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Objetivos Referências recomendadas: Cecil e Harrison, artigos (guidelines) 1- Conceituar dor, classificando-a quanto à: a) Tipos de dor (nociceptiva e não nociceptiva - neuropática), diferenciando-as b) Localização (localizada, referida, irradiada, etc.); c) Dor crônica e dor aguda. 2- Descrever as vias da dor (incluindo os nociceptores), enumerando os receptores, vias sensitivas e áreas encefálicas relacionadas. 3- Caracterizar as ações dos neurotransmissores envolvidos nas vias da dor, exemplificando-os. 4- Descrever os mecanismos desencadeantes e moduladores do Sistema doloroso. 5- Caracterizar sensibilização central e periférica. 6- Caracterizar clinicamente dor nociceptiva, descrevendo a qualidade da dor. 7- Identificar a terapêutica adequada da dor nociceptiva. 8- Identificar os riscos da automedicação, enumerando os ricos do uso abusivo de analgésicos. 9- Descrever o mecanismo de ação e efeitos colaterais das medicações: Tylenol, Dipirona, Buscopam, Anador, Nimesulida, Sulfadiazina de Prata. 1- CONCEITO DE DOR. REFERÊNCIA: Medicina Interna – Harrison A dor é uma sensação desagradável localizada em alguma parte do corpo. Com frequência, é descrita em termos relacionados com processos penetrantes ou destrutivos dos tecidos (p. ex., em punhalada, em queimação, em torção, dilacerante, compressiva) e/ou como uma reação corporal ou emocional (p. ex., pavorosa, nauseante, debilitante). Além disso, qualquer dor de intensidade moderada ou intensa é acompanhada de ansiedade e do desejo de escapar da sensação ou de interrompê-la. Essas propriedades ilustram a dualidade da dor: é tanto uma sensação quanto uma emoção. REFERÊNCIA: Cecil Medicina A International Association for the Study of Pain define dor como “uma experiência sensorial e emocional desagradável associada a dano tecidual real ou potencial, ou descrita em termos de tal dano.” Essa definição reconhece que a dor pode ser sentida, em algumas circunstâncias, na ausência de danos em curso nos tecidos, como a dor fantasma após amputação cicatrizada. Uma implicação desta definição é a suposição de que a dor é sempre subjetiva, portanto, um relato de dor do paciente sempre deve ser aceito como fato na ausência de prova contrária. REFERÊNCIA: Tratado de Fisiologia Médica – Guyton A dor ocorre sempre que os tecidos são lesionados, fazendo com que o indivíduo reaja para remover o estímulo doloroso. Mesmo atividades simples, como o ato de sentar durante longos períodos sobre os ísquios, podem causar destruição tecidual pela falta de fluxo sanguíneo para a pele comprimida pelo peso do corpo. Quando a pele fica dolorida, como o resultado de isquemia, a pessoa normalmente transfere o peso de modo subconsciente. Entretanto, uma pessoa que tenha perdido a sensação da dor, como após lesão da medula espinal, não vai sentir essa dor e consequentemente não realizará o movimento de transferência do peso. Essa situação resultará em perda e descamação total da pele nas áreas de pressão. TIPOS DE DOR. REFERÊNCIA: Tratado de Clínica Médica – Antônio Carlos Neto Nociceptiva: É causada pela ativação dos nociceptores e pela transmissão dos impulsos gerados, que percorrem as vias nociceptivas até as regiões do sistema nervoso central, onde são interpretados. A dor secundária a agressões externas (picada de um inseto, fratura de um osso, corte da pele), a dor visceral (cólica nefrética, apendicite), a neuralgia do trigêmeo, a dor da artrite e da invasão neoplásica dos ossos são exemplos de dor nociceptiva. Características: A dor nociceptiva começa simultaneamente ao início da atividade do fator causal, o qual pode ser, em geral, identificado. Sua remoção frequentemente culmina com o alívio da sensação dolorosa. Nenhum déficit sensorial é identificado nesses pacientes, e a distribuição da dor corresponde à das fibras nociceptivas estimuladas. Quanto menor é o número de segmentos medulares envolvidos na inervação de uma estrutura, mais localizada é a dor (somática superficial). Em contrapartida, quanto maior o número de segmentos medulares, mais difusa é a dor (visceral e somática profunda). A dor nociceptiva pode ser espontânea ou evocada. A espontânea pode ser expressa com as mais variadas designações: pontada, facada, agulhada, aguda, rasgando, latejante, surda, contínua, profunda, vaga, dolorimento. Todas essas denominações sugerem lesão tissular. A evocada pode ser desencadeada por algumas manobras como: manobra de Lasegue na ciatalgia, a dor provocada pelo estiramento da raiz nervosa, obtida pela elevação do membro inferior afetado, estando o indivíduo em decúbito dorsal, e lavar o rosto e escovar os dentes, nos pacientes com neuralgia do trigêmeo. Esse tipo de dor reproduz a sentida pelo paciente. REFERÊNCIA: Medicina Interna - Harrison Neuropática: As lesões nas vias nociceptivas periféricas ou centrais caracteristicamente resultam em perda ou redução da sensação dolorosa. Paradoxalmente, a lesão ou a disfunção dessas vias também podem provocar dor. Por exemplo, a lesão de nervos periféricos, como a que ocorre na neuropatia diabética, ou de aferentes primários, como no herpes-zóster, pode resultar em dor referida para a região do corpo suprida pelos nervos afetados. A dor também pode ser produzida por lesão do sistema nervoso central (SNC), por exemplo, em alguns pacientes após traumatismo ou lesão vascular da medula espinal, tronco encefálico ou regiões talâmicas contendo as vias nociceptivas. Essas dores neuropáticas com frequência são graves e caracteristicamente resistentes aos tratamentos convencionais. A dor neuropática tem um caráter incomum, sendo descrita como em queimação, formigamento ou semelhante a um choque elétrico, podendo ser desencadeada por um toque muito leve. Essas características são raras em outros tipos de dor. Ao exame físico, é frequente a presença de déficit sensitivo na área de dor do paciente. A hiperpatia, uma sensação muito exagerada de dor produzida por estímulos nociceptivos inócuos ou leves, também é característica da dor neuropática; com frequência, os pacientes queixam-se de que estímulos produzidos por movimentos muito suaves provocam dor incomum (alodinia). Nesse aspecto, é clinicamente interessante o fato de que uma preparação tópica de lidocaína a 5% sob a forma de adesivo é eficaz para pacientes com neuralgia pós-herpética que apresentem alodinia acentuada. Diversos mecanismos contribuem para a dor neuropática. A exemplo dos nociceptores aferentes primários sensibilizados, os aferentes primários lesados, incluindo nociceptores, tornam-se altamente sensíveis à estimulação mecânica e podem começar a gerar impulsos na ausência de estímulos. O aumento de sensibilidade e de atividade espontânea ocorre, em parte, pela maior concentração dos canais de sódio na fibra nervosa danificada. Os aferentes primários lesados também podem desenvolver sensibilidade à norepinefrina. Curiosamente, os neurônios medulares transmissores da dor, mesmo isolados de seus impulsos aferentes normais, também podem se tornar espontaneamente ativos. Por conseguinte, a hiperatividade de ambos os sistemas nervosos central e periférico contribui para a dor neuropática. Dor mantida simpaticamente. Os pacientes com lesão nervosa periférica ocasionalmente manifestam dor espontânea na região suprida pelo nervo. A dor com frequência é descrita como sensação de queimação. A dor se inicia após intervalo de horas a dias, ou mesmo semanas, e é acompanhada de tumefação do membro, perda óssea periarticular e alterações inflamatórias nas articulações distais. A dor pode ser aliviada com bloqueio anestésico local da inervação simpática do membro afetado. Os nociceptores aferentes primários lesados adquirem sensibilidade adrenérgica, podendo ser ativados por estimulação de eferentes simpáticos. Essa constelação de dor espontânea e sinais de disfunção simpática após umalesão foi denominada síndrome dolorosa complexa regional (SDCR). Quando isso ocorre após uma lesão nervosa identificável, a SDCR é dita do tipo II (também conhecida como nevralgia pós-traumática ou, quando intensa, causalgia). Quando um quadro clínico semelhante se instala sem qualquer lesão nervosa evidente, a SDCR é dita do tipo I (também conhecida como distrofia simpática reflexa). A SDCR pode ser produzida por diversas lesões, como fraturas ósseas, traumatismo de tecidos moles, infarto do miocárdio e acidente vascular encefálico. A SDCR do tipo I caracteristicamente é resolvida com tratamento sintomático; contudo, quando persiste, a investigação detalhada frequentemente revela evidências de lesão de nervo periférico. Embora a fisiopatologia da SDCR não tenha sido bem compreendida, a dor e os sinais de inflamação, quando agudos, podem ser aliviados rapidamente bloqueando-se o sistema nervoso simpático. Isso significa que a atividade simpática é capaz de ativar os nociceptores não lesados na presença de inflamação. Devem-se pesquisar sinais de hiperatividade simpática em pacientes com dor e inflamação pós-traumáticas sem outra explicação evidente. LOCALIZAÇÃO. REFERÊNCIA: Semiologia Médica - Porto Dor somática superficial (ou cutânea) É a forma de dor nociceptiva decorrente da estimulação de nociceptores do tegumento (pele e anexos). Tende a ser bem localizada e se apresentar de maneira bem distinta (picada, pontada, rasgando, queimor), de acordo com o estímulo aplicado. Sua intensidade é variável e, de certa maneira, proporcional à intensidade do estímulo. Decorre, em geral, de trauma, queimadura e processo inflamatório. Dor somática profunda É a modalidade de dor nociceptiva consequente à ativação de nociceptores dos músculos, fáscias, tendões, ligamentos e articulações. Suas principais causas são: estiramento muscular, contração muscular isquêmica (exercício