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DIMENSÕES DO JOGO Mariluce Ferreira Romão Origem e histórico social e cultural do jogo Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Definir jogo, brinquedo e brincadeira pelas perspectivas histórica e social. � Avaliar o papel da ludicidade e dos jogos na formação humana e no processo educativo escolar básico, considerando sua dimensão social, histórica e cultural. � Identificar a importância do jogo no processo de conhecimento, expressividade e socialização da criança. Introdução Por meio do jogo, o ser humano se introduz na cultura e amplia a sua capacidade de imaginação e de representação simbólica da realidade. O jogo nasce espontâneo, sem outro fim além da necessidade e da alegria de jogar. Além disso, ele evolui, cresce e acompanha o ser humano e a sua cultura. Neste capítulo, você vai conhecer a definição de jogo, brinquedo e brincadeira pelas perspectivas histórica e social. Também vai avaliar o papel da ludicidade e dos jogos na formação humana e no processo edu- cativo escolar básico, considerando sua dimensão sócio-histórico-cultural. Além disso, você vai verificar a importância do jogo nos processos de conhecimento, expressividade e socialização da criança. Jogo, brinquedo e brincadeira: perspectivas históricas e sociais Inúmeros autores discutem as concepções de jogo, brinquedo e brincadeira. Muitos deles assinalam a aproximação semântica desses termos e integram essas concepções à cultura humana, por sua função significante, isto é, por apresentarem um sentido que transcende sua execução propriamente dita (SARAIVA, 2011). Jogo Para começar, é necessário que você compreenda que qualquer definição de jogo é similar ao conceito de lúdico, independentemente da teoria que a contemple. O jogo é a ação de jogar, um passatempo ou uma diversão. Em geral, as crianças usam a palavra “jogo” compreendendo-a simplesmente como a prática de jogar. O jogo sugere clareza e evidência. Ele é considerado essencial para o ser humano: o homo ludens passa quase metade da vida em vigília. Contudo, considera-se que nenhum sábio tenha chegado a uma definição precisa, porque jogar faz referência a uma condição ou realidade primordial da vida. A definição de jogo não é exatamente determinada, tampouco delimitada. É possível, inclusive, que toda tentativa de definição seja classificada como jogo científico. A distorção acerca das tentativas de definição do jogo, por seu caráter “incoerente” e sua complexidade, responde à sua especificidade e indefinição inata. O jogo trata-se de um desafio, vivido como real e com mais intensidade do que o trabalho sério e responsável. Ele é algo que representa, na prática, uma ficção. Do ponto de vista fisiológico, pode-se entender o jogo como atividade que os seres vivos superiores realizam aparentemente sem um fim utilitário e com o objetivo de eliminar o excedente de energia. Como comportamento vital, poderiam existir atividades necessárias e essenciais e atividades desin- teressadas, nas quais se inclui o jogo (definição do poeta Schiller modificada pelo filósofo Spencer). Brinquedo Afirmar que o brinquedo metamorfoseia e fotografa a realidade significa assumi-lo como uma reprodução. Assim, o brinquedo reproduz tanto coisas como uma totalidade social: shopping centers, naves espaciais, aparelhos eletrodomésticos, bonecos e robôs, princesas e fadas, piratas, índios, mocinhos e bandidos. Isso referencia a tecnologia na atualidade e, sobretudo, incorpora um imaginário preexistente, veiculado por contos de fadas, filmes e seriados televisivos. Todavia, face à industrialização e ao consumismo, o brinquedo Origem e histórico social e cultural do jogo2 arrisca ser transformado em objeto de dominação do adulto, em detrimento da criança. Se, por um lado, suprem reais necessidades, os brinquedos podem impor desejos sugeridos pelas estratégias mercadológicas, que impregnam o mundo das crianças com a lógica do consumismo. Metamorfosear é o mesmo que transformar, transmudar, converter, transmutar. A oposição ao mercantilismo envolvendo o brinquedo, imposto pela tecno- logia e pela economia, edifica a convergência entre a cultura popular e a visão infantil do mundo, mediante as quais o elemento imaginário das identidades regionais e da percepção infantil pode se manifestar. No brinquedo, é possível observar claramente a base característica da arte popular, ou