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Direito Ambiental Aula 03 - Ambientalismo Constitucional Introdução da Aula Na presente parte da disciplina encontramos o que se denomina de “Ambientalismo Constitucional”. Trata-se, sobretudo, de uma expressão marcante, inclusive com repercus- sões teóricas importantes para a teoria e a filosofia do Direito. No entanto, a expressão significa dinâmica, movimento. Isto é, significa que sinergia en- tre a tutela ambiental e o conteúdo essencial contido na Constituição estão em constante interação, seja na teoria, seja no dia-a-dia do estudo ambiental. A partir desta relação “sinergética”, como objetivos desta aula, você deverá: • Compreender a dinâmica da tutela ambiental no plano do ambientalismo cons- titucional; • Associar o ambientalismo constitucional com a teoria dos direitos fundamentais e • Investigar a relação da ideia de bloco constitucional com a evolução legislativa em matéria ambiental. Reflexão Antes de iniciarmos esta aula, faça a sua “Pegada Ecoló- gica” e reflita um pouco sobre seus hábitos de consumo e sua influência para o nosso planeta. Tópico 1 - “Pegada Prática” do Ambientalismo Constitucional O Ambientalismo constitucional expressa a dinâmica de como o objeto da tutela ambiental pode ser tratado. Antes, a proteção do meio ambiente era o objeto clássico. Hoje, houve uma modificação substancial. Com a globalização dos riscos, a proteção ambiental ganhou proporções mun- diais. A Mundialização – vista a partir da ideia de Internacionalização do Direito – provoca os outros países a se movimentarem em torno do tema. A forma como a sociedade vive sempre deixa marcas no meio ambiente. É o que os espe- cialistas chamam de “pegada ecológica” Conceito A Pegada Ecológica é uma metodologia de contabi- lidade ambiental que avalia a pressão do consumo da sociedade sobre os recursos naturais. Há entida- des, por exemplo, que realizam o cálculo de quantos planetas seriam necessários para manter o padrão de consumo da sociedade. No contexto do direito ambiental, é importante contextualizar a “pegada prática”, isto é, a marca deixada pela influência da Constituição na regulação ambiental. O ambientalismo constitucional – a “pegada prática” desta influência, sem dúvida retrata a existência de uma complexidade específica do direito ambiental. Por essa razão, o funda- mento do conteúdo normativo gravita por normas técnicas e de acordo com o estágio de desenvolvimento da ciência (ANTUNES, 2016). As principais características das normas jurídicas necessitam sofrer mitigações relevantes. A abstração significa a construção de padrões teóricos de comportamento. Para o conteúdo ambiental, determinada norma pode se apresentar de forma bem concreta. A generalidade consiste na aplicação de uma norma jurídica a todos sem distinção. A norma ambiental – por outro lado – pode ser direcionada para setor específico. Com isso, há constante e visível crescimento de normas específicas e diretamente voltadas para situações “concretas”. Exemplos desta relação de abstração/concretude na norma ambiental podem ser encontra- dos tanto no plano internacional como no plano interno. • As “famosidades” são o Protocolo de Kyoto e Convenção sobre Diversidade Biológica. • A regularização fundiária e a função social da propriedade entram também no jogo da abstração vs. concretude | generalidade vs. setores específicos. • O agronegócio está na pauta em virtude de diversos aspectos, pois também pode ser considerado um importante exemplo da relação abstração/concretude experimentada pelo Direito Ambiental. Além das reservas florestais e sua dinâmica estabelecida pelo novo Código Florestal, observa-se que determinadas políticas econômicas estatais foram direcionadas para o setor agrícola, atuando como verdadeiras políticas públicas (LELIS; CLARK, 2016). Uma repercussão disto é a influência causada pela revolução verde. Com a revolução foi possível aumentar a produtividade agrícola por meio de melhoramento de sementes, uso de agrotóxicos, máquinas e tudo que o conhecimento humano pudesse produzir. Embora a produtividade tenha aumentado, não significou o fim da fome, e sim, a chegada de transgênicos, agrotóxicos mais potentes para evitar as doenças resistentes à monocultu- ra. Assim, a promessa da tecnologia moderna se transformou em ameaça. Neste contexto, surge como alternativa a agricultura orgânica. Estudo Complementar Sobre o tema, a leitura do texto “Intervenção esta- tal na agricultura e a possibilidade de uma ação ética”, de Lelis e Clark podem contribuir para o avanço da discussão. É preciso compreender a contextualização da agricultura orgânica, cujo papel relacionado à proteção constitucional do meio ambiente está além de sua cadeia produtiva, avançando também na agricultura familiar e nos perfis de consumo. A inserção da agricultura orgânica na sociedade também ocorreu por meio da evolução tecnológica da agricultura no século XIX e teve como foco principal o pequeno e médio agricultor. A agricultura orgânica tem por princípios a melhoria da qualidade dos alimentos, a preservação dos ecossistemas, o fortalecimento do associativismo e a prática do comér- cio justo (VIEIRA et. al., 2016). A tecnologia – inserida em alguns núcleos de