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Endocrinologia Dra. Gabriela Mestrinho Caroline Siza Hipertireoidismo Definição Deve-se, primeiramente, diferenciar o hipertireoidismo da tireotoxicose. Hipertireoidismo refere-se ao aumento da síntese e liberação dos hormônios tireoidianos pela glândula tireoide Tireotoxicose refere-se à síndrome clínica decorrente do excesso de hormônios tireoidianos circulantes, secundário à hiperfunção da glândula tireoide ou não Caso clínico Sexo feminino, 30 anos, apresentando palpitações. Há 6 meses com diarreia, emagrecimento de 5kg com apetite mantido, insônia e irritabilidade. FC de 120bpm, PA 130x80mmHg, bócio 2x, sopro, sem proptose ou sinais inflamatórios oculares, TSH cmg/ml e t4 livre 4,1ng/dl. Etiologia Dois grandes grupos: Tireotoxicose com hipertireoidismo o Tireoide hiperfuncionante o Captação aumentada de I131 (cintilografia) Tireotoxicose sem hipertireoidismo o Outras causas o Captação baixa ou nula de I131 1. Tireotoxicose com hipertireoidismo Doença de Graves Bócio nodular tóxico Adenoma tóxico de tireoide (bócio uninodular tóxico ou doença de Plummer) Hipertireoidismo iodo-induzido (fenômeno Jod-Basedow) Tumores trofoblásticos produtores de gonadotrofina coriônica humana - HCG (mola hidatiforme, coriocarcinoma) -> semelhante ao receptor de TSH Adenoma hipofisário secretor de TSH (hipertireoidismo secundário) Hipertireoidismo familiar não autoimune Hipertireoidismo neonatal transitório Resistência aos hormônios tireoidianos – forma parcial (hipofisária) 2. Tireotoxicose sem hipertireoidismo Tireotoxicose factícia o Paciente toma altas doses de hormônio tireoidiano, então a tireoide “percebe” que há altas doses de hormônio circulante e não aumenta produção Tireoidite com tireotoxicose transitória (subaguda, indolor, pós-parto) o Destruição da glândula faz subir rapidamente a quantidade de hormônio transitante. Tecido tireoidiano ectópico (struma ovarii, metástase funcionante de carcinoma da tireoide Endocrinologia Dra. Gabriela Mestrinho Caroline Siza Quadro clínico – hipertireoidismo Sintomas : Nervosismo (99%) Sudorese excessiva (91%) Intolerância ao calor (89%) Palpitação (89%) Fadiga (88%) Perda de peso (85%) Dispneia (75%) Fraqueza Aumento do apetite (65%) Queixas oculares (54%) Edema de membros inferiores (35%) Hiperdefecação (33%) – aumento do trânsito intestinal Diarreia (23%) Distúrbios menstruais (20%) Anorexia (9%) Ganho ponderal (2%) Sinais: Taquicardia (100%) Bócio (97%) Tremor (97%) Pele quente e úmida (90%) Sopro na tireoide (77%) – ausculta da tireoide Alterações oculares (71%) Fibrilação atrial (10%) Ginecomastia (10%) Eritema palmar (8%) Alterações oculares são sugestivas de Doença de Graves. Eritema palmar mais frequente em idosos. Idosos: quadros clínicos discretos. Perda de peso e anorexia são mais importantes. Pode haver depressão grave, apatia, astenia, fraqueza muscular, e emagrecimento, sem sinais adrenérgicos – hipertireoidismo apático. Podem apresentar fibrilação atrial no exame físico. 1. Doença de Graves Causa mais comum de hipertireodismo – 80% dos casos Tireoidite crônica autoimune – causa mais comum do hipertireoidismo Mais comum em mulheres da 2ª a 4ª década de vida. Pode se associar a outras doenças autoimunes: tireoidite de Hashimoto, DM1, anemia perniciosa, doença de Addison, lúpus eritematoso sistêmico e artrite reumatoide. Paciente apresenta exoftalmia bilateral, proptose, edema periorbital, edema de conjuntiva – algumas vezes impedindo de ocluir completamente os olhos. Bócio difuso na região cervical, podendo ocorrer sopro ou frêmito Reação autoimune pode envolver órbitas (oftalmopatia), tecido celular subcutâneo (dermopatia, mixedema) Cintilografia 123I: hipercaptação difusa, ou seja, em toda a tireoide Fisiopatologia da Doença de Graves Célula T supressora