumes, assim, a Europa 
tornou-se ponto de referência para comparar e estabelecer a separação entre 
os diferentes povos. O primitivo tornava-se o branco, e a mudança na cor da 
pele revelava uma degenerescência (SCHWARCZ, 1993; TODOROV, 1993).
A introdução da noção de degeneração teve forte influência a partir do 
século XIX com a emergência da raça como uma noção para explicar as 
diferenças. Essa reorientação intelectual marcou uma questão que já estava 
em discussão: as origens da humanidade, um discurso racial que surgiu em 
contraponto ao debate sobre a cidadania e a igualdade, aos pressupostos 
das revoluções burguesas europeias e à visão unitária da humanidade. Duas 
vertentes procuraram abranger essa discussão sobre a origem da humanidade: 
as visões monogenista e a poligenista (SCHWARCZ, 1993).
A visão monogenista congregou autores que compreendiam a humanidade 
como uma, originada de uma fonte comum, sendo a diferença apenas um 
produto da degeneração ou perfeição do Éden. Nesse caso, a humanidade se 
desenvolve em gradiente, do mais ao menos perfeito. Já a visão poligenista 
foi fortalecida pela interpretação biológica e crítica ao pensamento anterior, 
entendendo a origem como proveniente de vários centros que corresponde-
riam, consequentemente, às diferenças raciais. Há uma compreensão de que 
diferentes raças humanas constituiriam espécies diversas (SCHWARCZ, 1993).
A influência da publicação de Charles Darwin “A origem das espécies”, 
em 1859, foi um importante ponto de inflexão do debate anterior — as duas 
perspectivas assumiam o modelo evolucionista no conceito de raça, aproxi-
mando questões culturais e políticas. Assim, a abordagem darwinista também 
possibilitou vínculos ao imperialismo europeu, em que a ideia de seleção 
natural foi utilizada como justificativa para a explicação do domínio ocidental 
aos outros povos. Portanto, o darwinismo influenciou diferentes campos de 
discussão, como o pensamento social e as teorias racialistas da época. A 
consequência desse saber sobre as raças foi a formação de um ideal político 
em que havia uma prática deintervenção sobre a reprodução humana para 
controle e seleção populacional, chamada eugenia (SCHWARCZ, 1993).
Como você observou, a diferença tem sido uma questão discutida há vários 
séculos, mas, no século XIX, houve sua naturalização a partir das teorias 
das raças. Nesse contexto de debate, a conformação das nações e a ideia de 
igualdade e solidariedade eram negadas em razão da compreensão de que a 
diferença implicava uma divisão incomensurável entre as espécies.
7O etnocentrismo
No século XVIII, Sarah Baartman, uma mulher sul-africana conhecida como “Vênus 
Hotentote”, foi levada para a Europa para ser exibida como atração exótica em razão 
da curiosidade sobre suas dimensões corporais. Após sua morte, foi dissecada e 
colocada em exibição em um museu e, 200 anos depois, seu corpo (esqueleto, genitais 
e cérebro) ainda estava em exibição no Museu do Homem, em Paris. Saiba mais sobre 
Sarah no link a seguir.
https://qrgo.page.link/xW5Aq
Colonialidade, modernidade e críticas a partir 
de perspectivas subalternas
Segundo Mignolo (2005), há uma retórica que naturaliza a modernidade com um 
processo universal, global e ponto de chegada, que ocultaria a reprodução cons-
tante da colonialidade. Os países do sul global, outrora colonizados, são julgados 
de acordo com os padrões dos países industrializados do norte, isso significa 
que a expansão colonial foi acompanhada por um modelo único de moderni-
zação aplicada aos colonizados, considerados atrasados ou subdesenvolvidos. 
Assim, o colonialismo, segundo Quijano (2005), era a forma de dominação 
direta, política, social e cultural dos europeus sobre os conquistados de todos os 
continentes. Esse modo de dominação formal foi desfeito em muitos países, mas 
a estrutura colonial de poder produziu as discriminações sociais que, posterior-
mente, foram codificadas como raciais, étnicas, antropológicas ou nacionais.
