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SISTEMA-DE-SAÚDE

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0 
 
f 
 
 
 
1 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 2 
2 O FEDERALISMO BRASILEIRO E AS POLÍTICAS DE SAÚDE ................ 3 
3 O HISTÓRICO DO SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO............................ 5 
3.1 Antecedentes do SUS .......................................................................... 5 
4 A CONFIGURAÇÃO INSTITUCIONAL DO SUS ........................................ 8 
4.1 O Processo de Implantação do SUS .................................................... 9 
5 DADOS GERAIS SOBRE O SUS ............................................................. 11 
5.1 Financiamento .................................................................................... 13 
6 O PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO SUS ........................................... 17 
7 AVANÇOS E DIFICULDADES DO PROCESSO RECENTE DE 
DESCENTRALIZAÇÃO ............................................................................................. 18 
8 O PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO, ELABORAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO 
DA NOAS-SUS 01/01 ................................................................................................ 24 
9 LEITURA COMPLEMENTAR .................................................................... 28 
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 50 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2 
 
1 INTRODUÇÃO 
Prezado aluno! 
 
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante 
ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - 
um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma 
pergunta , para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum 
é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a 
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas 
poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em 
tempo hábil. 
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa 
disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das 
avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que 
lhe convier para isso. 
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser 
seguida e prazos definidos para as atividades. 
 
Bons estudos! 
 
 
3 
2 O FEDERALISMO BRASILEIRO E AS POLÍTICAS DE SAÚDE 
 
Fonte: vivacesaude.com.br 
O Brasil se organiza em um sistema político federativo constituído por três 
esferas de governo – União, estados e municípios –, todas consideradas pela 
Constituição da República de 1988 como entes com autonomia administrativa e sem 
vinculação hierárquica. São 26 estados e o Distrito Federal e 5.560 municípios. 
Estados que vão desde Roraima, com apenas 279 mil habitantes, até São Paulo, com 
mais de 36 milhões de habitantes. Municípios com pouco mais de mil habitantes até 
o município de São Paulo com mais de 10 milhões de habitantes. 
O sistema federativo seria, em linhas gerais, adequado para países marcados 
pela diversidade e heterogeneidade, por favorecer o respeito aos valores 
democráticos em situações de acentuada diferenciação política, econômica, cultural, 
religiosa ou social. Por outro lado, esse tipo de sistema torna mais complexo a 
implementação de políticas sociais de abrangência nacional, particularmente nos 
casos em que a situação de diversidade diz respeito à existência de marcantes 
desigualdades e exclusão social, como no Brasil. Nesses casos, acentua-se a 
importância do papel das políticas sociais de redistribuição, redução das 
desigualdades e iniquidades no território nacional e inclusão social. 
Além disso, a implementação de políticas sociais em um sistema federativo 
requer, por um lado, a explicitação das funções das diferentes esferas de governo 
 
4 
para cada área da política e, por outro, a adoção de mecanismos articuladores entre 
essas esferas, com ênfase em uma lógica de cooperação e complementação. 
No que diz respeito às políticas de saúde, agregue-se a isso a complexidade 
inerente a essa área, relacionada aos seguintes fatores: múltiplas determinações 
sobre o estado de saúde da população e dos indivíduos; diversidade das 
necessidades de saúde em uma população; diferentes tipos de ações e serviços 
necessários para dar conta dessas necessidades; capacitação de pessoal e recursos 
tecnológicos requeridos para atendê-las; interesses e pressões do mercado na área 
da saúde (no âmbito da comercialização de equipamentos, medicamentos, produção 
de serviços, entre outros) que frequentemente tencionam a estruturação de um 
sistema calcado na concepção de saúde como um direito de cidadania. 
O federalismo brasileiro apresenta algumas especificidades que merecem 
destaque, por suas implicações para a área da saúde. A primeira diz respeito ao 
grande peso dos municípios, considerados como entes federativos com muitas 
responsabilidades na implementação de políticas públicas. A diversidade dos 
municípios brasileiros – em termos de porte, desenvolvimento político, econômico e 
social, capacidade de arrecadação tributária e capacidade institucional de Estado –, 
por sua vez, implica diferentes possibilidades de implementação de políticas públicas 
de saúde, face à complexidade de enfrentamento dos desafios mencionados. 
Outro aspecto relevante é que o federalismo brasileiro ainda se encontra de 
certa forma “em construção”, uma vez que, ao longo de toda a história, foi tensionado 
por períodos de centralismo autoritário e a redemocratização do país ainda é 
relativamente recente. Esse processo de construção do federalismo é caracterizado 
por muitas tensões e conflitos na descentralização das políticas e definição dos papéis 
das três esferas de governo em cada área de política pública. No que diz respeito à 
saúde, a agenda política da década de 90 foi fortemente marcada pela temática da 
descentralização e pelos esforços de definição do papel dos gestores em cada nível 
de governo. 
 
5 
3 O HISTÓRICO DO SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO 
3.1 Antecedentes do SUS 
Antes da criação do Sistema Único de Saúde (SUS), o Ministério da Saúde 
(MS), com o apoio dos estados e municípios, desenvolvia quase que exclusivamente 
ações de promoção da saúde e prevenção de doenças, com destaque para as 
campanhas de vacinação e controle de endemias. Todas essas ações eram 
desenvolvidas com caráter universal, ou seja, sem nenhum tipo de discriminação com 
relação à população beneficiária. 
Na área de assistência à saúde, o MS atuava apenas por meio de alguns 
poucos hospitais especializados, nas áreas de psiquiatria e tuberculose, além da ação 
da Fundação de Serviços Especiais de Saúde Pública (FSESP) em algumas regiões 
específicas, com destaque para o interior do Norte e Nordeste. Essa ação, também 
chamada de assistência médico-hospitalar, era prestada à parcela da população 
definida como indigente, por alguns municípios e estados e, principalmente, por 
instituições de caráter filantrópico. Essa população não tinha nenhum direito e a 
assistência que recebia era na condição de um favor, uma caridade. 
A grande atuação do poder público nessa área se dava através do Instituto 
Nacional de Previdência Social (INPS) que depois passou a ser denominado Instituto 
Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), autarquia do 
Ministério da Previdência e Assistência Social. 
O INPS foi o resultado da fusão dos institutos de aposentadorias e pensões (os 
denominados IAPs) de diferentes categorias profissionais organizadas (bancários, 
comerciários, industriários, dentre outros), que posteriormente foi desdobrado em 
Instituto de Administração da Previdência Social (IAPAS), Instituto Nacional de 
Previdência Social (INPS) e InstitutoNacional de Assistência Médica da Previdência 
Social (INAMPS). Este último tinha a responsabilidade de prestar assistência à saúde 
de seus associados, o que justificava a construção de grandes unidades de 
atendimento ambulatorial e hospitalar, como também da contratação de serviços 
privados nos grandes centros urbanos, onde estava a maioria dos seus beneficiários. 
A assistência à saúde desenvolvida pelo INAMPS beneficiava apenas os 
trabalhadores da economia formal, com “carteira assinada”, e seus dependentes, ou 
 
6 
seja, não tinha o caráter universal que passa a ser um dos princípios fundamentais do 
SUS. 
Desta forma, o INAMPS aplicava nos estados, através de suas 
Superintendências Regionais, recursos para a assistência à saúde de modo mais ou 
menos proporcional ao volume de recursos arrecadados e de beneficiários existente. 
Portanto, quanto mais desenvolvida a economia do estado, com maior 
presença das relações formais de trabalho, maior o número de beneficiários e, 
consequentemente, maior a necessidade de recursos para garantir a assistência a 
essa população. Dessa forma, o INAMPS aplicava mais recursos nos estados das 
Regiões Sul e Sudeste, mais ricos, e nessas e em outras regiões, em maior proporção 
nas cidades de maior porte. 
Nessa época, os brasileiros, com relação à assistência à saúde, estavam 
divididos em três categorias, a saber: 
• Os que podiam pagar pelos serviços 
• Os que tinham direito a assistência prestada pelo INAMPS, e 
• Os que não tinham nenhum direito. 
A tabela a seguir mostra, como resultado dessa conjuntura, a distribuição 
percentual dos recursos gastos pelo INAMPS no ano de 1986, em comparação com 
a distribuição percentual da população, segundo região. 
 
Fonte: bvsms.saude.gov.br 
 
7 
Pode-se verificar que proporcionalmente a Região Sudeste, mais rica, foi que 
recebeu mais recursos e que as Regiões Norte e Nordeste, mais pobres, foram a que 
menos receberam. 
Esses recursos eram utilizados para o custeio das unidades próprias do 
INAMPS (Postos de Assistência Médica e Hospitais) e, principalmente, para a compra 
de serviços da iniciativa privada. 
Com a crise de financiamento da Previdência, que começa a se manifestar a 
partir de meados da década de 70, o INAMPS adota várias providências para 
racionalizar suas despesas e começa, na década de 80, a “comprar” serviços do setor 
público (redes de unidades das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde), 
inicialmente por meio de convênios. A assistência à saúde prestada pela rede pública, 
apesar do financiamento do INAMPS apenas para os seus beneficiários, preservou o 
seu caráter de universalidade da clientela. 
Também, nessa época, o INAMPS passa a dar aos trabalhadores rurais, até 
então precariamente assistidos por hospitais conveniados com o FUNRURAL, um 
tratamento equivalente àquele prestado aos trabalhadores urbanos. Mesmo com a 
crise que já se abatia sobre o INAMPS, essa medida significou uma grande melhoria 
nas condições de acesso dessa população aos serviços de saúde, particularmente na 
área hospitalar. 
No final da década de 80, o INAMPS adotou uma série de medidas que o 
aproximaram ainda mais de uma cobertura universal de clientela, dentre as quais se 
destaca o fim da exigência da Carteira de Segurado do INAMPS para o atendimento 
nos hospitais próprios e conveniados da rede pública. Esse processo culminou com a 
instituição do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), implementado 
por meio da celebração de convênios entre o INAMPS e os governos estaduais. 
Assim, podemos verificar que começava a se construir no Brasil um sistema de 
saúde com tendência à cobertura universal, mesmo antes da aprovação da Lei 8.080 
(também conhecida como Lei Orgânica da Saúde), que instituiu o SUS. Isso foi 
motivado, por um lado, pela crescente crise de financiamento do modelo de 
assistência médica da Previdência Social e, por outro, à grande mobilização política 
dos trabalhadores da saúde, de centros universitários e de setores organizados da 
sociedade, que constituíam o então denominado “Movimento da Reforma Sanitária”, 
no contexto da democratização do país. 
 
