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P á g i n a | 1 Semiologia Cardiopediátrica INTRODUÇÃO: Anamnese e um exame físico bem realizados são fundamentais para um diagnóstico adequado. Entretanto, com o surgimento de novas tecnologias, como a ecocardiografia, há uma tendência em se negligenciar o papel essencial que eles têm na formulação da hipótese diagnostica adequada. Devemos questionar a mãe em relação a história da gestação, realização de pré-natal, parto, doenças maternas prévias, doenças familiares (síndromes genéticas); O coração é o primeiro grande sistema a ser formado no feto, sendo que entre a 8ª e a 10ª semana de gestação, o coração já se encontra pronto; • O uso de drogas como o Roacutan, por exemplo, é muito prejudicial para o desenvolvimento do feto, independente se usado durante a gestação ou o uso interrompido pouco antes da gestação, sendo que as chances de malformações fetais são importantes; • O uso de drogas como o lítio, muito prescrito em tratamentos psiquiátricos, pode ser muito prejudicial ao desenvolvimento do feto. Desta forma, é fundamental que o psiquiatra mude a estratégia de tratamento para a mulher durante este período de gestação; O planejamento familiar é fundamental para uma gestação mais saudável; Antigamente a ocorrência de cardiopatias congênitas estava muito associada a bebês filhos de idosas, diabéticas, por exemplo. Atualmente muitos bebês cardiopatas são filhos de mães em idade fértil (20-30 anos de idade), sem presença de nenhuma comorbidade; • Há risco aumentado de cardiopatia congênita em bebês que tenham pelo menos um familiar (pai, mãe ou irmão) acometido pela doença, aumentando a incidência em 1,5-2% a chance de desenvolver cardiopatia; • Mãe diabética pode predispor o feto a uma alteração congênita. Quando a descompensação ocorre no final da gestação, pode ocorrer hipertrofia do septo cardíaco, gerando uma obstrução da saída do fluxo sanguíneo; Em casos de gestantes diabéticas em que o bebê nasceu sem malformação fetal, é indicada a realização de um ecocardiograma fetal a fim de avaliar o septo cardíaco, já que próximo a ele estarão a aorta e a pulmonar. Do VD sai a pulmonar e do VE sai a aorta. Na ocorrência de hipertrofia de septo cardíaco, o sangue fica impedido de sair da aorta e da pulmonar, promovendo assim uma estenose pulmonar ou estenose aórtica no nascimento, sendo que tais condições podem ser muito graves; Toda gestante diabética tem indicação de realizar um ecocardiograma fetal; Em gestantes com doenças autoimunes com anticorpos Anti-Ro e Anti-La positivos, pode ocorrer no feto uma bradicardia fetal por bloqueio atrioventricular total. Nesta condição, há um impedimento da passagem do batimento cardíaco do átrio para o ventrículo, sendo que assim, eles passam a bater em momentos distintos, resultando em bradicardia. A frequência respiratória normal de um feto gira em torno de 120-180bpm. Na ocorrência de bradicardia, a frequência cardíaca passa para 50-60bpm. Tal condição leva a desenvolvimento de insuficiência cardíaca, derrame pericárdico, derrame pleural e até mesmo óbito; Ainda, devemos avaliar a história atual que a criança está apesentando, ou seja, se ela apresenta cianose, cansaço aos esforços, cansaço em repouso, desmaios, estado nutricional, peso, pressão arterial, pulsos, sendo que os sinais e sintomas devem ser sempre temporalizados, ou seja, indicado o tempo de ocorrência (exemplo: cianose há 7 dias); 1. HISTÓRIA CLÍNICA: ❑ História gestacional e perinatal - Infecções maternas: Algumas infecções maternas que ocorrem na gestação frequentemente se associam a cardiopatias congênitas. O exemplo mais conhecido é a rubéola que, se ocorrer no 1º trimestre da gestação, pode resultar em estenose pulmonar e