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Corpo, Movimento e Psicomotricidade Responsável pelo Conteúdo: Prof. Dr.ª Carmen Conti Revisão Textual: Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira O Corpo e o Desenvolvimento Humano O Corpo e o Desenvolvimento Humano • Apresentar as noções de Corpo, Movimento e Psicomotricidade, que foram se construindo e reconstruindo nos diferentes contextos sociais, históricos e religiosos; • Conhecer e compreender que o uso do movimento corporal na escola é muito importante também para a concretização do processo de ensino e de aprendizagem. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Introdução; • O Corpo e o Desenvolvimento Humano; • O Corpo e a Cultura Corporal; • A Importância do Corpo e do Movimento na Educação; • A Neurociência e o Desenvolvimento da Criança. UNIDADE O Corpo e o Desenvolvimento Humano Introdução Nesta unidade, vamos conversar a respeito do corpo e do movimento na edu- cação. Antes mesmo de direcionarmos nossas aulas aos conceitos de Psicomotrici- dade e seus elementos, precisamos ter uma visão do que se conhece sobre o corpo e o movimento corporal. Como educadores, deveremos ter uma visão mais científica, mais aprofundada, pois vamos trabalhar esses sentidos e funções em um ser humano em formação. Assim sendo, veremos neste momento a importância do corpo e do movimento e suas implicações no desenvolvimento humano. O Corpo e o Desenvolvimento Humano Qual a importância do corpo no desenvolvimento da criança? No corpo estão inscritas todas as regras, todas as normas e todos os valores de uma sociedade específica, por ser ele o meio de contacto primário do indivíduo com o ambiente que o cerca. (DAÓLIO, 2003, p. 39) Daólio indica-nos, na citação anterior, que nosso corpo é o construtor e, ao mesmo tempo, é construído pela sociedade em que vive. Entender o corpo como a nossa representação no mundo e que a partir dele construímos nossa história, permite-nos ter uma visão da sua importância no desenvolvimento humano. É importante entendermos que o desenvolvimento humano ocorre pela aquisição ou aprendizagem de tudo aquilo que o indivíduo construiu ao longo da história da humanidade. Assim, isso acontece na aquisição e interação com o seu meio – família, escola, crenças, costumes, entre outros aspectos – mas também se estabelece pela congruência desses estímulos externos com toda a nossa complexidade interna. São aspectos do desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo e social somados à com- plexidade biológica, morfológica, emocional, física, muscular e com o nosso meio ambiente. Portanto, tudo isso pode ser observado em cada sujeito pela sua repre- sentação corporal. Nesse sentido, conhecer como o corpo se desenvolve é de grande importância para a formação docente, afinal, nossas ações pedagógicas são pautadas nas neces- sidades de cada fase de uma criança. Desta forma, é necessário, primeiro, ter uma visão histórica de como cada socie- dade e cultura, ao longo do tempo e em seu próprio espaço, construiu e representou o corpo humano, atribuindo-lhe certos atributos, negando outros e criando padrões referenciais de beleza, saúde, postura etc. Nem sempre nosso corpo foi considerado importante e demorou muito para a educação entender a necessidade de conhecer o desenvolvimento corporal para propor suas ações. 8 9 Nota-se que, conforme a evolução histórica do pensamento e do discurso humano, as mudanças corporais foram acontecendo, sendo aceitas, de forma que as novas con- cepções serviram de base para a próxima mudança. Vamos conhecer uma visão de como o corpo foi visto na história do homem. Você Sabia ? O homem vitruviano é um conceito apresentado pelo arquiteto romano Marco Vitruvio Polião. O conceito é considerado um cânone das proporções do corpo humano, segundo um determinado raciocínio matemático e baseando-se, em parte, na proporção áurea. Desta forma, o homem descrito por Vitrúvio apresenta-se como um modelo ideal para o ser humano, cujas proporções são perfeitas, segundo o ideal clássico de beleza. Figura 1 – Homem Vitruviano (1490), desenho de Leonardo da Vinci Fonte: Getty Images O método cartesiano, desenvolvido a partir de século XVII pelo filósofo René Descartes, influenciou todo desenvolvimento científico e a nossa visão de corpo. Nessa perspectiva, o conceito de dualidade corpo-mente compara o corpo a uma máquina e a mente como objeto intelectual de estudo (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009). A cisão corpo-mente governa e serve como fundamento lógico para o tratamento do ser humano como se ele fosse formado por peças separadas a serem exploradas por diferentes grupos de interesse. Com essa fragmentação perde-se a visão da intei- reza, do conjunto e de suas interconexões. Essa visão foi muito importante para sua 9 UNIDADE O Corpo e o Desenvolvimento Humano época, mas contribuiu para um olhar no qual o corpo não tem grande importância no desenvolvimento humano. Essa visão predominou por muito tempo e gerou grande impacto em como obser- vamos o corpo na educação e no ambiente escolar. Entender o corpo como a nossa representação no mundo, nos faz observar a sua importância no desenvolvimento e na apresendizagem de uma criança. O Corpo e a Cultura Corporal O ser humano é um ser complexo, e essa complexidade se deve a riqueza de informações que precisamos conhecer para um desenvolvimento integral e para a interação com o meio. Agora já aprendemos que o corpo, em contato com os estímulos do ambiente, registra e responde a diferentes informações que formam seu repertório de conhe- cimento, e, tudo isso pode variar de criança para criança, de acordo com a cultura na qual ela está inserida. Assim, vamos entender como cada corpo constrói sua cultua corporal. O documentarista francês Thomas Balmès realizou uma filmagem com duração de um ano. Balmés observou quatro crianças de países diferentes, buscando mostrar que as diferenças culturais influenciavam no desenvolvimento infantil, desde o nasci- mento até os primeiros passos. Os países escolhidos para criação do documentário “Bebês” foram: Namíbia, Mongólia, Japão e Estados Unidos. Veja Ponijao, o bebê da Namíbia, na África, disponível em: https://bit.ly/2XsFuvV Nesta direção, podemos afirmar que cada corpo tem seu desenvolvimento vincu- lado a cultura em que está inserido. Desse modo, a cultura corporal, como vamos chamar nessa perspectiva, tem relação com conceitos de teóricos da Pedagogia. O pesquisador Lev Semenovitch Vigotski, importante psicólogo russo, revolucio- nou o pensamento de sua época quando apresentou sua particular compreensão do desenvolvimento humano na perspectiva histórico-cultural. Vigotski buscou compreender o desenvolvimento humano e principalmente o fun- cionamento cognitivo de cada indivíduo enquanto parte da sua realidade histórico- cultural específica. Para o autor, o desenvolvimento do sujeito é um processo cons- truído nas e pelas interações que estabelece no contexto histórico e cultural em que está inserido (seu ambiente). E por meio destas relações sociais, estabelecidas e vivenciadas pela criança na cultura a que pertence, é que se apropria do conheci- mento produzido (gestos corporais, linguagens, costumes, crenças , juízo de moral etc.), conhecimento esse produzido pelas gerações precedentes, condição funda- 10 11 mental de desenvolvimento das funções tipicamente humanas, ou seja, as chamadas funções superiores (BRANDOLISE, 2018). O corpo é a representação do desenvolvimento humano. Desse modo, podemos considerar que o desenvolvimento de uma criança pode ser observado pela perspectiva cultural, pela progressão de mudanças corporais, ou pelo desenvolvimento cognitivo? A resposta é tão complexa quanto a pergunta, pois o desenvolvimento de uma criança deve ser analisado por diferentes perspectivas, podendo hoje compreender todo esse conhecimento por diferentes conceitos teóricos. Utilizaremos o conceito de desenvolvimento integral para compreender as di- ferentes dimensões que atuam no desenvolvimento de umser humano (RIBEIRO, 2015). Assim, as dimensões motora, cognitiva e afetiva/social são consideradas as principais. Todas as dimensões se interpenetram, por exemplo, um corpo li- mitado na sua expressão ou com dificuldades nas relações sociais compromete e impacta diretamente nos processos cognitivos. Dessa forma, apesar de esta disciplina tratar o desenvolvimento do corpo, nossa referência sempre será pau- tada no desenvolvimento integral do corpo, e, em cada área do desenvolvimento, podemos verificar as influências da genética, da maturação, da aprendizagem e do meio ambiente em geral. Mas, afinal, qual a importância de saber todas essas informações para sua formação? Assista ao documentário Bebês, a abordagem do desenvolvimento infantil na ótica da diversidade cultural. Ele é importante para estabelecermos as relações de desenvolvimento da criança por uma concepção histórico social. Trailer disponível em: https://youtu.be/lxw7pV3I2SU A Importância do Corpo e do Movimento na Educação Quando planejamos nossas ações pedagógicas, devemos conhecer quem é nosso aluno, em qual fase de desenvolvimento ele se encontra, e o que desejamos despertar no seu desenlvolvimento, assim como conhecer o que se espera de uma resposta de uma criança exige conhecimento sobre as fases de desenvolvimento. O desenvolvimento humano acontece de forma integral, levando em consideração as dimensões motora, cognitiva e afetivo/social. Todo o desenvolvimento acontece pelo nosso corpo e é expressado pelo nosso movimento. Os movimentos são considerados importantes na vida do ser humano, tanto nos aspectos biológicos, quanto nos psicológicos e sociais, tornando-se essenciais para o desenvolvimento humano. 