8 
4 A CONFIGURAÇÃO INSTITUCIONAL DO SUS 
 
Fonte: www.jornalcomarca.com.br 
Uma primeira e grande conquista do Movimento da Reforma Sanitária foi, em 
1988, a definição na Constituição Federal (CF) relativa ao setor saúde. O Art. 
196 da CF conceitua que “a saúde é direito de todos e dever do Estado (...)”. Aqui se 
define de maneira clara a universalidade da cobertura do Sistema Único de Saúde. 
Já o parágrafo único do Art. 198 determina que: “o sistema único de saúde será 
financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, 
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes”. 
Esta questão é de extrema importância, pois, em todo debate sobre o financiamento 
do SUS, a ênfase é na participação da União, como se esta fosse à única responsável. 
Um dos fatores determinantes deste entendimento foi, provavelmente, o papel do 
INAMPS no início do SUS, como veremos mais adiante. 
Um passo significativo na direção do cumprimento da determinação 
constitucional de construção do Sistema Único de Saúde foi à publicação do decreto 
n.º 99.060, de 7 de março de 1990, que transferiu o INAMPS do Ministério da 
Previdência para o Ministério da Saúde. Esse fato, portanto, foi anterior à promulgação 
da Lei 8.080, que só veio a ocorrer em setembro do mesmo ano. 
A Lei 8.080 instituiu o Sistema Único de Saúde, com comando único em cada 
esfera de governo e definiu o Ministério da Saúde como gestor no âmbito da União. A 
 
9 
Lei, no seu Capítulo II – Dos Princípios e Diretrizes, Art. 7º, estabelece entre os 
princípios do SUS a “universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os 
níveis de assistência”. Isso se constituiu numa grande alteração da situação até então 
vigente. O Brasil passou a contar com um sistema público de saúde único e universal. 
4.1 O Processo de Implantação do SUS 
Antes de tudo, é importante destacar que, como descrito anteriormente, o 
Sistema Único de Saúde começou a ser implantado por meio de uma estratégia que 
buscou dar caráter universal à cobertura das ações de saúde, até então proporcionada 
pelo INAMPS apenas para os seus beneficiários. 
No final da década de 80, o setor público de assistência à saúde mantinha uma 
estreita relação com o INAMPS, que a partir de 1990 passou a integrar a estrutura do 
Ministério da Saúde e que já vinha, nos anos anteriores, participando de modo 
significativo do seu financiamento. 
Considerando-se essa relação e a continuidade da participação do Ministério 
da Previdência no financiamento do INAMPS, este foi inicialmente preservado e se 
constituiu no instrumento para assegurar a continuidade, agora em caráter universal, 
da assistência médico-hospitalar a ser prestada à população. O INAMPS somente foi 
extinto pela Lei n° 8.689, de 27 de julho de 1993, portanto quase três anos após a 
promulgação da lei que instituiu o SUS. 
No parágrafo único do seu artigo primeiro, a lei que extinguiu o INAMPS 
estabelecia que: “As funções, competências, atividades e atribuições do INAMPS 
serão absorvidas pelas instâncias federal, estadual e municipal gestoras do Sistema 
Único de Saúde, de acordo com as respectivas competências, critérios e demais 
disposições das Leis n° 8.080, de 19 de setembro de 1990, e 8. 142, de 28 de 
dezembro de 1990”. 
Ao se preservar o INAMPS, preservou-se também a sua lógica de 
financiamento e de alocação de recursos financeiros. Dessa forma, o SUS inicia a sua 
atuação na área da assistência à saúde com caráter universal, utilizando-se de uma 
instituição que tinha sido criada e organizada para prestar assistência a uma parcela 
limitada da população. 
 
10 
Uma das consequências desta “preservação” foi o estabelecimento de limites 
físicos e financeirospara as unidades federadas na lógica do INAMPS, que garantiria 
a manutenção da situação até então vigente. Ou seja, o SUS não adotou uma lógica 
própria para financiar a assistência à saúde de toda a população o que significaria um 
grande remanejamento da alocação de recursos entre os estados. Essa medida, sem 
dúvidas, geraria uma forte reação política dos estados mais desenvolvidos e que 
contavam com uma maior proporção de recursos. 
A primeira alocação de recursos feita pelo Ministério da Saúde, na condição de 
gestor federal do SUS, baseou-se, fundamentalmente, na situação deixada pelo 
INAMPS, como resultado da capacidade instalada dos serviços de saúde, construída 
ao longo do tempo para atender à população previdenciária, e carregou consigo uma 
imensa desigualdade na divisão dos recursos entre os estados pois, agora, a 
assistência passava a ter um caráter universal. 
Porém, a manutenção do INAMPS e de sua lógica de financiamento não evitou 
que, a partir de maio de 1993 e, portanto, pouco antes da sua extinção (em 27 de julho 
de 1993), o Ministério da Previdência Social deixasse de repassar para o Ministério 
da Saúde recursos da previdência social criando uma enorme defasagem entre a nova 
responsabilidade constitucional e a disponibilidade orçamentária. 
Os anos de 1993 e de 1994 foram de grandes dificuldades para o SUS, pela 
falta de uma fonte de financiamento que garantisse recursos para honrar os 
compromissos resultantes das definições da Constituição Federal e da Lei Orgânica 
da Saúde. 
 
11 
5 DADOS GERAIS SOBRE O SUS 
 
Fonte: www.polemicaparaiba.com.br 
O SUS é um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo, sendo o único 
a garantir assistência integral e completamente gratuita para a totalidade da 
população, inclusive aos pacientes portadores do HIV, sintomáticos ou não, aos 
pacientes renais crônicos e aos pacientes com câncer. 
A Rede Ambulatorial do SUS é constituída por 56.642 unidades, sendo 
realizados, em média, 350 milhões de atendimentos ao ano. Esta assistência estende-
se da atenção básica até os atendimentos ambulatoriais de alta complexidade. 
No ano de 2001 foram realizadas aproximadamente 250 milhões de consultas, 
sendo 165 milhões em atenção básica (consultas de pré-natal, puericultura, etc.) e 85 
milhões de consultas especializadas. Nesse mesmo ano foram realizados 200 milhões 
de exames laboratoriais, 6 milhões de exames ultrassonográficos, 79 milhões de 
atendimentos de alta complexidade, tais como: tomografias, exames hemodinâmicos, 
ressonância magnética, sessões de hemodiálise, de quimioterapia e radioterapia. 
São 6.493 hospitais, públicos, filantrópicos e privados, com um total de 487.058 
leitos, onde são realizadas em média pouco mais de 1 milhão de internações por mês, 
perfazendo um total de 12,5 milhões de internações por ano. As internações 
realizadas vão da menor complexidade, tais como internações de crianças com 
 
12 
diarreia, até as mais complexas, como a realização de transplantes de órgãos, 
cirurgias cardíacas, entre outras que envolvem alta tecnologia e custo. Esta área, 
organizada num Sistema implantado em 1990, denominado Sistema de Informações 
Hospitalares (SIH/SUS), constitui-se na maior casuística hospitalar existente no 
mundo paga por um mesmo financiador. Para exemplificar, foram realizadas no ano 
2000 2,4 milhões de partos, 72 mil cirurgias cardíacas, 420 mil internações 
psiquiátricas, 90 mil atendimentos de poli traumatizados no sistema de urgência 
emergência, 7.234 transplantes de órgãos, sendo que 2.549 de rim, 385 de fígado e 
104 de coração. 
São despendidos, pelo MS recursos da ordem de R$ 10,5 bilhões por ano para 
custeio dos atendimentos ambulatoriais de média e alta complexidade e hospitalares, 
além de R$ 3 bilhões para a Atenção Básica. Em 1995, o SUS realizou 13,2 milhões 
de internações hospitalares e, em 2001, 12,2 milhões, uma redução de 7,9%. Os 
gastos, mesmo com a redução ocorrida no período, passaram de R$ 3,5 bilhões em 
1995 para R$ 5,1 bilhões em 2001, um crescimento de 43,1%. 
No entanto, vale ressaltar que a redução no número de internações não ocorreu 
em todas as Regiões. Enquanto no Sudeste ocorreu uma redução de 14,8% (mais de 
800 mil internações por ano), no Centro-Oeste ocorreu um crescimento de 8,2% e no 
Norte um crescimento de 7,4%. Este crescimento decorreu, muito provavelmente, de 
ampliação do acesso aos serviços hospitalares, como resultado do aumento 
significativo de recursos federais alocados nos estados dessas regiões nos últimos 
anos. 
A redução da frequência de internações hospitalares nas Regiões Nordeste, 
Sul e Sudeste têm motivos diversos. De um modo geral, a evolução da medicina tem 
levado a que muitos procedimentos que requeriam a internação do paciente 
passassem a ser realizados em regime ambulatorial. No Nordeste, especificamente, 
a redução se deve, provavelmente, aos avanços obtidos com a Atenção Básica, em 
particular com a presença de um grande número de Agentes Comunitários de Saúde, 
e dos investimentos realizados em saneamento básico. 
 