seja, a imitação de uma técnica procurada, aplicada a um material simples ou rudimentar. Brin- quedos confeccionados pela própria criança, acompanhada pelo adulto, como bolas, cata-ventos, papagaios ou bonecas de pano, reproduzem, naturalmente, objetos sofisticados, entretanto permitem, em sua execução, integrar tempos distintos. Em contrapartida, na idade adulta, esse ato de intensa comunicação é um meio de recuperação da própria infância, com ênfase na memória e na imaginação. Brincadeira Desenvolver-se socialmente, no universo infantil, é um processo complexo e permanente. Ele começa no início da vida e envolve diversas variáveis, com destaque à atividade física realizada de maneira informal do começo ao fim da vida. Associada a essa atividade física está a brincadeira, que preenche muito tempo na infância. Logo, cede lugar ao esporte enquanto nível máximo da atividade formal organizada. É no esporte que a criança manifesta o grau de socialização, atingido por meio de condutas tanto de colaboração como de competição (MURCIA et al., 2008). O fator emocional presente no ato de brincar é uma das razões pelas quais as crianças estabelecem uma coincidência entre a situação representada em uma brincadeira e a realidade. 3Origem e histórico social e cultural do jogo Ao brincar de “casinha” ou de “escolinha”, assumindo, respectivamente, o papel de mãe ou de professora, a criança tenta reproduzir o que considera que uma mãe e uma professora devam ser. Ao mesmo tempo, ela procura manifestar as regras de comportamento exigidas por esses papéis sociais na vida real. Assim, a representação tem uma força motivadora, que pode levar a criança a aceitar as restrições às suas próprias atitudes na relação com a mãe ou com a professora. Nesse sentido, o espaço da invenção, calcado em códigos de conduta prévios, promove a socialização. No Quadro 1, você pode ver definições de brincadeira. 1 A brincadeira é uma atividade fonte de prazer, divertida e que geralmente provoca excitação. 2 A brincadeira é uma experiência de liberdade e arbitrariedade, já que a característica psicológica principal é que se produz sobre um fundo psíquico geral, caracterizado pela liberdade de escolha. Por meio das brincadeiras, as crianças saem do presente, da situação concreta, situam-se e experimentam outras situações, outros papéis e personagens, com uma mobilidade e uma liberdade que a realidade da vida cotidiana não lhes oferece. 3 A ficção é considerada um elemento constitutivo da brincadeira. Pode-se afirmar que brincar é “fazer de conta”, que a realidade é assim e não “assado”, mantendo, ao mesmo tempo, a consciência dessa ficção. Por isso, qualquer atividade pode virar brincadeira (saltar, atirar uma pedra). Quanto menor a criança, maior a sua tendência a transformar cada atividade em brincadeira. O que caracteriza a brincadeira não é a atividade em si mesma, mas a atitude do sujeito frente a essa atividade. A maioria dos autores considera que a aparição da ficção (o faz de conta) é o momento em que começa a verdadeira brincadeira. 4 A brincadeira é uma atividade que envolve ação e participação, já que brincar é fazer e sempre envolve a participação ativa de quem brinca, mobilizando-se para a ação. A ativação lúdica tem motivações intrínsecas. Por isso, quando há utilitarismo, se converte em meio para alcançar um fim, perde a atração e o caráter de brincadeira. Quadro 1. Definições de brincadeira (Continua) Origem e histórico social e cultural do jogo4 Fonte: Adaptado de Múrciae colaboradores (2008). 5 A brincadeira é uma atividade séria, ainda que não possua o mesmo conceito de seriedade dos adultos. Para a criança, trata-se de uma atividade séria porque “põe em jogo” todos os recursos e as capacidades de sua personalidade. A brincadeira a envolve em toda a sua totalidade (nível corporal, intelectual e afetivo). 6 A brincadeira é sempre expressão e descobrimento de si mesmo e do mundo. 7 A brincadeira é sempre interação e comunicação, pois promove a relação e a comunicação com os outros, levando a criança a procurar parceiros com frequência. 