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MODELAGEM E OTIMIZAÇÃO DA LAVAGEM DA LEVEDURA CERVEJEIRA

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS 
Faculdade de Engenharia de Alimentos 
 
 
Allan Richard Gomes Munford 
 
 
 
“Modelagem e otimização da lavagem da levedura cervejeira para inativação de 
micro-organismos deteriorantes do processo fermentativo da cerveja” 
 
 
 
 
 
 
 
Campinas-SP 
2017 
Allan Richard Gomes Munford 
 
 
“Modelagem e otimização da lavagem da levedura cervejeira para inativação de 
micro-organismos deteriorantes do processo fermentativo da cerveja” 
 
Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia de 
Alimentos da Universidade Estadual de Campinas como 
parte dos requisitos exigidos para obtenção do título de 
Mestre em CIÊNCIA DE ALIMENTOS 
 
 
 
 
Orientador: Prof. Dr. Anderson de Souza Sant’Ana. 
Coorientador: Dr. Rafael Djalma Chaves. 
 
 
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO 
FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELO ALUNO 
ALLAN RICHARD GOMES MUNFORD E ORIENTADO 
PELO PROF. DR. ANDERSON DE SOUZA SANT’ANA 
 
 
Campinas-SP 
2017 
 
Comissão Examinadora 
 
 
 
Prof. Dr. Anderson de Souza Sant’Ana 
Universidade Estadual de Campinas 
Orientador 
 
 
 
 
 
Prof. Dr. Marcus Bruno Soares Forte 
Universidade Estadual de Campinas 
Membro titular 
 
 
 
 
Prof. Dr. Pedro Esteves Duarte Augusto 
Universidade de São Paulo – ESALQ 
Membro titular 
 
 
 
 
Dra. Alessandra Regina da Silva Marques 
Fundação André Tosello 
Membro suplente 
 
 
 
 
Profa. Dra. Maristela da Silva do Nascimento 
Universidade Estadual de Campinas 
Membro suplente 
 
 
 
 
 
 
A ATA da defesa, com as respectivas assinaturas dos membros, 
 encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno. 
 
 
DEDICATÓRIA 
 
Dedico este trabalho ao meu eterno herói, orientador, referência e pai, Arnaldo 
Carlos Munford. Sem seus ensinamentos, dedicação e exemplo, este e outros 
projetos da minha vida jamais seriam concluídos. Tenho a certeza que hoje você 
perpetua sua sabedoria, evolução e bondade em outros planos. 
 
Minha gratidão será sempre eterna. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Agradeço a todos que dedicaram, nem que somente um momento de motivação e 
incentivo, para que este projeto se tornasse algo concreto. 
 
A Deus pela oportunidade de estar aqui hoje trilhando meu caminho para a evolução 
espiritual. 
 
Ao meu pai por tudo que representou e ainda representa em minha vida. Sem ele não 
me tornaria a pessoa que sou hoje. 
 
À minha querida família que sempre me incentivou e me deu todo o suporte para 
conquistar meus sonhos. Mãe, Audrey (Djow), Renan, tio Armando, vovô (in 
memoriam) e vovó, vocês são o meu maior tesouro. 
 
Ao amor da minha vida, Géssica Tassi, por me apoiar nas minhas escolhas, por toda 
a paciência, companheirismo e amor. Você foi o motivo deste projeto ter começado, 
sem você e tudo que você representa na minha vida, ele jamais teria sido concluído. 
 
Ao meu orientador, Professor Doutor Anderson de Souza Sant’Ana, por prontamente 
confiar em mim a sua orientação. Por nunca ter me dado o peixe, mas sim me 
ensinado a pescar. Pela oportunidade de realizar um grande projeto em uma das 
maiores instituições do nosso país. 
 
Ao meu coorientador, Rafael Djalma Chaves, pela orientação, parceria e 
companheirismo. 
 
Aos membros da banca, Dra. Alessandra Regina da Silva Marques, Prof. Dr. Marcus 
Bruno Soares Forte, Profa. Dra. Maristela da Silva do Nascimento e Prof. Dr. Pedro 
Esteves Duarte Augusto, pela cooperação, disponibilidade, correções e sugestões. 
 
Aos funcionários da Universidade Estadual de Campinas e Faculdade de Engenharia 
de Alimentos, pois sem a cooperação e dedicação de todos este e muitos outros 
projetos não seriam concluídos. Em especial ao Cosme e Juliana Carusi, profissionais 
como vocês fazem a diferença no mundo. 
 
À Fundação de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e Extensão (FAEPEX) pela bolsa de 
mestrado concedida. 
 
À cervejaria Germânia e seu mestre cervejeiro, Arnaldo Ribeiro, por me ceder o mosto 
para o projeto e por toda a abertura e receptividade. 
 
Aos meus colegas de trabalho do Laboratório de Microbiologia Quantitativa de 
Alimentos (LMQA), Ligia, Chacon, Monyca, Ramon, Letícia Pozza, Alexandra, Ana 
Paula, Larissa, Beatriz, Bruna, Marianna, Aline (She-ra), Aline Morgan, Amin, Claudia, 
Libia, Tarcísio, Rodrigo, Yanet, Fernanda, Arthur, Lucas, Isadora, Carine e Carol, por 
partilhar tantos momentos difíceis, alegres e de conquistas. Aprendi muito nesses 
anos de convívio com todos vocês. 
 
À minha grande amiga, Mariana Batista, pela amizade incondicional, por partilhar 
muitos dos momentos difíceis e de alegria da minha vida dentro e fora do laboratório. 
 
À minha parceira de tomadas de decisões, Juliana Lane, que sempre buscou meus 
conselhos e também me ajudou muito nas minhas decisões. 
 
Ao meu irmão, Olavo Conte, pela amizade e parceria, pelas conversas acadêmicas, 
profissionais e sobre a vida, pelo conhecimento técnico e profissional compartilhado. 
 
Ao meu grande amigo, Leonardo Prado, por todo o auxílio nos projetos paralelos ao 
mestrado, pelas conversas, pelo companheirismo no Rio de Janeiro, por sempre estar 
disposto a fazer o melhor e o correto por todos. 
 
Ao meu parceiro, Humberto Hungaro, pela amizade, orientação e ajuda no desenho 
dos meus experimentos em anaerobiose. 
 
À Verônica Alvarenga (Vê) pelos ensinamentos, disposição em ajudar, paciência e 
conversas que sempre me trouxeram conhecimento e reflexão. 
 
Aos colegas do laboratório LEMeB, Wesley, Felipe Beato, José Madeira (Zé), VJ, 
Bruno Labate, Felipe Ferrari (tropeço), Pamela, Alberto, Dani, Suéllen e Priscila, que 
fizeram desse local um refúgio, um ambiente de muita paz e alegria. Sempre que 
puder estarei visitando vocês, assim podemos tomar aquele café com cookies na 
pracinha. 
 
Aos professores, Dr. Andreas Karoly Gombert e Dra. Maria Isabel Rodrigues pelo 
profissionalismo, pelas qualidades técnica e didática nas disciplinas ministradas. Os 
conhecimentos transmitidos por vocês fizeram a diferença na minha formação 
acadêmica. 
 
Aos meus companheiros de república, Alexandre (Alê), Leonardo (Bola), Leonardo 
(Bidê), Mauricio (Queijo), Diego e Felipe (Abelhinha), pelos churrascos, conversas, 
jantas, discussões, jogos de futebol, parceria e ajuda. Nossa convivência me ensinou 
mais ainda sobre respeito, amizade e irmandade. 
 
À minha amiga, Clarisse Boni, que chegou ao meu laboratório como vendedora e saiu 
como uma grande amiga. Apesar de nunca ter sido um comprador, você me comprou 
e, ao me vender, me permitiu alçar voo profissionalmente. Você é meu exemplo de 
que vender é mais do que proporcionar uma experiência comercial, mas sim permitir 
a formação de uma amizade verdadeira e duradoura com as pessoas que precisam 
de você e de seus produtos. 
 
