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ANTROPOLOGIA-DA-RELIGIÃO

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CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU 
 
 
 
ANTROPOLOGIA DA RELIGIÃO 
 CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU 
 
1 
 
SUMÁRIO 
1 ANTROPOLOGIA DA RELIGIÃO ................................................... 2 
2 ANTROPOLOGIA RELIGIOSA ....................................................... 6 
2.1 Autenticidade e Mercado religioso .............................................. 7 
2.2 A Reafricanização e as Viagens Místicas a África ...................... 8 
2.3 Uma Nova Reafricanização ou o Reforço do eixo Atlântico? ...... 8 
3 O GRINGO NO CANDOMBLÉ ....................................................... 9 
4 HISTÓRIA DAS IDEIAS RELIGIOSAS ......................................... 10 
4.1 Antropologia Religiosa do povo Macua ..................................... 12 
4.2 A guerra das Religiões pela Alma Indígena .............................. 14 
4.3 A guerra pelas almas................................................................. 14 
5 Antropologia Jurídica: as relações étnico-raciais na evolução religiosa e 
as influências culturais na evolução da formação do povo brasileiro ............... 17 
5.1 Conceito e Objeto da Antropologia ............................................ 19 
6 CULTURA E ANTROPOLOGIA NO MUNDO MODERNO ........... 21 
7 FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO ......................................... 23 
8 AS RAÍZES CULTURAIS QUE FORMAM A IDENTIDADE DO POVO 
BRASILEIRO .................................................................................................... 26 
8.1 Relações Étnico-raciais História e Cultura Afro-brasileira, Africana e 
Indígena 28 
8.2 Fundamentos De Antropologia Religiosa .................................. 30 
9 BIBLIOGRAFIA ............................................................................. 43 
 
 
 
 CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU 
 
2 
 
1 ANTROPOLOGIA DA RELIGIÃO 
A Antropologia é a ciência que estuda a humanidade em todas suas dimensões. 
Uma de suas divisões é a Antropologia Cultural, disciplina que cursamos e que 
engloba inúmeros aspectos que formam a cultura do homem. Um deles é a religião 
(do latim: “religio”, usado no texto Vulgata Editio, que significa “prestar culto a uma 
divindade”, “ligar novamente”, ou simplesmente “religar”), assunto que sempre 
despertou interesse nos antropólogos e cientistas sociais e que tem grande influência 
na história da humanidade. A religião interfere diretamente no comportamento do 
homem e na organização da sociedade, ela já foi e é responsável por guerras no 
mundo inteiro e é um dos fatores relacionados diretamente à origem dos grupos 
étnicos. Portanto nada mais interessante e instigante do que se aventurar pelos 
mistérios das crenças no sobrenatural existentes na cultura do homem. 
Segundo registros arqueológicos a religião é um aspecto universal presente na 
cultura desde o período Paleolítico Superior em que o homem Neandertal enterrava 
seus mortos com oferendas indicando assim uma crença no sobrenatural. 
Caracterizada por cultos e rituais, é por meio dela que o homem tenta estabelecer 
contato com seres espirituais, divindades e tudo que ele não pode detectar com seus 
sentidos ou comprovar cientificamente. 
A crença e o ritual são os dois elementos que constroem a Religião, ou seja, a 
crença deve estar associada a prática para que possamos reconhecer uma religião. 
A crença, ou fé, é a reverência e a aceitação da superioridade do sobrenatural, 
e o ritual, ou prática, é a manifestação desses sentimentos por meio de ações 
padronizadas com uma determinada finalidade. Dentre essas ações estão as orações 
dirigidas aos seres sobrenaturais feitas pelos adeptos do culto podendo ser de 
louvação, súplica ou agradecimento, demonstrando a atitude de subordinação do 
crente, como por exemplo as orações do cristianismo. As oferendas onde os fiéis 
oferecem alguma coisa às divindades também como forma de agradecer, louvar ou 
pedir algo em troca, como na festa de Iemanjá onde são oferecidas flores, comidas, 
bebidas e joias normalmente em pequenos barcos de madeira na beira do mar por ela 
ser conhecida como a deusa das águas e mares. E as manifestações que são um 
conjunto de atividades geralmente acompanhadas de cantos e de músicas como as 
 CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU 
 
3 
 
procissões católicas ou as danças indígenas e do candomblé também com objetivos 
de comunicação com os seres espirituais. 
 
Fonte:www.google.com 
No que diz respeito à história das religiões, sua doutrina e suas regras, 
podemos observar o uso de livros escritos por antigos personagens dessas mesmas 
religiões. Esses livros, mais comuns nas religiões monoteístas, servem como manual 
de comportamento e, mais importante, como modo de contar a história do culto, de 
como as coisas teriam acontecido num passado distante e como teria surgido a crença 
em suas respectivas divindades, seus autores teriam recebido revelações divinas para 
escrevê-lo. Como exemplos mais conhecidos temos a Bíblia do Cristianismo e o 
Alcorão do Islamismo, outros exemplos são o Torá do Judaísmo, o Rig Veda do 
Hinduísmo, o Mahabharata do Bramanismo e etc. 
O culto é uma série de atos que tem por finalidade venerar ou se comunicar 
com divindades, é um conjunto de crenças e rituais. Dentro de um culto existem um 
grande número de objetos sagrados os quais são adorados ou utilizados nos rituais. 
As imagens são representações das divindades que são cultuadas podendo ter forma 
humana, animal, humana e animal ou nenhuma forma determinada, como por 
exemplo os deuses egípcios, orixás de Candomblé, Santos Católicos e etc. Os objetos 
rituais são os objetos usados nos cultos, tanto os de uso comum como os 
especialmente confeccionados para os rituais como por exemplo os atabaques, 
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4 
 
colares e trajes de Umbanda. Menos usuais, mas também presentes, as máscaras 
também são utilizadas, simbolizando autoridade e prestígio, elas podem ter diferentes 
formas representando homens, animais ou os seres sobrenaturais cultuados. 
Variando muito de uma sociedade para outra, as normas religiosas de 
comportamento se tornam mais evidentes nos momentos de crise ou de grandes 
mudanças como no nascimento, na adolescência, no casamento, na enfermidade, na 
fome, na morte e etc... Para todos esses momentos existem vários tipos de ritos como 
os de iniciação, de transição e de intensificação. 
Nos ritos de iniciação são feitas cerimônias por ocasião da passagem da idade, 
quase sempre de jovem para adulto, onde os participantes são submetidos a provas 
de resistência para demonstrar sua maturidade. Diversos grupos indígenas utilizam 
esse processo como por exemplo o Wai'a, processo de iniciação dos jovens 
masculinos Xavante que acontece de quinze em quinze anos onde os homens 
aprendem a se comunicar com os espíritos através de cantos e danças 
desenvolvendo sua vocação espiritual. O processo é longo e envolve uma série de 
atividades, algumas bem penosas e muitos rituais. 
Mais conhecidos, os ritos de transição podem se dividir em quatro principais 
momentos que servem para marcar a mudança do estado social do indivíduo e que 
também podem variar de uma sociedade para outra. O nascimento quando a criança 
nasce e recebe uma benção e um nome como no batizado católico. A puberdade 
quando jovens se tornam aptos para procriação e são submetidos à diversos rituais 
tais como danças, proibições, missões, jejuns, dependendo de sua religião. O 
matrimônio, atividade socialmente aprovada relativa a união de dois seres humanos 
perante seus superiores sobrenaturais. E a morte, quando é feita uma cerimônia ou 
um funeral por ocasião do falecimento de alguém Dependendo da religião e do status 
do morto será o ritual, como exemplo temos o velório seguido pelo enterro feito no 
cristianismo onde o padre faz uma série de orações de despedida e passagem para 
outra vida. 
Os rituais, cultos e cerimôniasnão podem ser realizados por qualquer um, 
existem pessoas qualificadas ou escolhidas como sacerdotes, oráculos e chefes 
religiosos que, segundo as doutrinas dos cultos, tem uma espécie de permissão divina 
para realizar tais tarefas. Essas pessoas representam o intermediário entre os homens 
e os deuses. 
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5 
 
Existem dois tipos de lugares de grande valor para as religiões, os Santuários, 
conhecidos como templos e igrejas onde os sacerdotes realizam os rituais e os fiéis 
se encontram para rezar e realizar todos tipos de atividades de sua religião, muitas 
vezes é tido como a morada de sua divindade. E os Lugares Sagrados que também 
são vistos como a morada dos espíritos ou deuses e se localizam nas mais diversas 
localidades como montanhas, bosques, rios e até cidades inteiras, são considerados 
sagrados por motivos como a passagem de alguém considerado divino pelo lugar e 
são visitados em ocasiões especiais quando são celebradas cerimônias. Um exemplo 
de um lugar como esse é o Monte Olimpo na Grécia, considerado morada de deuses 
e constantemente visitado por turistas e adeptos de crenças. 
No universo da cultura e da religião existe uma dualidade muito importante, o 
Sagrado-Profano. Na mente das pessoas o sagrado e o profano são duas maneiras 
de como as coisas podem ser. O Sagrado é tudo que é objeto de interdição e o profano 
é onde essas interdições se aplicam ou seja, são diferentes, um se opõe ao outro. O 
ser sagrado não pode ser violado, ele tem uma espécie de proteção divina para que 
acredita nele e com qualquer contato indevido acontece sua profanação, o 
desaparecimento de todos atributos que constituem sua sacralidade. Por exemplo 
imagens sagradas que não podem ser tocadas sob pena de castigos divinos. Também 
para os adeptos dos cultos existe um conjunto de atitudes obrigatórias que devem ser 
observadas diante desses objetos e outras que se deve evitar como dentro de uma 
Igreja católica onde se tem atitudes padrões tomadas pelos fiéis como o sinal da cruz. 
Devido a essas duas condições se configura o tabu. O tabu é uma espécie de 
interdição, ele isola tudo que é sagrado, proibido ou impuro. “A característica principal 
do tabu é a de que não existem mediações entre a transgressão e a punição, 
derivando a segunda automaticamente da primeira” (RODRIGUES, p. 26). 
É importante lembrar que assim como estudamos no texto A Sociedade Como 
Sistema de Significação, do livro Tabu do Corpo (Rio de Janeiro, Achiamé, 1983) de 
José Carlos Rodrigues, a religião é um sistema de representação com diversos 
processos significantes e para os seus adeptos, os objetos e imagens sagradas sejam 
elas estátuas, árvores ou trajes, não são adoradas ou temidas pelos simples objetos 
que são, mas porque representam o sagrado ou seja, a imagem do santo não é vista 
apenas como uma representação para o crente, mas sim o santo em si. 
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6 
 