8 A brincadeira também é imitação e criação. Alguns autores veem na atividade lúdica a fonte das atividades superiores do homem, as quais conduzem ao trabalho, à ciência, à arte, etc. Quadro 1. Definições de brincadeira O significado de jogos e brincadeiras transcende aquilo que eles manifestam, uma vez que, ao se estruturarem no campo do imaginário-simbólico, constituem uma linguagem de sentidos múltiplos e se integram à cultura. A cultura surge sob a forma de jogo, que ela é desde seus primeiros passos, como que “jogada”. Assim, a vida social se reveste de formas suprabiológicas, que lhe conferem uma dignidade superior sob a forma de jogo. É por meio do jogo que a sociedade exprime sua interpretação da vida e do mundo (MURCIA et al., 2008). A ludicidade na formação humana e na escola básica A produção de um instrumento pedagógico com base na ludicidade da infância e na apropriação de experiências enraizadas na cultura local atende ao objetivo da escola de formar indivíduos socialmente comprometidos. Isso representa uma (Continuação) 5Origem e histórico social e cultural do jogo resistência ao processo de aculturação que crianças e adolescentes sofrem, visto que ocorre a disseminação das manifestações culturais de países economicamente hegemônicos. Isso também contribui para a constituição das identidades, para o aprimoramento da interação humana, para a compreensão dos significados inerentes aos produtos culturais, para o reconhecimento da riqueza presente na diversidade cultural e para a identificação das influências recíprocas entre as manifestações da cultura e os recursos tecnológicos (SARAIVA, 2011). Os seres humanos sempre jogaram e brincaram entre si. Há registros de jogos nas paredes de cavernas. Essas e outras possíveis evidências demonstram que o jogo acompanhou não somente a evolução histórica como também esteve presente em todas as civilizações. Assim, são encontrados jogos do Egito, da Grécia, da Índia, da China, dos incas, de Angola, da Espanha e do Brasil, por exemplo. As brincadeiras costumam variar conforme a região. Entretanto, permanece a sua essência, a sua forma e a sua “poesia”. Os aspectos que sofrem maiores alterações são a letra das canções e o próprio nome dos jogos. No Brasil, há uma riqueza ampla de jogos e brincadeiras, tendo em vista as heranças portuguesa, indiana e afrodescendente. Para a psicologia ou para a pedagogia, os registros da forma como uma criança joga e interage com seus parceiros (ou professores) são relativamente novos. Piaget (1975) e Kamii e De Vries (1991), responsáveis por divulgar esses registros a partir de observações sistemáticas, auxiliam os profissionais a refletirem e analisarem o desenvolvimento da criança. A educação física, ao considerar o jogo e o seu conteúdo, colabora para que eles continuem a ser transmitido de geração a geração, dando sustentação a esse patrimônio cultural tão significativo para a humanidade (DARIDO; RANGEL, 2017). Jogos como amarelinha, empinar papagaio e jogar pedrinhas têm registro na Grécia e no Oriente, comprovando a universalidade dos jogos infantis (KISHIMOTO, 2005). A importância da brincadeira na educação Os jogos, de acordo com Darido e Rangel (2017), podem ser considerados como um dos conteúdos escolares que apresentam maior facilidade de aplicação. Isso ocorre por diferentes razões, entre elas as listadas a seguir: Origem e histórico social e cultural do jogo6 � não são desconhecidos da criança, uma vez que a maioria já́ participou de diferentes jogos e brincadeiras; � não exigem espaço ou material sofisticado (embora possam existir jogos com tais exigências); � podem variar em complexidade de regras, ou seja, desde pequeno pode- -se jogar com poucas regras, ou chegar a jogos com regras de altíssimo nível de complexidade; � podem ser praticados em qualquer faixa etária; � são divertidos e prazerosos para os seus participantes (a menos que sejam levados a extremos de competição). Aprende-se o jogo pelo método global, diferentemente do esporte, que geralmente é aprendido/ensinado por partes. Ao contrário, em um grande jogo, aprende-se jogando, não se explica e se “treina” as partes para depois se jogar. A graça de se aprender o jogo está́ , justamente, em jogá-lo. Não se aprende a arremessar para depois se aprender a jogar queimada; o arremesso é aprendido durante o jogo. Se o arremesso deve ser mais forte, mais fraco, em determinada direção, para cima ou para baixo, é o contexto do jogo que vai determinar. Os jogos coletivos foram criados dessa maneira. Assim, as pessoas aprendiam jogando. Somente mais tarde, com a técnica e a ciência, é que se passou a ensinar com a decomposição das partes. Na educação contemporânea, jogos e brincadeiras podem ser