persistência do canal arterial (PCA) no RN. P á g i n a | 2 Outras infecções virais precoces (1º trimestre) podem ser teratogênicas e, se ocorrerem no final da gestação, podem causar miocardites no feto e no RN. OBS: COVID- pacientes pediátricos estão apresentando miocardiopatias e dilatação das artérias coronárias. Crianças com histórico de COVID na família pedir ECO! Uso de medicações durante a gestação - Anfetaminas, anticonvulsivantes (fenitoínas), progesterona e estrogênios são altamente teratogênicos. - Ingesta excessiva de álcool pode acarretar a síndrome alcoólica fetal, que frequentemente se associa a presença de cardiopatias como coagulação intravascular disseminada, PCA, comunicação interatrial (CIA) e tetralogia de Fallot. - Doenças maternas: Devemos investigar doenças maternas, pois algumas delas aumentam a prevalência de cardiopatias no RN. O DM materno aumenta o risco de transposição das grandes artérias, CIVD, PCA e de cardiomiopatia hipertrófica. LES (pede anti Ro e anti La)e outras doenças do colágeno aumentam o risco de ocorrência de bloqueio atrioventricular congênito no feto. Mães portadoras de cardiopatia congênita têm risco elevado de recorrência de cardiopatia nos seus filhos, podendo chegar a 15%, o que é bastante elevado quando se compara a incidência de cardiopatia congênita geral na população, que é de 1%. ❑ História pós-natal: A maioria das cardiopatias apresenta-se na infância por meio de uma das ✓ Cianose ✓ Insuficiência cardíaca ✓ Baixo DC Outras formas menos frequentes ✓ Sopro cardíaco ✓ Dor torácica ✓ Palpitações ✓ Síncope CIANOSE: coloração azulada da pele e mucosas e que ocorre quando há uma quantidade de Hb≤5g/dL no sangue arterial. Esse sinal pode aparecer precocemente no período neonatal. A detecção clínica de cianose em geral ocorre quando a saturação está < 85%, e pode ser mais dificilmente observada nas crianças de raça negra. As cardiopatias congênitas cianóticas apresentam obrigatoriamente uma mistura (shunt) de sangue do território venoso para o arterial (direita-esquerda). As cardiopatias cianóticas podem ocorrer por meio de crises de cianose ou também chamadas crises hipoxêmicas. São caracterizadas pelo aparecimento súbito de cianose e acompanhadas de instabilidade hemodinâmica e respiratória e, por vezes, até mesmo torpor e perda de consciência. Geralmente apresentam algum fator precipitante, como choro intenso, febre, esforço para evacuar ou anemia. SINTOMAS DE INSUFICIÊNCIA CARDÍACA E BAIXO DC: As cardiopatias que cursam com IC na criança geralmente são aquelas que apresentam aumento do fluxo pulmonar em decorrência de defeitos septais com mistura de sangue da E para a D, ou aquelas com disfunção ventricular, como as miocardiopatias. Os principais sintomas de IC na criança são aumento do esforço respiratório (taquidispneia), cansaço aos esforços (às mamadas no lactente), taquicardia, sudorese acentuada e aumento do número de infecções respiratórias. P á g i n a | 3 No lactente, as dificuldades para se alimentar + aumento do gasto energético basal que ocorre com a respiração, acarretam baixo ganho ponderal e desnutrição. Algumas cardiopatias podem cursar com sinais e sintomas de BAIXO DÉBITO, que se caracterizam por intolerância aos esforços, palidez e sudorese, pré-síncope ou síncope aos esforços. EXAME FÍSICO CARDIOVASCULAR: O exame físico deve ser completo e realizado de forma sistematizada. A técnica e a sequência dependem da idade do paciente, sendo que o exame físico realizado em um lactente pode não ser realizado na mesma sequência que em um adolescente, mas ambos devem ser completos. Sugere-se iniciar com a aferição dos sinais vitais. Esses dados devem ser analisados e interpretados levando-se em consideração a idade da criança por meio de