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Introdução ao Direito Aduaneiro - Rodrigo Mineiro Fernandes - 2018

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Prévia do material em texto

INTRODUÇÃO AO DIREITO
ADUANEIRO E TRIBUTAÇÃO
ADUANEIRA
Rodrigo Mineiro Fernandes
Mestre em Direito Público pela PUC Minas
Professor de Direito Tributário e Aduaneiro do IEC - PUC Minas
Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil
Conselheiro Titular do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais
Introdução ao Direito Aduaneiro e
Tributação Aduaneira
2018
DEDICATÓRIA E AGRADECIMENTOS
Dedico este livro a minha companheira de toda vida e meu amor,
Rosane, que me incentivou a escrever uma obra de Direito Aduaneiro para
aqueles que não conhecem a matéria. Obrigado pela dedicação e paciência
ao longo de todos esses anos!
Agradeço também aquela que é a luz que me ilumina a cada manhã,
Ana, minha Princesa de Júpiter, que me dá força para seguir sempre em
frente.
Destaco que a presente obra não existiria sem a ativa participação
de Pedro Mineiro, que revisou diversas vezes o material e produziu críticas
construtivas, sugeriu diversas alterações, contribuiu com a redação em
várias partes em coautoria e deu a sua “cara” ao trabalho. Muito obrigado
filho! Este livro também é seu!
SUMÁRIO
PARTE I – INTRODUÇÃO AO DIREITO ADUANEIRO
1. NOTAS INTRODUTÓRIAS SOBRE O DIREITO ADUANEIRO
1.1. DIREITO ADUANEIRO E COMÉRCIO INTERNACIONAL
1.1.1. Evolução histórica do comércio internacional
1.1.2. Direito Aduaneiro e regulação do comércio internacional
1.2. ELEMENTOS ESSENCIAIS DO DIREITO ADUANEIRO
1.3. FUNÇÕES DA ADUANA
1.3.1. Controle aduaneiro: bem jurídico tutelado
1.3.2. Tributação aduaneira
1.4. DIREITO ADUANEIRO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
1.4.1. Previsão Constitucional das atividades aduaneiras
1.4.2. Histórico da Legislação Aduaneira
1.4.3. Tratados e Convenções internacionais
1.4.4. Código Aduaneiro do Mercosul
1.5. DIREITO ADUANEIRO E SUA RELAÇÃO COM O DIREITO TRIBUTÁRIO E O DIREITO ECONÔMICO
2. ELEMENTOS CARACTERÍSTICOS DA MERCADORIA: CLASSIFICAÇÃO FISCAL,
ORIGEM E VALOR
2.1. CLASSIFICAÇÃO FISCAL DAS MERCADORIAS
2.1.1. Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias
2.1.2. Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) e a Tarifa Externa Comum (TEC)
2.1.2.1. Lista das Seções e Capítulos
2.1.3. Regras de Classificação Fiscal de Mercadorias
2.1.3.1. Regras Gerais para Interpretação do Sistema Harmonizado
2.1.3.2. Regra Geral Complementar (RGC)
2.1.3.3. Notas Explicativas do Sistema Harmonizado (NESH)
2.1.4. Consultas de Classificação Fiscal
2.1.5. Pareceres de Classificação Fiscal
2.2. ORIGEM DAS MERCADORIAS
2.3. VALOR DAS MERCADORIAS
2.3.1. Acordo de Valoração Aduaneira
2.3.2. Utilização de uma Base de Dados Nacional de Valoração
2.3.3. Apuração do Valor Aduaneiro em Caso de Duvidas da Veracidade ou
Exatidão do Valor Declarado
2.3.4. Despesas com capatazia e o valor aduaneiro
3. PROCEDIMENTOS ADUANEIROS NA IMPORTAÇÃO
3.1. IMPORTAÇÃO DE MERCADORIAS
3.2. MODALIDADES DE IMPORTAÇÃO
3.2.1. Importação por conta e ordem de terceiros
3.2.2. Importação por encomenda
3.3. DESPACHO ADUANEIRO DE IMPORTAÇÃO
3.3.1. Registro da Declaração de Importação - DI
3.3.2. Parametrização da Declaração de Importação
3.3.3. Conferência aduaneira
3.3.4. Desembaraço das mercadorias
3.4. REVISÃO ADUANEIRA
3.4.1. Previsão legal e regulamentar
3.4.2. Revisão Aduaneira e o princípio da autotutela
3.4.3. Revisão Aduaneira dentro do modelo de Aduana do século XXI
3.4.4. Diferença entre Revisão do Lançamento Tributário e Revisão Aduaneira
3.5. NOVO PROCESSO DE IMPORTAÇÃO
4. ADUANA E MEDIDAS DE FACILITAÇÃO COMERCIAL
4.1. PORTAL ÚNICO DE COMÉRCIO EXTERIOR
4.2. OPERADOR ECONÔMICO AUTORIZADO
4.3. ACORDO SOBRE A FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO DA OMC
5. ASPECTOS GERAIS DAS INFRAÇÕES E PENALIDADES ADUANEIRAS
5.1. INTRODUÇÃO AO REGIME INFRACIONAL ADUANEIRO
5.2. HARMONIZAÇÃO INTERNACIONAL DAS SANÇÕES ADUANEIRAS
5.3. ESPÉCIES DE PENALIDADES ADUANEIRAS
5.4. NATUREZA JURÍDICA E CONSTITUCIONALIDADE DA PENA DE PERDIMENTO
5.5. DENÚNCIA ESPONTÂNEA ADUANEIRA
5.5.1. Denúncia espontânea prevista no artigo 138 do CTN
5.5.2. Diferenciação entre os conceitos de obrigação aduaneira e obrigação tributária-
aduaneira
5.5.3. Denúncia espontânea prevista no artigo 102 do Decreto-Lei nº 37/66
5.5.4. Posicionamento do CARF e da RFB
5.5.5. Nosso entendimento
6. INFRAÇÕES GRAVES AO CONTROLE ADUANEIRO: A OCULTAÇÃO DO
SUJEITO PASSIVO (INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA) E O SUBFATURAMENTO
6.1. OCULTAÇÃO DO SUJEITO PASSIVO E INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA DE TERCEIROS
6.1.1. Controle aduaneiro e informações prestadas pelo importador na declaração de
importação
6.1.2. Ocultação do sujeito passivo como infração aduaneira
6.1.2.1. Análise do tipo infracional
6.1.2.2. Conceito de ocultação fraudulenta ou simulada
6.1.2.3. Responsabilidade pela infração nas diversas modalidades de importação
indireta
6.1.3. Questão probatória
6.1.4. Penalidades aplicáveis pela ocultação do sujeito passivo
6.1. SUBFATURAMENTO NA IMPORTAÇÃO
6.2.1. Subfaturamento e falsidade documental
6.2.2. Previsão de arbitramento de preços em casos de subfaturamento
6.2.3. Penalidades aplicáveis pelo subfaturamento
PARTE II – TRIBUTAÇÃO ADUANEIRA E REGIMES ADUANEIROS ESPECIAIS
7. TRIBUTOS INCIDENTES NA IMPORTAÇÃO
7.1. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO
7.1.1. Previsão constitucional e legal
7.1.2. Hipótese de Incidência
7.1.2.1. Conceito de Importação
7.1.2.2. Uso dos termos “produtos”, “mercadorias” e “bens”
7.1.2.3. Conceito de produtos estrangeiros
7.1.2.4. Aspecto Espacial
7.1.2.5. Aspecto Temporal
7.1.2.6. Sujeição passiva
7.1.2.7. Base de cálculo e alíquota
7.1.3. Regime de Tributação Simplificada
7.1.4. Regime de Tributação Especial
7.2. IPI VINCULADO À IMPORTAÇÃO
7.2.1. Previsão constitucional e legal
7.2.2. Hipótese de Incidência
7.2.2.1. Aspecto Material
7.2.2.2. Aspecto Espacial
7.2.2.3. Aspecto Temporal
7.2.2.4. Sujeição passiva
7.2.2.5. Base de cálculo e alíquota
7.2.2.6. Incidência do IPI na Revenda de Produtos Importados
7.3. PIS-IMPORTAÇÃO E COFINS-IMPORTAÇÃO
7.3.1. Previsão constitucional e legal
7.3.2. Hipótese de Incidência
7.3.2.1. Aspecto Material
7.3.2.2. Aspecto Espacial
7.3.2.3. Aspecto Temporal
7.3.2.4. Sujeição Passiva
7.3.2.5. Base de cálculo na importação de mercadorias
7.3.2.6. Base de cálculo na importação de serviços
7.3.2.7. Alíquota
7.3.3. Configuração do resultado do serviço para fins de incidência tributária
7.3.3.1. Configuração do resultado na exportação de serviços para fins de não
incidência do ISSQN
7.3.3.2. Configuração do resultado na importação de serviços
7.4. ICMS NA IMPORTAÇÃO
7.4.1. Previsão constitucional e legal
7.4.2. Hipótese de Incidência
7.4.2.1. Aspecto Material
7.4.2.2. Aspecto Espaciale Temporal
7.4.2.3. Aspecto Pessoal
7.4.2.4. Base de cálculo e alíquota
7.5. ADICIONAL DE FRETE PARA RENOVAÇÃO DA MARINHA MERCANTE
7.6. TAXA DE UTILIZAÇÃO DO SISCOMEX
8. LANÇAMENTO DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO
8.1. DESEMBARAÇO ADUANEIRO COMO HOMOLOGAÇÃO EXPRESSA DO LANÇAMENTO
8.2. REVISÃO ADUANEIRA COMO HOMOLOGAÇÃO EXPRESSA DO LANÇAMENTO
8.3. PROTEÇÃO DA CONFIANÇA E LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO-ADUANEIRO
8.3.1. Práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas
8.3.2. Proteção da confiança nas hipóteses de Revisão Aduaneira
8.3.2.1. Proteção da confiança nos diversos canais de conferência aduaneira
8.3.2.2. Requisitos para configurar a prática reiterada nos casos de Revisão Aduaneira
9. INTRODUÇÃO AOS REGIMES ADUANEIROS ESPECIAIS
9.1. REGIMES ADUANEIROS ESPECIAIS COMO INSTRUMENTO DE INTERVENÇÃO ESTATAL NA
ECONOMIA
9.2. OBJETIVOS DOS REGIMES ADUANEIROS ESPECIAIS
9.3. REGIMES DE INGRESSO OU SAÍDA TEMPORÁRIOS
9.3.1. Regime de Admissão Temporária
9.3.2. Regime de Exportação Temporária
9.4. REGIMES DE DEPÓSITO DE MERCADORIAS
9.5. REGIMES DE PASSAGEM OU TRÂNSITO DE MERCADORIAS
9.6. REGIMES DE DESENVOLVIMENTO DE ÁREAS OU SETORES INDUSTRIAIS
9.7. REGIMES DE INDUSTRIALIZAÇÃO COM DESTINO À EXPORTAÇÃO
9.7.1. Regime Aduaneiro Especial de Entreposto Industrial sob Controle Aduaneiro
Informatizado - RECOF
9.7.2. Regime Aduaneiro Especial de Entreposto Industrial sob controle informatizado
do Sistema Público de Escrituração Digital - RECOF – SPED
10. REGIME ADUANEIRO ESPECIAL DE DRAWBACK
10.1. REGIME DE DRAWBACK NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
10.2. NATUREZA JURÍDICA DO REGIME DE DRAWBACK E PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS
10.3. REGIME ADUANEIRO ESPECIAL DE DRAWBACK SUSPENSÃO
10.4. REGIME ADUANEIRO ESPECIAL DE DRAWBACK ISENÇÃO
10.5. REGIME ADUANEIRO ESPECIAL DE DRAWBACK RESTITUIÇÃO
10.6. VINCULAÇÃO FÍSICA E EQUIVALÊNCIA DE INSUMOS NO DRAWBACK
10.7. INADIMPLEMENTO DAS CONDIÇÕES DO REGIME
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
APRESENTAÇÃO
O presente trabalho é fruto de vários anos lecionando em cursos de
pós- graduação do Instituto de Educação Continuada (IEC) da PUC Minas,
nas disciplinas relacionadas à tributação aduaneira e ao Direito Aduaneiro,
nos cursos Direito Tributário, Gestão Fiscal e Tributária, MBA em
Comércio Exterior e LLM em Direito Tributário. Durante esse tempo, uma
grande dificuldade enfrentada pelos dedicados alunos sempre foi encontrar
obras que pudessem servir como material básico para as disciplinas.
