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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Engenharia de Alimentos Allan Richard Gomes Munford “Modelagem e otimização da lavagem da levedura cervejeira para inativação de micro-organismos deteriorantes do processo fermentativo da cerveja” Campinas-SP 2017 Allan Richard Gomes Munford “Modelagem e otimização da lavagem da levedura cervejeira para inativação de micro-organismos deteriorantes do processo fermentativo da cerveja” Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para obtenção do título de Mestre em CIÊNCIA DE ALIMENTOS Orientador: Prof. Dr. Anderson de Souza Sant’Ana. Coorientador: Dr. Rafael Djalma Chaves. ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELO ALUNO ALLAN RICHARD GOMES MUNFORD E ORIENTADO PELO PROF. DR. ANDERSON DE SOUZA SANT’ANA Campinas-SP 2017 Comissão Examinadora Prof. Dr. Anderson de Souza Sant’Ana Universidade Estadual de Campinas Orientador Prof. Dr. Marcus Bruno Soares Forte Universidade Estadual de Campinas Membro titular Prof. Dr. Pedro Esteves Duarte Augusto Universidade de São Paulo – ESALQ Membro titular Dra. Alessandra Regina da Silva Marques Fundação André Tosello Membro suplente Profa. Dra. Maristela da Silva do Nascimento Universidade Estadual de Campinas Membro suplente A ATA da defesa, com as respectivas assinaturas dos membros, encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno. DEDICATÓRIA Dedico este trabalho ao meu eterno herói, orientador, referência e pai, Arnaldo Carlos Munford. Sem seus ensinamentos, dedicação e exemplo, este e outros projetos da minha vida jamais seriam concluídos. Tenho a certeza que hoje você perpetua sua sabedoria, evolução e bondade em outros planos. Minha gratidão será sempre eterna. AGRADECIMENTOS Agradeço a todos que dedicaram, nem que somente um momento de motivação e incentivo, para que este projeto se tornasse algo concreto. A Deus pela oportunidade de estar aqui hoje trilhando meu caminho para a evolução espiritual. Ao meu pai por tudo que representou e ainda representa em minha vida. Sem ele não me tornaria a pessoa que sou hoje. À minha querida família que sempre me incentivou e me deu todo o suporte para conquistar meus sonhos. Mãe, Audrey (Djow), Renan, tio Armando, vovô (in memoriam) e vovó, vocês são o meu maior tesouro. Ao amor da minha vida, Géssica Tassi, por me apoiar nas minhas escolhas, por toda a paciência, companheirismo e amor. Você foi o motivo deste projeto ter começado, sem você e tudo que você representa na minha vida, ele jamais teria sido concluído. Ao meu orientador, Professor Doutor Anderson de Souza Sant’Ana, por prontamente confiar em mim a sua orientação. Por nunca ter me dado o peixe, mas sim me ensinado a pescar. Pela oportunidade de realizar um grande projeto em uma das maiores instituições do nosso país. Ao meu coorientador, Rafael Djalma Chaves, pela orientação, parceria e companheirismo. Aos membros da banca, Dra. Alessandra Regina da Silva Marques, Prof. Dr. Marcus Bruno Soares Forte, Profa. Dra. Maristela da Silva do Nascimento e Prof. Dr. Pedro Esteves Duarte Augusto, pela cooperação, disponibilidade, correções e sugestões. Aos funcionários da Universidade Estadual de Campinas e Faculdade de Engenharia de Alimentos, pois sem a cooperação e dedicação de todos este e muitos outros projetos não seriam concluídos. Em especial ao Cosme e Juliana Carusi, profissionais como vocês fazem a diferença no mundo. À Fundação de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e Extensão (FAEPEX) pela bolsa de mestrado concedida. À cervejaria Germânia e seu mestre cervejeiro, Arnaldo Ribeiro, por me ceder o mosto para o projeto e por toda a abertura e receptividade. Aos meus colegas de trabalho do Laboratório de Microbiologia Quantitativa de Alimentos (LMQA), Ligia, Chacon, Monyca, Ramon, Letícia Pozza, Alexandra, Ana Paula, Larissa, Beatriz, Bruna, Marianna, Aline (She-ra), Aline Morgan, Amin, Claudia, Libia, Tarcísio, Rodrigo, Yanet, Fernanda, Arthur, Lucas, Isadora, Carine e Carol, por partilhar tantos momentos difíceis, alegres e de conquistas. Aprendi muito nesses anos de convívio com todos vocês. À minha grande amiga, Mariana Batista, pela amizade incondicional, por partilhar muitos dos momentos difíceis e de alegria da minha vida dentro e fora do laboratório. À minha parceira de tomadas de decisões, Juliana Lane, que sempre buscou meus conselhos e também me ajudou muito nas minhas decisões. Ao meu irmão, Olavo Conte, pela amizade e parceria, pelas conversas acadêmicas, profissionais e sobre a vida, pelo conhecimento técnico e profissional compartilhado. Ao meu grande amigo, Leonardo Prado, por todo o auxílio nos projetos paralelos ao mestrado, pelas conversas, pelo companheirismo no Rio de Janeiro, por sempre estar disposto a fazer o melhor e o correto por todos. Ao meu parceiro, Humberto Hungaro, pela amizade, orientação e ajuda no desenho dos meus experimentos em anaerobiose. À Verônica Alvarenga (Vê) pelos ensinamentos, disposição em ajudar, paciência e conversas que sempre me trouxeram conhecimento e reflexão. Aos colegas do laboratório LEMeB, Wesley, Felipe Beato, José Madeira (Zé), VJ, Bruno Labate, Felipe Ferrari (tropeço), Pamela, Alberto, Dani, Suéllen e Priscila, que fizeram desse local um refúgio, um ambiente de muita paz e alegria. Sempre que puder estarei visitando vocês, assim podemos tomar aquele café com cookies na pracinha. Aos professores, Dr. Andreas Karoly Gombert e Dra. Maria Isabel Rodrigues pelo profissionalismo, pelas qualidades técnica e didática nas disciplinas ministradas. Os conhecimentos transmitidos por vocês fizeram a diferença na minha formação acadêmica. Aos meus companheiros de república, Alexandre (Alê), Leonardo (Bola), Leonardo (Bidê), Mauricio (Queijo), Diego e Felipe (Abelhinha), pelos churrascos, conversas, jantas, discussões, jogos de futebol, parceria e ajuda. Nossa convivência me ensinou mais ainda sobre respeito, amizade e irmandade. À minha amiga, Clarisse Boni, que chegou ao meu laboratório como vendedora e saiu como uma grande amiga. Apesar de nunca ter sido um comprador, você me comprou e, ao me vender, me permitiu alçar voo profissionalmente. Você é meu exemplo de que vender é mais do que proporcionar uma experiência comercial, mas sim permitir a formação de uma amizade verdadeira e duradoura com as pessoas que precisam de você e de seus produtos. Aos meus colegas de trabalho e clientes que sempre me incentivaram e me deram força para concluir este projeto. RESUMO MODELAGEM E OTIMIZAÇÃO DA LAVAGEM DA LEVEDURA CERVEJEIRA PARA INATIVAÇÃO DE MICRO-ORGANISMOS DETERIORANTES DO PROCESSO FERMENTATIVO DA CERVEJA A contaminação do fermento cervejeiro por micro-organismos deteriorantes é uma das principais preocupações das indústrias cervejeiras. As principais alternativas empregadas pelos cervejeiros para eliminar contaminações microbianas do fermento e permitir sua reutilização, são as lavagens ácidas ou as lavagens com dióxido de cloro. Apesar de serem práticas comuns dentro das indústrias cervejeiras, a sua otimização e eficácia, sobre micro-organismos contaminantes do processo fermentativo, e o impacto sobre a levedura utilizada para fabricação da cerveja, ainda não são bem elucidados. Assim, o presente estudo deve como objetivos a modelagem da inativação dos principais contaminantes do processo cervejeiro através da lavagem ácida e otimizar os processos de lavagem ácida e lavagemcom dióxido de cloro, afim de se obter fermento de reinoculação livre de contaminantes e viável para novas bateladas fermentativas. Primeiramente, foram avaliados os perfis de inativação das cepas Lactobacillus brevis DMS 6235, Lactobacillus casei ATCC334, Pediococcus damnosus ATCC 29358 e Pediococcus damnosus DSM 20289; expostas ao processo de lavagem ácida com ácido fosfórico a 85%/4°C a diferentes regimes de pH (pH 1,5, pH 2 e pH 3). Com o uso do software GinaFit, diversos modelos foram ajustados aos dados obtidos, sendo os de Weibull e Weibull com cauda, os que melhor se ajustaram aos dados experimentais (R2 > 0,9). Através dos parâmetros obtidos pelos modelos foi possível observar que a resposta de inativação das cepas contaminantes é dependente o pH e que uma variação de 0,5 no pH do ácido utilizado pode ser suficiente para se obter inativações mais eficientes sem reduzir a viabilidade da levedura cervejeira. Para otimizar os processos de lavagem ácida e lavagem com dióxido de cloro foram utilizados 2 delineamentos compostos centrais rotacionais (DCCR), totalizando 2 experimentos com 11 ensaios independentes, sendo 3, no ponto central. Para a lavagem ácida as variáveis independentes foram pH (1-3) e temperatura (1-9 °C). Enquanto para a lavagem com dióxido de cloro as variáveis foram: concentração do sanitizante (10-90 mg/L) e a temperatura (5-25°C).O micro- organismo alvo dos foi o Lactobacillus brevis DSM 6235. Os modelos obtidos para as 4 variáveis resposta γLA, γCl (redução decimal do contaminante),Vf/V0LA e Vf/V0Cl (razãoda viabilidade da levedura cervejeira), apresentaram R2> 0,80 e valores de Fcalculado> Ftabelado, portanto considerados preditivos e estatisticamente significantes (p < 0,1). A validação dos modelos foi realizada dentro do intervalo dos parâmetros estabelecidos no ensaio, apresentando valores, dos fatores bias (γLA: 0,93 / Vf/V0LA:0,99 – γCl: 1,0 / Vf/V0Cl: 0,99) e exatidão (γLA: 1,12 / Vf/V0LA: 1,01 – γCl: 1,08 / Vf/V0Cl: 1,03), próximos a 1. Os resultados obtidos nestes estudos deixam evidente que a microbiologia preditiva e a modelagem através do delineamento experimental são, ambas ferramentas, importantes para se avaliar a eficácia de