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que o paradoxo se estabelece: ao passo que a ciência é fixa, com sua metodologia bem 
delimitada e que busca um “padrão” de comportamento e atitude para que se obtenha 
um resultado, a sociedade se move, sendo construída diariamente por todos nós. Por-
tanto, fica o questionamento: como se podem tirar leis gerais a partir do conhecimento 
científico para a compreensão da sociedade?
Esse é o desafio das Ciências Sociais desde sua gênese: explicar, a partir de mecanis-
mos científicos, o comportamento da sociedade, que se move constantemente em busca 
de uma realidade diferente daquela que nós vivenciamos. Talvez por esse estilo peculiar 
é que o conteúdo aprendido seja tão abstrato e tão difícil de ser medido e tocado. Nosso 
esforço está em demonstrar como as ciências sociais se tornaram um importante e ne-
cessário instrumento para a análise deste “mundo de maluco” em que vivemos, que clama 
a cada nova descoberta por uma análise apurada de nossa realidade social.
Costumamos argumentar que as Ciências Sociais anseiam pelo conflito e pelo de-
bate. De fato: sem os problemas entre as relações humanas seria muito difícil imaginar 
como o cientista social teria seu objeto de estudo, isto é, a sociedade, caracterizada pelas 
disputas sociais existentes. Desta forma, reafirmamos o ponto de largada da trajetória 
de formação dessa área: o conflito entre os seres humanos. Não tratamos aqui das brigas 
entre vizinhos e familiares ou as que acontecem em um jogo de futebol, mas sim as dispu-
tas quase invisíveis na sociedade, que o cientista social tornará objeto de seu estudo. Isto 
é, os espaços de disputa política em que um grupo debate contra outro(s); a afirmação 
de práticas culturais e os conflitos ocasionados por essas políticas afirmativas com as 
demais culturas existentes; a dinâmica competitiva do mercado de trabalho e, por fim, 
as próprias relações sociais, palco de todos os primeiros conflitos.
Observe que “conflito” é a palavra-chave para compreender as Ciências Sociais. Quais 
são, porém, as origens dessa área de conhecimento? Qual a relevância de estudarmos 
esse tipo de conteúdo no Ensino Superior? Além disso, será que as Ciências Sociais 
irão colaborar com a formação acadêmica? São essas as perguntas que pretendemos 
responder neste tópico.
Nossa jornada inicia na Grécia Antiga em 500 a.C., quando a sociedade se diferen-
ciava das demais por um motivo: foi a primeira vez que se tentou organizar uma cor-
rente de pensamento sobre a vida humana em sociedade. Pelo desenvolvimento típico 
da Democracia e do contato com diferentes culturas, os gregos puderam não depender 
necessariamente da Igreja e do Estado — detentores do poder político, econômico e 
ideológico daquele período — para pensar sobre a natureza dos homens e da sociedade.
Prova desse argumento são as ideias de Platão e Aristóteles sobre a melhor forma de 
organizar a política em sociedade, que ganharam força e vigor na Grécia Antiga e até hoje 
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balizam discussões sobre a política. Cada qual à sua maneira, ambos proporcionaram o 
pioneirismo da Grécia, que recebeu o título distintivo de “berço da civilização ocidental”, 
pela forma “evoluída” que sua população se comportava.
Apesar dos avanços proporcionados pelos gregos, a primeira universidade só surgiu 
no século XII, com a consolidação dos intelectuais no mundo acadêmico após a ruptura 
do comando da Igreja sobre a educação. Neste hiato, as produções isoladas refletiam o 
comando da Igreja sobre a condição individual e social de pesquisa, o que não contribuiu 
para o progresso das Ciências Humanas. A instituição das universidades delimitou, de 
alguma forma, uma separação entre o mundo “exterior” (a sociedade em si) e o mundo 
“interior” (as instituições de ensino), o que levava novamente à reflexão sobre a impor-
tância da discussão da vida em sociedade.
Collins (2009) ratifica a relevância do surgimento das universidades para as pesqui-
sas sobre as humanidades:
 “
Com o surgimento das universidades e especialmente em virtude da criati-
vidade da faculdade filosófica, os intelectuais ganharam seu próprio “lar” e 
conquistaram maior clareza acerca de seus próprios propósitos. A história 
do pensamento humano a partir de então oscilou entre uma interação 
entre a comunidade intelectual e o mundo exterior e um isolamento das 
universidades em relação a questões práticas e ortodoxias ideológicas, bem 
como entre as formas como essas questões penetravam nesse ambiente, 
oferecendo aos intelectuais novas demandas e novos problemas (COL-
LINS, 2009, p. 19).
Observamos que, apesar das universidades terem surgido como espaço para a transmis-
são do conhecimento, precisavam dialogar mais com a comunidade, uma crítica que 
permanece até os dias de hoje. O papel, portanto, das Ciências Sociais neste contexto é 
estabelecer a conexão entre o acadêmico e o popular, entre a erudição do conhecimento 
e a praticidade das pessoas, entre a teoria e a prática.
Somente após o Renascimento é que as Ciências Sociais começaram a assumir seu 
espaço de atuação. Contudo, convém ressaltar que o período conhecido como Renas-
cença (que ocorreu entre o fim do século XIV e início do XVII) teve grande relevância 
para compreender o campo de trabalho de um cientista social. Tal argumento se baseia 
nas transformações econômicas, políticas e sociais do período, com fenômenos que 
alteraram as estruturas da sociedade desde então. Além da valorização de elementos da 
Antiguidade Clássica (por isso o nome “Renascimento”), citamos a transição do modo 
de produção feudal para o capitalista como chave para o entendimento das cisões oca-
sionadas pelo turbilhão de transformações sociais.
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A ruptura cultural ocasionada a partir do Renascimento e do fim da sociedade me-
dieval na Europa oportunizou que o homem (pautado pelo antropocentrismo) passasse 
a figurar como centro das preocupações de pesquisas acadêmicas, discussões filosóficas 
e da sociedade em si. O foco direcionado para o homem enquanto “centro do universo” 
abriu espaço para o protagonismo das Ciências Sociais, que são basicamente um produto 
das transformações ocorridas no período entre e a Revolução Industrial e a Revolução 
Francesa (principalmente após esses períodos), conforme trataremos a seguir.
É nesse cenário que as Ciências Sociais começaram a ganhar forma no campo de conhe-
cimento das humanidades. A primeira a ganhar autonomia de atuação para a reprodução e 
produção do saber foi a Antropologia. A partir das descobertas de sociedades tribais na Amé-
rica, na África e no Pacífico com as grandes expedições marítimas, o homem europeu passou 
a conhecer realidades muito distintas das que já estava acostumado no velho continente.
Com tais descobertas, a explicação medieval de que a sociedade europeia era uma 
“operação divina” deixou de imperar, surgindo, assim, diversas teorias para explicar a 
evolução da sociedade e do seu relacionamento com o outro. Um processo de estra-
nhamento, isto é, de olhar o outro de forma diferente para conhecer melhor a si mesmo, 
obteve sucesso na relação da Antropologia com as demais ciências. Paralelo a isso, a An-
tropologia dialogou com a Medicina, buscando explicações biológicas para a existência 
de um outro não europeu.
Outra vertente de atuação da Antropologia é a chamada Antropologia Cultural ou 
Histórica, que tem por objetivo estudar os padrões de cultura de determinados grupos 
sociais ou de sociedades específicas, a fim de compreender como essas comunidades 
estão organizadas, quais são seus costumes, sua organização interna, seu relacionamento 
com outras sociedades, entre outros aspectos.
Após essa divisão de áreas de atuação entre o antropólogo de campo (que trabalhava 
em conjunto com pesquisas na seara da Biologia e da Medicina) e o antropólogo his-
tórico-cultural, a Antropologia passou a ter de forma evidente seu objeto depesquisa, 
consolidado na segunda metade do século XIX: o homem e seu duplo relacionamento, 
com seu eu interior e com o mundo exterior, ou seja, a sociedade propriamente dita.
Em segundo lugar, destacamos a Sociologia como ciência que se estabeleceu no 
campo das Ciências Sociais. Por seu caráter mais generalista, as raízes para seu estabe-
lecimento são as mais diversas: inspirou-se na História, na Filosofia, na Política, na Eco-
nomia, na Antropologia, na Psicologia, entre outras. Abrangente em relação aos objetos 
de pesquisa, a Sociologia pode ser considerada como a mãe de todas as Ciências Sociais.
Produto indireto das Revoluções Burguesas, a Sociologia tem como foco o estudo 
da sociedade e das diversas implicações que essa relação pode estabelecer. Ela nasce “da 
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constatação de que a ordem social moderna desorganizou as formas de convívio social, 
gerando problemas novos que reclamavam interpretações e soluções inovadoras” (SELL, 
2012, p. 18). Em suma: a Sociologia está destinada a analisar as relações sociais e tentar 
fixar leis gerais do comportamento da sociedade. Como exposto, essa paradoxal tarefa 
motiva os sociólogos a continuar atuando na área, tentando decifrar uma encantadora 
personalidade: o homem atuando em sociedade, seja ativa ou passivamente.
A preocupação em estabelecer a Sociologia como ciência foi um dos objetivos de 
Auguste Comte, considerado por alguns como o “pai da Sociologia”. Ele foi responsável 
por popularizar a expressão “Física Social”, que posteriormente seria conhecida como 
a Sociologia propriamente dita. A Física Social de Comte reflete, assim, dois conceitos 
distintos em união para um mesmo ambiente: a sociedade. Ao passo que a Física estuda 
o movimento dos corpos em sociedade, a Física Social nada mais é do que o estudo da 
dinâmica da ação das pessoas socialmente, as quais são influenciadas pela sociedade, 
ditando suas normas, as normas do trabalho e do seu campo próprio de atuação.