Aos meus colegas de trabalho e clientes que sempre me incentivaram e me deram 
força para concluir este projeto. 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
MODELAGEM E OTIMIZAÇÃO DA LAVAGEM DA LEVEDURA CERVEJEIRA 
PARA INATIVAÇÃO DE MICRO-ORGANISMOS DETERIORANTES DO 
PROCESSO FERMENTATIVO DA CERVEJA 
A contaminação do fermento cervejeiro por micro-organismos deteriorantes é uma das 
principais preocupações das indústrias cervejeiras. As principais alternativas 
empregadas pelos cervejeiros para eliminar contaminações microbianas do fermento 
e permitir sua reutilização, são as lavagens ácidas ou as lavagens com dióxido de 
cloro. Apesar de serem práticas comuns dentro das indústrias cervejeiras, a sua 
otimização e eficácia, sobre micro-organismos contaminantes do processo 
fermentativo, e o impacto sobre a levedura utilizada para fabricação da cerveja, ainda 
não são bem elucidados. Assim, o presente estudo deve como objetivos a modelagem 
da inativação dos principais contaminantes do processo cervejeiro através da lavagem 
ácida e otimizar os processos de lavagem ácida e lavagemcom dióxido de cloro, afim 
de se obter fermento de reinoculação livre de contaminantes e viável para novas 
bateladas fermentativas. Primeiramente, foram avaliados os perfis de inativação das 
cepas Lactobacillus brevis DMS 6235, Lactobacillus casei ATCC334, Pediococcus 
damnosus ATCC 29358 e Pediococcus damnosus DSM 20289; expostas ao processo 
de lavagem ácida com ácido fosfórico a 85%/4°C a diferentes regimes de pH (pH 1,5, 
pH 2 e pH 3). Com o uso do software GinaFit, diversos modelos foram ajustados aos 
dados obtidos, sendo os de Weibull e Weibull com cauda, os que melhor se ajustaram 
aos dados experimentais (R2 > 0,9). Através dos parâmetros obtidos pelos modelos 
foi possível observar que a resposta de inativação das cepas contaminantes é 
dependente o pH e que uma variação de 0,5 no pH do ácido utilizado pode ser 
suficiente para se obter inativações mais eficientes sem reduzir a viabilidade da 
levedura cervejeira. Para otimizar os processos de lavagem ácida e lavagem com 
dióxido de cloro foram utilizados 2 delineamentos compostos centrais rotacionais 
(DCCR), totalizando 2 experimentos com 11 ensaios independentes, sendo 3, no 
ponto central. Para a lavagem ácida as variáveis independentes foram pH (1-3) e 
temperatura (1-9 °C). Enquanto para a lavagem com dióxido de cloro as variáveis 
foram: concentração do sanitizante (10-90 mg/L) e a temperatura (5-25°C).O micro-
organismo alvo dos foi o Lactobacillus brevis DSM 6235. Os modelos obtidos para as 
4 variáveis resposta γLA, γCl (redução decimal do contaminante),Vf/V0LA e Vf/V0Cl 
(razãoda viabilidade da levedura cervejeira), apresentaram R2> 0,80 e valores de 
Fcalculado> Ftabelado, portanto considerados preditivos e estatisticamente significantes (p 
< 0,1). A validação dos modelos foi realizada dentro do intervalo dos parâmetros 
estabelecidos no ensaio, apresentando valores, dos fatores bias (γLA: 0,93 / 
Vf/V0LA:0,99 – γCl: 1,0 / Vf/V0Cl: 0,99) e exatidão (γLA: 1,12 / Vf/V0LA: 1,01 – γCl: 1,08 / 
Vf/V0Cl: 1,03), próximos a 1. Os resultados obtidos nestes estudos deixam evidente 
que a microbiologia preditiva e a modelagem através do delineamento experimental 
são, ambas ferramentas, importantes para se avaliar a eficácia de tratamentos de 
inativação de micro-organismos, assim como para se obter tratamentos em condições 
otimizadas. 
Palavras-chave: Cerveja, descontaminação, fermentação, microbiologia preditiva, 
delineamento experimental, otimização de processos, Lactobacillus, 
Pediococcusdamnosus. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
MODELING AND OPTIMIZATION OF BREWING YEAST WASHING FOR THE 
INACTIVATION OF SPOILAGE MICROORGANISMS FROM THE BEER 
FERMENTATIVE PROCESS 
The contamination of brewer's yeast by deteriorating microorganisms is a major 
concern of the brewing industry. The main alternatives used by brewers to eliminate 
microbial contaminations of the yeast and allow its reuse are acidic washes or washes 
with chlorine dioxide. Although, they are common practices within the brewing industry, 
their optimization and efficacy, on microorganisms that contaminate the fermentation 
process, and the impact on yeast used for brewing, are still not well understood. Thus, 
the present study should aim to model the inactivation of the main contaminants of the 
brewing process through the acid washing and to optimize the processes of acid 
washing and chlorine dioxide washing, in order to obtain repitching yeast free of 
contaminants and viable for new batch. First, the inactivation profiles of Lactobacillus 
brevis DMS 6235, Lactobacillus casei ATCC334, Pediococcus damnosus ATCC 
29358 and Pediococcus damnosus DSM 20289 were evaluated; exposed to the acid 
washing process with phosphoric acid 85% / 4 ° C at different pH regimes (pH 1.5, pH 
2 and pH 3). With the use of the GinaFit software, several models were fitted to the 
data obtained, Weibull and Weibull with tail, where the ones that best fited the 
experimental data (R2> 0.9). Through the parameters obtained by the models it was 
possible to observe that the inactivation response of the contaminating strains is pH 
dependent and that a variation of 0.5 in the pH of the acid used, may be sufficient to 
cause inactivation of contaminating microorganisms without reducing the viability of 
the brewer's yeast. To optimize the acid washing and chlorine dioxide washing 
processes, two central composite rotatable design (CCRD) were used, totaling 2 
experiments with 11 independent tests, 3 of which were in the central point. For acid 
washing the independent variables were pH (1-3) and temperature (1-9 ° C). While, for 
chlorine dioxide washing, the variables were: concentration of the sanitizer (10-90 mg 
/ L) and temperature (5-25 ° C). Lactobacillus brevis DSM 6235 was the target 
microorganism. The models obtained for the 4 response variables γLA, γCl (decimal 
reduction of the contaminant), Vf / V0LA and Vf / V0Cl (viability ratio of brewer's yeast) 
showed R2> 0, 80 and values of Fcalculated > Ftabulated, therefore considered as predictive 
and statistically significant (p <0.1). The validation of the models was performed within 
the range of the parameters established in the test, presenting bias factors (γLA: 0.93 / 
Vf / V0LA: 0.99 - γCl: 1.0 / Vf / V0Cl: 0.99) and accuracy (γLA: 1.12 / Vf / V0LA: 1.01 - γCl: 
1.08 / Vf / V0Cl: 1.03), close to 1. The results obtained in these studies make it clear 
that predictive microbiology and modeling through the experimental design are both 
important tools to evaluate the effectiveness of inactivation treatments of 
microorganisms, as well as to obtain treatments under optimized conditions. 
Key words: Beer, decontamination, fermentation, predictive microbiology, 
experimental design, process optimization, Lactobacillus brevis, 
Pediococcusdamnosus. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
Introdução geral ........................................................................................................ 15 
Capítulo 1: Revisão bibliográfica ............................................................................... 17 
Parte 1: indústria cervejeira ................................................................................... 18 
1.1 Definição e contexto econômico ................................................................... 18 
1.2 Matérias-primas para a produção de cerveja ................................................ 19 
1.3 Processamento ............................................................................................. 21 
Parte 2: Contaminações microbiológicas na indústria cervejeira ........................... 24 
2.1 Contaminações por micro-organismos deteriorantes ................................... 24 
2.1.1 Contaminações por bactérias gram-positivas ......................................... 25 
2.1.2 Contaminações por bactérias gram-negativas ....................................... 26 
2.1.3 Leveduras selvagens .............................................................................. 28 
2.2 Principais fontes de contaminação microbiológica durante o processo de 
fabricação da cerveja .......................................................................................... 30 
2.2.1 Contaminações primárias ....................................................................... 30 
2.2.1.1 Cevada e malte ................................................................................ 31 
2.2.1.2 Mosturação e mosto ......................................................................... 32 
2.2.1.3 Fermentação e maturação ............................................................... 34 
2.2.2 Contaminações secundárias .................................................................. 35 
2.2.2.1 Envase ............................................................................................. 36 
Parte 3: Tratamentos e reutiização da leveduracervejeira .................................... 37 
3.1 Descontaminação do fermento – a lavagem ácida ....................................... 37 
3.2 Ácidos fracos ................................................................................................ 39 
3.2.1 Teoria dos ácidos fracos......................................................................... 39 
3.2.2 Ácido fosfórico ........................................................................................ 41 
3.3 Dióxido de cloro ............................................................................................ 41 
3.4 Reutilização da levedura em sucessivas bateladas ...................................... 43 
Parte 4: Ferramentas para otimização de processos ............................................. 45 
4.1 Microbiologia preditiva .................................................................................. 45 
4.2 Planejamento experimental e delineamento composto central rotacional .... 46 
5. Referêncas bibliográficas ................................................................................... 48 
Capítulo 2: Cinética de inativação de bactérias deteriorantes de cerveja através da 
lavagem ácida de levedura de reinoculação ............................................................. 61 
Resumo .................................................................................................................. 63 
1. Introdução .......................................................................................................... 64 
2. Materiais e Métodos ........................................................................................... 66 
2.1. Micro-organismos e condições de cultivo .................................................... 66 
2.2. Condições da fermentação .......................................................................... 67 
2.3. Lavagem ácida ............................................................................................ 68 
2.4. Enumeração de micro-organismos e viabilidade da levedura ...................... 68 
2.5. Modelagem matemática da inativação ......................................................... 68 
2.5.1. Modelos matemáticos ............................................................................ 69 
2.5.1.1. Weibull e Weibull + cauda ............................................................... 69 
2.6. Análise estatística ........................................................................................ 69 
3. Resultados ......................................................................................................... 69 
4. Discussão .......................................................................................................... 77 
5. Referências ........................................................................................................ 81 
Capítulo 3: Modelagem da lavagem ácida eda lavagem com dióxido de cloro da 
levedura cervejeira de reinoculação para a inativação de bactérias contaminantes e 
manutenção da viabilidade ........................................................................................ 87 
Resumo .................................................................................................................. 89 
1. Introdução .......................................................................................................... 90 
2. Material e métodos ............................................................................................. 92 
2.1 Micro-organismos e condições de cultivo ..................................................... 92 
2.2 Condições da fermentação ........................................................................... 93 
2.3 Regimes de lavagem .................................................................................... 93 
2.4 Enumeração de micro-organismos ............................................................... 94 
2.5 Delineamento experimental, análises estatísticas e validação dos modelos 
desenvolvidos ..................................................................................................... 94 
3. Resultados ......................................................................................................... 95 
3.1 Otimização da lavagem ácida ....................................................................... 95 
3.2 Otimização da lavagem com dióxido de cloro ............................................... 99 
3.3 Validação dos modelos preditivos............................................................... 104 
4.Discussão ......................................................................................................... 105 
4.1 Otimização da lavagem ácida ..................................................................... 105 
4.2 Otimização da lavagem com dióxido de cloro ............................................. 106 
5.Conclusão ......................................................................................................... 108 
6. Referências ...................................................................................................... 108 
Discussão Geral ...................................................................................................... 116 
Conclusão Geral ...................................................................................................... 118 
Referências Geral ................................................................................................... 119 
 
