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O COLAPSO DOS DIREITOS HUMANOS E O ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA NO APAGÃO DO AMAPÁ: A perspectiva de Hannah Arendt sobre a abdicação do pensamento crítico¹ Amélia Cristina Santana da Silva² RESUMO O presente paper tem como objetivo analisar os erros e as omissões na crise elétrica do estado amapaense e as violações dos Direitos Humanos dos órgãos responsáveis pela companhia elétrica, além de observar o descaso da distribuidora estatal e do Ministério de Minas e Energia. Baseado na concepção de banalidade do mal de Hannah Arendt e na generalização de valores e sacralização da pessoa de Hans Joas, este trabalho pretende ressaltar a negligência humana e governamental a respeito do apagão em treze de dezesseis cidades no Amapá, a partir da interpretação da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Para isto, foi realizando uma pesquisa bibliográfica, sendo Hannah Arendt e Hans Joas como as principais referencias. Palavras-chave: Direitos Humanos. Omissão. Hannah Arendt. Hans Joas. THE COLLAPSE OF HUMAN RIGHTS AND THE STATE OF PUBLIC CALAMITY IN THE BLACKOUT OF AMAPÁ: Hannah Arendt's perspective on the abdication of critical thinking ABSTRACT This paper aims to analyze the errors and omissions in the electric crisis in the state of Amapá and the human rights violations of the bodies responsible for the electric company, in addition to observing the neglect of the state distributor and the Ministry of Mines and Energy. Based on Hannah Arendt's conception of banality of evil and the generalization of values and the sacredness of the person of Hans Joas, this work intends to highlight the human and governmental negligence regarding the blackout in thirteen of sixteen cities in Amapá, from the interpretation of the Declaration Universal Declaration of Human Rights. For this, a bibliographic research was carried out, with Hannah Arendt and Hans Joas as the main references. ¹ Paper apresentado à matéria Historia do Pensamento Jurídico como requisito para a avaliação da disciplina. ² Discente regularmente matriculada no Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Pará. 1 INTRODUÇÃO Ao escrever os cinco artigos que compuseram o livro Eichmann em Jerusalém, Hannah Arendt desenvolve o conceito de banalidade do mal, isto é, ao analisar o julgamento do nazista Adolf Eichmann, a filósofa alemã compreende que ele foi uma ferramenta da ideologia nazista, ou seja, apenas um cidadão cumpridor das leis entre tantos alemães. Assim, abdicação do pensamento crítico foi essencial no Holocausto. Nesse contexto, a indiligência dos órgãos de controle da subestação, no Amapá, sabiam do problema no transformador há dois anos e, além disso, a Aneel e o Ministério de Minas e Energia foram informados que a instalação operava no limite, desde o governo Temer. Além dos transtornos causados pela pandemia do Coronavírus, a crise elétrica do Amapá viola a dignidade humana, prevista pelos Direitos Humanos e, sobretudo, pela Constituição Federal brasileira. O caos instaurado pela negligência e descaso de vários segmentos sociais, frisa a importância da generalização de valores e da sacralidade da pessoa de Hans Joas que conflue com as teorias de Hannah Arendt. O conceito de generalização de valores expressa a universalização da declaração internacional de direitos humanos e a formulação de uma ideologia pautada na sacralização da pessoa com individuo, ou seja, a partir de intensidade afetiva e com a ausência de essência religiosa. As percepções dos dois autores corroboram para afirmar as transgressões de direitos inalienáveis dos cidadãos amapaenses. Nessa perspectiva, a controversa a ser exposta no presente paper se trata de investigar e expor todas as questões sobre a crise elétrica no Amapá, haja vista que Hannah Arendt constata que, às vezes, o próprio Estado é responsável por mazelas sociais e pela disseminação de ideologia que incentive a falta de pensamento crítico (ARENDT, 2013, pg. 17-35), desse modo, a compilação de omissões, desde 2018, sobre a subestação amapaense confirma a quebra compromisso estatal do município e do Governo Federal. Ademais, o estado de calamidade pública também resulta em um “estado selvagem” proposto de pelo contratualista