Apenas artigos extraídos de diversas coletâneas aduaneiras eram utilizados.
Os poucos livros escritos tratavam de temas específicos sobre a matéria
aduaneira, ou versavam exclusivamente sobre o imposto de importação ou
sobre a internacionalização da matéria aduaneira. Inexiste em nossa
doutrina uma obra que possa ser denominada Curso de Direito Aduaneiro.
A obra que ora apresento não tem a pretensão de ser um curso sobre
a matéria, mas tem a ousadia de ser o primeiro passo para tanto. Pretendo
que seja uma obra aberta, que possa ser ampliada, revisada e reescrita
diversas vezes até se tornar, efetivamente, um curso de Direito Aduaneiro.
Ou que seja um incentivo a outros autores, mais qualificados,
desenvolverem tal curso. Creio que é função da academia produzir
conhecimento, e a ousadia que tive ao gestar e lançar este livro é
compatível com a função do mestre, que deve deixar de lado as vaidades e
se expor para permitir a disseminação do conhecimento e aperfeiçoar
aquilo que pretensamente acha que conhece.
O livro é direcionado primariamente aos alunos de cursos de pós-
graduação em matérias ligadas ao Direito Aduaneiro e à tributação
aduaneira, especialmente pela ausência de tais disciplinas na grade dos
principais cursos de Direito do país e pela limitada análise do Direito
Aduaneiro que é feita em cursos de graduação ligados ao comércio
exterior. Por isso, o livro leva o título de “introdução”. Entretanto,
confesso que extrapolei em alguns pontos, passando da análise
introdutória, especialmente nos temas ligados às sanções aduaneiras e ao
regime aduaneiro especial de Drawback. Por isso, a presente obra poderá
servir também aos profissionais e pesquisadores já iniciados na matéria.
A obra foi desenvolvida em 10 capítulos, divididos em duas partes: a
primeira, diretamente ligada às questões tipicamente aduaneiras; a segunda,
relativa a tópicos de tributação aduaneira e aos regimes aduaneiros especiais.
A primeira parte, intitulada “Introdução ao Direito Aduaneiro”, com 6
capítulos, trata dos seguintes temas: notas introdutórias sobre o Direito
Aduaneiro, apresentando a matéria aduaneira, seus elementos essenciais, suas
funções e sua relação com o Direito Tributário e com o Direito Econômico;
elementos característicos da mercadoria, apresentando os conceitos de
classificação fiscal, origem e valor aduaneiro das mercadorias; procedimentos
aduaneiros na importação, com especial destaque ao procedimento de
despacho aduaneiro e suas diversas etapas, incluindo a revisão aduaneira;
medidas de facilitação comercial; aspectos gerais das infrações e penalidades
aduaneiras, inclusive com a análise da previsão normativa de denúncia
espontânea aduaneira; e a análise de duas infrações graves ao controle
aduaneiro - a ocultação do sujeito passivo (interposição fraudulenta) e o
subfaturamento.
A segunda parte da obra, intitulada “Tributação aduaneira e regimes
aduaneiros especiais”, com 4 capítulos, trata dos tributos incidentes na
importação, do lançamento tributário-aduaneiro, dos aspectos gerais dos
regimes aduaneiros especiais e, especificamente, do regime aduaneiro
especial de Drawback.
Os capítulos foram escritos de forma a possibilitar ao leitor uma
leitura independente de cada um deles, podendo consultar a obra em um
ponto específico em que tiver maior interesse.
Por fim, destaco que a presente obra traduz as opiniões e
interpretações exclusivamente pessoais do autor, que não refletem,
necessariamente, o posicionamento da Secretaria da Receita Federal do Brasil
ou do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Trata-se de um estudo
teórico, acadêmico e imparcial.
Belo Horizonte, 30 de junho de
2018. Rodrigo Mineiro Fernandes
rmineirof@gmail.com
mailto:rmineirof@gmail.com
PREFÁCIO
Professor Doutor Adilson Rodrigues Pires
PARTE I – INTRODUÇÃO AO DIREITO ADUANEIRO
1. NOTAS INTRODUTÓRIAS SOBRE O DIREITO ADUANEIRO1
A importância da matéria aduaneira já começa a ser reconhecida
em nosso país, apesar de nossa escassa produção doutrinária e da pouca
atenção dada pela academia ao tema. Debates acerca de custos
alfandegários, discussões sobre as medidas de facilitação comercial,
acordo bilaterais e multilaterais com cláusulas de reduções tarifárias,
barreiras não-tarifárias, regimes aduaneiros especiais com benefícios
fiscais já fazem parte do noticiário econômico e jurídico dos principais
jornais e publicações eletrônicas brasileiras.
O conhecimento da matéria aduaneira e sua ligação com a
atividade de comércio internacional, especialmente sob o viés jurídico,
constituem o ponto de partida do presente estudo.
1.1. Direito Aduaneiro e comércio internacional
1.1.1. Evolução histórica do comércio internacional
A atividade aduaneira possui uma estreita vinculação com a
comercialização de mercadorias entre diferentes territórios, observada até
mesmo em antigas civilizações. A vigilância das fronteiras do território
(cidade-estado, reino, império, feudo, tribo), com o controle do tráfego
externo de mercadorias, refletia o poder do ente controlador do território e
era exercido por alguma espécie de autoridade aduaneira.A aplicação de
restrições à importação e à exportação de mercadorias é tão antiga quanto
o comércio entre os territórios, como forma de proteção à economia
interna (ainda que de forma primitiva) e à segurança, além de propiciar o
reconhecimento da autoridade do ente controlador do território e a
soberania territorial, influenciada pela corrente econômica dominante em
cada época.
O doutrinador argentino Ricardo Xavier Basaldúa, em seu clássico
estudo sobre o Direito Aduaneiro, apresenta uma investigação histórica
sobre a presença da Aduana em diversas civilizações (Egito, Grécia,
Roma, Idade Média, Veneza, Gênova, Bizâncio, França, Espanha e
América pré-colonial)2. O autor reporta a
1 Conteúdo adaptado de FERNANDES, 2015, p. 88-109.
2 Cf. BASALDÚA, 1988.
presença de alguma atividade aduaneira nessas civilizações, através do
controle exercido na entrada e saída de mercadorias de seu território, de
forma a impedir esse fluxo ou aplicar-lhe alguma espécie de gravame na
operação comercial. Ricardo Basaldúa apresenta interessantes exemplos
de aplicação de restrições à importação e à exportação em sua
investigação histórica: a proibição de exportar trigo no Egito antigo; a
proibição de exportar grãos e figos na Grécia antiga; a proibição de
exportar trigo, sal e armas no Império Romano; a proibição de exportar
ouro, ferramentas e armas no Império Bizantino; a proibição de exportar
cavalos na Espanha de Alfonso, o Sábio; a proibição de exportar cereais,
ouro e prata na França medieval. Buscava-se, assim, desde o início, a
proteção da economia local. De acordo com a abundância ou a escassez
de uma determinada mercadoria em outras regiões, estabeleciam-se cotas
maiores ou menores de importação e exportação, definindo como fator de
restrição, os gravames.
Com o início da Revolução Comercial, a consequente
desintegração do feudalismo, a consolidação do absolutismo e a formação
dos Estados Nacionais, a atividade aduaneira passou a exercer um outro
papel fundamental dentro da doutrina mercantilista: a arrecadação de
tributos ou direitos aduaneiros sobre a entrada ou saída de mercadorias do
território, constituindo uma importante fonte de recurso ao tesouro do
Estado Nacional, além de instrumento para a prática de medidas
protecionistas3. A prática mercantilista proporcionava um resultado
positivo na balança comercial do Estado, com o acesso às reservas de
metais preciosos e o desenvolvimento de suas manufaturas.