tratamentos de inativação de micro-organismos, assim como para se obter tratamentos em condições otimizadas. Palavras-chave: Cerveja, descontaminação, fermentação, microbiologia preditiva, delineamento experimental, otimização de processos, Lactobacillus, Pediococcusdamnosus. ABSTRACT MODELING AND OPTIMIZATION OF BREWING YEAST WASHING FOR THE INACTIVATION OF SPOILAGE MICROORGANISMS FROM THE BEER FERMENTATIVE PROCESS The contamination of brewer's yeast by deteriorating microorganisms is a major concern of the brewing industry. The main alternatives used by brewers to eliminate microbial contaminations of the yeast and allow its reuse are acidic washes or washes with chlorine dioxide. Although, they are common practices within the brewing industry, their optimization and efficacy, on microorganisms that contaminate the fermentation process, and the impact on yeast used for brewing, are still not well understood. Thus, the present study should aim to model the inactivation of the main contaminants of the brewing process through the acid washing and to optimize the processes of acid washing and chlorine dioxide washing, in order to obtain repitching yeast free of contaminants and viable for new batch. First, the inactivation profiles of Lactobacillus brevis DMS 6235, Lactobacillus casei ATCC334, Pediococcus damnosus ATCC 29358 and Pediococcus damnosus DSM 20289 were evaluated; exposed to the acid washing process with phosphoric acid 85% / 4 ° C at different pH regimes (pH 1.5, pH 2 and pH 3). With the use of the GinaFit software, several models were fitted to the data obtained, Weibull and Weibull with tail, where the ones that best fited the experimental data (R2> 0.9). Through the parameters obtained by the models it was possible to observe that the inactivation response of the contaminating strains is pH dependent and that a variation of 0.5 in the pH of the acid used, may be sufficient to cause inactivation of contaminating microorganisms without reducing the viability of the brewer's yeast. To optimize the acid washing and chlorine dioxide washing processes, two central composite rotatable design (CCRD) were used, totaling 2 experiments with 11 independent tests, 3 of which were in the central point. For acid washing the independent variables were pH (1-3) and temperature (1-9 ° C). While, for chlorine dioxide washing, the variables were: concentration of the sanitizer (10-90 mg / L) and temperature (5-25 ° C). Lactobacillus brevis DSM 6235 was the target microorganism. The models obtained for the 4 response variables γLA, γCl (decimal reduction of the contaminant), Vf / V0LA and Vf / V0Cl (viability ratio of brewer's yeast) showed R2> 0, 80 and values of Fcalculated > Ftabulated, therefore considered as predictive and statistically significant (p <0.1). The validation of the models was performed within the range of the parameters established in the test, presenting bias factors (γLA: 0.93 / Vf / V0LA: 0.99 - γCl: 1.0 / Vf / V0Cl: 0.99) and accuracy (γLA: 1.12 / Vf / V0LA: 1.01 - γCl: 1.08 / Vf / V0Cl: 1.03), close to 1. The results obtained in these studies make it clear that predictive microbiology and modeling through the experimental design are both important tools to evaluate the effectiveness of inactivation treatments of microorganisms, as well as to obtain treatments under optimized conditions. Key words: Beer, decontamination, fermentation, predictive microbiology, experimental design, process optimization, Lactobacillus brevis, Pediococcusdamnosus. SUMÁRIO Introdução geral ........................................................................................................ 15 Capítulo 1: Revisão bibliográfica ............................................................................... 17 Parte 1: indústria cervejeira ................................................................................... 18 1.1 Definição e contexto econômico ................................................................... 18 1.2 Matérias-primas para a produção de cerveja ................................................ 19 1.3 Processamento ............................................................................................. 21 Parte 2: Contaminações microbiológicas na indústria cervejeira ........................... 24 2.1 Contaminações por micro-organismos deteriorantes ................................... 24 2.1.1 Contaminações por bactérias gram-positivas ......................................... 25 2.1.2 Contaminações por bactérias gram-negativas ....................................... 26 2.1.3 Leveduras selvagens .............................................................................. 28 2.2 Principais fontes de contaminação microbiológica durante o processo de fabricação da cerveja .......................................................................................... 30 2.2.1 Contaminações primárias ....................................................................... 30 2.2.1.1 Cevada e malte ................................................................................ 31 2.2.1.2 Mosturação e mosto ......................................................................... 32 2.2.1.3 Fermentação e maturação ............................................................... 34 2.2.2 Contaminações secundárias .................................................................. 35 2.2.2.1 Envase ............................................................................................. 36 Parte 3: Tratamentos e reutiização da leveduracervejeira .................................... 37 3.1 Descontaminação do fermento – a lavagem ácida ....................................... 37 3.2 Ácidos fracos ................................................................................................ 39 3.2.1 Teoria dos ácidos fracos......................................................................... 39 3.2.2 Ácido fosfórico ........................................................................................ 41 3.3 Dióxido de cloro ............................................................................................ 41 3.4 Reutilização da levedura em sucessivas bateladas ...................................... 43 Parte 4: Ferramentas para otimização de processos ............................................. 45 4.1 Microbiologia preditiva .................................................................................. 45 4.2 Planejamento experimental e delineamento composto central rotacional .... 46 5. Referêncas bibliográficas ................................................................................... 48 Capítulo 2: Cinética de inativação de bactérias deteriorantes de cerveja através da lavagem ácida de levedura de reinoculação ............................................................. 61 Resumo .................................................................................................................. 63 1. Introdução .......................................................................................................... 64 2. Materiais e Métodos ........................................................................................... 66 2.1. Micro-organismos e condições de cultivo .................................................... 66 2.2. Condições da fermentação .......................................................................... 67 2.3. Lavagem ácida ............................................................................................ 68 2.4. Enumeração de micro-organismos e viabilidade da levedura ...................... 68 2.5. Modelagem matemática da inativação ......................................................... 68 2.5.1. Modelos matemáticos ............................................................................ 69 2.5.1.1. Weibull e Weibull + cauda ............................................................... 69 2.6. Análise estatística ........................................................................................ 69 3. Resultados ......................................................................................................... 69 4. Discussão .......................................................................................................... 77 5. Referências ........................................................................................................ 81 Capítulo 3: Modelagem da lavagem ácida eda lavagem com dióxido de cloro da levedura cervejeira de reinoculação para a inativação de bactérias contaminantes e manutenção da viabilidade ........................................................................................ 87 Resumo .................................................................................................................. 89 1. Introdução .......................................................................................................... 90 2. Material e métodos ............................................................................................. 92 2.1 Micro-organismos e condições de cultivo ..................................................... 92 2.2 Condições da fermentação ........................................................................... 93 2.3 Regimes de lavagem .................................................................................... 93 2.4 Enumeração de micro-organismos ............................................................... 94 2.5 Delineamento experimental, análises estatísticas e validação dos modelos desenvolvidos ..................................................................................................... 