exaustivo prolongado), contusão, ruptura tendinosa e ligamentar, síndrome miofascial, artrite e artrose. É mais difusa que a dor somática superficial, apresenta localização imprecisa, sendo em geral descrita como dolorimento (aching pain), dor surda, dor profunda e, no caso da contração muscular isquêmica, como cãibra. Sua intensidade é proporcional à do estímulo causal, mas comumente vai de leve à moderada. Às vezes, pode manifestar‐se como dor referida. Dor visceral É a dor nociceptiva decorrente da estimulação dos nociceptores viscerais. É profunda, e tem características similares às da dor somática profunda, ou seja, é difusa, de difícil localização e descrita como um dolorimento ou uma dor surda, vaga, contínua, profunda, que tende a acentuar‐se com a solicitação funcional do órgão acometido. Tais características se devem às peculiaridades da inervação nociceptiva visceral. De um modo geral, a dor visceral pode ser relacionada com quatro condições: (a) comprometimento da própria víscera (dor visceral verdadeira); (b) comprometimento secundário do peritônio ou pleura parietal (dor somática profunda); (c) irritação do diafragma ou do nervo frênico; (d) reflexo viscerocutâneo (dor referida). Embora a dor visceral verdadeira, em geral, apresente as características mencionadas anteriormente, ela tende a se localizar próximo ao órgão que a origina. A dor cardíaca, por exemplo, tem localização retroesternal ou precordial; a pleural, na parede do hemitórax correspondente; a esofágica é retroesternal ou epigástrica, entre outras. Pode‐se dizer ainda que determinadas qualidades de dor são mais específicas para certo tipo de víscera. Assim, a dor das vísceras maciças e dos processos não obstrutivos das vísceras ocas é descrita como surda; a dos processos obstrutivos das vísceras ocas é do tipo cólica; a por comprometimento da pleura parietal (dor somática profunda e não visceral) é em pontada ou fincada; a por isquemia miocárdica é constritiva ou em aperto; e a por aumento da secreção do ácido clorídrico (gastrite, úlcera gástrica ou duodenal) é do tipo em queimação ou ardor. Dor referida Pode ser definida como uma sensação dolorosa superficial, que está distante da estrutura profunda (visceral ou somática) cuja estimulação nóxica (nociva) é a responsável pela dor. Obedece à distribuição metamérica. A explicação mais aceita para esse fenômeno é a convergência de impulsos dolorosos viscerais e somáticos superficiais e profundos para neurônios nociceptivos comuns localizados no corno dorsal da medula espinal (sobretudo na lâmina V). Visto que o tegumento apresenta um suprimento nervoso nociceptivo muito mais exuberante do que o das estruturas profundas somáticas e viscerais, a representação talâmica e cortical destas é muito menor do que a daquela. Por conseguinte, os impulsos dolorosos provenientes das estruturas profundas seriam interpretados pelo cérebro como oriundos do tegumento e o paciente apontaria a dor neste local. São exemplos de dor referida: dor na face medial do braço (dermátomo de T1) em pacientes com infarto agudo do miocárdio; epigástrica ou periumbilical (dermátomos de T6‐T10) na apendicite; no ombro (dermátomo de C4) em indivíduos com doença diafragmática ou irritação do nervo frênico. Dor irradiada Caracteriza‐se por ser sentida a distância de sua origem, porém ocorre obrigatoriamente em estruturas inervadas pela raiz nervosa ou em nervo cuja estimulação nóxica é responsável pela dor. Um exemplo clássico é a ciatalgia, provocada pela compressão de uma raiz nervosa por uma hérnia de disco lombar. REFERÊNCIA: Tratado de Fisiologia Médica - Guyton DOR REFERIDA Frequentemente, a pessoa sente dor em uma parte do corpo que fica distante do tecido causador da dor. Essa é a chamada dor referida. Por exemplo, a dor em órgãos viscerais geralmente é referida à área na superfície do corpo. O conhecimento dos diferentes tipos de dor referida é importante para o diagnóstico clínico, pois em várias doenças viscerais o único sinal clínico é a dor referida. Mecanismo da Dor Referida. A Figura 49-5 mostra o provável mecanismo por meio do qual grande parte da dor é referida. Na figura, ramos das fibras para a dor visceral fazem sinapse na medula espinal, nos mesmos neurônios de segunda ordem (1 e 2) que recebem os sinais dolorosos da pele. Quando as fibras viscerais para a dor são estimuladas, os sinais dolorosos das vísceras são conduzidos pelo menos por alguns dos mesmos neurônios que conduzem os sinais dolorosos da pele, e a pessoa tem a impressão de que as sensações se originam na pele. DOR VISCERAL A dor originada das diferentes vísceras do abdome e do tórax é um dos poucos critérios que podem ser utilizados para o diagnóstico de inflamação visceral, doença visceral infecciosa e outros males viscerais. Geralmente, as vísceras têm receptores sensoriais exclusivos para a dor. Além disso, a dor visceral difere da dor superficial em vários aspectos importantes. Uma das diferenças mais importantes entre a dor superficial e a dor visceral é que os danos viscerais muito localizados raramente causam dor grave. Por exemplo, cirurgião pode dividir as alças intestinais em duas partes em paciente consciente, sem causar dor significativa. Inversamente, qualquer estímulo que ocasione estimulação difusa das terminações nervosas para a dor na víscera causa dor que pode ser grave. Por exemplo, a isquemia, provocada pela oclusão do suprimento sanguíneo para grande área dos intestinos, estimula várias fibras dolorosas difusas ao mesmo tempo, podendo resultar em dor extrema. REFERÊNCIA: Semiologia Médica - Porto DOR CRÔNICA. A dor crônica é a que persiste por um período superior ao necessário para a cura de um processo mórbido ou que está associada a afecções crônicas (câncer, artrite reumatoide, alterações degenerativas da coluna), ou, ainda, a que decorre de lesão do sistema nervoso.Não tem qualquer função de alerta e determina acentuado estresse, sofrimento e perda na qualidade de vida. É a maior causa de afastamento do trabalho, gerando um enorme ônus para o país. REFERÊNCIA: Medicina Interna – Harrison A conduta médica tradicional de procurar uma patologia orgânica obscura geralmente é inútil. Por outro lado, a avaliação psicológica e os modelos de tratamento com base comportamental costumam ser úteis, sobretudo quando realizados em um centro multidisciplinar para tratamento de dor. Há diversos fatores capazes de causar, perpetuar ou exacerbar a dor crônica. Em primeiro lugar, o paciente pode ser portador de uma doença caracteristicamente dolorosa para a qual não existe atualmente qualquer possibilidade de cura. São exemplos a artrite, o câncer, as cefaleias crônicas diárias, a fibromialgia e a neuropatia diabética. Em segundo lugar, é possível que existam fatores perpetuadores secundários que tenham sido desencadeados por alguma doença e tenham persistido após a sua resolução. São exemplos a lesão de nervos sensoriais, a atividade eferente simpática e a contração muscular reflexa dolorosa (espasmo). Por fim, diversos estados psicológicos podem agravar ou mesmo causar dor. Há certas áreas às quais deve-se dedicar atenção especial na anamnese. Como a depressão é o transtorno emocional mais comum nos indivíduos com dor crônica, os pacientes devem ser inquiridos sobre humor, apetite, padrões de sono e atividade diária. - Outros sinais a indicar que há um transtorno emocional relevante contribuindo para a queixa de dor crônica são: ocorrência em múltiplos locais não relacionados; padrão de episódios dolorosos recorrentes, porém distintos, com início na infância ou na adolescência; o fato de a dor ter-se iniciado em uma época de trauma emocional, como a perda de um dos pais ou do cônjuge; história de maus-tratos físicos ou de abuso sexual; e uso abusivo, passado ou presente, de drogas. No exame físico, deve-se dar atenção especial ao fato de o paciente proteger a área dolorosa ou evitar certos movimentos ou posturas em função da dor. A identificação de um componente mecânico para a dor pode ser útil para o diagnóstico e o tratamento. - Devem-se examinar as áreas dolorosas quanto à presença de hipersensibilidade profunda à palpação, observando se a dor é localizada em músculos, estruturas ligamentares ou articulações. A dor miofascial crônica é muito comum e, nesses pacientes, a palpação profunda pode revelar pontos desencadeantes altamente localizados que consistem em faixas ou nós rígidos nos músculos. Um princípio norteador na investigação dos pacientes com dor crônica é avaliar os fatores emocionais e orgânicos antes de instituir o tratamento. A análise conjunta desses fatores, sem que seja necessário aguardar a exclusão de possíveis causas orgânicas antes de considerar os aspectos emocionais, melhora a adesão do paciente ao tratamento, o que em parte pode ser explicado pela tranquilização do paciente ao perceber que a avaliação psicológica não significa que o médico esteja duvidando da validade de sua queixa. Mesmo quando se pode identificar uma causa orgânica para a dor do paciente, ainda é prudente investigar outros fatores. Por exemplo, os pacientes com câncer e metástases ósseas dolorosas também podem apresentar dor decorrente da lesão nervosa e estar deprimidos. REFERÊNCIA: Fisiopatologia da Doença – Ganong (LANGE) Os opiáceos, como a morfina, que são altamente efetivos no alívio da dor crônica (p. ex., dor causada por câncer), têm o efeito colateral prejudicial de inibir a motilidade do intestino delgado. Os opióides atuam sobre os nervos entéricos, inibindo a secreção de neurotransmissores excitatórios e, consequentemente, o peristaltismo. A inibição da motilidade retarda o trânsito intestinal, permitindo uma absorção mais completa, de modo que o volume que chega ao cólon encontra-se diminuído, resultando em prisão de