11 UNIDADE O Corpo e o Desenvolvimento Humano Nós produzimos movimentos desde o nascimento e é a partir daí que começamos a interagir melhor com o mundo e ter um maior controle sobre o nosso corpo. E com as crianças, não é nada diferente. Os bebês engatinham, correm, caminham e colocam o derredor como o seu mundo, sempre experimentando o novo, o desconhecido e surpreendendo com sua maneira de encarar o próprio corpo, as limitações e, sobretudo, com a inventividade. O movimento para um bebê/criança não tem limite. Quando as crianças estão brincando também estão exprimindo sentimentos, emoções e uma maneira de pensar e agir. Cabe ao educador observar e aumentar o repertório de verbalização e linguagens. Sendo assim, o movimento é muito mais do que o simples fato de se lomover em um espaço, porque quando se movimentam eles atuam sobre o meio físico e humano, modificando-o. Quando uma criança se movimenta, ela não apenas se desloca, ela mobiliza pessoas no tempo e no espaço e intenciona uma interação com outras pes- soas e com o mundo que a rodeia. O modo como andamos, saltamos, praticamos esportes, constitui o resultado da nossa interação com o meio físico e social. Todos esses movimentos constituem o produto das nossas necessidades e interesses, em diferentes épocas e em diferentes culturas. Vamos lembrar-nos do conceito de cultura corporal, campo da cultura que abrange e expressa as práticas expressivas de comunicação, que se manifestam por meio de movimentos. Em diferentes épocas e diferentes culturas foram surgindo movimentos/expressões comporais que deram origem à dança, aos jogos, brincadeiras e esportes que tinham por finalidade última a interação/integração social de determinados grupos. Esses comportamentos e movimentos tinham e têm intencionalidade. Quando as crianças brincam, elas criam movimentos e ritmos próprios de sua cultura e apropriam-se desses, aprofundando a cultura e tornando o seu meio mais rico culturalmente. Toda e qualquer instituição de educação infantil deve favorecer um ambiente seguro e socialmente agradável, para que as crianças, ao se sentirem protegidas e estimuladas, visualizem sinestesicamente, arrisquem-se e promovam desafios sob a tutela do edu- cador. Se esse ambiente for pobre, pequena será sua manifestação, se for rico e propi- ciar desafios, grande será sua atuação e ampliação cultural. O trabalho com movimento é essencial para a criança desenvolver de forma inte- gral. Quando posteriormente apresentarmos os conceitos de psicomotricidade, você vai entender melhor como o movimento é importante, pois possibilita manifestações motoras, sensoriais e psíquicas que irão proporcionar à criança o desenvolvimento de suas potencialidades. A cultura do movimento é essencial para o desenvolvimento da psicomotricidade e quanto mais rica for, maior será a produção intelectual da criança. 12 13 Os movimentos corporais da criança expressam desejos de comunicação, afetivi- dade e interação com o ambiente que a rodeia. Essas possibilidades a fazem crescer culturalmente e a levam a ações intecionais cada vez mais complexas. Veremos que a psicomotricidade, antes relegada ao estudo do desenvolvimento mo- tor com relevância para sua coordenação, tem nos dias atuais uma maior amplitude. As diversas práticas pedagógicas que nos tempos atuais marcam a educação refle- tem diversas concepções em relação ao sentido que se deve dar ao movimento nas creches, pré-escolas, escolas e outras instituições afins. É muito comum confundir movimentação com indisciplina. Com o intuito de se assegurar ordem, progresso, relações harmoniosas e uma atmosfera civilizada, pro- cura-se simplesmente suprimir a ideia de movimento, cria-se um ambiente rígido nas posturas para as crianças de diferentes idades. Diante dessas assertivas, tão comuns nas escolas e no pensamento de alguns educadores, poderemos concluir que a educação e movimento não se coadunam. É imperioso dizer que não se poder movimentar ou gesticular é o que impede o pensa-mento e a manutenção da atenção, tão necessários à aprendizagem. Nesta direção, é importante entender que quando falamos de corpo, de mo- vimento, falamos de desenvolvimento humano, ou mais especificamente do desenvolvimento infantil, sobre o qual estamos nos referindo para assim plane- jar e refletir sobre as nossas ações. Pois na escola, as nossas ações devem ter intenções e finalidades que levem em consideração a fase de desenvolvimento das crianças. O desenvolvimento humano se dá pela aquisição ou aprendizagem de tudo aquilo que o ser humano construiu ao longo da história da humanidade, da aquisição e da interação com o seu meio (família, escola, crenças, costumes, dentre outros aspectos), mas esse desenvolvimento também se estabelece pela congruência destes estímulos externos com toda a nossa complexidade interna. É na primeira infância, fase que vai dos zero aos seis anos de idade, que as crian- ças desenvolvem suas estruturas e circuitos cerebrais e adquirem capacidades que permitem a elas avançar com habilidades futuras. Segundo a publicação “O Impacto do Desenvolvimento na Primeira Infância so- bre a Aprendizagem“, do Núcleo Ciência pela Infância, as crianças com desenvolvi- mento integral saudável, durante os primeiros anos de vida, têm maior facilidade de se adaptarem a diferentes ambientes e de adquirirem novos conhecimentos, contri- buindo para que posteriormente obtenham um bom desempenho escolar, alcancem realização pessoal, vocacional e econômica e se tornem cidadãos responsáveis. O desenvolvimento de uma criança é influenciado pelo meio onde a criança vive e interage e também pelos relacionamentos afetivos estabelecidos. 13 UNIDADE O Corpo e o Desenvolvimento Humano Indicamos aqui quatro documentários disponíveis na Netflix, que pautam a infância, seu desenvolvimento e os direitos inerentes a essa etapa da vida. Confira! • O Começo da Vida (2016): A partir de relatos familiares e de especialistas, o filme faz uma análise sobre os primeiros mil dias de um recém-nascido e ressalta a importância de as crianças terem garantidos seu lugar de fala e de escuta, prevendo o seu desen- volvimento integral. Trailer disponível em: https://youtu.be/lxw7pV3I2SU • Secret Life Of Babies: Documentárioque aborda as motivações dos bebês nos primeiros dois anos de vida. Embora seja a fase em que aprendem a falar e a andar, as crianças já apresentam naturalmente muitos mecanismos de defesa. Trailer disponível em: https://youtu.be/n5H7t66t7mU • Crescendo como Coy: O documentário narra a batalha pública travada por uma família do Colorado (EUA), para que a filha transgênero, Coy, tenha seus direi- tos assegurados e possa viver a infância plenamente. Trailer disponível em: https://youtu.be/y2GxjSuF7Ag • The Mask you Live In: “Homem não chora!” “Isso é coisa de menina!” “Vira homem!”. Essas expressões, ainda bastante comuns na sociedade, dizem respeito a uma ideia do macho dominante que ainda se cultua. O documentário parte do tema para mostrar como ele pode ser maléfico ao desenvolvimento dos meninos e, por outro lado, como eles podem ter acesso a uma infância mais livre de rótulos e, portanto, prazerosa. Trailer disponível em: https://youtu.be/LS8bwOesLjA Figura 2 – O Começo da Vida (2016) Fonte: Divulgação O ser humano é um organismo complexo, que possui corpo e cérebro atuando conjuntamente, e o educador deve ter uma visão holística, uma visão sistêmica para compreendê-lo. 14 15 A mente humana conjuga o corpo e o cérebro, daí resultando a sua integração e a interação, constituídos pelo contexto onde ela se insere. O corpo e a motricidade do ser humano não podem continuar restritos ao bioló- gico, ao fisiológico, não havendo paralelismo, psicológico e fisiológico separados. O ser humano tem ação e intenção. As concepções sobre o desenvolvimento humano têm sido compreendidas a partir de variadas perspectivas e sob olhares tanto das ciências naturais e biológicas quanto das ciências humanas e sociais. Vários autores influenciaram as compreen- sões do desenvolvimento humano ao longo do século XX, como Skinner, Piaget, Vygotski, Wallon, Galluhue, Freud, entre outros podem nos ajudar a compreender como uma criança se desenvolve. Hoje, áreas como a Neurociência trouxeram mais informações para esse processo de desenvolvimento integral – cognição, afetividade e dimensão motora. Nesse sentido, é importante que o educador observe e absorva a ideia de que a expressividade e mobilidade são essenciais à educação. Grupo disciplinado não é aquele em que todos ficam quietos e imóveis à espera de ordens e comandos. Deslocamentos, conversas, brincadeiras, jogos não podem ser considerados desor- dem, mas sim manifestações naturais de alegria, desejo de participação e, portanto, guiados e dirigidos pelo educador para o fim que se deseja. As manifestações de motricidade têm um caráter lúdico e expressivo e permitirão ao educador organizar e melhorar suas práticas educacionais. A Neurociência e o Desenvolvimento da Criança O termo neurociência se difunde como um conceito transdisciplinar ao reunir diversas áreas de conhecimento no estudo do cérebro humano. A neurociência se constitui como a ciência do cérebro. O que chamamos comumente de mente é um grupo de funções desempenhadas pelo cérebro. As ações cerebrais estão ligadas à toda complexidade humana, aos comportamentos, e não apenas a comportamentos motores relativamente simples, como andar e comer, mas a todas as complexas ações cognitivas que associamos ao comportamento de todo ser humano, como pensar, falar, criar estratégias, entre outras. A Ciência Neural hoje pode fornecer explicações da atividade cerebral que podem contribuir para entendermos como a criança desenvolve suas dimensões. A Neurociência pode explicar os caminhos pelos quais milhões de células indivi- duais, no cérebro humano, atuam para produzir todo o desenvolvimento e apren- dizagem da criança, e como tudo isso acontece pelas influências do ambiente e das relações com outras pessoas. 