13 
5.1 Financiamento 
O financiamento do SUS é uma responsabilidade comum dos três níveis de 
governo. Em setembro de 2000, foi aprovada a Emenda Constitucional 29 (EC-29), 
que determinou a vinculação de receitas dos três níveis para o sistema. Os recursos 
federais que correspondem, a mais de 70% do total, progressivamente vêm sendo 
repassados a estados e municípios, por transferências diretas do Fundo Nacional de 
Saúde aos fundos estaduais e municipais, conforme mecanismo instituído pelo 
decreto 1.232, de 30 de agosto de 1994. 
A intensa habilitação de municípios e estados em modalidades avançadas de 
gestão gerou um expressivo aumento das transferências diretas de recursos do Fundo 
Nacional de Saúde para os fundos municipais e estaduais, fazendo com que, em 
dezembro de 2001 (Tabela 2), a maior parte dos recursos da assistência já fosse 
transferida nessa modalidade, em contraposição à predominância de pagamento 
federal direto aos prestadores de serviços. 
 
 
Fonte: bvsms.saude.gov.br 
Além das transferências do Fundo Nacional de Saúde, os fundos estaduais e 
municipais recebem aportes de seus próprios orçamentos. Alguns estados promovem 
 
14 
repasses de recursos próprios para os fundos municipais de saúde, de acordo com 
regras definidas no âmbito estadual. 
O nível federal ainda é o responsável pela maior parcela do financiamento do 
SUS, embora a participação dos municípios venha crescendo ao longo dos últimos 
dez anos e haja a perspectiva de que a parcela dos recursos estaduais no 
financiamento do sistema aumente significativamente em decorrência da aprovação 
da EC-29. O pagamento aos prestadores de serviços de saúde é feito pelo nível de 
governo responsável por sua gestão. Independentemente do nível de governo que 
execute o pagamento, o SUS utiliza um mesmo sistema de informações para os 
serviços ambulatoriais – o Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA) e outro para 
os serviços hospitalares – o Sistema de Informações Hospitalares (SIH). No caso 
específico das internações hospitalares, embora o pagamento pelos serviços 
prestados esteja descentralizado para o nível de governo responsável por sua gestão, 
o processamento das informações relativas a todas as internações financiadas pelo 
sistema público de saúde é realizado de forma centralizada pelo Departamento de 
Informática do SUS (DATASUS) órgão do Ministério da Saúde. Do mesmo modo, todo 
o sistema público utiliza uma única tabela de preços, definida pelo MS, para o 
pagamento aos prestadores de serviços. 
A tendência é que os municípios assumam cada vez mais a responsabilidade 
pelo relacionamento com os prestadores de serviço, à medida que se habilitem às 
condições de gestão descentralizada do sistema. A norma em vigor (NOAS-SUS 
01/01) define duas condições de gestão municipal: (a) Gestão Plena daAtenção 
Básica Ampliada, pela qual o município se habilita a receber um montante definido em 
base per capita para o financiamento das ações de atenção básica, e (b) Gestão Plena 
do Sistema Municipal, pela qual o município recebe o total de recursos federais 
programados para o custeio da assistência em seu território. Cabe esclarecer que o 
financiamento por base per capita não dispensa o gestor de alimentar o sistema de 
informações ambulatoriais, cuja produção servirá como insumo para futuras 
negociações de alocação de recursos financeiros. 
Apesar do incremento das habilitações de estados e municípios, e do 
consequente aumento do volume de recursos repassados diretamente aos fundos de 
saúde subnacionais, um terço dos recursos federais ainda é empregado em 
pagamentos diretos a prestadores de serviços de saúde. Tal situação decorre do 
 
15 
processo de contratação e pagamento centralizado que vigorou durante o período do 
INAMPS que antecedeu à implementação do SUS e, em certa medida, ainda não foi 
plenamente substituído pelo processo de descentralização, dado o caráter não 
compulsório e progressivo deste último. 
 
 
Fonte: www.hmdoctors.com 
Até 1997 não havia subdivisão dos recursos transferidos para estados e 
municípios o que passou a ocorrer a partir de março de 1998 com a edição da Portaria 
n° 2.121/GM que implantou o Piso da Atenção Básica (PAB) e separou os recursos 
para o financiamento da Atenção Básica e para o financiamento da Assistência de 
Média e Alta Complexidade Ambulatorial. 
O PAB de cada município que é calculado tendo por base um valor per capita 
é transferido de forma automática do Fundo Nacional de Saúde para os Fundos 
Municipais de Saúde mudando a forma anterior de financiamento por prestação de 
serviços e passando para uma lógica de transferência de recursos em função do 
compromisso do município assumir a responsabilidade sanitária por este nível de 
atenção. 
Vale destacar que enquanto os recursos do PAB fixo são transferidos tendo por 
base o valor per capita, o valor do PAB variável depende da adesão do município a 
programas prioritários definidos pelo Ministério da Saúde, tais como os Programas de 
Agentes Comunitários de Saúde, de Saúde da Família e de Combate às Carências 
 
16 
Nutricionais e a ações estratégicas tais como a Farmácia Básica e as Ações Básicas 
de Vigilância Sanitária. 
O Manual da Atenção Básica, aprovado pela Portaria GM/MS n° 3.925, de 13 
de novembro de 1998, define a Atenção Básica como “o conjunto de ações, de caráter 
individual ou coletivo, situadas no primeiro nível de atenção dos sistemas de saúde, 
voltadas para a promoção da saúde, a prevenção de agravos, o tratamento e a 
reabilitação”. E frisa, ainda, que “essas ações não se limitam àqueles procedimentos 
incluídos no Grupo de Assistência Básica da tabela do SIA/SUS, quando da 
implantação do Piso da Atenção Básica. A ampliação desse conceito se torna 
necessária para avançar na direção de um sistema de saúde centrado na qualidade 
de vida das pessoas e de seu meio ambiente”. 
Com a Portaria GM/MS n° 2.121, o Ministério da Saúde concretizou um primeiro 
e significativo passo para a construção de um sistema de saúde que não se reduzia a 
apenas a um componente de assistência médica e para a redução das desigualdades 
regionais na distribuição dos recursos. 
A partir da Portaria GM N° 1.399, de 15 de dezembro de 1999, que 
regulamentou a NOB SUS 01/96 no que se refere às competências da União, estados, 
municípios e Distrito Federal, na área de Epidemiologia e Controle de Doenças e 
definiu a sistemática de financiamento, no ano 2000 o Ministério da Saúde, por meio 
da Fundação Nacional de Saúde, começou a implementar o processo de 
descentralização dessa área. 
Assim, a parir de junho de 2001, o volume de recursos transferidos pelo 
Ministério da Saúde para os estados e municípios para o desenvolvimento de ações 
e serviços de saúde passou a ser subdividido em: 
• Recursos para a Atenção Básica (PAB Fixo e PAB Variável) 
• Recursos para a Vigilância Epidemiológica e Controle de Doenças 
• Recursos para a Assistência de Média Complexidade 
• Recursos para a Assistência de Alta Complexidade. 
 
17 
6 O PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO SUS 
 
Fonte: cdnmaismedicos.elivepress.com.br 
O Sistema Único de Saúde vem passando, desde a sua instituição pela Lei 
Orgânica da Saúde em 1990, por importantes mudanças, entre as quais pode-se 
destacar o significativo avanço obtido na sua universalização, principalmente em 
decorrência de um importante processo de descentralização de responsabilidades, 
atribuições e recursos da esfera federal para estados e municípios, em oposição ao 
modelo anterior do sistema de saúde, caracterizado por marcante centralização 
decisória e financeira no nível federal. 
Esse processo tem sido orientado pelas Normas Operacionais do SUS, 
instituídas por meio de portarias ministeriais. Estas Normas definem as competências 
de cada esfera de governo e as condições necessárias para que estados e municípios 
possam assumir as novas posições no processo de implantação do SUS. 
As Normas Operacionais definem critérios para que estados e municípios 
voluntariamente se habilitem a receber repasses de recursos do Fundo Nacional de 
Saúde para seus respectivos fundos de saúde. A habilitação às condições de gestão 
definidas nas Normas Operacionais é condicionada ao cumprimento de uma série de 
requisitos e ao compromisso de assumir um conjunto de responsabilidades referentes 
à gestão do sistema de saúde. 
 