ventre. REFERÊNCIA: Fisiopatologia – Porth A dor crônica é aquela que persiste por mais tempo do que se poderia razoavelmente esperar após um evento causador. Além disso, é mantida por fatores que são patológica e fisicamente distantes da causa originária. A dor crônica pode se manter por anos a fio, como pode ser bastante variável. Pode ser implacável e extremamente grave, como a dor óssea metastática. Pode ser relativamente contínua, com ou sem períodos de escalada, como acontece com algumas formas de dor nas costas. Algumas condições com episódios recorrentes de dor aguda são particularmente problemáticas, porque apresentam tanto características de dor aguda quanto de dor crônica. Isso inclui a dor associada a crises de anemia falciforme ou à cefaleia do tipo enxaqueca. A dor crônica é uma das principais causas de incapacitação. Diferentemente da dor aguda, a dor crônica persistente geralmente não tem função útil. Ao contrário, impõe tensões fisiológicas, psicológicas, familiares e econômicas e é capaz de esgotar os recursos de uma pessoa. Em contraste com a dor aguda, as influências psicológicas e ambientais são propensas a desempenhar um papel importante no desenvolvimento de comportamentos associados à dor crônica. Os fatores biológicos que influenciam a dor crônica incluem mecanismos periféricos, mecanismos periférico centrais e mecanismos centrais. Os mecanismos periféricos resultam da estimulação persistente de nociceptores e, em sua maioria, estão envolvidos com distúrbios crônicos musculoesqueléticos, viscerais e vasculares. Os mecanismos periférico centrais estão relacionados com o funcionamento anormal de áreas centrais e periféricas do sistema somatossensorial, como o resultante da perda parcial ou total das vias descendentes inibidoras ou da descarga espontânea de fibras regeneradas. Isso inclui condições como causalgia, dor do membro fantasma e neuralgia pós-herpética. Os mecanismos centrais estão associados a doenças ou lesões do sistema nervoso central e se caracterizam pela manifestação de ardor, dor, hiperalgesia, disestesia e outras sensações anormais. A dor central está associada a doenças como lesões do tálamo (dor talâmica), lesão da medula espinal, interrupção cirúrgica de vias de dor e esclerose múltipla. Indivíduos com dor crônica podem não apresentar os comportamentos somáticos, autônomos ou afetivos frequentemente associados aos casos de dor aguda. À medida que a condição dolorosa se torna prolongada e contínua, as respostas do sistema nervoso autônomo tendem a diminuir. Além disso, estão mais associadas a dor crônica, perda de apetite, transtornos do sono e depressão. Felizmente, a depressão geralmente é aliviada depois que a dor é removida. A ligação entre depressão e diminuição da tolerância à dor pode ser explicada de modo similar, pelo fato de que ambas respondem a alterações nas vias biológicas dos sistemas serotoninérgico e noradrenérgico. Antidepressivos tricíclicos e outros medicamentos com efeito serotoninérgico e noradrenérgico demonstram o alívio de diversas síndromes de dor crônica. REFERÊNCIA: Medicina Interna – Harrison DOR AGUDA. Quando aguda, a dor está associada a uma reatividade comportamental e a uma resposta de estresse que consiste em elevação da pressão arterial, da frequência cardíaca, do diâmetro da pupila e dos níveis plasmáticos de cortisol. Além disso, muitas vezes há contração de músculos locais (p. ex., flexão dos membros, rigidez da parede abdominal). O tratamento ideal para qualquer dor é eliminar sua causa; por essa razão, embora o tratamento possa ser iniciado imediatamente, devem-se empregar esforços concomitantes para determinar a etiologia subjacente no início da terapêutica. Algumas vezes, o tratamento do distúrbio subjacente não alivia imediatamente a dor. Além disso, alguns distúrbios são tão dolorosos que é essencial obter uma analgesia rápida e eficaz (p. ex., estado pós-operatório, queimaduras, traumatismo,câncer ou crise de anemia falciforme). Os analgésicos são a primeira linha de tratamento nesses casos, e todos os médicos devem estar familiarizados com o seu uso. REFERÊNCIA: Fisiopatologia – Porth A dor aguda é aquela provocada por danos aos tecidos do corpo e pela ativação de estímulos nociceptivos no sítio de dano tecidual local. Geralmente, é de curta duração e tende a apresentar resolução quando o processo patológico subjacente é resolvido. O propósito da dor aguda é servir como um sistema de alerta. Esse nível de dor avisa ao indivíduo quanto à existência de um dano real ou iminente aos tecidos e conduz à busca por auxílio médico. A localização, a irradiação, a intensidade e a duração da dor, bem como os fatores que agravam ou aliviam, fornecem pistas essenciais para o diagnóstico. 2- Vias da dor (incluindo os nociceptores), enumerando os receptores, vias sensitivas e áreas encefálicas relacionadas. REFERÊNCIA: Dor: aspectos atuais da sensibilização periférica e central – Revista Brasileira de Anestesiologia NOCICEPTORES Os receptores específicos para a dor estão localizados nas terminações de fibras nervosas Ad e C e, quando ativados, sofrem alterações na sua membrana, permitindo a deflagração de potenciais de ação. As terminações nervosas das fibras nociceptivas Ad e C (nociceptores) são capazes de traduzir um estímulo agressivo de natureza térmica, química ou mecânica, em estímulo elétrico que será transmitido até o sistema nervoso central e interpretado no córtex cerebral como dor. As fibras Ad são mielinizadas e as fibras C não são mielinizadas e possuem a capacidade de transmitir estímulos dolorosos em diferentes velocidades. As fibras Ad, em função da presença da bainha de mielina, transmitem o estímulo doloroso de forma rápida, enquanto as fibras C são responsáveis pela transmissão lenta da dor. Ambas são classificadas em subtipos Ad1, Ad2, C1 e C2. O tipo de fibra nociceptiva parece estar envolvido com alterações periféricas distintas nas diversas síndromes dolorosas, e poderá, no futuro, contribuir para o tratamento mais eficaz da dor. Os nociceptores, então, são sensibilizados pela ação de substâncias químicas, denominadas algiogênicas, presentes no ambiente tissular: acetilcolina, bradicinina, histamina, serotonina, leucotrieno, substância P, fator de ativação plaquetário, radicais ácidos, íons potássio, prostaglandinas, tromboxana, interleucinas, fator de necrose tumoral (TNFa), fator de crescimento nervoso (NGF) e monofosfato cíclico de adenosina (AMPc). REFERÊNCIA: Cem bilhões de neurônios -Lent Estimulação de nociceptores. Diferentemente de outros receptores sensoriais, os nociceptores respondem a várias formas de estimulação, incluindo estímulos mecânicos, térmicos e químicos. Alguns receptores respondem a um único tipo de estímulo (mecânico ou térmico) e outros, chamados receptores polimodais, respondem aos três tipos de estímulos (mecânico, térmico e químico). Estímulos mecânicos podem surgir a partir de uma pressão intensa aplicada à pele ou da contração violenta ou estiramento extremo de um músculo. Estímulos térmicos: tanto os extremos de calor quanto de frio são capazes de estimular os nociceptores. Estímulos químicos surgem a partir de fontes variadas, como traumatismo tecidual, isquemia e inflamação. Uma gama de mediadores químicos é liberada a partir de tecidos lesionados e inflamados, incluindo íons hidrogênio e potássio, prostaglandinas, leucotrienos, histamina, bradicinina, acetilcolina e serotonina. Esses mediadores químicos produzem seus efeitos estimulando diretamente os nociceptores ou sensibilizando-os para os efeitos do estímulo nociceptivo, perpetuando as respostas inflamatórias ao levar à liberação de agentes químicos que agem como estímulos nociceptivos, ou incitam reflexos neurogênicos que aumentam a resposta a estímulos nociceptivos. Por exemplo, bradicinina, histamina, serotonina e potássio ativam e também sensibilizam os nociceptores. Trifosfato de adenosina, acetilcolina e plaquetas atuam isoladamente ou em conjunto para sensibilizar nociceptores por intermédio de outros agentes químicos, como as prostaglandinas. O ácido acetilsalicílico e outros medicamentos anti-inflamatórios não esteroides (AINE) são eficazes no controle da dor, pois bloqueiam a enzima necessária para a síntese de prostaglandina. A estimulação nociceptiva que ativa as fibras C pode causar uma resposta conhecida como inflamação neurogênica, que produz vasodilatação e um aumento na liberação de mediadores químicos a que os nociceptores respondem. Acredita-se que o mecanismo de fibras C seja mediado por um reflexo neuronal de raiz dorsal, que produz transporte retrógrado e liberação de mediadores químicos, que por sua vez provocam o aumento da inflamação nos tecidos periféricos. Esse reflexo pode configurar um ciclo vicioso com implicações relacionadas com dor persistente e hiperalgesia. RECEPTORES Os receptores para dor na pele e em outros tecidos são terminações nervosas livres. Distribuem-se por praticamente todos os tecidos do organismo. Uma notável exceção, já mencionada, é o sistema nervoso central. Não há nociceptores no tecido nervoso, embora eles estejam presentes nos vasos sanguíneos cerebrais mais calibrosos e nas meninges que circundam o SNC. Com a exceção do tecido nervoso, os nociceptores estão presentes em todos os tecidos: na superfície cutânea, na parede das vísceras ocas, no parênquima das vísceras sólidas, na vasculatura, nos ossos e nas articulações, na córnea, nas raízes dentárias. Há nociceptores para diferentes estímulos: mecânicos, térmicos e químicos. Em geral, a dor rápida é desencadeada por tipos de estímulos mecânicos e térmicos, enquanto a dor crônica pode ser desencadeada pelos três tipos de estímulo. Algumas das substâncias que excitam o tipo químico de dor são: bradicinina, serotonina, histamina, íons