15 UNIDADE O Corpo e o Desenvolvimento Humano O professor de Pediatria e Neurologia da Universidade de Chicago, Peter Huttenlocher, descobriu que, após o nascimento, o cérebro de uma bebê constrói inú- meras conexões ou sinapses, mais do que este irá necessitar. O excesso de conexões garante ao recém-nascido receber as informações de qualquer meio ambiente. Isso quer dizer que dentro de um desenvolvimento normal, as crianças têm um grande potencial para receber estímulos (MORALES, 2005). Os estudos de Huttenlocher demonstram que os três primeiros anos de vida são as fases mais críticas para as crianças estabelecerem novas sinapses, e que o ápice ou pico dessa explosão de sinapses é aos seis anos, quando o cérebro começa a eli- minar aquelas conexões que não são usadas. O cérebro humano é um órgão complexo, parcialmente desvendado pela ciência, formado por células nervosas (ou neurônios) e células gliais (células que proporcionam suporte e nutrição aos neurônios). As primeiras são responsáveis pela motricidade, consciência e sensibilidade, enquanto as gliais sustentam e mantêm vivos os neurônios. Figura 3 – Desenvolvimento do cérebro de uma criança Fonte: Adaptado de National Institute of Enviromental Halth Sciences Imagem exibida pelo pesquisador Giorgio Tamburlini, do Centro per la Salute del Bambino, de Trieste, na Itália, na abertura da III Mostra Internacional das Semanas do Bebê, realizada em 2016, em Recife, pelo Unicef. A imagem mostra a quantidade de sinapses neurais em cada uma das fases do desenvol- vimento da criança. As atividades dos neurônios se adaptam e se modificam à medida em que intera- gem com o meio ambiente, sendo que os nossos cinco sentidos (tato, gustação, visão, olfato e audição) constituem o elo de comunicação. São as nossas experiências ou os estímulos recebidos os principais responsáveis pelas constantes trocas de adaptações e modificações, a cada novo estímulo aprendido, novas conexões neurais são acres- centadas (MORALES, 2005). 16 17 O termo plasticidade cerebral também foi apresentado pela Neurociência. O con- ceito de plasticidade cerebral considera que o sistema nervoso tem a capacidade de modificar-se ou ajustar-se frente às influências ambientais. Diante desta breve apresentação da Neurociência, a pergunta que surge é: O que tudo isso importa para entender o desenvolvimento da criança? Os profissionais que trabalham na Educação devem estar sempre atualizados com as pesquisas relacionadas ao desenvolvimento humano, pois, de longa data os autores relacionados à área da Educação consideram as características do desenvolvimento humano um conhecimento importante para compreender o homem, seu desenvolvi- mento e como acontece a aprendizagem. Ao longo desta unidade, identificamos a importância do corpo e do movimento para essas relações – sujeito, ambiente, desenvolvimento, aprendizagem, cultura e, talvez o mais importante, liberdade e autonomia. Entender o funcionamento do sistema nervoso nos permite entender como o desenvolvimento do corpo acontece na sua integridade. Assim, atualmente, a educação trabalha com o termo Neuroeducação. A Neuroeducação pode ser definida como uma área de abordagem que trata da junção dos conhecimentos da Neurociência, da Educação e da Psicologia. Um dos impactos da Neuroeducação na vida de uma criança é que, em função dos progressos oferecidos por essa ciência, muitos indivíduos conseguem conquistar a autonomia. Um dos exemplos mais interessantes é presenciarmos pessoas que convivem com algum transtorno ou síndrome e que vivem normalmente, trabalhando, estudando e exercendo sua autonomia. Considerando o aspecto neuroeducacional, a psicomotricidade ganha uma dimen- são inegável pelo fato de sua atuação provir do sistema nervoso central. Ele é respon- sável pela criação de uma consciência no indivíduo acerca dos movimentos que realiza, por meio de parâmetros como a velocidade, o tempo, o espaço e a percepção própria da pessoa. A pesquisadora Marta Kohl de Oliveira, doutora em Psicologia da Educação pela School of Education of Stanford University (California, EUA) e autora de vários livros com grande suporte teórico das pesquisas de Vygotsky, diz serpossível esta- belecer nexo entre a plasticidade cerebral e a teoria histórico-cultural de Vygotsky. Para Oliveira (1992), a ligação da estrutura biologicamente dada com o papel essen- cial atribuído aos processos históricos na constituição do ser humano se dá por uma característica de toda espécie, que seria a plasticidade do cérebro, a capacidade de cada ser humano se ajustar. O cérebro é um sistema aberto que pode servir a dife- rentes funções (que podem ser específicas de um momento ou de um lugar cultural). No cérebro humano existem aproximadamente cem bilhões de neurônios e cada um desses pode se conectar a milhares de outros, fazendo com que os sinais de informação 17 UNIDADE O Corpo e o Desenvolvimento Humano fluam e formem novas conexões neurais ou sinapses. Essa atividade neural pode ser fortalecida, ou não, dependendo dos estímulos do ambiente. A aprendizagem e o desen- volvimento estão estreitamente relacionados, assim, se faz necessário que, para propor- cionarmos uma intervenção pedagógica de qualidade, busquemos ter conhecimento das bases de desenvolvimento da criança. Agora que você entendeu que o corpo é a nossa representação no mundo para viver e registrar nossas experiências, precisamos discutir um pouco sobre a temática do desen- volvimento humano, suas fases, expectativas de respostas e como podemos atuar. A ciência da Psicomotricidade vai ser a nossa grande ferramenta para pensar nos melhores estímulos e verificar possíveis transtornos no desenvolvimento de uma criança. Finalizaremos a unidade com um fragmento do texto de Merleau-Ponty, impor- tante pensador contemporâneo. Leia o trecho e pense a respeito do seu próprio corpo: A tradição cartesiana habituou-nos a desprender-nos do objeto: a atitude reflexiva purifica simultaneamente a noção comum do corpo e a da alma, definindo o corpo como uma soma de partes sem interior, e a alma como um ser inteiramente presente a si mesmo, sem distância. Essas definições correlativas estabelecem a clareza em nós e fora de nós: transparência de um objeto sem dobras, transparência de um sujeito que é apenas aquilo que pensa ser. O objeto é objeto do começo ao fim, e a consciência é consciência do começo ao fim. Há dois sentidos e apenas dois sentidos da palavra existir: existe-se como coisa ou existe-se como consciência. A experiência do corpo próprio, ao contrário, revela-nos um modo de existir ambíguo. Se tento pensá-lo como um conjunto de processos em terceira pessoa – “visão”, “motricidade”, “sexualidade” – percebo que essas “funções” não podem estar ligadas entre si e ao mundo exterior por relação de causalidade, todas elas estão confusamente retomadas e implicadas em um drama único. Portanto, o corpo não é um objeto. Pela mesma razão, a consciência que tenho dele não é um pensamento, quer dizer, não posso decompô-lo e recompô-lo para formar dele uma idéia clara. Sua unidade é sempre implícita e confusa. Ele é sempre outra coisa que aquilo que ele é, sempre sexualidade ao mesmo tempo que liberdade, enraizada na natureza no próprio momento em que se trans- forma pela cultura, nunca fechado em si mesmo e nunca ultrapassado. Quer se trate do corpo do outro ou do meu próprio corpo, não tenho outro meio de conhecer o corpo humano senão vivê-lo, quer dizer, reto- mar por minha conta o drama que o transpassa e confundir-me com ele. (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 268-269) 18 19 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites Profissionais Psicomotricidade https://bit.ly/3bLISqv Livros Desenvolvimento Humano O livro chega à sua 12ª edição trazendo dados e tópicos totalmente atualizados sobre as diferentes fases do desenvolvimento, da formação de uma nova vida ao inevitável momento da morte. Seguindo uma abordagem cronológica, as autoras Diane E. Papalia e Ruth Duskin Feldman apresentam os aspectos do desenvolvimento físico, cognitivo e psicossocial de forma didática e ilustrada. Neurociência Aplicada à Educação O livro traz estratégias para o educador de como é possível estimular o cérebro do aluno no contexto escolar. O livro traz informações de sinapses e conexões na Neurociência na área da Linguagem, Matemática, Música, Motricidade e Ludicidade. A partir de uma perspectiva de análise e reflexão da prática escolar é possível compreender como o cérebro se modifica. Ensinar é encantar e encantar é conhecer e ser capaz de aprender sempre. Filmes Divertida Mente O filme da Disney e da Pixar, conta a história de Rilley, uma garota de 11 anos que enfrenta uma série de mudanças em sua vida. A principal delas foi sair de sua cidade natal, no estado de Minnesota (EUA), para morar na longínqua cidade de São Francisco. O enredo se desenrola dentro da cabeça da menina, onde cinco emoções — Alegria, Tristeza, Medo, Raiva e Nojo — são responsáveis por processar as informações e armazenar as memórias. O desenho foi dirigido pelo americano Pete Docter, que procurou ajuda de psicólogos e neurologistas na preparação do roteiro. Assista ao filme e faça uma relação com o desenvolvimento humano e a neurociência. https://youtu.be/LSpeM7G4zfY Leitura A Neurociência e a Educação: Como Nosso Cérebro Aprende? O artigo reflete o processo de aprendizagem, o desenvolvimento e a aquisição de novos comportamentos. https://bit.ly/3bKkMg1 19 UNIDADE O Corpo e o Desenvolvimento Humano Referências ARANHA, M. L. de A.; MARTINS, M. H. P. Filosofando: introdução à filosofia. 3. ed. revista. São Paulo: Moderna, 2003. BRASIL. Referencial Curricular Nacional Para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998, v. 3. BRANDOLISE, F. M. Desenvolvimento Humano, Brincadeira, Educação Infantil e as Contribuições de Vigotski e Winnicott. Piracicaba: UNIMEP, 2018. DAOLIO, J. Da cultura do corpo. 7. Ed. Campinas, SP: Papirus, 2003. FONSECA, V. da. Psicomotricidade: uma visão pessoal. Construção Psicopedagógica. vol. 18, n. 17, pg. 42-52. São Paulo-SP, 2010. . Manual de Observação Psicomotora: significação psiconeurológica dos fatores psicomotores. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo, Martins Fontes, 1999. RIBEIRO, F. B. Educação escolar: aspectos cognitivos, motores, afetivos e sociais. Santa Catarina: UNOCHAPECÓ, 2015. MORALES, R. Educação e Neurociências: uma via de mão dupla. In: 28ª Reunião da ANPED, n. 13, 2005, Caxambu. Educação Fundamental. Caxambu: UFSCar, 2005. SCHULTZ, D. P.; SCHULTZ, S. E. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cengage Learning, 2009. Sites visitados Sociedade Brasileira de Psicomotricidade. Disponível em: <http://profissionais psicomotricidade.blogspot.com.br/2007/07/segundo-sociedade-brasileira-de.html>. Acesso em: 10/4/2013. 20 Corpo, Movimento e Psicomotricidade Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Dr.ª Carmen Conti Revisão Textual: Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem • Apresentar a noção de como se desenvolvem e aprendem as crianças pequenas; • Estudar como acontece o desenvolvimento das capacidades motoras, linguagem e habilidades manuais na criança; • Entender que na educação infantil, o desenvolvimento acontece no decorrer de três etapas: maturação, desenvolvimento e aprendizagem de acordo com Bassedas, Huguet e Solé. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • O Desenvolvimento Humanoe a Aprendizagem; • Bases do Desenvolvimento Humano. UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem Contextualização Reflita sobre as questões abaixo, permita-se divagar sobre elas e, dentro de um contexto educacional, responda o que você acredita ser a verdade. Ou não há verdades, apenas suposições? É possível conhecer uma criança observando-a, colhendo informações sobre os movimentos que ela executa, de maneira intencional ou reflexa? Que linguagem ou que tipos de linguagens ela usa que permitem o seu conhecimento? Ela expressa sua linguagem de maneiraa se fazer entender? Como isso se processa? Ou não se processa de maneira alguma e apenas inferimos informações dedutíveis? Criança têm habilidades? Ou apenas movimentos reflexos a que denominamos habilida- des manuais? 8 9 O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem Nesta unidade, estudaremos que, no ser humano, do nascer até os 6 anos, ocor- rem as mais potentes e espetaculares mudanças, que se tornam visíveis e fazem parte do dia a dia na vida de uma criança. Nesta direção, os profissionais não deveriam ter somente conhecimentos voltados à segurança e ao cuidar, esse profissional também passa a ter necessidade de conhecer as fases de desenvolvimento de uma criança, para assim pensar nos melhores estímu- los e avaliar as expectativas de respostas em cada uma das fases de desenvolvimento. As pesquisas nesta área passam por fases de grandes descobertas e discussões. Muitos pensadores da educação, ao investigar o desenvolvimento infantil, percebe- ram que a inteligência se dá a partir do nascimento e se estende por toda a infância, e, entender toda essa complexidade é fator essencial para um desenvolvimento de sujeitos preparados para atuar no mundo. Devemos estar prontos para atuar na área da educação, conhecendo todos os direitos relacionados à infância, mas também as necessidades para um crescer em toda a integridade do desenvolvimento humano. Mas, afinal, quando falamos de desenvolvimento humano ou, mais especificamente, do desenvolvimento infantil, a qual conhecimento estamos nos referindo para assim pla- nejar e refletir sobre as nossas ações? Pois, na escola, as nossas ações devem ter inten- ções e finalidades que levem em consideração a fase de desenvolvimento das crianças. O desenvolvimento humano se dá pela aquisição ou aprendizagem de tudo aquilo que o ser humano construiu ao longo da história da humanidade, da aquisição e da interação com o seu meio (família, escola, crenças, costumes, entre outros aspectos), mas esse desenvolvimento também se estabelece pela congruência destes estímulos externos com toda a nossa complexidade interna, e tudo isso, como já estudamos em unidade anterior, acontece pelo nosso corpo em movimento. Hoje, a área da educação deve formar profissionais atentos à visão da complexida- de humana, aos aspectos do desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo, social, soma- dos a nossa complexidade biológica, morfológica, emocional, física, muscular e ao nosso meio ambiente. Tudo isso pode ser visto em cada ser humano, e esse conhe- cimento deve ser familiar a todos que pretendem trabalhar no ambiente educacional. Para começar, vamos esclarecer alguns aspectos para facilitar a organização do nosso conhecimento. Alguns conceitos importantes neste momento: desenvolvimen- to humano, aprendizagem, maturação e complexidade. Estamos repetidamente falando sobre “desenvolvimento humano”, primeiro, é impor- tante lembrarmos que o desenvolvimento humano é um campo em constante evolução, assim, o que apresentamos hoje deve ser constantemente atualizado pelas suas pesquisas. 9 UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem Desde o momento da concepção, tem início nos seres humanos um processo de transformação que continuará até o fim da vida. Uma única célula se desenvolve até se tornar um ser vivo, e, apesar de sermos singulares , únicos, as transformações que as pessoas experimentam durante a vida apresentam padrões em comum, assim, o cam- po que estuda o desenvolvimento concentra-se no estudo científico dos processos sistemáticos de mudança e estabilidade que ocorrem nas pessoas. Devemos estar atentos ao fato de que esse desenvolvimento acontece por várias dimensões ou domínios, entre eles, a área educacional precisa conhecer a dimensão motora, a dimensão cognitiva e a dimensão afetivo/social. O desenvolvimento relacionado à dimensão motora está relacionado ao movimen- to, ao corpo, ao domínio físico. Esse desenvolvimento refere-se ao corpo, às capaci- dades sensoriais, e às habilidades motoras. O desenvolvimento relacionado à dimensão cognitiva refere-se às mudanças nas habilidades mentais (relacionadas ao conhecimento), tais como aprendizagem, atenção, memória, linguagem, pensamento, raciocínio e criatividade. Já o desenvolvimento afetivo/social observa os padrões de mudanças nas emoções, na formação da personalidade e nas relações sociais. Os autores que estudaram essas dimensões passaram a verificar quais são os padrões em comum no desenvolvimento de cada fase do ser humano, isso quer dizer o que devemos esperar de evolução em cada fase e assim planejar nossas ações para os melhores estímulos. Figura 1 – Imagem ilustrativa sobre o desenvolvimento humano Fonte: Freepik O segundo conceito que vamos entender se refere ao termo aprendizagem. Existem várias abordagens ou teorias sobre o conceito de aprendizagem, e cada abordagem apresentará uma concepção diferente do termo. Porém, um ponto de vista comum entre essas abordagens é que aprendizagem indica mudança, trans- formação do sujeito, isso quer dizer que a aprendizagem se dá através da assimila- ção de informações que podem ser utilizadas posteriormente. 10 11 Para os futuros professores(as), é impossível falar em aprendizagem sem men- cionar Jean Piaget (1896-1980). O biólogo, psicólogo e epistemólogo suíço estudou com profundidade as etapas do desenvolvimento humano, pois, sim, desenvolvi- mento humano e aprendizagem estão totalmente relacionados. Ao longo dos anos, PIAGET foi responsável por estabelecer teorias que abordassem esse importante aspecto da vida de todos nós, que é a aprendizagem. Para o pesquisador, os organismos vivos tendem a se adaptar a um novo meio a partir do momento em que passa a existir uma relação entre eles e o ambiente. Adquiri- mos conhecimentos através de experiências com o contexto no qual estamos inseridos. Segundo Piaget (1964), a interação entre o indivíduo e o ambiente é responsável pela formação do conhecimento humano. O equilíbrio de uma ação com outras ações pelo homem (ser humano) propicia a adaptação aos ambientes. A assimilação é o elemento-chave que determina a base de todo esse processo de aprendizagem. Sendo assim, Jean Piaget trouxe aos seus experimentos a constatação de que a criança vivencia diferentes fases de desenvolvimento para adquirir habilidades funda- mentais para sua vida, como o pensamento e a linguagem. Por trás do processo de aprendizagem estão algumas etapas que são imprescin- díveis para o progresso da mente e também para o fortalecimento da capacidade de lidar com os desafios e as descobertas do conhecimento e aprendizado. Figura 2 – Processo de aprendizagem Fonte: Getty Images Outro conceito importante é o termo maturação, pois o desenvolvimento e a aprendi- zagem só podem acontecer em um período onde a criança apresenta certa maturação. A Maturação diz respeito às mudanças que ocorrem ao longo da evolução, existente no sistema nervoso central, sendo que o indivíduo se prepara para que todas suas condi- ções e conexões nervosas cresçam e se adaptem às necessidades futuras do ser humano. A maturação está vinculada ao corpo e ao cérebro, assim, podemos entender que existe uma sequência natural de mudanças físicas e padrões de comportamento. Essa informação tem total conexão com os conceitos de desenvolvimento humano e aprendizagem, afinal uma criança só pode dar uma resposta a um estímulo caso tenha áreas necessárias a essa resposta em uma fase de maturação apropriada. 