Se você observar as principais linhas de exploração e da dominação social 
na escala global, a distribuição de recursos e trabalho entre a população, 
notará que essa estrutura de poder ainda opera por meio de outras relações 
sociais. A maioria dos explorados e discriminados pertence aos grupos sociais 
racializados ou às nações que foram colonizadas, assim, ainda que se tenha 
abolido o colonialismo político, a relação entre a cultura europeia e as outras 
continua sendo de dominação colonial (QUIJANO, 2005).
De acordo com Quijano (2005), a consolidação da expansão colonial foi 
acompanhada pela constituição de um complexo cultural conhecido como 
racionalidade-modernidade, que se estabelecia como paradigma dominante 
de conhecimento e relação com o restante do mundo. Trata-se de uma matriz 
colonial de poder, conforme Mignolo (2005), que inclui a esfera econômica, 
mas não apenas, possibilitando a naturalização da cosmovisão ocidental.
O etnocentrismo8
Essa cumplicidade entre modernidade-racionalidade, de acordo com Qui-
jano (2005), torna-se excludente porque apaga as diferenças e a intersubjetivi-
dade, bem como a totalidade social como sede de produção de conhecimento, 
omitindo a referência a qualquer outro sujeito que não seja do contexto europeu, 
os demais são os outros, objetos de conhecimento ou práticas de dominação.
A partir dessas críticas, esses dois autores, juntamente aos outros grupos, 
propõem um debate que procura formas de enunciação que reflitam a classi-
ficação étnica sob o qual os Estados-Nação se desenvolveram e os efeitos do 
processo colonial. Assim, contrapondo-se a uma ideia de subalterno passivo 
que não somente reage, sendo mobilizado apenas a partir de cima, como tam-
bém atua e produz efeitos sociais, ainda que não sejam sempre reconhecíveis. 
Eles propõem a necessidade de releituras das narrativas nacionais e indicam 
a ausência de representação da ação e de narrativas subalternas.
Já Spivak (2010) faz um chamado aos perigos da representação do sujeito 
denominado Terceiro Mundo pelos intelectuais do Primeiro Mundo, os quais 
marcaram a si como não representantes ausentes que deixam o oprimido falar, 
uma prática que mantém o essencialismo e o imperialismo, que resultam em 
uma violência epistêmica. Segundo Bahri (2013), as críticas do feminismo 
pós-colonial demonstram como a tokenização, indivíduos que se colocam no 
lugar de falar porque acreditam ser representantes de determinada categoria, 
também produz um essencialismo que é acompanhado da guetização e do 
silenciamento de outras pessoas.
Portanto, Spivak (2010) reflete sobre a história de uma viúva para abordar 
a condição de subalternidade quando se articula a categoria gênero e a mar-
ginalização das mulheres na produção colonial, marcadamente masculina. 
A autora problematiza a noção de sujeito homogêneo presente em algumas 
abordagens sobre a agência e a resistência do subalterno. Essa leitura das 
narrativas subalternas parece indicar que não haveria muitas possibilidades 
para a agência desses sujeitos, considerando o lugar da mulher subalterna no 
contexto colonial e pós-colonial colocado pela autora. Contudo, ao questionar 
se o subalterno pode falar, ela provoca a reflexão dos modos de enunciação 
sobre e do outro em um contexto de produção em que o subalterno não teria 
como se representar, procurando pensar nas possibilidades de ele subjetivar-se.
O hibridismo identitário torna-se um recurso possível para se pensar e um 
essencialismo estratégico. As duas categorias se referem a uma questão: como 
não emudecer o subalterno nas representações produzidas nos trabalhos? Não 
falar por, nem em lugar de significa assumir o lugar de fala e a posição de 
sujeito a fim de trabalhar o hibridismo. Os debates epistemológicos colocados 
pelas vozes subalternizadas, que ocupam a posição de eu e outros, tensionam 
9O etnocentrismo
o local do autor, confrontando política e eticamente as relações com a dife-
rença. Antes de tudo, essas relações são de desigualdade e se apresentam no 
modo como está estruturado o contexto político e institucional de produção 
do conhecimento (ABU-LUGHOD, 1991).