potássio, ácidos, acetilcolina e enzimas proteolíticas. Além disso, as prostaglandinas e a substância P aumentam a sensibilidade das terminações nervosas, mas não excitam diretamente essas terminações. As substâncias químicas são de modo especial importantes para a estimulação do tipo de dor lenta e persistente que ocorre após lesão tecidual. Não há nociceptores para luz, embora algumas fontes muito intensas provoquem dor pela ação do calor que emitem junto com a luz. "Luz fria" intensa pode lesar a retina sem a ocorrência de dor, embora esta apareça posteriormente junto com os processos inflamatórios consequentes à lesão. Sons muito intensos podem provocar dor porque a forte vibração mecânica que produzem atinge os nociceptores situados nas estruturas vibráteis do ouvido. Natureza não Adaptativa dos Receptores para Dor. Ao contrário da maioria dos outros receptores do corpo, os receptores para dor se adaptam muito pouco e algumas vezes não se adaptam. De fato, em certas circunstâncias, a excitação das fibras dolorosas fica progressivamente maior, à medida que o estímulo persiste, em especial para a dor lenta persistente nauseante. Esse aumento da sensibilidade dos receptores para dor é chamado hiperalgesia. Pode-se compreender prontamente a importância dessa ausência de adaptação dos receptores para dor, pois isso possibilita que a pessoa fique ciente da presença de estímulo lesivo, enquanto a dor persistir. A auto-observação é suficiente para identificarmos dois tipos de dor. Pense no que acontece quando alguém pressiona a sua pele com uma agulha. Aparece uma dor aguda que você localiza pronta e precisamente. Se a agulha é pressionada com mais força, e efetivamente fere a pele, a sua retirada não impede a ocorrência de um segundo tipo de dor que se prolonga durante um certo tempo, tanto maior quanto maior a gravidade do ferimento. O primeiro tipo chama-se dor rápida ou aguda, porque cessa com a interrupção do estímulo. O segundo chama-se dor lenta ou crônica, que ocorre pelodisparo de reações inflamatórias no tecido ferido, mesmo após a interrupção do estímulo inicial. A dor rápida é sentida, dentro de 0,1 segundo, após a aplicação de estímulo doloroso, enquanto a dor lenta começa somente após 1 segundo ou mais, aumentando lentamente durante vários segundos e, algumas vezes, durante minutos. Os neurocientistas verificaram que cada um desses dois tipos de dor envolve mecanismos celulares diferentes e é veiculado por diferentes receptores e vias ascendentes. VIAS ASCENDENTES E MECANISMOS CENTRAIS DA DOR Uma vez estimulados química, mecânica ou termicamente, os nociceptores produzem potenciais receptores como todos os demais receptores sensoriais, e esses são codificados em salvas de potenciais de ação na membrana vizinha à extremidade especializada na transdução. Tanto as fibras Aδ como as fibras C se incorporam aos nervos periféricos, terminando por penetrar na medula através dos nervos espinhais e no tronco encefálico através de alguns nervos cranianos, principalmente o trigêmeo. Ao entrar pelas raízes dorsais, essas fibras se ramificam e distribuem ramos ascendentes e descendentes que penetram no corno dorsal em vários segmentos medulares. Essa divergência multissegmentar das fibras nociceptivas é mais uma característica que confere à dor um baixo poder de localização. Os corpos dos neurônios primários da dor localizam-se - como em todas as demais submodalidades somestésicas - nos gânglios espinhais e no gânglio trigêmeo. A maioria dos neurônios de segunda ordem, entretanto, situa-se em diversas lâminas do corno dorsal da medula e no núcleo espinhal do trigêmeo, onde recebem as sinapses excitatórias (geralmente glutamatérgicas) dos aferentes de primeira ordem e de outros aferentes, formando aí pequenos circuitos locais de grande importância para a percepção final da dor. O funcionamento desses circuitos será descrito adiante. Do mesmo modo que no caso da termossensibilidade, muitos aferentes primários da dor fazem sinapses especificamente com neurônios da lâmina I da medula, no corno dorsal, integrando também o sistema somestésico interoceptivo, tratado com mais detalhe adiante. Os neurônios de segunda ordem da dor emitem axônios dentro da medula que cruzam para o lado oposto, nos mesmos segmentos em que entraram os aferentes primários (Figura 7.16), e se incorporam aos feixes espinotalâmicos situados na coluna anterolateral da medula, que, como já vimos, carreiam também algumas fibras do tato e as da termossensibilidade. Os feixes espinotalâmicos ascendem por toda a medula até o tronco encefálico, onde se encontram com as fibras nociceptivas de segunda ordem do núcleo espinhal do trigêmeo para formar o lemnisco espinhal (não representadas na figura). Até este ponto, as fibras da dor rápida (principalmente Aδ) estão misturadas às da dor lenta (principalmente C), embora alguns anatomistas façam distinção entre um feixe chamado neospinotalâmico ou espinotalâmico lateral, que conduziria ao tálamo os impulsos nociceptivos da dor rápida, e outro chamado paleospinotalâmico ou espinotalâmico medial, que conduziria os impulsos nociceptivos da dor lenta ao tálamo passando através da formação reticular (Figura 7.16). Outras fibras desse sistema nociceptivo mais antigo terminariam em regiões do tronco encefálico (formação reticular, núcleo parabraquial e grísea periaquedutal) encarregadas de promover reações comportamentais e fisiológicas à dor. O fato é que os impulsos da dor rápida são veiculados diretamente a dois núcleos talâmicos (posterior e ventral posterior), onde estão os neurônios de terceira ordem, cujos axônios projetam às áreas corticais S1 e S2. A via "direta" da dor rápida (apenas três neurônios e duas sinapses antes do córtex) explica as suas características fisiológicas principais: estreita correlação com o estímulo e precisa localização espacial. Essas características fazem com que a dor rápida consista em um sistema de sinalização de maior velocidade, capaz de ativar reflexos que possam contribuir para afastar o organismo do estímulo nocivo que a provocou. Já a dor lenta tem características diversas: o estímulo nocivo cessa, mas ela continua; sua origem corporal é de dificil localização; ocorrem reações orgânicas mais diversas do que os simples reflexos de retirada, e tudo provoca repercussões emocionais de maior duração, que podemos sintetizar com a palavra sofrimento. Assim, na vigência da dor lenta, não podemos mais nos livrar do estímulo inicial, pois ele já cessou. Ficamos com um processo inflamatório que amplifica a dor, cujas consequências podem envolver alterações da frequência cardíaca e do ritmo respiratório, provocar sudorese, mal-estar, alterações digestivas e, frequentemente, um intenso sofrimento. Além disso, muitas vezes não conseguimos localizar de forma precisa a região dolorosa, sobretudo quando ela está situada em algum órgão do interior do corpo. A angina do peito ou dor do infarto, por exemplo, é frequentemente acompanhada de dor no braço ou no estômago. Um cálculo biliar provoca dor no abdome, como seria de esperar, mas também no alto das costas. Esse fenômeno é chamado dor referida (Figura 7.17A). MECANISMOS PERIFÉRICOS DA DOR A dor rápida consiste principalmente na ativação de terminações livres de fibras do tipo Aδ (finas, com pouca mielina e velocidade média-baixa de condução de PAs, por volta de 20 m/s). Algumas dessas terminações livres podem ser sensíveis a estímulos mecânicos (como no exemplo da agulha), outras a estímulos térmicos (se a agulha estiver muito quente), outras a ambos (terminações bimodais). Em todos os casos ocorrerá um potencial receptor nas extremidades livres, e estes serão codificados em salvas de potenciais de ação conduzidos ao longo das fibras Aδ através dos nervos espinhais até a medula, ou através dos ramos do trigêmeo em direção ao tronco encefálico. (Figura 7.14) A dor lenta é mais complexa. Como é provocada por lesão dos tecidos que circundam os nociceptores, ocorrem diversos fenômenos celulares que acentuam e prolongam a dor. Imagine um instrumento cortante que perfura a pele (Figura 7.15). Haverá sangramento e, portanto, anóxia do tecido nutrido pelos vasos que se romperam. Ocorre também lesão celular e depois inflamação. Além de células vermelhas (hemácias), o sangramento liberará no tecido células brancas do sangue (leucócitos), dentre eles os mastócitos, que produzem e secretam substâncias algogênicas (i. e., que provocam dor), como a serotonina (5-HT) e a histamina. As próprias células lesadas do tecido atingido (a pele, em nosso exemplo) também liberam substâncias fortemente algogênicas, como o peptídeo bradicinina, e substâncias irritantes, como os derivados do ácido araquidônico (as prostaglandinas), que por si sós não são algogênicas, mas que potenciam a ação das primeiras. Os nociceptores ativados por esse coquetel de substâncias liberadas pela ação lesiva da agulha são principalmente terminações livres de fibras do tipo C (as mais finas de todas, amielínicas e com baixa velocidade de condução de PAs, em tomo de 2 m/s). Tanto a agulha, diretamente, como as substâncias químicas liberadas após a lesão, ativam ou sensibilizam os nociceptores do tipo C, que são comumente polimodais, ou seja, sensíveis a mais de um tipo de estímulo. A simples sensibilização dos nociceptores, isto é, uma leve despolarização de seu potencial de repouso, aproximando-o do limiar de disparo de potenciais de ação, faz com que qualquer estímulo normalmente inócuo passe a provocar dor. É o fenômeno da hiperalgesia, que todos sentimos em uma região inflamada, como uma espinha ou um furúnculo, ou na pele que se torna dolorida aos menores estímulos após uma queimadura do sol de verão. Essa percepção exacerbada de dor decorre da sensibilização dos receptores