11 UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem [...] quando falamos de maturação, estamos referindo-nos às mudanças que ocorrem ao longo da evolução dos indivíduos, as quais se fundamentam na variação da estrutura e da função das células. (BASSEDAS, 1999, p. 20) Bases do Desenvolvimento Humano Utilizaremos o conceito de desenvolvimento integral para compreendermos as dife- rentes dimensões que atuam no desenvolvimento de um ser humano, fazendo aqui uma referência ao que comentamos anteriormentesobre o pensamento complexo. A di- mensão motora, cognitiva e afetiva/social considera as principais. Todas as dimensões se interpenetram, por exemplo, um corpo limitado na sua expressão ou com dificulda- des nas relações sociais compromete e impacta diretamente nos processos cognitivos. Assim, apesar da disciplina ter uma nomenclatura que parece tratar o desenvolvimento do corpo, nossa referência sempre será pautada no desenvolvimento integral desse cor- po. Desse modo, em cada área do desenvolvimento, podemos verificar as influências da genética, da maturação, da aprendizagem e do meio ambiente em geral. Quando estudamos teorias que tratam do desenvolvimento devemos ter uma con- vicção de que toda mudança desenvolvimental, em qualquer dimensão, só pode ser compreendida após uma visão dos padrões entre idades, assim, devemos conhecer quais são as características de desenvolvimento previstas em cada fase. Muitos autores verificaram que os domínios do desenvolvimento de cada dimen- são são observados pelas habilidades e respostas comuns entre as crianças em uma determinada fase do seu corpo. Nos estudos de desenvolvimento humano, os fatores internos e externos devem ser compreendidos. Embora muito do desenvolvimento inicial seja controlado pela matu- ração (fatores internos), um mínimo do estímulo ambiental (fatores externos) é neces- sário para um desenvolvimento considerado bem-sucedido. Ambientes empobrecidos em estímulos podem retardar o desenvolvimento de diversas maneiras. A estimulação do ambiente pode ter um impacto a longo prazo sobre o desenvolvimento motor, das percepções da criança, das habilidades cognitivas e das relações sociais. Neste momento, você já compreendeu que vamos precisar conhecer fatores do desenvolvimento interno e identificar quais são os melhores estímulos para tornar o desenvolvimento da criança dentro das expectativas de resposta para a fase do corpo em que ela se encontra. O crescimento e o desenvolvimento físico não podem ser ignorados quando pen- samos no desenvolvimento integral da criança. Para uma criança desenvolver sua dimensão motora que está relacionada ao seu movimento, temos que compreender que as habilidades motoras dependem do crescimento muscular, cerebral, ósseo, e que cada criança, apesar de ter as mesmas estruturas, apresenta ritmo de cresci- mento e uma constituição corporal única. Assim, vamos observar como essa singu- laridade de cada criança pode exercer profundas influências sobre a maneira que a criança desenvolve sua autoimagem, bem como alguns aspectos comportamentais. 12 13 No início, embora a gestação e o parto, com suas histórias específicas, tragam diferenças, o processo de nascimento é muito semelhante para a maioria dos bebês. Assim, quando nasce uma criança, já podemos determinar se seu crescimento e desenvolvimento pode evoluir dentro das expectativas dos padrões desejados? Atualmente, observamos que a constituição e crescimento do feto podem receber influências ambientais com grande impacto durante a fase pré-natal e, posteriormente , durante todo o desenvolvimento da criança. As influências ambientais são diversas, e, dentre elas podemos citar as doenças que podem acometer a mãe (rubéola e sífilis), as drogas utilizadas, o estilo de vida (sedentarismo, obesidade, fumo, bebida), a idade da mãe, dietas pobres que podem afetar o desenvolvimento das células do cérebro e dos tecidos do sistema nervoso, o estado emocional da gestante, entre outros. Durante o desenvolvimento pré-natal, há períodos durante os quais o organismo em desenvolvimento é particularmente vulnerável a essas influências. Durante o nasci- mento, existem também alguns riscos que podem interferir no desenvolvimento de uma criança, provenientes da falta de oxigênio, ou no caso de crianças prematuras, que têm algum comprometimento durante sua fase de desenvolvimento (BEE, 2012). Após o nascimento, as crianças continuam o seu desenvolvimento pela matura- ção e pelo contato com o ambiente. Os bebês utilizam as primeiras semanas para muita exploração visual. Na tabela abaixo, vamos observar características de desenvolvimento nas três grandes dimensões, assim, podemos pensar nas respostas esperadas em cada fase. Tabela 1 – Principais Desenvolvimentos Típicos da Infância Faixa Etária Desenvolvimentos Físicos Desenvolvimentos Cognitivos Desenvolvimentos Psicossociais Período Pré-Natal (Concepção ao Nascimento) • Ocorre a concepção; • A dotação genética interage com as influências ambientais desde o início; • Formam-se as estruturas e os órgãos corporais básicos; • Inicia-se o crescimento cerebral; • O crescimento físico é o mais rápido de todo o ciclo vital; • O feto ouve e responde os estímulos sensórios; • A vulnerabilidade a influência ambientais é grande. • As capacidades de aprender e lembrar estão presentes durante a etapa fetal. • O feto responde à voz da mãe e desenvolve uma preferência por ela. Primeira Infância (Nascimento aos 3 Anos) • Todos os sentidos funcionam no nascimento em graus variados; • O cérebro aumenta de complexidade e é altamente sensível à influência ambiental; • O crescimento e o desenvolvimento físico das habilidades motoras são rápidos. • As capacidades de aprender e lembrar estão presentes, mesmo nas primeiras semanas; • O uso de símbolos e a capacidade de resolver problemas desenvolvem-se ao final do segundo ano de vida; • A compreensão e o uso da linguagem desenvolvem-se rapidamente. • Desenvolve-se um apego aos pais e a outras pessoas; • Desenvolve-se a autoconsciência; • Ocorre uma mudança da dependência para a autonomia; • Aumenta o interesse por outras crianças. Fonte: Adaptada de PAPALIA e FELDMAN (2013) 13 UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem Para Gallahue e Ozmun (2005), os seres humanos apresentam a capacidade de interagir com o meio ambiente através dos movimentos. Essa capacidade sofre alte- rações ao longo do desenvolvimento da criança e durante todo seu ciclo de vida, de- vido a características como crescimento, maturação, capacidades físicas, e aspectos ambientais, como espaços, superfícies, inserção sócio cultural, além de, por último, as exigências das tarefas. Por volta do 2° mês, ao menos de acordo com alguns pesquisadores como Jean Piaget, existe sim, uma grande mudança na direção de comportamento em direção a ações mais propositais, contudo, é por volta dos 6 meses que a criança ganha um maior controle mo- tor. Essa evolução é gradativa, por volta de 1 mês o bebê ergue o queixo, aos 2 meses pode levantar o pescoço e aumenta assim a sua exploração visual, a manipulação para agarrar e para alcançar objetos começa a se desenvolver. Por volta de 5 meses, ele busca os objetos e o desenvolvimento segue, na medida em que o controle motor se torna melhor, outros tipos de exploração tornam-se possíveis, fazendo o processo de aprendizagem e desenvol- vimento se manifestarem como algo estreitamente relacionado (BEE, 2012). O ápice do refinamento da dimensão motora acontece por volta dos 6 anos de idade, ainda que todas as dimensões se desenvolvam até o final da vida. Recordando o conceito, as mudanças que ocorrem em um indivíduo desde sua concepção até a morte denominam-se desenvolvimento humano. O desenvolvimento é composto por mudanças comportamentais e estruturais. O processo de desenvol- vimento motor revela-se por alterações no comportamento motor, o que proporciona o processo de aprender a mover-se com controle e competência para interagir com o ambiente (GALLAHUE e OZMUN, 2001). O processo de desenvolvimento motor é apresentado por Gallahue e Ozmun (2001) em uma forma de ampulheta. Os autores caracterizam o desenvolvimento da dimensão motora por fases e expectativas de respostas. Estágio de Utilização Permanente Estágio de Aplicação Estágio Transitório Estágio Maduro Estágio Elementar Estágio Inicial Estágio de Pré-Controle Estágio de Inibição de Re�exos Estágio de Decodi�cação de InformaçõesEstágio de Codi�cação de Informações 14 anos e Acima De 11 a 13 Anos De 7 a 10 Anos De 6 a 7 Anos De 4 a 5 Anos De 2 a 3 Anos De 1 a 2 Anos do Nascimento Até 1 Ano De 4 Meses a 1 Ano Dentro do Útero e Até 4 Meses de Idade Utilização Permanente na Vida Diária Utilização Permanente Recreativa OS ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO MOTOR FAIXAS ETÁRIAS APROXIMADAS DE DESENVOLVIMENTO FASE MOTORA ESPECIALIZADA FASE MOTORA FUNDAMENTAL FASE MOTORA RUDIMENTAR FASE MOTORA REFLEXIVA Utilização Permanente Competitiva Figura 3 – Fases do desenvolvimento motor Fonte: Adaptada de GALLAHUE e OZMUN (2001) 14 15 Para os autores, as fases são divididas em: • Fase motora reflexiva: os reflexos são as primeiras formas de movimento humano. Esses são involuntários e formam a base para as fases do desenvolvimento motor. A partir da atividade de reflexos, o bebê obtém informações sobre o ambiente ; Nesta fase existem os estágios de codificação de informações (movimentos mais aleatórios) e a decodificação de informações (movimentos mais propositais) ; Reflexos do bebê, disponível em: https://bit.ly/2XAWJg6 • Fase de movimentos rudimentares: os movimentos rudimentares são determi- nados de forma maturacional e caracterizam-se por uma sequência de apareci- mento previsível. Esta sequência é resistente a alterações em condições normais. Elas envolvem movimentos estabilizadores, como obter o controle da cabeça, pescoço e músculos do tronco, as tarefas manipulativas de alcançar, agarrar e soltar, e os movimentos locomotores de arrastar-se, engatinhar e caminhar ; Figura 4 Fonte: Getty Images • Fase de movimentos fundamentais: as habilidades motoras fundamentais da primeira infância são consequências da fase de movimentos rudimentares. Esta fase do desenvolvimento motor representa um período na qual as crianças pequenas estão envolvidas ativamente na exploração e na experimentação das capacidades motoras de seus corpos ; Figura 5 Fonte: Getty Images 15 UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem • Fase de movimentos especializados: esse é um período em que as habilida- des estabilizadoras, locomotoras e manipulativas fundamentais são progressi- vamente refinadas, combinadas e elaboradas para o uso em situações crescen- temente exigentes. Figura 6 Fonte: Getty Images Guedes e Guedes (1997) referem-se ao desenvolvimento motor como sendo não apenas aspectos biológicos de crescimento e maturação. Os autores acreditam que o desenvolvimento depende das experiências vividas pelo indivíduo e das relações com o ambiente que o cerca. Le Boulch (1982) deixa evidente a preocupação de estudiosos da área em identificar os mecanismos e variáveis que influenciam o desenvolvimento motor e as fases específicas em que cada indivíduo é mais suscetível às influências de determinados estímulos. Nesta direção, compreendemos que o crescimento e maturação do ser humano é um processo natural, ainda que o ambiente pode afetar de maneira diferente o desenvolvimento das dimensões para cada indivíduo. O pesquisador Lev Semenovitch Vigotski, importante psicólogo russo, revolucio- nou o pensamento de sua época quando apresentou a sua particular compreensão do desenvolvimento humano na perspectiva histórico-cultural (BRANDOLISE, 2018). Lev Vigotski se opôs às concepções de desenvolvimento de sua época e acredita- va que o processo, ou as fases de desenvolvimento, estavam atrelados às condições de aprendizagem. Para o autor, aprendizagem e desenvolvimento não são sinônimos nem se antagonizam, mas estabelecem profundas relações. (BRANDOLISE, 2018). A teoria de Vigotski descreve que o desenvolvimento, acontece por uma dupla for- mação, ou seja, a dos planos biológico e cultural, que conduzem a esse processo. Retomando a Jean Piaget, a pergunta fundamental que ele formulou, em 1911, e que orientou suas pesquisas foi: como o ser vivo consegue se adaptar ao meio ambiente? Essa foi a pergunta que levou o pesquisador a duas situações problema, a da adaptação biológica e ao problema do conhecimento. Piaget chegou a duas ideias centrais, a primeira que a adaptação biológica de todo organismo vivo, assim como toda aquisição de repertório intelectual, se faz através da assimilação de um dado 16 17 exterior (ambiente) e o conhecimento não pode ser uma cópia, mas uma integração em uma estrutura mental pré-existente que, ao mesmo tempo, vai ser mais ou menos modificada por esta integração. A segunda ideia central é que os fatores normati- vos do pensamento correspondem às relações, às necessidades de equilíbrio que se observam no plano biológico. Assim, quando aprendemos algo novo precisamos organizar nossas estruturas (CAVICCHIA, 1993). Para o autor, o conhecimento acontece pelas trocas entre o organismo e o meio. Essas trocas são responsáveis pela construção da própria capacidade de conhecer, já que as informações do ambiente produzem estruturas mentais que, ainda que sejam orgânicas, não estão programadas no desenvolvimento do ser humano, mas apare- cem como resultado das solicitações do meio ao organismo, assim sua adaptação biológica (CAVICCHIA, 1993). A essa adaptação biológica entre o estímulo do ambiente e organização do or- ganismo para uma resposta, Piaget chama de processo de adaptação, e o autor complementa com dois aspectos: a assimilação e a acomodação. A adaptação do ser humano ao meio ambiente se realiza através da ação (organização de nossas es- truturas), elemento central da teoria piagetiana, indicando o centro do processo que transforma a relação com o objeto em conhecimento. A capacidade de organizar e estruturar a experiência vivida por cada ser humano é um processo das estruturas mentais que funcionam seriando, ordenando, classifi- cando e assim estabelecendo relações, porém, como apresentamos anteriormente, muitos aspectos estão envolvidos neste processo (maturação, ambiente, influências na gestação, momento do nascimento). Para Piaget, todo esse processo é denominado de desenvolvimento cognitivo. Nesse desenvolvimento, o autor elencou diferentes estágios que expressam as etapas pelas quais se dá a construção do mundo pela criança. Nas suas pesquisas, Piaget acreditava que para acontecer os estágios de desenvol- vimento é necessário, em primeiro lugar, que a ordem das aquisições seja constante. Trata-se de uma ordem sucessiva e não apenas cronológica, isso quer dizer que existe a dependência da experiência do sujeito, e não apenas de sua maturação ou do meio social. Além desse critério, Piaget propõe uma divisão por períodos ou fases para carac- terizar estágios no desenvolvimento cognitivo. Sendo assim, o pesquisador distinguiu quatro grandes períodos no desenvolvimento das estruturas cognitivas relacionados ao desenvolvimento da afetividade e da socialização da criança: estágio da inteligên- cia sensório-motora (de 0 a aproximadamente 2 anos); estágio da inteligência sim- bólica ou pré-operatória (2 a 7-8 anos); estágio da inteligência operatória concreta (7-8 a 11-12 anos); e estágio da inteligência formal (a partir, aproximadamente, dos 12 anos), (CAVICCHIA, 1993). Os estágios propostos por Piaget estão relacionados a degraus de equilíbrio, pois quando a criança recebe um estímulo todo o seu organismo deve se reestruturar para se reequilibrar, e, assim que o equilíbrio é atingido num ponto, a estrutura é integrada em novo equilíbrio em formação. 17 UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem Os diversos estágios ou etapas surgem, portanto, como consequência das suces- sivas equilibrações de um processo que acontece no decorrer do desenvolvimento. Essa construção só pode acontecer quando as competências cognitivas do ser humano estão preparadas para o próximo estímulo. A equilibração é, pois, o processo pelo qual se formam as estruturas cognitivas e constitui, em última análise, a expressão da lei funcional que afirma a atuação das estruturas. O processo que conduz desequilíbrios e reconstruções de estru- turas mentais é ofator determinante no progresso do desenvolvimento cognitivo (CAVICCHIA, 1993). Na teoria de Piaget, a concretização ou realização dessas possibilidades dependerá do meio no qual a criança se desenvolve, uma vez que a capacidade de conhecer é resultado das trocas do organismo com o meio. Da mesma forma, essa capacidade de conhecer depende, também, da organização afetiva, uma vez que a afetividade e a cognição estão sempre presentes em toda a adaptação humana. O desenvolvimento integral é um emaranhado de aspectos que envolvem a com- plexidade do ser humano. Esses aspectos, como vimos, são compostos pela nossa complexidade interna e nossa interação e relação com o ambiente (externo), com seus espaços, objetos e pessoas. É importante recordarmos que, quando falamos em desenvolvimento integral, estamos afirmando que o desenvolvimento nunca acontece em dimensões isoladas, e sim em conexão com toda sua complexidade. Figura 7 – Imagem referente ao desenvolvimento integral, com todas as dimensões atuando Fonte: sxc.hu 18 19 Agora, vamos conhecer a importância do corpo neste desenvolvimento integral. Assim como todos os nossos aspectos, a dimensão motora é parte integrante do ser humano e da sua experiência humana. Portanto, mais do que um deslocamento do corpo no espaço, o movimento constitui-se como uma linguagem, em algumas fases de desenvolvimento, como a única forma de comunicação e interação com o ambiente. Por meio do corpo e do movimento, a criança interage e se comunica. Conhece mais sobre si, sobre o outro e o mundo que a cerca. Expressa sentimentos, emoções e pensamentos, aprimorando seus gestos e posturas corporais e, nessa direção, se desenvolve. Na próxima unidade, vamos conhecer a Psicomotricidade, uma ciência que estuda o homem em seu desenvolvimento integral, com suas relações internas e externas. 19 UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Compreendendo o Desenvolvimento Motor Obra mundialmente reconhecida, apresenta um texto acessível com base descritiva e explicativa para os processos e produtos dinâmicos do desenvolvimento motor. Abrangendo todas as fases da vida a partir de uma perspectiva das restrições, o livro enfoca as fases do desenvolvimento motor, proporcionando uma sólida introdução aos aspectos biológicos, afetivos, cognitivos e comportamentais de cada fase. Os autores trazem o que há de mais atual em termos de teoria e pesquisa, utilizando o Modelo de Ampulheta Triangulada como estrutura conceitual que auxilia o leitor no entendimento do desenvolvimento motor do bebê, da criança, do adolescente e do adulto. GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C. D.; GOODWAY, J. Compreendendo o Desenvolvimento Motor. 7 ed., Amgh Editora. Vídeos D-14 - O movimento do corpo infantil - uma linguagem da criança Neste vídeo, você verá uma escola que utiliza o movimento como base para o trabaho pedagógico, e o quanto é importante o seu uso para o desenvolvimento infantil, pois é considerada uma linguaguem de cominucação que a criança utiliza. https://youtu.be/X1UzQjKZVUA PhD. David Gallahue na FSG - FSG Comunica 39ª Edição Neste vídeo você verá uma pequena entrevista realizada com o Prof. David Lee Gallahue, um dos mais importantes pesquisadores sobre o desenvolvimento motor. O Curso de Educação Física da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) promoveu o 3º Congresso Internacional de Motricidade da Serra gaúcha. https://youtu.be/1_R9-BBKyLM Leitura A importância do movimentar-se e suas contribuições para o desenvolvimento A didática do professor nas aulas de educação física infantil: a importância do movimentar-se e suas contribuições para o desenvolvimento da criança. Autores: Lillian dos Santos Belo Oliveira e Carolina Petruy. https://bit.ly/2yk5GQp 20 21 Referências BASSEDAS, E.; HUGUET, T.; SOLE, I. Aprender e Ensinar na Educação Infantil. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999. BEE, H.; BOYD, D. A criança em desenvolvimento. Porto Alegre: Artmed. 