94 3. Resultados ......................................................................................................... 95 3.1 Otimização da lavagem ácida ....................................................................... 95 3.2 Otimização da lavagem com dióxido de cloro ............................................... 99 3.3 Validação dos modelos preditivos............................................................... 104 4.Discussão ......................................................................................................... 105 4.1 Otimização da lavagem ácida ..................................................................... 105 4.2 Otimização da lavagem com dióxido de cloro ............................................. 106 5.Conclusão ......................................................................................................... 108 6. Referências ...................................................................................................... 108 Discussão Geral ...................................................................................................... 116 Conclusão Geral ...................................................................................................... 118 Referências Geral ................................................................................................... 119 15 INTRODUÇÃO GERAL A produção mundial de cerveja está acima de 80 bilhões de litros por ano. Dentro desse mercado, o Brasil, ocupa uma posição estratégica com uma produção de mais de 8 bilhões de litros/ano, com faturamento bruto atingindo mais de R$ 17 bilhões. Esse seguimento emprega mais de 150 mil pessoas, entre postos diretos e indiretos, e durante os anos de 2000 a 2004 o setor investiu mais de R$ 3 bilhões com a instalação de novas plantas industriais e na ampliação e modernização das indústrias já em operação (Sindicerve, 2004) Ao longo dos anos a qualidade representa um papel cada vez mais fundamental na sobrevivência e sucesso competitivo das organizações. A indústria cervejeira não é exceção, tendo como objetivo principal fornecer um produto de elevada qualidade para fazer face à competitividade e para satisfazer as necessidades dos seus clientes e consumidores. Dentre os principais requisitos percebidos pelo consumidor para uma cerveja de qualidade encontram-se, sobretudo aqueles relacionados com as suas propriedades sensoriais (cor, limpidez, brilho, ausência de flavours desagradáveis, etc.) (Back,2006). No entanto, tais requisitos podem ser afetados negativamente por contaminações microbiológicas, o que pode comprometer seriamente a imagem da cerveja ou da empresa que a produz junto ao mercado (Fernandes,2012). A contaminação microbiológica ocorrida durante o processamento da cerveja pode modificar as propriedades sensoriais do produto final, assim como pode causar o “arraste” da fermentação (Back, 2006). O arraste da fermentação ocorre devido à competição pelos nutrientes do mosto, entre a levedura cervejeira e os contaminantes (Vaughan, 2005). Em virtude do crescimento dos contaminantes do processo de fermentação, ocorre uma maior liberação de metabólitos no meio, o que acaba por inibir a multiplicação da levedura cervejeira (Priest, 2003) Nos processos industriais de produção de cerveja existentes no Brasil, e no mundo, o fermento é reutilizado em diversos ciclos fermentativos, o que aumenta a probabilidade de contaminação microbiológica. A levedura recuperada no final do processo de fermentação, também chamada de levedura de reinoculação, é reconhecida como sendo o principal reservatório de bactérias deteriorantes dentro das 16 indústrias (Ogden, 1987). Dos tratamentos mais utilizados na indústria,para reduzir a população microbiana contaminante, é a lavagem do fermento cervejeiro com ácido fosfórico ou dióxido de cloro (Cunningham e Stewart, 2000; Meneghin et al., 2008). Apesar de ser amplamente empregada na indústria cervejeira, não há estudos atuais de modelos que definem a sua eficiência na inativação de micro-organismos deteriorantes da cerveja e estratégias de otimização desses processos. A modelagem do efeito de sanitizantes em micro-organismos é considerada uma importante ferramenta na otimização de protocolos de sanitização existentes ou para a geração de novos (Virto et al., 2005). Na microbiologia preditiva, o estudo do crescimento ou morte microbiana em relação a fatores ambientais é traduzido em equações matemáticas que permitem a predição do crescimento ou inativação de micro-organismos em alimentos (Janssen et al., 2007). Esse estudo teve como objetivo geral a obtenção de ferramentas, como os modelos matemáticos preditivos, para se conhecer as condições ótimas de inativação das bactérias contaminantes do processo cervejeiro e manutenção da levedura cervejeira, pelos processos de lavagem ácida e com dióxido de cloro. Para alcance do objetivo geral, foram considerados nessa pesquisa, os seguintes objetivos específicos: - Avaliação da inativação de bactérias contaminantes do processo cervejeiro por diferentes regimes de lavagem ácida, - Identificação dos parâmetros cinéticos e perfis de curva de sobrevivência através de ferramentas da microbiologia preditiva de alimentos. - Otimizaçãodos processos de lavagem ácida e da lavagem com dióxido de cloro visando-se a inativação de contaminantes comuns do processo cervejeiro (Lactobacillus brevis DSM 6235) e manutenção da viabilidade da levedura cervejeira. 17 Capítulo 1: Revisão bibliográfica 18 PARTE 1: INDÚSTRIA CERVEJEIRA 1.1 DEFINIÇÃO E CONTEXTO ECONÔMICO Um dos processos biotecnológicos mais antigos conhecido pelo homem é o processo fermentativo de cereais. Há pesquisas que informam que a prática da cervejaria tenha se originado na Mesopotâmia em 6.000 A.C, e que a cerveja nesta época não era utilizada somente na dieta, mas também como artigo medicinal e cosmético (Kunze, 1997, Aquarone et al., 1983). De forma genérica, define-se cerveja como uma bebida carbonada de teor alcoólico entre 3 e 8% (v/v), produzida a partir de malte de cevada, lúpulo, fermento e água de boa qualidade, permitindo ainda o uso de outras matérias primas como arroz, trigo ou milho (Almeida e Silva, 2005). A legislação brasileira define através do Decreto nº 2314, de 04 de setembro de 1997, art.64 a art.71: “Cerveja é a bebida obtida pela fermentação alcoólica do mosto cervejeiro oriundo do malte de cevada e água potável, por ação da levedura, com adição de lúpulo” (Brasil, 1997). As cervejas podem ser divididas em dois grandes grupos: as do tipo Lager, como a Pilsen, Bock e Munique, e as do tipo. Ale, dentre as quais temos a Porter e a Stout. As cervejas do tipo Ale são produzidas através de uma fermentação superficial ou “alta”. Esse tipo de cerveja apresenta uma coloração variada, sabor pronunciado de lúpulo, sutil acidez e teor alcoólico variando de 4 a 8%. O processo de fermentação ocorre entre a temperatura de 20 e 25ºC, com duração de 2 a 5 dias e a maturação entre 4,5 e 8ºC. As cervejas do tipo Lager são as mais consumidas e comuns, sendo a Pilsen uma das cervejas mais tradicionais em todo o mundo. A fabricação das cervejas desse grupo ocorre por fermentação profunda ou “baixa”, através de processo lento, geralmente em torno de 5 dias. Essa cerveja é caracterizada por possuir sabor suave, cor clara e teor alcoólico entre 4 e 5% (Delos,1994). A produção de cerveja no Brasil atinge o volume de 8,5 bilhões de litros anuais, ficando atrás somente da China (27 bilhões de litros/ano), Estados Unidos (23,6 bilhões de litros/ano), Alemanha (10,5 bilhões de litros/ano) e Rússia (9 bilhões de litros/ano), sendo o consumo per capita no país, o nono maior do mundo, com uma média de 47,6 litros/ano por habitante (Sindicerve, 2004). Portanto, a agroindústria do álcool representa um considerável gerador de divisas, e levando em conta que toda a 19 produção de álcool se dá por via fermentativa, é de fundamental importância o conhecimento do processo fermentativo, que tem sido constantemente aprimorado. 1.2 MATÉRIAS-PRIMAS PARA A PRODUÇÃO DE CERVEJA Na formulação da cerveja as principais matérias-primas são a água, cereais, lúpulo e fermento. A água é a principal matéria-prima da cerveja, pois representa 95% de massa final do produto e pelas suas características determinantes para a qualidade do produto final. Para se definir uma água de qualidade para o processo cervejeiro ela deve seguir padrões de qualidade como: ser translucida, inodora e isenta de qualquer indicio de matéria orgânica e sabor. A presença dos sais dissolvidos na água pode influenciar o processo fermentativo, e consequentemente, a qualidade da cerveja (Pombeiro, 2008). Os cereais são a fonte dos açúcares simples que serão assimilados pela levedura no processo fermentativo. Podem-se usar diferentes cereais, em conjunto ou separadamente. Mais comumente, utiliza-se a cevada (transformada em malte), devido ao seu alto teor de amido e capacidade enzimática. A utilização de outros cereais de forma adjunta, como o milho, arroz, trigo ou outros grãos tem por objetivos constituir uma fonte extra de amido de valor reduzido, refinar o gosto da cerveja, propiciar cores mais brilhantes e gerar maior estabilidade física (Fernandes, 2012). O lúpulo é uma planta que apresenta no pólen, das flores femininas, grânulos de lupulina que detêm as substâncias de interesse para o processo cervejeiro. Destas substâncias, as mais importantes são os óleos essenciais, as resinas amargas e os polifenóis, no qual a quantidade interfere no amargor, aroma e estabilidade microbiológica da cerveja (Fernandes, 2012). As leveduras cervejeiras são responsáveis pelo processo fermentativo. A espécie mais utilizada no processo é a Saccaromyces cerevisiae, no entanto dois tipos diferentes de estirpes são responsáveis por dois tipos de fermentações que produzem características distintas à cerveja, sendo elas estirpes do tipo Ale e Lager. As leveduras do tipo Ale, também conhecidas como “de alta fermentação”, pois se elevam até a superfície do mosto formando uma película flutuante de biomassa no final da fermentação. Entretanto, as leveduras Lager são “de baixa fermentação”, pois apresentam floculação e sedimentação no final do processo (tabela 1) (Carvalho et al., 2006). 