15 
 
INTRODUÇÃO GERAL 
 
A produção mundial de cerveja está acima de 80 bilhões de litros por ano. 
Dentro desse mercado, o Brasil, ocupa uma posição estratégica com uma produção 
de mais de 8 bilhões de litros/ano, com faturamento bruto atingindo mais de R$ 17 
bilhões. Esse seguimento emprega mais de 150 mil pessoas, entre postos diretos e 
indiretos, e durante os anos de 2000 a 2004 o setor investiu mais de R$ 3 bilhões com 
a instalação de novas plantas industriais e na ampliação e modernização das 
indústrias já em operação (Sindicerve, 2004) 
Ao longo dos anos a qualidade representa um papel cada vez mais fundamental 
na sobrevivência e sucesso competitivo das organizações. A indústria cervejeira não 
é exceção, tendo como objetivo principal fornecer um produto de elevada qualidade 
para fazer face à competitividade e para satisfazer as necessidades dos seus clientes 
e consumidores. 
Dentre os principais requisitos percebidos pelo consumidor para uma cerveja 
de qualidade encontram-se, sobretudo aqueles relacionados com as suas 
propriedades sensoriais (cor, limpidez, brilho, ausência de flavours desagradáveis, 
etc.) (Back,2006). No entanto, tais requisitos podem ser afetados negativamente por 
contaminações microbiológicas, o que pode comprometer seriamente a imagem da 
cerveja ou da empresa que a produz junto ao mercado (Fernandes,2012). 
A contaminação microbiológica ocorrida durante o processamento da cerveja 
pode modificar as propriedades sensoriais do produto final, assim como pode causar 
o “arraste” da fermentação (Back, 2006). O arraste da fermentação ocorre devido à 
competição pelos nutrientes do mosto, entre a levedura cervejeira e os contaminantes 
(Vaughan, 2005). Em virtude do crescimento dos contaminantes do processo de 
fermentação, ocorre uma maior liberação de metabólitos no meio, o que acaba por 
inibir a multiplicação da levedura cervejeira (Priest, 2003) 
Nos processos industriais de produção de cerveja existentes no Brasil, e no 
mundo, o fermento é reutilizado em diversos ciclos fermentativos, o que aumenta a 
probabilidade de contaminação microbiológica. A levedura recuperada no final do 
processo de fermentação, também chamada de levedura de reinoculação, é 
reconhecida como sendo o principal reservatório de bactérias deteriorantes dentro das 
16 
 
indústrias (Ogden, 1987). Dos tratamentos mais utilizados na indústria,para reduzir 
a população microbiana contaminante, é a lavagem do fermento cervejeiro com ácido 
fosfórico ou dióxido de cloro (Cunningham e Stewart, 2000; Meneghin et al., 2008). 
Apesar de ser amplamente empregada na indústria cervejeira, não há estudos atuais 
de modelos que definem a sua eficiência na inativação de micro-organismos 
deteriorantes da cerveja e estratégias de otimização desses processos. 
A modelagem do efeito de sanitizantes em micro-organismos é considerada 
uma importante ferramenta na otimização de protocolos de sanitização existentes ou 
para a geração de novos (Virto et al., 2005). Na microbiologia preditiva, o estudo do 
crescimento ou morte microbiana em relação a fatores ambientais é traduzido em 
equações matemáticas que permitem a predição do crescimento ou inativação de 
micro-organismos em alimentos (Janssen et al., 2007). 
Esse estudo teve como objetivo geral a obtenção de ferramentas, como os 
modelos matemáticos preditivos, para se conhecer as condições ótimas de inativação 
das bactérias contaminantes do processo cervejeiro e manutenção da levedura 
cervejeira, pelos processos de lavagem ácida e com dióxido de cloro. 
Para alcance do objetivo geral, foram considerados nessa pesquisa, os 
seguintes objetivos específicos: 
- Avaliação da inativação de bactérias contaminantes do processo cervejeiro por 
diferentes regimes de lavagem ácida, 
- Identificação dos parâmetros cinéticos e perfis de curva de sobrevivência através de 
ferramentas da microbiologia preditiva de alimentos. 
- Otimizaçãodos processos de lavagem ácida e da lavagem com dióxido de cloro 
visando-se a inativação de contaminantes comuns do processo cervejeiro 
(Lactobacillus brevis DSM 6235) e manutenção da viabilidade da levedura cervejeira. 
 
 
 
 
 
 
17 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Capítulo 1: Revisão bibliográfica 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
18 
 
 PARTE 1: INDÚSTRIA CERVEJEIRA 
 1.1 DEFINIÇÃO E CONTEXTO ECONÔMICO 
Um dos processos biotecnológicos mais antigos conhecido pelo homem é o 
processo fermentativo de cereais. Há pesquisas que informam que a prática da 
cervejaria tenha se originado na Mesopotâmia em 6.000 A.C, e que a cerveja nesta 
época não era utilizada somente na dieta, mas também como artigo medicinal e 
cosmético (Kunze, 1997, Aquarone et al., 1983). 
De forma genérica, define-se cerveja como uma bebida carbonada de teor 
alcoólico entre 3 e 8% (v/v), produzida a partir de malte de cevada, lúpulo, fermento e 
água de boa qualidade, permitindo ainda o uso de outras matérias primas como arroz, 
trigo ou milho (Almeida e Silva, 2005). A legislação brasileira define através do Decreto 
nº 2314, de 04 de setembro de 1997, art.64 a art.71: “Cerveja é a bebida obtida pela 
fermentação alcoólica do mosto cervejeiro oriundo do malte de cevada e água potável, 
por ação da levedura, com adição de lúpulo” (Brasil, 1997). 
As cervejas podem ser divididas em dois grandes grupos: as do tipo Lager, como 
a Pilsen, Bock e Munique, e as do tipo. Ale, dentre as quais temos a Porter e a Stout. 
As cervejas do tipo Ale são produzidas através de uma fermentação superficial ou 
“alta”. Esse tipo de cerveja apresenta uma coloração variada, sabor pronunciado de 
lúpulo, sutil acidez e teor alcoólico variando de 4 a 8%. O processo de fermentação 
ocorre entre a temperatura de 20 e 25ºC, com duração de 2 a 5 dias e a maturação 
entre 4,5 e 8ºC. As cervejas do tipo Lager são as mais consumidas e comuns, sendo 
a Pilsen uma das cervejas mais tradicionais em todo o mundo. A fabricação das 
cervejas desse grupo ocorre por fermentação profunda ou “baixa”, através de 
processo lento, geralmente em torno de 5 dias. Essa cerveja é caracterizada por 
possuir sabor suave, cor clara e teor alcoólico entre 4 e 5% (Delos,1994). 
A produção de cerveja no Brasil atinge o volume de 8,5 bilhões de litros anuais, 
ficando atrás somente da China (27 bilhões de litros/ano), Estados Unidos (23,6 
bilhões de litros/ano), Alemanha (10,5 bilhões de litros/ano) e Rússia (9 bilhões de 
litros/ano), sendo o consumo per capita no país, o nono maior do mundo, com uma 
média de 47,6 litros/ano por habitante (Sindicerve, 2004). Portanto, a agroindústria do 
álcool representa um considerável gerador de divisas, e levando em conta que toda a 
19 
 
produção de álcool se dá por via fermentativa, é de fundamental importância o 
conhecimento do processo fermentativo, que tem sido constantemente aprimorado. 
1.2 MATÉRIAS-PRIMAS PARA A PRODUÇÃO DE CERVEJA 
 Na formulação da cerveja as principais matérias-primas são a água, cereais, 
lúpulo e fermento. A água é a principal matéria-prima da cerveja, pois representa 95% 
de massa final do produto e pelas suas características determinantes para a qualidade 
do produto final. Para se definir uma água de qualidade para o processo cervejeiro ela 
deve seguir padrões de qualidade como: ser translucida, inodora e isenta de qualquer 
indicio de matéria orgânica e sabor. A presença dos sais dissolvidos na água pode 
influenciar o processo fermentativo, e consequentemente, a qualidade da cerveja 
(Pombeiro, 2008). 
Os cereais são a fonte dos açúcares simples que serão assimilados pela 
levedura no processo fermentativo. Podem-se usar diferentes cereais, em conjunto ou 
separadamente. Mais comumente, utiliza-se a cevada (transformada em malte), 
devido ao seu alto teor de amido e capacidade enzimática. A utilização de outros 
cereais de forma adjunta, como o milho, arroz, trigo ou outros grãos tem por objetivos 
constituir uma fonte extra de amido de valor reduzido, refinar o gosto da cerveja, 
propiciar cores mais brilhantes e gerar maior estabilidade física (Fernandes, 2012). 
O lúpulo é uma planta que apresenta no pólen, das flores femininas, grânulos de 
lupulina que detêm as substâncias de interesse para o processo cervejeiro. Destas 
substâncias, as mais importantes são os óleos essenciais, as resinas amargas e os 
polifenóis, no qual a quantidade interfere no amargor, aroma e estabilidade 
microbiológica da cerveja (Fernandes, 2012). 
As leveduras cervejeiras são responsáveis pelo processo fermentativo. A 
espécie mais utilizada no processo é a Saccaromyces cerevisiae, no entanto dois tipos 
diferentes de estirpes são responsáveis por dois tipos de fermentações que produzem 
características distintas à cerveja, sendo elas estirpes do tipo Ale e Lager. As 
leveduras do tipo Ale, também conhecidas como “de alta fermentação”, pois se elevam 
até a superfície do mosto formando uma película flutuante de biomassa no final da 
fermentação. Entretanto, as leveduras Lager são “de baixa fermentação”, pois 
apresentam floculação e sedimentação no final do processo (tabela 1) (Carvalho et 
al., 2006). 
20 
 
 
Tabela 1. Tipos de cerveja produzidas por alta e baixa fermentação, principais 
características sensoriais e matérias-primas. 
Cervejas 
Caractrísticas 
físico-químicas 
Características 
sensoriais 
Matéria-prima Referências 
 
Alta 
fermentação 
 
Indian Pale 
Ale 
12,5-16°plato1 ; 5-11% de 
álcool1 2 3; 35-55 IBU1 4; 12-
28 EBC1 
Médio a alto amargor e teor 
alcóolico com coloração 
cobre1 3 
Água, malte, levedura e 
alto teor de lúpulos 
aromáticos e de 
amargor1 2 3 
1(Priest e Stewart, 
2006) 2(Bamforth, 
2009) 3(Kunze, 1997) 
4(Silva e Faria, 2008) 
5(Baiano e Terracone, 
2013) 
Weissbier 
11,8-14°plato1; 4,9-6 % de 
álcool1 2 3; 10-15 IBU1; 6-18 
EBC1 
Aromas frutados e fenólicos 
com baixo teor de amargor 
e com coloração palha turva 
1 3 
Água, malte de trigo e 
cevada, levedura e 
lúpulos aromáticos e de 
amargor1 2 3 5 
1(Priest e Stewart, 
2006) 2(Bamforth, 
2009) 3(Kunze, 1997) 
5(Baiano e Terracone, 
2013) 
Stout 
9,5-12°plato1; 3,8-5 % de 
álcool 1 2 3; 30-40 IBU1; 40+ 
EBC1 
Aroma de torra e alto teor 
de amargor 1 3 
Água, cevada e maltestorrados, levedura e 
elevado teor de lúpulos1 
2 3 5 
1(Priest e Stewart, 
2006) 2(Bamforth, 
2009) 3(Kunze, 1997) 
5(Baiano e Terracone, 
2013) 
Porter 
12-115°plato1; 4,5-6,5 % 
de álcool1 2 3; 20-40 IBU1; 
20-35 EBC1 
Aroma leve de torra e teor 
frutado com alto teor de 
amargor e coloração rubi1 3 
Água, cevada e maltes 
torrados, levedura e 
elevado teor de lúpulos 
1 2 3 
1(Priest e Stewart, 
2006) 2(Bamforth, 
2009) 3(Kunze, 1997) 
5(Baiano e Terracone, 
2013) 
Baixa 
fermentação 
 