tabelas específicas. A. INSPEÇÃO GERAL (inicia-se a partir do momento que o paciente entra) Iniciamos a avaliação do tórax através da inspeção. Devemos avaliar o tipo de tórax (deformidades torácicas não necessariamente estão relacionadas a cardiopatias congênitas),se há abaulamentos no precórdio, dinâmica do tórax (hiperdinâmico quando há insuficiência cardíaca). Deve-se observar: o Aspecto geral da criança o Procurar alterações que possam estar relacionadas a alguma síndrome genética (como Down, Williams, Turner) o Estado nutricional o Padrão respiratório o Cianose: Nos casos de cianose, deve-se observar se há presença de baqueteamento digital, o que significa estado de hipoxemia crônica, geralmente > 6 meses de evolução. Quanto ao padrão respiratório, deve-se observar se há retrações subcostais e/ou intercostais, além de deformidades torácicas, o que costuma ocorrer nos casos de IC em que há aumento do fluxo pulmonar e do trabalho respiratório. Avaliar o tipo de marcha do paciente quando esse já andar; analisar se a criança é hiperativa; analisar bem o tórax, pois as vezes é possível ver o coração bater (em crianças mais magrinhas o Ictus pode ser visto); analisar dinâmica do tórax (em casos de insuficiência o tórax é hiperdinâmico); ver se há turgência jugular; cicatrizes no tórax; simetria dos membros e malformações dos membros. o Peso e estatura: Essas informações são importantes, pois permitem determinar se a criança apresenta algum grau de comprometimento no crescimento.Várias cardiopatias podem cursar com graus variados de desnutrição ou déficit de crescimento, como as cardiopatias com hiperfluxo pulmonar e IC (como cardiopatias tipo comunicação interventricular). SINAIS VITAIS PRINCIPAIS - Frequência cardíaca (FC): A aferição da FC deve ser feita pela ausculta direta dos batimentos cardíacos ou da palpação dos pulsos arteriais.É importante conhecer os valores normais de FC para cada faixa etária para que se possa fazer uma interpretação adequada dos valores encontrados. Taquicardia pode ser um sinal importante de IC ou mesmo de arritmia cardíaca, assim como o achado de bradica - Frequência respiratória (FR): A aferição da FR deve ser feita pela observação dos movimentos respiratórios da P á g i n a | 4 criança e contados ao longo de pelo menos 1 min.Crianças geralmente apresentam respiração periódica e, por isso, não se pode aferir a FR em tempo menor que 1 min.O aumento da FR geralmente antecede o quadro de dispneia, que é mais facilmente detectado ao exame físico. - Pressão arterial: Em geral, essa aferição não é fácil de ser feita em crianças pequenas, e o examinador deve ter especial atenção para utilizar o manguito adequado. Sugere-se que seja utilizado um manguito cuja largura do cuff seja de 50% da circunferência do membro aferido. Devem-se realizar 3 aferições consecutivas e, em geral, descarta-se a 1ª aferição. A análise da medida obtida deve ser feita utilizando-se curvas específicas para cada faixa etária. - Oximetria de pulso: O valor considerado normal é ≥ 95%, não podendo haver diferença maior que 3% entre membros superiores e inferiores. Cianose clínica geralmente é percebida quando a saturação periférica é menor que 85%. Crianças que apresentam saturação entre 85 e 95% geralmente não manifestam cianose, mas apresentam hipoxemia, que pode ser decorrente de cardiopatia cianótica. O oxímetro de pulso permite averiguar adequadamente a saturação de O2 em crianças com perfusão periférica adequada, porém, em situações de baixo débito ou choque, a sua utilização não é recomendada. EXAME FÍSICO CARDIOVASCULAR ESPECÍFICO A. Inspeção e palpação precordial: Palpar com a ponta do dedo e para sentir usar a palma da mão A região precordial de uma criança normal geralmente não