20 Tabela 1. Tipos de cerveja produzidas por alta e baixa fermentação, principais características sensoriais e matérias-primas. Cervejas Caractrísticas físico-químicas Características sensoriais Matéria-prima Referências Alta fermentação Indian Pale Ale 12,5-16°plato1 ; 5-11% de álcool1 2 3; 35-55 IBU1 4; 12- 28 EBC1 Médio a alto amargor e teor alcóolico com coloração cobre1 3 Água, malte, levedura e alto teor de lúpulos aromáticos e de amargor1 2 3 1(Priest e Stewart, 2006) 2(Bamforth, 2009) 3(Kunze, 1997) 4(Silva e Faria, 2008) 5(Baiano e Terracone, 2013) Weissbier 11,8-14°plato1; 4,9-6 % de álcool1 2 3; 10-15 IBU1; 6-18 EBC1 Aromas frutados e fenólicos com baixo teor de amargor e com coloração palha turva 1 3 Água, malte de trigo e cevada, levedura e lúpulos aromáticos e de amargor1 2 3 5 1(Priest e Stewart, 2006) 2(Bamforth, 2009) 3(Kunze, 1997) 5(Baiano e Terracone, 2013) Stout 9,5-12°plato1; 3,8-5 % de álcool 1 2 3; 30-40 IBU1; 40+ EBC1 Aroma de torra e alto teor de amargor 1 3 Água, cevada e maltestorrados, levedura e elevado teor de lúpulos1 2 3 5 1(Priest e Stewart, 2006) 2(Bamforth, 2009) 3(Kunze, 1997) 5(Baiano e Terracone, 2013) Porter 12-115°plato1; 4,5-6,5 % de álcool1 2 3; 20-40 IBU1; 20-35 EBC1 Aroma leve de torra e teor frutado com alto teor de amargor e coloração rubi1 3 Água, cevada e maltes torrados, levedura e elevado teor de lúpulos 1 2 3 1(Priest e Stewart, 2006) 2(Bamforth, 2009) 3(Kunze, 1997) 5(Baiano e Terracone, 2013) Baixa fermentação Pilsner 10-12°plato1; 3,8-5 % de álcool1 2 3 ; 5-14 IBU1; 4-8 EBC1 Aromas do malte, adjuntos e lúpulos leves com muita carbonatação e cor âmbar1 3 Água, malte, adjuntos, levedura e lúpulos aromáticos e de amargor1 2 3 5 1(Priest e Stewart, 2006) 2(Bamforth, 2009) 3(Kunze, 1997) 5(Baiano e Terracone, 2013) Bock 15-17°plato1; 6-8 % de álcool1 2 3 ; 25-35 IBU1; 20- 30 EBC1 Aromas de torra e adocidaco com médio teor de amargor e coloração marrom escuro1 3 Água, malte de cevada torrado, levedura e lúpulos aromáticos e de amargor1 2 3 1(Priest e Stewart, 2006) 2(Bamforth, 2009) 3(Kunze, 1997) Export 11,9-13,8°plato1; 4-6,1 % de álcool1 2 3; 23-29 IBU1; 3-12 EBC1 Aroma moderado adocicado e lúpulado com coloração palha dourada1 3 Água, malte, levedura e lúpulos aromáticos e de amargor1 2 3 1(Priest e Stewart, 2006) 2(Bamforth, 2009) 3(Kunze, 1997) °Plato: porcentagem em massa de sacarose presente em uma solução - IBU: Escala internacional de amargor - EBC: Convenção cervejeira europeia para cor e turbidez. 21 1.3 PROCESSAMENTO A cerveja é obtida pela conversão em álcool, dos açúcares presentes nos grãos da cevada. A fermentação é a principal etapa do processo cervejeiro e sua efetividade depende de várias operações anteriores, incluindo o preparo das matérias-primas. Após a fermentação, são realizadas etapas de tratamento, para conferir à cerveja as características sensoriais (sabor, odor, textura) desejadas no produto final. A produção de cerveja apresenta basicamente quatro etapas: maltagem, preparação do mosto (mosturação), fermentação e processamento da cerveja (figura 1) (Santos et al., 2005, Willaert et al., 2006). O processo de fabricação do malte é conhecido como maltagem, e consiste no controle do umedecimento com água e posterior germinação, sob condições controladas de temperatura, com o intuito de formação de enzimas necessárias à hidrólise dos polissacarídeos e do amido presente nos grãos de cevada (Briggs, 1998). Esse processo é formado por três etapas: molha, germinação e secagem dos grãos. Primeiramente os grãos são limpos e selecionados e em seguida depositados em tanques imersos em água, assim adquirindo certa quantidade de umidade necessária para se iniciar a germinação (cerca de 40-42%). Após a molha, os grãos são encaminhados para caixas de germinação onde permanecem em condições controladas de umidade, arejamento e temperatura, durante cerca de 4-6 dias. Dentro do processo de maltagem, a germinação tem como principal objetivo disponibilizar as enzimas necessárias à formação do mosto e de degradação dos tecidos de reserva da cevada, permitindo que o amido presente nos grãos se desprenda. Logo que os grãos apresentem indícios da germinação o processo é interrompido através de um processo de secagem em estufa ou torrefação. Por último, após a secagem, o malte é desradiculado e armazenado em silos por 3-4 semanas (Fernandes,2012). O processo de preparação do mosto, também conhecido como brassagem, pode ser dividido nas seguintes fases: moagem, mistura, filtração, fervura e decantação. Após a operação de moagem do malte e adjuntos, a farinha moída resultante é misturada com água aquecida e submetida a condições operacionais (tempo, temperatura, agitação e pH) pré-estabelecidas para que as enzimas amilases presentes no malte sejam ativadas e hidrolisem o amido em açúcares fermentescíveis (glicose, maltotrioses e maltose). Após a mistura, o líquido formado é filtrado para a separação da parte insolúvel (cascas do malte e proteínas coaguladas) do filtrado 22 (mosto) (Kunze, 1997, Pombeiro, 2008). O mosto resultante é fervido, sendo nesta etapa que ocorre a adição do lúpulo. A operação de fervura é uma etapa crítica para a qualidade do produto final, pois promove: esterilização microbiológica do mosto, eliminação de substâncias voláteis que geram sabores não desejáveis, inativação de enzimas e coagulação de complexos proteicos que podem causar turvação no produto final, formação de compostos responsáveis pela cor e sabor do produto, através de reação de Maillard e caramelização, e a extração de compostos amargos e aromáticos do lúpulo (Denk et al, 2000). Após a fervura, o mosto é enviado a um tanque de clarificação, nesse tanque acontece à decantação. Como o mosto servirá de fonte de nutrientes para as leveduras, no processo fermentativo, percebe-se a importância do seu correto preparo para que se obtenha uma cerveja de qualidade (Santos et al., 2005, Willaert et al., 2006). Uma vez tendo sido preparado, pode-se dar início a fermentação do mosto, processo central da indústria cervejeira (Santos et al., 2005, Willaert et al., 2006). A fermentação do mosto é dividida em duas etapas: numa primeira etapa, denominada aeróbia, as leveduras são adicionadas no mosto areado e se reproduzem rapidamente aumentando sua população entre 2 a 6 vezes, devido à alta quantidade de O2 dissolvido no meio. Depois que todo o oxigênio é consumido, inicia-se a fase anaeróbia, na qual as leveduras realizam a fermentação propriamente dita, convertendo os açúcares presentes no mosto em CO2, etanol e compostos aromáticos como ácidos orgânicos, ésteres e aldeídos (Siqueira et al., 2008, Santos et al., 2005). O processo de fermentação dura de 3 a 9 dias, ao final dos quais se obtém, além do mosto fermentado, uma grande quantidade de gás carbônico que após ser purificado é reaproveitado em outra etapa do processo cervejeiro. Ao final de fermentação, obtém-se também um excesso de levedo, que é tratado e estocado, sendo uma parte reutilizada em novas bateladas de fermentação, e parte vendida para a indústria de alimentos (Santos et al., 2005). O mosto fermentado, chamado também de cerveja verde, que ainda possui uma suspensão de leveduras e uma parte do material fermentescível, passa por uma fermentação secundária chamada de maturação. Essa etapa permite que a levedura continue atuando a uma velocidade reduzida devido às baixas contagens e temperatura de acondicionamento. Após a fermentação, a cerveja que é encaminhada para o processo de maturação apresenta 1-4 milhões de células por ml e uma 23 gravidade de 2-4 graus Plato. Nessa fase ocorre a precipitação de coloides que causam turvação à cerveja e eliminação de substâncias que causam sabor desagradável. Esta etapa do processo é realizada sob temperaturas de 0 a 3°C durante um período de 15 a 60 dias, e contribui para a clarificação da cerveja e melhora do seu sabor (Aquarone et al., 1983, Santos et al., 2005). A cerveja já maturada é dirigida para o processo de filtração para que se torne límpida e brilhante, eliminando os complexos proteicos coloides que ainda se encontram em suspensão e possíveis contaminantes microbiológicos e a levedura cervejeira. O processo consiste em uma aplicação de força sobre o líquido através de uma membrana ou meio filtrante (ex. terra de diatomáceas). Nessa fase a cerveja pode ser ainda diluída em água, para o ajuste de sua concentração, e carbonatada, para o ajuste de dióxido de carbono a valores desejados para a cerveja final (Fernandes, 2012). Depois de filtrada, a cerveja segue para uma linha de enchimento de latas, garrafas ou barris. Para se evitar a formação de espuma e eliminar o oxigênio contido nas embalagens, que poderia deteriorar a cerveja em termos físico-químicos(oxidação) ou microbiológicos, o enchimento é feito em contrapressão com gás carbônico. Na fase de enchimento procede-se ainda à estabilização microbiológica da cerveja, que pode ser feita através de filtração esterilizante ou pasteurização. São conhecidos dois modos de pasteurização: (a) Pasteurização flash: processo no qual a cerveja é aquecida por uma placa de trocador de calor a uma temperatura entre 68 a 72ºC e mantidas a essa temperatura por aproximadamente 50 segundos. Após esse tempo a cerveja é novamente resfriada (Kunze, 1994). (b) Pasteurização “túnel”: Nessa operação a cerveja, já no interior da embalagem fechada, passa por um túnel fechado com esguichos de água quente que tem por objetivo elevar a temperatura do líquido dentro da embalagem a uma temperatura aproximada de 60 ºC por 20 min (Briggs et al., 2004). 