Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Disciplina: Perícia Forense - Medicina Legal Aula 5: Traumatologia forense 2 – energias física, química, bioquímica, físico-química, biodinâmica e mista Apresentação Nesta aula, reconheceremos as demais energias de agentes vulnerantes em Medicina Legal diversas da energia mecânica. São elas: as energias física, química, bioquímica, físico-química, biodinâmica e mista. A físico-química é uma área vasta e que será estudada na próxima aula. Nas energias mistas, reconheceremos os critérios de diagnóstico que fundamentarão a qualificadora chamada tortura. Aqui apresentaremos os conceitos básicos e a dinâmica de aplicação médica e forense. Objetivos Classificar os agentes vulnerantes em ordens de acordo com suas energias; Classificar e diagnosticar as lesões provenientes das energias diversas da mecânica; Vincular a lesão a cada tipo de energia diversa da mecânica. Classificação dos agentes vulnerantes diversos da energia mecânica Os agentes vulnerantes diversos da energia mecânica são classificados em ordem na forma que se segue: 1 Física 2 Química 3 Bioquímica 4 Biodinâmica 5 Físico-química 6 Mista A cada ordem se pressupõe uma energia. Cada instrumento tem uma energia potencial com capacidade para alterar o estado inercial de um corpo. Vamos estudar cada um, deixando a asfixiologia para aula em separado. Terminologia forense Terminologia forense é a área da medicina legal que se ocupa dos efeitos da temperatura no corpo humano. Veja a seguir os principais tipos de temperaturas e suas definições: Calor difuso A termonose seria atribuída ao calor difuso. Dois conceitos se apresentam: insolação (exposição direta) e intermação (exposição indireta). Outros fatores estão implicados, como a faixa etária, as condições ambientais de arejamento e ventilação, as vestes, patologias prévias, atividade física, alcoolismo, a fonte de calor natural ou artificial etc. Atualmente, o conceito anatomopatológico e clínico é que vai apontar o tipo de termonose, sendo a intermação de natureza hemodinâmica e a insolação (manifestações neurológicas) a evolução desfavorável da intermação. Calor localizado A queimadura é a consequência do calor localizado. Dupuytren classifica a queimadura em seis graus. Vamos prestigiar a classificação de Hoffmann, que a divide em quatro graus: 1º grau: compromete somente a epiderme. Eritema, edema e dor são as características principais; 2º grau: há comprometimento da derme. A vesícula ou flictena é a característica. Ao romper-se, expõe a derme; 3º grau: são lesões profundas, expondo aponeuroses e músculos. A necrose é a sua característica; 4º grau: são as lesões mais profundas, por vezes comprometendo o plano ósseo. Sua característica é a carbonização. Frio difuso (hipotermia) Na hipotermia, assim como na termonose, as circunstâncias é que vão direcionar o diagnóstico médico-legal. No frio difuso, há a manifestação de alteração do sistema nervoso, com sonolência, delírios e convulsões. A vítima apresenta também congestão polivisceral, isquemia de estruturas, edema pulmonar e infiltração hemorrágica na mucosa gástrica (sinal de Wischnewski). Frio localizado A geladura é a consequência do frio localizado. Calissen classifica a geladura em três graus: 1º grau: caracterizado pela palidez ou rubefação, ou eritema; 2º grau: aqui há eritema e bolhas (vesicação); 3º grau: caracterizado por necrose e gangrena. Temperaturas oscilantes Quando a vítima for submetida a oscilações térmicas, pode concorrer com baixa da imunidade e, consequentemente, predisposição a infecções oportunistas. Baropatia forense As variações da pressão atmosférica vão lesionar o homem conforme a redução da pressão (altitude) ou elevação (profundidade). A redução da pressão leva às doenças das montanhas, enquanto a elevação da pressão propicia as doenças dos caixões. Mal das montanhas Com a altitude, o ar fica rarefeito e com menor concentração de oxigênio. A hipóxia desencadeia mecanismos de adaptação. A não adaptação pode propiciar duas formas clínicas: clássica e doença dos monges. Na forma clássica, ocorre cefaleia frontal, insônia, náusea e vertigem. Não tratada, a hipóxia segue para desfechos graves, como o edema pulmonar e edema cerebral. A doença dos monges é a forma crônica caracterizada pela redução da ventilação pulmonar. Cefaleia, vertigem, irritabilidade, alucinações, sonolência e depressão fazem parte do quadro. Mal dos caixões O conjunto das alterações da elevação da pressão atmosférica é chamado de barotrauma. As formas clínicas do barotrauma podem estar relacionadas diretamente com a