Pilsner 
10-12°plato1; 3,8-5 % de 
álcool1 2 3 ; 5-14 IBU1; 4-8 
EBC1 
Aromas do malte, adjuntos 
e lúpulos leves com muita 
carbonatação e cor âmbar1 3 
Água, malte, adjuntos, 
levedura e lúpulos 
aromáticos e de 
amargor1 2 3 5 
1(Priest e Stewart, 
2006) 2(Bamforth, 
2009) 3(Kunze, 1997) 
5(Baiano e Terracone, 
2013) 
Bock 
15-17°plato1; 6-8 % de 
álcool1 2 3 ; 25-35 IBU1; 20-
30 EBC1 
Aromas de torra e 
adocidaco com médio teor 
de amargor e coloração 
marrom escuro1 3 
Água, malte de cevada 
torrado, levedura e 
lúpulos aromáticos e de 
amargor1 2 3 
1(Priest e Stewart, 
2006) 2(Bamforth, 
2009) 3(Kunze, 1997) 
Export 
11,9-13,8°plato1; 4-6,1 % 
de álcool1 2 3; 23-29 IBU1; 
3-12 EBC1 
Aroma moderado adocicado 
e lúpulado com coloração 
palha dourada1 3 
Água, malte, levedura e 
lúpulos aromáticos e de 
amargor1 2 3 
1(Priest e Stewart, 
2006) 2(Bamforth, 
2009) 3(Kunze, 1997) 
°Plato: porcentagem em massa de sacarose presente em uma solução - IBU: Escala internacional de amargor - EBC: 
Convenção cervejeira europeia para cor e turbidez. 
 
21 
 
1.3 PROCESSAMENTO 
A cerveja é obtida pela conversão em álcool, dos açúcares presentes nos grãos 
da cevada. A fermentação é a principal etapa do processo cervejeiro e sua efetividade 
depende de várias operações anteriores, incluindo o preparo das matérias-primas. 
Após a fermentação, são realizadas etapas de tratamento, para conferir à cerveja as 
características sensoriais (sabor, odor, textura) desejadas no produto final. A 
produção de cerveja apresenta basicamente quatro etapas: maltagem, preparação do 
mosto (mosturação), fermentação e processamento da cerveja (figura 1) (Santos et 
al., 2005, Willaert et al., 2006). 
O processo de fabricação do malte é conhecido como maltagem, e consiste no 
controle do umedecimento com água e posterior germinação, sob condições 
controladas de temperatura, com o intuito de formação de enzimas necessárias à 
hidrólise dos polissacarídeos e do amido presente nos grãos de cevada (Briggs, 
1998). Esse processo é formado por três etapas: molha, germinação e secagem dos 
grãos. Primeiramente os grãos são limpos e selecionados e em seguida depositados 
em tanques imersos em água, assim adquirindo certa quantidade de umidade 
necessária para se iniciar a germinação (cerca de 40-42%). Após a molha, os grãos 
são encaminhados para caixas de germinação onde permanecem em condições 
controladas de umidade, arejamento e temperatura, durante cerca de 4-6 dias. Dentro 
do processo de maltagem, a germinação tem como principal objetivo disponibilizar as 
enzimas necessárias à formação do mosto e de degradação dos tecidos de reserva 
da cevada, permitindo que o amido presente nos grãos se desprenda. Logo que os 
grãos apresentem indícios da germinação o processo é interrompido através de um 
processo de secagem em estufa ou torrefação. Por último, após a secagem, o malte 
é desradiculado e armazenado em silos por 3-4 semanas (Fernandes,2012). 
O processo de preparação do mosto, também conhecido como brassagem, 
pode ser dividido nas seguintes fases: moagem, mistura, filtração, fervura e 
decantação. Após a operação de moagem do malte e adjuntos, a farinha moída 
resultante é misturada com água aquecida e submetida a condições operacionais 
(tempo, temperatura, agitação e pH) pré-estabelecidas para que as enzimas amilases 
presentes no malte sejam ativadas e hidrolisem o amido em açúcares fermentescíveis 
(glicose, maltotrioses e maltose). Após a mistura, o líquido formado é filtrado para a 
separação da parte insolúvel (cascas do malte e proteínas coaguladas) do filtrado 
22 
 
(mosto) (Kunze, 1997, Pombeiro, 2008). O mosto resultante é fervido, sendo nesta 
etapa que ocorre a adição do lúpulo. A operação de fervura é uma etapa crítica para 
a qualidade do produto final, pois promove: esterilização microbiológica do mosto, 
eliminação de substâncias voláteis que geram sabores não desejáveis, inativação de 
enzimas e coagulação de complexos proteicos que podem causar turvação no produto 
final, formação de compostos responsáveis pela cor e sabor do produto, através de 
reação de Maillard e caramelização, e a extração de compostos amargos e aromáticos 
do lúpulo (Denk et al, 2000). Após a fervura, o mosto é enviado a um tanque de 
clarificação, nesse tanque acontece à decantação. Como o mosto servirá de fonte de 
nutrientes para as leveduras, no processo fermentativo, percebe-se a importância do 
seu correto preparo para que se obtenha uma cerveja de qualidade (Santos et al., 
2005, Willaert et al., 2006). 
Uma vez tendo sido preparado, pode-se dar início a fermentação do mosto, 
processo central da indústria cervejeira (Santos et al., 2005, Willaert et al., 2006). A 
fermentação do mosto é dividida em duas etapas: numa primeira etapa, denominada 
aeróbia, as leveduras são adicionadas no mosto areado e se reproduzem rapidamente 
aumentando sua população entre 2 a 6 vezes, devido à alta quantidade de O2 
dissolvido no meio. Depois que todo o oxigênio é consumido, inicia-se a fase 
anaeróbia, na qual as leveduras realizam a fermentação propriamente dita, 
convertendo os açúcares presentes no mosto em CO2, etanol e compostos aromáticos 
como ácidos orgânicos, ésteres e aldeídos (Siqueira et al., 2008, Santos et al., 2005). 
O processo de fermentação dura de 3 a 9 dias, ao final dos quais se obtém, além do 
mosto fermentado, uma grande quantidade de gás carbônico que após ser purificado 
é reaproveitado em outra etapa do processo cervejeiro. Ao final de fermentação, 
obtém-se também um excesso de levedo, que é tratado e estocado, sendo uma parte 
reutilizada em novas bateladas de fermentação, e parte vendida para a indústria de 
alimentos (Santos et al., 2005). 
O mosto fermentado, chamado também de cerveja verde, que ainda possui 
uma suspensão de leveduras e uma parte do material fermentescível, passa por uma 
fermentação secundária chamada de maturação. Essa etapa permite que a levedura 
continue atuando a uma velocidade reduzida devido às baixas contagens e 
temperatura de acondicionamento. Após a fermentação, a cerveja que é encaminhada 
para o processo de maturação apresenta 1-4 milhões de células por ml e uma 
23 
 
gravidade de 2-4 graus Plato. Nessa fase ocorre a precipitação de coloides que 
causam turvação à cerveja e eliminação de substâncias que causam sabor 
desagradável. Esta etapa do processo é realizada sob temperaturas de 0 a 3°C 
durante um período de 15 a 60 dias, e contribui para a clarificação da cerveja e 
melhora do seu sabor (Aquarone et al., 1983, Santos et al., 2005). 
A cerveja já maturada é dirigida para o processo de filtração para que se torne 
límpida e brilhante, eliminando os complexos proteicos coloides que ainda se 
encontram em suspensão e possíveis contaminantes microbiológicos e a levedura 
cervejeira. O processo consiste em uma aplicação de força sobre o líquido através de 
uma membrana ou meio filtrante (ex. terra de diatomáceas). Nessa fase a cerveja 
pode ser ainda diluída em água, para o ajuste de sua concentração, e carbonatada, 
para o ajuste de dióxido de carbono a valores desejados para a cerveja final 
(Fernandes, 2012). 
Depois de filtrada, a cerveja segue para uma linha de enchimento de latas, 
garrafas ou barris. Para se evitar a formação de espuma e eliminar o oxigênio contido 
nas embalagens, que poderia deteriorar a cerveja em termos físico-químicos(oxidação) ou microbiológicos, o enchimento é feito em contrapressão com gás 
carbônico. Na fase de enchimento procede-se ainda à estabilização microbiológica da 
cerveja, que pode ser feita através de filtração esterilizante ou pasteurização. São 
conhecidos dois modos de pasteurização: 
(a) Pasteurização flash: processo no qual a cerveja é aquecida por uma placa 
de trocador de calor a uma temperatura entre 68 a 72ºC e mantidas a essa 
temperatura por aproximadamente 50 segundos. Após esse tempo a cerveja é 
novamente resfriada (Kunze, 1994). 
(b) Pasteurização “túnel”: Nessa operação a cerveja, já no interior da 
embalagem fechada, passa por um túnel fechado com esguichos de água quente que 
tem por objetivo elevar a temperatura do líquido dentro da embalagem a uma 
temperatura aproximada de 60 ºC por 20 min (Briggs et al., 2004). 
24 
 
 
Figura 1. Processo cervejeiro e principais pontos de contaminação por micro-
organismos (*) (Modificado de Vaughan et al., 2005). 
 