Thomas Hobbes, uma vez que a taxa de assaltos e crimes subiu desde o primeiro dia sem energia. A falta de água, de abastecimento e de recursos hospitalares aumenta o caos no estado, entretanto, o bom senso e a empatia de lideres políticos, com ajudas humanitárias, auxilia no mínimo de qualidade de vida que os cidadãos precisam neste período. Este trabalho tem o intuito de analisar os fatos ocorridos contra os direitos humos no apagão do Amapá, uma vez que as autoridades conheciam os posteriores problemas em uma possível pane. À luz dos conceitos de banalidade do mal e generalização dos valores de Hannah Arendt e Hans Joas, respectivamente. 2 A NEGLIGÊNCIA E AS OMISSÕES NA CRISE ELÉTRICA DO AMAPÁ O estado do Amapá sofre com a falta de energia desde o dia 3 de novembro de 2020, quando houve um incêndio na subestação de energia, em Macapá. Após o ocorrido, a interrupção do abastecimento de eletricidade provocou o blecaute em treze de dezesseis municípios amapaense. Ademais, ao longo de trezes dias de instabilidade energética e de rodízio elétrico nas cidades, no dia 17 de novembro de 2020, o Amapá sofreu um novo apagão. Há dois anos, em 2018, os documentos do Ministério de Minas e Energia, do Operador Nacional do Sistema (ONS) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) mostravam que a subestação incendiada operava no limite de capacidade. Além disso, um dos documentos comprova que havia dificuldades com a linha de segurança quando ainda era um projeto. Antes da contratação do grupo espanhol Isolux, que comprou o projeto em um leilão, o Comitê Técnico da Transmissão do MME apontava a indispensabilidade à subestação de Macapá ter três transformadores trifásicos e uma unidade reserva. Para entender o sistema elétrico brasileiro é necessário explicar que três tipos empresas são responsáveis por gerar, ou seja, produzir energia; por transmitir energia todo o país e por distribuir, a conexão final ao consumidor. O que ocorreu em Macapá foi responsabilidade da empresa transmissora, que fazia parte do grupo Isolux, mas foi vendida a Gemini Energy após falir. A empresa Gemini Energy, há dois meses do incêndio, buscava técnicos e especialistas para a manutenção do transformador. No segundo blecaute, a população ficou a mercê novamente. Segundo a Eletronorte, o novo apagão pode ter sido falha no sistema de distribuição, conforme o informado ocorreu o desligamento da Usina Hidrelétrica de Coaracy Nunes em decorrência a um evento externo à Usina. Após todos os transtornos causados pelo colapso elétrico e pela pandemia, os cidadãos do Amapá têm incerteza sobre o regresso da normalidade, uma vez que há falhas nos sistema de rodízio, perdas materiais, preços abusivos nas passagens aéreas, a falta de abastecimento e a não conservação de alimentos. O mais preocupante é o aumento dos números de infectados e mortes de COVID-19, segundo o Conselho Nacional de Saúde (Conass), o número de infectados aumentou 1204 casos, após uma semana de apagão, já as mortes subiram para 24 óbitos. No dia 18 de novembro de 2020, o presidente Jair Messias Bolsonaro, em um evento em Goiás, ignorou todas as perguntas dos jornalistas sobre o blecaute no Amapá. O estado que não recebeu visita presidencial após o acorrido, foi mencionado pelo presidente, em uma rede social, após quatro dias sem luz, na qual Bolsonaro isentou de culpabilidade o governo federal. Com a cidadania em xeque, o caos público instaurado e os órgãos se esquivando da responsabilidade, é nítida a violação da dignidade da pessoa humana, sendo este o principal ponto deste trabalho. A proteção e a propagação dos Direitos Humanossão princípios dos Estados nacionais e no Brasil não poderia ser diferente. Negar visibilidade e assistência oferece descaso ao Amapá, e isto é ferir os direitos fundamentais dos brasileiros. 3 A QUEBRA DOS DIREITOS HUMANOS De acordo com o preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, “Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.” (Assembleia Geral da ONU, 1948). Desse modo, é explicito que o blecaute no Amapá infringe os preceitos básicos á dignidade da pessoa humana. O art.4.