No pós-guerra, Césaire (2006) e Fanon (1975), homens negros martini-
quenhos, realizaram importantes críticas ao colonialismo e aos processos 
corporificados de produção da relação eu-outro, em que os negros como uma 
marca são produzidos pelo colonizador. Grandes influências para os debates 
pós-coloniais e os estudos subalternos, ao refletir sobre o colonialismo difu-
samente nas relações subjetivas e no pensamento, demonstram que os saberes 
modernos são coloniais. Esses projetos empreenderam críticas à epistemologia 
ocidental a partir de outros lugares de enunciação ao mostrarem os efeitos 
de poder da relação colonial eu-outro, na medida em que esta é violenta por 
desumanizar o outro em sua materialização por meio de uma violência epis-
têmica, como apresenta Spivak (2010).
Em “Cultura e Imperialismo”, publicado pela Companhia das Letras em 1995, Edward 
Said examina de forma brilhante as influências política e cultural do Ocidente por 
meio de políticas imperiais ainda presentes. Na obra, ele aponta como os meios de 
comunicação podem ser armas de colonização e mostra as vozes insurgentes na 
literatura, vindas dos países colonizados.
ABU-LUGHOD, L. Writing against culture. In: FOX, R. (ed.). Recapturing anthropology: 
working in the present. Santa Fe: School of American Research Press. p. 137–162.
BAHRI, D. Feminismo e/no Pós-Colonialismo. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, 
v. 21, n. 2, p. 659–688, 2013. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/
article/view/S0104-026X2013000200018. Acesso em: 12 set. 2019.
CÉSAIRE, A. Discurso sobre el colonialismo. Madrid: Akal, 2006. 222 p.
FANON, F. Do pretenso complexo de dependência do colonizado. In: FANON, F. (ed.). 
Pele negra, máscaras brancas. Porto: A. Ferreira; Paisagem, 1975. p. 97–120.
O etnocentrismo10
LAPLANTINE, F. Aprender antropologia. São Paulo: Brasiliense, 2003. 205 p.
MIGNOLO, W. D. La colonialidad a lo largo y a lo ancho: el hemisferiooccidental en 
el horizonte colonial de la modernidad. In: LANDER, E. (comp.). La colonialidad del 
saber: eurocentrismo y ciencias sociales: perspectivas latinoamericanas. Buenos Ai-
res: Clacso, 2005. p. 34–52. Disponível em: http://biblioteca.clacso.edu.ar/clacso/sur-
-sur/20100708034410/lander.pdf. Acesso em: 12 set. 2019.
QUIJANO, A. Colonialidad del poder, eurocentrismo y América Latina. In: LANDER, 
E. (comp.). La colonialidad del saber: eurocentrismo y ciencias sociales: perspectivas 
latinoamericanas. Buenos Aires: Clacso, 2005. p. 122–151. Disponível em: http://biblio-
teca.clacso.edu.ar/clacso/sur-sur/20100708034410/lander.pdf. Acesso em: 12 set. 2019.
ROCHA, E. P. G. O que é etnocentrismo. 5. ed. São Paulo: Brasiliense, 1988. 95 p. (Coleção 
Primeiros Passos, 124).
SCHWARCZ, L. M. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no 
Brasil: 1870–1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. 296 p.
SPIVAK, G. C. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: UFMG, 2010. 133 p.
THOMAZ, O. R. A antropologia e o mundo contemporâneo: cultura e diversidade. In: 
SILVA, A. L.; GRUPIONI, L. D. B. A temática indígena na escola: novos subsídios para pro-
fessores de 1º e 2º graus. Brasília: MEC; UNESCO; São Paulo: Mari — Grupo de Educação 
Indígena/USP, 1995. p. 425–441. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/pes-
quisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=26725. Acesso em: 12 set. 2019.
TODOROV, T. A raça e o racismo. In: TODOROV, T. Nós e os outros: a reflexão francesa 
sobre a diversidade humana. Rio de Janeiro: Zahar, 1993. p. 107–141.
11O etnocentrismo

Outros materiais

Outros materiais