moleculares situados nos terminais sensitivos (sensibilização periférica) ou entãodos receptores sinápticos no corno dorsal da medula (sensibilização central). REFERÊNCIA: Fisiopatologia – Porth Centros cerebrais e percepção dolorosa A informação sobre uma lesão tecidual é transmitida da medula espinal até os centros encefálicos no tálamo, onde se manifesta uma sensação básica de agravo, ou dor (Figura 18.9). No sistema neoespinotalâmico, são necessárias interconexões entre o tálamo lateral e o córtex somatossensorial para adicionar precisão, discriminação e significado à sensação dolorosa. O sistema paleoespinotalâmico se projeta difusamente a partir dos núcleos intralaminares do tálamo para grandes áreas do córtex límbico. Essas conexões, provavelmente, estão associadas ao agravo e ao efeito de alteração do humor e estreitamento da atenção causado pela dor. Figura 18.8 • Vias primárias da dor. A transmissão de impulsos nociceptivos é modulada pelo circuito do corno dorsal, que recebe a informação a partir de receptores primários de toque e de vias descendentes que envolvem os sistemas corticais límbicos (córtex frontal orbital, amígdala e hipotálamo), o centro periaquedutal analgésico endógeno no mesencéfalo, neurônios noradrenérgicos da ponte e NMR na medula. As linhas tracejadas indicam inibição ou modulação da transmissão da dor por neurônios de projeção do corno dorsal. SAR, sistema ativador reticular. Figura 18.9 • Percurso do estímulo de dor. (1) A dor começa como uma mensagem recebida por terminações nervosas, como um dedo queimado. (2) A liberação de substância P, bradicinina e prostaglandinas sensibiliza as terminações nervosas, ajudando a transmitir a dor do local da lesão para o encéfalo. (3) O sinal de dor, em seguida, trafega como um impulso eletroquímico ao longo do comprimento do nervo até o corno dorsal da medula espinal, uma região que recebe sinais de todo o corpo. (4) A medula espinal, então, envia a mensagem para o tálamo, que em seguida envia para o córtex. (5) O alívio da dor se inicia com sinais provenientes do encéfalo que descem pela medula espinal, onde (6) substâncias químicas como endorfina S são liberadas no corno dorsal para diminuir a mensagem de dor. Pesquisas utilizando magnetoencefalografia demonstram a representação cortical da sensação de dor em humanos e se mostram muito eficazes quando combinadas com modalidades de imagem estrutural. Em adultos saudáveis, a estimulação aferente nociceptiva Aδ está relacionada com a ativação do córtex somatossensorial primário contralateral no lobo parietal, enquanto a estimulação aferente C está relacionada com a ativação do córtex somatossensorial secundário e do córtex cingulado anterior, que é parte do sistema límbico. 3- Ações dos neurotransmissores envolvidos nas vias de dor. Neurotransmissores excitatórios: o glutamato é o principal para a via rápida, enquanto a substância P é a mais importante para a via lenta. Neurotransmissores inibitórios: serotonina e encefalina. REFERÊNCIA: Fisiopatologia – Porth Mediadores na medula espinal Na medula espinal, a transmissão de impulsos entre neurônios nociceptivos e neurônios do corno dorsal é mediada por neurotransmissores químicos liberados a partir de terminações nervosas centrais de neurônios nociceptivos. Alguns desses neurotransmissores são aminoácidos (p. ex., glutamato), outros são derivados de aminoácidos (p. ex., norepinefrina) e outros ainda são peptídios de baixo peso molecular, compostos por dois ou mais aminoácidos. O aminoácido glutamato é um dos principais neurotransmissores excitatórios liberados pelas terminações nervosas centrais de neurônios nociceptivos. A substância P, um neuropeptídio, também é liberada no corno dorsal por fibras C em resposta à estimulação nociceptiva. A substância P provoca potenciais excitatórios lentos nos neurônios do corno dorsal. Diferentemente do glutamato, que tem sua ação limitada à área imediata da terminação sináptica, alguns neuropeptídios liberados no corno dorsal podem se difundir até certa distância, porque não são inativados por mecanismos de recaptação. Na dor persistente, isso ajuda a explicar a excitabilidade e a natureza não localizada de muitas condições dolorosas. Neuropeptídios, como a substância P, também parecem prolongar e aprimorar a ação do glutamato. Se esses neurotransmissores são liberados em grandes quantidades ou por longos períodos, podem conduzir a hiperalgesia secundária, condição na qual os neurônios de segunda ordem se tornam extremamente sensíveis a baixos níveis de estimulação nociva. 4- Mecanismos desencadeantes e moduladores da dor. REFERÊNCIA: Fisiologia da dor – Monografia – Universidade Castelo Branco Processos fisiológicos: Os processos fisiológicos associados com o reconhecimento da dor são: a transdução, transmissão, modulação e a percepção. Transdução: É a transformação de um estímulo nociceptivo em estímulo elétrico nas terminações nervosas sensoriais. Normalmente inibido pela administração preemptiva (antecipada) de anestésicos locais e antiinflamatórios não esteroidais (AINEs). Transmissão: É o movimento de atividade elétrica pelo sistema nervoso periférico. A administração de bloqueios anestésicos regionais minimiza a transmissão do estímulo nociceptivo. Impulso elétrico libera neurotransmissores, os quais se ligam aos neurônios da raiz dorsal (2ª ordem). Sinal progride para centros mais alto (formação reticular, tálamo). Modulação: É a diminuição ou modificação na transmissão da atividade elétrica pelos nociceptores. A administração sistêmica de opióides ou no espaço epidural, bem como de agonistas α2 ativam o sistema modulador da dor. Percepção: A percepção envolve o processamento cognitivo ou consciente da dor. Pode ser modificada por opióides sistêmicos, agonistas α2 ou com opióides associados aos tranquilizantes. REFERÊNCIA: Cem bilhões de neurônios – Lent Uma observação cotidiana de todas as pessoas é que a percepção da dor depende do contexto psicológico e social em que ela é provocada, e que em certa medida a sua intensidade pode ser autocontrolada. Exemplo: Soldados feridos durante uma batalha sentem menos dor do que indivíduos com ferimentos semelhantes ocorridos em situações domésticas. É que a motivação para lutar ou a expectativa de ser removido do campo de batalha são fatores psicológicos atenuadores da experiência dolorosa. Justamente o contrário ocorre nos casos de acidentes domésticos: o indivíduo será afastado de sua casa e hospitalizado, terá de gastar dinheiro para curar-se e não poderá trabalhar ou divertir-se durante algum tempo. Existem então mecanismos analgésicos endógenos, ou seja, um sistema de regiões neurais conectadas às vias aferentes nociceptivas, que modulam, ou bloqueiam completamente, a passagem das informações da dor em sua trajetória ascendente em direção ao córtex cerebral. Interneurônios inibitórios O primeiro desses mecanismos é muito simples e atua logo na entrada das fibras nociceptivas na medula. As sinapses destas com os neurônios de segunda ordem estão localizadas no como dorsal. Esses neurônios, no entanto, recebem também sinapses inibitórias de interneurônios situados nas redondezas, os quais, por sua vez, são ativados pelas fibras Aβ que veiculam as informações táteis. A consequência funcional desse circuito intramedular é que os impulsos táteis, quando chegam à medula ao mesmo tempo que os impulsos dolorosos (cada um através de suas vias aferentes específicas, é claro), podem inibir a transmissão sináptica entre o neurônio nociceptivo primário e o neurônio de segunda ordem. → Quem já não percebeu que a dor de um ferimento pode ser aliviada por um carinho tátil suave em torno da região lesada? A descoberta desse circuito simples de bloqueio ou modulação da dor nos anos 1960 levou uma dupla de pesquisadores britânicos, Ronald Melzack e Patrick Wall, a propor a teoria da comporta da dor,que propõe que a passagem da dor pelos estágios sinápticos intermediários seria controlada por "comportas" (isto é, sinapses inibitórias) que se abririam em certas condições, mas poderiam ser fechadas em outras. Mais recentemente, descobriu-se que as sinapses moduladoras da dor não estão presentes apenas na medula, mas nos vários níveis das vias nociceptivas, e que a origem dos circuitos inibitórios não se restringe às fibras aferentes Aβ. Vias Descendentes Moduladoras da Dor De fato, sabe-se hoje que existem vias descendentes moduladoras da dor, que se originam no córtex somestésico e no hipotálamo, projetando-se a uma região mesencefálica situada em torno do aqueduto cerebral (chamada substância cinzenta ou grísea periaquedutal), daí a diferentes núcleos bulhares, especialmente o núcleo parabraquial e os núcleos da rafe, e destes, por sua vez, ao corno dorsal da medula. A estimulação elétrica ou farmacológica a experimental desses núcleos inibe a transmissão sináptica nociceptiva na medula, provocando o bloqueio da dor. Um grande avanço na elucidação desses mecanismos analgésicos endógenos veio com a descoberta dos peptídeos opioides e seus efeitos. Desde tempos imemoriais é conhecida a ação da morfina (palavra derivada do nome do deus grego do sono e dos sonhos, Morfeu). A morfina é uma droga obtida da papoula, aparentada ao ópio (daí o termo "opioide" ou "opiáceo"), cujas ações euforizantes e analgésicas têm sido há muito apreciadas pelos usuários de drogas e pelos médicos. Nos anos 1970, raciocinou-se que o efeito neurofarmacológico da morfina só poderia existir se houvesse receptores moleculares correspondentes no cérebro, e que a existência de receptores naturais para a morfina no cérebro obrigaria a pensar na ocorrência também de ligantes endógenos desses receptores, cuja estrutura molecular fosse análoga à da morfina. Esse raciocínio logo se confirmou: o uso de opioides radioativos identificou a presença de receptores específicos em diversas regiões cerebrais, e a busca dos opioides naturais encontrou as encefalinas, as endorfinas e, mais recentemente, as dinorfinas. Esses peptídeos diferem quanto ao peso molecular, mas todos compartilham uma mesma sequência de aminoácidos com ação analgésica. Todos eles são encontrados na substância cinzenta periaquedutal, nos núcleos da rafe e no como dorsal da medula. Embora os detalhes de sua ação molecular ainda estejam sob investigação, sabe-se que exercem uma função moduladora nas sinapses nociceptivas, bloqueando a liberação de neurotransmissor excitatório pelo terminal pré-sináptico e hiperpolarizando a membrana pós-sináptica. REFERÊNCIA: Fisiopatologia - Porth Pesquisas em laboratório, ainda um pouco inconsistentes, revelaram que os agonistas opiáceos inibem canais de cálcio nos neurônios da raiz dorsal e do gânglio trigeminal, bem como nos neurônios aferentes primários. Como são os íons cálcio que provocam a liberação do neurotransmissor na sinapse, esse bloqueio de cálcio inibiria a transmissão sináptica dos impulsos de dor. REFERÊNCIA: Cem bilhões de neurônios – Lent Dessa forma, tanto os desígnios da razão (possivelmente através do córtex cerebral) como os determinantes da emoção (através do hipotálamo) podem modular a dor que sentimos, permitindo-nos em muitos casos buscar proteção e alívio sem sucumbir à gravidade dos ferimentos que a provocam. 