Durante o mercantilismo, o comércio internacional passou por um 
processo de regulamentação, de forma a disciplinar as operações
internacionais e resguardar os interesses dos agentes de comércio e dos
Estados Nacionais. A evolução da atividade aduaneira, como responsável
pela aplicação de restrições à importação e à exportação de mercadorias e
pela arrecadação de tributos ou direitos aduaneiros, também foi refletida
através de uma evolução legislativa, de forma a assegurar, mediante um
conjunto de normas, uma maior eficácia no cumprimento das funções
aduaneiras4. Remonta-se ao ano de 1687, durante o reinado de Luiz XIV,
na França absolutista, aquele que é considerado como o primeiro código
aduaneiro5. A
3 Cf. BASALDÚA, 1988.
4 Cf. BASALDÚA, 1988.
5 Cf. FÉLIX ALAIS, 2008 e BASALDÚA, 1988.
codificação de 1687 era constituída por cento e sessenta e dois artigos
agrupados em quatorze títulos, com disposições administrativas, penais,
tributárias e processuais, além de apresentar princípios e regras próprias,
refletidas posteriormente em outros dispositivos aduaneiros. Para Horácio
Félix Alais, essa mudança marcou “el comienzo de un sistema destinado a
utilizar a los derechos de importación como un freno a los productos
extranjeros, con el fin de promover y facilitar la producción de los
productos nacionales”6.
Já no século XVIII, o desenvolvimento do comércio internacional
foi um dos pilares da doutrina econômica clássica, a partir da principal
obra de Adam Smith, intitulada “A Riqueza das Nações”, na qual se
defendia a concentração, por parte de cada país, da produção de artigos
cujos custos fossem mais baixos do que em outros países. Com o livre
comércio, importava não a riqueza das nações de forma separadas, mas a
riqueza de todas as nações em conjunto. O comércio irrestrito entre as
nações proporcionaria o crescimento de todos os países7.
David Ricardo, outro autor clássico da Ciência Econômica, em sua
obra “Princípios de Economia Política e Tributação”, publicada
originalmente em 1817, apresentou sua teoria das vantagens
comparativas, fundamentando de forma mais consistente o
desenvolvimento do comércio internacional. Essa teoria centra sua
eficácia nos fatores produtivos e nos custos relativos, de forma que um
país deveria especializar-se exclusivamente na produção de mercadorias
que tivessem abundância e custos relativos favoráveis, importando as
demais mercadorias cujo custo de produção seria desfavorável. Dessa
forma, se produziria naturalmente uma divisão internacional da produção,
através do comércio internacional, permitindo trocas eficientes e rentáveis
a todas as nações participantes8.
Além do modelo ricardiano, o comércio internacional encontra sua
fundamentação na teoria de Heckscher-Ohlin, chamada de teoria das
proporções de fatores, desenvolvida por dois economistas suecos (Eli
Heckscher e Bertil Ohlin, este último recebeu o Prêmio Nobel de
Economia em 1977). Essa teoria fundamenta-se na inter-relação entre as
proporções em que fatores de produção diferentes estão disponíveis em
diferentes países e as proporções em que eles são
6 Cf. FÉLIX ALAIS, 2008.
7 Cf. SMITH, 1996.
8 Cf. RICARDO, 1996.
utilizados na produção de diferentes bens. Com base nessa teoria, um país
tende a exportar bens intensivos nos fatores cuja oferta é abundante9.
Significativa mudança no papel aduaneiro ocorreu no século XX,
no pós- guerra. Com a economia europeia bastante debilitada, o comércio
internacional se tornou sujeito a uma crescente variedade de restrições,
com a implantação de medidas protecionistas que visavam a proteção dos
respectivos mercados internos no reduzido mercado mundial,
prolongando o quadro recessivo das economias e diminuindo ainda mais o
mercado mundial.
Diante desse quadro, as potências aliadas concluíram pela
necessidade de reconstrução da economia mundial, fundando uma nova
ordem econômica baseada em três instituições: o Fundo Monetário
Internacional (FMI), o Banco Internacional de Reconstrução e
Desenvolvimento (BIRD) e a tentativa de criação da Organização
Internacional de Comércio (OIC). Entre as medidas propostas,
encontrava-se aquela de construção de uma nova ordem jurídica que
garantisse a tutela jurisdicional em tribunais internacionais e nacionais.
Em 1947, foi instituído o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio
(General Agreement of Tariffs and Trade - GATT), com o objetivo de
reconstrução do comércio internacional e sua regulamentação.
Apesar de ter sido instituído em caráter provisório, o GATT
colaborou com a liberalização do comércio internacional no pós-guerra.
Entretanto, somente em 01/01/1995, após a Rodada Uruguai de
negociações, foi instituída a Organização Mundial do Comércio (OMC),
como uma organização supranacional, responsável pela regulação do
comércio de mercadorias, serviços e propriedades intelectuais, além da
estruturação de um sistema de solução de controvérsias.
A busca pela simplificação e harmonização dos procedimentos
entre os diferentes países motivou a criação do Conselho de Cooperação
Aduaneira (atual Organização Mundial de Aduanas), em 1952, com o fim
de aumentar a eficácia e a efetividade das administrações aduaneiras de
seus membros. Desde sua criação, a exportação mundial saiu de quase
zero para quase 18 trilhões de dólares em 2011, refletindo uma efetiva
mudança no comércio internacional10. Novos mercados consumidores
foram abertos; empresas transnacionais ocuparam grande parte do
planeta, com produção em diversos continentes; países em
desenvolvimento
9 Cf. KRUGMAN e OBSTFELD, 2010.
passaram a participar deforma mais efetiva do comércio, refletindo uma
pequena parcela de desenvolvimento econômico.
Já na segunda década do século XXI, novos modelos de operações
transnacionais estão sendo desenvolvidos, representando um desafio para
os Estados modernos, tanto no fomento de suas economias, quanto na
regulação das atividades operacionais, como, por exemplo, as cadeias
globais de valores. Nesse modelo de negócio internacional, as empresas
transnacionais fragmentam suas etapas de produção, distribuídas pelo
mundo conforme vantagens de custos, insumos e logística.
Restrições impostas pela administração aduaneira de um país
tendem a reduzir a capacidade deste país de participar dessa rede de
investimento, visto que as empresas transnacionais que participam dessa
cadeia tendem a se instalar em países com menor restrição aduaneira. A
competitividade da operação e, consequentemente, a busca por maior
lucratividade está na possibilidade de se importar insumos com a menor
incidência tarifária, para fabricação e posterior fornecimento de partes,
peças ou bens finais às grandes empresas de cadeias globais. A atividade
aduaneira será determinante para a implantação e o sucesso desse modelo
de comércio internacional em cada país.
A nova economia demanda novos modelos de crescimento
baseados em tecnologia da informação, em nanotecnologia, na automação
e demais conceitos que fazem parte da chamada Quarta Revolução
Industrial, cujo pilar coincide com a abertura comercial internacional.
Ocorre que novas barreiras são impostas ao comércio e ao
desenvolvimento econômico, a partir de medidas protecionistas e de
fechamento ao mercado externo, inclusive aquelas derivadas da crise
fiscal dos Estados. Novas barreiras são impostas dentro dos sistemas
jurídicos nacionais, com reflexos na economia global, como por exemplo
barreiras sanitárias, fitossanitárias, técnicas, de meio-ambiente, dentre
outras, que podem onerar excessivamente os produtos estrangeiros,
podendo até inviabilizar as operações comerciais.
A importância do comércio internacional e as perspectivas para o
futuro foram objeto de estudo de um grupo de trabalho coordenado pelo
então Diretor Geral da
10 Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), a partir de dados
da
Organização Mundial de Comércio (OMC). Disponível em:
<http://www.desenvolvimento.gov.br/arquivos/dwnl_1337952119.xls>. Acesso em: 27 ago. 2012.
http://www.desenvolvimento.gov.br/arquivos/dwnl_1337952119.xls
OMC, Pascal Lamy11, demonstrando as razões pela qual se entende que a
abertura do comércio contribui para o bem-estar social e para o
desenvolvimento. Os pesquisadores concluíram que o comércio e o
investimento encontram-se interligados, incentivando o desenvolvimento
e a criação de empregos, e reduzindo a desigualdade. Por fim, apontaram
a necessidade de estabelecimento de regras e princípios para regular as
complexas estruturas comerciais da atualidade, dentre as quais se encontra
a normativa aduaneira.
1.1.2. Direito Aduaneiro e regulação do comércio internacional
A partir do conhecimento histórico da evolução do comércio
internacional, impõe-se conhecer uma de suas ferramentas regulatórias: o
Direito Aduaneiro. A regulação do comércio internacional pode ser
entendida como o estabelecimento de regras para o funcionamento da
atividade comercial entre os países, direcionando o comportamento dos
agentes econômicos envolvidos nas operações comerciais internacionais e
dos agentes públicos. O Direito Aduaneiro também se encaixa neste
conceito.
Definido por Ricardo Xavier Basaldúa como um conjunto de
normas jurídicas cujo objeto é a regulação do tráfego internacional de
mercadorias12, o Direito Aduaneiro ainda é considerado como uma
disciplina jurídica em desenvolvimento, de caráter multidisciplinar e
intervencionista. Seu objeto de estudo é o comércio internacional,
considerado como seu antecedente, e a relação aduaneira, como seu
consequente13.
A administração aduaneira, responsável pelas atividades
aduaneiras, é normalmente designada como Aduana (customs, douane), e
a repartição pública na qual normalmente ficam lotados os funcionários
aduaneiros é designada como alfândega. Trata-se de um órgão estatal
encarregado de controlar as operações de comércio exterior do país.
Horácio Félix Alais, partindo de uma concepção histórica da
Aduana como uma agência responsável por controlar a entrada e saída de
mercadorias de uma
11 Cf. LAMY, 2013
12 Cf. BASALDÚA, 2011.
13 Cf. CARLUCI, 2001.
região, incluindo a arrecadação de tributos e aplicação de restrições, a
partir de razões de estado, conveniência ou vontade do governante, define
a Aduana como:
el organismo del Estado encargado de aplicar las políticas de comercio exterior
que establezca la autoridad competente, y de efectuar el control relativo a las
prohibiciones de carácter económico y no económico, y eventualmente recaudar
cuando así este previsto, respecto del ingreso o egreso de mercaderías a un
territorio aduanero o desde é, en la medida en que éstas estén afectadas al tráfico
internacional.14
Dada a relevância das atividades aduaneiras e do comércio
internacional, o conhecimento das normas aduaneiras é de vital
importância para o desenvolvimento econômico de cada país,
independentemente de se conferir autonomia a esse ramo do Direito.