PARTE 2: CONTAMINAÇÕES MICROBIOLÓGICAS NA INDÚSTRIA 
CERVEJEIRA 
 
2.1 CONTAMINAÇÕES POR MICRO-ORGANISMOS DETERIORANTES 
A cerveja é reconhecida como uma bebida de singular estabilidade 
microbiológica. Tal fato deve-se a diversos fatores que a tornam um meio desfavorável 
à sobrevivência e/ou multiplicação de vários micro-organismos, dos quais podemos 
citar: a) presença de etanol (0,5 a 10% p/p, equivalente a aproximadamente 0,6 a 
12,3% v/v), b) presença de compostos antimicrobianos encontrados no lúpulo (17 a 
55 ppm de iso-α-ácidos), c) elevada concentração de dióxido de carbono 
(aproximadamente 0,5% p/p), d) baixo pH (3,8 a 4,7) e e) reduzida concentração de 
oxigênio (<0,1 ppm). Mesmo apresentando essas características desfavoráveis à 
sobrevivência e/ou multiplicação microbiana, alguns micro-organismos são capazes 
de se multiplicarem nessas condições e causarem a deterioração desta bebida 
(Suzuki et al., 2006a; Sakamoto e Konings, 2003). Além da deterioração do produto 
25 
 
final, a contaminação microbiológica durante o processo de fabricação da cerveja, 
pode causar diversos problemas, tais como: consumo de açúcar, formação de goma, 
floculação do fermento, inibição e redução da viabilidade das leveduras devido às 
toxinas e ácidos orgânicos excretados no meio, e, por consequência, redução no 
rendimento e na produtividade da fermentação (Alterthum et al., 1984, Amorim et al., 
1982, Yokoya, 1991). 
Os micro-organismos que comumente são encontradas no processo de 
produção da cerveja podem ser classificados de acordo com sua forma, 
características bioquímicas, aspectos estruturais, ou ainda através de técnicas de 
coloração (Briggs et al., 2004, Hough et al., 1982). Dentre as técnicas conhecidas de 
identificação, uma das mais importantes e mais amplamente utilizadas em 
microbiologia é o método de Gram, em que as bactérias são coradas e então 
classificadas em dois grupos: Gram-positivas e Gram-negativas (tabela 2) (Boulton e 
Quain, 2006, Pelczar et al., 1980). 
 
2.1.1 CONTAMINAÇÕES POR BACTÉRIAS GRAM-POSITIVAS 
Dentre as bactérias Gram-positivas causadoras de deterioração da cerveja, 
temos as bactérias ácido láticas pertencentes aos gêneros Lactobacillus e 
Pediococcus (Gil et al., 2004, Venturini e Cereda, 2001). Aproximadamente 70% dos 
problemas por contaminação da cerveja são causados por bactérias láticas (Iijima et 
al., 2007, Suzuki et al., 2006a, Suzuki et al., 2006b). 
O gênero Lactobacillus é o mais conhecido dentre as bactérias ácido láticas, 
incluindo numerosas espécies que são amplamente empregadas em vários processos 
fermentativos, tais como na produção de picles, vinho e iogurte (Sakamoto e Konings, 
2003). L. brevis tem sido relatada como a espécie mais frequentemente detectada 
como deteriorante da cerveja, e, portanto, o micro-organismo mais estudado na 
produção cervejeira (Back, 2005). Essa bactéria é uma heterofermentativa estrita que 
apresenta crescimento ótimo a 30 °C e pH entre 4 e 5, e que pode causar 
superatenuação (consumo acelerado de açúcares fermentescíveis pelos 
contaminantes) na cerveja devido à capacidade de fermentar dextrinas e amido 
(Vaughan et al., 2005, Priest, 1996). 
26 
 
O gênero Pediococcus é constituído por bactérias homofermentativas que 
crescem em pares ou tétrades. Antigamente estas bactérias eram intituladas como 
sarcinas, pois sua organização celular era confundida com aquela das verdadeiras 
sarcinas. Por esse motivo, a deterioração da cerveja causada por estes micro-
organismos era denominada “doença da sarcina” (Sakamoto e Konings, 2003). A 
deterioração causada por Pediococcus é semelhante àquela causada por outras 
bactérias ácido láticas, provocando aumento de turbidez, acidez e formando sabores 
e aromas desagradáveis (amanteigados, devido à formação de diacetil) (Hartnett et 
al., 2002; Hough et al., 1982). 
A espécie P. damnosus, também referenciada na literatura como P. cerevisiae, 
é conhecida como a mais comum e perigosa bactéria deteriorante da cerveja, sendo 
responsável por cerca dos 90% dos casos de contaminação de cerveja por bactérias 
desse gênero (Priest, 1996). É conhecido que algumas estirpes de P. damnosus 
produzem exopolissacarídeos que tornam, de forma indesejada, a cerveja viscosa e 
gelatinosa (Back, 2005). Essa espécie também é reportada por se aderir as leveduras 
e algumas vezes induzir a uma sedimentação prematura do fermento, resultando em 
um retardamento do processo fermentativo (Priest, 2003). 
 
2.1.2 CONTAMINAÇÕES POR BACTÉRIAS GRAM-NEGATIVAS 
Os micro-organismos Gram-negativos conhecidos como deteriorantes da 
cerveja abrangem diversas espécies de bactérias pertencentes a vários gêneros. 
Dentre eles, os mais importantes incluem as bactérias dos gêneros Pectinatus, 
Megasphaera, Zymomonas e certos membros da família Enterobacteriaceae (Boulton 
e Quain, 2006; Priest, 2003; Briggs et al., 2004; Sakamoto e Konings, 2003). 
O gênero Pectinatus é constituído por bacilos anaeróbios, móveis, não 
formadores de esporos que possuem flagelos laterais. Estas bactérias podem se 
multiplicar em temperaturas de 15 a 40 °C (ótima de 32 °C), pH 3,5 a 6 (ótimo 4,5) e 
em meios contendo até 4,5% p/p (aproximadamente 5,6% v/v) de etanol (Chelak e 
Ingledew, 1987). As espécies P. cerevisiiphilus e P. frisingensis estão entre as 
principais deteriorantes da cerveja, sendo responsáveis por 20 a 30% dos incidentes 
por contaminação bacteriana, principalmente em cervejas não pasteurizadas 
(Vaughan et al., 2005; Back, 1994b). Essas bactérias, durante a multiplicação, 
27 
 
produzem quantidades consideráveis de ácidos, tais como, o ácido propiônico, 
acético, láctico, succínico e também de acetoína (Haikara et al., 1981). A espécie P. 
cerevisiiphilus, em temperaturas acima de 15°C, produz uma grande quantidade dos 
ácidos propiônico os quais inibem a multiplicação do levedo cervejeiro, S. cerevisiae 
(Chowdhury et al.,1997). No entanto, o principal efeito de deterioração causado pelas 
espécies de Pectinatus é uma evidente turvação e um forte cheiro de “ovo podre” 
resultante da combinação de diferentes ácidos graxos, sulfeto de hidrogênio e metil 
mercaptano (Lee et al.,1980). No seguimento cervejeiro industrial Pectinatus tem 
como fontes o óleo de lubrificação, tubulações, a água de maceração do malte antes 
da moagem e na água condensada no teto (Helander et al., 2004). 
Ogênero Megasphaera tem sido relacionado como responsável por 7% dos 
incidentes por bactérias deteriorantes na produção de cerveja (Back, 1994). Esse 
gênero é constituído por 2 espécies, M. elsdeni e M. cerevisiae. Porém, somente M. 
cerevisiae tem sido considerada responsável pela deterioração de cervejas 
(Sakamoto e Konings, 2003; Satokari et al., 1998). As células desse micro-organismo 
são cocos Gram-negativos, imóveis e anaeróbios estritos. Sua multiplicação ocorre 
entre 15 e 37 °C, com temperatura ótima de 28 °C, e em valores depH acima de 4,1, 
sendo inibidas em cervejas com concentração de etanol acima de 2,8% p/v 
(aproximadamente 3,5% v/v). Entretanto, já foi evidenciado crescimento em 
concentrações de etanol de 5,5% p/v (Haikara e Lounatmaa, 1987). A contaminação 
da cerveja causada por esse micro-organismo resulta na produção de consideráveis 
quantidades de ácido butírico, aliado a baixas concentrações de ácido acético, 
isovalérico, valérico, capróico e de acetoína (Vurren, 1996). M. cerevisiae é um dos 
micro-organismos mais temidos pelos cervejeiros, pelo fato de, assim como ao 
Pectinatus, provocar odor fecal na cerveja através da produção de sulfeto de 
hidrogênio (Lee, 1994). 
Outro gênero de bactéria Gram-negativa conhecido por causar problemas na 
indústria cervejeira é o Zymomonas, particularmente a espécie Z. mobilis. Essa 
bactéria é uma anaeróbia tolerante ao oxigênio, resistente ao lúpulo e apresenta a 
capacidade de se multiplicar em cervejas com pH acima de 3,4 e concentrações de 
etanol de até 10% (v/v). Apresenta crescimento rápido a 15 °C em cervejas mantidas 
em tonéis, mesmo sua temperatura ótima de crescimento sendo de 30 °C (Hough et 
al., 1982). 
28 
 
Sendo assim, os problemas causados pela contaminação da cerveja provocam 
não somente grandes prejuízos econômicos, com a retirada dos produtos do mercado, 
mas também perda da confiança do consumidor, motivos esses que podem levar à 
falência da empresa. Desta forma, a contaminação da cerveja é uma das principais 
preocupações das indústrias cervejeiras no mundo inteiro (Iijima et al., 2007). 
 