18 
Embora o instrumento formal seja uma portaria do Ministro da Saúde, o seu 
conteúdo é definido de forma compartilhada entre o Ministério e os representantes do 
Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS) e do Conselho 
Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS). Para tanto foram criadas 
instancias de negociação, sendo uma a nível nacional, a Comissão Inter gestores 
Tripartite (CIT – com representação do Ministério da saúde, do CONASS e do 
CONASEMS) e, em cada estado, uma Comissão Inter gestores Bipartite (CIB), com 
representação da Secretaria Estadual de Saúde e do Conselho Estadual de 
Secretários Municipais de Saúde (COSEMS). 
Desde o início do processo de implantação do SUS, foram públicas três Normas 
Operacionais Básicas (NOB SUS 1991, 1993 e em 1996.). No ano 2001 foi publicada 
a Norma Operacional da Assistência à Saúde (NOAS-SUS), atualmente em vigor. Os 
fundamentos jurídicos e normativos da descentralização do SUS são sistematizados 
na figura a seguir. 
Uma das dimensões relevantes desse processo diz respeito à tentativa de 
definição do papel de cada esfera de governo no SUS, que se dá com intensos 
debates e conflitos, tendo em vista o caráter ainda recente do processo de 
democratização no Brasil, a marcante heterogeneidade política, econômica e social 
no país, as características do federalismo brasileiro e as intensas transformações por 
que o Estado brasileiro vem passando nas diversas áreas da política, entre outras 
questões. 
7 AVANÇOS E DIFICULDADES DO PROCESSO RECENTE DE 
DESCENTRALIZAÇÃO 
O período de implementação da NOB SUS 01/96, compreendido entre os anos 
1998 a 2000 (as habilitações na referida norma no ano 2001 foram residuais), foi 
marcado por uma série de importantes avanços do processo de descentralização do 
Sistema Único de Saúde. Entre esses avanços cabe destacar: 
1. No âmbito do financiamento: 
a) a implementação do Piso da Atenção Básica para o financiamento das ações 
de atenção básica desenvolvidas pelos municípios, representando a introdução de 
 
19 
uma lógica de financiamento per capita pela primeira vez no SUS, o que é um avanço 
no sentido da superação dos mecanismos de pós-pagamento; 
b) a adoção de incentivos específicos para áreas estratégicas, e o aumento 
expressivo de transferências de recursos do Fundo Nacional de Saúde para os 
FundosEstaduais e Fundos Municipais de Saúde; 
2. No âmbito do modelo assistencial e da organização dos serviços: 
a) a expansão da estratégia de Equipes de Saúde da Família e de Agentes 
Comunitários de Saúde; 
b) a implementação de experiências inovadoras de atenção no âmbito local e 
avanços, tanto na organização da atenção básica como na organização de redes de 
referência em vários municípios e estados; 
3. No âmbito da gestão: 
a) milhares de municípios foram habilitados de acordo com as condições de 
gestão da NOB SUS 01/96, integrando-se de forma voluntária e assumindo 
responsabilidades no Sistema Público de Saúde; 
b) houve uma intensa transferência negociada de responsabilidades, 
atribuições e recursos do nível federal para municípios e estados; 
Ao final do período de vigência da NOB SUS 01/96, 99% dos municípios 
brasileiros estavam habilitados a uma das condições de gestão da referida norma, 
sendo 89% em Gestão Plena da Atenção Básica e 10,1% em Gestão Plena do 
Sistema Municipal (Quadro II). A maior parte dessas habilitações ocorreu ainda em 
1998, no primeiro ano de implantação da NOB/96. Entretanto, o percentual de 
municípios habilitados em cada uma dessas condições de gestão é bastante variável 
entre os estados, sugerindo a existência de diferentes ritmos e modelos de 
descentralização. Cabe lembrar que o processo de habilitação depende da iniciativa 
dos gestores subnacionais. Conforme já mencionado, os estados e municípios 
voluntariamente se submetem ao processo de habilitação, assumindo 
responsabilidades e fazendo jus ao repasse de recursos e responsabilidades a partir 
do cumprimento dos requisitos definidos nas Normas Operacionais. 
 
 
20 
 
Fonte: bvsms.saude.gov.br 
 
21 
Já o processo de habilitação dos estados foi mais lento e irregular (Tabela 4). 
Em dezembro de 2001, cinco estados estavam habilitados na condição de Gestão 
Avançada do Sistema Estadual e sete estados na condição de Gestão Plena do 
Sistema Estadual. 
 
 
Fonte: bvsms.saude.gov.br 
Entretanto, os próprios avanços da descentralização no período levantam 
novas questões críticas para a implementação do SUS. No final da década de 90, 
acentua-se o debate sobre alguns problemas e desafios até então não equacionados: 
a) Divisão de responsabilidades entre estados e municípios: 
Parcela significativa dos pactos de gestão sobre os prestadores de serviços de 
saúde entre estados e municípios foi estabelecida segundo critérios pouco adequados 
a organização funcional do sistema e ao comando efetivamente público do sistema, 
tais como partilhas de gestão por natureza jurídica dos prestadores de serviços 
(públicos vs. privados). 
 
22 
Em alguns estados, ainda há unidades básicas de saúde sob gestão estadual 
e/ou conflitos relacionados à persistência de hospitais estaduais que não estão sob 
gestão de municípios em Gestão Plena do Sistema Municipal. 
b) Processo de habilitação: 
Em muitos casos a habilitação ocorreu de forma cartorial. O processo de 
habilitação dos estados nem sempre apresentou uma relação direta com a capacidade 
efetiva da Secretaria de Estado da Saúde de exercer todas as suas funções gestoras. 
A maciça habilitação dos municípios em Gestão Plena da Atenção Básica 
representou um avanço do ponto de vista da responsabilização de milhares de 
gestores municipais e aumento da equidade na alocação de recursos por meio da 
implantação do PAB, mas não assegurou a qualidade e efetividade da atenção básica 
em todos esses municípios, nem foi suficiente para garantir o acesso dos cidadãos 
aos demais níveis de atenção. 
A habilitação em Gestão Plena do Sistema Municipal, por sua vez, representou 
um avanço para centenas de municípios que passaram a dispor de maior autonomia 
de gestão; por outro lado, não foi suficiente para assegurar sua inserção no Sistema 
Estadual de Saúde e seu papel na garantia do atendimento às populações referidas 
de outros municípios com menor capacidade assistencial. 
c) Financiamento do sistema: 
A alocação dos recursos financeiros permanecia, em parte, vinculada à lógica 
da oferta, à capacidade instalada existente e às necessidades de receita dos 
prestadores de serviços de saúde, o que mantinha a concentração de recursos nas 
áreas mais desenvolvidas e em ações nem sempre compatíveis com as necessidades 
da população. 
No âmbito dos estados, os critérios adotados para a distribuição de recursos 
entre os municípios eram, em geral, pouco explícitos. 
d) Planejamento e organização funcional do sistema: 
Embora muitos estados tenham conduzido os processos de Programação 
Pactuada e Integrada (PPI) com seus municípios, sua implementação foi efetiva em 
poucos casos, dificultando a integração intermunicipal. 
As limitações da capacidade de planejamento e coordenação das Secretarias 
 
23 
Estaduais de Saúde aumentavam o risco de atomização dos sistemas 
municipais, da incorporação tecnológica irracional e da adoção de barreiras de acesso 
entre municípios. 
A prática de contratação de serviços privados e da construção de unidades 
públicas, sem a prévia análise da adequação do perfil da oferta existente às 
necessidades da população, dificultava a estruturação de uma rede regionalizada e 
Resolutiva de unidades. 
Por outro lado, a expansão de serviços nas décadas precedentes produziu um 
conjunto de unidades com oferta desordenada e relações frágeis entre os serviços, 
dificultando a reorientação do modelo de atenção e a conformação de redes 
regionalizadas e resolutivas. 
e) Resolutividade e acesso aos serviços: 
A configuração do elenco de procedimentos incluídos na atenção básica (Piso 
de Atenção Básica fixo – PAB fixo) era restrita, apresentando baixa capacidade de 
resolução dos problemas mais frequentes dos usuários. Simultaneamente, ocorriam 
dificuldades de acesso à assistência de média e alta complexidade, relacionadas à 
concentração desses serviços em poucos municípios ou mesmo à inexistência de 
determinados serviços de alta complexidade em diversos estados. 
O instrumental utilizado para as referências intermunicipais e interestaduais 
tem sido insuficiente para garantir o acesso, carecendo de mecanismos efetivos de 
relação entre gestores e entre serviços. 
f) Monitoramento e avaliação contínua de desempenho: 
Em geral não existia avaliação rotineira e sistemática do desempenho dos 
órgãos gestores e de monitoramento da implementação das atividades previstas nos 
Planos de Saúde e processos de programação. O controle e a auditoria da 
prestação de serviços por terceiros e do consequente faturamento apresentavam 
fragilidades e descontinuidades. 
Em síntese, tanto o Ministério da Saúde quanto a maior parte dos estados não 
dispunham de diagnósticos precisos do funcionamento dos sistemas estaduais e 
municipais para o desenvolvimento adequado de estratégias de cooperação técnica e 
decisões de investimento. 
g) Processo de habilitação das Secretarias Municipais de Saúde (SMS) e 
transferências fundo a fundo: 
 
24 
O processo de habilitação dos municípios atingiu seu ápice, sendo residual o 
número de municípios que ainda não se encontra em uma das condições de gestão 
previstas na NOB 96. A taxa de crescimento do volume de recursos transferidos fundo 
a fundo, bastante significativa no primeiro ano de vigência da referida Norma, 
apresentou uma desaceleração no período de dezembro de 1998 a dezembro de 
2000, indicando a necessidade do desenvolvimento de novos mecanismos para 
ampliar a descentralização dos recursos financeiros e buscar a superação progressiva 
do financiamento pela compra de serviços para mecanismos de repasse de recursos 
entre gestores por produção de serviços. 
Face aos avanços e problemas descritos, ainda durante a fase de 
implementação da NOB SUS 01/96, os diversos atores envolvidos no processo de 
consolidação do SUS passaram a discutir as estratégias necessárias para enfrentar 
os grandes desafioscolocados para as políticas de descentralização na saúde. Desse 
processo resultou a publicação da Norma Operacional da Assistência à Saúde (NOAS 
SUS 01/01) 
8 O PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO, ELABORAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DA 
NOAS-SUS 01/01 
 