5- Sensibilização central e periférica REFERÊNCIA: Dor: aspectos atuais da sensibilização periférica e central – Revista Brasileira de Anestesiologia SENSIBILIZAÇÃO CENTRAL – MECANISMOS A transmissão dos estímulos nocivos através da medula espinhal não é um processo passivo. Os circuitos intramedulares têm a capacidade de alterar o estímulo e a consequente resposta dolorosa. A interação entre esses circuitos medulares determinará as mensagens que atingirão o córtex cerebral. Estudos clínicos e experimentais têm demonstrado que estímulos nocivos provocam alterações no sistema nervoso central, modificando os mecanismos desencadeados pelos estímulos aferentes. A estimulação persistente de nociceptores provoca dor espontânea, redução do limiar de sensibilidade e hiperalgesia. Esta pode ser classificada como hiperalgesia primária e secundária. A hiperalgesia primária é conceituada como sendo o aumento da resposta ao estímulo doloroso no local da lesão, enquanto a hiperalgesia secundária é aquela que se estende para áreas adjacentes. A presença de todos esses elementos sugere que a sensibilização periférica não é o único fenômeno responsável por todas essas mudanças e que deve haver envolvimento do sistema nervoso central neste processo. A sensibilização central implica alterações dos impulsos periféricos, com adaptações positivas ou negativas. Ocorre redução do limiar ou aumento da resposta aos impulsos aferentes, descargas persistentes após estímulos repetidos e ampliação dos campos receptivos de neurônios do corno dorsal. Impulsos repetidos em fibras C amplificam sinais sensoriais em neurônios espinhais, enviando mensagens para o encéfalo. Lesões periféricas induzem plasticidade em estruturas supraespinhais por meio de mecanismos que envolvem tipos específicos de receptores para o glutamato. Após a agressão tecidual há liberação de neurotransmissores, como substância P, somatotastina, peptídeo geneticamente relacionado com a calcitonina, neurocinina-A, glutamato e aspartato. Essas substâncias estão relacionadas com a ativação de potenciais pós- sinápticos excitatórios e dos receptores N-metil-D-aspartato (NMDA) e não-NMDA. Estímulos frequentes dos aferentes geram a somação dos potenciais de ação e consequente despolarização pós-sinápticas cumulativa. Depois da ativação de receptores NMDA pelo glutamato há remoção do íon magnésio do interior do receptor e o influxo de cálcio para a célula, do que resulta a amplificação e o prolongamento da resposta ao impulso doloroso 30,31. O aumento do cálcio tem como consequência a ativação da enzima óxido nítrico-sintetase e a estimulação da transcrição de protoncogenes. Estes são genes localizados no sistema nervoso central e estão envolvidos na formação de dinorfinas e encefalinas. As encefalinas têm ação antinociceptiva e estão envolvidas no processo de redução da neuroplasticidade e hiperalgesia. Entretanto, as dinorfinas têm um efeito complexo, já que possuem ação algogênica e antinociceptiva. Estudos recentes têm sugerido que a ativação do c-fos e c-jun promove a transcrição de RNA mensageiro responsável pela síntese de proteínas fundamentais, as quais estão envolvidas na alteração da expressão fenotípica e, consequentemente, na perpetuação da hipersensibilidade neuronal. A sensibilização do corno dorsal da medula espinhal pode ser de diferentes modalidades: wind up, sensibilização sináptica clássica, potencialização de longo termo, fase tardia da potenciação de longo termo e facilitação de longo termo. A sensibilização sináptica clássica é causada por uma sequência sincronizada de estímulos periféricos nociceptivos repetidos por uma única estimulação nociceptiva assíncrona, aumentando a resposta de aferentes de fibras Ad e C (potencialização homossináptica) e de aferentes de fibras Ab não-estimulados (potenciação heterossináptica). Isto é consequência da liberação de aminoácidos excitatórios, peptídeos e de neurotrofinas no corno dorsal da medula espinhal. Os aminoácidos excitatórios são representados pelo glutamato e pelo aspartato e se ligam a receptores específicos do tipo ionotrópico ou metabotrópico. Os receptores ionotrópicos, ou receptores rápidos, são aqueles nos quais o local de ligação do neurotransmissor é parte integrante de um canal iônico, enquanto os receptores metabotrópicos ou receptores lentos são ligados à proteína G. Dentre os receptores para os aminoácidos excitatórios destacam-se o AMPA, o cainato e o N-metil-D-aspartato (NMDA), que são ionotrópicos,e o receptor Mrglu, que tem a sua ação mediada pela proteína G, sendo portanto um receptor metabotrópico. Os peptídeos, a substância P e o peptídeo geneticamente relacionado com a calcitonica (CGRP) ligam-se as neurocininas do tipo NK-1 e NK-2, enquanto as neurotrofinas possuem como receptores as tirocinases tipo A e B (trkA, trkB). Após a liberação de aminoácidos excitatórios, peptídeos e neurotrofinas e sua interação com receptores específicos, há a ativação de segundos mensageiros, do tipo AMPc, PKA, PKC, fosfotidilinositol, fosfolipase C, fosfolipase A2.. Isto promove a abertura de canais de cálcio, e, consequentemente, a produção de prostaglandinas e óxido nítrico. Estes migram do intracelular em direção à fenda sináptica e causam a liberação de glutamato, aspartato, substância P e CGRP, contribuindo para a ampliação do processo álgico. O wind up é o resultado da somação de potenciais sinápticos lentos após estimulação aferente repetida de baixa freqüência, inferior a 5 Hz, e por tempo prolongado. Isto estimula a liberação de neurotransmissores excitatórios, glutamato e aspartato, no corno dorsal da medula espinhal e produz a despolarização relacionada com a remoção do bloqueio voltagem-dependente exercido pelo magnésio nos receptores NMDA. Ocorre, então, aumento da condutividade ao cálcio e a resposta à dor, a cada estímulo repetido e da mesma intensidade. A potencialização de longo termo, embora mais estudada no hipocampo e nas áreas corticais, pode ser decorrente de sequência de estímulos nociceptivos breves e de alta freqüência. Isso provocaria a ativação de receptores AMPA e NK1 e de canais de cálcio, ocorrendo resposta pós-sináptica prolongada e excitatória, sobretudo em neurônios da lâmina I. Os mecanismos que contribuem para o aumento da eficácia da transmissão sináptica seriam decorrentes da fosforilação dos receptores de membrana e das alterações do tempo de abertura dos canais iônicos, ou da formação e do transporte de substâncias excitatórias do interior da célula para a fenda sináptica. Além disso, no corno dorsal da medula espinhal, as proteinocinases ativadas por mitógenos (MAPK) modulam a fosforilação dos receptores NMDA e AMPA, amplificando a resposta nociceptiva. A facilitação de longo termo envolve a ativação de fatores de transcrição e alterações na transcrição. Os fatores de transcrição modulam a relação entre o complexo receptor-neuromediador e as alterações na expressão gênica. O estímulo nociceptivo aciona a mesma cascata de receptores e segundo mensageiros descritos para a sensibilização sináptica clássica; contudo, também provoca a expressão de genes de formação imediata c-fos (B,C,D), c-jun, de enzimas COX-2 e de genes de resposta lenta que codificam a pró-dinorfina, o receptor NK1 e a trkB no corno dorsal da medula espinhal. Ocorre regulação ascendente das vias para síntese de citocinas, quimiocinas e moléculas de adesão. Assim, há mudança fenotípica no gânglio da raiz dorsal. SENSIBILIZAÇÃO PERIFÉRICA – MECANISMOS Quando o estímulo provoca a lesão tecidual, há o desencadeamento de processo inflamatório seguido de reparação. As células lesadas liberam enzimas de seu interior, que no ambiente extracelular degradam ácidos graxos de cadeia longa e atuam sobre os cininogênios, dando origem à formação de cininas. As cininas são pequenos polipeptídeos da a2-calicreína presente no plasma ou nos líquidos orgânicos. A calicreína é uma enzima proteolítica que é ativada pela inflamação e outros efeitos químicos ou físicos sobre o sangue ou os tecidos. Ao ser ativada, a calicreína atua imediatamente sobre a a2-globulina, liberando a cinina denominada calidina, que é, assim, convertida em bradicinina por enzimas teciduais. Uma vez formada, a bradicinina provoca intensa dilatação arteriolar e aumento da permeabilidade capilar, contribuindo para a propagação