Torna-se, então, recomendável sua perfeita delimitação, com
conhecimento e domínio de sua estrutura, funções, princípios e sua
relação com os demais ramos do Direito, especialmente o Direito
Tributário.
1.2. Elementos essenciais do Direito Aduaneiro
Para caracterizarmos uma operação comercial como internacional,
ela deve transpor o limite territorial ou político de um ente soberano. Caso
contrário, o que ocorre é uma operação de comércio interno, onde as
normas aplicadas deverão ser exclusivamente de direito interno. Já
naquelas, a operação comercial sujeita-se às normas de Direito
Internacional Público e Privado. Interessam-nos, no presente estudo, as
normas de Direito Público e, especialmente, as normas de Direito
Aduaneiro, cuja influência do Direito Internacional é de grande
relevância.
Segundo Ricardo Xavier Basaldúa, para denominarmos uma
matéria como aduaneira é indispensável encontrar seus pressupostos
básicos, que são a existência de um território aduaneiro, a existência de
uma mercadoria e sua introdução ou saída, denominada importação e
exportação, respectivamente15.
O primeiro elemento essencial do Direito Aduaneiro é o território.
Não apenas aquele conceito geográfico ou político, mas sua conotação
aduaneira: o território aduaneiro. A Convenção de Quioto Revisada16
define o território aduaneiro como
14 Cf. FÉLIX ALAIS, 2008.
15 Cf. BASALDÚA, 1988.
16 A Convenção Internacional para a simplificação e a harmonização dos Regimes Aduaneiros,
também denominada de Convenção de Quioto Revisada é um instrumento reconhecido pela
sendo o território onde se aplica a legislação aduaneira de uma Parte
Contratante. Trata-se de um território delimitado por uma fronteira
aduaneira.
Diferente do conceito de território político, no qual a soberania é
elemento determinante, no conceito aduaneiro, o território pode estar
compreendido na comunhão de vários entes soberanos, como no caso de
uniões aduaneiras (o exemplo da Comunidade Europeia é o mais forte),
ou mesmo dentro de um território político e geográfico, como nos casos
das zonas francas (exemplo mais conhecido é a Zona Franca de Manaus,
que faz parte do território brasileiro, mas possui um tratamento aduaneiro
especial).
Após diferenciarmos o território aduaneiro do território geográfico
e político, as demais exigências para a caracterização do comércio
internacional devem ser observadas: apenas nos casos em que a operação
comercial é feita transpondo a fronteira do território, no caso aduaneiro, a
operação pode ser caracterizada como uma operação de comércio
exterior, do ponto de vista específicode um país, com sua conotação
aduaneira.
Outro elemento essencial para o Direito Aduaneiro é a mercadoria17.
Considerando o comércio internacional como objeto de estudo do
Direito
Aduaneiro, chega-se à mercadoria, o objeto material da atividade
comercial. A doutrina aduaneira é unânime ao definir mercadoria, para
fins aduaneiros, como todo objeto suscetível de tráfego internacional e
passível de controle18. Nesse conceito, temos como mercadoria não
apenas o objeto sujeito à comercialização, mas uma acepção mais ampla,
como aqueles objetos sujeitos ao tráfego internacional por qualquer outro
motivo.
A individualização da mercadoria, por meio de sua codificação,
permite o controle por parte das autoridades aduaneiras e a imposição de
restrições ao tráfego e a sua tributação. Sem o conhecimento da
mercadoria19 objeto do comércio internacional, a autoridade aduaneira não
poderia exercer sua função.
Por esse motivo, associado à tradição, alguns doutrinadores
defendem que apenas o objeto físico que for passível de controle por parte
da Aduana poderia ser
Organização Mundial das Aduanas (OMA) como um compêndio de práticas aduaneiras ideais e
necessárias para um comércio global legítimo, simplificado e harmonizado.
17 O termo “mercadoria” empregado pelo Decreto-lei nº 37/1966 não tem o escopo de restringir a
incidência do imposto de importação aos bens destinados ao comércio, mas alcança significado
idêntico ao de “produto”. Nesse sentido SOUZA, 1980, LOPES FILHO, 1983, MEIRA, 2002,
FOLLONI, 2005 e TREVISAN, 2008a.
18 Cf. BASALDÚA, 2011, CARRERO, 2009 e FÉLIX ALAIS, 2008.
considerado como bem do comércio internacional, dentro do conceito
estrito de mercadoria20. Esses autores partem da figura histórica do posto
aduaneiro na fronteira, que faz a conferência física das mercadorias que
ultrapassam a fronteira, sem considerar as limitações desse tipo de
controle, e sem considerar a evolução do comércio internacional, que
apresenta outros itens passíveis de comercialização, como por exemplo,
os serviços e os bens intangíveis.
Considerar que a Aduana, na atualidade, tem como objeto apenas a
mercadoria física, por ser a única passível de controle e apreensão, é
limitar sua atuação, restringindo a atuação aduaneira a uma época que já
faz parte da história. O artigo 10 do Código Aduaneiro Argentino, com a
redação dada pela Lei 25.063, define mercadoria como todo objeto
suscetível de ser importado ou exportado, já dentro de um conceito amplo
de mercadoria. A exposição de motivos do referido código expressamente
apontou que todos os objetos passíveis de importação e exportação estão
sujeitos ao controle aduaneiro, incluindo os serviços e os direitos de
propriedade intelectual.
O controle sobre o comércio internacional de serviços e de
intangíveis representa um grande desafio para a Aduana do século XXI, e
que não pode ser ignorado, como uma atividade não-aduaneira. Se,
historicamente, quem sempre efetuou o controle sobre o comércio
internacional, seja com fins arrecadatórios, com fins de aplicação de
restrições ou apenas como atuação do soberano sobre o território, foi a
Aduana, por que então outro órgão seria responsável pelo controle do
comércio internacional de serviços e intangíveis? Apenas porque seu
controle requer novos métodos de fiscalização? A função de controle é
primordialmente e exclusivamente aduaneira, pois o objeto de controle
continua sendo o comércio internacional.
Em 02 de abril de 2012, foi instituída, pelo Decreto nº 7.708, a
Nomenclatura Brasileira de Serviços, Intangíveis e outras Operações que
Produzam Variações no Patrimônio (NBS), disponibilizando, para o
Brasil, um referencial para a classificação de comércio e serviços,
possibilitando sua individualização e, consequentemente, seu controle.
Também entrou em operação, em 1º de agosto de 2012, o Sistema
Integrado de Comércio Exterior de Serviços, Intangíveis e Outras
Operações que Produzam Variações no Patrimônio (SISCOSERV),
viabilizando o controle sobre o
19 Os elementos característicos da mercadoria serão analisados no capítulo 2 do presente trabalho.
20 Cf. BASALDÚA, 2011, p.46, CARRERO, 2009, p.192 e FÉLIX ALAIS, 2008, p.154.
comércio exterior de serviços, por meio de sua medição informatizada e
da geração de dados estatísticos que servirão como orientação para os
mecanismos de apoio ao comércio exterior de serviços.
Conclui-se que a mercadoria, dentro de um conceito amplo (de
tudo aquilo suscetível de ser importado ou exportado), é o objeto principal
do Direito Aduaneiro, sobre o qual incidirá toda a normatização
aduaneira, quando ultrapassar os limites do território aduaneiro.
Por fim, temos os elementos dinâmicos do Direito Aduaneiro: a
importação e a exportação. Sem essas operações comerciais, a
mercadoria não terá relevância para o Direito Aduaneiro. Apenas quando
ocorrem as operações de importação e exportação, em suas diversas
etapas e procedimentos, iniciam-se os fatos que terão repercussão
aduaneira. O movimento da mercadoria, na entrada e saída de um
determinado território aduaneiro, configura esse terceiro elemento
essencial do Direito Aduaneiro.
1.3. Funções da Aduana
1.3.1. Controle aduaneiro: bem jurídico tutelado
Segundo Ricardo Xavier Basaldúa, a função essencial da Aduana,
cuja ausência a descaracterizaria, é o controle que deve ser exercido sobre
as mercadorias objeto do tráfego internacional, ou seja, sobre as
importações ou exportações21. Trata-se do princípio da universalidade do
controle aduaneiro, sem o qual não existiria função aduaneira, que retrata
a soberania do território.
A Convenção de Quioto Revisada define controle aduaneiro como
“o conjunto de medidas tomadas pelas Alfândegas com vista a assegurar a
aplicação da legislação aduaneira”. Para Rosaldo Trevisan, o exercício do
controle aduaneiro sobre as mercadorias procedentes ou destinadas ao
exterior é o papel essencial da Aduana, ou seja, “regular o fluxo de
comércio exterior, estabelecendo incentivos ou restrições, e fiscalizando-
os, para garantir sua correta aplicação”22.
A Convenção de Quioto Revisada prevê, no seu Anexo Geral,
Norma 6.1, que todos os bens que sejam introduzidos no território
aduaneiro ou dele saiam estão
21 Cf. BASALDÚA, 2007.
22 Cf. TREVISAN, 2012.
sujeitos ao controle aduaneiro. O controle pode ser exercido em três
momentos: (i) antes da chegada da mercadoria; (ii) no momento da
apresentação da mercadoria às autoridades aduaneiras; e (iii) após o
desembaraço aduaneiro das mercadorias.
Não se trata de uma verificação absoluta de toda mercadoria
importada ou exportada, visto que tal verificação é efetuada por amostragem,
mas sim a sujeição de todas as mercadorias ao controle, ou seja, a
possibilidade de que, em algum momento, as mercadorias poderão ser
verificadas e as operações efetivamente controladas. “Verificação das
mercadorias” significa a operação pela qual as Alfândegas procedem ao
exame físico das mercadorias a fim de se assegurarem que a sua natureza,
origem, estado, quantidade e valor estão em conformidade com os dados da
declaração de mercadorias, segundo definição da Convenção de Quioto
Revisada.
Podemos considerar o “Controle Aduaneiro” como o bem jurídico
tutelado pelo Direito Aduaneiro, representando o poder soberano do Estado e
seu poder de polícia, atuando na proteção da sociedade e da economia.
Reflete também outra característica do Direito Aduaneiro: a formalidade
requerida nos atos praticados junto à administração aduaneira, não como
mera obrigação acessória e burocrática, mas como medida de controle e
segurança dos atos aduaneiros praticados.