Foi neste contexto que a Sociologia passou a intervir nas discussões políticas da 
sociedade. Daí nasce a terceira e mais recente das Ciências Sociais: a Ciência Política. 
Dialogando com a política permanentemente — e, por que não, praticando a política 
desde seu nascimento —, a Sociologia estabeleceu uma relação de proximidade com 
a política, até mesmo conversando com a Filosofia, que em sua origem se destinou a 
estudar os comportamentos políticos.
A Ciência Política teve origem no final do Século XIX nos Estados Unidos e buscava se 
estabelecer, desde então, como uma ciência “autônoma”, isto é, uma área de atuação própria, sem 
ser confundida com a Filosofia, a Sociologia ou encarada como uma subárea do Direito, por 
exemplo. Por esse caráter recente e multifacetado, tem quebrado barreiras quanto ao pensa-
mento político, na busca de estabelecer o seu principal objeto de pesquisa: as relações de poder.
Além de estudar as relações de poder, a Ciência Política tem o desafio de explicar 
como o Estado é constituído, seja enquanto ente governamental ou como espaço em que 
os políticos irão expor suas ideias, conduzir os rumos de uma determinada população, 
enfim, fazer política. A última vertente de estudo da Ciência Política são os Sistemas 
Políticos, que têm por finalidade estruturar um Estado específico, além de incorporar 
as regras de disputas eleitorais, por exemplo. Observamos, assim, que há um ingrediente 
específico para que haja um cientista político analisando algum fenômeno em geral: o 
poder e o local onde esse poder é aplicado, normalmente um Estado, um partido político 
ou um conjunto de forças políticas.
As três áreas das Ciências Sociais (Antropologia, Sociologia e Ciência Política) ten-
tam explicar, ora em conjunto, ora separado, a complexa sociedade em que vivemos. 
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cente, os produtos industriais. Nesta cadeia produtiva nas áreas industriais e nos centros 
econômicos, nesta fase do capitalismo, ocorre um crescimento da população urbana. Uma 
realidade que trará impasses e incertezas no decorrer dos séculos XIX e XX. Isso levará um 
número crescente de pensadores sociais a buscar entender qual será o futuro da sociedade 
diante de uma concentração populacional nunca vista na história humana. A cidade se 
tornou um ambiente de tensão, que exigiu preocupação por parte dos cientistas europeus.
Se a ciência foi um instrumento de dominação para a conquista de novos territórios, 
para a expansão do capitalismo ocidental fundado na empresa mercantil e, posteriormente, 
industrial, agora deveria atender à ordem social instituída na própria Europa. Entender as 
relações sociais constituídas no Ocidente se tornou uma prioridade. Buscar uma ação para 
sua transformação será o objeto de preocupação das forças políticas e também dos cientistas.
O crescimento urbano desse período pode ser medido pela vida em Londres, a 
primeira grande cidade industrial do mundo, no centro de uma economia que já foi 
por quatro séculos a maior do mundo, a inglesa. Londres praticamente triplicou a sua 
população entre os séculos XVIII e XIX. A massa populacional que passou a migrar para 
a cidade, com o chamado êxodo rural, fez crescer uma cidade desconexa e desordenada.
Os operários se concentraram em torno das fábricas ou em cortiços. Sem vias planejadas, 
as cidades estavam com problemas de ocupação. As moradias eram mal ventiladas, muitas 
delas tinham apenas um cômodo, onde ficava toda família, faltava saneamento e todos estavam 
expostos a um ambiente úmido e insalubre que provocava doenças, como tifo, cólera, varíola e 
escarlatina. Essas epidemias passaram a preocupar o Estado. A busca de um saneamento básico 
levará, entre outras atitudes, a promover o zoneamento urbano e as políticas de saúde pública.
A desigualdade de condições ficou expressa também na vida das classes mais abasta-
das, que tinham acesso aos benefícios dos produtos que a economia mundial permitia. A 
elite londrina, por exemplo, consumia produtos de luxo vindos das mais diversas partes 
e, também, aqueles que eram produzidos na indústria do seu país. As classes populares, 
em sua grande maioria formada de operários, não tinham acesso a esses bens.
Outros problemas também surgiram com a formação dos núcleos urbanos industriais, 
com a concentração populacional. O alcoolismo, o crescimento dos homicídios, os latrocí-
nios e a prostituição são alguns deles. Até mesmo os manicômios começaram a se propagar 
como uma alternativa para o tratamento de pessoas que demonstravam desequilíbrio de 
comportamento. Essas situações se justificam diante da condição de vida do operariado, 
que trabalhava em torno de 15 horas por dia, sem descanso. Até mesmo crianças de 10 anos 
eram encontradas nas fábricas sujeitas às mesmas jornadas dos adultos.
A massa humana que veio do campo, onde trabalhava subordinada ao regime feudal 
fundado na subsistência, agora se via em uma condição oposta. Inserido em um regime 
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frenético de trabalho, que nada lembrava as relações no mundo rural, o operariado viu 
se desfazerem os vínculos sociais que foram a base de sua identificação. A economia 
capitalista fez emergir as relações centradas na racionalidade e na busca de orientar 
a convivência social pela produtividade. A vida passou a valer na proporção em que 
gerava a riqueza e na lógica de mercado.
Dentro dessa lógica do mercado de trabalho, a quantidade de seres humanos disponí-
veis para trabalhar nas fábricas apresentava uma qualificação básica. A empresa capitalista 
estava, ainda, dando os seus primeiros passos nos séculos XVIII e XIX, estando longe de uma 
complexa rede de produção com setores específicos em um alto grau de qualificação como 
temos hoje. A sobrevivência passa a custar a sujeição a uma condição desumana de trabalho.
As condições de trabalho da classe operária durante a Revolução Industrial e sua 
propagação pela Europa foi temade análise de Eric Hobsbawm em sua obra Era das 
Revoluções. O historiador inglês estabelece uma relação direta entre a quantidade de 
mão de obra ofertada para a produção, o nível de qualificação e as condições de trabalho:
 “
Conseguir um número suficiente de trabalhadores era uma coisa; ou-
tra coisa era conseguir um número suficiente de trabalhadores com as 
necessárias qualificações e habilidades. A experiência do século XX tem 
demonstrado que este problema é tão crucial e mais difícil de resolver do 
que o outro. Em primeiro lugar, todo operário tinha que aprender a tra-
balhar de uma maneira adequada à indústria, ou seja, num ritmo regular 
de trabalho diário ininterrupto, o que é inteiramente diferente dos altos e 
baixos provocados pelas diferentes estações no trabalho agrícola ou da in-
termitência autocontrolada do artesão independente. A mão de obra tinha 
que aprender a responder aos incentivos monetários. Os empregadores 
britânicos daquela época, como os sul-africanos de hoje em dia, constan-
temente reclamavam da “preguiça” do operário ou de sua tendência para 
trabalhar até que tivesse ganhado um salário tradicional de subsistência 
semanal, e então parar. A resposta foi encontrada numa draconiana disci-
plina da mão de obra (multas, um código de “senhor e escravo” que mobi-
lizava as leis em favor do empregador etc.), mas acima de tudo, na prática, 
sempre que possível, de se pagar tão pouco ao operário que ele tivesse que 
trabalhar incansavelmente durante toda a semana para obter uma renda 
mínima [...]. Nas fábricas onde a disciplina do operário era mais urgente, 
descobriu-se que era mais conveniente empregar as dóceis (e mais baratas) 
mulheres e crianças: de todos os trabalhadores nos engenhos de algodão 
ingleses em 1834-47, cerca de um quarto eram homens adultos, mais da 
metade eram mulheres e meninas, e o restante de rapazes abaixo dos 18 
anos. Outra maneira comum de assegurar a disciplina da mão de obra, que 
refletia o processo fragmentário e em pequena escala da industrialização 
nesta fase inicial, era o subcontrato ou a prática de fazer dos trabalhadores 
qualificados os verdadeiros empregadores de auxiliares sem experiência 
(HOBSBAWM, 1982, p. 66-7).
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Em certa maneira, até nossos dias, a qualificação de mão de obra é um elemento determi-
nante para a forma como se estabelece a relação de trabalho e sua remuneração. Como 
Hobsbawm aponta, nos primeiros momentos da Revolução Industrial, essa condição já 
se apresentava. Ela se agravou com a massa de pessoas disponíveis para serem utilizadas 
pela produção capitalista, mas o grau de qualificação se ampliou e se aprofundou. Com 
isso, a maioria dos seres humanos disponíveis hoje para o trabalho não não utilizados.
Nos primeiros tempos da Revolução Industrial, os trabalhadores eram recém-che-
gados da zona rural, tinham uma padronização de qualificação, mas eram utilizados em 
funções que exigiam um grau baixo de especialidade. As operações de trabalho pode-
riam ser ensinadas sem dificuldade pelos empregadores, partindo de capacidades que 
os trabalhadores já tinham adquirido em sua vida rural. Como afirma Hobsbawm, os 
menos qualificados eram, muitas vezes, entregue ao comando de um trabalhador mais 
qualificado, por meio da terceirização das relações de produção.
As relações de trabalho são marcadas pela violência sem nenhuma garantia. Não 
há, nos primeiros tempos da indústria, uma legislação favorável aos operários. A vio-
lência das relações no ambiente industrial se estende pela vida urbana e se expressa no 
cotidiano das cidades europeias durante o nascimento da indústria. Uma violência que 
terá formas distintas de ser compreendida e de gerar reação.
Para o poder público, buscando atender ao interesse da empresa nascente, foi fun-
damental estabelecer mecanismos de controle social para garantir a ordem nos espaços 
urbanos. Policiamento ostensivo nas ruas e instituições para o aprisionamento e trata-
mento daqueles que não se adaptavam à vida urbana era um exemplo. 