Fonte: www.medsisten.com.br 
 
25 
Ao longo de todo o ano 2000, o Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de 
Assistência à Saúde, em articulação com outras secretarias do Ministério (Secretaria 
de Políticas de Saúde, Secretaria Executiva), coordenou um intenso processo de 
debate e negociação com as representações nacionais dos secretários estaduais 
(CONASS) e municipais (CONASEMS) de saúde no âmbito da Comissão Inter 
gestores Tripartite (CIT) do Conselho Nacional de Saúde (CNS), acerca do 
aperfeiçoamento e consolidação do processo de descentralização no Sistema Único 
de Saúde. 
A publicação da Norma Operacional de Assistência à Saúde NOAS SUS 01/01 
em janeiro de 2001 é fruto desse longo processo de negociação. O objetivo geral da 
referida norma é: “promover maior equidade na alocação de recursos e no acesso da 
população às ações e serviços de saúde em todos os níveis de atenção”. 
Para atingir esse objetivo, a NOAS adotou a regionalização como macro 
estratégia fundamental para o aprimoramento do processo de descentralização, nesse 
momento específico da implantação do SUS, e propôs três grupos de estratégias 
articuladas, como forma de promover a descentralização com equidade no acesso: 
1) Elaboração do Plano Diretor de Regionalização e diretrizes para a 
organização regionalizada da assistência, visando à conformação de sistemas 
de atenção funcionais e resolutivos nos diversos níveis. 
2) Fortalecimento das capacidades gestoras do SUS, que compreende um 
conjunto de estratégias voltadas para consolidar o caráter público da gestão do 
sistema, por meio da instrumentalização dos gestores estaduais e municipais 
para o desenvolvimento de funções como planejamento, programação, 
regulação, controle e avaliação, incluindo instrumentos de consolidação de 
compromissos entre gestores. 
3) Atualização dos critérios e do processo de habilitação de estados e 
municípios às condições de gestão do SUS, visando torná-lo coerente com o 
conjunto de mudanças propostas. 
Um dos pontos mais importantes da NOAS SUS 01/01 diz respeito ao processo 
de elaboração do Plano Diretor de Regionalização, coordenado pelo gestor estadual, 
com a participação do conjunto de municípios. Esse Plano deve conter minimamente: 
 
26 
a) A divisão do território estadual em regiões/microrregiões de saúde, 
definidas segundo critérios sanitários, epidemiológicos, geográficos, sociais, de 
oferta de serviços e de acessibilidade; 
b) O diagnóstico dos principais problemas de saúde e das prioridades de 
intervenção; 
c) A constituição de módulos assistenciais resolutivos, formados por um ou 
mais municípios, que garantam o primeiro nível da média complexidade, 
visando garantir o suporte às ações de Atenção Básica; 
d) Os fluxos de referência para todos os níveis de complexidade e os 
mecanismos de relacionamento intermunicipal; 
e) A organização de redes assistenciais específicas; 
f) O Plano Diretor de Investimentos, que procura suprir as lacunas 
assistenciais identificadas, de acordo com as prioridades de intervenção. 
No que diz respeito à organização da assistência, se enfatiza a importância de 
qualificar e melhorar a resolutividade da atenção básica em todos os municípios 
brasileiros, a partir da identificação de áreas estratégicas mínimas, relacionadas a 
problemas de saúde de abrangência nacional (saúde da mulher, saúde da criança, 
saúde bucal, controle da hipertensão e diabetes, controle da tuberculose e eliminação 
da hanseníase). 
Complementarmente, os gestores estaduais e municipais podem definir outras 
áreas estratégicas, de acordo com as especificidades locais. Além das ações mínimas 
de atenção básica a serem asseguradas em todos os municípios brasileiros, a NOAS 
SUS 01/01 propõe a formação de módulos assistenciais resolutivos, formados por um 
ou mais municípios, que garantam no âmbito microrregional o acesso ágil e oportuno 
de todos os cidadãos a um conjunto de ações de saúde frequentemente necessárias 
para atender os problemas mais comuns, que nem sempre podem ser oferecidas em 
todos os municípios pelo seu pequeno porte populacional. A proposta de qualificação 
de regiões/microrregiões na assistência à saúde apresentada na referida Norma se 
fundamenta, portanto, na busca de garantia de acesso a ações resolutivas para além 
dos limites municipais, considerando critérios de qualidade e economia de escala. 
Ainda no que tange à assistência à saúde, a NOAS SUS 01/01 estabelece 
diretrizes gerais para a organização das demais ações de média e alta complexidade, 
e preconiza que o plano de regionalização compreenda o mapeamento das redes de 
 
27 
referência em áreas estratégias específicas (gestação de alto risco, urgência e 
emergência, hemoterapia, entre outras). 
Esse tipo de regionalização, incentivado pela NOAS SUS 01/01, requer a 
articulação dos gestores municipais para a negociação e pactuação de referências 
intermunicipais, sob coordenação e regulação estadual, que deve se dar através da 
programação pactuada e integrada (PPI). Além disso, é necessário o fortalecimento 
da capacidade gestora de estados e municípios para exercer as funções de regulação, 
controle e avaliação do sistema, em uma nova perspectiva. 
Do ponto de vista do financiamento, a NOAS SUS 01/01 pressupõe um 
aumento do componente de financiamento federal calculado em uma base per capita, 
ao propor uma ampliação do Piso de Atenção Básica - fixo e que o financiamento das 
ações do primeiro nível da média complexidade ambulatorial passe a também a se 
dar com base em um valor per capita nacional. Esse aspecto é importante por 
assinalar uma tendência de superação da lógica anterior de financiamento, fortemente 
orientada pela oferta pré-existente de serviços, a partir da expansão dos mecanismos 
de pré-pagamento, que requerem um papel mais ativo dos gestores no planejamento 
da oferta, de acordo com as necessidades da população e prioridades identificadas. 
Uma vez publicada a NOAS em janeiro de 2001, ao longo do ano a Secretaria 
de Assistência à Saúde acompanhou e apoiou sistematicamente os processos de 
regionalização nos estados, considerando as especificidades de cada um, bem como 
buscou desenvolver estratégias e instrumentos de gestão e de organização da 
assistência de apoio aos estados e municípios no processo de regionalização. 
Ao longo do ano 2001, observou-se um grande dinamismo nos estados no que 
diz respeito aos processos de articulação entre gestores estaduais e municipais para 
a elaboração dos planos diretores de regionalização, de investimentos e da 
programação pactuada e integrada. Todos os estados já elaboraram esboços desses 
planos e, e a maior parte está adotando medidas significativas de organização da rede 
de serviços voltadas à melhoria do acesso. 
 
28 
9 LEITURA COMPLEMENTAR 
25 ANOS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: RESULTADOS E DESAFIOS1 
 
A pedido de estudos avançados, o médico Samir Salman, fundador do primeiro 
centro privado especializado em cuidados paliativos e no atendimento a pacientes 
crônicos de alta dependência (o Hospital Premier), entrevistou Eugênio Vilaça 
Mendes, conselheiro da Organização Pan-Americana da Saúde na área de 
Desenvolvimento de Sistemas e Serviços de Saúde e secretário adjunto da Secretaria 
de Estado da Saúde de Minas Gerais no governo Tancredo Neves. Entre os temas 
abordados, destacam-se o Sistema Único de Saúde e a Estratégia da Saúde da 
Família. 
Além de consultor de organismo internacional na área da saúde e gestor 
público, Eugênio Vilaça Mendes é especialista em planejamento de saúde, mestre em 
Administração e doutor em Odontologia. Foi professor das Faculdades de Odontologia 
e Medicinada Universidade Federal de Minas Gerais, da Faculdade de Odontologia 
da PUC Minas, das Escolas de Saúde Pública de Minas Gerais (ESP-MG) e do Ceará, 
e da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Montes Claros (MG), da 
qual recebeu o título de "Professor Honoris Causa". É autor de vários livros e capítulos 
de livros, e de artigos no Brasil e no exterior. Seu livro mais recente, As redes de 
atenção à saúde, foi publicado pela ESP-MG. 
Samir Salman – Passados 25 anos de sua instalação, o Sistema Único de 
Saúde (SUS) se apresenta a 75% dos brasileiros como a única forma de acesso e 
assistência à saúde. Qual a sua avaliação, hoje, dos caminhos do SUS diante dos 
desafios que sua implantação almejava responder, décadas atrás? 
Eugênio Vilaça Mendes – O SUS foi instituído pela Constituição Federal de 
1988. É, portanto, uma política pública recente, com duas décadas e meia de 
existência. Não obstante sua curta vida, tem muitos resultados a celebrar e, também, 
enormes desafios a superar. 
O nosso sistema público de saúde tem uma dimensão verdadeiramente 
universal quando cobre indistintamente todos os brasileiros com serviços de vigilância 
 
1 Texto Adaptado de Eugênio Vilaça Mendes 
 
29 
sanitária de alimentos e de medicamentos, de vigilância epidemiológica, de sangue, 
de transplantes de órgãos e outros. No campo restrito da assistência à saúde ele é 
responsável exclusivo por 140 milhões de pessoas, já que 48 milhões de brasileiros 
recorrem ao sistema de saúde suplementar, muitos deles acessando 
concomitantemente o SUS em circunstâncias em que o sistema privado apresenta 
limites de cobertura. 
O SUS constituiu a maior política de inclusão social da história de nosso país. 
Antes do SUS vigia um Tratado das Tordesilhas da saúde que separava quem portava 
a carteirinha do Inamps e que tinha acesso a uma assistência curativa razoável das 
grandes maiorias que eram atendidas por uma medicina simplificada na atenção 
primária à saúde e como indigentes na atenção hospitalar. O SUS rompeu essa 
divisão iníqua e fez da saúde um direito de todos e um dever do Estado. A instituição 
da cidadania sanitária pelo SUS incorporou, imediatamente, mais de cinquenta 
milhões de brasileiros como portadores de direitos à saúde e fez desaparecer, 
definitivamente, a figura odiosa do indigente sanitário. 
O SUS apresenta números impressionantes: quase seis mil hospitais e mais de 
sessenta mil ambulatórios contratados, mais de dois bilhões de procedimentos 
ambulatoriais por ano, mais de onze milhões de internações hospitalares por ano, 
aproximadamente dez milhões de procedimentos de quimioterapia e radioterapia por 
ano, mais de duzentas mil cirurgias cardíacas por ano e mais de 150 mil vacinas por 
ano. O SUS pratica programas que são referência internacional, mesmo considerando 
países desenvolvidos, como o Sistema Nacional de Imunizações, o Programa de 
Controle de HIV/Aids e o Sistema Nacional de Transplantes de Órgãos que tem a 
maior produção mundial de transplantes realizados em sistemas públicos de saúde 
do mundo, 24 mil em 2012. O programa brasileiro de atenção primária à saúde tem 
sido considerado, por sua extensão e cobertura, um paradigma a ser seguido por 
outros países. Com esses processos o SUS tem contribuído significativamente para a 
melhoria dos níveis sanitários dos brasileiros. Entre 2000 e 2010, a taxa de 
mortalidade infantil caiu 40%, tendo baixado de 26,6 para 16,2 óbitos em menores de 
um ano por mil nascidos vivos. 
Não obstante a exuberância dos números, o nosso sistema público de saúde 
permanece com muitos problemas a solucionar. No meu entendimento há três 
grandes desafios para o SUS: a organização macroeconômica do sistema de saúde 
 