da reação inflamatória. Também, a ação da fosfolipase A na membrana celular provoca a liberação de ácido araquidônico. Este é metabolizado por três sistemas enzimáticos principais: a cicloxigenase, de cuja atuação obtêm-se as prostaglandinas, os tromboxanos e as prostaciclinas; a lipoxigenase, que provoca a produção de leucotrienos e lipoxinas; e o citocromo P-450, que origina os denominados produtos da via da epoxigenase. Essas substâncias, sobretudo as prostaglandinas E2 (PGE2), promovem diminuição do limiar de excitabilidade dos nociceptores. Do mesmo modo, células inflamatórias, macrófagos e leucócitos liberam citocinas que vão contribuir para a migração de novas células para o local da lesão. Há produção e liberação de interleucina-1 e 6, fator de necrose tumoral, selectina, fatores quimiotáticos, óxido nítrico e substâncias oxidantes. Novos receptores, então, são recrutados e passam a fazer parte do processo inflamatório. A substância P e a neurocinina A produzem vasodilatação e aumento da permeabilidade vascular, contribuindo também para a manutenção do processo inflamatório. A bradicinina, a prostaglandina E2, o fator de crescimento nervoso (NGF) e as interleucinas, contudo, parecem exercer papel fundamental na nocicepção periférica. A prostaglandina e a bradicinina causam alterações em receptores específicos (TRPV1) acoplados a canais iônicos ligante-dependente via ativação do AMPc, e das proteínas cinases A (PKA) e C (PKC), reduzindo o tempo pós-hiperpolarização da membrana neural, causando redução do limiar para disparo da fibra nervosa. As neurotrofinas aumentam a síntese, o transporte axonal anterógrado e quantidade de SP e CGRP nas fibras C tipo 1 e reduzem a atividade do ácido gama-aminobutírico (GABA), tanto nas terminações nervosas periféricas quanto nas centrais. Ao lado disso, provocam mudanças nos receptores vanilóides (VR1) de fibras Ad acoplados a canais iônicos ligante-dependente e acionam as proteínas cinases ativadas por mitógenos (MAPK) que podem fosforilar o AMPc e iniciar a transcrição genética responsável por alterações fenotípicas, as quais contribuem para a amplificação da eficácia sináptica. A persistência da agressão causa modificações no sistema nervoso periférico e sensibilização de fibras nervosas, com consequente hiperalgesia e aumento dos níveis de AMPc e cálcio nos nociceptores. Esse fenômeno ocorre por ação dos mediadores inflamatórios e consequente atividade espontânea dos neurônios, aumento da resposta a estímulos supraliminares e diminuição do limiar de ativação dos nociceptores. Um tipo particular de nociceptor é referido como nociceptor silente, o qual é ativado após inflamação ou depois de ter ocorrido lesão tissular. As estimativas são de que 40% das fibras C e 30% das fibras Ad contribuem com nociceptores silentes. Após a liberação dos produtos químicos da lesão, esses receptores previamente silenciosos são ativados por estímulos térmicos e mecânicos e desenvolvem descargas espontâneas, tornando-se capazes de responder de maneira intensa a estímulos nociceptivos e não-nociceptivos. m resumo, a agressão tecidual resulta na acumulação de metabólitos do ácido araquidônico. A produção de prostaglandinas e de leucotrienos leva a degranulação de mastócitos e a ativação direta de fibras nervosas, macrófagos e linfócitos. Há liberação de mediadores, como potássio, serotonina, substância P, histamina e cininas. Ocorrem alterações na permeabilidade vascular, no fluxo sanguíneo local e produção dos sinais clássicos inflamatórios de rubor, calor, dor, tumor e impotência funcional. Tem início o processo de sensibilização periférica com consequente exacerbação da resposta ao estímulo doloroso. Os neuromediadores periféricos levam a despolarização da membrana neural por tempo prolongado, com consequente aumento da condutividade dos canais de sódio e cálcio e redução do influxo de potássio e cloro para o meio intracelular. Os canais de sódio estão envolvidos na gênese da hiperexcitabilidade neuronal e podem estar e podem ser classificadosem dois grandes grupos: os sensíveis à tetrodotoxina (TTXs), que estão presentes nas fibras Ad, em todo sistema nervoso e no gânglio da raiz dorsal; e os resistentes à tetrodotoxina (TTXr), que são encontrados especialmente nas fibras C do gânglio da raiz dorsal. Apesar de a lesão periférica da fibra nervosa tipo C provocar redução no corno dorsal da medula espinhal de SP, de neurotrofinas (BDNF), de receptores (VR1 e P2X3), de canais de cálcio tipo N de alta voltagem, há regulação ascendente de canais TTXs tipo III e existe a translocação do corpo celular para o neuroma de canais de sódio (TTXr), facilitando o aumento da excitabilidade nervosa. O exposto acontece caso a fibra nervosa esteja intacta (inflamação), ou seja, existe um aumento de neuromediadores excitatórios no corno dorsal da medula espinhal e uma maior expressão de canais de sódio (TTXr), fato que facilita a hiperexcitabilidade neuronal e dificulta a resposta ao tratamento com anestésicos locais. Também pode haver em ambas as situações descritas, sobretudo na lesão de fibras C, aumento de SP e BDNF nas fibras Ab (mecanorreceptores de baixo limiar), assim como brotamento dessas no local das conexões aferentes das fibras C (lâmina II), ampliando o campo receptivo do neurônio e facilitando a interpretação de estímulos mecânicos periféricos inócuos como agressivos. Isso explica, por exemplo, a alodinia mecânica que acontece na neuralgia pós- herpética. Outra possibilidade seria a do brotamento de axônio noradrenérgico simpático no gânglio da raiz dorsal, ao redor de neurônios de diâmetro largo (fibras Ad), sugerindo a hipótese da ativação de fibras aferentes sensitivas após a estimulação simpática. Além disso, pode existir alguma desproporção entre as vias excitatórias e as de supressão da dor, com redução da atividade inibitória da glicina, da GABA e dos opióides. REFERÊNCIA: Cecil Medicina Define-se como sensibilização o fenômeno pelo qual ocorre uma relação desproporcional entre o estímulo provocado e a percepção de dor, ou seja, pelo qual há uma redução no limiar da dor. Esse processo corresponde ao aumento da atividade neuronal e dos circuitos da via nociceptiva, que ocorrem por meio de alguns mecanismos bioquímicos, como o aumento da excitabilidade neuronal, aumento da eficácia sináptica e/ou pela redução da atividade da via inibitória nociceptiva. A sensibilização pode ocorrer perifericamente ou em nível central. A sensibilização periférica é aquela que se desenvolve no local da injúria tecidual e que ocorre devido a mudanças nos limiares dos nociceptores locais. Com o dano celular, há liberação de mediadores inflamatórios, degranulação de mastócitos e indução de enzimas inflamatórias que sensibilizam os nociceptores, que passam a perceber estímulos nocivos com maior intensidade e estímulos não nocivos (ex: tato) como dolorosos. Esse processo tornaria o sistema nociceptivo hiperalerta em condições nas quais há um risco de lesão adicional, como no período imediatamente após um estímulo nociceptivo. Com isso, estímulos de baixa intensidade tomam a via nociceptiva e passam a causar dor. Um bom exemplo disso seria a queimadura solar. Na área cutânea lesada pela radiação solar, um estímulo nociceptivo, como um beliscão, passa a ser sentido com maior intensidade que quando aplicado em área de pele não lesada. Já a sensibilização central (SC) pode ser entendida como uma facilitação do sistema nervoso central à passagem de estímulos nociceptivos. Da mesma forma que na sensibilização periférica, a SC leva à redução do limiar à dor e ao aumento na resposta do estímulo nocivo, mas também, ao aumento da área receptiva, que levaria às áreas sem lesão a produzirem dor quando estimuladas. Um bom exemplo de SC seria o que ouvimos com frequência nos relatos dos pacientes com migrânea. Como se sabe, a dor da migrânea é resultado da inflamação que ocorre nos vasos das meninges ocasionada pela ativação do sistema trigeminal. Com frequência, esses pacientes referem que, após um período variável de cefaleia, sentem desconforto ou dor ao passar as mãos ou pentear os cabelos. Nesses relatos ficam evidentes dois efeitos da SC: estímulos inócuos (tato) passam a gerar dor e a amplificação da área de geração de dor (da meninge para a pele). Lesões nos tecidos ou nervos periféricos e o resultante impulso doloroso alteram o processamento subsequente de dor. Em uma condição sem ferimento (Fig. 28-2), estímulos nocivos e inócuos disparam números modestos de impulsos nos nociceptores e Aβ-mecanorreceptores. Apenas os estímulos nocivos resultam em dor. Após a lesão a qualquer tipo tecido, a liberação de mediadores inflamatórios, tais como prostaglandinas, citoquinas, bradiquininas e prótons sensibiliza os nociceptores (Fig. 28-2), de modo que um leve contato pode disparar impulsos nestas fibras, e estímulos nocivos causam taxas de disparo mais elevadas do que antes. Se o nervo for lesado, novos canais de sódio em locais de reparo ou de regeneração geram descargas espontâneas, podendo levar à dor episódica ou permanente na ausência de estimulação periférica. Em alguns casos, receptores adrenérgicos no local do ferimento disparam dor quando ativados pela norepinefrina liberada por nervos simpáticos locais ou por catecolaminas circulantes. Uma cascata de impulsos dolorosos provenientes do nervo ou tecido lesado pode sensibilizar o neurônio central de modo que sinais de um leve toque conduzidos pelas fibras Aβ podem disparar uma descarga central suficiente para gerar dor. Mecanismos adicionais têm sido descritos em animais para explicar o desenvolvimento de dor mediante um leve toque. Decorrido um dia ou mais da lesão ao tecido, mecanorreceptores-Aβ podem começar a produzir um neurotransmissor, a substância P, que é geralmente confinada às fibras sinalizadoras da dor e excita os neurônios da projeção central de dor. Após a lesão do nervo, os mecanorreceptores Aβ, que normalmente fazem sinapse em uma camada profunda da corda espinhal que processa os toques leves, podem gerar novos ramos que produzem sinapses nos neurônios de projeção de dor na corda da espinha dorsal superficial. 