As escolas voltadas às classes populares e mantidas pelo poder público teriam como 
característica retirar os ociosos do mundo urbano e preparar os cidadãos para o trabalho. 
A educação, que sempre existiu como forma de organização da vida social e preparação 
das futuras gerações para a necessidade coletiva, agora deveria exercer essa função vi-
sando ao mundo da empresa capitalista, que se generalizava. Entre os movimentos ope-
rários que surgiram na Europa, alfabetizar os filhos era uma garantia de não reproduzir 
a relação que os pais estavam sujeitos para os filhos.
Para enfrentar a violência que o mundo urbano apresentava, a classe operária se orga-
nizou em associações e sindicatos. Assim, enfrentou o ambiente de trabalho imposto pelas 
empresas e os empresários capitalistas, dando início aos confrontos em forma de “quebra de 
máquinas” e paralisação de trabalhadores. Aconteceram greves ocasionadas pela luta por 
melhores condições de trabalho, como o Movimento Cartista na Inglaterra do século XIX.
Os problemas sociais urbanos chegaram a um determinado grau em que até mesmo 
as forças sociais e políticas opostas de trabalhadores e patrões passaram a lutar contra 
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problemas comuns e se associar em campanhas para romper comportamentos que se 
mostravam nocivos à sociedade. Um desses “inimigos comuns” foi o consumo de bebidas 
alcoólicas. Como afirma Hobsbawm:
 “
Por outro lado, havia muito mais pobres que, diante da catástrofe social que 
não conseguiam compreender, empobrecidos, explorados, jogados em cor-
tiços onde se misturavam o frio e a imundice, ou nos extensos complexos de 
aldeias industriais de pequena escola, mergulhavam em total desmoraliza-
ção. Destituídos das tradicionais instituições e padrões de comportamento, 
como poderiam muitos deles deixar de cair no abismo dos recursos de sobre-
vivência, em que as famílias penhoravam a cada semana seus cobertores até 
o dia do pagamento, e em que o álcool era “a maneira mais rápida para se sair 
de Manchester” (ou de Lille ou de Borinage). O alcoolismo em massa, com-
panheiro quase invariável de uma industrialização e de uma urbanização 
brusca e incontroláveis, disseminou “uma peste de embriaguez” em toda a 
Europa. Talvez os inúmeros contemporâneos que deploravam o crescimento 
da embriaguez, como da prostituição e de outras formas de promiscuidade 
sexual, estivessem exagerando. Contudo, repentina aparição, até 1840, de 
sistemáticas campanhas de agitação em prol da moderação, entre as classes 
médias e trabalhadoras, na Inglaterra, Irlanda e Alemanha, mostra que a 
preocupação com a desmoralização não era nem acadêmica nem tampouco 
limitada a uma única classe. Seu sucesso imediato teve pouca duração, mas 
durante o restante do século a hostilidade à embriaguez permaneceu como 
algo que tanto patrões quanto movimentos trabalhistas tinham em comum 
(HOBSBAWM, 1982, p. 223-4).
Podemos considerar que diante desse ambiente, que trazia condições de degradação para 
parte considerável dos trabalhadores (às vezes até para a classe média e para o patronato), 
a ação pública deveria ser pontual e estar dentro de uma política geral de governabilidade 
da vida social urbana. Isto é, era preciso uma ação dos governos municipais das cidades 
industrializadas. Eles necessitavam ter a capacidade de colocar, diante dos conflitos que se 
intensificam e de práticas que denegriam as forças sociais, mecanismos eficientes de ação.
Se a necessidade de racionalizar a vida social era uma emergência para o 
poder público, ela estaria na pauta de discussão do mundo científico. As corren-
tes de pensadores que se debruçaram sobre os problemas da vida urbana e das 
condições humanas na sociedade industrial são sensíveis a partir do século XVIII. 
Contudo, foi no século seguinte que essa preocupação se intensificou.
Das correntes liberais ao Socialismo, as teses políticas emergiram à procura 
dedar resposta ao contexto tenso que o mundo industrial urbano apresentava. 
Os valores que orientavam o homem europeu tinham se alterado e seriam um 
modelo para as demais formas de compreensão que surgiram em diversas partes 
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culos XIX e XX. O itinerário de formação da Antropologia não foi diferente, já que 
também é fruto da busca por conhecer o “novo”, por descobrir algo que encantava: o 
contato com novos povos e novas culturas por intermédio das grandes navegações.
Antes de falarmos de uma metodologia para explicar o que é e como estudar 
a Antropologia, podemos afirmar que já existia uma espécie de “pensamento 
antropológico”, isto é, já havia um número considerável de pensadores refletindo 
sobre os desdobramentos do estudo do homem e de sua relação consigo e com a 
sociedade. A questão fundamental da Antropologia é, portanto, entender como 
nós, seres humanos, tão parecidos em aspectos biológicos, podemos ser tão di-
ferentes em aspectos culturais.
Essa questão começou a ser respondida a partir da cultura europeia, domi-
nante nos primórdios da Antropologia. Diante do expansionismo europeu com 
as grandes navegações - iniciadas em Portugal e na Espanha e, posteriormente, 
na Inglaterra, na França e nos demais países -, podemos verificar que a relação 
entre dominante e dominado passou a pautar as principais questões voltadas 
à Antropologia. Afinal, a força do homem branco europeu era suficiente para 
dominar culturalmente um “novo homem descoberto”? Quem detinha, então, o 
domínio das relações culturais: o dominante (aqui visto como o Europeu) ou o 
dominado de qualquer localidade outrora “descoberta”?
Estabeleceu-se, assim, um paradoxo para a Antropologia: como agir diante 
dessa situação? Em Aprender Antropologia, François Laplantine faz um resgate 
histórico dessa ciência, trazendo à luz uma importante contribuição acerca da 
fundamentação deste “novo” conhecimento.
 “
O projeto de fundar uma ciência do homem — uma antropologia — é, ao 
contrário, muito recente. De fato, apenas no final do século XVIII é que 
começa a se constituir um saber científico (ou pretensamente científico) 
que toma o homem como objeto de conhecimento, e não mais a natureza; 
apenas nessa época é que o espírito científico pensa, pela primeira vez, em 
aplicar ao próprio homem os métodos até então utilizados na área física 
ou da biologia (LAPLANTINE, 1987, p. 7).
Nota-se que a Antropologia é uma ciência racional, direcionada ao conhecimento do 
homem por meio de seu contato com a sociedade, analisando as influências que um 
tem sobre o outro. Diante dessa face de troca do saber entre o individual e o social, ela 
se constitui, formando a cultura, um dos seus principais objetos de análise.
Como a Antropologia está dividida? Quais são suas áreas e o que ela pesquisa, afinal? 
Mais que isso: qual a função de conhecermos a Antropologia para os fundamentos da 
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educação? É esse o caminho que pretendemos demonstrar a você, caro(a) acadêmico(a), 
a fim de articular o conhecimento da Antropologia com as ações de sua vida cotidiana 
enquanto estudante das humanidades.
Segundo Marconi e Presotto (2007), existem dois grandes grupos que estruturam a 
Antropologia: a Antropologia Física ou Biológica e a Antropologia Cultural, que, 
com suas peculiaridades, auxiliam no entendimento do seu campo de atuação.
A Antropologia Física ou Biológica é destinada a estudar a posição do homem en-
quanto “herdeiro biológico”, ou seja, o homem e a evolução dele desde o surgimento da 
espécie até a atualidade. Surge, então, o primeiro trabalho do antropólogo físico, que 
é estudar a Paleontologia, destinada a buscar o entendimento do homem a partir da 
interface com a Biologia, a Genética, a Arqueologia e outras áreas.
A Paleontologia é um subcampo do conhecimento antropológico, uma vez que se 
articula com as demais áreas relacionadas a conhecer os fósseis humanos, realizar esca-
vações em sítios arqueológicos, entre outros. Por meio do estudo do aspecto biológico 
humano, a Paleontologia articula as ciências naturais com a História, compreendo como 
o homem estava situado na terra dos primórdios até a atualidade.
Por outro lado, a Antropologia Cultural tem como missão o estudo dos aspectos que irão 
formar a sociedade a partir daquilo que nós, humanos, consideramos como cultura, ou seja, 
algo que será perpetuado de geração em geração, constituindo o conjunto de várias áreas do 
conhecimento. A palavra “cultura” expressa o cultivo de elementos, como o conhecimento, a arte, 
as crenças, a lei, a moral, os costumes e todos os hábitos e as aptidões adquiridos pelo ser humano.
Neste sentido, a Antropologia Cultural tem por objetivo o estudo das diferentes 
culturas para cada sociedade, por meio de alguns questionamentos: existe um padrão de 
cultura? É possível mensurar semelhanças e diferenças entre diferentes culturas? O que 
faz com que a cultura de um povo seja formada? Ela é sempre imutável ou ela pode ser 
transformada de acordo com a evolução da sociedade? São essas as questões que per-
meiam há anos a Antropologia Cultural, um campo dessa ciência que estuda o homem 
e, sobretudo, recentemente, os possíveis “padrões de cultura” identificados na sociedade.
Laplantine (1987) salienta que a Antropologia Social e Cultural (ou Etnologia) é, 
hoje, o principal campo de atuação da Antropologia, uma vez que corresponde a pra-
ticamente tudo o que há na sociedade: “seus modos de produção econômica, suas téc-
nicas, sua organização política e jurídica, seus sistemas de parentesco, seus sistemas de 
conhecimento, suas crenças religiosas” (LAPLANTINE, 1987, p. 19). 
Portanto, a Etnologia é a área destinada a compreender a sociedade a partir do ponto 
de vista do homem. Conforme você, aluno(a), viu durante a formação das ciências so-
ciais, a Antropologia pretende estudar a relação do homem em/na sociedade, enquanto 
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o sociólogo estuda o funcionamento da sociedade, seja a partir das suas instituições ou 
a partir dos mecanismos desenvolvidos pelos humanos para que a sociedade progrida.