A Religião sempre esteve dentro da cultura do homem, desde cedo ele 
aprendeu e desenvolveu crenças em seres sobrenaturais. E uma das mais visíveis 
funções dessas crenças é a de explicar o inexplicável, criando uma razão para a 
existência da humanidade e seres superiores aos seres humanos. E também algo 
além do corpo físico e de tudo que podemos detectar com nossos sentidos ou explicar 
cientificamente, se pesquisarmos, encontraremos vários nomes para isso: alma, 
espírito, aura, chi e etc. Qual das crenças pode ser verdade, o que é essa verdade e 
se até os dias de hoje isso ajudou ou criou mais problemas para a humanidade é difícil 
de saber, mas de fato a religião foi e é um dos fatores que mais influenciam o 
comportamento e a organização social dos seres humanos.1 
2 ANTROPOLOGIA RELIGIOSA 
Autenticidades e Mercado religioso, no Atlântico, Ontem e Hoje 
 
O processo Atlântico de transferência de escravos e seus costumes para o 
Brasil, com enfoque em Salvador da Bahia, mas também para o Maranhão e Rio 
Grande do Sul, deu origem à ressignificação religiosa através dos sistemas 
designados por Candomblé, Tambor de Mina e Batuque, respetivamente, instituídos 
na viragem do séc. XVIII para o séc. XIX. Aportados ao Brasil escravocrata e de matriz 
cultural católico-português, os escravos viram-se jogados ao desempenho de papéis 
étnicos (que Parés chama de meta-etnicidades) múltiplos e volutáveis, negociados 
nas alteridades intra-africanas e dos africanos diante da sociedade escravista. 
Estas etnicidades – que surgiram como recurso para a organização das 
irmandades católicas na Bahia – foram importantes na construção das chamadas 
«nações de candomblé», tipologias rituais com claros ideais nacionalistas-étnicos 
africanos. É com estas tipologias que se se iniciam os discursos “de nação”, que viriam 
a ser convertidos – com determinante contribuição dos pioneiros nos estudos afro-
brasileiros – num discurso de pureza, em particular de pureza nagô. 
 
1 Extraído do link: antrodecomunicacao.blogspot.com 
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7 
 
2.1 Autenticidade e Mercado religioso 
Os discursos “de nação” veiculavam, ab initio, um princípio de autenticidade 
ritual e cultural, diante do avanço da crioulização (hibridismo) dos costumes africanos 
no Brasil. Estes discursos de autenticidade pré-datam um verdadeiro primado do 
mercado religioso, mas marcam, decisivamente, as relações entre práticas tomadas 
como autenticidades e degeneradas. 
A abertura do mercado religioso, com a liberdade religiosa e o surgimento da 
Umbanda, e colocando em cena a expansão do Candomblé, com a multiplicação 
vertiginosa do número de templos (terreiros) dentro de Salvador, mas também para 
novas geografias, com destaque para São Paulo, ganhando terreno à Umbanda a 
partir da década de 1950, reforçou as questões da autenticidade, mas igualmente 
tornou favorável o processo de hibridismo entre práticas díspares, ao mesmo tempo 
que colocou o campo religioso afro-brasileiro num intenso processo de concorrência. 
Nesse sentido, a autenticidade deixou de ser jogada, apenas, numa lógica de perda 
cultural e reforço “das raízes” (e até pela hierarquia entre templos, a partir do idioma 
da antiguidade e da posição de destaque – veja-se a relação entre a tríade Engenho 
Velho – Gantois – Opô Afonjá) na terminologia própria, para adentrar pela 
concorrência em termos de prestígio e captação de fiéis e clientes. 
 
Fonte:www.fashionghana.com 
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8 
 
2.2 A Reafricanização e as Viagens Místicas a África 
Entre as dinâmicas de expansão do Candomblé produziram crises identitárias 
ligadas às autenticidades, desta feita a partir das genealogias religiosas. Como mostra 
a literatura sobre o assunto, a incapacidade dos sacerdotes paulistas em traçarem a 
sua linhagem religiosa a um terreiro histórico da Bahia, autenticando, desta forma, a 
sua posição na hierarquia do campo e mercado religiosos, está na origem dos 
movimentos de reafricanização. É um facto que a reafricanização é uma questão ab 
initio do Candomblé, como menciona Capone, no entanto, os novos movimentos de 
reafricanização, emergentes a partir da década de 1960, introduziram novas formas 
de reafricanizar os padrões de culto. Entre buscas por sacerdotes de Ifá (sistema 
religioso do espaço cultural yorùbá, fortemente influenciado pelo islão místico e pelo 
cristianismo missionário, mas ‘vendido’ no mercado religioso brasileiro como 
puramente africano) cubanos, ou mais recentemente através de viagens (re) 
iniciáticas a África, há um caminho de procura por autenticidades que questiona o 
lugar da Bahia como ‘bolsa de autenticidade, e que promove uma forte concorrência 
no mercado religioso. 
2.3 Uma Nova Reafricanização ou o Reforço do eixo Atlântico? 
Do lado dos terreiros históricos baianos, a reafricanização recente é 
compreendidacomo um fenómeno de rutura com os padrões de autenticidade 
candomblecistas, porque invoca novas modalidades rituais, estéticas e cosmológicas 
que confrontam as formas pelas quais os costumes africanos foram reorganizados na 
Bahia. Esta reafricanização passou a ser concorrente do Candomblé baiano, 
tornando-se algo rejeitado no seio dos terreiros históricos de Salvador da Bahia. 
Todavia, essa rejeição parece ser parcial, porque diz respeito às inovações que 
coloquem em causa o modus operandi candomblecista. Prova disso são as recentes 
viagens da Casa de Oxumarê, conceituado terreiros baianos, à Nigéria e ao Benim, e 
a vinda de prestigiadas figuras políticas e religiosas africanas à Bahia. Esse trânsito 
atlântico recupera as viagens dos primórdios do Candomblé, em que saberes e 
produtos eram trocados e reciclados entre a Bahia e o Golfo do Benim. O que se torna 
importante objeto de olhar historiográfico e antropológico é o efeito que tais viagens 
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poderão ter em matéria ritual. Teremos uma nova fase de reafricanização, agora com 
uma recuperação de práticas e de valores estéticos africanos por parte dos terreiros 
históricos e Salvador, ou somente um reforço ideológico no eixo atlântico? Os títulos 
sacerdotais conferidos ao sacerdote da Casa de Oxumarê, Babá Pecê, produzirão 
novas dinâmicas de autenticidade no campo religioso baiano? 
3 O GRINGO NO CANDOMBLÉ 
Desde o “beneplácito régio pela Irmandade dos Martírios” e suas implicações 
para a constituição da sociedade religiosa que viria a ser o Ilê Axé Iyá Nassô Oká 
(Silveira 2006), passando pelas mulheres brancas iniciadas na religião por motivos 
diversos, que a presença do «outro», geralmente o “branco”, é parte integrante da 
moldura do Candomblé. Narrativas mitificadas como a que conta a liberdade de 
Manoel Joaquim Ricardo, através de uma cura de seu senhor, servem para autenticar 
o Candomblé através da agência de negros sobre o homem branco, num exercício de 
inversão de poder social através do elemento religioso (o efeito “mágico”). 
 
Fonte:www.viveruruguay.com 
A presença de investigadores como Nina Rodrigues, Roger Bastide ou Ruth 
Landes, ou ainda o papel das instituições de saúde mental na constituição de bolsas 
de liberdade reduzida para a prática do Candomblé (Capone 2004), foram essenciais 
 CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU 
 
10 
 
na consolidação de um processo de alteridade afro-religiosa que estabelece um lugar 
do «outro» nos palcos dos terreiros. Um dos aspetos mais invisíveis é o financeiro. 
Apesar de Landes (1947) falar dos aspetos mercadológicos do Candomblé, através 
da categoria acusatória face a babalorixás homossexuais, os “sentidos do dinheiro” — 
termo que viria a ser usado por Baptista (2007) — são tocados superficialmente, 
apesar da antropóloga norte-americana mencionar pagamentos por informações. 
Roger Bastide (1960: 317), por seu turno, fala em “macumbas para turistas”, 
alavancando a questão financeira a aspetos quer de «perda cultural» quer de recurso 
como renda. Esta ideia viria a ser explorada em trabalhos diversos, como Xavier Vatin 
(2008), Renata Carvalho e Marco Avila (2012), Luciana Duccini (2013), entre outros. 
No entanto, a exotização da figura do “gringo” no Candomblé aparece 
marginalmente, mencionada por exemplo por Paul-Christopher Johnson (2002), 
considerando a sua iniciação “para turista”. Stefania Capone (2004) mostra, ainda, 
como a sua nacionalidade é jogada a partir de interesses de ordem simbólica, em que 
é deslocada de italiana para francesa, nacionalidade revestida de carga simbólica 
particular, em favor de Roger Bastide e Pierre Verger. Ora, essa dimensão não resume 
o lugar do “gringo” no Candomblé, pelo contrário. A categoria “gringo” é elástica, 
dizendo tanto respeito ao estrangeiro quanto ao brasileiro de outro Estado. Esse 
cenário é muito evidente no Candomblé baiano, onde o “carioca” e o paulista são 
considerados “gringos”, e por essa via, gozam de um estatuto diferente, o qual não é, 
necessariamente, de destaque, mas antes, tal como o estrangeiro, o de recurso 
financeiro. Há, portanto, para o “gringo” um lugar particular no Candomblé brasileiro, 
exotizado como “rico”, constituindo-se um recurso importante para a sustentação 
financeira dos terreiros, sendo a dois tempos incluído, destacado, desvalorizado e, 
nos seus próprios termos, “explorado”. 
4 HISTÓRIA DAS IDEIAS RELIGIOSAS 
Na análise das religiões, nomeadamente no seio de disciplinas como a 
Antropologia e no core social das comunidades religiosas, os dados vigentes, quer de 
natureza litúrgica quer de natureza conceptual (i.e. teológica) tendem a ser tratados 
como ab initio. Dentro desta perspectiva de intemporalidade e imutabilidade dos 
 CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU 
 
