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MEDICINA LEGAL (SAÚDE E SOCIEDADE) Talita B. Valente ATM 2023/A 1 TRAUMATOLOGIA FORENSE • A traumatologia forense estuda as lesões e os estados patológicos, imediatos ou tardios, produzidos pela ação de energias (violência) sobre o corpo humano. OFENSAS À INTEGRIDADE FÍSICA OU À SAÚDE PRODUZIDAS POR AGENTES: Energias: • De ordem mecânica; • De ordem física; • De ordem química; • De ordem físico-química; • De ordem bioquímica; o São aquelas que se manifestam de modo combinado, havendo fatores orgânicos e químicos. • De ordem biodinâmica; o Está representada por uma síndrome conhecida por “choque”, cujo surgimento é quase sempre devido a uma agressão orgânica, como se esta representasse um mecanismo de defesa destinado a proteger o organismo da agressão recebida. o As modalidades de choque mais conhecidas são: cardiogênicas, obstrutivas, hipovolêmicas e periféricas. • De ordem mista. o Todas aquelas situações em que para a produção da lesão concorrem causas variadas. Energias de ordem bioquímica Negativas Inanição Doenças carenciais Positivas Intoxicações alimentares Auto- intoxicações Infecções Energias de ordem mista Fadiga Aguda Crônica Doenças parasitárias Sevícias Síndrome da criança maltratada Síndrome do ancião maltratado Tortura MEDICINA LEGAL (SAÚDE E SOCIEDADE) Talita B. Valente ATM 2023/A 2 ENERGIAS DE ORDEM MECÂNICA • As energias de ordem mecânica são aquelas que, atuando sobre um corpo, são capazes de modificar o seu estado de repouso ou movimento. Agentes mecânicos: • Ação/atuação: Agem por contato e diretamente sobre a superfície atingida, atuando por: o Somente pressão; o Pressão e deslizamento; o Choque, acompanhado ou não de deslizamento. • Tipos de lesão simples: o Punctória o Incisa/cortante o Contusa Ferida Modo de produção Objeto típico Punctória Pressão em um ponto Prego, alfinete, agulha, furador de gelo, estilete. Incisa ou cortante Deslizante maior que pressão Navalha, bisturi, lâminas, estilhaços de vidro, folha de papel, linha de papel, linha de cerol. Contusa Choque (pode ou não haver deslizamento) Martelo, marreta, caibro, cassetete, soco-inglês, bastão, pedra. Instrumentos perfurantes ou punctórios: • São de diâmetro transversal extremamente reduzido em relação ao seu comprimento. • Agem por meio de pressão exercida em um ponto e penetrem a superfície, geralmente afastando as fibras dos tecidos atingidos (divulsão). • As lesões produzidas por esses instrumentos são denominadas lesões punctórias: • Leis de Filhós e Langer: o As feridas punctórias ou puntiformes sofrem ação das linhas de tração da pele, podendo tomar a forma de botoeira, em ponta de seta e forma bizarra dependendo com a confluência das linhas de tração. Instrumentos Ação simples Perfurantes ou punctórios Cortantes Ação composta Contundentes Pérfuro-cortantes Pérfuro-contundentes O choque de superfícies pode se dar de forma ativa (quando o instrumento é projetado na vítima) ou passiva (quando a vítima vai ao encontro) ou mista (ambos em movimentação. MEDICINA LEGAL (SAÚDE E SOCIEDADE) Talita B. Valente ATM 2023/A 3 Instrumentos cortantes: • Agem por meio de pressão e deslizamento, de forma linear ou oblíqua, sobre a pele ou tecido dos órgãos. • Ex,: lâminas de barbear, navalhas e bisturi. Faca, quando atuam por deslizamento da lâmina, podem ser consideradas. • As lesões produzidas por esses instrumentos são denominadas lesões inicisas ou cortantes. • Características das lesões cortantes: o Regularidade e nitidez de suas margens e bordas. o Hemorragia quase sempre abundante. o Predomínio do comprimento sobre a profundidade. o Afastamento das bordas da ferida (mais acentuada nas lesões post-mortem) Instrumentos contundentes: • Agem pela ação de uma superfície. • Podem ser sólidos, líquidos ou gasosos desde que atuem por pressão, explosão, torção, distensão, descompressão, arrastamento ou outro meio, como por exemplo as mãos, um tijolo, um automóvel, jato de ar, a superfície de água de uma piscina, etc. • Pontes de tecidos ou pontes dérmicas entre as bordas de tecidos ou pontes dérmicas entre as bordas. • Os instrumentos contundentes produzem lesões contusas. • Devido a elasticidade da pele, a lesão se produz em diferentes níveis de profundidade. • Escoriação - quando o atrito do deslizamento lesa a superfície da pele. o O atrito provoca o arranchamento da epiderme e desnudamento da derme. o É comum nas quedas (lesões nos joelhos, cotovelos). o Ocorre formação de crosta que pode ser serosa (linfa) ou hemática (sanguíneo). o A recuperação se dá em prazo curto. o Interesse jurídico: arrastamento, atropelamento, lesões de defesa (unhadas). • Equimose - quando há rompimento de vasos e derrame sanguíneo infiltrando os tecidos. o São lesões contusas suja intensidade depende do instrumento e do grau de violência com que foi aplicado. o São comumente chamadas machas roxas e aparecem em razão do rompimento de vasos sanguíneos superficiais ou profundos. o As equimoses superficiais apresentam uma sucessão de cores denominada espectro equimótico: Engorjamento, degola e decapitação São lesões de natureza geralmente incisas localizadas no pescoço. • Engorjamento - lesão localizada na região anterior do pescoço. • Degola - lesão na região posterior. • Decapitação - separação da cabeça do corpo. MEDICINA LEGAL (SAÚDE E SOCIEDADE) Talita B. Valente ATM 2023/A 4 • Bossas e hematomas - quando o derrame sanguíneo não encontra condições de se difundir e forma coleções localizadas. o Bossas podem ser sanguíneas quando o líquido, não podendo se espalhar, forma uma coleção (especialmente sob o coro cabeludo, o “galo”) ou linfática, quando seu conteúdo for linfa. o O instrumento contundente age sobre a superfície corporal em que há tecido ósseo abaixo e com musculatura muito tênue. Rompendo-se o vaso, forma-se a bossa sanguínea. o O hematoma é semelhante a equimose, porém, trata-se do rompimento de um vaso maior, portanto, o sangramento é mais violento a ponto de descolar a pele, formando uma “bola” de sangue. Ocorre em áreas de tecido frouxo. Com o passar do tempo o organismo absorve o sangue, havendo ali as mesmas variações de cores da equimose, só que o processo será mais demorado. • Luxação - afastamento repentino e duradouro de uma das extremidades. • Fratura - é a solução de continuidade,parcial ou total, dos ossos submetidos à ação de instrumentos contundentes (fraturas cranianas são geralmente radiadas). • Rompimento de órgãos - decorrente de fratura. FORMAS DE AÇÃO MISTA OU COMPOSTA: • Quando os modos de ação se associam, a lesão passa a ser chamada de mista. o Pérfurocortante - faca, canivete, espada, punhal, estilete, peixeira. o Cortocontundente - machado, guilhotina, enxada, facão, foice, dentes. o Pérfurocontundente - projétil de arma de fogo, ponta de grade de ferro, ponteira de guarda-chuva. o Lácerocondundente - acidentes com trem ou automóvel. Instrumentos pérfuro-cortantes: • São aqueles geralmente dotados de, ao menos, uma ponta e uma lâmina ou gume. • Inicialmente o instrumento pérfuro-cortante age afastando as fibras e facilitando a penetração, para depois seccioná-las. • O melhor exemplo são as facas. • As lesões produzidas pelos instrumentos pérfuro- cortantes denominam-se pérfuro-incisas. Tem como característica geralmente serem mais profundos que largos. • Um