pressão (síndromes compressivas com comprometimento dos seios paranasais, da face, do dente, dos pulmões, das orelhas e síndrome de hiperdistensão pulmonar – SHP) ou indiretas (doença descompressiva, narcose por nitrogênio, intoxicação por gases e apagamento). Radiobiologia forense Radioatividade é o fenômeno de emissão natural ou artificial de radiações por elementos químicos instáveis. Trata-se de emissões eletromagnéticas, com poder de penetrar ou ionizar. As partículas emitidas são: 1 Alfa ( α ) Partículas pesadas e eletropositivas. Apresentam baixa penetrabilidade e alto poder de ionização; 2 Beta ( β ) Partículas leves e eletronegativas. Elevado poder de penetrabilidade e com pequeno poder de ionização; 3 Gama ( γ ) São fótons neutros com grande alcance e pequeno poder de ionização. A radiodermite é a lesão mais simples. Sua forma aguda é classificada em: 01 Primeiro grau: área avermelhada, eritematosa e com queda de pelos; 02 Segundo grau: pápulas vermelhas, crostosas ou ulceradas, dolorosas e infectadas; 03 Terceiro grau: progride com necrose que avança para a profundidade. 2 4 -1 0 0 0 As formas crônicas não têm uma apresentação definida. Registram-se lesões do tipo ulceroatrófica, neoplásica ou telangiectásica. Quanto à luz e ao som, podemos conceituar da seguinte forma: A luz é uma onda eletromagnética e/ou partículas (teoria da dualidade onda-partícula) que se propagam no ar e no vácuo, perceptíveis ao olho humano dentro de uma faixa de comprimento de onda. O som é uma onda mecânica longitudinal com propagação do tipo compressiva a uma velocidade no ar de 340m/s. O som também pode estar implicado como fator desencadeante de crises convulsivas (epilepsia acusticogênica). A exposição prolongada ao ruído pode levar a um quadro de perda auditiva permanente. Atenção Os efeitos indesejáveis da exposição à luz e ao som são de interesse médico-legal e, em sua maioria, decorrem de acidentes laborais (infortunística). Ordem química A ação química é denominada genericamente de ação cáustica; se ingerida essa substância, podemos ter o quadro de envenenamento. A lesão depende do agente, e sua agressão se faz por desidratação ou por liquefação. 1 Desidratação Os efeitos da desidratação, provenientes da ação coagulante, desenvolvem crostas ou escaras endurecidas no local de contato. 2 Liquefação O efeito liquefaciente propicia a formação de escaras úmidas, untuosas e moles. Veja a seguir as ações de acordo com cada agente: Ação ácida localizada Os ácidos coagulam e desidratam os tecidos. As lesões se apresentam secas, enquanto as tonalidades variam do branco ao preto de acordo com o tipo de ácido. O ácido sulfúrico, considerando a sua concentração, dá formação a escaras brancacentas ou carbonizadas. Tonalidade amarela aparece quando da ação do ácido nítrico e acinzentada se o ácido for o clorídrico . Ação básica ou alcalina localizada 5 As lesões pelos álcalis se apresentam úmidas pela ação liquefaciente. O representante desse grupo são os hidróxidos. Quando ingeridos , edemaciam os locais por onde passam e, se permanecerem por tempo em contato, acabam necrosando. No estômago, a agressão intensa de sua parede é conhecida como gangrena úmida de Tardieu . Ação sistêmica Os quadros sistêmicos são genericamente chamados de envenenamentos. Os venenos podem ser sólidos, líquidos ou gasosos. A título de exemplo, podemos citar a cicutoxina,extraída da cicuta. Esse foi o veneno que levou à morte de Sócrates. Da Atropa beladona, se extraem alcaloides. Da planta Nux vômica, se obtém um potente alcaloide chamado de estricnina que leva a espasmos e contrações musculares vigorosas, evoluindo para convulsões e morte. Dos gases, deve-se citar o cianeto, o gás sarin e o arsênico. O cianeto compromete severamente a fisiologia da respiração celular com consequente não utilização do oxigênio. Portanto, o oxigênio não entra nos processos metabólicos, concentrando-se nas vísceras e no sangue, dando aos mesmos uma tonalidade rósea. O gás sarin é do grupo dos organofosforados. Os efeitos deletérios desse gás são desencadeados pelo bloqueio da acetilcolina. Evolui com mal- estar generalizado, hipotensão, convulsões, paralisia e morte. O arsênico é conhecido na história como “o rei dos venenos”. Foi amplamente utilizado em épocas passadas nos envenenamentos. É um metal que se acumula nos fâneros. Inibe a tiamina, é cardiotóxico e compromete a respiração celular. A cocaína é um éster do ácido benzoico. Inibe a receptação das catecolaminas, intensificando a atividade simpática. 