6- Dor nociceptiva. REFERÊNCIA: Guideline de Clínica Médica – Farmacoterapia para a dor Neuropática – Jornal de Anestesia - NCBI A dor neuropática tem um efeito substancial na qualidade de vida (QV) e está associada a uma alta carga econômica para os indivíduos e a sociedade. Surge de um grupo heterogêneo de desordens que afetam os sistemas nervosos somatosensoriais periférico e central. É agora considerada uma entidade clínica distinta, apesar de uma grande variedade de causas. Pessoas com dor neuropática podem sentir alteração da sensação de dor, áreas de dormência ou queimação e dor contínua ou intermitente evocada ou espontânea. Assim, a dor neuropática é uma experiência sensorial e emocional desagradável. REFERÊNCIA: Semiologia Médica – Porto DOR NOCICEPTIVA É causada pela ativação dos nociceptores e pela transmissão dos impulsos gerados, que percorrem as vias nociceptivas até as regiões do sistema nervoso central, onde são interpretados. A dor secundária a agressões externas (picada de um inseto, fratura de um osso, corte da pele), a dor visceral (cólica nefrítica, apendicite), a neuralgia do trigêmeo, a dor da artrite e da invasão neoplásica dos ossos são exemplos de dor nociceptiva. Características A dor nociceptiva começa simultaneamente ao início da atividade do fator causal, o qual pode ser, em geral, identificado. Sua remoção frequentemente culmina com o alívio da sensação dolorosa. Nenhum déficit sensorial é identificado nesses pacientes, e a distribuição da dor corresponde à das fibras nociceptivas estimuladas. Quanto menor é o número de segmentos medulares envolvidos na inervação de uma estrutura, maislocalizada é a dor (somática superficial). Em contrapartida, quanto maior o número de segmentos medulares, mais difusa é a dor (visceral e somática profunda). A dor nociceptiva pode ser espontânea ou evocada. A espontânea pode ser expressa com as mais variadas designações: pontada, facada, agulhada, aguda, rasgando, latejante, surda, contínua, profunda, vaga, dolorimento. Todas essas denominações sugerem lesão tissular. A evocada pode ser desencadeada por algumas manobras como: manobra de Lasegue na ciatalgia, a dor provocada pelo estiramento da raiz nervosa, obtida pela elevação do membro inferior afetado, estando o indivíduo em decúbito dorsal, e lavar o rosto e escovar os dentes, nos pacientes com neuralgia do trigêmeo. Esse tipo de dor reproduz a sentida pelo paciente. 7- Terapêutica adequada da dor nociceptiva. REFERÊNCIA: Guideline de Clínica Médica – Dor A OMS classifica os analgésicos usados para este tipo de dor em uma escada de três degraus: - Etapa 1: analgésicos não opióides, como paracetamol e antiinflamatórios não esteroides (AINEs). - Etapa 2: analgésicos opioides fracos, como codeína e tramadol. Sua combinação com um ou dois analgésicos da Etapa 1 é recomendada. - Etapa 3: analgésicos opioides fortes, em primeiro lugar morfina. Sua combinação com um ou dois analgésicos da Etapa 1 é recomendada. O tratamento da dor é baseado em alguns conceitos fundamentais: - A dor só pode ser tratada corretamente se for avaliada corretamente. A única pessoa que pode avaliar a intensidade da dor é o próprio paciente. O uso de escalas de avaliação da dor é inestimável. - As observações da avaliação da dor devem ser registradas no prontuário do paciente da mesma forma que os demais sinais vitais. - O tratamento da dor deve ser o mais imediato possível. - Recomenda-se administrar analgésicos com antecedência, quando apropriado (por exemplo, antes de procedimentos de tratamento doloroso). - Os analgésicos devem ser prescritos e administrados em intervalos de tempo fixos (não sob demanda). - As formas orais devem ser usadas sempre que possível. - A combinação de diferentes analgésicos (analgesia multimodal) é vantajosa. - Comece com um analgésico do nível presumido mais eficaz: por exemplo, no caso de uma fratura de fêmur, comece com um analgésico de Etapa 3. - O tratamento e a dose escolhidos são guiados pela avaliação da intensidade da dor, mas também pela resposta do paciente que pode variar significativamente de uma pessoa para outra. Tratamento da dor aguda Dor suave Paracetamol /AINES Dor moderada Paracetamol / AINES + codeína ou tramadol Dor severa Paracetamol / AINES + morfina Notas sobre o uso de morfina e derivados: - A morfina é um tratamento eficaz para muitos tipos de dor intensa. Seu efeito analgésico é dependente da dose. Seus efeitos adversos costumam ser exagerados e não devem ser um obstáculo para seu uso. - O efeito adverso mais sério da morfina é a depressão respiratória, que pode ser fatal. Este efeito adverso resulta de overdose. Portanto, é importante aumentar as doses gradualmente. A depressão respiratória é precedida de sonolência, que é um alerta para monitorar a frequência respiratória (FR). A depressão respiratória deve ser identificada e tratada rapidamente: estimulação verbal e física do paciente; administração de oxigênio; suporte respiratório (bolsa e máscara) se necessário. Se não houver melhora, administrar naloxona (antagonista da morfina) em bolus a ser repetido a cada minuto até que a RR normalize e a sonolência excessiva remeta: 5 microgramas / kg em crianças e 1 a 3 microgramas / kg em adultos. - A morfina e a codeína sempre causam constipação. Um laxante deve ser prescrito se o tratamento com opióides continuar por mais de 48 horas. A lactulose PO é a droga de escolha: crianças <1 ano: 5 ml ao dia; crianças de 1 a 6 anos: 5 a 10 ml diariamente; crianças de 7 a 14 anos: 10 a 15 ml diariamente; adultos: 15 a 45 ml diariamente. Se as fezes do paciente forem moles, um laxante estimulante (bisacodil PO: crianças> 3 anos: 5 a 10 mg uma vez ao dia; adultos: 10 a 15 mg uma vez ao dia) é preferido. - Náuseas e vômitos são comuns no início do tratamento. Crianças: ondansetron PO: 0,15 mg / kg (máx. 4 mg por dose) até 3 vezes ao dia. Não use metoclopramida em crianças. Adultos: haloperidol PO (2 mg / ml solução oral): 1 a 2 mg até 6 vezes ao dia ou metoclopramida PO: 5 a 10 mg 3 vezes ao dia com um intervalo de pelo menos 6 horas entre cada dose. Não combine haloperidol e metoclopramida. - Para dor crônica em doença em estágio avançado (câncer, AIDS etc.), a morfina PO é a droga de escolha. Pode ser necessário aumentar as doses ao longo do tempo de acordo com a avaliação da dor. Não hesite em dar doses suficientes e eficazes. - A morfina, o tramadol e a codeína têm modos de ação semelhantes e não devem ser combinados. - Buprenorfina, nalbufina e pentazocina não devem ser combinadas com morfina, petidina, tramadol ou codeína porque têm ação competitiva. Tratamento da dor nociceptiva em mulheres grávidas e lactantes REFERÊNCIA: Cecil Medicina Analgésicos não opioides: AINEs, paracetamol, antagonista da COX-2 Analgésicos opioides fracos: codeína e tramadol Analgésicos opióides fortes: morfina Existem vários tipos de analgésicos (fármacos que aliviam a dor) que podem contribuir para controlar a dor. Classificam-se em três categorias: analgésicos opiáceos (narcóticos), analgésicos não opiáceos e analgésicos adjuvantes. Os analgésicos opiáceos provocam a máxima analgesia, constituindo a pedra angular no tratamento da dor aguda devido à sua grande eficácia. TERAPIA FARMACOLÓGICA Analgésicos Não Opiáceos Todos os analgésicos não opiáceos são anti-inflamatórios não esteróides (AINE), com exceção do paracetamol (acetaminofeno). A ação destes fármacos é dupla: em primeiro lugar, interferem com o sistema das prostaglandinas, um grupo de substâncias que interagem e são em parte responsáveis pela sensação de dor. Em segundo lugar, a maioria destes fármacos reduz a inflamação, o edema e a irritação que muitas vezes rodeia uma ferida e que aumenta a dor. A principal vantagem dos analgésicos não opioides é que estes não causam sedação ou outros efeitos colaterais no sistema nervoso central. Incluem o acetaminofeno, AINEs e os inibidores de COX-2. A menos que o paciente tenha contra-indicações a estas drogas ou tenha demonstrado não responder a várias delas, qualquer regime de analgésicos deveria incluir uma droga não opioide, mesmo se a dor for grave o bastante para exigir a complementação de um opioide. Analgésicos Opiáceos Todos os analgésicos opiáceos estão quimicamente relacionados com a morfina, um alcalóide derivado do ópio, embora alguns sejam extraídos de outras plantas e outros sejam produzidos em laboratório. Os agonistas do receptor opioide μ incluem morfina, codeína, oxicodona, hidrocodona, fentanil, hidromorfina, metadona e meperidina. O tramadol é uma droga do tipo opioide que tem propriedades analgésicas opioides fracas e efeitos colaterais de sedação e náusea do tipo opiode, mas é menos constipante e oferece um risco menor de abuso do que os agonistas do receptor μ. Os analgésicos opiáceos são muito eficazes para controlar a dor, mas têm muitos efeitos secundários e, com o tempo, as pessoas que os utilizam podem necessitar de doses maiores. Antes de se suspender o uso prolongado de analgésicos opiáceos, deve diminuir-se a dose gradualmente para minimizar o aparecimento de uma síndrome de abstinência. Apesar destes inconvenientes, as pessoas que sofrem de dor aguda não deveriam evitar os opiáceos. O uso adequado destes fármacos costuma evitar os efeitos secundários. Os diversos analgésicos opiáceos têm diferentes vantagens e desvantagens. O protótipo dos analgésicos opiáceos é a morfina. Um excesso de opiáceos