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Periodontia I 28 de setembro de 2020 FORP - USP Felipe S. Garcia T94 Controle químico e mecânico do biofilme bucal 1. Introdução (etiologia e patogenia da doença periodontal) O início do tratamento periodontal ocorre a partir da adequação do meio bucal, o qual é constituído pelo controle de placa . Para isso, pode-se utilizar métodos mecânicos e químicos. Esse controle de placa exige responsabilidade mútua entre o paciente e o profissional, de forma que o cirurgião dentista realize a instrumentação (Raspagem supra-gengival e profilaxia) e instrução do paciente, e o paciente coloque em prática o auto-controle de placa. Relembrando a patogenia periodontal, na imagem percebemos alterações gengivais: gengiva avermelhada e sangramento à sondagem positivo. Ao buscar os fatores responsáveis por essa doença periodontal, encontramos o biofilme como fator etiológico primário, de forma que desenvolva sangramento e inflamação diretamente relacionada com o biofilme. Dr Loe verificou que a ausência de escovação gerava inflamação gengival, sendo que a retomada da escovação regularizada revertia essa condição anormal. Dessa forma, pode-se afirmar que a inflamação gengival acompanha de forma consistente a intensidade do acúmulo de placa, o que gera as seguintes consequências histológicas, representadas pelo esquema abaixo: perda de inserção clínica, migração apical do epitélio juncional, reabsorção óssea e formação de bolsa periodontal. Para que ocorra a doença periodontal, além do biofilme, é muito importante a resposta imunoinflamatória do hospedeiro. Essa resposta vai estar diretamente relacionada com o complexo de bactérias que prevalece na condição periodontal do paciente: o complexo vermelho ( P. gengivalis, , T. forsithya ), por exemplo, está intimamente relacionado com uma resposta mais agressiva do hospedeiro. Não se encontra apenas um micro-organismo no processo infeccioso, mas sim um conjunto. O aumento e a diminuição de cada um está relacionado com a resposta do hospedeiro. A literatura aponta que alguns pacientes têm uma periodontite com grandes perdas periodontais, mas com pouco acúmulo de biofilme. Dessa forma, sabe-se que os micro-organismos que colonizam, o ambiente, e uma série de fatores estão relacionados com a resposta do hospedeiro e a doença periodontal em si. No início do tratamento periodontal, é muito importante que sejam removidos todos os fatores retentivos de placa bacteriana, para que o paciente consiga exercer uma boa higiene bucal. Relembrando a formação de biofilme, tem início com a formação da película adquirida do esmalte e colonização de streptococcus gram positivos, progredindo até uma comunidade complexa com bactérias anaeróbias gram negativas dos complexos laranja e vermelho. A coagregação desses micro-organismos gera uma supremacia do biofilme, onde antimicrobianos não conseguem atingir as partes mais profundas do biofilme. Portanto, torna-se necessária a desagregação mecânica da placa. 2. Tratamento periodontal básico Em relação às fases da terapia periodontal, inicia-se com o tratamento periodontal básico (Periodontia I), onde busca-se a adequação do meio bucal pelo profissional para permitir a higiene correta pelo paciente. Os objetivos do tratamento básico são: - Eliminar infecção - Atingir boas condições de higiene oral - Instrução de higiene oral - Motivação do paciente - Raspagem supragengival - Remoção dos fatores retentivos de placa Observação: é muito importante a colaboração do paciente para o tratamento adequado o profissional realiza a instrumentação e motivação do paciente, sendo que o paciente será responsável pelos métodos caseiros de manutenção da higiene bucal. A instrumentação mecânica realizada pelo paciente exerce um controle positivo nos seguintes aspectos: - Redução da concentração de produtos bacterianos e do tecido doente - Redução do fluido crevicular gengival - Neutralização do pH do biofilme - Diminuição da profundidade da bolsa - Diminuição da inflamação e edema com readaptação do epitélio juncional - Diminuição do número total de micro-organismos - Redução dos micro-organismos dos complexos vermelho e laranja - Aumento na proporção de cocos gram-positivos aeróbios (compatíveis com saúde) Dentro dessa primeira fase , serão executadas vários procedimentos pelo profissional , dentre essas: - Remoção total de cálculo - Ajuste ou substituição de restaurações mal adaptadas - Restaurações - Movimentação ortodôntica - Tratamento de áreas com impactação alimentar - Tratamento oclusal - Exodontia Portanto, a adequação do meio bucal é a chave para interrupção da