Na normativa brasileira, encontra-se a previsão do controle aduaneiro
no Regulamento Aduaneiro, aprovado pelo Decreto nº 6.759/2009, que
dispõe sobre o exercício da administração aduaneira, compreendendo a
fiscalização e o controle sobre o comércio exterior, essenciais à defesa dos
interesses fazendários nacionais, em todo o território aduaneiro. Também
consta do Regimento Interno da Secretaria da ReceitaFederal do Brasil
(RFB), aprovado pela Portaria MF nº 430, de 9 de outubro de 2017, a
competência da administração tributária federal e aduaneira, bem como a
direção, supervisão, orientação, coordenação e execução dos serviços de
administração, fiscalização e controle aduaneiros. Conforme explicitado no
parágrafo único do artigo 5º da Lei nº 13.464, de 10 de julho de 2017, os
ocupantes do cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil são as
autoridades aduaneiras da União.
Outra clássica função da Aduana, que muitos autores consideram com
autônoma, é a aplicação de restrições e proibições à importação e à
exportação. Preferimos tratá-la dentro da função de controle, como uma
espécie do gênero, na qual a Aduana é utilizada como uma ferramenta da
política econômica do governo.
Essa função aproxima o Direito Aduaneiro do Direito Econômico, como
instrumento de política aduaneira, que define a forma e o grau de
interação comercial do Estado com o resto do mundo, e as prioridades da
política econômica traçadas pelo governo, com base nas demandas
econômicas e sociais do país.
A abertura comercial do país, derivada da globalização e
internacionalização da economia, tende a ser direcionada pela política
econômica, na qual a política aduaneira está incluída, com a definição do
grau de abertura dos setores econômicos que serão impactados,
considerando seus reflexos sociais e econômicos. A implantação de
medidas de protecionismo comercial (proibições e restrições à
importação) é o extremo dessa função aduaneira. Mas há medidas
microeconômicas, como restrições a itens específicos, destinados a
determinados setores que apresentam problemas concorrenciais ou
mesmo de preço, de forma temporária. Tratam-se de medidas aduaneiras
de proteção à economia.
Entre os instrumentos de restrição, destacam-se os direitos
aduaneiros (antidumping e compensatórios) e os contingentes. Os direitos
antidumping e compensatórios visam combater as práticas desleais de
competição internacional em matéria de preços (mercadorias importadas
com preços inferiores aos normais de mercado). Os direitos antidumping
têm por objetivo complementar as quantias a pagar pela importação de
mercadorias. Já os direitos compensatórios atacam o subsídio,
compensando a subvenção ou subsídio concedido pelas autoridades do
país de origem ou de exportação, mesmo que indiretamente. Os
contingentes são instrumentos de restrição aduaneira que fixam um direito
para a importação de uma quantidade limitada de determinadas
mercadorias (volume do contingente), por determinado período.
A atuação da Aduana na proteção da sociedade é encontrada no
estabelecimento e controle de restrições e proibições de importações de
mercadorias que poderiam causar graves prejuízos sociais, à saúde, ao
meio ambiente e à segurança, e também no combate ao tráfico de drogas,
de armas e lavagem de dinheiro.
1.3.2. Tributação aduaneira
A outra função clássica da Aduana é a tributação aduaneira,
mediante a arrecadação e fiscalização dos tributos incidentes sobre as
operações de comércio
exterior. Ricardo Basaldúa23 não a considera como uma função essencial
do Direito Aduaneiro, sendo perfeitamente possível a existência de uma
Aduana sem a imposição tributária.
As denominadas medidas tarifárias representam uma atuação
estatal regulatória por indução, mediante a possibilidade de alteração da
alíquota do Imposto de Importação incidente sobre os produtos
importados, quando necessário para atender aos objetivos da política
econômica nacional, juntamente com a criação de benefícios fiscais e
instituição de regimes aduaneiros especiais24.
Roosevelt Baldomir Sosa assim apresenta a função tributária da
Aduana, com destaque para sua função extrafiscal:
Não incumbe às alfândegas apenas controlar os fluxos internacionais, esse “ir-e-
vir” de veículos, mercadorias e pessoas, desta para aquela nação. É que os Estados
extraem dos fenômenos de ingresso e saída de mercadorias consequências
econômico-tributárias, na forma de imposições fiscais, a cujo teor se pratica,
virtualmente, na política tributária de Comércio Exterior. Assim, pode-se tributar a
importação ou a exportação de mercadorias, bens ou serviços, visando arrecadar
recursos financeiros para o Erário, o que se verifica especialmente naquelas
economias ainda sustentadas por atividades primárias, as chamadas economias
agrícolas. Mas também pode-se taxar ou desonerar essas importações ou
exportações em função de estimular ou desestimular certa atividade econômica,
através de um direcionamento da política tributária de Comércio Exterior, que
conhecemos como função extrafiscal (não arrecadatória) do tributo. [...] O grau de
desenvolvimento econômico relativo é que dita a política de Comércio Exterior,
inscrevendo-se, nesse escopo, o equilíbrio das balanças comercial e de pagamentos.
É através da tributação aduaneira, ou de Comércio Exterior, que a extrafiscalidade
se materializa como função de política econômica, sendo esta uma das
características da atividade alfandegária.25
Os impostos extrafiscais são aqueles previstos na ordem
constitucional cuja função principal não é a obtenção de recursos ao
erário público, mas servir como instrumento de política social e
econômica, na qual também se inserem as políticas de comércio exterior.
Claro está que os impostos extrafiscais não perdem seu caráter tributário:
continuam sendo tributos. Entretanto, a finalidade de sua instituição e
regulação não é, necessariamente, arrecadação de recursos ao erário
público, mas intervenção estatal na vida econômica e social da nação.
A tributação aduaneira será analisada em maior profundidade na
Parte II do presente trabalho.
23 Cf. BASALDÚA, 1988.
24 Os Regimes Aduaneiros Especiais serão analisados no capítulo 9 do presente trabalho.
1.4. Direito Aduaneiro no ordenamento jurídico brasileiro
1.4.1. Previsão Constitucional das atividades aduaneiras
A Constituição de 1891 já estabelecia a competência da União para
decretar impostos sobre a importação de bens de procedência estrangeira
e a criação e manutenção de alfândegas. Era a maior fonte de receitas
públicas, refletindo a falta de mercado interno consolidado e a finalidade
arrecadatória dos tributos aduaneiros comum à época. A carta
constitucional também determinava que competia ao Congresso Nacional
estabelecer a regulação do comércio internacional, o alfandegamento de
portos, a criação ou supressão de entrepostos, e a legislação sobre a
navegação dos rios que banhassem mais de um Estado ou se estendessem
a territórios estrangeiros.
A Constituição Federal de 1934 estabelecia a competência
privativa da União para criar e manter alfândegas e entrepostos, legislar
sobre comércio exterior e decretar impostos sobre a importação de
mercadorias de procedência estrangeira.
A Constituição Federal de 1937, por sua vez, manteve a
competência privativa da União para criar e manter alfândegas e
entrepostos, prover aos serviços da polícia marítima e portuária, e legislar
sobre comércio exterior, além do poder para decretar impostos sobre a
importação de mercadorias de procedência estrangeira.
Já a Constituição Federal de 1946 manteve a competência da
União para legislar sobre comércio exterior e decretar impostos sobre
importação de mercadorias de procedência estrangeira.
A Constituição Federal de 1967, com a redação dada pela emenda
nº 1 de 1969, estabelecia a competência da União para legislar sobre o
comércio exterior e instituir imposto sobre a importação de produtos
estrangeiros (com a possibilidade de alterar suas alíquotas ou suas bases
de cálculo) e sobre a exportação. Também previa a possibilidade de
aplicação da pena de perdimento de bens por danos causados ao erário.
25 Cf. SOSA, 1996.
A Constituição Federal de 1988 determina a competência privativa da
União para legislar sobre o comércio exterior e para instituir o imposto de
importação sobre produtos estrangeiros e de exportação. Também se
relaciona à matéria aduaneirao artigo 170 da Constituição de 1988, que
estabelece os princípios gerais da atividade econômica, na qual a atividade
aduaneira também está inserida.
Entretanto, o artigo que reproduz toda a preocupação do constituinte
com o Direito Aduaneiro é o artigo 237, com a expressa referência ao
Controle Aduaneiro, merecendo sua transcrição integral nesse texto, verbis:
“A fiscalização e o controle sobre o comércio exterior, essenciais à defesa
dos interesses fazendários nacionais, serão exercidos pelo Ministério da
Fazenda”.
A extensão do conteúdo do referido artigo não é destacada por nossos
doutrinadores brasileiros, mas mereceu atenção do Supremo Tribunal
Federal, que analisou seu conteúdo e alcance.
No Agravo Regimental em Suspensão de Segurança nº 621-6, em que
se discutia a restrição imposta por ato infralegal à restrição de importação de
veículos usados, o Ministro relator Octavio Gallotti afirmou que a
competência de fiscalização e controle do artigo 237 da Constituição Federal
é uma competência normativa que não poderia ser contrastada pelo princípio
da reserva legal. Para o ministro, o artigo
237 claramente conferiu ao Poder Executivo, não ao Poder Legislativo, a
competência para a fiscalização e o controle sobre o comércio exterior,
incluindo, nesse conceito, a competência para editar normas.
No Recurso Extraordinário nº 203954-3, no qual também se discutia a
restrição imposta por ato infralegal à importação de veículos usados, o
Ministro relator Ilmar Galvão afirmou que, além da atribuição expressa ao
Ministério da Fazenda relativa à fiscalização e ao controle sobre o comércio
exterior, o artigo 237 da Constituição Federal considerou tais funções como
“essenciais à defesa dos interesses fazendários nacionais”.
O Ministro relator destacou em seu voto a proteção à economia
nacional efetuada pela edição do ato administrativo que vedou a importação
de bens de consumo usados, considerados como lesivos ao interesse público,
como uma legítima medida de política econômica. O Ministro Ilmar Galvão
interpretou o dispositivo constitucional em consonância com a função
primordial da Aduana: o controle aduaneiro, que visa a proteção da economia
e da sociedade, de acordo com a política econômica determinada pelo
Governo Federal. O destaque dado pelo
constituinte ao controle aduaneiro, essencial à defesa dos interesses
fazendários nacionais, mereceu a devida consideração do Ministro Ilmar
Galvão.