entendidos a partir de três perspectivas complementares: meio globalizador, objeto de estudo e ferramenta metodológica. Veja a seguir. � Como objeto de estudo: é um bloco de conteúdos que apresenta dife- rentes modalidades, segundo a complexidade das normas que o regulam, o grau de envolvimento que exige dos participantes e as capacidades que pretende desenvolver. � Como estratégia metodológica: é uma atividade intrinsecamente motivadora que facilita a aproximação natural à prática normalizada do exercício físico. Não resulta unicamente em aprendizagens esportivas. Tem sentido em si mesma e favorece a exploração corporal, as relações com os demais e o aproveitamento coletivo do ócio. � Como meio globalizador: inter-relaciona conteúdos de educação física com outras áreas e eixos transversais. Sua prática potencializa atitudes e hábitos de tipo cooperativo e social, baseados na solidariedade, na tolerância, no respeito e na aceitação das normas de convivência. Essas 7Origem e histórico social e cultural do jogo três perspectivas devem estar intimamente relacionadas, combinando-se para alcançar os objetivos da etapa. Jogo, conhecimento, expressividade e socialização Tendo em vista os valores sociais relacionados aos esportes, bem como a sua interlocução com a motricidade, identifica-se progressivo aumento no interesse por essas atividades. No universo infantil, o esporte se torna especialmente importante. Afinal, envolve pessoas que estão formando a sua personalidade e que se encontram no momento “delicado” de aprender a tomar decisões e incorporar em seu esquema de valores o que é mais e o que é menos relevante. Nesse contexto, é fundamental definir o que beneficia o indivíduo e o que é melhor para o grupo, o que pode e deve ser feito na prática esportiva e o que não se deve fazer. Para isso, as regras criam barreiras a fim de evitar o que atenta contra a ética esportiva. Você deve considerar, nesse cenário, os mais jovens e as crianças que, motivadas, dedicam-se a uma prática esportiva e buscam se “espelhar” no que assistem na televisão e/ou no que idealizam, como os praticantes de esportes adultos, os espetáculos e as competições. Jogar é, por convenção, o meio ideal para uma aprendizagem social fa- vorável, pois é uma atividade naturalmente ativa e muito estimuladora para a maior parte das crianças. As brincadeiras envolvem constantemente as pessoas nos processos de ação, reação, sensação e experimentação. Todavia, se alguém altera o jogo das crianças, premiando excessivamente a disputa, a agressão física, as trapaças e o jogo desleal, altera também a qualidadede vida das crianças. O desenvolvimento social nas crianças é um processo permanente e de alta complexidade. Nele, influem múltiplas variáveis, sendo uma das mais importantes a atividade física realizada de maneira informal do começo ao fim da vida. A brincadeira solicita da criança iniciativa e coordenação, bem como atitudes perante seus pares com vistas a estabelecer e manter a comunicação. Trata-se de potencializar de forma progressiva a relação com os outros, pois assim ocorre a assimilação da linguagem da comunicação e de suas diversas interfaces. Jogando, as crianças vivem situações diversificadas, que envolvem sentimentos, atitudes e comportamentos. Nesse contexto, aprendem a cooperar, a participar, a competir, a serem aceitas ou não, a constatar a imagem que os outros têm delas e a expressar a imagem que fazem dos outros. Origem e histórico social e cultural do jogo8 O ato de brincar promove a adaptação social, fazendo com que a criança, na representação de outro personagem, perceba a experiência do outro e a própria situação vivida. Nas atividades simbólicas, a criança assume o papel de outro, adotando sua perspectiva. Esse processo tem grande importância no desenvolvimento da capacidade de cooperação. Para compreender melhor a forma de atuar, considerando as situações lúdicas e a sua relação com o desenvolvimento de valores sociais, é importante repassar esses valores e o processo pelo qual as crianças os incorporam em seu repertório pessoal. Os valores são alcançados pela socialização e pela comunicação entre os seres humanos. Dessa maneira, tudo o que se faz para uma criança reflete no processo de formação de sua personalidade. Tanto na escola como nas práticas relativas ao esporte escolar, os professores e os treinadores devem procurar um equilíbrio entre o