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Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 1 DOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO RECEPTAÇÃO (ART. 180) TIPO PENAL O art. 180, caput, do Código Penal tem a seguinte redação: Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. ESPÉCIES A doutrina classifica a receptação em: Ø Própria: é a espécie que ocorre quando o agente, sabendo a origem ilícita do bem, pratica algum dos núcleos do tipo penal (adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar). Por exemplo, “A” adquire uma bicicleta que sabe ser produto de crime. Ø Imprópria: é a espécie em que o agente não é o receptador, mas aquele que influi o terceiro de boa-fé a adquirir o produto do crime. Por exemplo, “A” adquire um aparelho celular por recomendação de seu amigo “B”. Contudo, “B” conhecia o vendedor “C” e sabia que este havia furtado o equipamento de terceiro. CARACTERÍSTICAS MUITO IMPORTANTE A receptação é um crime acessório (ou parasitário), pois depende da existência de um crime antecedente. Dessa forma, não há falar em adquirir produto de crime se não houve a prática de um crime antecedente. Apesar dessa relação de acessoriedade, é importante destacar que a receptação é um crime autônomo. Essa autonomia se fundamenta na ausência de prejudicialidade entre os dois delitos (antecedente e receptação). Assim, pouco importa se não foi possível identificar o autor do crime antecedente, aliás, este pode até ter sido isento de pena, tais circunstâncias não influenciam na apuração do crime de receptação. É o que consta no art. 180, §4º, do Código Penal: Art. 180, § 4º - A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa. RECEPTAÇÃO QUALIFICADA O art. 180, §§ 1º e 2º, do Código Penal tem a seguinte redação: Art. 180, § 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime: Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa. § 2º - Equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência. A receptação qualificada se caracteriza pela conduta do agente que pratica o crime no exercício de atividade comercia ou industrial. Daí dizer que essa modalidade é classificada como crime próprio, pois exige a determinada qualidade de seu sujeito ativo. DÚVIDA: Há inconstitucionalidade na receptação qualificada em razão da desproporcionalidade da pena e o dolo eventual (“deve saber ser produto de crime”)? MUITO IMPORTANTE Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 2 A resposta é NÃO. Havia uma corrente minoritária que distinguia a receptação simples e qualificada em razão da espécie de dolo. Assim, para tal corrente, caso o agente soubesse a origem do produto (dolo direto), deveria responder pela receptação simples. Por outro lado, caso ocorresse o dolo eventual, expresso no “deve saber”, o agente responderia pela modalidade qualificada, circunstância que evidenciaria desproporcionalidade na reprimenda. Contudo, essa não foi a tese acolhida nos Tribunais Superiores. Assim, a jurisprudência firmou-se no sentido de que a maior reprimenda na receptação qualificada está no fato do delito ser praticado no exercício de atividade comercial ou industrial, admitindo-se, para tanto, o dolo direto e o eventual. RECEPTAÇÃO CULPOSA O art. 180, §3º, do Código Penal tem a seguinte redação: Art. 180, § 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso: Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas. A receptação admite a modalidade culposa que ocorre quando o agente adquire ou recebe a coisa, ainda que devesse presumir a origem ilícita do produto. Segundo o dispositivo legal, são 03 critérios adotados para analisar a conduta culposa do agente: Destaca-se, ainda, que a receptação culposa admite o perdão judicial, nos termos do art. 180, §5º, do Código Penal: Art. 180, § 5º - Na hipótese do § 3º, se o criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. Na receptação dolosa aplica-se o disposto no § 2º do art. 155. ELEMENTO SUBJETIVO NO CRIME DE RECEPTAÇÃO Como visto anteriormente, o crime de receptação, em sua modalidade simples, exige o dolo direto, ou seja, o agente pratica qualquer dos núcleos do tipo penal, sabendo que adquire produto de crime. Por outro lado, a receptação qualificada, reservada à conduta mais grave daquele que comete o crime no exercício de atividade comercial ou industrial, aceita o dolo indireto eventual, já que basta que o agente “deva saber” a origem ilícita do produto. Por fim, a receptação culposa sugere que as circunstâncias em que se deu a aquisição ou o recebimento da coisa que fariam o agente presumir a origem ilícita do produto. RECEPTAÇÃO CULPOSA Natureza da coisa Desproporção entre o valor e o preço Condição de quem a oferece RECEPTAÇÃO SIMPLES O agente sabe. (dolo direto) RECEPTAÇÃO QUALIFICADA O agente sabe ou deveria saber. (dolo eventual) Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 3 ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS CONCEITO A escusa absolutória é um instituto previsto no Código Penal que busca harmonizar a proteção do patrimônio e a relação familiar existente entre os sujeitos envolvidos no delito. Dessa forma, a depender do grau de parentesco, a repressão penal cede espaço à proteção dos laços familiares (isenção de pena) ou, ao menos, permite que a vítima decida se quer dar prosseguimento à persecução penal (necessidade de representação). ESPÉCIES As duas espécies de escusas absolutórias estão previstas nos arts. 181 e 182, ambos, do Código Penal: Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo: I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal; II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural. Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo: I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II - de irmão, legítimo ou ilegítimo; III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita. Nesse sentido: EXCEÇÕES À APLICAÇÃO DAS ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS O art. 183 do Código Penal apresenta as hipóteses que não serão permitidas a incidência das escusas absolutórias: Art. 183 - Não se aplica o disposto nos dois artigos anteriores: I - se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de grave ameaça ou violência à pessoa; II - ao estranho que participa do crime. III – se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos. Nesse sentido, é possível sintetizar as exceções no seguinte esquema: DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICAPRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA RECEPTAÇÃO CULPOSA O agente deveria presumir. ISENÇÃO DE PENA Cônjuge Ascendente ou descendente REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO Ex-cônjuge Irmão Tio ou sobrinho (coabitação) EXCEÇÕES Violência ou grave ameaça Estranho (sem vínculo de parentesco) Idoso (idade igual ou superior a 60 anos) Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 4 MUITO IMPORTANTE Os crimes praticados contra a Administração Pública envolvem a violação de diversos bens jurídicos, com especial destaque à moralidade e probidade, bens jurídicos intransigíveis, ou seja, que não podem ser relativizados. Sob tal fundamento, o princípio da insignificância seria incompatível com os crimes contra a Administração Pública, entendimento, inclusive, sumulado pelo STJ. MUITO IMPORTANTE: Súmula nº 599 - O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública. Por outro lado, cumpre salientar que o STF, em situações excepcionais, já permitiu a aplicação do princípio da insignificância para crimes contra a Administração Pública. MUITO IMPORTANTE: De toda forma, para fins de concurso público, sobretudo, para a Banca CESPE, adotem o entendimento sumulado do STJ. DÚVIDA: É possível aplicar o princípio da insignificância para o crime de descaminho (CP, art. 334)? A resposta é SIM. Não obstante o crime de descaminho estar no capítulo “dos crimes praticados por particular contra a Administração em geral”, tanto STF, quanto STJ, admitem a aplicação do princípio da insignificância. A justifica passa pelo forte viés arrecadatório/tributário do tipo penal do art. 334 do CP, razão pela qual, como ocorre nos crimes tributários, admite-se a bagatela para o descaminho. FUNCIONÁRIO PÚBLICO CONCEITO MUITO IMPORTANTE O art. 327, caput, do Código Penal traz o conceito legal de funcionário público: Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. Da leitura do dispositivo legal, percebe-se que o legislador apresentou um conceito abrangente de funcionário público. O motivo é simples. Em regra, as sanções penais dirigidas aos funcionários públicos são mais severas, isso por conta da maior reprovabilidade de sua conduta, que viola bens jurídicos de grande relevância, tais como a moralidade, probidade e fé pública. Por exemplo, basta comparar o tipo penal do art. 168 do CP (apropriação indébita) e o peculato- apropriação (CP, art. 312, caput). Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. STF Em situações excepcionais, aplica-se o princípio da insignificância STJ Não se aplica o princípio da insignificância (Súmula nº 599) FUNCIONÁRIO PÚBLICO Cargo, emprego ou função pública Transitoriedade Sem remuneração Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 5 Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo (...): Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa. A principal diferença entre os tipos penais é a condição de funcionário público do peculato- apropriação, circunstância suficiente para elevar, em muito, a pena do delito em comparação à apropriação indébita. DÚVIDA: O estagiário de órgão ou entidade pública é considerado funcionário público para fins penais? A resposta é SIM. Segundo a jurisprudência do STJ, o estagiário de órgão ou entidade pública, ainda que não remunerado, é considerado funcionário público para fins penais. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, estagiário da Caixa Econômica Federal, transfere dinheiro da conta dos correntistas para contas bancárias de seus parentes. No exemplo acima, “A” responderá pelo crime de peculato, ao invés de furto, já que se trata de funcionário público para fins penais. FUNCIONÁRIO PÚBLICO POR EQUIPARAÇÃO O art. 327, §1º, do Código Penal traz o conceito legal de funcionário público por equiparação: Art. 327, § 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000) DÚVIDA: Se o conceito de funcionário público previsto no art. 327, caput, do CP é abrangente, qual a finalidade do equiparado ao funcionário público (CP, art. 327, §1º)? O conceito de funcionário público (CP, art. 327, caput), apesar de abrangente, exige relação direta entre o agente e a Administração Pública. Por outro lado, o equiparado a funcionário público (CP, art. 327, §1º) não preenche um cargo, emprego ou função pública, mas está vinculado, ainda que indiretamente, à Administração Pública. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: Um médico de hospital particular, mas conveniado ao SUS, é funcionário público por equiparação. DÚVIDA: Um funcionário de empresa contratada para prestação de serviços de limpeza de um órgão público é considerado funcionário público por equiparação? A resposta é NÃO. O art. 327, §1º, do Código Penal exige que a empresa prestadora de serviços seja contratada para a execução de atividade típica da Administração Pública, que não é o caso do serviço de limpeza de repartições públicas. CAUSA DE AUMENTO DE PENA O art. 327, §2º, do Código Penal traz uma hipótese de aumento de pena para os crimes praticados por funcionário público contra a Administração Pública: Art. 327, § 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. O dispositivo legal prevê o aumento de 1/3 caso o funcionário público exerça cargo em comissão ou função de direção ou assessoramento. A ideia é simples: punir com mais rigor aquele que exerce função de superior hierárquico ou de confiança. DÚVIDA: É possível aplicar a causa de aumento de pena do art. 327, §2º, do CP, ao agente que exerce mandato eletivo? A resposta é SIM. Segundo o STF, é plenamente possível incidir a causa de aumento de pena para o Chefe do Poder Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 6 Executivo, que tem a função de direção da Administração Pública direta. DÚVIDA: O simples fato de o agente exercer um cargo eletivo é suficiente para incidir a causa de aumento de pena do art. 327, §2º, do CP? A resposta é NÃO. Segundo o STF, o simples fato de o réu exercer um mandato popular não é suficiente para incidir a causa de aumento do art. 327, §2º, do CP. Para o Tribunal, é necessário que ele ocupe uma posição de superior hierárquico. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: Um deputado federal, que foi ex-presidente da Casa, é condenado pela prática do crime do peculato. No exemplo acima, a causa de aumento de pena é aplicável em razão do réu ter ocupado o cargo de presidente da Câmara dos Deputados e não pelo simples fato de ter exercido o mandato eletivo. DÚVIDA: A causa de aumento de pena do art. 327, §2º, do CP é aplicável aos dirigentes de autarquias? A resposta é NÃO. O art. 327, §2º, do CP elenca apenasas hipóteses de: órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação. Nesse sentido, conforme entendimento do STF, em apreço ao princípio da legalidade, não é possível incidir a causa de aumento de pena para as autarquias. ART. 30 DO CÓDIGO PENAL – COMUNICABILIDADE COM O PARTICULAR MUITO IMPORTANTE O art. 30 do Código Penal traz a seguinte redação: Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime. Os crimes praticados por funcionário público contra a Administração Pública têm a circunstância subjetiva (funcionário público) como elementar do crime, ou seja, se ausente, desclassifica o tipo penal ou leva à atipicidade. Dessa forma, caso o crime seja praticado em concurso de pessoas (coautoria ou participação) com um particular, este responderá pelo crime funcional em razão do art. 30 do Código Penal. Obviamente, para que haja a comunicabilidade, é imprescindível que o particular tenha conhecimento da condição de funcionário público do comparsa. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, funcionário público, subtrai diversos equipamentos eletrônicos da repartição com auxílio de “B”, particular. No exemplo acima, “B”, caso tenha conhecimento da condição de funcionário público de “A”, responderá pelo crime de peculato. PECULATO DOLOSO CONCEITO O crime de peculato é previsto no art. 312 do Código Penal, nos seguintes termos: Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa. § 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário. Da redação do dispositivo legal, é possível observar que se trata do tipo penal que visa reprimir a dilapidação do patrimônio público praticado pelo funcionário público, ou, ao menos, com seu auxílio. ESPÉCIES A doutrina classifica o peculato doloso em 03 (três) espécies distintas: Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 7 O peculato-apropriação (CP, art. 312, caput, parte inicial) ocorre quando o agente se apropria de bem (público ou particular) que está em sua posse em razão do cargo. O peculato-apropriação é espécie de apropriação indébita (CP, art. 168) praticada por funcionário público. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, policial federal, vende sua arma funcional para quitar uma dívida com agiota. Por outro lado, o peculato-desvio (CP, art. 312, caput, parte final) ocorre quando o agente público reverte o patrimônio público em proveito próprio ou alheio. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “B”, funcionário público, recebe o pagamento de diárias relativas a viagens não realizadas. Por fim, o peculato-furto (CP, art. 312, §1º) ocorre quando o agente público, sem ter a posse, subtrai ou concorre para que terceiro o faça, sempre, se valendo da condição de funcionário público. O peculato-furto é espécie de furto (CP, art. 168) praticada/auxiliada por funcionário público. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “C”, funcionário público, deliberadamente, deixa a porta da repartição pública aberta para que “D”, posteriormente, possa subtrair os equipamentos eletrônicos do local. PECULATO DE USO TEMA DE APROFUNDAMENTO Como visto acima, o Código Penal brasileiro contempla 03 (três) espécies de peculato doloso, sendo certo que, em nenhuma delas, é abordado o chamado peculato de uso. Em linhas gerais, o legislador quis reprimir as condutas de “apropriar-se”, “desviar” e “subtrair” o patrimônio público, contudo, seria possível atribuir responsabilização penal para o agente que “usa” um bem público de forma particular? SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, policial, utiliza a viatura para realizar atividades particulares. DÚVIDA: É típica a conduta de “peculato de uso” de um veículo para a realização de deslocamentos por interesse particular? A resposta é NÃO. Segundo a jurisprudência majoritária dos Tribunais Superiores, é atípica a conduta de utilização de veículo oficial para deslocamentos por interesse particular. Nesse sentido, por ausência de previsão legal, a conduta descrita como “peculato de uso” não é típica. É importante registrar que, apesar de não configurar um ilícito penal, a conduta acima descrita amolda-se ao ato de improbidade administrativa, devendo o agente público ser responsabilizado na seara cível e administrativa. DÚVIDA: Mas em relação à gasolina utilizada, seria possível configurar o crime de peculato? A resposta é depende. Caso o consumo de combustível seja expressivo, o agente poderá, em tese, responder pelo peculato da gasolina gasta no deslocamento. DÚVIDA: Quer dizer que o peculato de uso não é figura típica no Direito Penal brasileiro? A resposta é NÃO. O peculato de uso é tipificado no Decreto-Lei nº 201/67, nos seguintes termos: Art. 1º, do Decreto-Lei nº 201/67 - São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao ESPÉCIES Peculato- apropriação Peculato- desvio Peculato- furto Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 8 julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: (...) II - utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos; Do dispositivo legal, o peculato de uso é crime previsto, especificamente, para o Prefeito Municipal, não sendo possível estender sua aplicabilidade aos demais agentes públicos em razão do princípio da taxatividade. PECULATO CULPOSO CONCEITO O crime de peculato culposo está previsto no art. 312, §2º, do CP, nos seguintes termos: Art. 312, § 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano. Como é sabido, a modalidade culposa é algo excepcional no Direito Penal, já que a regra é a repressão de condutas voluntárias e conscientes à prática de um crime. Contudo, em determinadas situações, o resultado danoso é tão grave que, ainda que o agente não tivesse a intenção de praticar a conduta (culpa), o Direito Penal acaba por cominar uma reprimenda. Dessa forma, o peculato culposo ocorre quando o agente não tinha a intenção de causar prejuízo ao erário, porém, devido ao seu agir culposo, permite que terceiro o faça. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, funcionário público, paga um alvará judicial a “B”, que se identificou com um documento falso. No exemplo acima, caso “A” não tenha conferido o cartão de assinatura ou outro documento idôneo para confirmar a identidade de “B”, aquele deverá responder pelo crime de peculato culposo. REPARAÇÃO DO DANO O art. 312, §3º, do Código Penal traz a hipótese de reparação de dano pelo agente, nos seguintes termos: Art. 312, § 3º - No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta. Inicialmente, chama-se atenção ao fato de que os efeitos da reparação do dano elencados no art. 312, §3º, do CP são exclusivos para o peculato culposo. Ademais, é importante destacar que o marco temporal do efeito causado pelareparação de dano é a sentença irrecorrível (S.I) Assim: OBS: Apesar de possuir significado distinto, é comum que as questões de concursos públicos utilizem a expressão “sentença com trânsito em julgado” como sinônimo de “sentença irrecorrível”. PECULATO MEDIANTE ERRO DE OUTREM (PECULATO-ESTELIONATO) CONCEITO O crime de peculato mediante erro de outrem, também conhecido como peculato-estelionato, está previsto no art. 313 do Código Penal, nos seguintes termos: Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A” procura o DETRAN para pagamento de uma multa de trânsito e entrega o valor ao servidor público “B”. Como é sabido, o pagamento de multa se dá por meio de guia de recolhimento, assim, caso “B” se aproprie do dinheiro entregue por “A”, que desconhecia a forma de quitação, responderá pelo crime de peculato por erro de outrem. ANTES S.I Extinção da punibilidade DEPOIS S.I Redução da pena (1/2) Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 9 INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÕES CONCEITO O crime de inserção de dados falsos em sistema de informações, conhecido como peculato eletrônico, está previsto no art. 313-A do Código Penal: Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Com a modernização da Administração Pública, hoje, informações relevantes são armazenadas em sistemas informatizados ou em banco de dados. Assim, o crime do art. 313-A do Código Penal visa reprimir a conduta do funcionário público que insere dados falsos (ou facilita a inserção), em tais sistemas. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: Uma das fraudes comuns contra o INSS ocorre quando o funcionário público da autarquia previdenciária lança registros de vínculo empregatício inexistente no CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais), possibilitando que indivíduos consigam obter benefícios previdenciários fraudulentos. CARACTERÍSTICAS As principais características do tipo penal do art. 313-A do Código Penal são: MODIFICAÇÃO OU ALTERAÇÃO NÃO AUTORIZADA DE SISTEMA DE INFORMAÇÕES CONCEITO O crime de modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações está previsto no art. 313-B do Código Penal: Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, funcionário público, por conta própria e sem autorização, altera o sistema de informação da repartição pública em que exerce suas atividades para permitir o acesso a jogos online em seu terminal de trabalho. CARACTERÍSTICAS As principais características do tipo penal do art. 313-B do Código Penal são: CAUSA DE AUMENTO DE PENA O art. 313-B, parágrafo único, do Código penal traz hipótese de aumento de pena nos seguintes termos: Art. 313-B, Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado. CONDUTA: Inserir ou facilitar a inserção INFORMAÇÃO: Dados falsos SUJEITO ATIVO: Funcionário autorizado DOLO ESPECÍFICO: Obter vantagem indevida ou causar dano CONDUTA: Modificar ou alterar INFORMAÇÃO: Sistema de informações ou programa de informática SUJEITO ATIVO: Funcionário Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 10 É bastante interessante observar que o art. 313-B do Código Penal não exige um dolo específico, como ocorre no art. 313-A. Na realidade, se a conduta praticada resultar em dano, haverá hipótese de aumento de pena. EMPREGO IRREGULAR DE VERBAS OU RENDAS PÚBLICAS CONCEITO O crime de emprego irregular de verbas ou rendas públicas está previsto no art. 315 do Código Penal: Art. 315 - Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei: Pena - detenção, de um a três meses, ou multa. DIFERENÇAS: PECULATO X EMPREGO IRREGULAR DE VERBAS OU RENDAS PÚBLICAS CONCUSSÃO (ART. 316, CAPUT) TIPO LEGAL ALTERAÇÃO LEGISLATIVA: LEI Nº 13.964/2019 (PACOTE ANTICRIMES) O crime de concussão é previsto no art. 316 do Código Penal, nos seguintes termos: Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019) A Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrimes) alterou o preceito secundário (pena) do art. 316 do Código Penal, elevando a pena máxima ao mesmo patamar do crime de corrupção passiva (CP, art. 317). CARACTERÍSTICAS Trata-se de tipo penal que tutela a moralidade administrativa e reprime a conduta do funcionário público que, valendo-se de seu cargo, exige vantagem indevida da vítima. Do dispositivo legal, verifica-se que o agente não precisa estar no exercício da função pública, já que o crime se configura mesmo fora ou antes de assumi-la. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, no curso de formação, aborda “B” e, identificando-se como policial, exige vantagem indevida da vítima. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, fiscal de vigilância sanitária, em gozo de licença para tratar de assuntos pessoais, exige vantagem indevida de “B”, dono de um restaurante, para não lavrar um auto de infração. DÚVIDA: Configura o crime de concussão quando o agente, passando-se por funcionário público, exige vantagem indevida da vítima? MUITO IMPORTANTE A resposta é NÃO. Como visto anteriormente, ocorre a concussão quando o agente se vale da função pública mesmo fora do exercício ou antes de assumi-la. Contudo, há necessidade da existência do vínculo jurídico ou, no mínimo, a expectativa disso (nomeação). No caso concreto, como o agente apenas se fez passar por funcionário público, a conduta tipifica o crime de usurpação de função pública (CP, art. 328). Art. 328 - Usurpar o exercício de função pública: Pena - detenção, de três meses a dois anos, e multa. Parágrafo único - Se do fato o agente aufere vantagem: Pena - reclusão, de dois a cinco anos, e multa. PECULATO Destinação própria ou para terceiro EMPREGO IRREGULAR DE VERBAS PÚBLICAS Destinção pública Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 11 A concussão possui alguns elementos comuns a outros tipos penais, razão pela qual serão apresentados os comparativos. DÚVIDA: Qual a diferença entre a concussão e a corrupção passiva? O elemento comum entre os tipos penais é o fato do agente, em razão da função pública, tentar obter vantagem indevida da vítima. Todavia, ao analisar a corrupção passiva (CP, art. 317), verifica-se que os núcleos dos tipos penais são bem distintos da concussão: Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dois)a 12 (doze) anos, e multa. Assim, resumidamente: Vale lembrar que a diferença de reprimenda entre os tipos penais foi ajustada com a Lei nº 13.964/19, que elevou a pena da concussão ao mesmo patamar da corrupção passiva. DÚVIDA: O funcionário público que exigir, mediante violência ou grave ameaça, vantagem indevida em razão do cargo comete o crime de concussão? MUITO IMPORTANTE A resposta é NÃO. A exigência de vantagem indevida com emprego de violência ou grave ameaça desclassifica o crime funcional de concussão para o crime de extorsão. Art. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. É importante ter cuidado com algumas questões de concurso que apresentam essa “pegadinha”. (CESPE/2014 – TJ-SE – Técnico Judiciário) - Em relação às causas extintivas da punibilidade e aos crimes contra a administração pública, julgue o item que se segue. Cometerá o crime de concussão o funcionário público que, utilizando-se de grave ameaça e em razão da função pública que ocupar, exigir de alguém vantagem indevida. Evidentemente, a intenção da banca foi induzir o candidato a assinalar a resposta como “correto”. Contudo, a assertiva está errada. CONSUMAÇÃO A concussão é classificada como crime formal. Dessa forma, o crime se consuma no momento em que o agente exige a vantagem indevida, ainda que esta venha a ser paga em momento posterior. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, em razão de sua função pública, exige vantagem indevida de “B”. Como “B” não tinha a quantia a ser paga naquele momento, ajustou a entrega para o dia seguinte. No exemplo acima, o crime se consumou no momento em que o agente exigiu a vantagem, sendo certo que o recebimento da vantagem indevida é mero exaurimento. EXCESSO DE EXAÇÃO (ART. 316, §1º) TIPO LEGAL CONCUSSÃO Obter vantagem indevida Exigir CORRUPÇÃO PASSIVA Obter vantagem indevida Solicitar, receber ou aceitar promessa CONCUSSÃO Exigir vantagem indevida EXTORSÃO Exigir vantagem indevida Violência ou grave ameaça Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 12 O crime de excesso de exação está previsto no art. 316, §1º, do Código Penal, nos seguintes termos: Art. 316, § 1º - Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. Trata-se de espécie de concussão em que o funcionário exige tributo ou contribuição social indevida ou, quando devida, emprega meio vexatório para tanto. CUIDADO: Apesar do mesmo núcleo do tipo penal (exigir), o excesso de exação se diferencia da concussão por conta dos elementos especiais (cobrança indevida ou vexatória de tributos/contribuições sociais). FORMA QUALIFICADA É importante destacar que, na modalidade simples, o tributo ou a contribuição social são recolhidos aos cofres públicos. Contudo, no §2º do art. 316, há previsão da forma qualificada, que ocorre quando o funcionário público desvia a quantia a ser recolhida: Art. 316, § 2º - Se o funcionário desvia, em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos: Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa. 1 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. O crime de corrupção passiva consuma-se ainda que a vantagem indevida esteja relacionada com atos que formalmente não se inserem nas atribuições do funcionário público. Buscador Dizer o Direito, CORRUPÇÃO PASSIVA (ART. 317) TIPO PENAL O crime de concussão é previsto no art. 317 do Código Penal, nos seguintes termos: Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. CARACTERÍSTICAS Trata-se de tipo penal que tutela a moralidade administrativa e reprime a conduta do funcionário público que solicita, recebe ou aceita promessa de vantagem indevida, em razão de sua função pública. É classificado como crime próprio, pois exige uma qualidade específica do agente, que é a condição de funcionário público. DÚVIDA: A corrupção passiva exige que o ato a ser praticado pelo funcionário público esteja dentro de sua competência? A resposta é NÃO. Segundo STJ, a configuração do delito de corrupção passiva exige-se apenas que haja um nexo causal entre a oferta (ou promessa) de vantagem indevida e a função pública exercida1. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, funcionário público que exerce suas atividades em aeroporto, mas não no controle imigratório, aceita vantagem indevida para facilitar a entrada de estrangeiro em território brasileiro. EXCEÇÃO À TEORIA MONISTA Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/d etalhes/f5a14d4963acf488e3a24780a84ac96c>. Acesso em: 23/05/2020 EXIGIR Tributo ou contribuição social indevidos Emprega meio vexatório ou gravoso Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 13 MUITO IMPORTANTE DÚVIDA: Todos os concorrentes de um mesmo contexto criminoso respondem sempre pela mesma infração penal? Em regra, o Direito Penal brasileiro adota a chamada teoria monista. Para essa teoria, ainda que o fato criminoso tenha sido praticado por vários agentes, conserva-se único e indivisível2. Contudo, excepcionalmente, há previsão no Código Penal da teoria pluralista. A teoria pluralista é aplicada quando há criação de tipos penais distintos para agentes que buscam o mesmo resultado criminoso. Por exemplo, é o que ocorre nos crimes de corrupção ativa e passiva, respectivamente, imputados ao particular e ao funcionário público que se envolvem no mesmo contexto criminoso. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A” oferece propina para que o Delegado de Polícia, “B”, deixe de lavrar o auto de prisão em flagrante contra si. “B” aceita a oferta e permite que “A” vá embora sem ser preso. Nesse caso, “A” responderá pelo crime de corrupção ativa (CP, art. 333) e “B”, pelo crime de corrupção passiva (CP, art. 317). CONSUMAÇÃO A corrupção passiva é crime formal quando praticado os núcleos do tipo penal “solicitar” e “aceitar promessa”. 2 Cunha, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral. 8ª edição. 