No referido julgamento, o Ministro Maurício Corrêa, que
acompanhou o voto do relator, destacou a autorização constitucional para
a edição de normas com vistas ao controle aduaneiro, de forma a impedir
o ingresso de produtos no território nacional, até por Portaria do Ministro
da Fazenda, sem a necessidade de lei autorizativa. No mesmo sentido,
votou o Ministro Carlos Velloso, afirmando ser desnecessária a edição de
lei que o autorize, por entender que a competência do Ministério da
Fazenda para proibir decorria diretamente da Constituição.
Já o Ministro Celso de Mello entendeu que a autoridade e a
eficácia da norma infralegal em discussão era indiscutivelmente revestida
do mais elevado grau de positividade jurídica em nosso sistema
normativo: o próprio texto da Constituição da República. Para o Ministro
Celso de Mello,
permite asserir que a própria Constituição da República outorgou às
autoridades administrativas do Ministério da Fazenda, em norma atributiva
de poderes, a competência para o exercício da fiscalização e do controle
sobre o comércio exterior, viabilizando, desse modo, com todos os meios
instrumentais necessários à sua colimação, o desempenho de funções
qualificadas pelo ordenamento positivo como essenciais à defesa dos
interesses fazendários nacionais.26
O Ministro finaliza seu voto afirmando que
o exercício do poder outorgado pela Carta Política ao Ministério da
Fazenda (art. 237) constitui fator de concretização dos objetivos
essencialmente extrafiscais que qualificam a prática da competência
federal, em sede de comércio exterior [...] numa perspectiva de ordem
estritamente extrafiscal, que se submeta à discrição governamental a
indicação – sempre feita em caráter impessoal e em bases racionais e
objetivas – dos bens insuscetíveis de importação, por assumir a respectiva
internação em território brasileiro, em dado momento histórico, um caráter
potencialmente danoso à economia nacional. [...]
Portanto, conclui-se que a Constituição Federal determina que o
controle aduaneiro é essencial à defesa dos interesses nacionais,
destacando a importância desse bem jurídico tutelado pelo Direito
Aduaneiro, sendo determinante para a análise de todas as normas
infraconstitucionais e operações de comércio exterior brasileiro, por
expressa determinação constitucional.
26 Cf. RE 203954, Relator Ministro Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, julgado em 20/11/1996, DJ
07/02/1997.
1.4.2. Histórico da Legislação Aduaneira
O levantamento histórico da legislação aduaneira brasileira foi
objeto de um projeto da Secretaria da Receita Federal do Brasil intitulado
“Memória da Receita Federal”, cujo estudo sobre a Evolução do Sistema
Aduaneiro27 ficou a cargo de José Eduardo Pimentel de Godoy, por
ocasião da comemoração dos 200 anos da alfândega brasileira.
Outro completo estudo sobre os aspectos históricos do sistema
aduaneiro foi empreendido por Rosaldo Trevisan, em sua dissertação de
mestrado intitulada “Atuação estatal no comércio exterior, em seus
aspectos tributário e aduaneiro”28.
Trevisan destaca como marco inicial da Aduana brasileira a
segunda expedição repressiva de Cristóvan Jaques, em 1526, com o
objetivo de combater o contrabando em terras brasileiras29. Outros dois
marcos ocorreram no sistema aduaneiro brasileiro: a criação da Alfândega
do Rio de Janeiro, em 1566, e a outorga do Foral da Alfândega Grande de
Lisboa, em 15/10/1587, modelo de toda a regulamentação aduaneira
posterior.
Apenas em 25/4/1832 foi editado o Regulamento Geral das
Alfândegas, o primeiro Regulamento Aduaneiro brasileiro, mandado pôr
em execução pelo Decreto nº 160, de 16/07/1832, publicado em
31/12/1832.
Posteriormente, foram publicados os Regulamentos das
Alfândegas de 1836 e 1860, e alterações de 1876 produzidas pelo Decreto
nº 6.272. Destaca-se, nesse período, o estabelecimento de uma nova tarifa
aduaneira, em 1845, pelo Ministro da Fazenda Alves Branco, com viés
protecionista, que, apesar de sua curta duração, constituiu um marco na
história econômica do Brasil.
Godoy relata que um funcionário aduaneiro, para seu uso pessoal,
efetuou a consolidação da legislação aduaneira, já complexa e retalhada
em diversos dispositivos, cujo resultado foi denominado “Consolidação
das Leis das Alfândegas e Mesas de Rendas” e adotado pelo governo.
27 O referido estudo encontra-se no sitio da Secretaria da Receita Federal do Brasil. Disponível em
<http://idg.receita.fazenda.gov.br/sobre/institucional/memoria/aduana/evolucao-do-
sistema- aduaneiro>. Acesso em 30/06/2018.
28 Cf. TREVISAN, 2008a.
http://idg.receita.fazenda.gov.br/sobre/institucional/memoria/aduana/evolucao-do-sistema-
29 Cf. TREVISAN, 2008b.
Posteriormente, essa consolidação foi atualizada e publicada, em
1894, com o nome de Nova Consolidação das Leis das Alfândegas e
Mesas de Rendas, a famosa N.C.L.A.M.A.R., o diploma aduaneiro mais
importante da história brasileira, que permaneceu vigente até 1966, ano de
publicação do Decreto-lei nº 37, de 18/11/1966, a nossa “Lei Aduaneira”,
conforme denominação sugerida por Rosaldo Trevisan.
O Decreto-lei nº 37/66 entrou em vigor em 01/01/1967, na mesma
data que o Código Tributário Nacional, e procurou consolidar as normas
aduaneiras existentes à época, embora expressamente restrita ao Imposto
de Importação e à organização dos serviços aduaneiros. Em suas “outras
providências”, tratou também de diversos dispositivos inseridos na
temática aduaneira, como o despacho aduaneiro e o controle aduaneiro.
As normas procedimentais ficariam para sua regulamentação posterior.
Outras normas aduaneiras de destaqueforam editadas
posteriormente ao Decreto-lei nº 37/66: o Decreto-lei nº 288/67, que
dispõe sobre a Zona Franca de Manaus, o Decreto-lei nº 1.455/76, que
dispõe sobre bagagem, isenções, entreposto aduaneiro, aplicação da pena
de perdimento e destinação de bens apreendidos pela Aduana, e o
Decreto-lei nº 1.578/77, que dispõe sobre o Imposto de Exportação.
Em 1968, foi criada a Secretaria da Receita Federal, órgão que
passou a administrar a Aduana brasileira.
Apenas em 1985, com a edição do Decreto nº 91.030, entrou em
vigor o Regulamento Aduaneiro, consolidando as normas aduaneiras e
regulamentando o Decreto-lei nº 37/66. Posteriormente, foram editados os
Regulamentos Aduaneiros de 2002 (Decreto nº 4.543, de 26/12/2002) e
de 2009 (Decreto nº 6.759, de 05/02/2009), atualmente em vigor.
1.4.3. Tratados e Convenções internacionais
Em função de sua natureza, as normas aduaneiras sofrem
influência de uma série de regras derivadas de tratados e convenções
internacionais, aprovadas em organismos internacionais30: Organização
Mundial do Comércio, Organização Mundial de Aduanas (OMA) e
Mercado Comum do Sul (MERCOSUL).
30 Cf. TREVISAN, 2018.
O já citado GATT-1994, resultado da Rodada Uruguai de
Negociações Comerciais Multilaterais, foi internalizado no Brasil, por
meio do Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto
nº 1.355, de 1994, integrando a legislação brasileira. Entre as regras do
GATT-1994 e seus anexos, destacam-se as que disciplinam os seguintes
temas: (i) consolidação das alíquotas do Imposto de Importação; (ii) regra
do tratamento de nação mais favorecida; (iii) regra do tratamento
nacional; (iv) valoração aduaneira; e (v) regras de origem.
Já em relação à OMA, o Brasil internalizou sua adesão através do
Decreto Legislativo nº 129, de 1980, promulgado pelo Decreto nº
85.801/1981. Note-se que, à época, a OMA era conhecida somente como
Conselho de Cooperação Aduaneira.
Sob a égide da OMA foram celebradas dezesseis convenções
internacionais, destacando-se as seguintes: (i) Convenção sobre o Sistema
Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias (SH); (ii)
Convenção Internacional sobre a Simplificação e Harmonização dos
Procedimentos Aduaneiros (Convenção de Quioto); (iii) Convenção sobre
Admissão Temporária (Convenção de Istambul). O Brasil é signatário da
Convenção sobre o Sistema Harmonizado, aprovada pelo Decreto
Legislativo nº 71, de 11/10/1988, promulgada pelo Decreto nº 97.409, de
23/12/1988, e da Convenção de Istambul, internalizada em 6/08/2010,
pelo Decreto Legislativo nº 563, promulgado pelo Decreto nº 7.545, de
2/08/201131. Apesar de não ser signatário da Convenção de Quioto, o
Brasil tem procurado se adequar às suas normas.
1.4.4. Código Aduaneiro do Mercosul
O MERCOSUL foi criado a partir da assinatura do Tratado de
Assunção, em
26 de março de 1991, pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, cujo
objetivo principal era a integração dos quatro Estados Partes por meio da
livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, do estabelecimento
de uma Tarifa Externa Comum (TEC), da adoção de uma política
comercial comum, da coordenação de políticas macroeconômicas e
setoriais, e da harmonização de legislações nas áreas pertinentes. Em
dezembro de 1994, foi aprovado o Protocolo de Ouro Preto, que
31 Do conteúdo adicional à Convenção, composto por 13 anexos, o Brasil internalizou apenas os
Anexos A, B.1, B.2, B.5 e B.6.
estabeleceu a estrutura institucional do MERCOSUL, dotando-o de
personalidade jurídica internacional.
Com o objetivo de avançar no processo de integração regional com
a adoção de uma legislação aduaneira comum, foi aprovado, em 2 de
agosto de 2010, pelo Conselho do Mercado Comum, através da Decisão
nº 27, em San Juan, Argentina, o Código Aduaneiro do Mercosul (CAM).