Será que a Antropologia sempre estudou os aspectos culturais para entender a ação 
do homem? Um dos pioneiros da área é Bronislaw Malinowski (1884-1942), que atri-
buiu a ela um caráter científico. Com a utilização da Etnografia, o autor ia até o campo 
de estudo para compreender melhor o dia a dia das comunidades do pacífico ocidental. 
A ideia de Malinowski para o trabalho do antropólogo é simples: nada como se tor-
nar um deles para conhecê-los melhor. Seguindo essa máxima, o autor se mudou para 
as Ilhas Trobriand, defendendo, durante sua pesquisa, aquilo que acreditava: é preciso 
fazer Antropologia no momento onde observamos determinado acontecimento. Com 
isso, afastava-se a possibilidade de atuar antropologicamente a partir de informações 
alheias, isto é, sem ter a fidelidade dos conhecimentos adquiridos no campo (na área de 
pesquisa) pelo próprio antropólogo. 
Seu método conhecido como “observação participante” até hoje pauta os trabalhos 
na Antropologia. Portanto, segundo Malinowski, não há melhor maneira de se fazer 
Antropologia senão participar cotidiana e rotineiramente com o nativo, ou seja, com o 
estranho que se tentará entender, para posteriormente estabelecer um padrão de cultura 
delimitado acerca de seu comportamento. Em Os Argonautas do Pacíico Ocidental, o 
autor se depara com essa realidade, traduzindo em seus diários as ações cotidianas do 
“nativo estranho” com o qual se deparou.
O nascimento da Antropologia, como exposto, teve como objeto de estudo o homem 
não europeu. Ela se debruçou sobre o comportamento de civilizações encontradas pela 
expansão europeia e sua dominação nas mais diferentes partes do mundo. Considerou, 
dessa forma, comparações, classificações e escalonamento mediante valores que o ho-
mem ocidental impunha aos demais povos. 
Essa escala serviupara estabelecer a “linha evolutiva” que tinha a “Europa civilizada”, 
como afirma Augusto Comte, no topo. O pensador francês, fundador das teses positivis-
tas, estabelecia, no princípio da evolução civilizadora, as sociedades que tinham com-
portamentos próximos ao dos primatas. Mais tarde, Morgan e mesmo Hegel seguiram 
por caminhos diferentes o mesmo critério de colocar os ocidentais na cadeia evolutiva.
Charles Darwin é o autor de maior lembrança quando falamos de evolução, por mais 
que suas colocações sejam interpretadas de forma equivocada como uma justificativa de 
superioridade natural do homem europeu. O antropólogo francês considera que a lei do 
melhor adaptado reside mais na capacidade de assimilação do ser vivo ao meio do que 
de sua competência mental para garantir a permanência. Isto é, formas mais complexas 
de espécies podem ser eliminadas se não assimilarem determinadas mudanças no meio.
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A literatura também foi uma expressão da superioridade ocidental. Romances e 
aventuras fortaleceram o ideal do vitorioso homem branco. Nas páginas dos livros que 
se transformaram em clássicos durante os séculos XIX e XX, os personagens vitoriosos 
eram os exemplares fiéis do corpo social do ocidente. Talvez, nenhum romance de aven-
tura expressou com maior intensidade esta ideia do que a Lenda de Tarzan.
O homem branco está fadado, segundo a produção científica e literária produzida pelo 
ocidente, à conquista, à superioridade e à responsabilidade de civilizar o mundo e, como um 
deus, recriá-lo a sua imagem e semelhança. Na conquista estabelecida sobre diversos povos, 
o homem ocidental julgou, absolveu e condenou. Sua sentença sempre está calcada na bus-
ca por si mesmo, segundo François Laplantine. Por isso, os que lhe pareciam conhecidos 
eram absolvidos e os que lhe causavam estranheza e o negavam deviam ser exterminados.
Esse panorama da Antropologia, conforme anunciamos anteriormente, mudou: o 
que está em voga na modernidade é a busca pelo conhecimento dos padrões de cultura 
e comportamento de cada sociedade, além da valorização da peculiaridade das culturas. 
Antes vistas como estranhas e desvalorizadas, as culturas não europeias passaram a ter 
a devida importância na discussão antropológica. O que vale hoje para a Antropologia 
é a igualdade de análise das culturas, reforçando as particularidades e não a supremacia 
cultural de um em relação a outrem.
Entretanto, para compreendermos essa abordagem, Laplantine esclarece ser necessário 
conhecer os conceitos de “social” e de “cultura”, uma vez que tanto a Antropologia quanto a 
Sociologia têm como finalidade o homem como objeto de estudo:
 “
O social é a totalidade das relações (relações de produção, de exploração, 
de dominação…) que os grupos mantêm entre si dentro de um mesmo 
conjunto (etnia, região, nação…) e para com outros conjuntos, também 
hierarquizados. A cultura por sua vez não é nada mais que o próprio so-
cial, mas considerado dessa vez sob o ângulo dos caracteres distintivos 
que apresentam os comportamentos individuais dos membros desse gru-
po, bem como suas produções originais (artesanais, artísticas, religiosas) 
(LAPLANTINE, 1987, p. 120).
Nota-se, dessa forma, que a cultura reflete em sociedade os comportamentos individuais 
de cada grupo, que posteriormente irá formar a sociedade. A cultura, como já adianta-
mos, é a transmissão e o cultivo dos saberes e costumes de um grupo humano de forma 
coletiva, ou seja, com o convívio em/na sociedade. Logo, a cultura passa a integrar um 
objeto antropológico de conhecimento, na tentativa de responder quais são os padrões 
de cultura assumidos por cada grupo na humanidade.
Observe que no itinerário que propusemos, da formação da Antropologia até a in-
vestigação da cultura para essa ciência, tentamos demonstrar a peculiaridade e a multi-
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plicidade de culturas que você irá lidar ao longo da carreira docente. Veja que o processo 
de considerar as diferentes culturas (cada qual com sua importância) é algo próprio da 
Antropologia. Roberto DaMatta define esse conceito como a “relativização” das culturas:
 “
O “relativizando” que nomeia este livro, portanto, nada tem a ver com uma 
ideologia substantiva do universo social humano, segundo a qual tudo é 
variável e tudo é válido. Muito ao contrário, trata-se de uma atitude positiva 
e valorativa, expressa no meu “relativizando”, a cobrir o abraço destemido 
que damos quando pretendemos entender honestamente o exótico, o dis-
tante e o diferente, o “outro” (DAMATTA, 1981, p. 10).
Relativizar, segundo DaMatta, é valorizar as diferenças culturais existentes, sabendo 
tolerá-las e, sobretudo, integrá-las na vida social. Portanto, a Antropologia aplicada à 
educação demonstra que, durante a carreira docente, é preciso saber relativizar as cul-
turas, os modos de comportamento e o estilo de vida de cada aluno(a), na tentativa de 
facilitar o relacionamento estabelecido no ambiente escolar.
Diante desse cenário, demonstramos que a Antropologia cumpre seu papel quanto 
aos fundamentos da educação: ela auxilia na compreensão e comparação entre os dois 
objetos fundamentais e em constante mudança no processo de formação educacional, ou 
seja, a sociedade e a cultura. Ainda que ambas tenham boa linearidade de pensamento, 
são peças em aperfeiçoamento permanente, em uma engrenagem complexa que é a 
história e a evolução do pensamento humano.
O educador, nesta seara, deve estar preparado para utilizar o que a Antropologia me-
lhor oferece, que é a “relativização” das culturas, além de se colocar no lugar do outro para 
melhor compreendê-lo, em um processo interminável de observação participante, confor-
me Malinowski, que poderá facilitar o entendimento das mudanças que a sociedade sofre. 
Assim, esperamos que a Antropologia possa fundamentar as bases do conhecimento das 
humanidades e, em conjunto com a Sociologia, ser parte da produção do saber.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta unidade, pudemos trabalhar com a formação das Ciências Sociais ao longo dos 
anos, isto é, apresentamos a você, caro(a) aluno(a), como e porque existem três ciências 
que se dedicam a estudar a sociedade sob três pontos de vista: a Sociologia, a Antropo-
logia e a Ciência Política.
Quanto à Sociologia, que tem a sociedade como grande laboratório, pudemos cons-
tatar seu ambiente de formação, tendo como plano de fundo a Revolução Industrial e a 
Revolução Francesa, dois marcos importantes para a compreensão de que a vida citadina 
possui maior complexidade do que a campesina, o que reflete nas novas relações sociais, 
trabalhistas, políticas e comportamentais.
Tal alteração do modo de vida do homem fez com que ele passasse a explorar novos 
espaços, ainda não descobertos (ou não explorados), o que demonstra a necessidade de 
compreendermos a cultura do outro para melhor nos entendermos. Surgia aí a Antro-
pologia, destinada a estudar o homem e sua trajetória em/na sociedade.
A jornada até aqui estabelecida conduz para iniciar o propósito deste livro, indicado 
nesta Unidade I: aguçar o senso crítico da vida que estabelecemos socialmente. Isto é, olhar 
para além do já fixado, do que é dado pela sociedade para nós e do que ofertamos em troca 
para a sociedade. Em suma: a proposta é melhor compreender o meio em que vivemos, 
dialogando, criticando e debatendo os caminhos para melhorar o convívio social.
Dessa forma, ainda fica a questão motriz do livro, porém já pautada de antemão: 
quais são os fundamentos sociológicos e antropológicos e a respectiva contribuição de 
ambos para a educação? É o que pretendemos demonstrar nesta trajetória, iniciando 
pelos chamados autores clássicos da sociologia, que expuseram com propostas centrais 
um a um os estilos de vida na sociedade urbana em seus primórdios.