2.1.3 LEVEDURAS SELVAGENS 
 As leveduras, conhecidas como selvagens, são quaisquer leveduras presentes 
no processo que não a estirpe industrial utilizada. As leveduras selvagens podem ser 
isoladas de todos os estágios do processo cervejeiro, desde a matéria-prima até o 
produto armazenado. As leveduras selvagens deteriorantes do processo podem ser 
divididas em Saccharomyces, como estirpes de S. cerevisiae, e não-Saccharomyces, 
como os gêneros Brettanomyces, Hansenula, Debaryomyces, Torulopsis, Dekkera, 
Candida e Pichia, sendo as do gênero Saccharomyces consideradas as mais 
prejudiciais. Dentre os efeitos deteriorantes causados nas cervejas, sabe-se que as 
leveduras selvagens podem causar turvação, formação de película na superfície da 
cerveja, fermentação com desvio na atenuação e desenvolvimento de aromas 
desagradáveis devido à formação de compostos sulforosos, fenólicos e diacetílicos. 
(Sakamoto e Konings, 2003; Carvalho et al., 2006). Além dos problemas apresentados 
acima, algumas leveduras selvagens são conhecidas como Killer yeasts (KY) devido 
à capacidade desses micro-organismos de secretar polipeptídios que são tóxicos para 
outras espécies ou estirpes de leveduras. Um dos principais micro-organismos 
selvagens produtores de toxinas é a Saccharomyces cerevisiae, que pode ser 
distinguida das leveduras cervejeiras através de suas características morfológicas. 
Esses produzem células menores e alongadas e floculam inconstantemente. As KY 
podem contaminar a fermentação eliminando e substituindo a levedura cervejeira do 
processo, que muitas vezes são susceptíveis a concentrações de KY baixas como de 
0,01% (Vaughan et al, 2005). 
29 
 
Tabela 2. Micro-organismos deteriorantes e suas características de crescimento e deterioração. 
Micro-
organismo 
Morfologia 
Tolerância 
ao lúpulo 
T° de 
crescimento 
Tolerância 
ao álcool 
(% v/v) 
Faixa de 
crescimento 
(pH) 
Tolerância 
ao O2 
Metabólitos 
formados 
Deterioração 
 
Lactobacillus 
brevis 
Bacilo 
G(+)1,2 
(+)1,2 2-30°C1 >141 <3.5 - 51,2 Microaerófilo1 
Diacetil1,2, 
lactato1,2, 
acetato1, 
glicerol6, 
etanol6 
Atenuação1, 
turbidez1,2 , off-
flavours1,2 
Lactobacillus 
casei 
Bacilo 
G(+)3 
(+)16 2-40°C18 <16,515 5,5-7,517 Microaerófilo2 
Diacetil1 , 
Acetoína1 
,Lactato2 
Atenuação2, 
turbidez2 , off-
flavours2 
Pediococcus 
damnosus 
Cocos 
G(+)3 
(+)2 8-30°C7 <49 4 - 77,8 Microaerófilo8 
Diacetil4,5 , 
lactato6 
Atenuação4,5,6, 
turbidez4,5,6 , 
off-flavours4,5,6 
Pectinatus 
cerevisiiphilus 
Bacilo 
G(-)2,6 
(+)2,6 15-40°C10 <5,610 3,5-610 Anaeróbio2,6,11 
Ác. 
Propiônico2,12, 
acético2,12 , 
H2S2,13 
Turbidez13, 
odor fecal13 
Megasphaera 
cerevisiae 
Cocos 
G(-)2,6,8 
(+)2,6 15-37 °C8 >3,58 >4,18 Anaeróbio2,6,8 
Ác. Butírico2,14, 
acetoína2,14 e 
H2S13 
Turbidez2 , odor 
fecal13 
Fonte: 1(Teixeira,1999), 2(Priest, 2003), 3(Sakamoto e Konings, 2003), 4(Hartnett et al., 2002), 5(Hough et al., 1982), 6(Briggs et al.,2004), 7 (De Vos et al, 2009), 8(König et al., 2009), 9(Fernandes 
et al., 1991), 10(Chelak e Ingledew, 1987), 11(Haikara e Lounatmaa, 1987), 12(Haikara et al.,1981), 13(Lee et al.,1980), 14(Vurren, 1996), 15(Suzuki, 2011), 16( (Haakensen et al., 2009), 17 (Axelsson 
2004), 18(Roginski, 2003) 
30 
 
2.2 PRINCIPAIS FONTES DE CONTAMINAÇÃO MICROBIOLÓGICA DURANTE O 
PROCESSO DE FABRICAÇÃO DA CERVEJA 
 O processo de produção de cerveja apresenta diversas fontes de contaminação 
microbiológica que podem afetar o produto final de forma significativa. A contaminação 
primária é a que acontece durante as etapas de produção, já a contaminação 
secundária é a que predomina nas fases de enchimento e pasteurização, e que se 
observa no produto final (Vaughan et al., 2005). 
 
Figura 2. Microbiota contaminante do processo de produção de cerveja (Modificado 
de Bokulich e Bamforth, 2013). 
 
2.2.1 CONTAMINAÇÕES PRIMÁRIAS 
Diversos problemas de contaminação microbiológica observados durante o 
processo produtivo da cerveja têm como fonte as matérias-primas. A matéria-prima 
que apresenta uma contaminação aguda pode introduzir uma carga de contaminantes 
31 
 
microbianos que podem ser carreados até a etapa de pré-filtração da cerveja, 
comprometendo o processo e podendo gerar metabólitos resistentes que 
permanecem até o produto final (Fernandes, 2012). 
Outra importante fonte de contaminação primária pode ser a cultura cervejeira 
em si. Um inóculo de levedura contaminado microbiologicamente pode principalmente 
afetar a fermentação (arrastar a fermentação). Para garantir um inóculo formado 
apenas pelo micro-organismo de interesse, ou seja, a estirpe de levedura utilizada no 
processo produtivo, quando se for reutilizar o fermento, deve-se realizar um 
tratamento para se eliminar as bactérias presentes. Este tratamento é normalmente 
feito com ácidos, como ácido fosfórico 5% por tempos e condições de temperatura 
que podem variar de empresa para empresa. Além disso, outra medida visando-se 
garantir a qualidade microbiológica do inóculo inicial é a renovação regular de cultivos 
puros de forma a evitar contaminações cruzadas por leveduras selvagens (Fernandes, 
2012). 
 
2.2.1.1 CEVADA E MALTE 
A contaminação microbiológica do processo cervejeiro começa nos campos de 
cultivo da cevada, nos quais a interação planta/micro-organismos pré e pós-colheita e 
a condição do grão podem implicar sérios problemas para o processo e para a 
qualidade do produto final. Muitos contaminantes dos campos não persistem após as 
diversas operações unitárias do processo, entretanto alguns metabólitos secundários 
podem perdurar até o produto envasado (Bokulich e Bamforth, 2013). 
Diversos micro-organismos já foram identificados como contaminantes da 
cevada (Figura 2), contudo somente alguns fungos patógenos de plantas apresentam 
uma expressiva importância para a qualidade da cerveja. Diversos fungos apresentam 
a capacidade de produzir metabólitos secundários, conhecidos como micotoxinas, que 
persistem por todo o processamento cervejeiro e é detectado no produto final (Wolf-
Hall, 2007, Kostelanska et al., 2009). Das diversas espécies de fungos que 
contaminam a cevada do campo ao armazenamento, o gênero Fusarium merece uma 
menção especial, pois esse é reconhecido como, opatógeno de plantas, produtor da 
micotoxina Deoxinivalenol (DON ou Vomitotoxina) (Clear et al., 1996). Os efeitos 
toxigênicos da DON para animais e humanos já estão bem elucidados, gerando uma 
32 
 
expressiva preocupação, quando se refere a padrões de qualidade na produção de 
cevada e malte. Além do potencial toxigênico em relação à saúde humana, altas 
concentrações de micotoxinas já demonstraram um efeito inibidor do crescimento das 
leveduras no processo de fermentação (Boeira et al., 1999ab). 
A contaminação fúngica da cevada e do malte também causa um problema que 
afeta o consumidor diretamente no momento do consumo, o gushing. O gushing é 
uma reação anormal de formação de espuma, devido à liberação espontânea de gás, 
no momento e abertura da embalagem. Esse fenômeno é proporcionado devido a 
peptídeos hidrofóbicos fúngicos (hidrofobinas) que atuam como sítios de adesão as 
bolhas de dióxido de carbono do produto envasado que, no momento de abertura, 
liberam esses gases de forma anormal causando a super espumação (Deckers et 
al.,2011). 
Dentro do processo de maltagem a fase de molha e germinação dos grãos torna 
essa matéria-prima suscetível a contaminações microbianas que podem alterar 
qualidade da cerveja por todo o processo. Entretanto a fase de secagem proporciona 
uma considerável redução na contagem de micro-organismos viáveis (Bokulich e 
Bamforth, 2013). Na fase de molha os micro-organismos presentes no grão se 
multiplicam rapidamente no próprio grão e na água de molha, isso devido à presença 
de nutrientes dissolvidos, umidade, temperatura favorável e aeração (Petters et al., 
1988, O’sullivan et al., 1999, Briggs e Mcguinness, 1993). O crescimento microbiano 
nessa etapa apresenta efeitos negativos para a qualidade do malte, além disso esses 
micro-organismos podem consumir o oxigênio disponível inibindo a germinação do 
grão e reduzir os efeitos desejáveis da alfa-amilase (Briggs e Mcguinness, 1993, 
Boran e Briggs, 1992, Kelly e Briggs, 1992). 
 
2.2.1.2 MOSTURAÇÃO E MOSTO 
Durante a fase de mosturação, bactérias termofílicas podem apresentar 
crescimento em caso de queda de temperatura do mosto, não lúpulado, ou se a 
temperatura for mantida abaixo de 60ºC (Vaughan et al., 2005). 
Bactérias aeróbias e formadoras de esporos do gênero Bacillus, ocasionalmente, 
causam problemas em cervejarias. Os esporos dos micro-organismos desse gênero 
estão presentes no malte e adjuntos e sobrevivem por todo o processo de produção 
33 
 
cervejeira, entretanto não apresentam germinação durante a fermentação e no 
produto final devido ao baixo pH dos meios e sensibilidade aos componentes do lúpulo 
(Smith e Smith, 1993). Contudo, Bacillus coagulans já foi reportado como produtor de 
ácido láctico em processo de mosturação mantidos a temperatura entre 55-70ºC por 
mais de duas horas, sendo esse crescimento atribuído à produção de nitrosamina 
acima do limite permitido (20 ug/L) (Calderbank e Hammond, 1989, Smith e Smith, 
1992). O crescimento de Clostridium durante a mosturação, ou no mosto pré-fervura, 
pode gerar a formação de ácido butirico que caracteriza um odor de queijo no produto 
final (Hawthorne et al., 1993). A baixa qualidade da espuma do produto final, assim 
como a consistência pouco viscosa do mosto em sua produção já foi correlacionada 
com a produção de beta-glucanases e xilanases produzidas por fungos (Latilia et al., 
2007). 
Após a mosturação e filtração o mosto é fervido por um longo período, formando 
um meio para a fermentação com características estéreis. Entretanto, o mosto é um 
meio rico em nutrientes e com alto pH (~5,5), portanto ao ser resfriado o meio se torna 
vulnerável a contaminações por micro-organismos oportunistas presentes no 
ambiente industrial. Dentre os potenciais contaminantes do mosto os mais comuns 
são os micro-organismos Gram-negativos do grupo das enterobactérias, como as 
espécies dos gêneros Klebsiella, Escherichia, Obesumbacterium, Enterobacter e 
Citrobacter (Priest et al., 1974). A contaminação do mosto por enterobactérias esta 
associada ao uso de suprimento de água contaminada ou devido a vazamentos de 
tubulações que atingem o mosto durante o processo. O crescimento de 
enterobactérias além de inibir o crescimento de leveduras (Priest et al., 1974), está 
relacionado com a produção de dimetilsulfido (DMS), diacetil, ácidos orgânicos e 
grande quantidade de 2,3-butanodiol dando a cerveja um aroma indesejável de fruta 
e vegetais (Priest et al., 1974, Van Vuuren et al., 1980). As enterobactéria, além de 
contaminar o mosto em diferentes fases de sua produção, são conhecidas como 
contaminantes do processo de reutilização do inóculo, por exemplo, espécies dos 
gêneros Obesumbacterium e Enterobacter (Priest et al., 1974). Entretanto, devido aos 
elevados padrões de higienes aplicados ao processo e a evolução dos equipamentos, 
a contaminação por enterobactérias no processo cervejeiro diminuiu 
consideravelmente, podendo esse grupo ser considerado pouco relevante como 
contaminante do processo (Bokulich e Bamforth, 2013). 
34 
 