Essa codificação permitirá uma uniformização de conceitos e o
disciplinamento dos institutos que regulam a matéria aduaneira no âmbito
do MERCOSUL, tendo sido elaborada no contexto das normas e das
realidades locais e regionais, de diretrizes previamente esboçadas,
tomando por base os principais atos legais aduaneiros dos Estados Partes
e considerando as disposições do Código Aduaneiro Europeu, bem como
a Convenção de Quioto Revisada.
O CAM sofreu correções formais que resultaram na Fé de Erratas
de 3 de março de 2011 e, atualmente, está em processo de internalização
aos ordenamentos jurídicos dos Estados Partes. Em 26 de abril de 2018, a
Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal
aprovou o texto do CAM, encaminhando o Projeto de Decreto Legislativo
(SF) n° 31/2018 ao Plenário do Senado. Para sua entrada em vigor, o
Código Aduaneiro do Mercosul terá que ser aprovado pelos Parlamentos
dos quatro países, sendo que, até o mês de junho de 2018, apenas o
parlamento argentino havia finalizado o processo.
1.5. Direito Aduaneiro e sua relação com o Direito Tributário e o Direito
Econômico
O Direito Aduaneiro, considerado como um conjunto de normas
que regulam o tráfego internacional de mercadorias32, ou como um
conjunto de proposições jurídico-normativas que disciplinam as relações
entre a Aduana e os intervenientes nas operações de comércio exterior33,
integra-se com uma pluralidade de normas que podem ser classificadas
como tributárias, penais, administrativas, comerciais, processuais e
constitucionais, de acordo com o objetivo da classificação.
Considerando as funções principais da Aduana, a regulação do
tráfego internacional de mercadorias pode ser classificada de diferentes
maneiras: (i) quando a regulação se dá através do controle aduaneiro,
estaremos no campo do
32 Cf. BASALDÚA, 2011.
33 Cf. TREVISAN, 2008a.
Direito Aduaneiro Administrativo; (ii) quando a regulação ocorre através
da aplicação de restrições, estaremos no campo do Direito Aduaneiro
Econômico; (iii) quando a regulação ocorre através da tributação,
estaremos no campo do Direito Aduaneiro Tributário, ou do Direito
Tributário Aduaneiro, dependendo da perspectiva que se adote.
O Direito Econômico trata da normatização das atividades
econômicas, praticadas pelos agentes econômicos, que necessitam de
regulação, seja para proteger os direitos individuais, seja para proteger os
interesses coletivos, através da atuação estatal como agente regulador ou
interventor direto nas atividades econômicas. A função aduaneira de
aplicação de restrições, assim como as medidas de facilitação comercial,
insere-se também no campo de competência do Direito Econômico, com
sujeição aos princípios da Constituição Econômica (artigo 170, da
Constituição Federal de 1988). Os Regimes Aduaneiros Especiais
também se enquadram dentro do conceito da regulação econômica, como
instrumento de intervenção do Estado na economia, na forma de indução,
dentro do campo de estudo do Direito Econômico34.
A primazia do caráter regulatório da tributação aduaneira, além
dos institutos e princípios próprios, permite-nos direcionar nossa
classificação para o Direito Aduaneiro Tributário. Regina Helena Costa,
em seu estudo sobre a existência de um Direito Aduaneiro, destaca a
extrafiscalidade como o ponto diferenciador entre as disciplinas:
não há que confundir o Direito Aduaneiro com o Direito Tributário, na sua
porção disciplinadora dos tributos sobre o comércio exterior, uma vez que as
relações jurídicas compreendidas no primeiro são de natureza necessariamente
administrativa, ainda que, por vezes, voltadas à realização de fins tributários. O
caráter regulatório, típico do Direito Aduaneiro, faz exsurgir o ponto de toque
entre essa disciplina e o Direito Tributário: a extrafiscalidade.35
Conclui-se, portanto, que o elemento diferenciador entre o Direito
Aduaneiro, na sua vertente de tributação aduaneira, e o Direito Tributário,
está na finalidade da norma de tributação, conjugando com campo de
estudo também do Direito Econômico. A relação entre esses ramos do
Direito é de interseção. A aplicabilidade de princípios gerais tributários às
normas aduaneiras será determinanteapenas
34 Vide capítulo 9 do presente trabalho.
35 Cf. COSTA, 2004.
quando a questão se referir aos tributos aduaneiros, a partir da análise
individualizada do caso e respeitando a normativa aduaneira, visto que o
Direito Aduaneiro é um ramo reconhecidamente especializado, com
particularidades, exceções e institutos próprios.
2. ELEMENTOS CARACTERÍSTICOS DA MERCADORIA: CLASSIFICAÇÃO
FISCAL, ORIGEM E VALOR
2.1. Classificação fiscal das mercadorias
O desenvolvimento do comércio internacional requer a existência
de uma denominação padronizada de cada mercadoria a ser negociada, de
forma a evitar problemas de linguagem e significado nas transações entre
pessoas e empresas de países e costumes distintos. A segurança das
relações comerciais internacionais pressupõe o pleno entendimento entre
as partes contratantes, que exige o uso de terminologias uniformes e de
dados precisos e comparáveis, evitando problemas de ordem técnica e
mesmo divergências comerciais acerca dos produtos negociados. A busca
por uma linguagem padronizada e harmônica direcionou o mercado e os
organismos internacionais ligados ao comércio ao desenvolvimento de
uma nomenclatura comum, composta por um conjunto de códigos que
individualizam cada mercadoria negociada, de forma a facilitar o
comércio internacional.
O uso de uma nomenclatura36 pressupõe a existência de uma
codificação para cada mercadoria. Entretanto, a codificação da
mercadoria, ou sua classificação numa tabela de códigos, só é possível a
partir de sua identificação plena e conhecimento de suas características
intrínsecas e extrínsecas37. O estudo científico da mercadoria e de sua
utilização é denominado merceologia38, e a plena identificação da
mercadoria é conhecida como “regra zero” de classificação. Ou seja,
nenhuma classificação é possível sem o pleno conhecimento da
mercadoria submetida à análise. Descumprir tal regra certamente levará o
intérprete ao erro, que resultará em prejuízos ao controle aduaneiro, à
identificação pautal e à correta quantificação do imposto devido39, além
de prejuízos aos controles estatísticos de comércio exterior e,
possivelmente, de divergências nas transações comerciais.
36 Cesar Dalston assim define “nomenclatura”: “Em termos absolutamente gerais, nomenclatura
pode ser definida como o conjunto de um ou mais tipos de objetos, logicamente conectados, criado
e mantido por regras específicas, cujo intento é uniformizar e facilitar a comunicação num dado
campo de atividade ou de conhecimento” (DALSTON, 2005b, p.21).
37 Para Luiz Roberto Domingo, “[é] inegável que a classificação de mercadorias dependerá sempre
da exata definição do produto submetido à análise, ou seja, da definição e descrição de suas
características intrínsecas e extrínsecas, e por vezes, até de sua destinação, função e/ou forma de
venda (a varejo, sortido, forma da embalagem, quantidade, etc.)” (DOMINGO, 2017, p.564).
38 Para Cesar Dalston , “[m]erceologia é a compreensão científica do que é uma mercadoria e
como a mesma deve ser utilizada” (DALSTON, 2005a, p.52).
39 Domingo destaca a importância da plena identificação da mercadoria e da atividade de se
classificar a mercadoria, considerada como uma típica atividade do jurista: “O cumprimento da
Regra Zero nada mais é que a obtenção, em linguagem competente, da descrição do fato
imponível. A atividade do agente classificador se inicia apenas quando o suporte fático for
bastante e suficiente
César Dalston nos ensina que a classificação de mercadoria é uma
ciência40 factual social, que consiste em inserir o objeto merceológico
específico anteriormente identificado através da merceologia, numa
nomenclatura41. Trata-se de uma tarefa complexa, que pressupõe o
conhecimento pleno da mercadoria, bem como de regras de classificação
contidas nas normas de regência de cada país. Para José Lence Carluci, a
atividade de se classificar uma mercadoria exige a aplicação de regras
lógicas, regras legais e regras técnicas:
As primeiras são regras de lógica formal, que comandam o ato intelectual da razão
e do raciocínio humano onde as palavras, os termos, os conceitos e definições, a
extensão (denotação) e a compreensão (conotação), o gênero e a espécie, a
essencialidade e a funcionalidade, são componentes indispensáveis ao processo
silogístico.
As regras legais constituem a vontade da nação representada e manifestada pelos
seus legisladores e constam de normas que orientam o classificador na procura da
posição mais adequada da mercadoria na pauta ou tarifa.
As regras técnicas, abundantes, tendo em vista a natureza física das mercadorias, a
complexidade tecnológica, as propriedades físico/químicas, os processos de
industrialização, dimensões, funções específicas etc., ajudam o classificador na
identificação da mercadoria a classificar, consubstanciando- se nas Notas
Explicativas (NESH), nos Regulamentos Técnicos e nos
Catálogos e manuais técnicos42.
2.1.1. Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias
A Nomenclatura do Sistema Harmonizado (SH) foi aprovada pela
Convenção Internacional sobre o Sistema Harmonizado de Designação e
Codificação de Mercadorias em 1983, pelo Conselho de Cooperação
Aduaneira, também conhecido como Organização Mundial das Aduanas
(OMA). Anteriormente, já havia a
para deflagrar a subsunção normativa. Nas posições do SH subsiste uma descrição de uma
mercadoria, que deve ser preenchida com o conceito do fato (análise física da mercadoria) bastante
e suficiente para a posição correta. Trata-se de atividade típica do jurista, ainda que desempenhada
com auxílio técnico de outros profissionais das respectivas ciências ligadas às diversas
mercadorias” (DOMINGO, 2017, p.566).
40 O autor apresenta os seguintes fundamentos para elevar o processo de classificação ao patamar
de ciência: “A Classificação de Mercadorias tem três elementos centrais, isto é, princípios
próprios, submete-se ao método científico e possui técnicas particulares que, em conjunto, forma
seu método de investigação e objeto merceológico, também dito mercadoria, cujo domínio é a
produção econômica primária e secundária. Esses mencionados elementos nos levam a acreditar
que a Classificação de Mercadorias não deve ser vista como um simples processo alocativo de
objetos merceológicos em famílias, gêneros e espécies de mercadorias. Ao contrário, a
Classificação de Mercadorias por possuir princípios próprios, métodos e domínio bem delimitado,
onde reside o objeto merceológico individualizado e conhecido, deve ser vista como uma ciência
factual ou ciência que trabalha a partir de uma conjugação de fatos” (DALSTON, 2005b, p.23).