desenvolvimento de valores pessoais ou individuais e o desenvolvimento de valores sociais ou coletivos. Em condições extremas, é necessário priorizar os valores sociais. Afinal, o excessivo empenho no desenvolvimento de valores individuais pode ocasionar um incremento no personalismo, na falta de consciência social, na falta de comunicação e na progressiva deterioração do ambiente comunitário. Acredita-se que o valor é um elemento fundamental para o ser humano. Valorizar significa dar preferência a algo em detrimento de outras coisas. Embora adquirir valores seja um processo sem fim, que concerne ao desen- volvimento e à evolução do indivíduo, é principalmente durante infância e a adolescência que ocorre a consolidação da constituição fundamental de valores. Nesse período, os valores passam de uma moral heterônoma, segundo a qual são direcionados pelas opiniões e normas dos mais “experientes” (pais, educadores, treinadores), para uma moral autônoma. Esta é gerida pela opinião própria. Esse processo acontece paralelamente ao desenvolvimento do juízo moral. Heterônoma: que se submete às vontades de outra pessoa; que está subordinada às leis ou preceitos exteriores. Por exemplo: um país heterônomo é aquele que pode ser alvo de leis de crescimento, desenvolvimento ou formação que se desviam das consideradas normais. 9Origem e histórico social e cultural do jogo Há etapas gerais que todos atravessam na conformação de seu esquema de valores. Nesse transcurso de tempo, e de processos psicossociais, as pessoas mais significativas e próximas da criança desempenham um papel diferente conforme a etapa do desenvolvimento moral em que ela se encontra. Para compreender isso melhor, observe o Quadro 2, a seguir. Aceitação de valores Identificação de valores Convicção de valores As crianças assumem os valores que os “outros significativos” lhes oferecem, entendendo-os como válidos pelo simples fato de que provêm de uma autoridade legítima. Esse processo constitui a representação mais genuína da moral heterônoma. Em geral, costuma-se atribuir à família a função principal de transmitir valores aos menores. Considerando-se o ritmo da sociedade atual e a escolarização cada vez mais precoce, é preciso refletir sobre o importante papel que podem desempenhar professores e treinadores quanto à incorporação de valores. É o momento no qual se corre o risco de que as crianças tenham de enfrentar conflitos entre o que dizem seus pais As crianças vivem uma transição no desenvolvimento moral por meio da busca de valores. Já não lhes serve que os mais velhos — pais, professores e treinadores — digam - -lhe o que está certo ou errado, pois procuram o valor das coisas em função de sua própria essência, não como valores alheios. Aqui, surgem numerosas dúvidas e se colocam importantes dilemas, processos que levarão a criança a incorporar uma decisão própria e a consolidar os critérios de valores que lhe servirão dali em diante. É o momento no qual as crianças passam muitas horas na escola, em contato com professores e treinadores. Portanto, esses profissionais Provoca na criança a satisfação pessoal, culminando na realização do valor. Esse processo coincide com a etapa da adolescência e permite a superação do abalo sofrido na puberdade, surgindo a capacidade de encontro com os próprios pensamentos, sentimentos e desejos. É o momento no qual os adolescentes prescindem das normas estabelecidas, preocupando-se com os valores que sustentam as regras e normas sociais, configurando o mundo de seu eu ideal. Quadro 2. Etapas de desenvolvimento moral da criança (Continua) Origem e histórico social e cultural do jogo10 Fonte: Adaptado de Múrcia e colaboradores (2008). Aceitação de valores Identificação de valores Convicção de valores e o que transmitem os educadores e colegas. Por isso, são indispensáveis uma coordenação de interesses e uma coincidência de objetivos a fim de evitar que a criança chegue a uma ambiguidade e a uma perigosa contradição. devem formular questões, estabelecer a orientação de metas e a busca de soluções, de modo que as crianças cheguem às suas próprias conclusões. Quadro 2. Etapas de desenvolvimento moral da criança Os jogos informais, os esportes infantis e os valores sociais Os jogos informais ocupam posição média entre o jogo e o esporte organi- zado. Mesmo que apresentem maior organização e estrutura do que os jogos infantis, eles mantêm o impulso