2011. BRANDOLISE, F. M. Desenvolvimento Humano, Brincadeira, Educação Infan- til e as Contribuições de Vigotski e Winnicott. Piracicaba: UNIMEP, 2018. CAVICCHIA, D. de C. O Cotidiano da Creche: um projeto pedagógico, São Paulo: Loyola, 1993. GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C. Compreendendo o Desenvolvimento motor: bebê, criança, adolescente e adulto. 1 ed., São Paulo: Phorte Editora, 2001. ________. Compreendendo o desenvolvimento motor: Bebê, Criança, adoles- cente e adulto. 3 ed., São Paulo: Phorte Editora, 2005. GUEDES, D. P.; GUEDES, J. E. R. P. Características dos programas de educação física escolar. Revista Paulista de Educação Física, v.11, n.1, p.49-62, 1997. LE BOULCH, J. Educação psicomotora: a psicomotricidade na idade escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987. PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Editora Forense: 1964. SALLES, V. O.; MATOS, E. A. S. Á. de. A Teoria da Complexidade de Edgar Morin e o Ensino de Ciência e Tecnologia. Revista Brasileira de Ensino de Ciência e Tecnologia, v. 10, n. 1, 2017. 21 Corpo, Movimento e Psicomotricidade Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Me. Evelyn Camponucci Cassillo Rosa Revisão Textual: Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira Fundamentos da Psicomotricidade Fundamentos da Psicomotricidade • Apresentar a história da psicomotricidade e suas bases conceituais; • Estudar como podemos utilizá-la na educação e nos campos de experiências propostos pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Introdução; • Bases Conceituais da Psicomotricidade; • Breve Revisão da História da Psicomotricidade; • A Psicomotricidade Aplicada à Educação. UNIDADE Fundamentos da Psicomotricidade Contextualização Para nosso momento de contextualização, sugerimos que leia um pequeno artigo da revista Nova Escola intitulado: O corpo, o movimento e a aprendizagem. O artigo fala da importância do trabalho com a dança nas escolas e defende a ideia de que “quem dança tem mais facilidade para construir a imagem do pró- prio corpo, o que é fundamental para o crescimento e a maturidade do indivíduo e a formação de sua consciência social”. Leia o artigo e faça uma reflexão sobre a importância da dança no currículo escolar. Ressaltamos a importância do estudo da unidade para a sua formação pessoal e profis- sional. Acesse em: https://bit.ly/2KsYFzv 8 9 Introdução Nesta unidade, vamos conversar a respeito da Psicomotricidade e mostrar o quan- to seu papel é importante para o desenvolvimento humano nas dimensões motoras, afetivas/socias e cognitivas. Como educadores, ao planejarmos uma aula, devemos conhecer quem são os nossos educandos e as fases em que se encontram, para produzirmos atividades que tenha conexão com o documento normativo (BNCC – Base Nacional Comum Curri- cular), não fazendo uma separação entre corpo e mente, e sim pensando na criança/ adolescente como um sujeito em processo de desenvolvimento integral. Assim sendo, veremos a partir de agora a importância da Psicomotricidade e do movimento, e suas implicações no desenvolvimento humano e na aprendizagem. Bases Conceituais da Psicomotricidade Na unidade anterior, apresentamos as bases de conhecimento do ser humano. Compreendemos a necessidade de um desenvolvimento integral e reconhecemos a importância do corpo e do movimento. Esse desenvolvimento integral é um emaranhado de aspectos que envolvem a complexidade do ser humano. Esses aspectos, como apresentamos, são compostos por nossa complexidade interna e pela interação e relação com o ambiente (externo), com seus espaços, objetos e pessoas. É importante recordarmos que, quando falamos em desenvolvimento integral, estamos afirmando que o desenvolvimento nunca acontece em dimensões isoladas, mas sim como uma grande congruência entre o interno e o externo. Nesta unidade, vamos conhecer a Psicomotricidade e como essa ciência pode nos ajudar a entender o desenvolvimentoem toda a sua integridade. O corpo e sua interação com o ambiente promovem a aprendizagem, o desenvol- vimento. Essa capacidade do ser humano para sentir e utilizar o corpo como uma manifestação com o mundo é o que chamamos de corporeidade. Entenda um pouco mais sobre o conceito de corporeidade e sua importância na educação, no desenvolvimento integral e nos conceitos de Psicomotricidade. Neste vídeo, o professor Walter Roberto Coelho comenta sobre o conceito de corporeidade e sua importância na edu- cação. Acesse em: https://youtu.be/SOYcovFKA2M Atualmente, qual área da ciência pode estudar essa corporeidade e toda a sua integração? Afinal, o movimento e os gestos de cada criança estão ligados à sua 9 UNIDADE Fundamentos da Psicomotricidade maturação. A corporeidade de cada indivíduo evolui de acordo com sua estrutura cognitiva, suas experiências afetivas. O desenvolvimento da corporeidade depende, assim, de todas as dimensões: o desenvolvimento das relações neuronais estabele- cidas entre as áreas sensoriais e motoras do cérebro, as emoções e relações sociais. A Psicomotricidade é uma área que promove o estudo dessas integrações. Segundo a Associação Brasileira de Psicomotricidade (ABP), trata-se de uma ciência que tem como objeto de estudo o homem através de seu corpo em movimento, em relação ao mundo interno e externo. Contudo, não apenas de movimento é composta, mas também de intelecto e afeto (emoção), ou seja, três pilares que, basicamente, formam as capacidades humanas. Para a ABP, a Psicomotricidade, portanto, é um termo empregado para uma concepção de movimento organizado e integrado, respeitando a individualidade em função das experiências vividas pelos sujeitos. O termo psicomotricidade pode ser entendido como a função do ser humano que sintetiza psiquismo e motricidade, com o propósito de permitir ao indivíduo adaptar- -se de forma flexível e harmoniosa ao meio que o cerca. Agora, vamos entender um pouco mais sobre o termo psiquismo? Figura 1 Fonte: Getty Images Psiquismo ou o psíquico é o nome científico que resume as noções de alma, espírito, mente, pensamento, conduta, comportamento, vida pessoal, drama pessoal humano, vida intelectual, afetiva e ativa. A consciência é um sistema que engloba um conjunto de conhecimentos que, por sua vez, é o universo simbólico que ocorre pela representação semântica da realidade. O pesquisador Lev Vygotsky chamou a essa representação de signos. É essa represen- tação que possibilita ao ser humano realizar atividades abstratas, teóricas e subjetivas. A consciência torna-se assim a expressão do psiquismo. A partir dos pensamen- tos, as pessoas criam objetivos, desejos e tudo que é pertinente à sua consciência, a 10 11 existência objetivada em uma imagem psíquica é o reflexo da realidade concreta pela ideia que a consciência constrói perante essa mesma realidade. Nesse momento, ocorre a transformação das imagens em signos e na sequência elabora-se o sistema de signos que compreendemos como linguagem (SILVA ,2016). Nesta direção, o processo de desenvolvimento do psiquismo humano ocorre por meio de elementos e de determinações presentes na cultura histórica e socialmente desenvolvida na ação do ser humano, assim, a evolução do psiquismo humano é influenciada pela cultura, isto é, pelas objetivações e apropriações realizadas pelo ser humano, em dado momento histórico (SILVA, 2016). Ainda não entendeu o que é psiquismo? No vídeo Aspectos que compõe o Desenvolvi- mento Psíquico, a Psicóloga clínica e educacional Mônica Alves apresenta informações sobre a formação do psiquismo. Acesse em: https://youtu.be/-lRNKXIcFls Agora, vamos entender mais sobre o termo motricidade? Figura 2 Fonte: Getty Images Já na motricidade estão os movimentos, com uma complexidade de ligações entre impulsos elétricos, nervos, músculos, que funcionam para permitir todas as ações automáticas e voluntárias. O papel da psicomotricidade está exatamente em entender a relação entre psiquismo e motricidade, e como ela pode afetar o desenvolvimento humano. A Psicomotricidade quer destacar a relação existente entre motricidade e psi- quismo, e, nesta relação, estamos falando da totalidade da criança, seus proces- sos mentais, a afetividade e toda as respostas da criança com o mundo externo (COLEVATI; PINHO E SORROCHE, 2009). Portanto, a psicomotricidade pode ser entendida como uma área de conheci- mento que vai ajudar você a entender as características de desenvolvimento do seu aluno, organizando atividades que possibilitem à criança conhecer de uma maneira concreta seu ser e seu ambiente. 