24 Figura 1. Processo cervejeiro e principais pontos de contaminação por micro- organismos (*) (Modificado de Vaughan et al., 2005). PARTE 2: CONTAMINAÇÕES MICROBIOLÓGICAS NA INDÚSTRIA CERVEJEIRA 2.1 CONTAMINAÇÕES POR MICRO-ORGANISMOS DETERIORANTES A cerveja é reconhecida como uma bebida de singular estabilidade microbiológica. Tal fato deve-se a diversos fatores que a tornam um meio desfavorável à sobrevivência e/ou multiplicação de vários micro-organismos, dos quais podemos citar: a) presença de etanol (0,5 a 10% p/p, equivalente a aproximadamente 0,6 a 12,3% v/v), b) presença de compostos antimicrobianos encontrados no lúpulo (17 a 55 ppm de iso-α-ácidos), c) elevada concentração de dióxido de carbono (aproximadamente 0,5% p/p), d) baixo pH (3,8 a 4,7) e e) reduzida concentração de oxigênio (<0,1 ppm). Mesmo apresentando essas características desfavoráveis à sobrevivência e/ou multiplicação microbiana, alguns micro-organismos são capazes de se multiplicarem nessas condições e causarem a deterioração desta bebida (Suzuki et al., 2006a; Sakamoto e Konings, 2003). Além da deterioração do produto 25 final, a contaminação microbiológica durante o processo de fabricação da cerveja, pode causar diversos problemas, tais como: consumo de açúcar, formação de goma, floculação do fermento, inibição e redução da viabilidade das leveduras devido às toxinas e ácidos orgânicos excretados no meio, e, por consequência, redução no rendimento e na produtividade da fermentação (Alterthum et al., 1984, Amorim et al., 1982, Yokoya, 1991). Os micro-organismos que comumente são encontradas no processo de produção da cerveja podem ser classificados de acordo com sua forma, características bioquímicas, aspectos estruturais, ou ainda através de técnicas de coloração (Briggs et al., 2004, Hough et al., 1982). Dentre as técnicas conhecidas de identificação, uma das mais importantes e mais amplamente utilizadas em microbiologia é o método de Gram, em que as bactérias são coradas e então classificadas em dois grupos: Gram-positivas e Gram-negativas (tabela 2) (Boulton e Quain, 2006, Pelczar et al., 1980). 2.1.1 CONTAMINAÇÕES POR BACTÉRIAS GRAM-POSITIVAS Dentre as bactérias Gram-positivas causadoras de deterioração da cerveja, temos as bactérias ácido láticas pertencentes aos gêneros Lactobacillus e Pediococcus (Gil et al., 2004, Venturini e Cereda, 2001). Aproximadamente 70% dos problemas por contaminação da cerveja são causados por bactérias láticas (Iijima et al., 2007, Suzuki et al., 2006a, Suzuki et al., 2006b). O gênero Lactobacillus é o mais conhecido dentre as bactérias ácido láticas, incluindo numerosas espécies que são amplamente empregadas em vários processos fermentativos, tais como na produção de picles, vinho e iogurte (Sakamoto e Konings, 2003). L. brevis tem sido relatada como a espécie mais frequentemente detectada como deteriorante da cerveja, e, portanto, o micro-organismo mais estudado na produção cervejeira (Back, 2005). Essa bactéria é uma heterofermentativa estrita que apresenta crescimento ótimo a 30 °C e pH entre 4 e 5, e que pode causar superatenuação (consumo acelerado de açúcares fermentescíveis pelos contaminantes) na cerveja devido à capacidade de fermentar dextrinas e amido (Vaughan et al., 2005, Priest, 1996). 26 O gênero Pediococcus é constituído por bactérias homofermentativas que crescem em pares ou tétrades. Antigamente estas bactérias eram intituladas como sarcinas, pois sua organização celular era confundida com aquela das verdadeiras sarcinas. Por esse motivo, a deterioração da cerveja causada por estes micro- organismos era denominada “doença da sarcina” (Sakamoto e Konings, 2003). A deterioração causada por Pediococcus é semelhante àquela causada por outras bactérias ácido láticas, provocando aumento de turbidez, acidez e formando sabores e aromas desagradáveis (amanteigados, devido à formação de diacetil) (Hartnett et al., 2002; Hough et al., 1982). A espécie P. damnosus, também referenciada na literatura como P. cerevisiae, é conhecida como a mais comum e perigosa bactéria deteriorante da cerveja, sendo responsável por cerca dos 90% dos casos de contaminação de cerveja por bactérias desse gênero (Priest, 1996). É conhecido que algumas estirpes de P. damnosus produzem exopolissacarídeos que tornam, de forma indesejada, a cerveja viscosa e gelatinosa (Back, 2005). Essa espécie também é reportada por se aderir as leveduras e algumas vezes induzir a uma sedimentação prematura do fermento, resultando em um retardamento do processo fermentativo (Priest, 2003). 2.1.2 CONTAMINAÇÕES POR BACTÉRIAS GRAM-NEGATIVAS Os micro-organismos Gram-negativos conhecidos como deteriorantes da cerveja abrangem diversas espécies de bactérias pertencentes a vários gêneros. Dentre eles, os mais importantes incluem as bactérias dos gêneros Pectinatus, Megasphaera, Zymomonas e certos membros da família Enterobacteriaceae (Boulton e Quain, 2006; Priest, 2003; Briggs et al., 2004; Sakamoto e Konings, 2003). O gênero Pectinatus é constituído por bacilos anaeróbios, móveis, não formadores de esporos que possuem flagelos laterais. Estas bactérias podem se multiplicar em temperaturas de 15 a 40 °C (ótima de 32 °C), pH 3,5 a 6 (ótimo 4,5) e em meios contendo até 4,5% p/p (aproximadamente 5,6% v/v) de etanol (Chelak e Ingledew, 1987). As espécies P. cerevisiiphilus e P. frisingensis estão entre as principais deteriorantes da cerveja, sendo responsáveis por 20 a 30% dos incidentes por contaminação bacteriana, principalmente em cervejas não pasteurizadas (Vaughan et al., 2005; Back, 1994b). Essas bactérias, durante a multiplicação, 27 produzem quantidades consideráveis de ácidos, tais como, o ácido propiônico, acético, láctico, succínico e também de acetoína (Haikara et al., 1981). A espécie P. cerevisiiphilus, em temperaturas acima de 15°C, produz uma grande quantidade dos ácidos propiônico os quais inibem a multiplicação do levedo cervejeiro, S. cerevisiae (Chowdhury et al.,1997). No entanto, o principal efeito de deterioração causado pelas espécies de Pectinatus é uma evidente turvação e um forte cheiro de “ovo podre” resultante da combinação de diferentes ácidos graxos, sulfeto de hidrogênio e metil mercaptano (Lee et al.,1980). No seguimento cervejeiro industrial Pectinatus tem como fontes o óleo de lubrificação, tubulações, a água de maceração do malte antes da moagem e na água condensada no teto (Helander et al., 2004). Ogênero Megasphaera tem sido relacionado como responsável por 7% dos incidentes por bactérias deteriorantes na produção de cerveja (Back, 1994). Esse gênero é constituído por 2 espécies, M. elsdeni e M. cerevisiae. Porém, somente M. cerevisiae tem sido considerada responsável pela deterioração de cervejas (Sakamoto e Konings, 2003; Satokari et al., 1998). As células desse micro-organismo são cocos Gram-negativos, imóveis e anaeróbios estritos. Sua multiplicação ocorre entre 15 e 37 °C, com temperatura ótima de 28 °C, e em valores depH acima de 4,1, sendo inibidas em cervejas com concentração de etanol acima de 2,8% p/v (aproximadamente 3,5% v/v). Entretanto, já foi evidenciado crescimento em concentrações de etanol de 5,5% p/v (Haikara e Lounatmaa, 1987). A contaminação da cerveja causada por esse micro-organismo resulta na produção de consideráveis quantidades de ácido butírico, aliado a baixas concentrações de ácido acético, isovalérico, valérico, capróico e de acetoína (Vurren, 1996). M. cerevisiae é um dos micro-organismos mais temidos pelos cervejeiros, pelo fato de, assim como ao Pectinatus, provocar odor fecal na cerveja através da produção de sulfeto de hidrogênio (Lee, 1994). Outro gênero de bactéria Gram-negativa conhecido por causar problemas na indústria cervejeira é o Zymomonas, particularmente a espécie Z. mobilis. Essa bactéria é uma anaeróbia tolerante ao oxigênio, resistente ao lúpulo e apresenta a capacidade de se multiplicar em cervejas com pH acima de 3,4 e concentrações de etanol de até 10% (v/v). Apresenta crescimento rápido a 15 °C em cervejas mantidas em tonéis, mesmo sua temperatura ótima de crescimento sendo de 30 °C (Hough et al., 1982). 28 Sendo assim, os problemas causados pela contaminação da cerveja provocam não somente grandes prejuízos econômicos, com a retirada dos produtos do mercado, mas também perda da confiança do consumidor, motivos esses que podem levar à falência da empresa. Desta forma, a contaminação da cerveja é uma das principais preocupações das indústrias cervejeiras no mundo inteiro (Iijima et al., 2007). 