6 Na investigação forense, se apuram os efeitos agudos e crônicos. O diagnóstico jurídico pode ser acidente, suicídio ou homicídio. Dos comemorativos clínicos à morte, se pode auferir o tipo de envenenamento ou intoxicação. As substâncias apresentam tropismos por tecidos. Em função disso, o exame laboratorial deve se basear na análise química desses tecidos com atenção para a substância-alvo. Os metais pesados, por exemplo, fixam-se nos fâneros. Também podem ser encontrados no fígado. O benzeno tem tropismo pela medula óssea, o metanol pelo nervo óptico e os inseticidas halogenados pelo tecido adiposo. O chumbo tem avidez pelos ossos. Sua ação se faz sentir na medula óssea, alterando as hemácias e desenvolvendo um quadro de anemia microcítica hipocrômica. O benzeno é absorvido e eliminado pelos pulmões. Nos rins, pode ser eliminado como benzeno ou como fenol e derivados. As anfetaminas são metabolizadas no fígado em fenilacetona. Pelos rins, são eliminadas como anfetaminas, fenilacetona e derivados glicurônicos. Concorda com “hidróxidos”. Ordem bioquímica Essa ordem médico-legal é uma gama de alterações caracterizadas por inanição, desnutrição, intoxicações alimentares (salmonelose, entre outras), doenças carenciais e outras formas de perturbação alimentar. 01 Hipovitaminose A: xeroftalmia, cegueira noturna, pele descamativa e queratomalácia; 02 Hipovitaminose B1: beribéri e polineurites; 03 Hipovitaminose B2: pelagra; 04 Hipovitaminose C: escorbuto; 05 Hipovitaminose B6: dermatites; 06 Hipovitaminose D: raquitismo; 07 Hipovitaminose E: esterilidade; 08 Hipovitaminose K: discrasia sanguínea; 09 Deficiência de niacina: também provoca pelagra. Em relação à nutrição, destaquemos as leis básicas estabelecidas pelo médico argentino Pedro Escudero: 1 Lei da qualidade A alimentação deve ser completa em sua composição; 2 Lei da quantidade Quantidade específica, sem excessos e sem restrições, o suficiente para dar suporte às necessidades calóricas e nutritivas; 3 Lei da harmonia Os nutrientes devem guardar uma proporcionalidade entre si; 4 Lei da adequação O objetivo da alimentação deve estar voltado para a necessidade do organismo. Ordem biodinâmica Nessa ordem, se encaixam as complicações que divergem da ação vulnerante primária. Por vezes elas são evoluções clínicas e cirúrgicas desfavoráveis, infecções nosocomiais que podem levar ao choque clínico (cardiogênico, hipovolêmico, séptico etc.), à falência de múltiplos órgãos e à coagulação intravascular disseminada. Ordem mista Energias de ordem mista representam a ação de pelo menos duas ordens de agentes lesivos. Sua importância reside no seu interesse forense de natureza civil, penal e trabalhista. Exemplo A título de exemplo, podemos citar a fadiga, as doenças parasitárias, sevícias e tortura. Considera-se a fadiga como um complexo de alterações da biofísica, bioquímica e psíquica. A síndrome de burnout é um exemplo de fadiga de natureza profissional. Destaca-se nessa síndrome a depressão, que pode evoluir para a despersonalização. Dentro do contexto criminal, pela sua natureza dolosa, destaca-se a sevícia, que pode se dar por ação ou por omissão. Assim o são a síndrome da criança maltratada, a síndrome do ancião maltratado e a tortura. Atividades 1. Qual a energia vinculada à deficiência de vitaminas? a) Físico-química b) Biodinâmica c) Bioquímica d) Mecânica e) Física 2. Qual a característica da lesão por ação local de um ácido? a) Tonalidade branca b) Untuosidade c) Lesão seca d) Umidade e) Mole 3. Qual das lesões é própria da ação elétrica cósmica? a) Lesão com bordos elevados b) Marca elétrica de Jellineck c) Queimadura elétrica d) Eletroplessão e) Lichtemberg Referências FÁVERO, F. Medicina legal. 12. ed. Rio de Janeiro: Villa Rica, 1991. p. 342. FILHO, D. B. Toxicologia humana e geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 1988. FRANÇA, G. V. Medicina legal. 10. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015. p. 130-136. FRANKLIN, R. Perguntas e respostas comentadas de medicina legal. Rio de Janeiro: Rúbio, 2014. p. 233-235. WATERS, T.A. Heat illness: tips for recognition and treatment. Clev. Clin. J. Med. 2001. v. 68. n. 8. p. 685-687. WEXLER, R. K. Evaluation and treatment of heat-related illness. Amer. Fam. Physician. 2002. v. 65. n. 11. p. 2307-2314. Próximos Passos • Reconhecer as lesões próprias das asfixias; • Diferenciar as formas de asfixias; • Estabelecer o diagnóstico diferencial com asfixia clínica. Explore mais Pesquise na internet, sites, vídeos e artigos relacionados ao conteúdo visto. Em caso de dúvidas, converse com seu professor online por meio dos recursos disponíveis no ambiente de aprendizagem.
Compartilhar