11 
 
padrões de entendimento e formulação sobre o dado religioso operam perigosas 
assunções quer científicas quer doutrinárias/dogmáticas. 
Tomando o campo religioso africano e mais especificamente o Yorùbá como 
estudo-de-caso, compreendemos que muitas das categorias hoje vigentes e que são 
comumente tomadas como clássicas e presentes ab initio são na verdade fruto de um 
labor da mutabilidade história dos contextos religiosos. Tal facto está particularmente 
presente em matéria do Ser-Supremo (Ferreira Dias, 2011c / link). Mas não somente. 
Se olharmos os trabalhos científicos e os discursos dos agentes religiosos (espaços 
que se interpenetram) em relação ao Sistema de Ifá, encontramos uma narrativa linear 
que não leva em conta que, por um lado o Sistema de Ifá é originário do universo 
conceptual islâmico, por outro que dessa forma ele não é formulador dos padrões 
religiosos yorùbá ab initio (vide Ilésanmí, 1993). 
Tudo isto para recordar a importância vital do estudo da história das ideias 
religiosas. Sem tal labor científico é impossível compreender a mutação dos padrões 
de entendimento e prática religiosa. Será impossível perceber que noções de 
mediação entre o extra-humano (deuses, deus, ancestrais, etc.) são produto da 
história das transformações religiosas frutos de encontros, os tais religious encounters 
que fala J.D.Y. Peel (2000). Será impossível compreender que o Ser-Supremo é um 
produto histórico para além de um dado doutrinário vigente. Será impossível 
compreender que a Religião Tradicional Africana é na verdade uma religião neo-
tradicional porquanto resulta de um processo de formulação pós-Império Yorùbá 
(Ferreira Dias, 2011e). A história das ideias religiosas é a narrativa das 
transformações, das mutações, das interpenetrações que transformam os dados 
religiosos ao longo dos tempos e que lhe vão conferindo uma falsa ilusão de 
imutabilidade que importa tomar no discurso científico.2 
 
 
2 Extraído do link: jfdias.hypotheses.org 
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12 
 
4.1 Antropologia Religiosa do povo Macua 
A religiosidade dos povos africanos tem sido objeto de muitos estudos, teses e 
pesquisas ao longo dos anos. Algumas claramente controversas, como um 
irresponsável português que escreveu “esses povos não têm religião nenhuma” (A. 
Langa em “Questões Cristãs à Religião Tradicional Africana (Mocambique) ”, Ed. 
Franciscanas, Portugal, 1984). 
N realidade, o povo Macua, como de resto todos os povos africanos e de todo 
o mundo são naturalmente religiosos. A forma de ver, de sentir ou de venerar o Deus 
supremo pode ser diferente, mas o Deus é um só e presente em todas as 
manifestações culturais de qualquer agrupamento de pessoas. 
O povo Macua acredita no mito do Monte Namuli, segundo o qual, Muluku 
(Deus) é Forca-Vital que criou os Homens e os animais. Alguns agrupamentos macuas 
chamam Muluku de Mulungu, Bava, Nkulukumba, Nluku, Xikwembu... não importa. A 
crença comum entre o povo macua é que “Muluku Mpattuxá mwanene itthu sothene” 
(Deus é Criadore dono de todas as coisas). 
Segundo o mito, após serem criados, os homens viveram em torno do Monte 
Namuli e nas terras próximas, divididos em famílias. Com o tempo e o alargamento 
destas famílias, foi necessário abandonar a montanha e espalhar-se pelo vale. Alguns 
transpuseram o Rio Lúrio (que nasce no Monte) e foram para mais longe ainda. 
É evidente a semelhança com os escritos nas bíblias cristãs, nos livros 
sagrados muçulmanos etc. 
Muluku okhala (Deus existe) é uma frase constante entre os povos macuas 
mais tradicionais e expressa a existência de Deus não só nas coisas boas, mas 
também nos infortúnios da vida, como uma esperança de dias melhores. 
A crença nos antepassados, tão discutida e afirmada erroneamente como a 
“religião dos macuas”, trata-se não de uma religião, mas sim na crença de que os 
mortos se tornam personalidades superiores e estão ao lado de Mukuku, como 
colaboradores diretos. 
 
Muluku nampaka mekawe (Deus onipotente) criou o homem e a mulher com 
capacidade de relacionarem-se entre si e com Ele (Muluku). Mas, os seres humanos 
 CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU 
 
13 
 
só podem se comunicar com Muluku através dos cultos religiosos, com a mediação 
destes antepassados. Daí o culto aos mortos. 
Também semelhante à crença ocidental nos Santos, Anjos, dentre outros seres 
místicos. 
A morte é temida entre o povo macua e a existência dela e de outras desgraças 
(calamidades, doenças) não são obra de Muluku, e só podem provir dos espíritos 
malignos, os Anakuru, que podem ser até mesmo algum antepassado que procura 
por atenção. 
Anakuru são espíritos dos mortos que não conseguiram entrar na categoria de 
“antepassados” por não estarem em sintonia com Muluku. 
Allan Kardeck, em suas obras espíritas, também interpreta estes fenômenos à 
sua maneira. 
Segundo a opinião de muitos Antropólogos a religiosidade dos povos Bantú é 
indiscutível. Os macuas são parte desta família alargada, que é também a origem de 
muitos outros povos do Sul da África. Apesar de, por muito tempo, negarem-se à 
existência de um culto a Deus nas religiões tradicionais africanas, pelo fato da 
presença dos “antepassados”, este culto a Deus existe e sempre existiu. 
O macua nunca foi animista (Pinho Martins em “Religiões Tradicionais e 
Cristianismo em Diálogo”, Ed. São Pio X, Maputo, 2003). 
 São Tomaz de Aquino, considerado um dos grandes teóricos da Igreja 
Católica, afirmava que a razão é incapaz, por ela mesma, de penetrar nos mistérios 
de Deus. 
A razão (conhecimento científico) ajuda-nos a entender os mistérios da Fé. 
Da mesma forma, a fé religiosa sem o conhecimento científico, torna-se 
irresponsabilidade.3 
 
 
3 Extraído do link: pt.linkedin.com 
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14 
 
4.2 A guerra das Religiões pela Alma Indígena 
Além do interesse pela mão-de-obra indígena, desde a sua chegada e 
aboletamento nas terras dos brasis, os portugueses queriam converter os índios ao 
cristianismo. Fazia parte de sua missão civilizatória, paralelo à missão colonizadora. 
Portanto, o que estamos presenciando hoje, a disputa entre as missões católicas e 
evangélicas, em geral unidas contra o Estado, é uma réplica dos 500 anos de 
colonização. Naqueles anos a disputa era entre jesuítas e as demais missões cristãs, 
os carmelitas, franciscanos, mercedários e, mais tarde, os capuchinhos, todos mais 
ou menos unidos contra a Metrópole, que, através do Padroado, financia a todas. 
Ao final, o que sobram são os índios desalmados de suas antigas crenças e 
incluídos religiosamente no mundo dominador. 
 
Fonte: 
indiospotiguaradapbemfoco.wordpress.com 
4.3 A guerra pelas almas 
Projeto de lei criado por evangélicos busca criminalizar o infanticídio nas tribos. 
Para especialistas, proposta é reflexo da atuação de entidades que tentam converter 
os índios ao cristianismo sem respeitar sua cultura 
A disputa entre católicos e os vários segmentos evangélicos chegou à taba. O 
Projeto de Lei nº 1057, que considera criminosa a pessoa que praticar ou conhecer e 
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15 
 
não denunciar o infanticídio indígena, é a parte visível da guerra pelas almas dos 
índios brasileiros. Prevista para ser votada no segundo semestre pela Comissão de 
Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados, a proposta divide 
religiosos, indigenistas e antropólogos sobre a prática de alguns povos que sacrificam 
crianças portadoras de necessidades especiais e comprometimento cerebral, entre 
outros casos. A disputa para cristianizar os índios coloca, de um lado, missionários 
católicos e, do outro, alguns segmentos evangélicos que patrocinam o projeto. 
Apresentado no ano passado pelo deputado evangélico Henrique Afonso (PT-
AC), o PL não tem data para ser votado no plenário da Câmara. Há uma semana, uma 
manifestação no Congresso levou grupos de militantes evangélicos de várias 
denominações a reivindicar a aprovação da lei. O parecer da deputada Janete Pietá 
(PT-SP) descarta a criminalização do infanticídio indígena. Pietá optou por um texto, 
ainda a ser votado na CDHM, prevendo a criação de um conselho tutelar indígena e 
a adoção de uma campanha educativa para evitar o infanticídio, ainda mantido por 
povos como os Suruwará. Eles vivem entre os rios Purus e Juruá, no Amazonas, e 
consideram a morte de crianças um instrumento de controle de natalidade. A prática 
foi tema do filme Hakani, produzido pelo escritório brasileiro da organização 
evangélica Jovens com um ideal (Jocum), como parte de uma campanha internacional 
pelo fim do infanticídio nas tribos. 
Batalha 
 