do jogo. Você deve considerar a importância dos jogos informais para o desenvolvimento do caráter moral e social das crianças, uma vez que os programas de esportes juvenis organizados minam a riqueza cultural dos jogos infantis. Tais programas desenvolvem seu argumento com base em uma análise histórica e transcultural associada a uma reflexão saudosa da infância. Como você viu, os jogos informais proporcionam um meio favorável para o desenvolvimento social e moral. Contudo, eles estão deixando de fazer parte do repertório das crianças. A seguir, você pode ver recomendações para melhorar a situação do ponto de vista da educação e da participação dos educadores no processo. (Continuação) 11Origem e histórico social e cultural do jogo � Os professores de educação física, os adultos relacionados com a re- creação infantil e os programas de esporte juvenil podem proporcionar oportunidades para que as crianças organizem e façam seus próprios jogos, bem como para que pratiquem os jogos propostos pelos adultos. � Deve-se reafirmar o valor dos jogos informais e da brincadeira espon- tânea nos contatos das crianças com pais e responsáveis. � Pode-se ensinar às crianças os jogos ameaçados de desaparecimento. Muitas brincadeiras maravilhosas, que existiram durante gerações e eram transmitidas oralmente, são agora “espécies” em perigo de extin- ção. O adulto deve ensinar como brincar e deixar as crianças à vontade. � Finalmente, esse mesmo adulto pode ajudar a modificar os conceitos esportivos a fim de incorporar algumas das vantagens oferecidas pelos jogos informais. 1. Tendo em vista o perfil do jogo, sob o pontode vista fisiológico, o que é correto afirmar? a) O jogo tem perfil utilitário. b) O jogo tem perfil opcional. c) O jogo tem perfil necessário. d) O jogo tem perfil secundário. e) O jogo tem perfil desprezível. 2. Do ponto de vista da educação, o que pode ser feito para melhorar a situação dos jogos informais? a) O valor dos jogos informais e brincadeiras deve ser considerado isoladamente pela escola. b) Os professores devem propor diversas oportunidades de jogos e brincadeiras espontâneas. c) A brincadeira e os jogos informais devem ser impostos e realizados de forma arbitrária. d) Os conceitos dos jogos esportivos devem ser dissociados dos jogos informais. e) Deve-se ensinar às crianças somente jogos novos. 3. Em relação ao desenvolvimento moral da criança, o que é correto afirmar? a) Na fase de aceitação de valores, a criança assume valores próprios desde a infância. b) Na fase de convicção de valores, surge a capacidade de encontro com os pensamentos na adolescência. c) Na fase de aceitação de valores, a criança incorpora decisões próprias e consolida critérios e valores. d) Na fase de convicção de valores, a criança confronta o que é dito pelos pais e pelos professores. Origem e histórico social e cultural do jogo12 e) Na fase de identificação de valores, a criança entende como seu o valor do outro. 4. No atual sistema educativo, os jogos e as brincadeiras podem ser entendidos a partir de três perspectivas: como objeto de estudo, estratégia metodológica e meio globalizador. Nesse contexto, o que caracteriza o objeto de estudo, a estratégia metodológica e o meio globalizador, respectivamente? a) Conteúdo, inter-relações e motivação. b) Motivação, conteúdo e inter-relações. c) Conteúdo, motivação e inter-relações. d) Motivação, inter-relações e conteúdo. e) Inter-relações, conteúdo e motivação. 5. Na educação, quais são as “facilidades” apresentadas pelos jogos como conteúdos escolares? a) São aprendidos/ ensinados por partes. b) Já são conhecidos pela criança. c) São limitados à infância. d) Priorizam a sofisticação. e) Possuem regras fixas. DARIDO, S. C.; RANGEL, I. C. A. (Coord.). Educação física na escola: implicações para a prática pedagógica. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017. MURCIA, J. A. M. et al. Aprendizagem através do jogo. Porto Alegre: Artmed, 2008. SARAIVA, J. A. et al. Palavras, brinquedos e brincadeiras: cultura oral na escola. Porto Alegre: Artmed, 2011. Leituras recomendadas FREIRE, J. B. Educação de corpo inteiro: teoria e prática da Educação Física. 4. ed. São Paulo: Scipione, 1997. (Pensamento e Ação no magistério). KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2005. 13Origem e histórico social e cultural do jogo Conteúdo:
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