 
2.2.1.3 FERMENTAÇÃO E MATURAÇÃO 
 Após a adição de lúpulo e fervura, o mosto é clarificado, resfriado e aerado para 
que apresente características adequadas para o crescimento e fermentação pela 
levedura cervejeira. Esse mosto também pode ser meio ideal para o crescimento de 
outros micro-organismos contaminantes, que podem ser introduzidos no mosto 
através do inóculo de leveduras, aeração ou como resultado de práticas inadequadas 
de higiene do processo (Vaughan et al., 2005). O mosto devidamente resfriado e 
aerado é bombeado para os tanques de fermentação, a onda a levedura cervejeira é 
adicionada para que possa converter o mosto em cerveja através da fermentação da 
maltose e de outros açúcares em etanol e dióxido de carbono. O produto final da 
fermentação primária apresenta um ambiente hostil para a maioria dos micro-
organismos, pois a cerveja possui alta concentração de álcool e dióxido de carbono, 
assim como, componentes antimicrobianos derivados do lúpulo e baixos níveis de 
oxigênio, pH e nutrientes. Entretanto, aproximadamente, 20% dos açúcares 
remanescentes no mosto são constituídos de oligossacarídeos que não são 
metabolizados pela Saccharomyces e podem servir como fonte de carbono para o 
crescimento de contaminantes (Bokulich e Bamforth, 2013). 
Dentre os contaminantes do processo fermentativo um dos mais temidos é a 
levedura selvagem. Esses micro-organismos podem ser isolados de diversos estágios 
da produção e podem causar diversos problemas de operação, principalmente na 
fermentação (Vaughan et al., 2005). O crescimento de leveduras selvagens na 
fermentação pode levar a produção de defeitos, como turbidez, off-flavours e aromas 
desagradáveis (Hough et al., 1982, Lawrance, 1988). Outros efeitos indesejáveis são 
relacionados ao desempenho fermentativo da levedura cervejeira, levando a 
fermentações menos eficientes e lentas, além de causar uma super atenuação do 
produto final. A super atenuação é um fenômeno no qual a cerveja apresenta um 
atípico, baixo nível de graus Plato e uma alta concentração alcoólica (Lawrence, 
1988). 
Dentre as bactérias contaminantes dessa etapa do processamento Pediococcus 
damnosus é um dos mais frequentes, inclusive esse pode estar presente no inóculo 
de leveduras. Fermentações experimentais contaminados com Pediococcus 
35 
 
damnosus e Pediococcus inopinatus tiveram seu tempo de fermentação estendidos e 
apresentaram elevadas concentrações de diacetil (Vaughan et al., 2005). 
 As aminas biogênicas (AB) são poliaminas que são formadas devido a 
contaminações microbianas, que descarboxilizam aminoácidos e que podem causar 
sérios danos de saúde a indivíduos sensíveis, resultando em reações semelhantes a 
alergias, enxaqueca e a reações de intoxicação (Bokulich e Bamforth, 2013). As 
aminas biogênicas são formadas por micro-organismospresentes na cevada, malte, 
mosto, lúpulo, mas principalmente no processo fermentativo (Gasarasi et al., 2003, 
Halasz et al., 1999). As bactérias ácido láticas são as mais reconhecidas como 
produtoras de AB, mas algumas estirpes de enterobacteria e algumas estirpes de 
Saccharomyces podem ser atribuídas como formadoras desse composto (Gasarasi et 
al., 2003). 
O processo de maturação tem seu ínicio ao fim da fermentação, ao qual a 
cerveja é transferida para tanques a mantidos a baixas temperaturas por longos 
períodos. Nessa etapa da produção cervejeira o mosto já fermentando pode ser 
contaminado por micro-organismos como Pediococcus damnosus e Lactobacillus 
lindineri. P. damnosus é conhecido por ser o mais frequente contaminante do 
processo fermentativo e de maturação, isso devido a sua capacidade de se multiplicar 
a baixas temperaturas (Back, 2005) Valores inesperados de diacetil durante o 
processo de maturação podem ser relacionados com contaminação por P. damnosus 
(Susuki, 2011). 
 
2.2.2 CONTAMINAÇÕES SECUNDÁRIAS 
 As contaminações secundárias representam mais de 50% dos casos de 
deteriorações em cervejas pasteurizadas via Flash pasteurização. A Flash 
pasteurização se dá pela eliminação da carga microbiana antes do enchimento das 
garrafas, diferente da pasteurização em “Túnel” que ocorre com a cerveja já 
engarrafada (Vaughn et al., 2005). 
Mesmo a cerveja sendo considerado um meio hostil para o crescimento 
microbiano alguns grupos de micro-organismos como leveduras selvagens, bactérias 
ácido láticas e bactérias anaeróbias estritas como Pectinatus ssp. e Megasphaera 
spp. conseguem se multiplicar contaminando o produto final. Sendo esses dois últimos 
36 
 
gêneros de bactérias anaeróbias, acredita-se que a presença deles na área de 
enchimento seja favorecida pela formação de interações simbióticas com micro-
organismos mais resistentes, adaptados ao ar e formadores de biofilmes (Back, 1994). 
Back (1994), ainda afirma que as contaminações no ambiente da área de enchimento 
acontecem de forma sequencial. Segundo o autor, bactérias acéticas (como por 
exemplo, Acetobacter spp. e Glunobacter spp.) e algumas enterobactérias, veiculadas 
pelo ar, são os principais micro-organismos colonizadores do biofilme. Primeiramente, 
as bactérias acéticas colonizam superfícies que apresentam resíduos orgânicos e 
inorgânicos do processo cervejeiro. Essas bactérias não são referenciadas como 
deterioradoras, porém são capazes de formar uma matriz de polissacarídeo que gera 
proteção e condições para proliferação de micro-organismos deteriorantes. 
 
2.2.2.1 ENVASE 
O processo de envase representa um dos maiores desafios para a manutenção 
da estabilidade microbiológica da cerveja. Durante os processos anteriores, como da 
produção do mosto até a maturação, a cerveja se mantém em toneis de aço inoxidável 
com acessíveis condições de higiene. Entretanto no processo de envase o produto é 
transportado por diversas superfícies dentro dos equipamentos e tubulações, nas 
quais exposições breves a atmosfera ocorrem, e são armazenados em pequenos 
vasilhames. Existe a possibilidade da formação de biofilmes na superfície de bicos 
injetores e nas áreas de envase, aumentando o risco de contaminação microbiana e 
justificando os altos índices de contaminações nessa etapa (Bokulich e Bamforth, 
2013). No advento de uma filtração ou pasteurização ineficiente, a cerveja se torna 
vulnerável a contaminação de diversos micro-organismos, sendo os principais 
deteriorantes relacionados a incidentes de contaminação microbiana, as bactérias 
ácido láticas Gram-positivas (Vaughan et al., 2005). Entretanto, a crescente demanda 
por cervejas não pasteurizadas vem aumentando os incidentes de contaminação 
microbiana de cerveja embalada, principalmente por espécies anaeróbias como 
Pectinatus e Megasphaera, gêneros de deteriorantes Gram-negativos (Jespersen e 
Jakobsen, 1996). 
 
 
37 
 
PARTE 3: TRATAMENTOS E REUTIIZAÇÃO DA LEVEDURA CERVEJEIRA 
 
3.1 DESCONTAMINAÇÃO DO FERMENTO – A LAVAGEM ÁCIDA 
A lavagem ácida do fermento tem sido empregada pelos cervejeiros a mais de 
100 anos como um método eficiente de eliminar a contaminação bacteriana sem afetar 
adversamente a qualidade fisiológica da levedura. A levedura apresenta uma 
resistência natural a condições ácidas, entretanto, se outras condições do meio, como 
concentração de álcool e temperatura, apresentarem variações, a resistência ao 
tratamento ácido diminui (Simpson e Hammond, 1989). Simpson e Hammond 
demonstraram que se a temperatura da lavagem ácida ocorrer abaixo dos 5 °C, a 
concentração de etanol permanecer abaixo de 8% (v/v) e o tratamento não durar mais 
que duas horas, não se observa redução significativa nos níveis de viabilidade e de 
performance fermentativa da levedura (Figura 3). 
A escolha do ácido para acidificar o fermento é determinada por diversos 
fatores, dentre eles, destacam-se: i) a aceitabilidade do ácido como um aditivo ou 
auxiliador no processo, ii) o custo do ácido, iii) características do ácido quanto à 
segurança de sua manipulação e iv) eficiência do ácido como um agente para a 
lavagem do fermento (Simpson e Hammond, 1989). Diversos ácidos satisfazem esses 
critérios em diversos graus, contudo o ácido fosfórico e o cítrico merecem uma 
menção especial. Como são ácidos fracos, o controle do pH do fermentado é 
facilmente alcançável. Por outro lado, ácidos fortes como o ácido sulfúrico podem 
causar problemas como a diminuição acentuada do pH devido à super dosagens e 
perda de viabilidade das células de leveduras. Ácidos fracos, também, diminuem 
ligeiramente o pH do mosto quando a levedura é reinoculada, o que restringe a 
possibilidade de recontaminação. Como são ácidos fracos, a influência no pH final da 
cerveja é negligenciável, pois sendo ácidos fracos a forma não dissociada predomina 
sobre a forma protonada (Simpson e Hammond, 1989). 
38 
 