A disputa pelas almas dos Suruwará motivou uma batalha judicial entre 
católicos e evangélicos. Em contato com os índios desde 1980, há cinco anos o 
Conselho Indigenista Missionário (Cimi), da Igreja Católica, entrou com uma 
representação no Ministério Público Federal contra a atuação da Jocum na aldeia. A 
representação foi motivada por um "diário de campo" deixado pelos evangélicos na 
aldeia e encontrado por missionários do Cimi. Segundo a entidade, o texto continha 
uma doutrina que considera as religiões indígenas uma manifestação demoníaca, o 
mesmo princípio usado historicamente pela Igreja Católica desde o Descobrimento e 
abandonado na década de 1960. A Procuradoria da República em Manaus conseguiu 
que a Justiça determinasse a saída dos missionários da Jocum da aldeia. Mas a 
organização resiste em deixar a área, alegando que está ali para combater o sacrifício 
de crianças doentes. 
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16 
 
"Qualquer religião é perversa com os indígenas. Os missionários tentam 
colonizar os índios impondo o pecado e o medo do inferno", critica Gersem Baniwa, 
doutor em antropologia e indígena que viveu até os 10 anos na aldeia Yakirana, no 
Amazonas. "As religiões ocidentais surgiram para dominar cultural e espiritualmente 
o mundo e também os índios. É o imperialismo religioso que acaba com a convivência 
coletivista das aldeias", lamenta. Entre as consequências da atuação religiosa nas 
aldeias está a mudança de hábitos e rotinas dos indígenas. Uma delas é a guarda de 
um dia de descanso depois de uma semana de trabalho, como está na Bíblia. Poucos 
índios adotam o calendário ocidental, mas alguns grupos estão sendo convencidos a 
adiar pescarias ou caças por ser sábado ou domingo. 
Arsenal 
 
Para transformar índios em cristãos, católicos e evangélicos não medem 
esforços. Montaram um arsenal para a tarefa. Fundado na década de 1970, o Cimi 
conta com cerca de 350 missionários padres e leigos, possui rádio, revista e jornal. 
Os evangélicos fundaram a Associação de Missões Transculturais Brasileiras (AMTB), 
que reúne 600 missionários e abriga diferentes entidades. A organização da AMTB, 
que tem 25 agências entre os índios brasileiros, chega ao detalhe de fazer um 
levantamentosobre quais tribos já foram evangelizadas e quantas ainda estão 
isoladas. A ONG detalha em seu site quais etnias possuem a Bíblia completa no 
próprio idioma e define como objetivo levar os princípios evangélicos a 120 outros 
povos. Na internet, a AMTB chega a oferecer a adoção de vários povos que, segundo 
eles, não conhecem a palavra de Deus. 
Nessa guerra, evangélicos e católicos apresentam estratégias diferentes. O 
antropólogo e pastor presbiteriano Ronaldo Libório, um dos coordenadores da AMTB, 
nega que os missionários da associação obriguem os índios a adotarem o cristianismo 
como religião, abandonando suas culturas. Segundo ele, os valores do evangelho não 
são incompatíveis com nenhuma sociedade humana, muito menos os índios. Revela 
que, no processo de conversão dos indígenas, há batismo, mas ressalva que a 
principal atividade dos missionários é aliviar o sofrimento dos povos das florestas com 
a implantação de projetos sociais nas áreas de saúde e educação. 
Já os missionários do Cimi não consideram o infanticídio uma prática selvagem 
dos índios e defendem que essa cultura tem lógica nas aldeias com pouco contato 
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17 
 
com a cultura ocidental. "Não podemos tratar os índios que têm essa prática como 
bandidos", argumenta Saulo Feitosa, secretário adjunto do Cimi. A entidade inaugurou 
há alguns anos um novo método de evangelização. Não batiza as crianças indígenas 
e aceita a teologia e os rituais dos diversos povos. Os católicos adotam o que chamam 
de "missão calada" e esperam que só com o exemplo possam conquistar almas dentro 
das florestas. 
O proselitismo cristão nas aldeias assusta estudiosos e indigenistas. O 
antropólogo Rubem Thomaz de Almeida defende que o governo estabeleça regras 
para a entrada e permanência dos missionários nas aldeias. "Os missionários 
católicos adotam a educação clássica como método de dominação política. Os 
evangélicos impõem proibições que impedem o diálogo cultural com os índios", 
analisa. O ex-presidente da FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO (FUNAI), Mércio 
Pereira Gomes, defende a saída dos missionários da convivência direta com os 
indígenas. Ele entende que, antes da Bíblia, os índios deveriam ter uma educação 
formal laica para evitar práticas como o infanticídio, por exemplo. "O que esses 
missionários cristãos querem mesmo é salvar as próprias almas", critica.4 
5 ANTROPOLOGIA JURÍDICA: AS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NA 
EVOLUÇÃO RELIGIOSA E AS INFLUÊNCIAS CULTURAIS NA EVOLUÇÃO DA 
FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO 
Em uma sociedade complexa, plural, diversa e desigual, a luta pela igualdade 
de direitos para a população afrodescendente, indígena e africana no Brasil não 
terminou com o fim do regime escravocrata. 
Somos forjados na construção de um escravismo criminoso, a abolição foi 
realizada sem uma ampla revisão de direitos e necessidades da população negra. 
 
 
4 Extraído do link: merciogomes.blogspot.com 
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18 
 
Fronte: 
eticavirtualcbtis205.blogspot.com 
“Todos são iguais perante a lei” é o que garante o Art. 5º da Constituição 
Federal de 1988, estabelecendo em seu texto a desigualdade e não a diferença. 
O estudo da Antropologia Jurídica com observância nas diferenças religiosas, 
culturais das várias etnias formadoras do povo brasileiro, foi à base do estudo aqui 
apresentado. 
Com a necessidade da equidade social, buscou-se aqui integrar pluralidade na 
constituição da cultura popular existente no país. 
A análise da proteção judicial dos direitos fundamentais em uma perspectiva 
comparada entre a antropologia e as ciências que compõe a estrutura de estudo do 
homem como indivíduo modificador influencia o campo do conhecimento 
antropológico. 
Os institutos de proteção aos direitos fundamentais, e as teorias norteadoras 
da cultura que influenciaram na miscigenação e deu origem a aplicação de uma 
antropologia voltada para evolução da raça polemiza pelas diferenças históricas, 
políticas e biopsicocultural. Serão analisados a evolução do homem, as origens 
históricas, do negro, do africano e do índio, e o processo de aculturação desses povos 
na formação da identidade brasileira. 
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19 
 
5.1 Conceito e Objeto da Antropologia 
A Antropologia é desde longo tempo ciência responsável pelo estudo e análise 
das sociedades e suas ramificações. 
Segundo o dicionário Aurélio Antropologia é o estudo ou reflexão acerca do ser 
humano, e do que lhes é característico; é a designação comum a diferentes ciências 
ou disciplinas, cujas finalidades são descrever o ser humano e analisá-lo com base 
nas características biológicas e socioculturais dos diversos grupos (povos, etnias, 
etc.), dando ênfase às diferenças e variações entre eles. 
De origem europeia a Antropologia está comprometida com os pilares básicos 
que constituem a sociedade. Estudar o homem enquanto ser, suas diferenças e 
reações ante a política, a religião e os fundamentos de direito instituídos são pontos 
importantes no estudo da disciplina. 
Por fim é possível compreender o objetivo primeiro da Antropologia quando nos 
deparamos com um estudo voltado para o encontro do “EU” segundo uma análise do 
“OUTRO”. 
Para Roberto Kant de Lima a questão fundamental da Antropologia é o 
conhecimento do seu objeto, já que é esse um sujeito de valores. 
Segundo Kant: Os problemas que se colocam para a disciplina antropológica 
continuam extremamente excitantes e traçar-lhe a trajetória futura é sempre arriscar 
o incógnito e a surpresa. A tarefa se impõe, no entanto, ainda mais devido ao papel 
crítico desempenhando por esse saber frente às outras disciplinas das Ciências 
Sociais. (LIMA, 2009, p. 4) 
A Antropologia Jurídica não se confunde com os preceitos dogmáticos e 
normativos que impregna o desenvolvimento jurídico, os fatos e a produção formal 
que está vinculada ao processo hierárquico das relações sociais e humanas que 
identificam o campo de abrangência da disciplina. 
As mudanças sociais e o progresso acelerado das sociedades fizeram crescer 
o enfoque da Antropologia, gerando críticas quanto à complexidade dos modelos 
formais e estruturais em cada sociedade. 
Para Bela Feldman-Bianco: Em reação às análises estáticas e à construção de 
modelos em equilíbrio prevalecentes no funcionalismo estrutural, antropólogos 
preocupados em captar a fluência social basearam-se inicialmente nesta distinção e 
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20 
 