2.1.3 LEVEDURAS SELVAGENS As leveduras, conhecidas como selvagens, são quaisquer leveduras presentes no processo que não a estirpe industrial utilizada. As leveduras selvagens podem ser isoladas de todos os estágios do processo cervejeiro, desde a matéria-prima até o produto armazenado. As leveduras selvagens deteriorantes do processo podem ser divididas em Saccharomyces, como estirpes de S. cerevisiae, e não-Saccharomyces, como os gêneros Brettanomyces, Hansenula, Debaryomyces, Torulopsis, Dekkera, Candida e Pichia, sendo as do gênero Saccharomyces consideradas as mais prejudiciais. Dentre os efeitos deteriorantes causados nas cervejas, sabe-se que as leveduras selvagens podem causar turvação, formação de película na superfície da cerveja, fermentação com desvio na atenuação e desenvolvimento de aromas desagradáveis devido à formação de compostos sulforosos, fenólicos e diacetílicos. (Sakamoto e Konings, 2003; Carvalho et al., 2006). Além dos problemas apresentados acima, algumas leveduras selvagens são conhecidas como Killer yeasts (KY) devido à capacidade desses micro-organismos de secretar polipeptídios que são tóxicos para outras espécies ou estirpes de leveduras. Um dos principais micro-organismos selvagens produtores de toxinas é a Saccharomyces cerevisiae, que pode ser distinguida das leveduras cervejeiras através de suas características morfológicas. Esses produzem células menores e alongadas e floculam inconstantemente. As KY podem contaminar a fermentação eliminando e substituindo a levedura cervejeira do processo, que muitas vezes são susceptíveis a concentrações de KY baixas como de 0,01% (Vaughan et al, 2005). 29 Tabela 2. Micro-organismos deteriorantes e suas características de crescimento e deterioração. Micro- organismo Morfologia Tolerância ao lúpulo T° de crescimento Tolerância ao álcool (% v/v) Faixa de crescimento (pH) Tolerância ao O2 Metabólitos formados Deterioração Lactobacillus brevis Bacilo G(+)1,2 (+)1,2 2-30°C1 >141 <3.5 - 51,2 Microaerófilo1 Diacetil1,2, lactato1,2, acetato1, glicerol6, etanol6 Atenuação1, turbidez1,2 , off- flavours1,2 Lactobacillus casei Bacilo G(+)3 (+)16 2-40°C18 <16,515 5,5-7,517 Microaerófilo2 Diacetil1 , Acetoína1 ,Lactato2 Atenuação2, turbidez2 , off- flavours2 Pediococcus damnosus Cocos G(+)3 (+)2 8-30°C7 <49 4 - 77,8 Microaerófilo8 Diacetil4,5 , lactato6 Atenuação4,5,6, turbidez4,5,6 , off-flavours4,5,6 Pectinatus cerevisiiphilus Bacilo G(-)2,6 (+)2,6 15-40°C10 <5,610 3,5-610 Anaeróbio2,6,11 Ác. Propiônico2,12, acético2,12 , H2S2,13 Turbidez13, odor fecal13 Megasphaera cerevisiae Cocos G(-)2,6,8 (+)2,6 15-37 °C8 >3,58 >4,18 Anaeróbio2,6,8 Ác. Butírico2,14, acetoína2,14 e H2S13 Turbidez2 , odor fecal13 Fonte: 1(Teixeira,1999), 2(Priest, 2003), 3(Sakamoto e Konings, 2003), 4(Hartnett et al., 2002), 5(Hough et al., 1982), 6(Briggs et al.,2004), 7 (De Vos et al, 2009), 8(König et al., 2009), 9(Fernandes et al., 1991), 10(Chelak e Ingledew, 1987), 11(Haikara e Lounatmaa, 1987), 12(Haikara et al.,1981), 13(Lee et al.,1980), 14(Vurren, 1996), 15(Suzuki, 2011), 16( (Haakensen et al., 2009), 17 (Axelsson 2004), 18(Roginski, 2003) 30 2.2 PRINCIPAIS FONTES DE CONTAMINAÇÃO MICROBIOLÓGICA DURANTE O PROCESSO DE FABRICAÇÃO DA CERVEJA O processo de produção de cerveja apresenta diversas fontes de contaminação microbiológica que podem afetar o produto final de forma significativa. A contaminação primária é a que acontece durante as etapas de produção, já a contaminação secundária é a que predomina nas fases de enchimento e pasteurização, e que se observa no produto final (Vaughan et al., 2005). Figura 2. Microbiota contaminante do processo de produção de cerveja (Modificado de Bokulich e Bamforth, 2013). 2.2.1 CONTAMINAÇÕES PRIMÁRIAS Diversos problemas de contaminação microbiológica observados durante o processo produtivo da cerveja têm como fonte as matérias-primas. A matéria-prima que apresenta uma contaminação aguda pode introduzir uma carga de contaminantes 31 microbianos que podem ser carreados até a etapa de pré-filtração da cerveja, comprometendo o processo e podendo gerar metabólitos resistentes que permanecem até o produto final (Fernandes, 2012). Outra importante fonte de contaminação primária pode ser a cultura cervejeira em si. Um inóculo de levedura contaminado microbiologicamente pode principalmente afetar a fermentação (arrastar a fermentação). Para garantir um inóculo formado apenas pelo micro-organismo de interesse, ou seja, a estirpe de levedura utilizada no processo produtivo, quando se for reutilizar o fermento, deve-se realizar um tratamento para se eliminar as bactérias presentes. Este tratamento é normalmente feito com ácidos, como ácido fosfórico 5% por tempos e condições de temperatura que podem variar de empresa para empresa. Além disso, outra medida visando-se garantir a qualidade microbiológica do inóculo inicial é a renovação regular de cultivos puros de forma a evitar contaminações cruzadas por leveduras selvagens (Fernandes, 2012). 2.2.1.1 CEVADA E MALTE A contaminação microbiológica do processo cervejeiro começa nos campos de cultivo da cevada, nos quais a interação planta/micro-organismos pré e pós-colheita e a condição do grão podem implicar sérios problemas para o processo e para a qualidade do produto final. Muitos contaminantes dos campos não persistem após as diversas operações unitárias do processo, entretanto alguns metabólitos secundários podem perdurar até o produto envasado (Bokulich e Bamforth, 2013). Diversos micro-organismos já foram identificados como contaminantes da cevada (Figura 2), contudo somente alguns fungos patógenos de plantas apresentam uma expressiva importância para a qualidade da cerveja. Diversos fungos apresentam a capacidade de produzir metabólitos secundários, conhecidos como micotoxinas, que persistem por todo o processamento cervejeiro e é detectado no produto final (Wolf- Hall, 2007, Kostelanska et al., 2009). Das diversas espécies de fungos que contaminam a cevada do campo ao armazenamento, o gênero Fusarium merece uma menção especial, pois esse é reconhecido como, opatógeno de plantas, produtor da micotoxina Deoxinivalenol (DON ou Vomitotoxina) (Clear et al., 1996). Os efeitos toxigênicos da DON para animais e humanos já estão bem elucidados, gerando uma 32 expressiva preocupação, quando se refere a padrões de qualidade na produção de cevada e malte. Além do potencial toxigênico em relação à saúde humana, altas concentrações de micotoxinas já demonstraram um efeito inibidor do crescimento das leveduras no processo de fermentação (Boeira et al., 1999ab). A contaminação fúngica da cevada e do malte também causa um problema que afeta o consumidor diretamente no momento do consumo, o gushing. O gushing é uma reação anormal de formação de espuma, devido à liberação espontânea de gás, no momento e abertura da embalagem. Esse fenômeno é proporcionado devido a peptídeos hidrofóbicos fúngicos (hidrofobinas) que atuam como sítios de adesão as bolhas de dióxido de carbono do produto envasado que, no momento de abertura, liberam esses gases de forma anormal causando a super espumação (Deckers et al.,2011). Dentro do processo de maltagem a fase de molha e germinação dos grãos torna essa matéria-prima suscetível a contaminações microbianas que podem alterar qualidade da cerveja por todo o processo. Entretanto a fase de secagem proporciona uma considerável redução na contagem de micro-organismos viáveis (Bokulich e Bamforth, 2013). Na fase de molha os micro-organismos presentes no grão se multiplicam rapidamente no próprio grão e na água de molha, isso devido à presença de nutrientes dissolvidos, umidade, temperatura favorável e aeração (Petters et al., 1988, O’sullivan et al., 1999, Briggs e Mcguinness, 1993). O crescimento microbiano nessa etapa apresenta efeitos negativos para a qualidade do malte, além disso esses micro-organismos podem consumir o oxigênio disponível inibindo a germinação do grão e reduzir os efeitos desejáveis da alfa-amilase (Briggs e Mcguinness, 1993, Boran e Briggs, 1992, Kelly e Briggs, 1992). 2.2.1.2 MOSTURAÇÃO E MOSTO Durante a fase de mosturação, bactérias termofílicas podem apresentar crescimento em caso de queda de temperatura do mosto, não lúpulado, ou se a temperatura for mantida abaixo de 60ºC (Vaughan et al., 2005). Bactérias aeróbias e formadoras de esporos do gênero Bacillus, ocasionalmente, causam problemas em cervejarias. Os esporos dos micro-organismos desse gênero estão presentes no malte e adjuntos e sobrevivem por todo o processo de produção 33 cervejeira, entretanto não apresentam germinação durante a fermentação e no produto final devido ao baixo pH dos meios e sensibilidade aos componentes do lúpulo (Smith e Smith, 1993). Contudo, Bacillus coagulans já foi reportado como produtor de ácido láctico em processo de mosturação mantidos a temperatura entre 55-70ºC por mais de duas horas, sendo esse crescimento atribuído à produção de nitrosamina acima do limite permitido (20 ug/L) (Calderbank e Hammond, 1989, Smith e Smith, 1992). O crescimento de Clostridium durante a mosturação, ou no mosto pré-fervura, pode gerar a formação de ácido butirico que caracteriza um odor de queijo no produto final (Hawthorne et al., 1993). A baixa qualidade da espuma do produto final, assim como a consistência pouco viscosa do mosto em sua produção já foi correlacionada com a produção de beta-glucanases e xilanases produzidas por fungos (Latilia et al., 2007). Após a mosturação e filtração o mosto é fervido por um longo período, formando um meio para a fermentação com características estéreis. Entretanto, o mosto é um meio rico em nutrientes e com alto pH (~5,5), portanto ao ser resfriado o meio se torna vulnerável a contaminações por micro-organismos oportunistas presentes no ambiente industrial. Dentre os potenciais contaminantes do mosto os mais comuns são os micro-organismos Gram-negativos do grupo das enterobactérias, como as espécies dos gêneros Klebsiella, Escherichia, Obesumbacterium, Enterobacter e Citrobacter (Priest et al., 1974). A contaminação do mosto por enterobactérias esta associada ao uso de suprimento de água contaminada ou devido a vazamentos de tubulações que atingem o mosto durante o processo. O crescimento de enterobactérias além de inibir o crescimento de leveduras (Priest et al., 1974), está relacionado com a produção de dimetilsulfido (DMS), diacetil, ácidos orgânicos e grande quantidade de 2,3-butanodiol dando a cerveja um aroma indesejável de fruta e vegetais (Priest et al., 1974, Van Vuuren et al., 1980). As enterobactéria, além de contaminar o mosto em diferentes fases de sua produção, são conhecidas como contaminantes do processo de reutilização do inóculo, por exemplo, espécies dos gêneros Obesumbacterium e Enterobacter (Priest et al., 1974). Entretanto, devido aos elevados padrões de higienes aplicados ao processo e a evolução dos equipamentos, a contaminação por enterobactérias no processo cervejeiro diminuiu consideravelmente, podendo esse grupo ser considerado pouco relevante como contaminante do processo (Bokulich e Bamforth, 2013). 