apresenta abaulamentos ou impulsões visíveis ou palpáveis. Durante a palpação do precórdio, devem-se definir a posição do ictus e a presença de bulhas palpáveis ou de frêmitos. Delimitar o coração; sentir o coração bater; diferenciar frêmito ou se é apenas o coração batendo; palpar a fúrcula (também pode sentir os batimentos); palpar puslos dos membros superiores e inferiores; ver expansibilidade torácica; no RN palpar pulso femoral, caso esteja reduzido e diferente do braquial pedir ECO; para palpar o ictus cordis (5EIC na linha axilar anterior ou na linha hemiclavicular) usar as pontas dos dedos. A presença de frêmitos tem muita importância e a sua localização pode sugerir fortemente determinadas cardiopatias. B. Ausculta cardíaca: Na ausculta cardíaca normal temos ritmo cardíaco regular em 2 tempos bulhas normofonéticas sem sopros (RCR 2T BNF SS); O local de realização do exame deve estar silencioso. O exame deve ser feito com o paciente tranquilo e colaborativo.Caso isso não ocorra, por exemplo, um lactente muito choroso, deve-se considerar realizar o exame em outro momento ou tomar providência para acalmar o bebê, como alimentá-lo, colocá-lo no colo dos pais ou mesmo aguardar um momento de sono espontâneo. O estetoscópio deve ser apropriado para a idade e o tamanho da criança. Em geral, crianças não gostam de estetoscópios e devem se familiarizar com eles um pouco antes do exame. Lembre-se de aquecê-lo antes de colocá-lo no tórax da criança. P á g i n a | 5 Idealmente, deve ter a campânula e o diafragma para que se possa analisar adequadamente ruídos de baixa frequência (mais audíveis com a campânula) e de alta frequência (mais audíveis com o diafragma). A ausculta deve percorrer toda a região precordial, a região axilar bilateral, o dorso e a região supraesternal. A rotina natural é começar pela região do ápice do coração (área mitral), depois borda esternal esquerda baixa (área tricúspide), borda esternal esquerda média, borda esternal esquerda alta (área pulmonar) e finalizar na borda esternal direita alta (área aórtica). Em cada foco de ausculta, deve-se procurar analisar inicialmente a 1ª bulha (sístole), a 2ª bulha (diástole) e, somente após isso, os demais ruídos. Quando um sopro está presente, geralmente ele tira a concentração e impede de fazer a avaliação inicial das bulhas. É necessário ter disciplina para não permitir que isso ocorra, pois é preciso definir o ciclo cardíaco (1ª e 2ª bulhas) antes de analisar qualquer sopro. O ritmo cardíaco regular é detectado através do TUM, TÁ que auscultamos. Na criança e no pré-adolescente podemos detectar um ritmo cardíaco irregular chamado de arritmia sinusal, que é decorrente de uma alteração da frequência cardíaca por conta da respiração. Na inspiração, o coração acelera. Já na expiração, o coração desacelera. É importante pedirmos que o paciente puxe e solte o ar em um momento da ausculta para podermos diferenciar as arritmias e presença de extra-sístole; Todo paciente normal apresenta um desdobramento variável da 2ª bulha, que representa o fechamento da aorta e da pulmonar. Desta forma, podemos auscultar TUM, TÁ, TUM, TÁ, TUM, TRÁ, TUM, TRÁ, TUM TÁ... Essa ausculta é normal, sendo que se pedirmos para a criança soltar o ar, esse desdobramento pode ser melhor auscultado, sendo que ele decorre de uma diferença de pressão normal da pulmonar; Em algumas cardiopatias congênitas que levam a hiperfluxo pulmonar, teremos o desdobramento constante e fixo da 2ª bulha, sendo assim auscultado o TUM, TRÁ, TUM, TRÁ, TUM TRÁ... Nesta situação patológica, ao pedirmos que a criança solte o ar, a ausculta não se altera; Ainda, devemos avaliar se o coração está normofonético, hipofonético ou hiperfonético; Em relação aos sopros, eles podem ser