30 
no Brasil, a organização microeconômica expressa no modelo de atenção à saúde 
que pratica e o financiamento. 
No plano da organização macroeconômica, o SUS foi concebido como um 
sistema público de saúde de cobertura universal, de corte beveridgeano que se 
caracteriza por financiamento público por meio de impostos gerais, universalidade de 
acesso, gestão pública e prestação de serviços por mix público/privado, com 
especificação de obrigações e direitos dos cidadãos e dos órgãos prestadores de 
serviços. O modelo beveridgeano tem como fundamento a saúde como direito 
humano e como direito constitucional, e tem como objetivo a universalização da 
atenção à saúde e o aumento da coesão social. Nele, o sistema público provê uma 
carteira generosa de serviços sanitariamente necessários, havendo a possibilidade de 
os cidadãos adquirirem, no setor privado, serviços suplementares aos que estão 
inscritos nessa carteira. Esse modelo originário do Reino Unido implantou-se em 
diferentes países, como Canadá, Dinamarca, Espanha, Finlândia, Itália, Noruega, 
Nova Zelândia, Portugal, Reino Unido e Suécia. 
A generosa concepção constitucional de um sistema de saúde de cobertura 
universal, ao longo dos anos, vem caminhando num sentido diverso, expresso na 
segmentação do sistema de saúde brasileiro. Dessa forma, o sonho da 
universalização vem se transformando no pesadelo da segmentação. 
Os sistemas de saúde segmentados combinam diferentes modelos 
institucionais segundo diferentes clientelas, segregando-as em nichos institucionais 
singulares. Disso resulta uma integração vertical em cada segmento e uma 
segregação horizontal entre eles, em que cada segmento, público ou privado, exercita 
as macrofunções de financiamento, regulação e prestação de serviços para sua 
clientela particular. Os Estados Unidos são um exemplo emblemático de sistema 
segmentado com sistemas públicos específicos para pobres (Medicaid), idosos 
(Medicare) e veteranos de guerra e sistema privados para quem pode pagar por si ou 
por meio de empresas. 
Em função da segmentação, o SUS, pensado como um sistema de cobertura 
universal, vem se consolidando como um subsistema público de saúde que convive, 
em nosso país, com um subsistema privado de saúde suplementar e um outro 
subsistema privado de desembolso direto. 
 
31 
No plano da organização microeconômica, o desafio é superar a forma 
fragmentada como o SUS se estrutura. Em realidade, a fragmentação dos sistemas 
de saúde é uma característica que dá tons de universalidade à crise dos modelos de 
atenção à saúde em todo o mundo, nos setores públicos e privados. Nesse plano, 
pode-se afirmar que a crise está em responder a uma situação de saúde do século 
XXI com um modelo de atenção à saúde engendrado na metade do século passado. 
Isso não deu certo nos países ricos, isso não está dando certo no Brasil. A razão 
desse problema está no descompasso temporal que ocorre entre uma evolução muito 
rápida dos fatores contingenciais do sistema de saúde (transição demográfica, 
transição nutricional, transição epidemiológica e inovação tecnológica) e a baixa 
velocidade desse sistema em adaptar-se a essas mudanças por meio de reformas 
internas (cultura organizacional, arranjos organizativos, modelos assistenciais, 
modelos de financiamento, sistemas de incentivos e liderança). 
O Brasil vive uma transição demográfica acelerada. A população de pessoas 
de mais de 65 anos dobrará nos próximos vinte anos e isso significará, no futuro, mais 
doenças crônicas, porque 79% de pessoas idosas brasileiras relatam ser portadores 
dessas condições de saúde. A transição nutricional é, também, muito rápida. Hoje, 
metade de nossa população total e um terço de nossa população de crianças de cinco 
a dez anos de idade tem sobrepeso ou obesidade. Por outro lado, o país apresenta 
uma transição epidemiológica singular. A carga de doença, medida em anos de vida 
perdidos ajustados por incapacidade, se compõe de 14,8% de doenças infecciosas e 
desnutrição, 10,2% de causas externas, de 8,8% de causas maternas e perinatais e 
de 66,2% de doenças crônicas. Isso significa que o Brasil temuma situação 
epidemiológica de tripla carga de doenças com a convivência, no mesmo tempo, de 
uma agenda de doenças infecciosas e causas maternas e perinatais, do crescimento 
das causas externas e pela dominância relativa das doenças crônicas e de seus 
fatores de riscos. 
O problema do SUS, mas presente igualmente nos subsistemas privados 
brasileiros, está numa situação de saúde que combina transição epidemiológica e 
nutricional aceleradas e tripla carga de doença, com forte predomínio relativo de 
condições crônicas, e uma resposta social estruturada num sistema de atenção à 
saúde que é fragmentado, que opera de forma episódica e reativa e que se volta, 
principalmente, para a atenção às condições agudas e às agudizações das condições 
 
32 
crônicas. O sistema de saúde fragmentado que praticamos não é capaz de responder 
socialmente, com efetividade, eficiência e qualidade, à situação de saúde vigente. 
A resposta a esse desafio está em restabelecer a coerência entre a situação 
de saúde e a forma de organização do sistema de saúde no plano microeconômico, 
acelerando as mudanças necessárias que levem à conformação de um sistema 
integrado que opere de forma contínua e proativa e que seja capaz de responder, com 
eficiência, efetividade, qualidade e de modo equilibrado às condições agudas e 
crônicas. Ou seja, o SUS deverá ser estruturado em redes de atenção à saúde, 
coordenadas pela atenção primária à saúde. 
Esse é um grande desafio que se coloca para os anos futuros, mas que não 
será fácil de ser superado porque a fragmentação presente tem profundas raízes 
econômicas, políticas e culturais que a sustenta. Mas alguns passos têm sido dados, 
nos últimos anos, no caminho da construção de redes de atenção à saúde no SUS. 
O terceiro desafio, o do subfinanciamento do SUS, que está na base da 
segmentação do sistema de saúde brasileiro, será considerado na questão seguinte. 
Samir Salman – A gestão de um sistema social complexo como o SUS 
exige recursos que possibilitem, de fato, a sua manutenção. Mas também exige um 
criterioso método de aplicação. Como o senhor avalia esse binômio alocação-método 
na atual conjuntura do SUS? Iluminando ainda questões importantes nesta reflexão, 
como o princípio da universalidade, qual o volume de recursos que seriam 
necessários, ano a ano, para que o SUS seja plenamente implantado no país, ainda 
nesta década? 
Eugênio Vilaça Mendes – A generosidade do mandamento jurídico da saúde 
como direito de todos e dever do Estado não foi sustentada, na Constituição Federal, 
por uma base material que garantisse um financiamento público compatível com a 
universalidade. 
O exame dos dados de 2013 da Organização Mundial da Saúde sobre 
financiamento dos sistemas de saúde mostra que o Brasil gasta em saúde 9,0 do PIB. 
Esse valor indica que o Brasil tem um gasto total em saúde muito adequado, bem 
próximo à média dos gastos em saúde dos países desenvolvidos. Contudo quando se 
examina o percentual do gasto público em saúde verifica-se que ele é muito baixo e 
incapaz de garantir que a norma constitucional se materialize na prática social de 
modo a garantir o princípio da universalidade do SUS. 
 