34 2.2.1.3 FERMENTAÇÃO E MATURAÇÃO Após a adição de lúpulo e fervura, o mosto é clarificado, resfriado e aerado para que apresente características adequadas para o crescimento e fermentação pela levedura cervejeira. Esse mosto também pode ser meio ideal para o crescimento de outros micro-organismos contaminantes, que podem ser introduzidos no mosto através do inóculo de leveduras, aeração ou como resultado de práticas inadequadas de higiene do processo (Vaughan et al., 2005). O mosto devidamente resfriado e aerado é bombeado para os tanques de fermentação, a onda a levedura cervejeira é adicionada para que possa converter o mosto em cerveja através da fermentação da maltose e de outros açúcares em etanol e dióxido de carbono. O produto final da fermentação primária apresenta um ambiente hostil para a maioria dos micro- organismos, pois a cerveja possui alta concentração de álcool e dióxido de carbono, assim como, componentes antimicrobianos derivados do lúpulo e baixos níveis de oxigênio, pH e nutrientes. Entretanto, aproximadamente, 20% dos açúcares remanescentes no mosto são constituídos de oligossacarídeos que não são metabolizados pela Saccharomyces e podem servir como fonte de carbono para o crescimento de contaminantes (Bokulich e Bamforth, 2013). Dentre os contaminantes do processo fermentativo um dos mais temidos é a levedura selvagem. Esses micro-organismos podem ser isolados de diversos estágios da produção e podem causar diversos problemas de operação, principalmente na fermentação (Vaughan et al., 2005). O crescimento de leveduras selvagens na fermentação pode levar a produção de defeitos, como turbidez, off-flavours e aromas desagradáveis (Hough et al., 1982, Lawrance, 1988). Outros efeitos indesejáveis são relacionados ao desempenho fermentativo da levedura cervejeira, levando a fermentações menos eficientes e lentas, além de causar uma super atenuação do produto final. A super atenuação é um fenômeno no qual a cerveja apresenta um atípico, baixo nível de graus Plato e uma alta concentração alcoólica (Lawrence, 1988). Dentre as bactérias contaminantes dessa etapa do processamento Pediococcus damnosus é um dos mais frequentes, inclusive esse pode estar presente no inóculo de leveduras. Fermentações experimentais contaminados com Pediococcus 35 damnosus e Pediococcus inopinatus tiveram seu tempo de fermentação estendidos e apresentaram elevadas concentrações de diacetil (Vaughan et al., 2005). As aminas biogênicas (AB) são poliaminas que são formadas devido a contaminações microbianas, que descarboxilizam aminoácidos e que podem causar sérios danos de saúde a indivíduos sensíveis, resultando em reações semelhantes a alergias, enxaqueca e a reações de intoxicação (Bokulich e Bamforth, 2013). As aminas biogênicas são formadas por micro-organismospresentes na cevada, malte, mosto, lúpulo, mas principalmente no processo fermentativo (Gasarasi et al., 2003, Halasz et al., 1999). As bactérias ácido láticas são as mais reconhecidas como produtoras de AB, mas algumas estirpes de enterobacteria e algumas estirpes de Saccharomyces podem ser atribuídas como formadoras desse composto (Gasarasi et al., 2003). O processo de maturação tem seu ínicio ao fim da fermentação, ao qual a cerveja é transferida para tanques a mantidos a baixas temperaturas por longos períodos. Nessa etapa da produção cervejeira o mosto já fermentando pode ser contaminado por micro-organismos como Pediococcus damnosus e Lactobacillus lindineri. P. damnosus é conhecido por ser o mais frequente contaminante do processo fermentativo e de maturação, isso devido a sua capacidade de se multiplicar a baixas temperaturas (Back, 2005) Valores inesperados de diacetil durante o processo de maturação podem ser relacionados com contaminação por P. damnosus (Susuki, 2011). 2.2.2 CONTAMINAÇÕES SECUNDÁRIAS As contaminações secundárias representam mais de 50% dos casos de deteriorações em cervejas pasteurizadas via Flash pasteurização. A Flash pasteurização se dá pela eliminação da carga microbiana antes do enchimento das garrafas, diferente da pasteurização em “Túnel” que ocorre com a cerveja já engarrafada (Vaughn et al., 2005). Mesmo a cerveja sendo considerado um meio hostil para o crescimento microbiano alguns grupos de micro-organismos como leveduras selvagens, bactérias ácido láticas e bactérias anaeróbias estritas como Pectinatus ssp. e Megasphaera spp. conseguem se multiplicar contaminando o produto final. Sendo esses dois últimos 36 gêneros de bactérias anaeróbias, acredita-se que a presença deles na área de enchimento seja favorecida pela formação de interações simbióticas com micro- organismos mais resistentes, adaptados ao ar e formadores de biofilmes (Back, 1994). Back (1994), ainda afirma que as contaminações no ambiente da área de enchimento acontecem de forma sequencial. Segundo o autor, bactérias acéticas (como por exemplo, Acetobacter spp. e Glunobacter spp.) e algumas enterobactérias, veiculadas pelo ar, são os principais micro-organismos colonizadores do biofilme. Primeiramente, as bactérias acéticas colonizam superfícies que apresentam resíduos orgânicos e inorgânicos do processo cervejeiro. Essas bactérias não são referenciadas como deterioradoras, porém são capazes de formar uma matriz de polissacarídeo que gera proteção e condições para proliferação de micro-organismos deteriorantes. 2.2.2.1 ENVASE O processo de envase representa um dos maiores desafios para a manutenção da estabilidade microbiológica da cerveja. Durante os processos anteriores, como da produção do mosto até a maturação, a cerveja se mantém em toneis de aço inoxidável com acessíveis condições de higiene. Entretanto no processo de envase o produto é transportado por diversas superfícies dentro dos equipamentos e tubulações, nas quais exposições breves a atmosfera ocorrem, e são armazenados em pequenos vasilhames. Existe a possibilidade da formação de biofilmes na superfície de bicos injetores e nas áreas de envase, aumentando o risco de contaminação microbiana e justificando os altos índices de contaminações nessa etapa (Bokulich e Bamforth, 2013). No advento de uma filtração ou pasteurização ineficiente, a cerveja se torna vulnerável a contaminação de diversos micro-organismos, sendo os principais deteriorantes relacionados a incidentes de contaminação microbiana, as bactérias ácido láticas Gram-positivas (Vaughan et al., 2005). Entretanto, a crescente demanda por cervejas não pasteurizadas vem aumentando os incidentes de contaminação microbiana de cerveja embalada, principalmente por espécies anaeróbias como Pectinatus e Megasphaera, gêneros de deteriorantes Gram-negativos (Jespersen e Jakobsen, 1996). 37 PARTE 3: TRATAMENTOS E REUTIIZAÇÃO DA LEVEDURA CERVEJEIRA 3.1 DESCONTAMINAÇÃO DO FERMENTO – A LAVAGEM ÁCIDA A lavagem ácida do fermento tem sido empregada pelos cervejeiros a mais de 100 anos como um método eficiente de eliminar a contaminação bacteriana sem afetar adversamente a qualidade fisiológica da levedura. A levedura apresenta uma resistência natural a condições ácidas, entretanto, se outras condições do meio, como concentração de álcool e temperatura, apresentarem variações, a resistência ao tratamento ácido diminui (Simpson e Hammond, 1989). Simpson e Hammond demonstraram que se a temperatura da lavagem ácida ocorrer abaixo dos 5 °C, a concentração de etanol permanecer abaixo de 8% (v/v) e o tratamento não durar mais que duas horas, não se observa redução significativa nos níveis de viabilidade e de performance fermentativa da levedura (Figura 3). A escolha do ácido para acidificar o fermento é determinada por diversos fatores, dentre eles, destacam-se: i) a aceitabilidade do ácido como um aditivo ou auxiliador no processo, ii) o custo do ácido, iii) características do ácido quanto à segurança de sua manipulação e iv) eficiência do ácido como um agente para a lavagem do fermento (Simpson e Hammond, 1989). Diversos ácidos satisfazem esses critérios em diversos graus, contudo o ácido fosfórico e o cítrico merecem uma menção especial. Como são ácidos fracos, o controle do pH do fermentado é facilmente alcançável. Por outro lado, ácidos fortes como o ácido sulfúrico podem causar problemas como a diminuição acentuada do pH devido à super dosagens e perda de viabilidade das células de leveduras. Ácidos fracos, também, diminuem ligeiramente o pH do mosto quando a levedura é reinoculada, o que restringe a possibilidade de recontaminação. Como são ácidos fracos, a influência no pH final da cerveja é negligenciável, pois sendo ácidos fracos a forma não dissociada predomina sobre a forma protonada (Simpson e Hammond, 1989). 