progressão da doença e retorno da dentição a um estado de saúde, conforto e função. As imagens a seguir ilustram antes e depois da adequação do meio bucal Depois da adequação supra gengival, inicia-se a raspagem subgengival e alisamento radicular (Periodontia II) 3. Instrução dos pacientes: métodos mecânicos É muito importante que o paciente exerça os cuidados caseiros propostos pelo profissional. Caso contrário, a microbiota pré tratamento pode se restabelecer rapidamente. É uma recomendação mínima que se escove os dentes duas vezes ao dia por dois minutos. A nossa instrução é que sempre após a ingestão de alimentos sólidos, o paciente exerça a escovação, de forma que impeça a maturação da placa bacteriana. O nosso objetivo é evitar essa maturação do biofilme para que não seja necessária a intervenção profissional no controle da saúde bucal. Certamente, muitos indivíduos removem apenas cerca de 50% da placa de seus dentes, mesmo quando escovam por 2 minutos. Os métodos mais eficazes e utilizados são a escova e o fio dental. ● Técnicas de escovação e outros dispositivos mecânicos A escovação ideal é aquela que remove a maior quantidade de placa dental no menor tempo possível, sem causar danos aos tecidos. A escovação vai depender do desenho da escova, da habilidade do indivíduo em usá-la e a frequência de uso. Portanto, a ideia de que exista uma escova superior do que as outras não é muito evidente pela literatura baseada em casos clínicos controlados.Então, desde que a escova esteja nos parâmetros internacionais determinados, pode-se recomendá-la ao paciente. 1. Técnica de Stilmman A primeira técnica que nós recomendamos é a técnica de Stilmman. Nessa técnica, as cerdas são voltadas para o ápice/sulco gengival, em um ângulo aproximado de 45º, com pressão leve, sem movimento horizontal, mas sim vibratório , sem deslocamento da escova. 2. Técnica de Stillman modificada Também conhecida como técnica de rotação, no final da vibração, desloca-se as cerdas com movimento de varredura em direção coronária. 3. Técnica de Charters Indicada nos casos de recessão da papila interdental, nessa técnica, as cerdas são voltadas para a incisal/oclusal, e são realizados movimentos vibratórios nessa posição. 4. Técnica de Bass Bastante indicada para o paciente periodontal, nessa técnica, as cerdas são voltadas para o ápice/sulco, sendo realizados movimentos rítmicos curtos ântero-posteriores. Na técnica de Bass ocorre maior introdução das cerdas nos sulcos gengivais, alcançando cerca de 0,5 mm subgengival. 5. Técnica de Bass modificada Essa técnica é a união da técnica de Bass + técnica de Stillman modificada. Além das técnicas citadas, há as técnicas distal e oclusal , constituídas de movimentos de “vai-e-vem” nas faces distal do último molar e oclusais dos dentes posteriores. Essas técnicas devem ser realizadas em combinação com outra técnica, garantindo, assim, uma efetiva remoção mecânica de placa pelo paciente. No mercado atual há as escovas elétricas , as quais têm indicações principalmente voltadas a pacientes com alguma deficiência motora ou pacientes mais idosos. Apresentam melhor eficácia na remoção de placa e no controle da inflamação gengival do que as escovas convencionais. A região interdental é muito suscetível ao acúmulo de placa, então, é importante a limpeza dessa região, seja com escova interdental , seja com escova unitufo ou com fio dental . As indicações vão depender do contorno e consistência gengival, tamanho do espaço interproximal, posição e alinhamento do dente, habilidade e motivação do paciente. Fios e fitas dentais são indicados para regiões onde a papila interdental preenche o espaço interproximal . Quando usados adequadamente, removem mais de 80% da placa proximal, podem remover placa subgengival. O fator que mais impacta é a técnica. Em relação à técnica , utilizaremos mais ou menos 45 cm de fio dental, de forma que fique firme nas duas mãos. Assim, vamos "abraçar" a superfície proximal do dente que pretende-se higienizar, realizando movimentos de vai-e-vem, desce até a região apical, e retirá-lo em direção coronal. Também há palitos dentais , os quais são indicados para espaços interproximais abertos; são pouco utilizados na região ocidental. Observação: esses palitos são específicos para a limpeza interdental; não são os palitos de madeira que estão presentes nas mesas de restaurantes. As escovas interproximais são indicadas para superfícies radiculares expostas, que apresentam concavidades e ranhuras, bem como para defeitos de furca grau III. As escovas unitufos são utilizadas para áreas de difícil acesso, como distal de molares e superfícies