33 
As evidências internacionais mostram que todos os países que estruturaram 
sistemas universais de saúde, beveridgeanos ou bismarckianos, apresentam uma 
estrutura de financiamento em que os gastos públicos em saúde são, no mínimo, 70% 
dos gastos totais em saúde. Por exemplo: Alemanha, 76,8%; Canadá, 71,1%; Itália, 
77,6%; Holanda, 84,8%, Noruega, 85,5%; Reino Unido, 83,2%. No Brasil, o gasto 
público como porcentual do gasto total em saúde é de, apenas, 47%, inferior aos 53% 
que constituem o porcentual de gastos privados em saúde. Em geral, a segmentação 
dos sistemas de saúde se dá quando os gastos públicos são inferiores a 50% dos 
gastos totais em saúde. Nos Estados Unidos, país emblemático do sistema 
segmentado, esse valor é de 48,2%, bem próximo ao gasto público brasileiro. 
Com a estrutura vigente de gastos públicos em saúde não se pode pretender 
consolidar o SUS como direito de todos e dever do Estado. Essa é a razão fundante 
da segmentação do sistema de saúde brasileiro que poderá fazer de nosso sistema 
público de saúde, no longo prazo, um sistema de assistência à saúde para as classes 
mais baixas e um resseguro para procedimentos de alto custo para as classes médias 
e para os ricos. 
Os gastos públicos em saúde em nosso país são muito baixos quando 
comparados com outros países em dólares americanos com paridade de poder de 
compra. O gasto total em saúde é de US$ 1.009,00, mas o gasto público per capita em 
saúde é de apenas US$ 474,00. Esse valor é muito inferior aos valores praticados em 
países desenvolvidos, mas é inferior a países da América Latina como Argentina, US$ 
851,00; Chile, US$ 562,00; Costa Rica, US$ 825,00; Panamá, US$ 853,00; e Uruguai, 
US$ 740,00. A razão para esse baixo gasto público em saúde no Brasil está no fato 
de que os gastos em saúde correspondem a 10,7% do gasto do orçamento total dos 
governos, um valor muito abaixo do praticado em âmbito internacional, em países 
desenvolvidos e em desenvolvimento. Estima-se que o faturamento per capita do 
sistema de saúde suplementar brasileiro é três vezes superior aos gastos per 
capita do SUS. 
Esses dados eloquentes sobre o subfinanciamento do SUS não têm 
sensibilizado os segmentos políticos, de diferentes matizes ideológicos, para que 
promovam um aumento do financiamento que permita tornar realidade o princípio da 
cobertura universal em saúde. Os sistemas segmentados de saúde, não raro, são 
justificados por um suposto, aparentemente magnânimo: o de que ao se instituírem 
 
34 
sistemas específicos para quem pode pagar, sobrariam mais recursos públicos para 
dar uma melhor atenção aos pobres. As evidências indicam que esse suposto não é 
verdadeiro; ao contrário, ao se especializar um sistema singular para os pobres, dada 
a desorganização social desses grupos excluídos e sua baixa vocalização política, 
esse sistema tende a ser subfinanciado. 
O financiamento do SUS é feito pela trina federativa de forma solidária. Ocorre 
que os Estados e municípios vêm aumentando seus gastos em saúde e chegaram ao 
limite definido pela Emenda Constitucional 29. De outra forma, os gastos federais em 
saúde vêm numa tendência fortemente decrescente e as tentativas de aumentar os 
gastos federais em saúde são reiteradamente frustradas. Estima-se que seria 
necessário quase dobrar o orçamento do Ministério da Saúde para chegar-se a uma 
relação que torne viável a universalização da saúde. Por isso, não há que ter muita 
esperança para a solução desse problema nesta década e, como consequência, o 
gasto público deverá permanecer em valores próximos a 50% dos gastos totais em 
saúde, o que manterá a segmentação do sistema de saúde. 
Em função do volume de recursos necessários para fortalecer o sistema público 
da insensibilidade dos diferentes segmentos políticos para o tema da universalização 
da saúde, dos movimentos de mobilidade social que ampliaram vertiginosamente as 
classes médias do país, dos valores professados por esses segmentos sociais 
emergentes, da dimensão alcançada pelo sistema privado de saúde suplementar e 
das dificuldades de se fazerem reformas sanitárias no âmbito macroeconômico do 
sistema de saúde, o cenário mais provável para os próximos dez anos é de mudanças 
incrementais lentas, pontuais e destituídas de visão estratégica que levarão a uma 
consolidação da segmentação do sistema de saúde, com as consequências, no longo 
prazo, de ineficiência e de iniquidade. Em certo sentido, se pode prever que, em 
termos de sistema de saúde, caminharemos para sermos amanhã, à moda brasileira, 
o que são, hoje, os Estados Unidos. 
Samir Salman – A Estratégia de Saúde da Família tem sido considerada pelo 
senhor como a principal forma de implantação do SUS por todoo país. Qual o mérito 
dessa estratégia? 
Eugênio Vilaça Mendes – O sistema público de saúde brasileiro sempre fez 
uma opção por organizar-se com base na Atenção Primária à Saúde (APS). 
Historicamente, é possível identificar sete ciclos de desenvolvimento da APS no 
 
35 
sistema público de saúde de nosso país, desde o ciclo inicial do Prof. Paula Souza na 
USP, na segunda década do século XX, até o sétimo ciclo inaugurado em 1993, no 
governo Itamar Franco, o ciclo da Estratégia da Saúde da Família (ESF), ainda 
vigente. O Brasil tem hoje uma ESF extensiva que conta com mais de 32 mil equipes 
espalhadas por quase todos os municípios brasileiros e que cobrem aproximadamente 
58% de nossa população. 
Creio que a expansão da APS e sua tradução na ESF foi a opção estratégica 
mais consequente feita no sistema de saúde brasileiro ao longo de toda sua história. 
A razão disso está nas evidências que se produziram, nos âmbitos internacional e 
nacional, sobre a APS em geral e sobre a ESF em particular. 
Recentemente fiz uma revisão bibliográfica sobre a APS visitando centenas de 
publicações de muitos países, desenvolvidos e em desenvolvimento. As evidências 
são robustas em atestar que os sistemas de saúde com forte orientação para a APS 
comparados com outros com frágil orientação para a APS apresentam melhores 
resultados em termos de diminuição da mortalidade, redução dos custos da atenção, 
maior acesso a serviços preventivos, melhoria da equidade em saúde, redução das 
internações hospitalares e redução da atenção de urgência. 
Da mesma forma, um exame da literatura produzida por acadêmicos, no 
exterior e no Brasil, mostrou que a opção feita pelo SUS para fortalecer a APS 
produziu os mesmo resultados. Mas, muito importante, vários estudos demonstraram 
que a operacionalização da APS por meio da ESF tem sido exitosa e superior aos 
modelos tradicionais de estruturação da APS. As evidências indicam que a ESF influiu 
positivamente no acesso e na utilização dos serviços e teve impacto na saúde dos 
brasileiros: reduziu a mortalidade infantil e a mortalidade de menores de cinco anos; 
teve impacto na morbidade; aumentou a satisfação das pessoas com a atenção 
recebida; teve uma nítida orientação para os mais pobres; melhorou o desempenho 
do SUS; influiu positivamente em outras políticas públicas como educação e trabalho; 
e contribuiu para incrementar o interesse internacional pela APS. 
Samir Salman – Dos desafios e tendências que se colocam nos caminhos 
futuros do SUS, quais seriam, na sua opinião, duas propostas de aperfeiçoamento 
que poderiam reescrever a trajetória do sistema de forma a cumprir a proteção social 
a que se destina? 
 
36 
Eugênio Vilaça Mendes – Creio que se pode subscrever a afirmativa de que o 
SUS não é um problema sem solução, mas uma solução com problemas. Mas a 
superação de seus problemas não será fácil, nem rápida, nem barata. 
As mudanças na organização macroeconômica do sistema de saúde no Brasil 
são improváveis pelas razões mencionadas na primeira questão. Junte-se a elas a 
constatação empírica de que mudanças consequentes nesse âmbito, em geral, se dão 
em janelas históricas que se abrem em momentos de fortes transformações 
institucionais, o que não parece estar no horizonte brasileiro. 
Por consequência, as mudanças possíveis devem se limitar ao plano da 
organização microeconômica do SUS, especialmente por meio de sua organização 
em redes de atenção à saúde e do fortalecimento da APS por meio da ESF. 
Nesse âmbito, mesmo contando com menores recursos que o sistema privado 
de saúde suplementar, o SUS apresenta melhores condições de efetivamente 
estruturar redes de atenção à saúde, coordenadas pela APS. O sistema de saúde 
suplementar brasileiro sequer colocou, em sua agenda, os temas das redes de 
atenção à saúde e da APS. 
As redes de atenção à saúde são a resposta adequada à situação de saúde 
vigente em nosso país e implicam organizar, de forma integrada, sob coordenação da 
APS, os pontos de atenção ambulatoriais e hospitalares secundários e terciários, os 
sistemas de apoio (sistema de assistência farmacêutica, sistema de apoio diagnóstico 
e terapêutico e sistema de informação), os sistemas logísticos (sistema de regulação 
da atenção, registro eletrônico em saúde e sistema de transporte em saúde) e o 
sistema de governança. 
A proposta de organização em redes de atenção à saúde já foi incorporada na 
legislação do SUS pelo Decreto 7.508/2011 que regulamentou a Lei Orgânica da 
Saúde e tem constituído uma prioridade de diversos governos nos âmbitos nacional, 
estadual e municipal. 
As redes de atenção à saúde, para cumprirem com seus objetivos, devem ser 
coordenadas por uma APS forte. Para isso, será necessário aprofundar o movimento 
de implantação da ESF, inaugurando um oitavo ciclo no SUS, o ciclo da atenção 
primária à saúde. Isso implicará uma agenda de radicalização da ESF com alguns 
pontos fundamentais: aumento da cobertura como um foco especial em grandes e 
médios municípios, até atingir uma cobertura de 75% da população brasileira; 
 
37 
superação dos problemas críticos de sua gestão; expansão do trabalho 
interdisciplinar; implantação de modelos de atenção à saúde baseados em evidência; 
e incremento dos recursos financeiros. 
Esse novo ciclo significará o encontro da ESF brasileira com as novas diretrizes 
da APS, enunciadas pela Organização Mundial da Saúde no Relatório Mundial de 
Saúde de 2008. "Agora mais do que nunca" é preciso fortalecer a ESF no SUS. 
 
SAÚDE PÚBLICA, REDE BÁSICA E O SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO2 
 
RESUMO 
Este artigo focaliza o desenvolvimento da saúde pública no Brasil com o intuito de analisar os 
problemas com os quais se depara o processo atual de municipalização dos serviços de saúde. 
Argumenta-se que a postura neoliberal ou conservadora tornou-se incapaz de articular uma proposta 
viável para o sistema de saúde. Por outro lado, a proposta reformista concentra sua atenção no sistema 
de saúde e sua administração, tendo como modelo a postura positivista das ciências naturais e 
administrativas. Argumenta-se que apenas uma mudança radical no paradigma da medicina, na qual a 
dimensão coletiva e social predomina sobre a dimensão biológica e individual, permitiria conciliá-la com 
as necessidades de saúde da população. 
 