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rural, a qual não se podia mais reproduzir na cidade. Aomesmo tempo, as condições de 
sobrevivência no mundo urbano se mostravam violentas. 
Revoltas populares contra as máquinas no século XVIII, na Inglaterra, foram uma 
expressão dessa contradição. Os operários consideravam que os maus-tratos impostos 
a eles eram consequência da existência das máquinas. Dessa forma, se elas fossem des-
truídas, a relação com a classe patronal seria mais humana. Ao longo da história, a luta 
contra o desenvolvimento tecnológico se mostrou em vão.
Outras tendências se colocavam em oposição ao caos social, resgatando as “tradições” e 
considerando que a perda de um comportamento moral seria responsabilidade das trans-
formações econômicas que a sociedade estava vivendo. O regime de liberdade era questio-
nado e colocado como o fator de permissividade para o que se chamava de “imoralidade”. 
Em alguns países, como a França, logo após a derrota de Napoleão Bonaparte, em 
1815, quando se viveu a restauração do “antigo regime”, aconteceu o retorno ilusório de 
uma sociedade de ordens, que prometeu resgatar o caos, mas apenas aprofundou a crise 
social. Uma lição que se tirou da Europa no século XIX é que não há retorno quando se 
tem mudança, principalmente uma revolução.
A sociedade europeia não foi a mesma após a Revolução Industrial (1750) e Revolução 
Francesa (1789). As correntes liberais ascenderam na vida pública e passaram a dominar 
o cenário político no Continente. Fora da Europa, e como um desdobramento dos seus 
movimentos liberais, os Estados Unidos foi a primeira colônia a se tornar independente e 
iniciar a ruptura das colônias europeias na América. A implantação dos regimes liberais, 
porém, não foi compreendida como a superação dos problemas sociais. As críticas às teses 
liberais e aos governos que ela respaldou, sejam monarquias ou repúblicas, acentuaram-se.
Duas tendências cresceram no contexto de crítica aos problemas urbanos nas cidades 
industrializadas da Europa. O primeiro foi o socialismo, inicialmente utópico, que se propa-
gou na França e Inglaterra. A tendência de crítica estabelecida por essa corrente não refutava 
efetivamente a economia industrial, mas considerava que a desigualdade deveria ser comba-
tida pelo Estado. O governo deveria se comprometer a intervir na vida social e econômica, 
visando garantir as condições mínimas para os indivíduos que se encontravam ameaçados 
pela exploração econômica e pela miséria que a constituição do proletário estabeleceu.
Mais tarde, o socialismo enriqueceu suas teses e gerou uma crítica mais contundente 
ao capitalismo em desenvolvimento. Com Karl Marx, teórico alemão, foi estudado cri-
teriosamente. Seus estudos iniciaram pela mercadoria, pela produção da vida material 
e pelas relações entre as classes formadas pela economia, pelos proprietários dos meios 
de produção (a burguesia) e pela força de trabalho (o proletário). 
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busca de desenvolver um modelo ideológico que influenciasse a administração france-
sa na busca de atender as melhorias da vida da população. Uma ilusão que Comte em 
pouco tempo rompeu.
O rompimento entre Comte e Saint-Simon ocorreu por diversos fatores, o mais conhecido 
foi a mania do mestre do socialismo utópico de roubar as ideias de seus discípulos. Simon não 
costumava ser muito original em suas ideias, mas isso acontecia por um motivo de por discor-
dância teórica, já que os dois apresentavam análises opostas. Enquanto Comte acreditava em 
uma interferência neutra do Estado, Saint-Simon tendia a um acordo político de tendência 
pequeno-burguesa. Comte chegou a acusá-lo de se aproximar de empresários franceses e fa-
vorecê-los, manipulando os movimentos sociais franceses. Outra crítica foi a de intelectualizar 
o movimento político e gerar uma casta intelectual beneficiária da liderança social.
Traçando um caminho próprio, Comte busca, então, uma análise mais objetiva dos 
fenômenos sociais e passa a considerar o método das Ciências Naturais como um ins-
trumento fundamental na construção de princípios para entender o desenvolvimento da 
sociedade humana. Para ele, a sociedade ocidental era o cume de uma cadeia evolutiva 
do conhecimento desenvolvido pelas sociedades humanas. Nesta evolução, as sociedades 
passaram por estágios semelhantes, mas algumas ainda se encontram, segundo ele, em 
uma etapa mística do pensamento, a infância.
Para ele, a própria Física Social, nome dado à Sociologia em sua origem, estava ligada 
a esse processo de desenvolvimento e deveria ter como objeto de estudo a compreensão 
dos fenômenos sociais como resultado da evolução que as diferentes civilizações viveram 
até chegar à “Europa civilizada”:
 “
Entendo por Física Social a ciência que tem por objeto próprio o estudo 
dos fenômenos sociais, considerados com o mesmo espírito que os fe-
nômenos astronômicos, físicos, químicos e fisiológicos, isto é, como sub-
metidos a leis naturais invariáveis, cuja descoberta é o objetivo especial 
de suas pesquisas. Propõe-se, assim, a explicar diretamente, com a maior 
precisão possível, o grande fenômeno do desenvolvimento da espécie hu-
mana, considerado em todas as suas partes essenciais; isto é, a descobrir o 
encadeamento necessário de transformações sucessivas pelo qual o gênero 
humano, partindo de um estado apenas superior ao das sociedades dos 
grandes macacos, foi conduzido gradualmente ao ponto em que se encon-
tra hoje na Europa civilizada. O espírito desta ciência consiste, sobretudo, 
em ver, no estudo aprofundado do passado, a verdadeira explicação do 
presente e a manifestação geral do futuro (COMTE, 1989, p. 53).
É possível perceber que a Ciência tem um papel fundamental na teoria de Comte, mas 
não a Ciência de uma forma geral. Para ele, as Ciências Naturais são as verdadeiras Ciên-
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cias Positivas, que se somam para a construção da superioridade da civilização ocidental, 
para gerar a maturidade necessária para que o conhecimento possa intervir na análise 
da vida social. Por isso, para ele, a Ciência já teria atingido esse grau de maturidade no 
Ocidente, no que ele chama de “Europa civilizada”.
Na própria citação, é possível compreender a evolução do conhecimento científico e 
os seus estágios. A Física Social é fruto de um desdobramento das Ciências Naturais, por 
meio de um processo de evolução que tem como princípio a Matemática, desdobran-
do-se em sua evolução na Astronomia, na Física, na Química e na Biologia (Fisiologia 
para ele). A Medicina seria, para Comte, a Ciência que se aproximaria no exercício da 
profissão do perfil de interferência do físico-social. Cabe ao médico diagnosticar a do-
ença diante dos dados levantados empiricamente, cabe ao sociólogo a análise dos fatos 
sociais diagnosticados pelos mesmos critérios da Medicina, ou seja, a Fisiologia.
Se considerarmos quem seriam os precursores da Ciência Positiva, Comte aponta 
Bacon, Galilei e Descartes. Para ele, foram os que deslumbraram a capacidade da Ciência 
compreender, por meio dos fenômenos físicos, as leis que regem a natureza. Mais que 
isso, criaram um método seguro, que permite a acumulação do conhecimento e seu 
desenvolvimento posterior.
Segundo o próprio Comte (1989):
A época em que as ciências começaram a tornar-se verdadeiramente po-
sitivas deve ser reportada a Bacon, que deu o primeiro sinal dessa grande 
revolução; a Galileu, seu contemporâneo, que lhe deu o primeiro exemplo, 
e, por fim, a Descartes, que destruiu irrevogavelmente nos espíritos o jugo 
da autoridade em matéria científica. Foi então que a filosofia natural nas-
ceu e que a capacidade científica encontrou seu verdadeiro caráter, como 
elemento espiritual de um novo sistema social.
A partir dessa época, as ciências tornaram-se sucessivamente positivas na 
ordem natural que deviam seguir para tal fim, isto é, segundo o grau maior 
ou menor de suas relações com o homem. Foi assim que a Astronomia em 
primeiro lugar, em seguida a Física, mais tarde a Química,e, enfim, nos nos-
sos dias, a Fisiologia, constituíram-se em ciências positivas. Esta revolução 
está, portanto, plenamente efetuada em todos os nossos conhecimentos 
particulares, e tende evidentemente a operar-se hoje na Filosofia, na Moral 
e na Política, sobre as quais a influência das doutrinas teológicas e da me-
tafísica já foi destruída aos olhos de todos os homens instruídos, sem que, 
contudo, estejam elas ainda fundas em observações. É a única coisa que 
falta ao desenvolvimento do nosso sistema social (COMTE, 1989, p. 55).
Nesta citação, fica claro o papel das Ciências Naturais como também da ruptura que pensa-
dores como Bacon, Galileu e Descartes fizeram com a Filosofia Humanista. Não podemos 
esquecer que o conhecimento científico que foi promovido partindo da lógica da Ciência 
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Moderna acabou por romper com a tradição filosófica da racionalidade científica. Pensar 
o homem era pré-requisito para pensar as coisas, em especial os elementos da natureza. O 
que Comte propõe é a razão inversa: nós somos elementos dentro de uma lógica universal, 
obedecemos as leis naturais dentro da vida social, assim como a astronomia e a física já 
demonstraram por meio da comprovação da existência empírica destas leis.
Vale ressaltar que para Comte o único conhecimento o qual, partindo da abstração, 
consegue se positivar por meio da experimentação é a Matemática. Ela é a Filosofia das 
Ciências Naturais. A lógica matemática se constitui na raiz do pensamento positivo, das 
ciências que se positivaram. O avanço do conhecimento científico partindo da Mate-
mática gerou a capacidade de dimensionar de forma precisa a condição dos fenômenos 
físicos e compreender o seu movimento lógico. Isto é, se observarmos os fundamentos 
da Física, Química e Biologia, vamos encontrar a Matemática servindo como base.