com margem gengival irregular. Além dos métodos convencionais (fio e escova), há métodos auxiliares . Dentre esses, os raspadores de língua , para redução e reservatório de micro-organismos que contribuem para a formação da placa. São eficazes no tratamento da halitose/desinfecção total da boca. Caso não se tenha em mãos os raspadores, pode utilizar a escova para a higiene do dorso da língua. Também como método auxiliar, há os dentifrícios - que serão descritos com mais detalhes posteriormente nos métodos químicos - e os dispositivos de irrigação dental , que são utilizados em casos de próteses fixas e aparelhos ortodônticos, com finalidade de remoção de placa e fragmentos moles através da ação mecânica de um jato de água corrente - podem ser adicionadas substâncias antimicrobianas. Os dispositivos mecânicos têm que ser usados com cautela e técnica adequada , uma vez que o uso inadequado pode provocar efeitos negativos e sequelas como recessões gengivais, abrasão, entre outros problemas como LCNC. 4. Instrução dos pacientes: métodos químicos Além dos métodos mecânicos, temos os métodos químicos. Vale lembrar que o controle mecânico é essencial, e os químicos complementam . Pondera-se que o controle químico é auxiliar , não podendo ser utilizado diariamente. A longo prazo, pode ser prejudicial, necessitando, portanto, ser usado de forma cautelosa. O uso dos métodos químicos é justificado em casos que pode superar as deficiências nos hábitos mecânicos e atuar preventivamente . Sempre haverá data para iniciar e data para finalizar o uso dos métodos químicos. Na literatura, os benefícios adjuvantes do uso de óleos essenciais por pacientes que escovam os dentes e passam fio dental regularmente são: o aumento da saúde nos tecidos periodontais. Especula-se que o enxaguante deveria ser utilizado de forma regular, contudo, também sabe-se que o enxaguante bucal provoca efeitos colaterais . Isso confirma a manutenção do controle mecânico, com data para início e fim do uso de enxaguantes . As substâncias químicas podem ter efeitos diferentes na cavidade bucal, podendo atuar como agentes anti-adesivos - impedem a formação da película adquirida, dificultando a adesão dos micro-organismos; agentes removedores de placa - deslocam o biofilme maduro.; agentes antimicrobianos - promovem a morte/inibem o crescimento dos micro-organismos; e agentes anti-patogênicos - mudam o perfil de virulência dos micro-organismos na cavidade bucal. Um dos meios para administrar esses agentes químicos é o dentifrício(pasta dental) . Outra forma de administrar os agentes químicos é o uso de colutórios bucais (Listerine) - antes utilizava-se álcool na composição, mas hoje já não se usa mais, em detrimento dos possíveis danos à saúde. Também há irrigadores, spray, gomas de mascar e vernizes . Os agentes químicos podemser das seguintes classes: - Agentes antimicrobianos: capazes de matar/inibir o crescimento de micro-organismos - Agentes inibidores/redutores de placa: diminuem a capacidade de biofilme. mas sem efeitos na diminuição do sangramento(inflamação) - Agentes anti-placa: exercem efeito na redução de placa e também na redução da inflamação gengival. - Agentes anti-gengivite: exercem função na diminuição dos processos inflamatórios Os agentes químicos devem apresentar os seguintes requisitos: - Não ser tóxico - Não ser absorvido/limitado pelas mucosas - Eficaz contra micro-organismos implicados na doença periodontal - Baixa indução de resistência à droga - Adsorção e retenção prolongada(substantividade) - Manutenção da atividade antimicrobiana - Neutralização e eliminação lenta Exemplos de agentes químicos: antibióticos - promovem resistência bacteriana e podem eliminar bactérias “boas” da microbiota; enzimas - promovem o rompimento da matriz da placa e reforça o mecanismo de defesa do hospedeiro; produtos naturais; fluoretos; sais de metais; agentes oxigenantes; álcoois amino; clorito de sódio acidificado - promove erosão dental - e outros antissépticos. 1. Compostos quaternários de amônio São representados pelo cloreto de benzilcônio e cloreto de cetilpiridínio. Os nomes comerciais são Colgate Plax e Cepacol. O seu efeito tem duração de 3 a 5 horas. Estudos mostraram que esses enxaguatórios, quando combinados com escovação, não promoveram nenhum efeito adicional ao controle de biofilme. Ou seja, só exerce efeito na melhoria do odor. Laboratorialmente, apresenta propriedade antimicrobiana, mas não exerce efeito antiplaca . 