Palavras-Chave: Saúde Pública; Sistemas de Saúde 
 
INTRODUÇÃO 
 
Este artigo tem como objetivo principal focalizar o desenvolvimento da saúde 
pública e do sistema de saúde no Brasil, buscando contribuir para a compreensão dos 
principais problemas que marcam o momento atual. Será argumentado que o 
processo de municipalização dos serviços de saúde, em grande medida estimulado 
por princípios contidos no paradigma (o termo “paradigma” é empregado de acordo 
com o conceito de Kuhn (1975), ou seja, como um mapa que governa a percepção do 
cientista no sentido de conformar a ele os fatos e as descobertas) social da medicina, 
encontra-se, presentemente, num estágio crucial do seu desenvolvimento. 
Observa-se, neste sentido, que, sob uma nova fachada de racionalidade 
administrativa, o paradigma mecanicista se impõe sobre o paradigma social da 
medicina. Este artigo defende o ponto de que é necessário ir além de uma mera 
reforma administrativa e, no interior de uma concepção social de medicina, encontrar 
 
2 Texto adaptado do autor: Emerson E. Merhy 1 Marcos S. Queiroz 
 
38 
tecnologias (o termo “tecnologia” é empregado no sentido usado por Gonçalves 
(1986), ou seja, como um instrumental contido principalmente na formação do 
especialista, e não somente como um aparelho externo a ele) que, ao organizar o 
sistema de saúde, a tornem prática. Embora os fatos históricos apresentados na 
primeira parte deste artigo sejam de conhecimento comum e já tenham sido 
divulgados (Merhy, 1991), sua apresentação justifica-se por forneceruma visão 
resumida do processo e permitir focalizar o momento atual a partir de uma dimensão 
histórica. 
 
O DESENVOLVIMENTO DA SAÚDE PÚBLICA 
 
A história da Saúde Pública brasileira inicia-se no começo do século com Emílio 
Ribas, em São Paulo, e Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. No interior da escola 
pasteuriana, estes cientistas tinham como meta superar a teoria miasmática a partir 
da introdução da teoria bacteriológica, considerada mais adequada para organizar a 
intervenção no campo da saúde. Nesta perspectiva, tanto a saúde como a doença 
passaram a ser vistas como um processo coletivo, resultado da agressão externa que 
o corpo biológico (fisiologicamente harmônico) sofria de um meio social/natural 
insalubre. A descoberta e o isolamento dos indivíduos doentes contagiantes, o 
saneamento do meio, a destruição dos vetores biológicos e a proteção dos sadios 
consistiam nos principais objetivos desta perspectiva. Para instrumentalizar as ações 
de saúde, adotava-se a bacteriologia e a engenharia sanitária. Secundariamente, 
utilizava-se a medicina, entendida como muito limitada e pouco eficaz. 
O modelo assistencial público tinha na campanha e na polícia sanitária seus 
meios principais de efetivação. Para pôr em prática esta política, foram organizadas 
leis, códigos e decretos. Além disso, foram também organizados institutos de 
pesquisa, laboratórios e serviços sanitários como braços auxiliares. Os principais 
aspectos administrativos e programáticos situavam-se no âmbito estadual, com 
alguns resíduos no nível municipal. Via de regra, os pensadores da política de saúde 
eram funcionários públicos e, como tal, compartilhavam das perspectivas que os 
grupos oligárquicos adotavam para as questões sociais, tendo em vista servir ao 
processo agroexportador e legitimar o Estado. 
 
39 
A partir da teoria bacteriológica, novas ideias foram se organizando e 
desembocaram, na década de 10, na formação de um movimento em saúde pública 
que ficou conhecido como “médico-sanitário”. Esta perspectiva foi influenciada pela 
escola norte-americana de saúde pública, que tinha em Baltimore seu núcleo mais 
ativo, através da associação entre a Fundação Rockefeller e a John Hopkins 
University. 
Nesta época, já se buscava no Brasil uma ação social que saneasse a zona 
rural, a fim de constituir um povo saudável, racialmente forte, permitindo, ao mesmo 
tempo, a ocupação do interior do país, considerada vital para a integração nacional. 
A chamada Liga do Saneamento caracterizou-se, neste sentido, por criticar os 
excessivos urbanismo e regionalismo da política de saúde então vigente. Este 
movimento tinha em Belisário Pena e Artur Neiva os seus mais significativos 
representantes. 
No decorrer da década de 20, a corrente médico-sanitária tornou-se 
hegemônica, organizando-se principalmente nos grandes centros urbanos, como Rio 
de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Recife, entre outros. Dois núcleos foram 
especialmente ativos: o paulista, influenciado por Paula Souza e Borges Vieira 
(médicos sanitaristas formados pela John Hopkins University, com bolsas da 
Fundação Rockfeller), e o dos “jovens turcos”, sanitaristas vinculados ao 
Departamento Nacional de Saúde Pública, no Rio de Janeiro, que defendiam a 
especialidade na carreira médica na área de saúde pública e o trabalho integral nas 
instituições estatais. Estes núcleos chegaram a organizar cinco congressos durante a 
década de 20 (os Congressos Brasileiros de Higiene) e tiveram tal influência no 
desenvolvimento da política de saúde no Brasil que sua presença se fez marcante até 
a reforma administrativa da década de 60/70, no interior da Secretaria de Saúde do 
Estado de São Paulo. 
A base deste modelo pressupunha o processo saúde-doença como um 
fenômeno coletivo, porém determinado, em última instância, pelo nível individual. O 
conceito de “consciência sanitária” permitia compreender como o meio insalubre 
atingia os indivíduos. Medicina e saúde pública eram entendidas como campos 
distintos; a primeira para curar através da clínica, patologia e terapêutica, e a segunda 
para prevenir doenças, prolongar e promover a saúde através da higiene e da 
educação sanitária. O setor privado, entendido sob o ângulo “caritativo”, deveria ser 
 
40 
controlado pelo serviço público. Não havia qualquer conflito com a organização liberal, 
predominante no período. O modelo tecnoassistencial desta proposta centrou-se na 
construção de serviços regionais permanentes de saúde pública (os centros e postos 
de saúde) comandados por especialistas — os sanitaristas — em tempo integral. 
Durante a fase de transição 30/37, a saúde pública praticamente reduziu-se à 
atuação campanhista pelo conjunto do país. Sob a influência da Liga de Saneamento, 
foram favorecidas as ações verticais permanentes. Este foi um período que viabilizou 
a construção dos serviços médicos previdenciários, abrindo um outro setor 
socialmente significativo no conjunto das ações de saúde. 
Os “jovens turcos” foram marcando passagem pelas instituições na luta por 
uma reforma que levasse à criação de um ministério da saúde e de secretarias 
estaduais de saúde, experiência, aliás, já vivida pelo estado da Bahia em 1925. Assim 
ocorreu com a Reforma Federal de 1937, que permitiu a criação dos departamentos 
nacionais de combate a problemas específicos, como a malária, a febre amarela e a 
saúde das crianças. Quando, na década de 40, tiveram a oportunidade (diante dos 
problemas colocados pela situação da Segunda Guerra Mundial e as relações do 
governo brasileiro com o norte americano) de organizar um serviço que permitisse a 
ocupação de regiões importantes para a produção de borracha e minérios, 
implementaram a Fundação Serviço de Saúde Pública (Sesp). 
O ideário original desta corrente foi mantido mesmo com a incorporação de 
novos recursos médicos, como, por exemplo, o antibiótico, que foi “retraduzido” sob a 
mesma ótica “tecnológica”. A esta experiência seguiu-se a criação, em 1953, do 
Ministério da Saúde e, em 1956, do Departamento de Endemias Rurais, que herdou 
um conjunto de projetos realizados nos departamentos verticalizados específicos, 
como o da malária, existente desde 1939. 
No estado de São Paulo, a exemplo do que ocorria em outros estados, a 
Fundação Sesp tentou influenciar a constituição da Secretaria Estadual de Saúde, em 
1948. Neste processo, os vários grupos articulados a esta proposta saíram frustrados, 
pois consideraram que seus objetivos foram desvirtuados pela presença de interesses 
políticos menores que se sobrepuseram aos técnicos. No entanto, com a reforma da 
organização dos serviços de saúde no estado, em 1968, consideraram atingidos seus 
objetivos. 
 
41 
No pós-guerra, sem alterar as estratégias básicas da corrente “médico-
sanitária”, novos elementos foram sendo incorporados, como, por exemplo, o uso da 
medicina clínica pela saúde pública, que encontrava suporte teórico na concepção de 
Leavell & Clarck (1967), que preconizavam a união do conjunto das ações de saúde 
num esforço comum de prevenção e cura. Com isso, o modelo passou a introduzir a 
clínica nos programas de saúde, dentro de uma perspectiva multicausal do processo 
saúde doença. Esta concepção permitiu que as ações de saúde se tornassem parte 
de uma atividade globalmente planejada. 
Desde o final dos anos 40 já era evidente uma inversão dos gastos públicos, 
favorecendo a assistência médica em relação à saúde pública. Nos anos 60, a 
dicotomia assistência médica-saúde pública radicaliza-se no interior de um modelo 
institucional que mostrava ações pontuais e desordenadas, incapazes de conter a 
miséria e as péssimas condições de saúde da população brasileira. 
Tomando como ponto de reflexão a falência das perspectivas “campanhistas” 
e “norte-americanas”, Mario Magalhães introduziu, numa perspectiva 
desenvolvimentista, a integração e o planejamento das ações de saúde.

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