Quando Comte fala da positivação da política e da moral, ele acredita que a maturidade 
do homem culto se libertou de princípios superficiais sobre a conduta social e seus fatores. 
Para ele, o comportamento dos homens em sociedade deveria ser orientado pela racionali-
dade estabelecida mediante a compreensão dos fenômenos sociais fundados na condição 
coletiva da vida. Isto é, não se deve analisar e julgar um fenômeno social utilizando critérios 
teológicos ou abstratos, mas sim dados científicos, elementos que comprovam a função 
e a condição de existência de tais fenômenos. Aqui, seria importante lembrarmos que os 
fenômenos sociais estão, muitas vezes, carregados de um julgamento místico e religioso. 
Se considerarmos, por exemplo, a questão polêmica do aborto na sociedade brasileira, 
ela é tratada mais pela mistificação do fenômeno do que pela sua compreensão científica.
Segundo a análise de Comte, deveríamos ter a preocupação de trazer essa questão 
para a lucidez dos fatos e para a necessidade de uma intervenção eficiente do estado, 
sem mistificá-la. Se há um número excessivo de abortos, é preciso ter conhecimento 
da proporção do que ele ocasiona e os fatores que o determinam. Por não termos essa 
compreensão racional e positiva dos fenômenos do aborto, promovemos a manutenção 
de uma prática que a justiça condena, mas não contém. Isto é, proibir não significa conter.
Por isso, para Comte, a eficiência deveria ser determinante no trato das questões so-
ciais e na superação dos problemas que a vida em sociedade gera. A eficiência da Ciência 
que se fundamenta na objetividade não está só em detectar os conflitos e os impasses 
para o desenvolvimento, mas também preveni-los e gerar a capacidade de antecipar 
crises. Para isso, é necessária a administração tecnocrata, ou seja, especialistas nas áreas 
de governança. Para as mais diferentes especialidades que o Estado atua, deve haver um 
técnico ou um cientista para realizar a condução.
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Muitos governos se instituíram como voltados a esse propósito. Na história brasileira, 
o princípio do positivismo inspirou principalmente os militares, em especial do Exército. 
Crentes em um governo fundado na eficiência e na meritocracia, os militares tomaram 
o poder diversas vezes na defesa de uma modernização do Brasil por meio das teses po-
sitivas. Mesmo a Proclamação da República (1889), feita pelos militares, foi inspirada na 
purificação do regime, na moralização do Estado e na eficiência da máquina pública, ou 
seja, nas teses positivistas. O lema expresso na bandeira brasileira (Ordem e Progresso) 
é inspirado nas teses de Comte. A ordem científica promove o progresso humano.
O método defendido por Comte se sustenta nos mesmos critérios das Ciências Na-
turais. Para ele, o pesquisador dos fenômenos sociais deve se postar diante de seu objeto 
da mesma forma que o físico, o químico ou o biólogo. Deve-se ater, ainda, aos fatos ob-
serváveis, mensuráveis e que necessitam ser comparados e classificados. A objetividade 
é um critério fundamental para o cientista social positivista.
Outro aspecto importante do método positivo, que costumeiramente gera polêmica, 
é a neutralidade científica. Isto é, o pesquisador não pode se deixar envolver pelos valo-
res subjetivos, teológicos ou abstratos, que deturpem a análise do fenômeno ou que lhe 
imponha um julgamento prévio. A objetividade está ligada diretamente à neutralidade. 
Caso se dedique exclusivamente aos fatos observáveis, passíveis de mensuração, de 
proporcionalidade e de correlação objetiva com outros fenômenos a ele relacionados 
pela ligação direta e objetiva, o pesquisador atingirá a verdade. Um exemplo a ser consi-
derado é a prática do homicídio: por mais que haja repulsa moral à sua prática, ele existe 
ao longo da história, é uma constante social. Segundo Enzensberger (1995, p. 9), “os ani-
mais lutam, mas não fazem guerra. O homem é o único primata que planeja o extermínio 
dentro de sua própria espécie e o executa entusiasticamente e em grandes dimensões”.
Quantos fatos não são uma constante? O comportamento social se mantém em al-
gumas sociedades como uma necessidade da própria ordem. Um elemento que garante 
a eficiência da vida social. Esses fenômenos merecem um destaque maior na análise 
das diferentes sociedades. Se levarmos em consideração que o trabalho desempenha 
um papel vital para a manutenção da vida coletiva, em qualquer período histórico, ele é 
uma dessas constantes. O engraçado nos dias atuais é o quanto as pessoas desprezam a 
função do trabalho na construção de um projeto de estabilidade futura.
Comte, quando analisou a ordem econômica, considerava que o trabalho em uma 
sociedade complexa como a capitalista industrial, fundada em uma divisão de trabalho, 
necessita preparar os seus membros para cumprirem as diferentes funções que a vida 
social exige. Dessa forma, para ele, cabe ao Estado orientar o desenvolvimento de uma 
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sociedade, estimulando o trabalho especializado para que cada um dos seus membros 
se adéque às necessidades que a sociedade exige.
Em uma sociedade como a nossa, na qual discutimos a necessidade do trabalho 
técnico profissionalizante, as teses positivistas nos orientariam para o investimento na 
qualificação, ou seja, na promoção de um ensino voltado ao mercado de trabalho, nos 
mais diferentes níveis de conhecimento e grau de complexidade. Essa necessidade deve 
estar, para o positivismo, acima dos desejos particulares. Os cargos de comando social 
devem ser ocupados por quem tem uma qualificação de maior custo e tempo para o 
Estado, por isso, seria relegada a poucos. 
A escolha dos que deveriam ascender às funções mais importantes deve privilegiar o 
grau de eficiência com um critério de avaliação que priorize a competência para o cargo. 
Devem-se priorizar os benefícios da ordem social e não os interesses particulares, de setores 
determinados. Se determinados grupos estão sendo marginalizados, deve-se entender os 
fatores desta marginalização. Eles não devem, porém, colocar em riscoas prioridades da 
ordem. Não podemos estimular as diferenças em detrimento da ordem social eficiente.
A maturidade social não é algo fácil dentro de uma sociedade na qual as forças são 
diversas. Para Comte, a conquista de um desenvolvimento econômico em um grau mais 
elevado só pode ser alcançada após a sociedade atingir uma maturidade na capacidade de 
agir fundada na razão científica. Para ele, o crescimento do capitalismo está relacionado 
diretamente a isso. A economia só pode se desenvolver na condição da sociedade indus-
trial após o aprimoramento científico e técnico dos meios de produção. Dessa forma, o 
capitalismo é um estágio superior do desenvolvimento econômico, em especial quando 
se deixa levar pelas leis de mercado e se orientar por uma racionalidade científica.
A Lei dos Três Estágios
Um dos princípios fundamentais defendidos por Comte é a Lei dos Três Estágios. Nela, o 
autor busca a compreensão do desenvolvimento social mediante a presença do conheci-
mento científico na vida social. A Ciência está presente nas relações entre o homem e as 
instituições que servem de orientação para a ordem social. Também podemos considerar 
a própria explicação do homem sobre a natureza e os elementos que atingem diretamente 
sua relação com as leis naturais.
Por isso, anteriormente, as leis naturais desvendadas nas teses de Galileu e Bacon são 
elogiadas por Comte como uma conquista importante na busca de compreender as leis 
universais e orientar o homem para o conhecimento científico moderno, separando a 
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Ciência da Filosofia. Essa maturidade do pensamento, para ele, atingiu outros campos 
de conhecimento e hoje já estaria em seu grau satisfatório para ser usada na análise do 
desenvolvimento social humano.
Quais seriam, porém, esses estágios de desenvolvimento? O primeiro é o estado teo-
lógico, em que os fenômenos naturais só podem ser compreendidos com a crença em um 
elemento divino, que oriente a vida dos homens e promova as condições nas quais ele está 
inserido. Logo, o conhecimento que temos da vida e das coisas que nos cercam é considerado, 
neste estágio de desenvolvimento, como superficial. Esse estado permite ao homem uma ver-
dade carregada de princípios sustentáveis apenas se admitirmos a existência de uma entidade 
acima da capacidade de compreensão humana, que seria o verdadeiro condutor da vida.
O segundo é o estado da abstração, que, para Comte, desempenha o papel de pas-
sagem do estágio teológico para o físico, que veremos logo mais. Nele, o homem rompe 
com as explicações teológicas e estabelece uma relação racional com o mundo, tentando 
entendê-lo dentro de categorias lógicas. Esse estágio permite a análise pela cadeia de 
fenômenos observáveis, mas apenas de forma superficial, ainda sem uma comprovação 
empírica e que siga leis previamente estabelecidas pela observação.
O pensamento abstrato é resultado das condições de desenvolvimento da raciona-
lidade científica fundada em leis naturais. Os dados observáveis vêm daquilo que existe 
enquanto fenômeno, mas a compreensão de sua essência ainda não é entendida desta 
forma pelo pensamento abstrato. As regras do conhecimento não estão estabelecidas a 
partir das leis observáveis e nela se sustentam. 
Há leis naturais que regem os fenômenos para Comte, as quais devem ser os elementos 
que conduzem a observação. Contudo, resultam da pesquisa constante de comprovação de 
sua existência, como as leis da Física e da Química. Um avanço neste sentido só foi possível 
na sociedade atual. Nela, o pensador considera que a maturidade atingida pela Ciência já 
permite utilizar os métodos das ciências naturais para compreender os fenômenos sociais.