com multiplicação e produção de autoanticorpos contra receptor de TSH (TRAB) Endocrinologia Dra. Gabriela Mestrinho Caroline Siza TRAB se liga aos receptores de TSH e passam a estimular a tireoide, aumentando a produção da T3 e T4 Feedback negativo para a hipófise, havendo a supressão de TSH, ou seja, diminuição do estimulo para produção de T3 e T4 o Mas tem-se autoanticorpo se ligando, então a produção continua, independente do TSH estar diminuído. TRAB também se ligam a outros receptores, como os retro-orbitais, levando a produção de citocinas inflamatórias, que levam aos sinais clínicos que são conhecidos na oftalmopatia – edema palpebral, carúncula, dor ocular, quemose... o Semelhança entre os receptores, por isso há ligação. Produção de TRAb é feita pelos linfócitos B, levando a uma produção excessiva de hormônios. Há aumento de T3 e T4 com TSH baixo 2. Bócio multinodular tóxico Faixas etárias mais avançadas >50 anos Resulta da história natural do BMNA (bócio multinodular atóxico), quando áreas autônomas se tornam evidentes, muitas vezes também devido a mutações no receptor do TSH Bócio volumosos, podem levar a compressão cervical, bócios mergulhantes. Estima-se que 10% dos BMNA evoluam para hipertireoidismo em 7-10 anos. Associado a deficiência de iodo, tabagismo, fatores genéticos e ambientais Cintilogtrafia: hipercaptação difusa - Múltiplos nódulos hiperfuncionantes 3. Doença de Plummer Adenoma folicular hiperfuncionante – somente um nódulo autônomo, difere do bócio multinodular tóxico por conta disso. o Pode até ter mais de um nódulo, porém não podem ser hiperfuncionantes; se forem, a classificação a passa a ser de bócio multinodular tóxico. Mais comum em pessoas mais idosas, mulheres e em áreas com relativa deficiência de iodo Nódulo tireoidiano único >3cm, com restante da glândula normal Cintilografia: nódulo solitário hiperfuncionante, com supressão do tecido paranodular e do lobo contralateral; o O tecido para nodular está suprimido pois segue o comando de diminuição de estímulo, feita pela diminuição de TSH, porém, a área de hipercaptação acaba suprimindo o restante da glândula. Diagnóstico Quadro clínico Tempo de início dos sintomas, uso de medicamentos (como amiodarona), exposição ao iodo (realização de exames com contraste iodado ou uso de compostos com alto teor de iodo), gestação recente e história familiar de doença autoimune da tireoide devem ser questionados. Peso corporal, pressão arterial e frequência cardíaca. Endocrinologia Dra. Gabriela Mestrinho Caroline Siza Taquicardia sinusal e hipertensão arterial sistólica são comuns, e a fibrilação atrial pode estar presente, principalmente em idosos Dosagem de TSH e T4 livre – indicam que há hipertireoidismo, mas não apontam qual a causa. o TSH ↓ + T4l ↑: hipertireoidismo clínico o TSH ↓ + T4l normal: hipertireoidismo subclínico o TSH normal ou ↑ + T4l ↑: hipertireoidismo central o Importante salientar que só a dosagem de TSH e T4 livre, não são suficientes para indicar qual a causa do hipertireoidismo, indica somente que houve aumento dos níveis dos hormônios Dosagem de TRAb: o Indivíduos eutireoidianos com oftalmopatia. o Gestantes com DG ou história médica pregressa de DG, para avaliação de risco da tireotoxicose neonatal por passagem transplacentária dos anticorpos o Diagnóstico diferencial da tireotoxicose gestacional (1º trimestre) Nesse momento da gravidez, o feto não produz HT, então a mãe deve aumentar a sua produção para fornecer também ao feto. As gestantes podem fazer um hipertireoidismo subclínico fisiológico, não significa que têm hipertireoidismo, é apenas transitório. USG da tireoide não é indicada rotineiramente A captação de iodo radioativo (131I ou 123I) é útil no diagnóstico diferencial da causa da tireotoxicose, especialmente para diferenciar as tireoidites