 
Figura 3. Processo de lavagem ácida e segregação dos produtos da fermentação 
cervejeira (Simpson e Hammond, 1989). 
Estudos mais recentes apresentam a lavagem ácida como um fator de estresse 
para as leveduras que podem gerar culturas com baixa vitalidade e viabilidade, que 
levam a fermentações incompletas, floculações da levedura, decantação, baixas 
contagens e variações metabólicas que podem gerar off-flavours (Stewart et al., 
2013). Quando a lavagem ácida de leveduras é realizada em paralelo com 
fermentações de alto °Plato os efeitos estressantes sobre a levedura são acentuados, 
com isso processos de gerenciamento do inóculo devem ser otimizados para se 
reutilizar o levedo em uma próxima fermentação. É de interesse da indústria, para a 
reutilização do levedo em novas bateladas, garantir que a levedura apresente um bom 
estado fisiológico e possa manter sua resistência em condições ácidas (Cunningham 
e Stewart, 1998). É evidenciado que as resistências da levedura a condições impostas 
pela lavagem ácida estão relacionadas com os fatores ambientais, como por exemplo, 
a temperatura da lavagem, pH e concentrações de etanol; assim como as condições 
fisiológicas da levedura antes da lavagem (Simpson e Hammond, 1989). As fases 
logarítimica das culturas de levedura apresentam uma resistência ácida baixa em 
comparação com a fase estacionária, portanto a fisiologia da levedura determina sua 
resistência aos efeitos do tratamento ácido (Steels et al., 1994). 
A performance fermentativa da levedura cervejeira exposta a sucessivas 
lavagens ácidas e reutilizações em novas bateladas de fermentações podem gerar 
diversos efeitos deletérios (como por exemplo, baixa performance fermentativa e 
geração de off flavours) se não realizada propriamente, mas se as condições de 
39 
 
temperatura, pH, concentração de álcool e tempo da lavagem forem seguidos 
conforme estudos anteriores; e o mosto utilizado nas fermentações sucessivas esteja 
devidamenteoxigenado e apresente uma baixa gravidade (em torno de 12 °Plato), as 
fermentações não apresentam problemas em sua performance fermentativa e as 
lavagens e reutilizações podem seguir desde que a levedura apresenta uma alta taxa 
de viabilidade (>80%) (Cunningham e Stewart, 2000). 
 
3.2 ÁCIDOS FRACOS 
 Historicamente os ácidos orgânicos desempenham um significante papel nos 
alimentos e bebidas há milhares de anos. Existem registros que datam de 5000 a 5400 
antes de cristo quanto à presença de resíduos de ácido tartárico em jarras de vinhos 
Iranianos. Os ácidos naturais de uva melhoram e adicionam frescor aos vinhos, além 
de melhorar as propriedades antioxidantes dessa bebida. Nos dias atuais, tem se 
tornado prática comum à adição de ácido cítrico, málico ou tartárico, particularmente 
em vinhos de climas quentes e sazonais. Não é coincidência que o os vinhos de maior 
validade são os produzidos com uvas mais ácidas (Stratford, 1999). 
Acidulantes agem como conservantes por retardar o crescimento de micro-
organismos e a germinação de esporos que poderiam causar a deterioração de 
alimentos e bebidas. O efeito inibitório dos ácidos fracos é atribuído tanto ao pH 
quanto a concentração desse ácido na sua forma não dissociada. Primeiramente, é a 
forma não dissociada do ácido que possui a ação antimicrobiana e quanto menor o 
pH, melhor é o equilíbrio em favor da forma não dissociada, conduzindo assim, a uma 
atividade microbiana mais eficaz (Dziezak, 2003). 
 
3.2.1 TEORIA DOS ÁCIDOS FRACOS 
A clássica teoria dos ácidos fracos de inibição de micro-organismos por 
conservantes é amplamente definida por parâmetros físico-químicos. Ácidos fracos, 
quando em solução aquosa, dissociam-se parcialmente gerando um equilíbrio 
dinâmico entre ácidos moleculares e íons carregados. Em baixo pH, o equilíbrio 
favorece a formação de ácidos moleculares (não dissociados), enquanto em pH 
próximo da neutralidade, observa-se o predomínio de íons carregados. Os ácidos 
40 
 
orgânicos moleculares são lipossolúveis, diferente dos íons carregados, que a baixo 
pH penetram a célula de um micro-organismo através dos lipídeos da membrana 
plasmática por um transporte conhecido como difusão facilitada. No citoplasma da 
célula, a pH neutro, o ácido molecular se dissocia em ânion e próton, os quais não 
conseguem deixar o citoplasma da célula devido a suas cargas. Com o aumento da 
concentração de prótons o citoplasma sofre uma substancial acidificação que inibe 
processos do metabolismo celular como a glicólise, comunicação celular e o 
transporte ativo (Figura 4) (Lambert e Stratford, 1999). 
 
Figura 4. Transporte de um ácido fraco e sua forma dissociada e não dissociada 
através da membrana microbiana (modificado de Lambert e Stratford, 1999). 
Segundo a teoria dos ácidos fracos, todos os ácidos lipofílicos de mesmo pKa, 
ácido acético e sórbico, por exemplo, são equivalentes quanto a sua efetividade como 
conservantes, causando inibição por difusão de moléculas de ácido não dissociados 
para o interior da célula, seguido da dissociação e acidificação do citoplasma. 
Entretanto, estudos recentes demonstram que ácidos, como os citados acima, que 
possuem o mesmo valor de pKa, apresentam variações na redução do pH de células 
de levedura e fungos filamentosos, quando utilizados concentrações semelhantes. O 
ácido acético cumpre com a proposta da teoria dos ácidos fracos, no qual sua 
utilização, a níveis inibitórios, reduz o pH celular para valores próximos a 4.7. Assim 
sugerindo que o ácido acético causa a inibição através da acidificação do citoplasma 
microbiano (Stratford et al.,2009, Stratford et al.,2013). Entretanto o ácido sórbico, em 
concentrações inibitórias menores que a do ácido acético, apresenta o efeito 
41 
 
conservante por vias diferentes da de redução do pH, como previsto pela teoria dos 
ácidos fracos. As baixas concentrações inibitórias, em comparação com o ácido 
acético, o ácido sórbico apresentou efeito conservante, mesmo reduzindo o pH de 
micro-organismos de 7-7,4 para 6.3. Assim, pode se concluir que o ácido sórbico não 
inibe os micro-organismos através da via de acidificação citoplasmática como previsto 
pela clássica teoria dos ácidos fracos (Stratford et al.,2013). Devido às características 
hidrofóbicas do ácido sórbico, acredita-se que o sítio de ação desse conservante são 
as proteínas e lipídeos de membrana. Avariações da membrana podem ser 
evidenciadas de várias formas, como a lise celular, alteração das proteínas de 
membrana e pequenos vazamentos devido à mudança da fluidez de membrana 
(Stratford et al.,2009). Em princípio, o resultado obtido para esses ácidos pode ser 
equiparado a efeitos, inibidores de crescimento, de outros ácidos fracos, como por 
exemplo, o ácido cítrico, fosfórico láctico e outros. 
 
3.2.2 ÁCIDO FOSFÓRICO 
 O ácido fosfórico é o único ácido inorgânico utilizado na indústria de alimentos, 
sendo o segundo ácido mais utilizado nesse ramo. Dos acidulantes alimentares o 
ácido fosfórico é o que produz o menor pH quando se considera a mesma quantidade 
de ácido adicionado no alimento, isso devido aos seus baixos valores de Ka e pKa 
(7,52 x 10-3 e 2,12, respectivamente), em comparação com outros ácidos fracos. Esse 
ácido é mais utilizado na produção de bebidas carbonatadas como refrigerantes e 
cervejas (Dziezak, 2003). 
 
3.3 DIÓXIDO DE CLORO 
O dióxido de cloro aquoso (ClO2) é um forte oxidante e agente sanitizante de 
ampla e alta ação biocida contra algas, deteriorantes de alimentos e patógenos (Junli 
et al., 1997; Kim et al., 2009; Vandekinderen et al., 2009; Tomás-Callejas et al., 2012). 
O ClO2 aquosopode ser utilizado para sanitizar superfícies que entram em contato 
com alimentos e diretamente aplicado nos mesmos. A aplicação desse agente 
sanitizante tem recebido grande atenção devido as suas vantagens potenciais em 
comparação com outros sanitizantes a base de cloro, sendo que o mesmo fora 
aprovado para a lavagem de frutas e vegetais pela Food and Drug Administration. 
42 
 
(FDA et al., 1998). Trabalhos reconhecem que o dióxido de cloro possui 3.5 vezes 
mais ação oxidante do que o cloro isoladamente; e também que a solução aquosa 
desse sanitizante apresentou uma ação bactericida mais eficiente do que a aplicação 
de uma solução de cloro 7 vezes mais concentrada (Benarde et al, 1965; Lillard, 1979). 
Em relação ao uso de cloro, típico sanitizante industrial, surgiram algumas 
preocupações no âmbito da saúde devido à produção de trihalometanos e clorofenois 
gerados durante a cloração. Entretanto, diversos estudos vêm apresentando o dióxido 
de cloro como uma alternativa mais eficaz na sanitização e livre da produção desses 
compostos carcinogênicos (Kim et al., 1999; Owusu-Yaw et al., 1999). 
O dióxido de cloro aquoso é utilizado amplamente na Europa (Katz, 1980) e 
esta sendo aplicado em mais de 400 plantas de tratamento de água potável nos 
Estados Unidos (Richardsen et al., 1996). A utilização de ClO2 aquoso tem sido 
considerada como potencial sanitizante para o processamento de vegetais, peixes, 
carne vermelha, aves e embalagem de cítricos (Costilow et al., 1984; Reina et al., 
1995; Key et al., 1996; Lin et al., 1996; Cutter e Dorsa, 1995; Villarreal et al., 1990; 
Tsai et al., 1995). Além das pesquisas na área de alimentos e de água potável, o 
dióxido de cloro tem sido considerado para a sanitização de suspensões de leveduras 
para processos fermentativos (Meneghin et al., 2008). Ao final do processo 
fermentativo do caldo de cana de açúcar, para a produção de etanol, a levedura 
recuperada dos tanques de fermentação é lavada com ácido sulfúrico. Muitas vezes 
se faz necessário à adição de biocidas como, por exemplo, quaternário de amônia, 
fenóis halogenados e antibióticos; para o controle de contaminantes do processo. 
Devido aos altos custos desses biocidas e também a possibilidade de seleções de 
micro-organismos

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