classificados em sistólicos ou diastólicos; - Os sopros diastólicos (exemplo: TUM, TASHHH, TUM, TASHHH) são sempre patológicos; - Os sopros sistólicos (exemplo: TUM, SHHH, TÁ, TUM, SHHH, TÁ) podem ser fisiológicos ou patológicos; Os sopros fisiológicos são sopros mais leves, suaves, que se alteram de acordo com a posição do indivíduo e ficam mais perceptíveis em situações hiperdinâmicas, como a febre eaumento da frequência cardíaca; Os sopros patológicos são referentes a comunicações e estenoses, por exemplo. Estes sopros são mais rudes e característicos; Os sopros cardíacos são graduados em cruzes (1+ até 6+). Abaixo de 4+ o médico gradua de acordo com a intensidade do sopro, e tal classificação se aprende com a prática de ausculta. É importante sabermos que até 3+ não há frêmito. A partir do momento em que palpamos frêmito, o sopro deve ser graduado de 4+ para cima. Quando auscultamos o sopro e há frêmito, 4+. Quando tiramos uma banda do estetoscópio e ainda auscultamos o frêmito, 5+. Quando tiramos completamente o estetoscópio do tórax e ainda auscultamos o frêmito, 6+; P á g i n a | 6 Devemos localizar o sopro, seu local de ocorrência. Pode ser através da indicação do EIC e linha em que se encontra ou pelo nome do foco. Exemplo: Foco pulmonar ou 2º EIC esquerdo; Importante: Não existe sopro panfocal, ele pode apenar irradiar. Desta forma, quando identificarmos um sopro, devemos sempre localizá-lo no tórax do paciente; Exemplos de sopro: Sopro diastólico no foco mitral → estenose mitral, sopro sistólico no foco mitral → insuficiência mitral, sopro diastólico na fúrcula esternal – região aórtico acessória → insuficiência aórtica; Importante: Sopro não é diagnóstico, e sim um sinal!!! RUÍDOS CARDÍACOS: A interrupção súbita do fluxo sanguíneo ocasionado pelo fechamento das valvas cardíacas é responsável pelo surgimento da 1ª e da 2ª bulha cardíaca. Esses ruídos não são gerados pela coaptação das cúspides valvares, mas, sim, pela interrupção súbita do fluxo de sangue nas valvas fechadas. Isso gera um ruído audível de alta frequência e alta intensidade. O fluxo de sangue que passa normalmente pelo coração tem baixa frequência e não é audível. o 1ª bulha (B1): está relacionada ao fechamento das valvas mitral e tricúspide, sendo mais audível nos focos mitral (apical) e tricúspide (borda esternal esquerda baixa). Tem 2 componentes, o mitral e tricúspide, sendo que a distância entre esses componentes é pequena, e não é comum observar desdobramentos da 1ª bulha na criança. o 2ª bulha (B2): está relacionada ao fechamento das valvas aórtica e pulmonar, sendo mais audível nos focos pulmonar (borda esternal esquerda alta) e aórtico (borda esternal direita alta). O melhor local para se analisar a 2ª bulha é no foco pulmonar. Tem 2 componentes, o aórtico (A2) e o pulmonar (P2), sendo que o P2 ocorre um pouco após o A2. A intensidade da 2ª bulha nessa região e a presença de desdobramentos devem ser bem analisadas: - Desdobramento normal de B2: a 2ª bulha normalmente apresenta um desdobramento variável com o ciclo respiratório, sendo maior na inspiração e diminuindo na expiração (Figura 2); - Alterações patológicas de B2: as principais alterações estão relacionadas ao desdobramento e à intensidade da B2 no foco pulmonar; - Desdobramento amplo e fixo de B2 ocorre em situações em que a sístole do ventrículo direito é prolongada, como na comunicação interatrial e no bloqueio de ramo direito; B2 única (ausência completa de desdobramento) pode sig- unificar hipertensão pulmonar (P2 aproxima-se de A2), presença de apenas uma valva arterial (atresia pulmonar, atresia aórtica, tronco arterial comum), ou quando se ouve apenas o componente A2 por conta de uma má posição da valva pulmonar (como transposição das grandes