só gume (faca, canivete, espada) - feridas em forma de botoeira. • Dois gumes (punhal) - feridas com bordas iguais, ângulos agudos. • Três gumes (lima) - feridas com forma triangular ou estrelada. • Feridas penetrantes podem ser graves, lesando órgãos, causando infecções; é comum ser necessário cirurgia. • Interesse jurídico - mais comum causa jurídica de morte é o homicídio. Instrumentos pérfuro-contundentes: • São aqueles que agem inicialmente por pressão em uma superfície e posteriormente perfuram a região atingida. MEDICINA LEGAL (SAÚDE E SOCIEDADE) Talita B. Valente ATM 2023/A 5 • As lesões produzidas são denominadas pérfuro-contusas e são lesões típicas dos projéteis de arma de fogo. Instrumentos corto-contundentes • São aqueles que atuam por pressão exercida sobre uma linha, tem a sua principal ação pela contusão, pela pressão devido ao seu próprio peso. • As lesões produzidas são corto- contusas, sempre profundas, com bordas e formas irregulares, com destruição de tecidos, podendo ter fraturas. • Ex.: foice, facão, machado, enxada, rodas de trem. BALÍSTICA FORENSE • Balística forense é a disciplina que estuda basicamente as armas de fogo, munições, fenômenos e feitos dos disparos, a fim de esclarecer questões de interesse judicial. Se divide em: interna/interior, externa e terminal. • Armas de fogo são engenhos mecânicos destinados a lançar projéteis no espaço pela ação da força expansiva dos gases oriundos da combustão da pólvora. FERIMENTOS PRODUZIDOS POR PROJÉTEIS UNITÁRIOS • A lesão de entrada produzida por projétil de arma de fogo é geralmente circular ou elíptica, na dependência do ângulo de incidência e das linhas de tensão que atuam sobre a pele. • Não é possível determinar o calibre do projétil pelo diâmetro da lesão observada. • O ferimento de entrada geralmente tem bordos invertidos, invaginados, voltados para o interior do corpo; o ferimento de saída tem as bordas evertidas, indicando claramente o sentido de sua trajetória. Como exceção, temos a Câmara de Hoffmann ou Câmara de Mina, observada nos tiros encostados, em que o ferimento de entrada tem os bordos evertidos, voltados pra fora. Lesão pérfuro-contusa por arma de fogo • O projétil de arma de fogo é composto por chumbo e revestido ou não por outros metais. Possui formas variáveis: cilíndricas ou ogivais. As munições podem ter carga simples ou única (revólver) ou múltiplas (cartucheiras). • As lesões causam perfuração e ruptura dos tecidos. • Características do ferimento: o Predomínio da profundidade o Caráter penetrante ou transfixante Critérios de estudo da lesão pérfuro-contusa: São consideradas: 1. Pela distância de disparo do alvo 2. Pelas características de seus orifícios Trajeto é o caminho percorrido pelo projétil dentro do corpo da vítima. Pode ser; • Transfixante • Não transfixante (projétil retido) Por ser: • Trajeto simples: resultante de projétil único. • Trajeto múltiplo: resultante de projéteis múltiplos. Trajetória é o caminho percorrido pelo projétil fora do corpo (da arma até a superfície atingida) MEDICINA LEGAL (SAÚDE E SOCIEDADE) Talita B. Valente ATM 2023/A 6 • De entrada • De saída 3. Pelo seu trajeto (trajetória) Orifícios de entrada • O ferimento de entrada tem geralmente, bordos invertidos, invaginados, voltados para o interior do corpo. • Podem ser: o Circulares (ângulo de incidência 90º) o Ovais ou arredondados (ângulo de incidência diverso de 90º) o Tangencial (de acordo com o ângulo de incidência) • Ao atingir o corpo, o projétil provoca: o Arrancamento da epiderme (orla de contusão) o Rompimento na pele, formando um orifício em forma tubular no qual se enxerga seus detritos (orla de enxugo). • Ao