2020, pág. 457 Por outro lado, em relação ao núcleo “receber”, a doutrina entende ser crime material. CAUSA DE AUMENTO DE PENA (ART. 317, §1º) O art. 317, §1º, do Código Penal tem a seguinte redação: Art. 317, § 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional. Do dispositivo legal, observa-se que o exaurimento do crime (deixar de praticar o ato de ofício ou praticá- lo infringindo dever funcional) acarreta o aumento de pena em 1/3. CORRUPÇÃO PASSIVA PRIVILEGIADA (ART. 317, §2º) O art. 317, §2º, do Código Penal tem a seguinte redação: Art. 317, § 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa. Segundo RogérioSanches3, nesta figura criminal, o agente, sem visar satisfazer interesse próprio, cede a pedido, pressão ou influência de outrem. É o conhecido “favorzinho” dentro da Administração Pública. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A” é preso em flagrante e levando perante à autoridade policial “B”. Na delegacia, “A” reconhece “B” como sendo seu amigo de infância e pede para que este deixe de lavrar o auto de 3 Cunha, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral. 8ª edição. 2020, pág. 880 TEORIA MONISTA Regra Todos respondem pelo mesmo tipo penal TEORIA PLURALISTA Exceção É possível a imputação de tipos penais diversos CRIME FORMAL Solicitar Aceitar promessa CRIME MATERIAL Receber Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 14 prisão em flagrante. Diante do pedido, “B” libera o conduzido. DÚVIDA: Qual a diferença da corrupção passiva privilegiada e a prevaricação? MUITO IMPORTANTE Os tipos penais têm em comum o fato de o funcionário deixar de praticar ato de ofício ou praticá- lo de forma irregular. Contudo, como visto, a corrupção passiva privilegiada o agente age sob a influência de terceiro, ao passo que, na prevaricação (CP, art. 319), age para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Do comparativo: FACILITAÇÃO DE CONTRABANDO OU DESCAMINHO (ART. 318) CONCURSOS FEDERAIS TIPO LEGAL O crime de facilitação de contrabando ou descaminho está previsto no art. 318 do Código Penal, nos seguintes termos: 4 Cunha, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral. 8ª edição. 2020, pág. 882 Art. 318 - Facilitar, com infração de dever funcional, a prática de contrabando ou descaminho (art. 334): Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. É o tipo penal que reprime a conduta do funcionário público que participa dos crimes de contrabando ou descaminho praticado pelo particular. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, policial rodoviário federal, libera a passagem de um ônibus de sacoleiros que acabara de voltar do Paraguai. EXCEÇÃO À TEORIA MONISTA MUITO IMPORTANTE Novamente, trata-se de exceção à teoria monista, oportunidade em que os particulares respondem pelo tipo penal do art. 334 ou 334-A (descaminho ou contrabando) e o funcionário público pelo arts. 318 (facilitação de contrabando ou descaminho), todos, do Código Penal. PREVARICAÇÃO (ART. 319) TIPO LEGAL O crime de prevaricação está previsto no art. 319 do Código Penal nos seguintes termos: Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Segundo Rogério Sanches4, o tipo penal protege a administração contra os comportamentos de funcionários desidiosos, que ignoram cumprir o seu dever, preferindo satisfazer interesse próprio em detrimento da coletividade. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, Delegado de Polícia, deixa de instaurar inquérito policial para investigar “B”, seu amigo de infância, que, supostamente, havia praticado um estelionato. CORRUPÇÃO PASSIVA PRIVILEGIADA Ato de ofício Influência de terceiro PREVARICAÇÃO Ato de ofício Interesse ou sentimento pessoal Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 15 PREVARICAÇÃO X CORRUPÇÃO PASSIVA PRIVILEGIADA Tendo em vista a importância do tema, faço remissão aos comentários apresentados na corrupção passiva privilegiada. PREVARICAÇÃO IMPRÓPRIA (ART. 319-A) TIPO PENAL O crime de prevaricação imprópria está previsto no art. 319-A do Código Penal nos seguintes termos: Art. 319-A. Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. O tipo penal recrimina a conduta do funcionário público (Diretor de Penitenciária e/ou agente público responsável) que não impede a entrada de aparelho telefônico ou outro equipamento eletrônico que permita a comunicação do preso com os demais ou com o ambiente externo. Dada a gravidade da conduta, a doutrina entende que o legislador falhou ao estipular pena muito branda ao tipo penal. CONDESCENDÊNCIA CRIMINOSA (ART. 320) TIPO PENAL 5 Cunha, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral. 8ª edição. 2020, pág. 891 O crime de condescendência criminosa está previsto no art. 320 do Código Penal nos seguintes termos: Art. 320 - Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa. É dever do superior hierárquico responsabilizar o subordinado quando este praticar uma infração no exercício do cargo. Além da obrigação na seara administrativa, a eventual omissão configura um ilícito penal, previsto no art. 320 do Código Penal. Observa-se que o dever de responsabilizar não se estende apenas ao superior hierárquico, já que o funcionário público, tomando ciência da falta, deverá levar o fato ao conhecimento da autoridade competente. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, chefe de Delegacia, deixou de informar à corregedoria que o agente de polícia, “B”, havia feito uma viagem particular com a viatura. ADVOCACIA ADMINISTRATIVA (ART. 321) TIPO PENAL O crime de advocacia administrativa está previsto no art. 321 do Código Penal nos seguintes termos: Art. 321 - Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário: Pena - detenção, de um a três meses, ou multa. Segundo Rogério Sanches5, o tipo penal busca resguardar a moralidade administrativa, impedindo que funcionários públicos patrocinem, valendo-se do cargo, interesse privado em detrimento da Administração Pública. CORRUPÇÃO PASSIVA PRIVILEGIADA Ato de ofício Influência de terceiro PREVARICAÇÃO Ato de ofício Interesse ou sentimento pessoal Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 16 SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, funcionário público lotado no INSS, deu entrada no requerimento de aposentadoria de sua mãe. Além disso, desmarcou agendamentos mais antigos, encaixando a perícia de sua genitora com prioridade. Por fim, pediu ao colega que adiantasse o parecer final para concessão do benefício previdenciário. DÚVIDA: O crime de advocacia administrativa exige que o interesse patrocinado seja ilegítimo/ilegal? MUITO IMPORTANTE A resposta é NÃO. Se o interesse é ilegítimo, o agente vai responder pela modalidade qualificada prevista no art. 321, parágrafo único, do Código Penal: Art. 321, Parágrafo único - Se o interesse é ilegítimo: Pena - detenção, de três meses a um ano, além da multa. VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL (ART. 325) TIPO PENAL O crime de violação de sigilo funcional está previsto no art. 325 do Código Penal nos seguintes termos: Art. 325 - Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo,ou facilitar- lhe a revelação: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, se o fato não constitui crime mais grave. O tipo penal recrimina a conduta do agente que revela informações sigilosas da Administração Pública. Particularmente, em relação à atividade policial, a prática do ilícito pode resultar na ineficácia de toda a investigação policial. Trata-se de crime subsidiário, pois, se a conduta configurar crime mais grave, este deverá ser imputado ao réu. Por outro lado, a violação de sigilo funcional não exige prejuízo, bastando, apenas, a indevida revelação da informação. SITUAÇÃO HIPOTÉTICA: “A”, policial federal, toma conhecimento de que será deflagrada uma operação policial em desfavor de seu conhecido, “B”. Dessa forma, na noite anterior à deflagração, “A” avisa “B”, que foge. FORMAS EQUIPARADAS (ART. 325, §1º) O art. 325, §1º, do Código Penal traz as formas equiparadas ao crime de violação de sigilo funcional: § 1o Nas mesmas penas deste artigo incorre quem: I – permite ou facilita, mediante atribuição, fornecimento e empréstimo de senha ou qualquer outra forma, o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública; II – se utiliza, indevidamente, do acesso restrito. Em relação ao inciso I, destaca-se que o fornecimento e empréstimo de senha deve ser à pessoa não autorizada. Dessa forma, é atípica a conduta de compartilhar senha para outro funcionário público que, também, tem acesso ao sistema de informações ou banco de dados. FORMA QUALIFICADA (ART. 325, §2º) O art. 325, §2º, do Código Penal traz modalidade qualificada do crime de violação de sigilo funcional: Art. 325, § 2o Se da ação ou omissão resulta dano à Administração Pública ou a outrem: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL Crime próprio Crime subsidiário Não exige prejuízo Professor: JULIANO YAMAKAWA DIREITO PENAL – PARTE GERAL MUDE SUA VIDA! 17 Como visto anteriormente, o dano é desnecessário para configurar o crime de violação de sigilo funcional. Contudo, caso a conduta resulte em dano à Administração ou a outrem, a modalidade será qualificada. QUESTÃO DE PROVA: (CESPE/2018 – ABIN – Oficial) Valdemar, empresário do setor de frigoríficos, emprega estratégias, como a utilização de produtos químicos, para disfarçar o estado de putrefação de carnes que vende fora do prazo de validade. Ele garante uma mesada a Odair, empregado de agência reguladora do setor e encarregado de elaborar os registros de fiscalização, em troca de ser avisado de qualquer ação não programada do órgão. De posse desse tipo de informação, Valdemar toma providências para que os fiscais não encontrem a carne de má qualidade. Durante a investigação de um caso referente a uma pessoa que sofrera prejuízo à saúde em razão do consumo de carne estragada, escuta telefônica autorizada gera as provas da existência do esquema. A respeito da situação hipotética apresentada, julgue o item a seguir. Odair cometeu os crimes de corrupção passiva e de violação de sigilo funcional qualificado pelo dano a outrem. A resposta é CERTO. A conduta de Odair configura o crime de corrupção passiva, já que recebeu vantagem indevida para informar Valdemar das fiscalizações sanitárias em seu estabelecimento comercial. Por outro lado, ao avisar o empresário das ações não programadas do órgão de fiscalização e, com isso, permitir que alimentos de má qualidade causassem prejuízo a saúde de terceiro, Odair incidiu, também, no crime de violação de sigilo funcional qualificado pelo dano a outrem. Observe-se que a modalidade qualificada não é crime subsidiário, como ocorre na simples (CP, art. 325, caput). Ademais, há violação de bens jurídicos tanto da Administração Pública, quanto do indivíduo que sofreu prejuízo a sua saúde.
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