passaram a privilegiar a observação de processo, contradição, conflito de normas e 
manipulação de regras. (BIANCO, 1987 p. 22). 
Considerando a importância da pesquisa antropológica, é possível identificar 
uma prática cultural baseada no antagonismo europeu, voltada para perspectivas que 
contrastem com o pensamento habitual da Antropologia que busca conscientizar o 
homem do seu direito à cidadania referenciada diante dos princípios constitucionais 
que implicam na: “soberania, dignidade da pessoa humana, liberdade de culto e 
igualdade de gêneros em busca do tratamento igual aos iguais, e desigual aos 
desiguais à medida de suas desigualdades”. 
Torna-se assim impenetrável o saber antropológico, firma-se explicitamente 
uma trave de impedimentos na fixação da raiz sociológica e filosófica da possibilidade 
de investigação e especificidade do sistema jurídico-processual. 
Hoebel e Frost (1981) definem a antropologia como a ciência da humanidade e 
da cultura. Como tal, é uma ciência superior social e comportamental, e mais, na sua 
relação com as artes e no empenho do antropólogo de sentir e comunicar o modo de 
viver total de povos específicos, é também uma disciplina humanística. 
É possível identificar um povo a partir das características do seu nascimento, 
representada através do idioma. As afinidades linguísticas de um grupo étnico definema harmonia e compreendem fatores culturais e religiosos. 
Entender Antropologia requer uma análise aprofundada do seu objeto já que 
para alguns filósofos a cultura é sua base enquanto que para os antropólogos a 
evolução humana resume a essência da Antropologia enquanto ciências sociais. 
Vislumbrar uma Antropologia autônoma torna-se impossível no instante que a 
sua universalidade é incapaz de definir seu objeto enquanto associada a outras 
ciências. 
Para Assis e Kumpel: (...) a antropologia visa conhecer o homem inteiro, o 
homem em sua totalidade, isto é, em todas as sociedades e em todos os grupos 
humanos. Esse entendimento confere a Antropologia um tríplice aspecto: a) de ciência 
social: na medida em que procura conhecer o homem como indivíduo integrante de 
sociedades, comunidades e grupos organizados; b) de ciência humana: quando 
procura conhecer o homem através de sua história, suas crenças, sua arte, seus usos 
e costumes, sua magia, sua linguagem etc; c) de ciência natural: quando procura 
conhecer o homem por meio de sua evolução, seu patrimônio genético, seus 
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21 
 
caracteres anatômicos e fisiológicos. (ASSIS, Olney Queiroz; KUMPEL, Vítor 
Frederico, 2011, p.14). 
Entende-se então que a Antropologia é a construção de um saber científico do 
homem pautado na exposição dos conhecimentos adquiridos a partir da análise da 
sociedade. 
A antropologia visa o conhecimento completo do homem, o que torna suas 
expectativas muito mais abrangentes. Dessa forma, uma conceituação mais ampla a 
define como a ciência que estuda o homem, suas produções e seu comportamento. 
Entender o objeto de estudo da antropologia torna-se evidente quando a 
tomamos como ciência cultural que baseia seus estudos e observações no homem e 
nas suas obras. 
Entendemos a antropologia quando recebemos informações inerentes ao 
estudo do homem fóssil, sua anatomia, produções culturais e evolução. Todo esse 
estudo desenvolve-se a partir das investigações antropológicas e do método 
comparativo que busca respostas para compreender as diferenças e semelhanças 
físicas, sociais, culturais e psíquicas dos grupos humanos. 
Hoebel e Frost (1981) afirmam que a antropologia fixa como seu objetivo o 
estudo da humanidade como um todo. 
Pode-se dizer ser este um objetivo amplo que visa o homem como 
biopsicocultural, como ser participante da sociedade e explorador das atividades 
humanas unificadas. 
6 CULTURA E ANTROPOLOGIA NO MUNDO MODERNO 
A individualidade dupla do homem quando objeto da Antropologia, permite um 
estudo pautado no espaço físico e cultural do homem sem prejuízo de seus valores, 
tradições, costumes, crenças e hábitos que formam uma comunidade social 
específica. 
O ser humano é parte de uma diversidade cultural que abarca uma série de 
atos que o distingue e individualiza. Os hábitos culturais diferenciam os povos e 
imprimem costumes a tais civilizações costumes que não devem ser observados como 
diferenças de comportamento entre os homens. 
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22 
 
Não há o que se falar em capacidade específica de cada raça, os povos não 
possuem habilidades e inteligência pauta em suas raízes por serem naturalizados ou 
nativos de um país. As diferenças hereditárias e genéticas não contribuem como fato 
determinante nas aptidões e manifestações de cultura dos grupos étnicos. O homem 
evolui segundo sua faculdade e interesse no crescimento contínuo e acelerado de 
seus investimentos em aprendizagem e civilidade. 
É certo dizer que uma criança do sexo masculino se difere de uma criança do 
sexo feminino não por seus hormônios, e sim em decorrência da educação que 
recebe. Por tudo isso os antropólogos reconhecem que há limitação na influência 
geográfica sobre os fatores culturais já que a diversidade comportamental não sofre 
alterações de acordo com o ambiente físico. 
 
 
Fonte:cultura.culturamix.com 
Por volta do século XVIII a ideia de cultura abrangia aspectos espirituais de 
uma comunidade, e realizações materiais de um povo. Estudos levaram a observância 
de um sentido amplo que adotou um sentido etnográfico em busca de conhecimentos, 
crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos 
adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade. Segundo David Schneider, 
“Cultura é um sistema de símbolos e significados. (...)”. 
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23 
 
Hoebel e Frost (1981:77) afirmam que “para compreender a cultura humana 
devem-se conhecer as fases pelas quais a humanidade se transformou, do antropoide 
dominado pelo instinto ao ser humano adaptável culturalmente. Desde o tempo das 
origens primitivas da cultura, todo desenvolvimento humano foi biológico e cultural. 
Nenhuma tentativa de estudar a humanidade pode ignorar este fato. ” 
O desenvolvimento cultural do homem é uma realidade atestada pelos restos 
arqueológicos, ou seja, pela presença de artefatos rudimentares manufaturados. O 
desenvolvimento cultural do homem acha-se intimamente associado à sua evolução 
psicobiológica, o que lhe permitiu conquistas, cada vez mais aperfeiçoadas e 
complexas, no mundo cultural. 
O homem se torna, então, um ser cultural, capaz de produzir, ou seja, capaz 
de criar e acumular experiências e principalmente de transmiti-las socialmente. 
Brace (1970:67), analisando a cultura como mecanismo primário de adaptação 
humana, afirma: “a mais singular característica do ser humano é a sua capacidade 
para partilhar da experiência acumulada e transmitida pelos seus semelhantes. Esta 
deve, portanto, ser considerada a mais importante forma de adaptação do homem. ” 
Assim a compreensão da história baseia-se da cultura humana ocorrida na 
época pleistocênica. Sua reconstituição requer o conhecimento dos diferentes níveis 
culturais. 
7 FORMAÇÃO DO POVO BRASILEIRO 
O simples estudo do sistema de interpretação que explica e traduz os aspectos 
físicos, fisiológicos, psíquicos e sociológicos da conduta humana não é suficiente para 
explicar o homem considerando que estes aspectos são fragmentos da raça. 
A formação humana obedece às crenças, cultura, produção econômica, 
descobertas, invenções, organização política e jurídica em busca da constituição de 
uma sociedade voltada para o conhecimento das crenças religiosas, língua e criações. 
A evolução do homem e a reconstituição de habitat auxilia a antropologia na 
descoberta dos costumes que permitem uma análise técnica e abrangente. 
Preleciona o autor: 
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24 
 
O povo nação não surge no Brasil da evolução de formas anteriores de 
sociabilidade, em que grupos humanos se estruturam em classes opostas, mas se 
conjugam para atender às suas necessidades de sobrevivência e progresso. Surge, 
isto sim, da concentração de uma força de trabalho escrava, recrutada para servir a 
propósitos mercantis alheios a ela, através de processos tão violentos de ordenação 
e repressão que constituíram, de fato, um continuado genocídio e um etnocídio 
implacável. (RIBEIRO, 2005, p.23). 
Nessa passagem da história, o povo escravizado financeiramente e 
culturalmente deixa de lado suas raízes formadoras, se vêm banidos da sociedade e 
se deparam com uma realidade miserável, é o mesmo povo, a mesma raça, a mesma 
pátria, porém, são ricos e pobres, negros e brancos. Diferença que veio com a 
miscigenação, mas marca o povo em sua formação. 
Em outra passagem da sua obra Darcy Ribeiro expressa em palavras toda 
diferença dessa nação: Nessas condições, exacerba-se o distanciamento social entre 
as classes dominantes e as subordinadas, e entre estas e as oprimidas, agravando 
as oposições para acumular, debaixo da uniformidade étnico-cultural e da unidade 
nacional, tensões dissociativas de caráter traumático. Em consequência, as elites 
dirigentes, primeiro lusitanas, depois luso-brasileiras e, afinal, brasileiras,viveram 
sempre e vivem ainda sob o pavor pânico do alçamento das classes oprimidas. Boa 
expressão desse pavor pânico é a brutalidade repressiva contra qualquer insurgência 
e a predisposição autoritária do poder central, que não admite qualquer alteração da 
ordem vigente. A estratificação social separa e opõe, assim, os brasileiros ricos e 
remediados dos pobres, e todos eles dos miseráveis, mais do que corresponde 
habitualmente a esses antagonismos. Nesse plano, as relações de classes chegam a 
ser tão infranqueáveis que obliteram toda comunicação propriamente humana entre a 
massa do povo e a minoria privilegiada, que a vê e a ignora, a trata e a maltrata, a 
explora e a deplora, como se esta fosse uma conduta natural. A façanha que 
representou o processo de fusão racial e cultural é negada, desse modo, no nível 
aparentemente mais fluido das relações sociais, opondo à unidade de um 
denominador cultural comum, com que se identifica um povo de 160 milhões de 
habitantes, a dilaceração desse mesmo povo por uma estratificação classista de nítido 
colorido racial e do tipo mais cruamente desigualitário que se possa conceber. 
(RIBEIRO, 2005, p. 25). 
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25 
 
Por fim, é sabido que a formação do povo brasileiro é uma das mais 
miscigenadas do mundo e mesmo vivendo como único, esse povo de cultura 
extravagante e gosto aguçado é definido por Darcy Ribeiro (2005) em seu livro Povo 
Brasileiro como parte de uma origem de desigualdades. 
Composta como uma constelação de áreas culturais, a configuração histórico-
cultural brasileira conforma uma cultura nacional com alto grau de homogeneidade. 
Em cada uma delas, milhões de brasileiros, através de gerações, nascem e vivem 
toda a vida encontrando soluções para seus problemas vitais, motivações e 
explicações que lhes afiguram como o modo natural e necessário de exprimir sua 
humanidade e sua brasilidade. (RIBEIRO, 2005, p. 254). 
 