° da Constituição Federal brasileira promulga a prevalência dos Direitos humanos, entretanto, com a falta de energia elétrica, de abastecimentos de água e a crise humanitária resultante do apagão, evidenciam as violações dos direitos naturais do amapaenses. Segundo os relatos dos afetados, a falta de energia nega informações sobre o próprio Estado, propicia noites de calor insuportáveis, haja vista que o estado é cortado pela Linha do Equador e afirmam que o sistema de rodízio ocasiona pane em eletrodomésticos e eletrônicos, assim perdendo bens materiais. Outros relatos denunciam as truculências policiais ás manifestações em Macapá, ocasionando pessoas feridas por armas de bala de borracha. A falta de voz que região Norte tem no resto do Brasil foi estampada nas mídias sociais. Apesar de toda a comoção nacional em prol do estado, certos brasileiros ignoram o acontecido, ou pior, tornam a crise medíocre sob sua perspectiva. Para o sociólogo Zygmunt Bauman, a característica da sociedade pós-moderna é o individualismo (BAUMAN, 2001, pg. 244), dessa forma, o dever dos cidadãos de cobrar direitos e respostas do Estado, perde força ser não há unidade social. É inadmissível que quase 90% da população do Amapá permaneça em situações precárias, de abandono, descaso e negligência. Por meio dos relatos e denuncias, revela-se que a propagação dos Direitos Humanos, no período do apagão, foi descontinuada pelos principais órgãos responsáveis e que o egocentrismo da sociedade brasileira nega visibilidade a calamidade pública do Amapá. Para a alemã Hannah Arendt, em nome dos interesses pessoais muitos abdicam do pensamento crítico (ARENDT, 1999, pg. 137) e ,baseado nisso, o que o ocorre no norte do país é a abdicação do senso moral e ético, em âmbito governamental e social. 4 A ESSÊNCIA DE BANALIDADE DO MAL NO AMAPÁ E GENERALIZAÇÃO DE VALORES O conceito do mal era compreendido até a Segunda Guerra Mundial como uma prerrogativa teológica, a partir das novas definições dos filósofos modernos, o mal passar a ser entendido como algo inerente ao homem. Assim, a filósofa Hannah Arendt constrói a definição de banalidade do mal, baseada nas atrocidades da Alemanha nazista e no julgamento de Adolf Eichmann. Para Arendt, o mal é comum, o mal é banal. Ao analisar o depoimento de Eichmann, a autora percebe que não era possível enxergar o anti-semitismo no alemão responsável pelo transporte dos judeus aos campos de concentração, e o próprio acusado de homicídio se considerava inocente, pois alegava que apenas seguia ordens superiores e que ele nunca havia matado um judeu ou um não judeu (ARENDT, 1999, pg. 33-35). Aqui nota-se que a normalização das ordens transcendeu o discernimento crítico e, sobretudo, o senso moral e ético. A banalização das ações do Estado ultrapassa fronteiras temporais e geográficas. Desde o Regime Militar brasileiro, em 1964, até o Apagão no Amapá, em 2020, a negligência do Estado com a dignidade humana, posiciona os brasileiros às margens dos Direitos Humanos. A Declaração Universal dos Direitos Humanos delineia os direitos humanos básicos e no contexto de sua publicação, pós segunda Guerra Mundial, seu principal intuito ainda é que o próprio Estado não se torne bandido, ou seja, que nunca fira os direitos mais básicos das pessoas. O que ocorreu no Amapá foi erro das empresas privadas e, acima de tudo, dos órgãos fiscais responsáveis, nos quais são estatais. Há dois anos, o próprio Ministério de Minas e Energia era ciente do limite de capacidade do transformador e nada foi feito para troca imediata do equipamento. Sob a ótica da proteção da pessoa humana, Hans Joas sugere a generalização de valores alicerçada nos Direitos Humanos a partir da compreensão histórica por meio da dialética, isto é, a sensibilidade na comunicação adere validade ao argumento moral (RODRIGRUES, Bráulio. SIMÕES, Sandro. A Declaração Internacional dos Direitos Humanos e a generalização dos valores: memória e escândalo na genealogia dos direitos subjetivos. Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito, Belém, setembro-dezembro, 2018). Fundamentado na perspectiva do sociólogo alemão Hans Joas, cultiva a dialética sobre os direitos dos brasileiros é essencial para que não ocorram violações das garantias individuais. Ter energia elétrica, abastecimento de água potável e dignidade são regalias de qualidade de vida, e conforme a Constituição Federal, isso é uma garantia fundamental ao brasileiro. Os valores sociais devem ser perpetuados na comunidade para que situações como o Apagão no Amapá não se banalize na sociedade. Faz parte dos objetivos fundamentais do Brasil, construir uma sociedade livre, justa e solidária, conforme o art.3.