2. Fenóis Representado pelo triclosan, que é um agente químico presente em cremes dentais. Possui efeito anti-placa e uma efetividade de ação de 5 horas. É um agente anti-placa comprovado, uma vez que também possui efeito anti-inflamatório também. Quando se tem triclosan com copolímero citrato de zinco, aumenta-se o efeito anti-placa. O creme dental Colgate Total 12 foi um dos primeiros dentifrícios que trouxe o triclosan. Dessa forma, é uma ótima opção para indicar aos pacientes 3. Óleos essenciais Representado comercialmente pelo Listerine , é um agente químico que demonstrou eficácia em estudos de uso doméstico em curto e longo prazo. Possuem ação anti-placa comprovada, não tendo, contudo, eficácia como a clorexidina. Um ponto negativo é a erosão dos tecidos dentais mineralizados(pH=4,3), o que reforça a ideia de ser um agente auxiliar com uso de duração limitada. 4. Detergentes O detergente, que está presente hoje em quase todos os cremes dentários, tem como representante o lauril sulfato de sódio . Tem uma efetividade de ação entre 5 a 7 horas, com uma ação inibidora de placa semelhante a do triclosan, mas ainda menor. do que a do triclosan. A maior parte dos cremes dentais hoje apresentam triclosan e lauril sulfato de sódio na sua composiçã o. 5. Antissépticos bisbiguanidas A Clorexidina é o principal representante dessa classe. É o agente químico de padrão ouro. Tem excelente ação antimicrobiana , com mínima absorção pela pele e mucosas, sem efeitos adversos significativos, sem resistência microbiana e alta substantividade(12 horas). O nome comercial é PerioGard. A Clorexidina é o único agente químico que pode ser substituto da escova e fio dental - temporariamente, em pacientes que necessitam. Contudo, esse PerioGard apresenta efeitos colaterais. Tem um prazo de utilização bastante restrito. O seu mecanismo de ação ocorre a partir de uma molécula di-catiónica, onde uma parte da molécula se liga aos tecidos periodontais/dentais e outra parte fica livre para se ligar a uma bactéria, de forma que essa parte ligada a bactérias garanta a morte dos micro-organismos. No entanto, a molécula pode se ligar a corantes, promovendo manchamento nos dentes; essas manchas podem ser removidas através de limpeza profissional. Os efeitos colaterais são: - Manchas acastanhadas nos dentes - Perturbação do paladar - Erosão da mucosa oral - Tumefação da parótida - Estímulo da formação de cálculo supragengival As concentrações de colutórios podem ser de duas formas, exigindo, então, duas prescrições diferentes: - 0,2% - 10 mL de 12 em 12h pelo tempo determinado - 0,12% - 15 mL de 12 em 12h pelo tempo determinada Há outras formas de apresentação da Clorexidina, como géis para uso direto restrito, vernizes para profilaxia, sprays e pastas de dentes - difíceis de serem manipulados pelo fato da clorexidina ser uma molécula catiónica. Dentro dos agentes químicos, os fenóis e detergentes são utilizados de forma rotineira. Os óleos essenciais e a clorexidina são utilizados de maneira restrita. 5. Instrução e motivação do paciente Em relação à instrução e motivação do paciente , é necessária uma participação ativa do indivíduo, com efetividade na mudança de comportamento. Para isso, utilizaremos os agentes evidenciadores de placa bacteriana , garantindo que o paciente ACREDITE no biofilme Na primeira sessão , pedimos para que o paciente traga a escova dental, iniciamos com a realização do Índice de Placa(IP) e Índice de Sangramento Marginal(IS), pedimos para que o paciente escove os dentes; nesse momento, observamos o tempo, empunhadura e dificuldades. Depois disso, utilizamos um evidenciador de placa, para que o paciente visualize a ineficácia da sua escovação. Dessa forma, mostraremos as regiões onde há maior dificuldade de escovação. Então, com o auxílio de macromodelos, devemos instruir o paciente a escovar os dentes com a técnica de Bass modificada . Depois disso, o paciente realizará a escovação novamente, para tentar remover o máximo de placa possível. Na segunda sessão , utilizaremos novamente a solução evidenciadora de placa, mostrando os pontos de maior dificuldade. Nessa etapa, introduziremos a limpeza interproximal, com o uso de fios dentais. Devemos solicitar novamente que o paciente escove os dentes, para que possamos observar os erros e corrigi-los. Caso o paciente apresente melhora, devemos motivá-lo com um reforço positivo.Ainda, utilizaremos os evidenciadores de placa para mostrar os possíveis erros de escovação. Se há uma grande dificuldade pelo paciente, utilizaremos o enxaguante para auxiliar nessa etapa inicial. Na terceira sessão repetiremos o mesmo processo das primeiras sessões. Portanto, no mínimo três sessões devem ser utilizadas para instrução e motivação do paciente. .
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