Em seus estudos acerca da formação do povo brasileiro, Josuel Stênio da 
Paixão (2012) afirma que as diferenças de cor e costumes não são marcantes no 
desenvolvimento dos povos, sua raiz predominante está na diversidade cultural. 
(...) diversos estudos antropológicos ao longo da história desta ciência 
demonstraram que a diferenciação entre as pessoas e sociedades são todas no 
âmbito cultural, ou seja, as diferenças surgem por meio da tradição, dos hábitos e 
costumes de um determinado povo. (PAIXÃO, 2012, p. 10). 
Por tudo isso o antropólogo Claude Lévi-Strauss assevera: 
Lévi-Strauss vai além dos demais quando entende que é necessário buscar os 
invariantes universais que estruturavam a produção de códigos simbólicos e 
expressavam a unidade psíquica do homem. Afirma o fundador do moderno 
estruturalismo a necessidade de constituir os fatos que fazem referência à mente 
humana e às suas organizações sociais. (STRAUSS, 1995, p. 55). 
A evolução histórica e evolução cultural dos povos, a contribuição na formação 
do povo brasileiro tem base no intercâmbio cultural e na miscigenação das raças. A 
ampliação do conhecimento religioso, alimentar e linguístico, configura-se na 
diversidade de usos e costumes impressos em nosso cotidiano. 
 CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU 
 
26 
 
8 AS RAÍZES CULTURAIS QUE FORMAM A IDENTIDADE DO POVO 
BRASILEIRO 
A influência da formação do povo brasileiro na construção das raízes culturais 
é parte da identidade brasileira. As conexões sociais acompanham as mudanças que 
influenciam a mola propulsora das diferenças socioculturais. 
 
Fonte:www.google.com 
Segundo Tales dos Santos Pinto a identidade brasileira é parte de um processo 
construído pela história e iniciou-se pós independência. 
Assim dispõe o autor: 
A identidade brasileira foi decorrente de um processo de construção histórica, 
como em diversos outros países. Apesar de ter se iniciado após a Independência, em 
1822, o processo de constituição da identidade nacional ganhou um impulso maior 
após a década de 1930, quando Getúlio Vargas chegou ao poder. A partir disso, pôde-
se perceber que a construção da identidade, para além de um processo cultural, era 
também um processo político. (PINTO, 2014). 
O processo político, as mudanças na administração estatal e as 
individualidades regionais, são garantias da representação cultural e da padronização 
da expressão cultural do Brasil. Para José Luiz Fiorin todo processo de construção da 
identidade está pautado em um Brasil moderno, porém com início na história. 
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27 
 
A identidade nacional é uma criação moderna. Começa a ser construída no 
século XVIII e desenvolve-se plenamente no século XIX. Antes dessa época não se 
pode falar em nações propriamente ditas, nem na Europa nem em outras partes do 
mundo. Conta-se, como aprendemos em nossos livros de História do Brasil, que D. 
João VI, ao deixar o Brasil, despediu-se de seu filho, dizendo: “Pedro, se o Brasil vier 
a separar-se de Portugal, põe a Coroa sobre tua cabeça, que hás de me respeitar, 
antes que algum aventureiro lance mão dela”. Observe-se que D. João, como, aliás, 
qualquer outro rei europeu, não tinha nenhum sentimento nacional, tinha um 
sentimento dinástico. (FIORIN, 2009, p. 115-126) 
Segundo Eliane Maria de Oliveira Giacon e Giane Maria Giacon (2011) a 
identidade nacional, antes de estar associada a uma atitude, é uma forma discursiva 
produzida em determinado contexto histórico. 
Assevera Adriano Franco Murta 
O embate entre culturas distintas começa a partir do processo de colonização 
quando se procura instaurar a cultura estrangeira no âmbito dos processos simbólicos 
da cultura nativa. A partir daí, busca-se entender os conflitos na formação da 
identidade cultural brasileira que se estabelece dentro de uma negociação constante 
e uma contínua modificação na atualização da identidade desses povos. (MURTA, 
2007, p. 16) 
A chamada brasilidade ou identidade brasileira tem conexão com a formação 
administrativa e trata também da coesão social. Tales dos Santos Pinto (2014) fala da 
construção desta identidade na ordem latifundiária e na representação militar. 
Entre as décadas de 1940 e 1960, a construção da identidade nacional passou 
a ser realizada levando em consideração a luta contra o que era considerado uma 
influência colonial, do que era vindo da Europa ou dos EUA. A partir da década de 
1960, com a ditadura militar e sua centralização autoritária e repressiva, aliadas à 
difusão da televisão pelos domicílios, um novo momento de difusão de elementos 
culturais foi conhecido. As telenovelas passaram também a auxiliar na exposição de 
práticas sociais consideradas expoentes da brasilidade. (PINTO, 2014). 
Em meio a concepção de identidade e as possibilidades de maturidade de uma 
nação organizada que se dá nas fronteiras da história e da construção social e cultural 
tem como diferenciação a língua. 
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28 
 
Contribuiu ainda para a existência da identidade nacional o fato de a língua 
portuguesa ser comum a todo o território, apesar de suas particularidades regionais. 
A língua seria então um elemento no conjunto de elementos culturais comuns que são 
constitutivos da cultura nacional. (PINTO, 2014). 
Esse processo de construção da identidade nacional, conta e apoia-se nas 
novas diretrizes e conteúdo da evolução cultural e educacional do país. O estudo da 
história e cultura afro-brasileira e indígena estimula o crescimento da cidadania e 
reafirma a preservação e resgate dos trabalhos arqueológicos em busca da presença 
destes povos em nossa cultura. 
8.1 Relações Étnico-raciais História e Cultura Afro-brasileira, africana e 
indígena 
O Brasil hoje possui cerca de 170 línguas indígenas. Algumas das línguas 
registradas à época do descobrimento desapareceram outras se tornaram extintas e 
irregulares o seu uso. As áreas de efetiva colonização brasileiraainda hoje possuem 
o domínio da língua indígena e influenciam o cotidiano. 
Sabe-se que a influência cultural, no âmbito da ciência antropológica é de 
grande relevância e acentua o processo civilizatório. A característica primordial dos 
povos indígenas é a multiplicidade de povos e a diferença acentuada entre eles. 
Os negros chegaram ao Brasil e com eles uma estrutura linguística e cultural 
que evidencia a variedade cultural deste povo. A aculturação marcou a expansão da 
língua geral e influenciou na troca e adoção dos padrões culturais e linguísticos entre 
o branco, negros e índios. Essa aproximação cultural entre os povos facilitou o contato 
e o entendimento entre eles. 
As relações entre afro-brasileiro, africanos e indígenas no Brasil caracteriza-se 
pela linguagem difundida no momento em que o encontro desses povos mescla a 
língua e intensifica a riqueza de cultura existente no país. 
A aquisição da linguagem marcou a revolução histórica da humanidade, tal 
fenômeno nasceu dos agrupamentos familiares que a partir dos rudimentos da fala 
formulou um vocabulário comum que originou em uma língua básica compreendida 
pelos integrantes de cada grupo familiar. 
 CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU 
 
29 
 
Essa mistura de línguas originou um dialeto assimilado e adotado por africanos 
e afro-brasileiros. Quanto aos hábitos e costumes desses povos foram alterados e 
mesclados durante o processo evolutivo e contribuíram para conversão dos negros à 
religião católica a partir do sincretismo de crenças e cultos. A religião africana mesclou 
com elementos religiosos indígenas, católicos e espíritas. 
A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Direitos dos Povos, aprovada em 
1981, trouxe uma grande novidade ao afirmar que: 
Os povos são também titulares de direitos humanos, tanto no plano interno 
como na esfera internacional. Até então só havia o reconhecimento do direito dos 
povos a autodeterminação... A Carta Africana, vai mais além, e afirma os direitos dos 
povos à existência enquanto tal (art. 20, in initio), à livre disposição de sua riqueza e 
recursos naturais (art. 21), ao desenvolvimento (art. 22), à paz e à segurança (art. 23) 
e também à preservação de um meio ambiente sadio (art. 24) (COMPARATO, 2004, 
p. 391). 
A miscigenação e transculturação devem ser estudadas e vista em um único 
processo, sem dissociação. Os dois processos receberam e ofereceram elementos 
culturais e históricos que assimilaram e diluíram no entendimento religioso e 
linguístico. 
Para Marconi e Presotto (2011), a miscigenação foi intensa e prolongada e nas 
mesmas proporções, o processo de transculturação. 
Assim o processo cultural no Brasil deu-se a partir da fusão dos grupos étnico-
raciais. Assim o povo brasileiro é mestiço e encontra-se ainda em processo de 
miscigenação e aculturação. 
Os portugueses trouxeram consigo sua sociedade e sua civilização. Em um 
esforço de adaptação ecológica. A língua portuguesa aos poucos foi se impondo, 
mesclada de vocábulos indígenas e africanos. A religião e diferenças culturais 
também sofreram influências, a religião negra impregnou-se de elementos do 
catolicismo e, em menor proporção, a dos indígenas, num sincretismo que foi e é muito 
expressivo nessas duas esferas da cultura: religiosa e linguística. 
Os indígenas não só emprestaram seus elementos culturais, mas também 
assimilaram muito através dos vários contatos. A fusão dos vários grupos 
heterogêneos culminou no processo aculturativo do Brasil e contribuiu para a 
miscigenação das raças. 
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30 
 
Os grupos que integram o Brasil indígena contemporâneo são os que restaram 
do longo processo a que foi submetida a população ameríndia ou pré-cabraliana, a 
partir do Descobrimento do Brasil, no século XVI. 
Segundo Darcy Ribeiro (1957:18), em 1900 havia 230 grupos tribais no Brasil, 
que ficaram reduzidos, em 1957, a 143. Em aproximadamente meio século, 
desapareceram 87 grupos indígenas do território brasileiro. 
Com relação ao Brasil, as pesquisas arqueológicas e paleontológicas vêm 
demonstrando que as datas mais antigas da presença do homem situam-se em torno 
do ano 8.000 a. C., constatadas pelos testemunhos fósseis do Homem da Lagoa 
Santa, em Minas Gerais. 
Para Darcy Ribeiro (1977:254) o “indígena é, no Brasil de hoje, essencialmente, 
aquela parcela da população que apresenta problemas inadaptação à sociedade 
brasileira, em suas diversas variantes, motivados pela conservação de costumes, 
hábitos ou meras lealdades que a vinculam a uma tradição pré-colombiana. ” 
São números as culturas e as línguas tribais que compõem essa parcela da 
população brasileira, num verdadeiro mosaico de grupos indígenas diversificados e 
diferenciados.5 
8.2 Fundamentos De Antropologia Religiosa 
O sagrado só pode ser captado na própria existência do homem que o define e 
o limita. Daí a necessidade de uma compreensão do cerne dos fatos religiosos. Para 
explicar não apenas o como, mas também o porquê da experiência humana do divino, 
esse livro parte das noções mais gerais e exprime mediante exemplos precisos, a 
dimensão cultural do homem crente. 
 