38 Figura 3. Processo de lavagem ácida e segregação dos produtos da fermentação cervejeira (Simpson e Hammond, 1989). Estudos mais recentes apresentam a lavagem ácida como um fator de estresse para as leveduras que podem gerar culturas com baixa vitalidade e viabilidade, que levam a fermentações incompletas, floculações da levedura, decantação, baixas contagens e variações metabólicas que podem gerar off-flavours (Stewart et al., 2013). Quando a lavagem ácida de leveduras é realizada em paralelo com fermentações de alto °Plato os efeitos estressantes sobre a levedura são acentuados, com isso processos de gerenciamento do inóculo devem ser otimizados para se reutilizar o levedo em uma próxima fermentação. É de interesse da indústria, para a reutilização do levedo em novas bateladas, garantir que a levedura apresente um bom estado fisiológico e possa manter sua resistência em condições ácidas (Cunningham e Stewart, 1998). É evidenciado que as resistências da levedura a condições impostas pela lavagem ácida estão relacionadas com os fatores ambientais, como por exemplo, a temperatura da lavagem, pH e concentrações de etanol; assim como as condições fisiológicas da levedura antes da lavagem (Simpson e Hammond, 1989). As fases logarítimica das culturas de levedura apresentam uma resistência ácida baixa em comparação com a fase estacionária, portanto a fisiologia da levedura determina sua resistência aos efeitos do tratamento ácido (Steels et al., 1994). A performance fermentativa da levedura cervejeira exposta a sucessivas lavagens ácidas e reutilizações em novas bateladas de fermentações podem gerar diversos efeitos deletérios (como por exemplo, baixa performance fermentativa e geração de off flavours) se não realizada propriamente, mas se as condições de 39 temperatura, pH, concentração de álcool e tempo da lavagem forem seguidos conforme estudos anteriores; e o mosto utilizado nas fermentações sucessivas esteja devidamenteoxigenado e apresente uma baixa gravidade (em torno de 12 °Plato), as fermentações não apresentam problemas em sua performance fermentativa e as lavagens e reutilizações podem seguir desde que a levedura apresenta uma alta taxa de viabilidade (>80%) (Cunningham e Stewart, 2000). 3.2 ÁCIDOS FRACOS Historicamente os ácidos orgânicos desempenham um significante papel nos alimentos e bebidas há milhares de anos. Existem registros que datam de 5000 a 5400 antes de cristo quanto à presença de resíduos de ácido tartárico em jarras de vinhos Iranianos. Os ácidos naturais de uva melhoram e adicionam frescor aos vinhos, além de melhorar as propriedades antioxidantes dessa bebida. Nos dias atuais, tem se tornado prática comum à adição de ácido cítrico, málico ou tartárico, particularmente em vinhos de climas quentes e sazonais. Não é coincidência que o os vinhos de maior validade são os produzidos com uvas mais ácidas (Stratford, 1999). Acidulantes agem como conservantes por retardar o crescimento de micro- organismos e a germinação de esporos que poderiam causar a deterioração de alimentos e bebidas. O efeito inibitório dos ácidos fracos é atribuído tanto ao pH quanto a concentração desse ácido na sua forma não dissociada. Primeiramente, é a forma não dissociada do ácido que possui a ação antimicrobiana e quanto menor o pH, melhor é o equilíbrio em favor da forma não dissociada, conduzindo assim, a uma atividade microbiana mais eficaz (Dziezak, 2003). 3.2.1 TEORIA DOS ÁCIDOS FRACOS A clássica teoria dos ácidos fracos de inibição de micro-organismos por conservantes é amplamente definida por parâmetros físico-químicos. Ácidos fracos, quando em solução aquosa, dissociam-se parcialmente gerando um equilíbrio dinâmico entre ácidos moleculares e íons carregados. Em baixo pH, o equilíbrio favorece a formação de ácidos moleculares (não dissociados), enquanto em pH próximo da neutralidade, observa-se o predomínio de íons carregados. Os ácidos 40 orgânicos moleculares são lipossolúveis, diferente dos íons carregados, que a baixo pH penetram a célula de um micro-organismo através dos lipídeos da membrana plasmática por um transporte conhecido como difusão facilitada. No citoplasma da célula, a pH neutro, o ácido molecular se dissocia em ânion e próton, os quais não conseguem deixar o citoplasma da célula devido a suas cargas. Com o aumento da concentração de prótons o citoplasma sofre uma substancial acidificação que inibe processos do metabolismo celular como a glicólise, comunicação celular e o transporte ativo (Figura 4) (Lambert e Stratford, 1999). Figura 4. Transporte de um ácido fraco e sua forma dissociada e não dissociada através da membrana microbiana (modificado de Lambert e Stratford, 1999). Segundo a teoria dos ácidos fracos, todos os ácidos lipofílicos de mesmo pKa, ácido acético e sórbico, por exemplo, são equivalentes quanto a sua efetividade como conservantes, causando inibição por difusão de moléculas de ácido não dissociados para o interior da célula, seguido da dissociação e acidificação do citoplasma. Entretanto, estudos recentes demonstram que ácidos, como os citados acima, que possuem o mesmo valor de pKa, apresentam variações na redução do pH de células de levedura e fungos filamentosos, quando utilizados concentrações semelhantes. O ácido acético cumpre com a proposta da teoria dos ácidos fracos, no qual sua utilização, a níveis inibitórios, reduz o pH celular para valores próximos a 4.7. Assim sugerindo que o ácido acético causa a inibição através da acidificação do citoplasma microbiano (Stratford et al.,2009, Stratford et al.,2013). Entretanto o ácido sórbico, em concentrações inibitórias menores que a do ácido acético, apresenta o efeito 41 conservante por vias diferentes da de redução do pH, como previsto pela teoria dos ácidos fracos. As baixas concentrações inibitórias, em comparação com o ácido acético, o ácido sórbico apresentou efeito conservante, mesmo reduzindo o pH de micro-organismos de 7-7,4 para 6.3. Assim, pode se concluir que o ácido sórbico não inibe os micro-organismos através da via de acidificação citoplasmática como previsto pela clássica teoria dos ácidos fracos (Stratford et al.,2013). Devido às características hidrofóbicas do ácido sórbico, acredita-se que o sítio de ação desse conservante são as proteínas e lipídeos de membrana. Avariações da membrana podem ser evidenciadas de várias formas, como a lise celular, alteração das proteínas de membrana e pequenos vazamentos devido à mudança da fluidez de membrana (Stratford et al.,2009). Em princípio, o resultado obtido para esses ácidos pode ser equiparado a efeitos, inibidores de crescimento, de outros ácidos fracos, como por exemplo, o ácido cítrico, fosfórico láctico e outros. 3.2.2 ÁCIDO FOSFÓRICO O ácido fosfórico é o único ácido inorgânico utilizado na indústria de alimentos, sendo o segundo ácido mais utilizado nesse ramo. Dos acidulantes alimentares o ácido fosfórico é o que produz o menor pH quando se considera a mesma quantidade de ácido adicionado no alimento, isso devido aos seus baixos valores de Ka e pKa (7,52 x 10-3 e 2,12, respectivamente), em comparação com outros ácidos fracos. Esse ácido é mais utilizado na produção de bebidas carbonatadas como refrigerantes e cervejas (Dziezak, 2003). 3.3 DIÓXIDO DE CLORO O dióxido de cloro aquoso (ClO2) é um forte oxidante e agente sanitizante de ampla e alta ação biocida contra algas, deteriorantes de alimentos e patógenos (Junli et al., 1997; Kim et al., 2009; Vandekinderen et al., 2009; Tomás-Callejas et al., 2012). O ClO2 aquosopode ser utilizado para sanitizar superfícies que entram em contato com alimentos e diretamente aplicado nos mesmos. A aplicação desse agente sanitizante tem recebido grande atenção devido as suas vantagens potenciais em comparação com outros sanitizantes a base de cloro, sendo que o mesmo fora aprovado para a lavagem de frutas e vegetais pela Food and Drug Administration. 42 (FDA et al., 1998). Trabalhos reconhecem que o dióxido de cloro possui 3.5 vezes mais ação oxidante do que o cloro isoladamente; e também que a solução aquosa desse sanitizante apresentou uma ação bactericida mais eficiente do que a aplicação de uma solução de cloro 7 vezes mais concentrada (Benarde et al, 1965; Lillard, 1979). Em relação ao uso de cloro, típico sanitizante industrial, surgiram algumas preocupações no âmbito da saúde devido à produção de trihalometanos e clorofenois gerados durante a cloração. Entretanto, diversos estudos vêm apresentando o dióxido de cloro como uma alternativa mais eficaz na sanitização e livre da produção desses compostos carcinogênicos (Kim et al., 1999; Owusu-Yaw et al., 1999). O dióxido de cloro aquoso é utilizado amplamente na Europa (Katz, 1980) e esta sendo aplicado em mais de 400 plantas de tratamento de água potável nos Estados Unidos (Richardsen et al., 1996). A utilização de ClO2 aquoso tem sido considerada como potencial sanitizante para o processamento de vegetais, peixes, carne vermelha, aves e embalagem de cítricos (Costilow et al., 1984; Reina et al., 1995; Key et al., 1996; Lin et al., 1996; Cutter e Dorsa, 1995; Villarreal et al., 1990; Tsai et al., 1995). Além das pesquisas na área de alimentos e de água potável, o dióxido de cloro tem sido considerado para a sanitização de suspensões de leveduras para processos fermentativos (Meneghin et al., 2008). Ao final do processo fermentativo do caldo de cana de açúcar, para a produção de etanol, a levedura recuperada dos tanques de fermentação é lavada com ácido sulfúrico. Muitas vezes se faz necessário à adição de biocidas como, por exemplo, quaternário de amônia, fenóis halogenados e antibióticos; para o controle de contaminantes do processo. Devido aos altos custos desses biocidas e também a possibilidade de seleções de micro-organismos
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