se formar o túnel de entrada pequenos vasos se rompem formando equimoses em torno do ferimento (orla equimótica). Orla e contusão e enxugo - Anel de Fish: Orla de enxugo: ORLAS ORLA DE CONTUSÃO - a pele se invagina e se rompe devido à diferença de elasticidade da derme e da epiderme ORLA EQUIMÓTICA - zona de hemorragia oriunda da ruptura de pequenos vasos ORLA DE ENXUGO - zona de cor escura que se adaptou às faces do projétil, limpando-os dos resíduos da pólvora ZONAS ZONA DE TATUAGEM - resultante da impregnação de partículas de pólvora incombusta que alcançam o corpo ZONA DE ESFUMAÇAMENTO - produzida pelo depósito de fuligem da pólvora ao redor do orifício de entrada ZONA DE CHAMUSCAMENTO - tem como responsável a ação superaquecida dos gases que atingem e queimam o alvo MEDICINA LEGAL (SAÚDE E SOCIEDADE) Talita B. Valente ATM 2023/A 7 Orifícios de entrada - TIRO ENCOSTADO: a. Forma irregular (estrelado) pela dilaceração dos tecidos pelos gases explosivos (mina de Hoffmann, os gases refluem) b. Sem zona de tatuagem ou esfumaçamento c. Diâmetro do ferimento maior que o projétil (explosão dos gases) d. Halo fuliginosos nos ossos (sinal de Benassi) e. Impressão (pressão) do cano da arma (sinal de Werkgaertner) f. Quando transfixante: trajeto com orifício de entrada e saída Orifício de entrada - TIRO A CURTA DISTÂNCIA: a. Cone de dispersão do tiro b. Forma arredondada ou circular c. Orla de escoriação ou contusão d. Orla equimótica e. Orla de enxugo f. Zona de tatuagem g. Zona de esfumaçamento (removível) h. Zona de queimadura (chamuscamento) MEDICINA LEGAL (SAÚDE E SOCIEDADE) Talita B. ValenteATM 2023/A 8 Orifício de entrada - TIRO À DISTÂNCIA a. Forma arredondada b. Diâmetro menor que o projétil c. Com orla de escoriação d. Com equimótica e. Com orla de enxugo Orifício de saída a. De forma irregular ou dilacerado b. Maior que o orifício de entrada c. Maior sangramento d. Ausência de orlas, zonas e halos e. Bordos evertidos Sinal do Funil de Bonnet O Sinal de Funil de Bonnet caracteríza um ferimento de entrada ou de saída em ossos planos, mais comum em ossos do crânio, produzido pela ação de um instrumento perfuro - contundente, o projétil de arma de fogo (PAF), em disparos a curta ou curtíssima distância. O orifício de entrada tem a forma de um cone invertido, ou seja, externamente o ferimento é regular e de forma arredondada equanto internamente é irregular e maior do que o externo com um bisel bem definido; sua base e voltada para dentro da cavidade com traços de fraturas radias. * exceções podem ocorrer: tiro encostado, ricochete, dois ou mais projéteis sucessivos atingem o mesmo ponto Orifício de entrada Regular Invertido Normalmente proporcional ao diâmetro do projétil Com orlas e zonas * Orifício de saída Dilacerado Evertido Desproporcional ao diâmetro do projétil Sem orlas e zonas MEDICINA LEGAL (SAÚDE E SOCIEDADE) Talita B. Valente ATM 2023/A 9 FERIMENTOS PRODUZIDOS POR PROJÉTEIS MÚLTIPLOS (BALINS) • Nos disparos efetuados com cartuchos de munição de projéteis múltiplos (armas de alma lisa), o aspecto da lesão depende, basicamente, da distância em que foi realizado o disparo e da consequente abertura do cone de dispersão. • Em tirou muito próximos ou encostados, os projéteis múltiplos causam grande destruição tecidual muitas vezes acompanhada de significativa perda de substância. • Nos disparos efetuados à distância o que observamos é a existência de lesões múltiplas, como se produzidas por vários disparos unitários, distribuídas ao redor de um ponto central, e que se afastam mais um do outro quanto maior for a distância entre atirador e alvo.
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