 
5 Extraído do link: joseanelcsantos.jusbrasil.com.br 
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31 
 
Fonte: 
www.setead.com.br 
O autor faz em primeiro lugar reflexão necessária e crítica de noções 
fundamentais como religião, sagrado, puro e impuro, e experiência religiosa. 
Em seguida procura mostra os quadros culturais de uma tal experiência, 
estudando o significado das ações rituais, o fundamento de alguns grandes símbolos 
religiosos estreitamente ligados ao ser humano, e os problemas relativos à 
aculturação religiosa. 
Na última parte, precisa as relações entre o indivíduo e a divindade, analisando 
a dimensão psicológica, as experiências do divino: o desejo do pai e a paternidade 
divina, e a memória como lembrança de Deus.6 
“Todos os sistemas, seja culturais, científicos, políticos, econômicos e até 
artísticos, que se apresentam como portadores exclusivos da verdade e de solução 
única para os problemas devem ser considerados fundamentalistas. Vivemos 
atualmente sob o império feroz de vários fundamentalismos” – BOFF, 
Fundamentalismo – A globalização e o futuro da Humanidade 
Pensando amplamente nesta consideração de Leonardo Boff, levantamos 
alguns estudos antropológicos sobre religiões – ou que sirvam como apoio teórico 
para reflexões antropológicas. 
 
6 Extraído do link: www.erdos.com.br 
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32 
 
O interesse pelos mitos, ritos de iniciação, pela religião e pela magia foi uma 
constante na antropologia francesa do século XX, e se mantém consideravelmente 
estável até hoje. Uma antropologia da religião, partindo de uma reflexão sobre a 
humanidade e sobre a cultura como realidades complexas, busca compreender como 
o ser humano foi e continua sendo visto, por ele próprio, através de uma das suas 
mais significativas manifestações, a religião. Não se trata de fazer uma análise de 
cada uma das religiões, mesmo aquelas mais conhecidas: a Antropologia da Religião 
desenvolve análises científicas do fenômeno religioso, enquanto experiência 
antropológica, essencialmente humana. Para a antropologia, a religião não é um modo 
arcaico do pensamento científico; é, ao contrário, um espaço distintivo da prática e da 
crença humanas que não pode ser reduzido a nenhum outro. Disso parece seguir que 
a essência da religião não deve ser confundida com, digamos, a essência da política, 
ainda que em muitas sociedades as duas possam se sobrepor e se entrelaçar. Mircea 
Eliade, “Imagens e símbolos “Nosso guia de antropologia inicia-se com o livro de um 
historiador, ligado comumente à chamada fenomenologia da religião. O romeno 
Mircea Eleade, nas análises desenvolvidasao longo de sua obra, desvenda os pontos 
de apoio que permitem ao indivíduo e aos grupos humanos equilibrarem-se e 
assegurarem seus pensamentos em meio aos movimentos da sua experiência. Em 
Imagens e Símbolos, o autor reivindica a função fundamental do imaginário e do 
simbólico para a vida e a cultura. “O pensamento simbólico não é uma área exclusiva 
da criança, do poeta, do desequilibrado; ele é consubstancial ao ser humano, precede 
a linguagem e a razão discursiva. O símbolo revela certos aspectos da realidade –os 
mais profundos – que desafiam qualquer outro meio de conhecimento. As imagens, 
os símbolos, os mitos, não são criações irresponsáveis da psique; elas respondem a 
uma necessidade e preenchem uma função: revelar as mais secretas modalidades do 
ser. Por isso, o seu estudo nos permite conhecer o homem, o homem simplesmente”. 
O símbolo cumpre sua função ao transmitir uma mensagem, mesmo que seu 
significado escape à consciência, ou seja modificado, camuflado, pois o símbolo, diz 
Eliade, dirige-se ao ser humano integral e não apenas à sua inteligência. A principal 
característica do símbolo é a simultaneidade de sentidos por ele revelados, que 
podem inclusive ser compreendidos em qualquer cultura. Os símbolos e as imagens 
têm valências universais porque são “aberturas para um mundo trans-histórico, 
conservando as culturas ‘abertas’. Ao mesmo tempo, apesar de serem produtos do 
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33 
 
inconsciente, são depurados no processo histórico e cultural em que estejam 
inseridos”. A história, diz, pode fazer com que sejam acumuladas novas significações 
à estrutura original do simbolismo, mas não a destrói. Ao tornarem-se símbolos, os 
objetos “anulam seus limites concretos, deixam de ser fragmentos isolados para se 
integrar num sistema, ou melhor, eles encarnam em si próprios, a despeito de sua 
precariedade e do seu caráter fragmentário, todo o sistema em questão”. Diante 
dessas considerações, é legítimo falar de uma “lógica dos símbolos, pois qualquer 
que seja a sua natureza e o plano em que se manifestem, são sempre coerentes e 
sistemáticos”. Segundo Eliade, o pensamento simbólico precede a linguagem e a 
razão discursiva, pois o símbolo revela certos aspectos da realidade que desafiam 
qualquer outro meio de conhecimento. As imagens, os símbolos e os mitos têm o 
poder de revelar verdades secretas do ser e de transportar o ser humano para o 
mundo espiritual muito mais amplo. Em outro livro, intitulado O sagrado e o profano, 
o autor estuda a situação do homem em um mundo saturado de valores religiosos e, 
por exemplo, comenta os simbolismos originais: “Graças às fases da Lua – quer dizer, 
ao seu ‘nascimento’, ‘morte’ e ‘ressurreição’ –, os homens tomaram consciência de 
seu próprio modo de ser no Cosmos e de suas possibilidades de sobrevivência ou 
renascimento. Graças ao simbolismo lunar, o homem religioso conseguiu aproximar 
amplos conjuntos de fatos, sem relação aparente entre si, e finalmente integrá-los num 
único ‘sistema’. É mesmo provável que a valorização religiosa dos ritmos lunares 
tenha possibilitado a realização das primeiras grandes sínteses antropocósmicas dos 
primitivos”. Mircea Eliade elaborou uma morfologia do sagrado, constituindo, mediante 
o método comparativo, modelos ou estruturas da experiência religiosa, buscando 
neles suas características permanentes. A partir da oposição entre sagrado e profano, 
ele comparou a experiência religiosa do Oriente e do mundo antigo à experiência 
profana do Ocidente e do mundo moderno. O sagrado, segundo Eliade, é o elemento 
central da religião. A distinção, para ele, entre sagrado e profano, é uma distinção 
ontológica; o simbolismo religioso, um monumento original de qualquer experiência 
religiosa profunda. A distinção entre sagrado e profano implica numa distinção entre 
o homem religioso e não-religioso, distintos, por sua vez, no que tange à percepção 
do tempo, como heterogêneo e homogêneo respectivamente: Eliade concebe que a 
percepção do tempo, como um meio homogêneo, linear, e inexorável, é uma 
peculiaridade do homem moderno e não-religioso. O homem arcaico ou religioso 
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34 
 
(homo religiosus), na comparação, percebe o tempo como heterogêneo, isto é, como 
dividido entre o tempo profano (linear), e o tempo sagrado (cíclico e 
retornável).Analisando a estrutura do mito e dos símbolos religiosos, bem como 
algumas das suas mais diversificadas manifestações, quer entre os povos primitivos, 
quer nas civilizações clássicas e nas modernas, Eliade produziu uma obra que 
constitui, simultaneamente, notável exposição histórica e síntese antropológico-
filosófica. Segundo Eliade, a história das religiões divide-se entre duas orientações 
metodológicas, distintas e complementares: enquanto alguns estudiosos dedicam-se 
a desvendar as estruturas dos fenômenos religiosos, outros preferem reconstituir o 
contexto histórico desses mesmos fenômenos. “Os primeiros esforçam-se por 
compreender a essência da religião, os outros trabalham para decifrar e apresentar 
sua história”; de modo que os resultados obtidos pelas pesquisas etnológicas e 
sociológicas devem ser utilizados pelo historiador das religiões, entretanto, é preciso 
completá-los para que possam assumir “uma perspectiva diferente e mais ampla”, pois 
“o etnólogo apenas se ocupa das sociedades que denominamos primitivas, enquanto 
que o historiador da religião incluirá em seu campo de investigação toda a história 
religiosa da humanidade, desde os primeiros cultos das eras paleolíticas de que se 
tem notícia, até os movimentos religiosos modernos”. 
O trabalho antropológico de Marcel Mauss (1872-1950) é aceito também nas 
discussões de cunho sociológico. O Ensaio sobre a dádiva – Forma e razão da troca 
nas sociedades arcaicas, sua obra fundamental, é um marco no desenvolvimento 
antropológico da sociologia durkheimiana, adotando a etnografia, abrindo-se para as 
sociedades não-ocidentais e assumindo cada vez mais a comparação e uma visão 
filosoficamente crítica. 
O trabalho antropológico de Marcel Mauss (1872-1950) é aceito também nas 
discussões de cunho sociológico. O Ensaio sobre a dádiva – Forma e razão da troca 
nas sociedades arcaicas, sua obra fundamental, é um marco no desenvolvimento 
antropológico da sociologia durkheimiana, adotando a etnografia, abrindo-se para as 
sociedades não-ocidentais e assumindo cada vez mais a comparação e uma visão 
filosoficamente crítica. 
Segundo Mauss, que estudava narrativas antropológicas e descrições das 
trocas em sociedades primitivas, toda representação é relação, ou seja, funda-se 
sobre a união de uma dualidade de contrários e, justamente, o argumento central do 
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35 
 