° da Constituição Federal, assim, as análises de Joas são válidas à propagação da sacralização da pessoa. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O trabalho apresentado teve como observação os relatos e denúncias sobre o blecaute no Amapá, com a análise da violação dos Direitos Humanos. Nessa essa perspectiva, os estudos de Hannah Arendt e Hans Joas ajustaram-se para aprofundar os motivos que levaram a negligência e descaso nas esferas estatais e sociais. Desse modo, as particularidades humanas, pós Holocausto, são significativas na exploração do individualismo vivido na crise elétrica amapaense. Como propõe Zygmunt Bauman, a sociedade pós-moderna vive a dissociação entre individuo e sociedade, logo, o homem se torna incapaz de se colocar no lugar do outro. Nesse propósito, foi observada a essência de banalidade do mal no Amapá e como as características de omissão dos Estados no século XX ainda se conservam nas políticas públicas de resolução de crise em 2020, no Brasil. Portanto, a proteção dos Direitos Humanos torna-se primordial em qualquer situação do estado democrático e não deve ser latente em circunstâncias de calamidade pública. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARENDT, Hannah. As origens do totalitarismo. São Paulo: Companhia de Bolso, 2013. A Declaração Internacional dos Direitos Humanos e a generalização dos valores: memória e escândalo na genealogia dos direitos subjetivos, set. 2018. Disponível em: http://revistas.unisinos.br/index.php/RECHTD/article/view/rechtd.2018.103.07/60746880. Acessado em: 12 de novembro de 2020. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 10 de Dez. de 1948. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-humanos. Acessado em: 12 de novembro de 2020. Os erros e omissões na crise do Amapá, 12 de Nov. de 2020. Disponível em: https://blogs.oglobo.globo.com/miriam-leitao/post/erros-e-omissoes-na-crise-do-amapa.html. Acessado em: 13 de novembro de 2020. https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-humanos Violações de direitos humanos devem ser interrompidas no Amapá, diz Anistia Internacional, 14 de Nov. de 2020. Disponível em: http://atarde.uol.com.br/brasil/noticias/2146245- violacoes-de-direitos-humanos-devem-ser-interrompidas-no-amapa-diz-anistia-internacional. Acessado em: 15 de novembro de 2020. A sacralidade da pessoa: entre razão e emoção, Dez. de 2017. Disponível em: http://www.cchla.ufpb.br/rbse/IcaroResenha.pdf. Acessado em: 16 de novembro de 2020.ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalem. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. São Paulo: Zahar, 2001. Bolsonaro ignora perguntas sobre o apagão do Amapá em evento em Goiás. 18 de Nov. de 2020. Disponível em: https://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2020-11-18/bolsonaro-ignora- perguntas-sobre-apagao-no-amapa-em-evento-em-goias.html. Acessado em: 19 de novembro de 2020. http://atarde.uol.com.br/brasil/noticias/2146245-violacoes-de-direitos-humanos-devem-ser-interrompidas-no-amapa-diz-anistia-internacional http://atarde.uol.com.br/brasil/noticias/2146245-violacoes-de-direitos-humanos-devem-ser-interrompidas-no-amapa-diz-anistia-internacional https://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2020-11-18/bolsonaro-ignora-perguntas-sobre-apagao-no-amapa-em-evento-em-goias.html https://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2020-11-18/bolsonaro-ignora-perguntas-sobre-apagao-no-amapa-em-evento-em-goias.html A Declaração Internacional dos Direitos Humanos e a generalização dos valores: memória e escândalo na genealogia dos direitos subjetivos, set. 2018. Disponível em: http://revistas.unisinos.br/index.php/RECHTD/article/view/rechtd.2018.103.07/60746880. ... Violações de direitos humanos devem ser interrompidas no Amapá, diz Anistia Internacional, 14 de Nov. de 2020. Disponível em: http://atarde.uol.com.br/brasil/noticias/2146245-violacoes-de-direitos-humanos-devem-ser-interrompidas-no-amapa-diz-anistia-i...
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