daDG do BMNT. É contraindicada na gestação e na lactação. o Se houver hipocaptação, há suspeita de carcinoma o Captação normal ou elevada: doença de Graves, bócio multinodular tóxico, adenoma tóxico, doença trofoblástica, adenoma de hipófise secretor de TSH, resistência aos hormônios tireoidianos o Captação baixa ou ausente: tireoidite indolor (silenciosa), tireoidite induzida por amiodarona, tireoidite subaguda (granulomatosa, de Quervain), tireotoxicose iatrogênica, ingesta factícia de hormônios tireoidianos, Struma ovarii, tireoidite subaguda, metástases extensas de carcinoma folicular da tireoide. Tratamento Objetivo: manter o paciente eutireoidiano Controle dos sintomas – beta-bloqueadores → controle dos sintomas adrenérgicos Propranolol (10 a 40mg de 3 a 4x/dia): bloqueador não seletivo. Longa experiência. Pode bloquear a conversão de T4 a T3 em altas doses. Fármaco de escolha para mulheres em amamentação. Atenolol (25 a 100mg 1 a 2x/dia): bloqueador seletivo. Maior aderência. Metoprolol (25 a 50mg 4x/dia): bloqueador seletivo. Disponível em apresentação com uma dose ao dia Nadolol (40-160mg 1x/dia): bloqueador seletivo. Pode bloquear a conversão de T4 a T3 em altas doses. Pouca experiência até o momento. Drogas antitireoidianas – DAT Mecanismo de ação: o Bloqueio da enzima peroxidase → interfere na organificação (formação e DIT e MIT) e acoplamento (junção MIT e DIT para formar T3 e T4) → inibindo a síntese de T3 e T4 Endocrinologia Dra. Gabriela Mestrinho Caroline Siza o Tionamidas: MMI (metimazol) e PTU (propiltiouracil) MMI: dose inicial de 10-40mg/dia, dose de manutenção de 5-15mg/dia – tomar 1x/dia Melhor droga a ser escolhida pois possui menos efeito colateral. PTU: dose inicial de100 a 400mg/dia, dose de manutenção 50-200mg/dia – tomar de 2 a 3x ao dia. o Efeito imunomodulador o Por não inibirem a captação de iodo, nem afetar a liberação dos hormônios já sintetizados e estocados dentro da glândula, seu efeito é mais bem observado em 10-15 dias o PTU= também inibe conversão periférica de T4 em T3 o Devido aos potenciais efeitos hepatotóxicos do PTU, a utilização dessa droga como primeira opção terapêutica deve ser restrita aos casos de hipertireoidismo grave, crise tireotóxica e no primeiro trimestre da gestação. O uso do MMI tem sido associado à aplasia cútis congênita, sendo contraindicado no 1ºT gestacional. Resultados: o Avaliar a cada 4 a 6 semanas, quando alcançar o eutireoidismo a dose da tionamida deve ser reduzida gradualmente até que se obtenha a menos dose que mantenha os pacientes eutireoideos Manutenção: MMI mantido entre 5 a 10mg/dia e o PTU entre 50 e 100mg/dia TSH pode permanecer suprimido por meses após o início do tratamento e não deve ser utilizado para monitorização na fase inicial. Remissão em cerca de 50% dos pacientes (DG); taxa mais elevada naqueles com doença mais branda, valores menores de TRAb, tempo de tratamento. Efeitos colaterais: PTU tem mais que MMI; Reações adversas menores: prurido, rash → nesse caso não há necessidade de suspensão da droga, pode-se associar a um anti-histamínico. Efeitos colaterais graves: poliartitrite grave, agranulocitose, mais raramente, anemia aplástica, trombocitopenia, hepatite tóxica (PTU), vasculites, síndrome lúpus-like, hipoprotrombinemia (PTU) e hipoglicemia (MMI) o DAT deve ser suspensa imediatamente e não deve ser reintroduzida. Radioiodoterapia Cirurgia Tratamento - doença de Graves Iodo radioativo Pode ser utilizado como tratamento inicial, principalmente em pacientes com baixa probabilidade de remissão com o uso de DAT, necessidade de controle definitivo e rápido da tireotoxicose ou com contraindicações ao uso de DAT e/ou cirurgia. A radiação induzida pelo 131I provoca uma resposta inflamatória seguida de destruição local e fibrose progressiva, contribuindo para a redução