Por isso é necessário a compreensão sobre os fenômenos físicos, fundamentais para 
consolidar o desenvolvimento da Ciência. Eles já atingiram todos os níveis necessários 
nos demais campos dos conhecimentos, segundo Comte. Já se alcançou a maturidade 
do pensamento na Astronomia, Física, Química e Biologia (nas Ciências Naturais de 
uma forma geral). Agora, o próximo passo será o amadurecimento dos demais campos 
do conhecimento. Logo, para ele, não só a Sociologia seria o resultado do avanço das 
Ciências Naturais, mas também a Economia, a Política e, até mesmo, a Ética poderiam 
ser conduzidas pelos mesmos critérios das Ciências Naturais.
Diante dessa maturidade do pensamento físico e da possibilidade de um estágio supe-
rior da organização da vida social, a sociedade poderia atingir um progresso nunca visto 
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antes, que resultaria de uma harmonia estabelecida entre os diferentes órgãos (funções) 
sociais. Integrados e na busca de um mesmo sentido de ação, os organismos sociais resul-
tariam, então, em uma submissão ao órgão maior, o corpo social. 
Quem seria o condutor no sentido de integrar e dar eficiência à sociedade seria o Es-
tado. Este, administrado por políticos que conduzissem a sociedade para a superação de 
seus problemas de forma racional e objetiva; por isso, como comentamos anteriormente, 
a necessidade de positivar a política. O homem público deve ter uma ação fundada na 
objetividade do conhecimento e sua escolha deve se pautar na eficiência.
O estágio superior de organização da vida social é o estágio positivo, ou seja, aquele 
cujos fenômenos sociais podem ser compreendidos por meio da comprovação da pró-
pria ciência. O estágio positivo, para Comte, é o positivismo em si, o desenvolvimento 
máximo do seu modo de pensar a sociedade e, da mesma forma, a organização das 
ciências. A característica basilar deste estágio de desenvolvimento humano é, portanto, 
investigar a natureza e comprovar as descobertas realizadas de modo a garantir a aplica-
ção prática destas, levando ao desenvolvimento tecnológico e a mais conforto material. 
Último na escala do pensamento de Auguste Comte, o estágio positivo é direcionado 
à organização das teorias acerca da sociedade via física-social, ou seja, a partir da expli-
cação de uma ciência que possa analisar os movimentos dos corpos em/na sociedade. 
O positivismo, que, posteriormente, se tornou uma filosofia de vida e religião, em que a 
ciência era a máxima de seus dogmas, obteve muitos adeptos no Brasil, no contexto da 
Proclamação da República, em 1889. O lema da bandeira nacional (ordem e progresso) é 
uma derivação do lema do positivismo proposto por Comte: o amor por princípio, a ordem 
como base e o progresso por fim. Vale ressaltar que a religião positivista era vista como 
a “religião da humanidade”, uma espécie de profecia imanada por Comte, que imaginava 
angariar adeptos crentes em seus ideais.
O pensamento de Comte auxiliou no entendimento da vida social, oferecendo a 
possibilidade de formar um método de análise criterioso e com meios de mensurar os 
fenômenos sociais na mesma condição dos fenômenos naturais. Muitas dessas teses posi-
tivistas não só serão questionadas, mas também utilizadas ao longo do amadurecimento 
da Ciência fundada pelo pensador francês. Não se pode negar, porém, a importância que 
tiveram as primeiras bases de análise de Comte. Elas permitiram a busca por delimitar um 
campo de atuação para uma Ciência que tivesse como foco a vida social e seus fenômenos.
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Os fatos sociais devem ser tratados como coisas — eis a proposição fun-
damental de nosso método, e que mais tem provocado contradições. Esta 
assimilação que fazemos, das realidades do mundo social às realidades do 
mundo exterior, foi interpretada como paradoxal e escandalosa. Estabele-
ceu-se singular confusão a respeito do sentido e da extensão desta assimi-
lação; seu objetivo não é rebaixar formas superiores às formas inferiores do 
ser, e sim, ao contrário, reivindicar para as primeiras um grau de realidade 
pelo menos igual ao que todos reconhecem como apanágio das segundas. 
Com efeito, não afirmamos que os fatos sociais sejam coisas materiais, e 
sim que constituemcoisas ao mesmo título que as coisas materiais, embora 
de maneira diferente (DURKHEIM, 1960, p. 52).
Quando falamos da estranheza que o pesquisador social deve ter diante do objeto, ao 
tratá-lo na condição de “coisa material”, estamos levando em consideração aquilo que 
Durkheim expressa em sua citação acima: “com efeito, não afirmamos que os fatos so-
ciais sejam coisas materiais, e sim que constituem coisas ao mesmo título que as coisas 
materiais, embora de maneira diferente” (DURKHEIM, 1960, p. 52). 
Isso significa que os fenômenos sociais não podem ser considerados na mesma 
condição por não poderem ser analisados com a mesma condição dos fenômenos ma-
teriais. Estes podem ser extraídos da sociedade e levados a um laboratório para serem 
desmembrados, dissecados e estudados em suas partes decompostas, com a objetividade 
da observação descritiva e comparativa, o que seria impossível aos fenômenos sociais.
Não podemos reproduzir os fenômenos sociais em laboratório. Seria impossível 
isolá-los da condição social onde se realizam, já que estão presos à sociedade e somente 
nela é possível observá-los. Contudo, nem por isso, devemos deixar de tratá-los na con-
dição de coisa material. Para isso, devemos quantificá-los e proporcioná-los dentro da 
ordem em que se estabelecem. 
Com uma observação objetiva dos fenômenos sociais, podemos compreender os 
elementos que influenciam a sua condição. Para Durkheim, os fenômenos sociais são 
uma condição coletiva, que leva em consideração a coação e coesão social dentro da 
condição solidária em que se realiza.
É importante definir neste momento o termo “solidariedade”, que é a condição em 
que os fenômenos ocorrem, ou seja, a cumplicidade entre os agentes que proporcionam a 
existência dos fenômenos. Isso não indica a consciência por parte daqueles que praticam 
o ato. Se pensarmos na Educação e nos elementos que contribuem para que ela ocorra, 
nem todos têm a dimensão de que sua ação vai refletir na condição de educar.
As condições em que se realiza a Educação estão baseadas em fatos que interligados, 
de alguma forma, vão gerar os fatores que permitem que ela ocorra. Logo, o ambiente de 
educar e os condicionantes da educação não são apenas os seus agentes diretos (alunos, 
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Dinâmica social e pedagógica de Durkheim
Se entendermos, com Durkheim, a pedagogia como sendo a teorização, implícita ou ex-
plícita, da prática educativa, coloca-se, então, a questão de saber qual poderá ser a con-
tribuição da ciência da educação para a pedagogia. Mais precisamente, em que aspecto a 
sociologia da modernidade poderá inluenciar não somente a análise do sistema educati-
vo, mas também as pedagogias que nele são praticadas?
O fato de que a sociedade moderna funda-se sobre uma industrialização e uma divisão 
crescentes das tarefas traz como consequência uma diferenciação cada vez maior dos pa-
péis sociais, a especialização das funções sociais e, no im, um risco de ruptura da “solida-
riedade social”. Esse risco deve ser contrabalançado, diz Durkheim, pelo desenvolvimento 
dos valores supremos, os que dizem respeito à legitimação dos direitos, à responsabilida-
de e à vocação dos atores sociais.
Fonte: Filoux (2010, p. 19-20).
explorando Ideias
escola, professores, funcionários, currículo escolar etc.). Muito mais que isso, a Educa-
ção é resultado de uma complexidade social mais intensa e ampla. Uma relação que vai 
além dos muros da escola e que envolve a construção solidária de todos seus elementos. 
Os seres humanos que convivem dentro do ambiente escolar são resultado de outros 
fenômenos que os produzem, além do dia a dia de sala de aula.
Um aluno é filho ou pai, é jovem ou idoso, é casado ou solteiro, trabalha ou não, 
locomove-se mediante os meios de transportes dos mais variados. Todos esses fatores 
e muitos outros, os quais seria impossível relacionar, contribuem para o entendimento 
da educação como um fenômeno social. Podemos considerar pelos mesmos critérios a 
condição do professor, do diretor e de todos que estão envolvidos com a educação. Logo, 
se formos dimensionar a complexidade da construção da educação, ela só seria possível 
diante de um estudo profundo e demorado, por meio de uma observação minuciosa de 
todos seus elementos condicionantes. É sempre bom lembrar, porém, que os elementos 
condicionantes aqui considerados são fatos na condição de coisa material.
Outro elemento importante a ser considerado é a condição em que a sociedade organiza 
a sua vida material. Durkheim busca no entendimento da divisão do trabalho social a 
premissa para a compreensão dos fenômenos que a sociedade produz. As sociedades, 
ao longo da história, promoveram um crescimento da divisão do trabalho e se organiza-
ram de forma cada vez mais complexa. Nas sociedades industriais, segundo o pensador 
francês, a divisão do trabalho social atingiu um grau intenso e extenso, o que promoveu 
uma tensão entre os elementos que a compõe. Contudo, e pela divisão social do traba-
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lho, não podemos considerar a particularidade e a individualidade como critério para 
o entendimento da ordem social e dos fatos que ela produz.
Quanto mais a sociedade divide suas funções, mais a particularidade perde sentido 
como referência para o entendimento do corpo social, ou seja, não está no comporta-
mento do indivíduo um padrão para o comportamento coletivo, quando falamos de 
sociedades com um alto grau de divisão do trabalho social. Na sociedade industrial, a 
condição de vida para atender às necessidades dos membros da sociedade é fruto de um 
número imenso de indivíduos e, por isso, não é no olhar sobre esse elemento particular 
que vamos entender a vida social.