artérias, tetralogia de Fallot); Quanto à intensidade, B2 hiperfonética pode indicar hipertensão pulmonar, enquanto B2 hipofonética ocorre na estenose pulmonar; o 3ª bulha (B3): ocorre na fase inicial da diástole, quando o fluxo de sangue atrial chega ao ventrículo. Pode ser um achado normal em crianças de 2 a 8 anos, mas está presente em cardiopatias com grande dilatação e redução da complacência do ventrículo esquerdo (como miocardiopatias, cardiopatias com grande shunt esquerda-direita). É um ruído audível, po- rém de menor intensidade que B1 e B2. Geralmente audível nos P á g i n a | 7 focos mitral e tricúspide (borda esternal esquerda baixa); o 4ª bulha (B4): ocorre na fase final da diástole, após a contração atrial, quando esse fluxo de sangue se choca com um ventrículo dilatado e com alteração de complacência. É um ruído sempre patológico. SOPRO CARDÍACO: Os sopros são produzidos em decorrência de um fluxo sanguíneo turbulento que causa uma vibração nas estruturas intracardíacas e vasculares de intensidade suficiente para ser transmitida e ser audível na parede torácica. O sopro deve ser identificado e analisado de forma sistematizada, devendo-se observar principalmente os seguintes aspectos: intensidade, localização em relação ao ciclo cardíaco (sistólico, diastólico, contínuo), localização principal e irradiação no tórax e intensidade. INTENSIDADE DO SOPRO: a intensidade de um sopro é determinada pelo volume de sangue que se movimenta no local de turbulência de fluxo e o gradiente de pressão existente entre as câmaras cardíacas. Quanto maior o volume de fluxo e o gradiente de pressão, maior a intensidade do sopro. Utiliza-se a seguinte classificação para graduar a intensidade de um sopro: LOCALIZAÇÃO DO SOPRO: de acordo com a localização do sopro em relação à 1ª e à 2ª bulhas cardíacas, o sopro é classificado em sistólico, diastólico ou contínuo: ❑ Sopro sistólico: ocorre entre a 1ª e a 2ª bulhas cardíacas e é classificado em sopro de ejeção e de regurgitação, de acordo com o início do sopro em relação à 1ª bulha: - Sopro sistólico em ejeção: inicia-se após a 1ª bulha e tem caráter crescendo-decrescendo, geralmente terminando antes da 2ª bulha. É geralmente causado pela obstrução ao fluxo sanguíneo nas vias de saída direita ou esquerda (estenótica pulmonar ou aórtica); - Sopro sistólico em regurgitação: inicia-se junto à 1ª bulha (não há intervalo algum entre a 1ª bulha e o início do sopro) e geralmente tem duração mais longa, podendo ocorrer em toda a sístole (holossistólico). Esse tipo de sopro é sempre patológico e está presente nas seguintes situações: comunicação interventricular, insuficiência tricúspide e insuficiência mitral; ❑ Sopro diastólico: ocorre entre a 2ª bulha e a 1ª bulha e é classificado em 3 tipos, de acordo com o mecanismo hemodinâmico causador do sopro: - Sopro diastólico em regurgitação: inicia-se junto com a 2ª bulha (protodiastólico) e tem caráter em decrescendo, diminuindo sua intensidade ao longo da diástole até o início da 1ª bulha. É o sopro característico da insuficiência das valvas arteriais. É mais audível na borda esternal esquerda média e geralmente tem irradiação para o foco mitral ou tricúspide. Na insuficiência aórtica, o sopro tem alta intensidade em virtude de um elevado gradiente entre a pressão da aorta e a pressão do ventrículo esquerdo, enquanto na insuficiência pulmonar, a intensidade do sopro será menor, exceto nos casos de hipertensão arterial pulmonar; - Sopro diastólico de enchimento ventricular: decorre de uma estenose relativa das valvas mitral ou tricúspide em situações de alto fluxo através delas, como ocorre em cardiopatias com grande shunt esquerda-direita (comunicação interventricular, comunicação interatrial). É mais audível no