do volume da glândula, mais pronunciada no primeiro ano após a dose. Contraindicação: gestação, lactação, suspeita ou confirmação de câncer de tireoide. Evitar em mulheres que planejam engravidar em período inferior a 4-6 meses. Ingerido por via oral, em dose fixa ou calculada de acordo com a cintilografia. Endocrinologia Dra. Gabriela Mestrinho Caroline Siza Pré-tratamento com betabloqueadores e DAT devem ser considerados em pacientes com risco para complicações Se o paciente permanece tireotóxico, a monitorização laboratorial com T3 e T4L deve ser continuada em intervalos de quatro a seis semanas Em pacientes com hipertireoidismo persistente após seis meses do tratamento com iodo radioativo, a administração de nova dose deve ser considerada A presença de TSH suprimido com T3 total e T4l dentro dos limites da normalidade deve ser monitorizada quanto à possibilidade de recidiva Aproximadamente 20% dos pacientes tratados com 131I apresentam falha terapêutica. Asa características associadas a uma maior taxa de falha são a presença de bócio volumoso (>50ml), captação de iodo elevada (>90%) e níveis séricos de T3 elevados (>500ng/mL) no diagnóstico Nódulos tireoidianos: o Pacientes com DG e nódulos tireoidianos maiores do que 1cm devem ser avaliados seguindo os mesmos critérios propostos para nódulos em geral, antes da administração de dose terapêutica de 131I Tratamento cirúrgico (tireoidectomia total) Bócios volumosos associados a sintomas compressivos Nódulos suspeitos ou com confirmação de doença maligna Gestantes em controle da doença com DAT Pacientes com intolerância a DAT Recusa ao tratamento com 131I Vantagens: rápida normalização da disfunção hormonal e maior efetividade nos casos com sintomas compressivos Desvantagens: custo, internação hospitalar, o risco anestésico, e os riscos inerentes ao ato cirúrgico (hipoparatireoidismo, lesão do nervo laríngeo-recorrente, sangramento, infecção, cicatriz e hipotireoidismo) Tratamento – bócio multinodular tóxico e adenoma tóxico Primeira escolha: tireoidectomia total (BMNT), pode ser feita lebctomia (AT) Ablação com 131I o Pacientes que não apresentam condições clínicas para o tratamento cirúrgico ou que não querem ser submetidos à cirurgia são candidatos para o tratamento com 131I As doses terapêuticas de 131I recomendadas para pacientes com BMNT e AT estão na faixa de 150-300𝜇Ci por grama de tecido corrigido para a captação de 131I em 24h. Preparo: DAT (preferencialmente MMI 10 a 30mg/dia) até atingir o eutireoidismo. Em casos de hipertireoidismo leve/moderado ou em bócios de tamanho moderado, pode-se utilizar apenas beta- bloqueadores. Em pacientes idosos, com contraindicação para cirurgia ou 131I, pode-se manter o tratamento contínuo com doses baixas de MMI A escleroterapia de nódulos císticos ou autônomos é uma opção terapêutica segura em pacientes nos quais os tratamentos tradicionais (cirurgia ou 131I) estão contraindicados ou foram recusados pelos pacientes. Hipertireoidismo subclínico TSH suprimido, T4L e T3 total normal Excluir causas transitórias Endocrinologia Dra. Gabriela Mestrinho Caroline Siza Etiologia: o O mais comum é o uso de levotiroxina para tratamento de hipotireoidismo. o Doença de Graves, BMNT, AT, tireoidites o Outras causas de TSH supresso: uso de glicocorticoides, doença sistêmica severa ou disfunção hipofisária devem ser ecluídas Fatores de risco: o Progressão para hipertireoidismo franco o Efeitos cardíacos o Efeitos esqueléticos O tratamento visa à melhora de sintomas, dos parâmetros cardiovasculares e do metabolismo ósseo. Avaliar a etiologia e seguir o mesmo tratamento do hipertireoidismo clínico Pacientes jovens, assintomáticos e sem evidências de envolvimento orgânico podem ser observados e reavaliados semestralmente.
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