41 Cf. DALSTON, 2015a, p.81.
42 CARLUCI, 2001, p.445-446.
Nomenclatura Aduaneira de Bruxelas (NAB), alterada para Nomenclatura
do Conselho de Cooperação Aduaneira (NCCA).
Como o próprio nome já indica, trata-se de uma nomenclatura que
procura tratar, de forma harmônica e sistemática, a designação e
codificação de mercadorias, por meio de posições, subposições e
respectivos códigos numéricos, agrupados em capítulos e seções, de notas
de Seção, de Capítulo e de Subposição, juntamente com as Regras Gerais
para a Interpretação do Sistema Harmonizado43.
O Sistema Harmonizado é organizado em 96 Capítulos que se
agrupam em 21 Seções. Sua sequência lógica considera os produtos
básicos (menor intervenção humana) nos primeiros capítulos até os
últimos capítulos, nos quais constam os produtos que possuem quase todo
seu valor agregado na intervenção humana (objetos de arte, por
exemplo)44.
A Nomenclatura do Sistema Harmonizado é o anexo à referida
Convenção, que foi assinada pelo Brasil em 31/10/1986, aprovada pelo
Decreto-Legislativo nº 71/1988 e promulgada pelo Decreto nº
97.409/1988, vigendo em nosso país a partir de 1º de janeiro de 1989,
com utilização obrigatória nas classificações fiscais.
2.1.2. Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) e a Tarifa Externa Comum
(TEC)
O Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) foi introduzido no
ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto Legislativo nº 197, de25 de
setembro de 1991, complementado pelo Decreto nº 350, de 21 de
novembro de 1991, e foi instituído com o objetivo de se criar um mercado
comum com livre circulação de bens, serviços, trabalhadores e capital,
pela redução das barreiras tarifárias e não- tarifárias, além da adoção de
uma política comercial uniforme e a adoção de uma tarifa externa comum.
A Tarifa Externa Comum (TEC) foi implantada no Brasil pelo
Decreto 1.343, de 23 de dezembro de 1994, com alterações posteriores,
tendo como base a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM). A TEC
dispõe sobre as alíquotas do Imposto de Importação a serem aplicadas nas
operações de importação, de forma harmônica entre os países integrantes
do bloco, com a correspondência entre cada código (item da
nomenclatura) e sua alíquota. O Acordo prevê também que as
43 Vide item 2.1.3.1.
44 Vide item 2.1.2.1.
operações realizadas entre os países do bloco têm tarifas aduaneiras
nulas, exceto
nas operações relativas a determinadas mercadorias contidas numa lista
predeterminada pelos países, denominada de “lista de exceção”. A NCM é
utilizada em nosso país tanto para fins tributários quanto para fins
administrativos/aduaneiros. A NCM utiliza-se da estrutura do Sistema
Harmonizado de Designação e de Codificação de Mercadorias, com o
acréscimo de mais 2 (dois) dígitos à direita. O Código NCM contém
duas partes: (i) parte internacional = 6 primeiros dígitos (código
SH); e (ii) parte regional = 2 últimos dígitos (código Mercosul).
SSSS.SS.MM
[SS] Capítulo
[SSSS] Posição
[SSSS.S] Subposição de 1º nível
[SSSS.SS] Subposição de 2º nível
[SSSS.SS.M] Item
[SSSS.SS.MM] Subitem
A leitura do código NCM sempre deve ser feita da esquerda para a
direita: os dois primeiros algarismos equivalem ao capítulo da NCM; os
dois algarismos subsequentes equivalem à posição dentro do capítulo. Para
facilitar o entendimento, passaremos a demonstrar o código que identifica
a mercadoria “sardinhas picadas” na NCM:
1. Inicialmente procuramos no Sumário da NCM em qual capítulo
(os 2 primeiros dígitos) o produto poderia se encaixar, no caso o
capítulo 16, que leva o título “preparações de carne, de peixes ou
de crustáceos, de moluscos ou de outros invertebrados aquáticos”.
Como “sardinhas picadas” é uma preparação de peixe,
selecionamos tal capítulo.
2. Em seguida devemos identificar as posições (3º e 4º dígito)
possíveis dentro capítulo 16:
16.01 Enchidos e produtos semelhantes, de carne, de miudezas ou de
sangue; preparações alimentícias à base de tais produtos.
16.02 Outras preparações e conservas de carne, de miudezas ou de sangue.
16.03 Extratos e sucos de carne, de peixes ou de crustáceos, de moluscos ou de
outros invertebrados aquáticos.
16.04 Preparações e conservas de peixes; caviar e seus sucedâneos
preparados a partir de ovas de peixe.
16.05 Crustáceos, moluscos e outros invertebrados aquáticos, preparados
ou
em conservas.
Selecionamos a posição 04 do capítulo 16, por se referir a
preparações e conservas de peixe. Para simplificar, podemos
denominar “posição 1604”.
3. Uma posição dentro de um capítulo pode ou não ser
desdobrada (dividida): quando a posição não for desdobrada, após
os 4 primeiros dígitos haverá o número zero (ex:1601.00); quando
houver o desdobramento, depois dos 4 primeiros dígitos haverá
um dígito diferente de zero.
4. Na sequência, devemos identificar a subposição de 1º nível (o 5º
dígito). Para tanto, devemos relacionar as subposições possíveis:
1604.1 Peixes inteiros ou em pedaços, exceto peixes
picados:
1604.2 Outras preparações e conservas de peixes
1604.3 Caviar e seus sucedâneos:
Selecionamos a subposição 1604.2, por se tratar de outras
preparações de peixes. Note-se que a subposição 1604.1, apesar
de se referir a peixes, expressamente excluir os peixes picados.
4. O segundo desdobramento rende uma subposição de 2º Nível.
Entretanto, no caso em análise, o 6º dígito é “zero”, o que
significa que a subposição de 1º nível não foi desdobrada:
1604.20.
5. Para identificarmos os itens e subitens da parte regional do
código NCM (7º e 8º dígito), seguiremos a mesma lógica anterior.
Para o item, veremos as possibilidades da nomenclatura:
1604.20 Outras preparações e conservas de
peixes
1604.20.10 De atuns
1604.20.20 De bonito-listrado
1604.20.30 De sardinhas ou de anchoveta
1604.20.90 Outras
O item correto é o 1604.20.3, por se tratar de sardinhas. Note-se
que não houve desdobramento do item em subitem, visto que o 8º
dígito é “zero”. Caso não fosse, o procedimento seria o mesmo
das etapas anteriores. Portanto, a posição na NCM para a
mercadoria “sardinhas picadas” é o código 1604.20.30.
Uma leitura desatenta do intérprete poderia levá-lo a classificar a
mercadoria no código 1604.13.10, cujo texto é “sardinhas”. Entretanto,
para classificar a mercadoria neste código a mesma não poderia ser “peixe
picado”, conforme o texto
da subposição de 1º nível 1604.1. Ou seja, antes de chegar no código
final, o intérprete deve passar por cada etapa do processo, sendo temerário
tentar classificar exclusivamente pelo texto final do código, sem passar
pelos textos das posições, subposições e itens.
2.1.2.1. Lista das Seções e Capítulos45
Transcrevemos o sumário da Nomenclatura Comum do Mercosul,
com base no Sistema Harmonizado, que deverá ser consultado após a
identificação plena da mercadoria, para fins de início do processo
classificatório da mercadoria46:
SEÇÃO I - ANIMAIS VIVOS E PRODUTOS DO REINO ANIMAL
01 Animais vivos.
02 Carnes e miudezas, comestíveis.
03 Peixes e crustáceos, moluscos e outros invertebrados aquáticos.
04 Leite e lacticínios; ovos de aves; mel natural; produtos comestíveis de origem
animal, não especificados nem compreendidos noutros Capítulos.
05 Outros produtos de origem animal, não especificados nem compreendidos
noutros Capítulos.
SEÇÃO II - PRODUTOS DO REINO VEGETAL
06 Plantas vivas e produtos de floricultura.
07 Produtos hortícolas, plantas, raízes e tubérculos, comestíveis.
08 Fruta; cascas de citros (citrinos*) e de melões.
09 Café, chá, mate e especiarias.
10 Cereais.
11 Produtos da indústria de moagem; malte; amidos e féculas; inulina; glúten de
trigo.
12 Sementes e frutos oleaginosos; grãos, sementes e frutos diversos; plantas
industriais ou medicinais; palhas e forragens.
13 Gomas, resinas e outros sucos e extratos vegetais.
14 Matérias para entrançar e outros produtos de origem vegetal,
não especificados nem compreendidos noutros Capítulos.
SEÇÃO III - GORDURAS E ÓLEOS ANIMAIS OU VEGETAIS; PRODUTOS DA SUA
DISSOCIAÇÃO; GORDURAS ALIMENTÍCIAS ELABORADAS; CERAS DE
ORIGEM ANIMAL OU VEGETAL
15 Gorduras e óleos animais ou vegetais; produtos da sua dissociação; gorduras
alimentícias elaboradas; ceras de origem animal ou vegetal.
SEÇÃO IV - PRODUTOS DAS INDÚSTRIAS ALIMENTARES; BEBIDAS, LÍQUIDOS
ALCOÓLICOS E VINAGRES; TABACO E SEUS SUCEDÂNEOS
MANUFATURADOS
45 NOMENCLATURA COMUM DO MERCOSUL (NCM) E TARIFA EXTERNA COMUM
(TEC).
Atualizada até a Resolução Camex nº 32 de 02/05/2018 . Disponível em
<http://www.mdic.gov.br/images/REPOSITORIO/secex/deint/cgam/tec/TEC_2018/Maio2018-tec-
word- completa.docx>. Acesso em 04/06/2018.
46 Cf. DALSTON, 2005a, p.256.
http://www.mdic.gov.br/images/REPOSITORIO/secex/deint/cgam/tec/TEC_2018/Maio2018-tec-word-
16 Preparações de carne, de peixes ou de crustáceos, de moluscos ou de outros
invertebrados aquáticos.
17 Açúcares e produtos de confeitaria.
18 Cacau e suas preparações.
19 Preparações à base de cereais, farinhas, amidos, féculas ou leite; produtos de pastelaria.
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