Ensaio é que a dádiva produz alianças, matrimoniais, políticas, religiosas, 
econômicas, jurídicas e diplomáticas, postulando, assim, um entendimento da 
constituição da vida social baseada em um constante dar-e-receber, no qual 
evidencia-se o papel da troca – posteriormente estudado em especial por Pierre 
Clastres. 
Falar de sacrifício é também falar de dádiva: o sacrifício, por exemplo o 
sacrifício totêmico, é uma dádiva interessada que fazemos para ganhar os favores 
dos deuses ou desviar a sua cólera: “Em todo sacrifício há um ato de abnegação, pois 
quem se sacrifica se priva e se dá. Essa abnegação lhe é mesmo frequentemente 
imposta como um dever. […] O sacrifício se apresenta, então, sob um duplo aspecto. 
E um ato útil e urna obrigação. O desinteresse se mescla ao interesse. Por isso ele foi 
frequentemente concebido sob a forma de um contrato”. Castigo, dádiva, contrato: 
esses são os temas centrais da obra de Mauss. No “Ensaio sobre a dádiva”, o 
antropólogo demonstrou que a vida dos “primitivos” é mais complexa, ativa e dinâmica 
do que se acreditava, é, portanto, preciso não a representarcomo “estática”, e que a 
vida econômica está profundamente ligada à moralidade e à religiosidade. 
Para Mauss, a dádiva é uma lógica organizativa do social que tem caráter 
universalizante e que não pode ser reduzida a aspectos particulares como aqueles 
religiosos ou econômicos. As traduções feitas por diferentes culturas produzem, de 
fato, desvios semânticos que levam, por exemplo, pensando o caso brasileiro, a uma 
redução do dom a um fenômeno religioso. Isso dificulta a compreensão da sociologia 
de Mauss, mas esta dificuldade não pode ser vista como uma restrição linguística 
insuperável. 
No Ensaio sobre a dádiva, Mauss, a partir de um estudo do fenômeno da dádiva 
entre os povos da Polinésia e da Melanésia e os indígenas da América do Norte, 
evidencia que os fatores econômicos não são dissociáveis de outros aspectos da vida 
social. As trocas, sejam elas quais forem, dizem respeito à sociedade no seu conjunto 
e derivam todas da obrigação de dar. 
 A dádiva tem valor social e reúne simultaneamente questões religiosas, 
econômicas, políticas, matrimoniais e jurídicas. A dádiva está presente na própria 
ideia de da influência decisiva, daquilo que circula, sobre como se formam os atores 
e como se definem seus lugares em sociedade. No seu texto sobre Relações reais e 
práticas entre a psicologia e a sociologia, por exemplo, Mauss sustenta que, 
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36 
 
diferentemente dos demais animais, o humano se caracteriza pela presença da 
vontade, da pressão da consciência de uns sobre outros, das comunicações de ideias, 
da linguagem, das artes plásticas e estéticas, dos agrupamentos e religiões, em uma 
palavra, complementa, das “instituições que são o traço da nossa vida em comum”. 
Marcel Mauss é espontaneamente identificado a Emile Durkheim, de quem é 
sobrinho, discípulo e alter ego. Seu Ensaio sobre a dádiva um prolongamento-
renovação da teoria durkheimiana da coesão social, da relação indivíduo-sociedade. 
Sua preocupação fundamental durante a concepção do estudo, e que o situa dentro 
de um verdadeiro programa de pesquisa, recai sobre as formas arcaicas de contrato. 
Mauss abandona, assim, a oposição central e constitutiva da sociologia 
durkheimiana do fato religioso: a oposição entre sagrado e profano. Durkheim 
acreditara em poder “tudo explicar pela religião”. A partir de então, tudo se poderá 
compreender a partir do simbolismo. Deixa de ser necessário recorrer à dicotomia 
entre o sagrado e o profano, já que basta a oposição simples entre simbólico e 
utilitário, de onde é retirado todo o poder da distinção conceitual primitiva. Ao inverso 
da concepção durkheimiana do sagrado e do profano, Mauss insistirá continuamente 
na imbricação entre utilitário e simbólico, entre interesse e desinteresse. 
No ensaio, Mauss analisa a dádiva, a reciprocidade e a troca nas “sociedades 
arcaicas”, principalmente na Melanésia e no noroeste americano, estabelece também 
uma comparação com “alguns traços dos direitos indo-europeus” – tais como direito 
romano, hindu clássico e germânico – analisando as trocas que, aparentemente livres 
e gratuitas, são, como ele demonstra, obrigatórias e interessadas: os presentes. 
Mauss se refere à noção de hau, do espírito da coisa, para explicar: haveria uma força 
das coisas que obriga a dar presentes, pois “apresentar alguma coisa a alguém é 
apresentar alguma coisa de si”. 
A dádiva produz a aliança, tanto as alianças matrimoniais como as políticas 
(trocas entre chefes ou diferentes camadas sociais), religiosas (como nos sacrifícios, 
entendidos como um modo de relacionamento com os deuses), econômicas, jurídicas 
e diplomáticas (incluindo-se aqui as relações pessoais de hospitalidade). Podemos 
isolar o aspecto econômico de uma troca, mas ela implica sempre também um aspecto 
religioso (que se evidencia nos sacrifícios, nas dádivas de palavras das rezas etc.), 
político (que se evidencia nas trocas malsucedidas – que redundam em guerra –, na 
troca de violência ou ainda no desequilíbrio entre o que é trocado e na assimetria 
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37 
 
temporal implícita em qualquer redistribuição –, ou mesmo estético (a confecção dos 
objetos, o modo de oferecimento etc.). A troca é assim um fato social “total”. 
Para Lévi-Strauss, em sua abordagem estruturalista, o pensamento primitivo 
articula proposições cosmológicas por meio de categorias sensíveis. A significação 
assim é produzida a partir da relação dos elementos nas narrativas míticas ou na 
tradução isomórfica. 
Lévi-Strauss forneceu à etnologia um valor heurístico no campo das ciências 
sociais, próximo, mas também bastante crítico àquele expressado por Durkheim. 
Quando assumiu, em 1951, a cadeira de Religiões dos povos não civilizados, fundada 
em 1888 na École Pratique des Hautes Études, e que fora de Léon Marillier, Marcel 
Mauss e Maurice Leenhardt, mudou-lhe o nome para Religiões comparadas dos 
povos sem escrita. Foi nesse quadro institucional e ideológico francês da década de 
1950 que Lévi-Strauss experimentou métodos de análise das representações míticas 
e das práticas religiosas. São os escritos desse período que, portanto, dão a conhecer 
de maneira mais clara o que as suas interpretações sobre as religiões ditas primitivas 
devem (ou não) a Durkheim. Estudando os temas de magia e religião, a antropólogo 
tornou central determinado conceito de representação em sua teoria do simbólico, de 
viés cognitivista. 
Na Antropologia Estrutural, Lévi-Strauss distingue, assim, as estruturas de 
ordem “vividas” – relacionadas à realidade objetiva – das estruturas de ordem 
“concebidas” – as representações que os homens fazem de sua realidade. Enquanto 
o parentesco, a organização social, as relações de troca pertencem à primeira ordem, 
a religião e o mito correspondem à segunda. Como Durkheim, Lévi-Strauss reconhece 
que os fatos religiosos devem ser estudados como parte integrante da vida social. O 
papel da etnologia seria, pois, o de estabelecer correlações entre diversos tipos de 
religião e diversos tipos de organização social. 
Submetendo os mitos à sua análise estrutural, Lévi-Strauss decompõe a trama 
narrativa em unidades mínimas de relações, como o parentesco. As frases narrativas 
que desenvolvem o mesmo tema são agrupadas, então, em conjuntos orgânicos e, 
estes, comparados a fim de construir uma série de variações. A teoria de Lévi-Strauss 
do significado está subordinada, portanto, a essa operação de composição de séries 
e é a própria relação lógica entre as séries que nos dá acesso ao significado do mito. 
De acordo com sua análise, a narrativa mítica se desenvolve no plano das relações 
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sociais, mas o seu significado se realiza no plano das estruturas mentais. No mito, 
como diz em O cru e o cozido, “o espírito, deixado a só consigo mesmo e liberado da 
obrigação de compor-se com os objetos, fica de certo modo reduzido a imitar-se a si 
mesmo […] e evidencia assim sua natureza de coisa entre as coisas”. A mitologia, 
apresentada como o universo da regra em si, seria a mais pura expressão do modus 
operandi da mente humana. Desse modo, como explica a professora Paula Monteiro, 
no artigo “A teoria do simbólico de Durkheim e Lévi-Strauss: desdobramentos 
contemporâneos no estudo das religiões” “se, para Durkheim, o estudo das crenças 
religiosas observadas nos daria acesso às categorias abstratas de entendimento, tais 
como tempo, espaço, gênero e espécie, para Lévi-Strauss, as categorias sensíveis – 
cru e cozido, fresco e podre -, definidas pela observação etnográfica, servem como 
ferramentas conceituais para isolar noções abstratas e encadeá-las em proposições”. 
Para Lévi-Strauss, não é a variedade empírica particular das culturas que o 
interessa, mas a regra de suas variações, estabelecida pela comparação que 
demonstra que apenas um número limitado

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