foco mitral ou tricúspide e geralmente é de pequena intensidade; P á g i n a | 8 - Sopro diastólico pré-sistólico (contração atrial): ocorre no final da diástole, após a contração atrial. É característico da estenose mitral ou tricúspide. Como os gradientes de pressão são pequenos (5 a 10 mmHg), a intensidade desse sopro é pequena, mas tem uma característica típica que lembra um “ruflar”; ❑ Sopro contínuo: ocorre durante todo o ciclo cardíaco, ou seja, sístole e diástole, sem ocorrer interrupção na 2ª bulha. Os tipos principais são: - Comunicação aortopulmonar ou arteriovenosa: nestas patologias,o fluxo turbulento mantém-se ao longo da sístole e da diástole na direção do território de maior pressão para o de menor pressão. O exemplo mais conhecido é a PCA, cujo sopro contínuo é mais audível no foco pulmonar e na borda esternal esquerda alta, não havendo nenhuma modificação com o decúbito. Nos casos de fístulas arteriovenosas extracardíacas, como cerebrais ou hepáticas, o sopro contínuo será audível nessas regiões (cabeça, abdome); - Estenose de artérias: como na coarctação de aorta (sopro contínuo no dorso); - Sopro sistodiastólico: decorre de dupla lesão nas valvas arteriais, como na estenose aórtica associada a insuficiência aórtica, ou na estenose pulmonar associada a insuficiência pulmonar. Nessas situações, o sopro será sistólico e diastólico, porém a direção do fluxo sanguíneo não será a mesma ao longo do ciclo cardíaco, o que o diferencia do sopro contínuo da PCA; - Sopro venoso: decorre de uma discreta turbulência de fluxo na chegada das veias inominadas junto à veia cava superior direita. É um sopro benigno e faz parte do grupo de sopros inocentes. É mais audível na borda esternal direita, estando a criança em posição sentada, e geralmente desaparece na posição supina; ❑ Sopro inocente: a maioria das crianças (70 a 80%) apresenta algum tipo de sopro cardíaco inocente ao longo da infância, sendo mais frequente entre 3 e 5 anos de idade. Esse sopro não é patológico e não está associado à presença de cardiopatia. Eles geralmente são detectados ou se acentuam em situações de elevação do débito cardíaco, como febre ou anemia. Os três principais tipos de sopros inocentes são: - Sopro de Still: é o tipo mais comum de sopro inocente. Trata-se de um sopro sistólico de ejeção de pequena intensidade (grau 1 a 2) localizado na borda esternal esquerda média, com timbre vibratório, cuja explicação fisiopatológica é o aumento da velocidade de fluxo na via de saída do ventrículo esquerdo ou a presença de uma pequena corda tendínea no ventrículo esquerdo; - Sopro inocente pulmonar: é o segundo tipo mais comum; também um sopro de ejeção de pequena intensidade (grau 1 a 3) localizado na borda esternal esquerda alta. Também decorre de um aumento da velocidade de fluxo sanguíneo na via de saída do ventrículo direito, sendo mais comumente audível em crianças magras com tórax “fino” ou com pectus excavatum; - Sopro venoso contínuo: é o terceiro tipo mais comum, já descrito anteriormente. Como o sopro é um sinal clínico muito comum em crianças, torna-se muito importante fazer o diagnóstico diferencial entre um sopro inocente e um sopro patológico. Na presença de um dos seguintes achados, o sopro deve ser considerado patológico e necessita de avaliação cardiológica especializada: o Sintomas de insuficiência cardíaca ou cianose; o Sopro sistólico com intensidade grau 3 ou mais, ou com frêmito; o Sopro diastólico; o Alteração das bulhas cardíacas; o Alteração nos pulsos arteriais (amplos ou diminuídos); o Alteração no eletrocardiograma; o Alteração na radiografia de tórax: cardiomegalia, silhueta cardíaca alterada ou alteração da trama vascular pulmonar.
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