Se abrirmos a geladeira em nossa casa e olharmos os produtos que estão à nossa 
volta, dos mais elementares aos de uso fútil, iremos perceber que há uma quantidade 
imensa de trabalho coletivo para a existência deles. Seria impossível quantificar o nú-
mero de indivíduos que participam da produção diária de nossas vidas. Logo, nem nós, 
nem cada um desses indivíduos, têm em seu comportamento o padrão da vida social, 
ela é o encontro solidário de todos esses elementos enquanto um organismo que gera 
as condições de todos e de cada um.
As formas de solidariedade
A solidariedade é o conjunto dos agentes sociais que produzem a vida humana, não 
sendo um encontro espontâneo e carregado de afetividade, mas uma condição típica das 
sociedades humanas e da organização física da vida social. Ser solidário é estar ligado à 
sociedade diretamente ou integrado por uma cadeia de relações estabelecidas entre as 
diferentes instituições sociais que a compõe. O homem é um ser social e está ligado à 
dependência dos membros de uma coletividade, assim como constrói o sentido de sua 
existência dentro desta coletividade. Podemos considerar que a sociedade constrói e 
determina a condição individual. O homem é uma concessão social.
Durkheim procura esclarecer que há uma diferença fundamental entre o objeto de estu-
do da Sociologia (que é o fato social) e da Psicologia (voltada a entender o comportamento 
individual). Ele estabelece um parâmetro para diferenciar os dois campos de conhecimento:
A proposição que se apresenta os fenômenos sociais como exteriores aos 
indivíduos não foi menos vivamente discutida do que a precedente. Já nos 
concedem hoje, com assaz boa vontade, a existência de certo grau de hete-
rogeneidade entre os fatos da vida individual e os da vida coletiva; pode-se 
mesmo dizer que um acordo, se não unânime, pelo menos muito geral, está 
nesse ponto em vias de se conseguir. Não existem mais quase sociólogos que 
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neguem à Sociologia toda e qualquer especificidade. Mas, porque a socie-
dade é composta de indivíduos, parece ao senso comum que a vida social 
não pode ter outro substrato senão a consciência individual; caso contrário, 
como que ficaria no ar,planando no vácuo.
Contudo, admite-se correntemente nos outros reinos da natureza aquilo que 
com tanta facilidade julgamos inadmissível ao se tratar dos fatos sociais. Todas 
as vezes que, ao se combinarem e devido à combinação, quaisquer elementos 
desencadeiam fenômenos novos, não se pode deixar de conceber que estes são 
contidos, não nos elementos, mas no todo formado pela união. [...]
Ao aplicarmos ao mesmo princípio à Sociologia. Se a síntese sui generis que 
constitui toda sociedade desenvolve fenômenos novos, diferentes daqueles que 
se passam nas consciências solitárias (ponto cuja admissão já alcançamos), con-
corde-se também que a sede de tais fatos específicos e a própria sociedade que os 
produz, e não as partes desta, isto é, seus membros (DURKHEIM, 2002, p. 23-4).
Logo, a sociedade é uma formação da coletividade estabelecida dentro de uma relação 
entre instituições e indivíduos que provocam os fenômenos sociais ao se encontrarem 
dentro de determinados ambientes, como agentes químicos que se misturam em deter-
minadas condições e provocam, por isso, reações que só podem ser explicadas com aque-
les elementos determinados e suas condições. Por isso, os fenômenos sociais obedecem 
às mesmas leis dos fenômenos naturais. É preciso compreender o ambiente e as relações 
que determinados agentes propiciam e os fenômenos a elas relacionados.
Para compreendermos a complexidade dessas relações, temos que considerar que há dois 
tipos de solidariedade estabelecida por Durkheim: a primeira liga diretamente o indivíduo à 
sociedade, o que chamamos de solidariedade mecânica. A segunda, só pode ser entendida na 
complexidade das relações sociais em sua divisão do trabalho social, na qual o indivíduo é 
apenas um componente dentro da complexa cadeia de dependência – a solidariedade orgâni-
ca. Nesta, o indivíduo exalta suas particularidades e parece negar sua relação com a sociedade.
Durkheim define assim as duas formas de solidariedade:
Como a solidariedade negativa não produz por mesma nenhuma integração 
e, além disso, não tem nada de específico, reconhecemos somente duas espé-
cies de solidariedade positiva, nas quais se notam as seguintes características:
1) A primeira liga diretamente o indivíduo à sociedade, sem nenhum in-
termediário. Na segunda, ele depende da sociedade porque depende das 
partes que a compõem.
2) A sociedade não é vista sob o mesmo aspecto nos dois casos. No pri-
meiro, o que chamamos por esse nome é um conjunto mais ou menos or-
ganizado de crenças e sentimentos comuns a todos os membros do grupo: 
o tipo coletivo. No segundo caso, ao contrário, a sociedade na qual somos 
solidários é um sistema de funções diferentes e especiais, que unem rela-
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ções definidas. Essas duas sociedades são apenas uma. São duas faces de 
uma única e mesma realidade, mas nem por isso têm menos necessidade 
de ser distinguidos (DURKHEIM, 2002, p. 27).
Aqui, Durkheim estabelece um paralelo entre as duas formas de solidariedade. A primeira, 
mecânica, está ligando diretamente o indivíduo à sociedade por apresentar uma baixa 
divisão social do trabalho, ou seja, a dependência entre os elementos sociais é pequena, 
desta forma, a individualidade não se exalta e não contraria as formas de identificação 
com a sociedade. Logo, o sentimento de pertencimento e a fusão entre as crenças sociais e 
particulares são elevadas. Essa forma de organização é típica das sociedades primitivas, não 
só estando presente na vida social de cada um, mas também se expressando na coletividade.
Um dos exemplos usados pelo próprio Durkheim são as sociedades primitivas, orga-
nizações humanas que vivem em um sistema tribal, onde não há uma complexa divisão 
do trabalho social. Nelas, principalmente, prevalece a divisão natural do trabalho, ou seja, 
a divisão entre o trabalho masculino e feminino. Além disso, a condição de trabalho está 
ligada diretamente a todas as outras condições e instituições que a sociedade estabelece. 
A simplicidade das relações condiciona o homem para uma vida particular em sintonia 
constante com o interesse coletivo. O que uma mulher faz em uma coletividade primitiva 
todas as outras fazem. Assim também os homens.
Nessas sociedades, o pai é o chefe de família e também o líder religioso, o orienta-
dor para a vida do trabalho, para a vida moral e para a vida sexual. Há uma reprodução 
constante das atividades que se simplificam em uma conduta única. Um homem e uma 
mulher reproduzem em sua vida praticamente todas as funções coletivas em sua vida 
privada. Se compararmos com nossa sociedade, nós não produzimos em nossas vidas as 
funções vitais de nossa coletividade. Isso porque seria impossível ser, ao mesmo tempo, 
o professor, o médico, o educador, o líder religioso, o juiz, o policial, o pai, o soldado etc.
Em nossa sociedade, as atividades que nos sustentam estão divididas, dessa forma, 
não reproduzimos os papéis necessários para nossa própria existência. Não seria pos-
sível quantificar os indivíduos que participaram da produção do computador que uso 
agora para poder produzir este livro. Talvez um número bem maior que uma cidade de 
média proporção. Se analisarmos as condições que o fazem ser usado neste momento, 
a energia elétrica, a mesa e a cadeira que me servem de suporte para este trabalho, os 
livros, a lâmpada, as canetas, o papel, a impressora, enfim, uma imensidão de elementos 
que produzem diariamente a existência de outros tantos. Por isso, nossa sociedade é 
orgânica, diferente das sociedades primitivas, onde predomina a solidariedade mecânica.
A essa dinâmica das sociedades (solidárias mecânicas e orgânicas), é preciso acres-
centar outros ingredientes: a coesão, a coação, a unidade e o condicionamento. Trata-se 
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de uma relação vital na formação do indivíduo dentro do corpo social, para que as fun-
ções necessárias à vida coletiva sejam produzidas. Nela se estabelece a necessidade do 
todo e a de cada um. Em condições diferentes e, muitas vezes, aparentemente antagônicas.
É importante entender como esses elementos se dão e o que eles significam. A coesão 
é a unidade de ação de diversos agentes em um mesmo sentido. Imagine a densidade de 
uma mesa e o quanto é difícil romper sua unidade, ou seja, quebrá-la requer um grau ele-
vado de força. Logo, se formos pensar por que a madeira é resistente, podemos concluir 
que há uma grande coesão (unidade) entre suas moléculas. Assim, as moléculas de uma 
mesa são mais resistentes à coação por serem mais coesas. Se pensarmos em uma folha de 
papel, chegaremos à conclusão oposta, ela é mais flexível por ter moléculas menos coesas 
e, dessa forma, resiste menos à coação. Basta uma pequena força e você pode rasgá-la.
Em um movimento grevista, no qual há um grau elevado de adesão de trabalhadores 
a uma paralisação, há um grau elevado de coesão. Portanto, romper o movimento, pres-
sionar os trabalhadores a voltarem ao trabalho sem atender as suas reivindicações seria 
difícil e exigiria grau elevado de coação. Um aparato policial dispersando manifestantes 
em uma passeata seria um bom exemplo de coação. Por isso, imagine o papel do Estado 
como agente de coação para garantir a ordem social e o quanto, também, pode ser uma 
expressão de coesão. Ao executar uma sentença e promover a justiça sob um valor que 
une a maioria dos elementos sociais que se sentem atingidos pelo crime cometido e 
reagem com a sentença aplicada, há uma coesão social.
Em sala de aula, a manutenção da disciplina para o desenvolvimento de um conte-
údo é, ao mesmo tempo, fruto das partes que executam a prática educativa (professor e 
alunos) e da unidade que eles estabelecem para executar a função para as quais existem. 
Quanto mais coesos neste sentido forem os membros que executam a Educação, mais 
eficiente ela será e menos espaço para ações contrárias. Quem tentar a indisciplina será 
coagido tanto pelos iguais como pelos diferentes.

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