11 UNIDADE Fundamentos da Psicomotricidade Quanta informação! Na disciplina Corpo, Movimento e Psicomotricidade, preciso conhecer tudo isso? Figura 3 Fonte: Getty Images Sim, o desenvolvimento integral da criança depende de fatores como o desen- volvimento cognitivo, afetivo e corporal/motor. Neste aspecto, a psicomotricidade integra o movimento aos fatores psíquicos e sociais do indivíduo, proporcionando uma visão que estabelece total relação com o pensamento complexo, essa aborda- gem holística amplia o olhar do profissional, contribuindo para novas descobertas nas dificuldades de aprendizagem e desenvolvimento. Breve Revisão da História da Psicomotricidade Os estudos sobre a Psicomotricidade, como objeto de pesquisa, iniciaram-se na década de 60, sendo que seu auge aconteceu nos anos 70 e 80. Anteriormente, o movimento humano era estudado apenas nos aspectos físico e motor, porém, nos dias atuais, os estudos relacionados ao desenvolvimento corporal e motor passaram a enfatizar o ser humano em toda a sua integração, e assim, como já relatamos, os fatores psíquicos e sociais foram introduzidos ao estudo da motricidade (HAETINGER, 2005). Assim, os relatos mostram que os estudos da psicomotricidade ainda são recentes e, no decorrer de tão pouco tempo, já passou por olhares de diferentes perspecti- vas. Na primeira fase, a pesquisa fixou-se, sobretudo, no desenvolvimento motor da criança, e, com o avanço das pesquisas, os estudos passaram a verificar a relação entre o atraso no desenvolvimento motor e o atraso intelectual da criança, e, a partir daí, a área de conhecimento da psicomotricidade foi ampliada. Segundo Bueno (1998), as escolas europeias e americanas contribuíram de maneira efetiva para a evolução da psicomotricidade, sobressaindo-se a escola francesa, a qual influenciou no direcionamento que a área da psicomotricidade vem seguindo até hoje. 12 13 O professor Vítor da Fonseca, catedrático da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa, docente no Departamento de Educação Especial e Reabilitação, e mestre em Dificuldades de Aprendizagem pela Universidade de Northwestern, Psicopedagogo e psicomotricista, tem sido responsável clínico, ao lon- go de trinta anos, em vários centros de observação e reeducação psicoeducacional privados. Ele aponta os pioneiros na área, dentre eles, Fonseca (1995) cita Dupré, que, em 1909, concedeu destaque ao termo psicomotricidade após relacionar pertur- bações psicológicas a motoras. A figura de Ernest Dupré, neuropsiquiatra, em 1909, é de fundamental importân- cia para o âmbito psicomotor, já que é ele quem afirma a independência da debilidade motora (antecedente do sintoma psicomotor) de um possível correlato neurológico. Outro pioneiro no estudo da psicomotricidade no campo científico foi Henri Wallon, médico, psicólogo e pedagogo, que em 1925, principiou os estudos da reeducação psicomotora no desenvolvimento psicológico da criança e também introduziu o senso de identidade corporal. Wallon ocupa-se do movimento humano, dando-lhe uma cate- goria fundamental como instrumento na construção do psiquismo, permitindo assim, relacionar o movimento ao afeto, à emoção, ao meio ambiente e aos hábitos de cada indivíduo. Assim, a teoria walloniana influenciou ao longo dos anos vários campos de atuação como a psicologia, pedagogia, psiquiatria,medicina e educação física. Ain- da de acordo com Fonseca (1995), Edouard Guilmain, neurologista, desenvolveu, em 1935, um exame psicomotor para fins de diagnóstico e indicação terapêutica. Você sabia que Wallon foi responsável pela teoria da emoção? Psicólogo da criança, ideali- zador da reforma do sistema de ensino francês, essas são algumas das maneiras comuns de identificar a obra do médico, filósofo e educador Henri Wallon (1879-1962). Todas elas estão corretas, mas também incompletas. “Na verdade, ele é tudo isso, mas é, principalmente, um psicólogo do desenvolvimento”, diz a vice coordenadora do Programa de Psicologia da Educação da PUC-SP, Laurinda Ramalho de Almeida. Acesse o link a seguir e descubra mais sobre esse grande pensador da educação: Disponível em: https://youtu.be/ZfXIkidkFQI O psiquiatra e professor Ajuriaguerra, em 1947, redefiniu o conceito de debi- lidade motora, considerando-a como uma síndrome com suas próprias particula- ridades. Foi ele quem delimitou os transtornos psicomotores que oscilam entre o neurológico e o psiquiátrico. Piaget (1896-1980) foi um dos autores que mais estudou as interrelações entre a psicomotricidade e a percepção através de ampla experimentação. Ele descreve a importância do período sensório-motor e da motricidade principalmente antes da aquisição da linguagem, no desenvolvimento da inteligência. Para ele, o desenvol- vimento mental se constrói, paulatinamente. É uma equilibração progressiva, uma passagem contínua de um estado de menor equilíbrio para um estado de equilíbrio superior. A inteligência, portanto, é uma adaptação ao meio ambiente. Para que isso possa ocorrer é necessário, inicialmente, a manipulação dos objetos do meio com a modificação dos reflexos primários (OLIVEIRA, 2007, p.31). 13 UNIDADE Fundamentos da Psicomotricidade As contribuições de Ajuriaguerra, somadas às de Wallon e Piaget influenciaram o curso de pensamentos de outros autores como: R. Diatkine, J. Buges, Jolivet, S. Leboaci, permitindo-lhes redefinir os objetos da psicomotricidade, dando ênfase es- pecial à relação, às emoções e ao movimento. Essas redefinições também sofreram influência de conceitos psicanalíticos relativos ao campo de afetividade, destacando- -se psicanalistas como S. Freud, M. Klein, J. Lacan, W. Reich, P. Schilder, F. Dolto, Samí Alí, D. Winnicott, Manoni, entre outros. Segundo Fonseca (1995), em 1947-1948, Ajuriaguerra e Datkine provocaram uma mudança na história da psicomotricidade e redefiniram o conceito de debi- lidade motora considerando-a como uma síndrome de propriedades particulares. Ajuriaguerra, em seu Manual de Psiquiatria Infantil, delimita com clareza os transtornos psicomotores que oscilam entre o neurológico e o psiquiátrico. É nesta oscilação que situa os transtornos propriamente psicomotores. Na década de 70, devido à influência das pesquisas de Wallon, surgem os tra- balhos na educação psicomotora, por Le Boulch, que desde 1966, em seu livro “A Educação pelo Movimento”, tinha como objetivo inicial sensibilizar os professores do primeiro grau quanto ao problema da educação psicomotora na escola, pois era um contexto desfavorável à pedagogia da época, centrada na aquisição das “Habilidades Escolares de Base”. Somaram-se a estes os trabalhos os de L. Pick, P. Vayer, André Lapierre, Bernard Auconturier, Defontaine, J. C. Coste e outros, que percebiam nesse momento a educação psicomotora, enquanto maneira original de ajudar a criança inadaptada a desenvolver suas potencialidades e ter acesso ao mundo escolar. Agora que conhecemos um pouco sobre a história da psicomotricidade, vamos entender como essa área pode auxiliar na sua formação. Conheça um pouco mais sobre as Etapas do Esquema Corporal de Le Boulch. Disponível em: https://youtu.be/1SUr6ilFwX8 A Psicomotricidade Aplicada à Educação O conceito de psicomotricidade passou por muitas mudanças. No início, obser- vamos que o corpo era o único aspecto estudado, já atualmente, o termo psico- motricidade é visto como o relacionar-se através da ação, ou seja, o sujeito na sua integração, unindo todas as suas dimensões de desenvolvimento. Nesta direção, a área psicomotora está associada com a afetividade, a persona- lidade do indivíduo ao seu corpo, pois ele se utiliza do movimento para expressar sentimentos e pensamentos. Segundo Fonseca (2004), atualmente a psicomotricidade deve ser compreendida como uma forma de integração da criança com o meio, assim, a psicomotricidade compreende as habilidades motoras relacionadas aos fatores psicológicos e ambien- 14 15 tais. E, dessa forma, o desenvolvimento psicomotor não envolve somente as áreas motoras, mas também prioriza as habilidades e expressões corporais. Portanto, é pela representação corporal e pelo movimento que interligamos as di- mensões motora, cognitiva e afetiva/social para o desenvolvimento de um ser humano. Os avanços da psicomotricidade foram além dos aspectos motrizes. Hoje, ela pro- porciona o desenvolvimento da socialização entre os indivíduos, auxilia na aquisição de aprendizagens como leitura, escrita e pensamento lógico-matemático. Esse desenvol- vimento tem papel fundamental nos primeiros anos de vida escolar da criança, pois é nessa fase que se observam possíveis desvios das capacidades motoras, evitando então futuras dificuldades de aprendizagem. Dentre as inúmeras linhas de atuação da psicomotricidade, a área da educação deve ter um grande conhecimento desta ciência, uma vez que as crianças na Educação Infantil estão no ápice do desenvolvimento psicomotor. Nos primeiros anos de vida, as crianças exploram o mundo que as rodeiam com seus corpos, através dos movimentos. Assim, é importante compreendermos que para um desenvolvimento psicomotor adequado o movimento é muito importante. Vale lembrar que um processo de aprendizagem é um sistema complicado, no qual a criança deve ser preparada na área cognitiva e afetiva. Para que tudo isso aconteça, umas das competências está calcada no desenvolvimento e na exploração que dependem do movimento. A criança, durante o tempo que está sendo alfabetizada, por exemplo, utiliza-se de elementos psicomotores que facilitarão quando tiver que ler e escrever. Inscreva-se no canal do Youtube “Doses de Psicomotricidade”. Com bom humor e uma didática leve, você receberá conhecimentos esclarecedores sobre os temas relacionados à psicomotricidade. Disponível em: https://bit.ly/2VwE3Nc A educação infantil é um período de suma importância para o desenvolvimento integral da criança, e a psicomotricidade tem uma importante contribuição para as crianças na faixa etária de até 5 anos, que estão em uma fase em que o movimento vai além de uma forma de comunicação, pois é algo que lhes traz prazer. Além da parte motora, as atividades que envolvem o movimento podem ajudar a criança no desenvolvimento de seu raciocínio, imaginação, criatividade, afetividade e socialização. Os professores devem estar atualizados quanto às principais áreas do desenvol- vimento psicomotor na busca por recursos de auxílio na aprendizagem escolar e no desenvolvimento adequado das fases da criança. Experiências motoras são de fundamental importância para o desenvolvimento cognitivo, pois pelo movimento a criança explora e se relaciona com seu meio ambiente. O movimento se relaciona com o desenvolvimento cognitivo, no sentido de que a integração das sensações provenientes de movimentos resulta na percepção, e toda 15 UNIDADE Fundamentos da Psicomotricidade aprendizagem simbólica posterior depende da organização dessas percepções em forma de estruturas cognitivas. Por meio da exploração motora, a criança desen- volve consciência do mundo que a cerca e de si própria. O controle motor possibilita à criança experiências concretas, que servirão como base para a construção de noções básicas para todo o seu desenvolvimento (ROSA NETO, 1996). Infelizmente, a escola ainda despreza o corpo no desenvolvimento da criança. O
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