agricultura orgânica – baseia-se em sistemas de produção que se limita a excluir o uso de fertilizantes sintéticos, pesticidas, reguladores de crescimento e aditivos para a alimentação animal. A agricultura orgânica não se baseia em seu sistema produtivo e sim, também, na inserção da agricultura familiar (VIEIRA et. al., 2016). Dentro deste contexto, a prática da agricultura orgânica não se restringe a um nicho de mercado, mas sim a um sistema justo e sólido que busca melhorar todos aspectos da qualidade de vida do ser humano. Estudo Complementar O texto “Agricultura orgânica: solução para o sécu- lo XXI?” de Vieira, Guilherme, Itavo e Tashima, co- loca em evidência o ambientalismo constitucional, no que diz respeito às interações sociais, econômi- cas e biológicas entre a pessoa e o meio ambiente. No entanto, em virtude da industrialização, a poluição do ar foi um dos primeiros enfoques da restrição ambiental normativa. O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) estabeleceu, por exemplo, o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Auto- motores (PROCONVE) desde 1993. Com isso, o estímulo ao avanço da tecnologia foi de sobremaneira importante para a redução da emissão de poluentes no ar. Atualmente, os racionamentos de energia e de água são a tônica da vez. O avanço tecnoló- gico também é importante para a proteção constitucional do meio ambiente. Com a pro- dução de novas matrizes enérgicas, sobretudo a partir da “pegada ecológica” (solar, eólica, biomassa), bem como sua aplicação prática no desenvolvimento econômico chegar-se-á a um nível tecnológico que propicie o avanço do ambientalismo constitucional. Saiba mais A reportagem “Nordeste puxa a produção de energia eó- lica no Brasil” demonstra o avanço em relação a estas no- vas tecnologias. Tópico 2 - Ambientalismo Constitucional como Direito Fundamental Estabelece o caput do artigo 225 da Constituição: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. A classificação hermeneuticamente adequada para o dispositivo é de ser um princípio, so- bretudo por comportar a variação interpretativa de cada realidade constitucional diferen- ciada. Neste momento, é importante avançar e decompor o dispositivo, para se compreender a proteção ambiental como direito fundamental. O dispositivo apresenta o meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fun- damental de 3ª dimensão. Este tipo de proteção constitucional foi estabelecido por dois fatores:O primeiro diz respeito às expressões “Todos têm direito”, “bem de uso comum do povo”, “impondo-se à coletividade” e “as presentes e futuras gerações”. Estas expressões não conseguem “individualizar” a proteção constitucional, que se confere, por exemplo, à liberdade de expressão, à intimida- de e à vida privada ou até mesmo o direito de ir e vir de determinada pessoa. Também não é possível identificar uma categoria específica (como trabalhadores de determinado profissão – professores, por exemplo; ou estudantes de determinada faixa etária e que pleiteiam acesso à creche). O titular deste direito fundamental não é iden- tificável. Por isso o meio ambiente ecologica- mente equilibrado apresenta-se como direito de 3ª dimensão: os interesses protegidos são interesses difusos, vez que são indivisíveis (não se consegue decompor parte de determinado ecossistema) e as expressões recortadas acima indicam que os titulares deste direito são pesso- as indeterminadas. Por essa razão, são direitos transindividuais, na medida em que estas pessoas indetermina- das (e que as vezes ainda não existem, como as “futuras gerações”) estão conectadas por uma circunstância de fato (no caso, a proteção am- biental indivisível). Os direitos fundamentais clássicos ou de 1ª dimensão estão previstos no Título II do texto constitucional, que compreende dos artigos 5º ao 17. Não contempla, portanto, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O segundo aspecto diz respeito ao que pode ser chamado de bloco de constitucionalidade ou bloco constitucional. No entanto, o artigo 5º do texto constitucional contém duas cláusulas gerais importantes, previstas nos §§ 1º e 2º: Art. 5º (…). § 1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. -- § 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. Estes dispositivos são de extrema relevância. No § 1º, há a conotação de que os direitos fundamentais possuem aplicação imediata. Reflexão Se o direito fundamental ao meio ambiente não está no Título II, é possível que esta cláusula geral se aplique ao artigo 225 do texto consti- tucional? Isto, sem dúvida, é objeto de elevada controvérsia jurídico-constitucional. Para determinados autores, como Ferreira Filho (2016), a proteção constitucional ao meio ambiente pode ser enquadrada como direitos de solidariedade ou fraternidade. Segundo o autor, ainda há certa resistência quanto à natureza ou o seu rol. No entanto, O reconhecimento dos direitos sociais não pôs termo à ampliação do campo dos direitos fundamen- tais. Na verdade, a consciência de novos desafios, não mais à vida e à liberdade, mas especialmente à qualidade de vida e à solidariedade entre os seres humanos de todas as ou nações, redundou no surgimento de uma nova geração – a terceira –, a dos direitos fundamentais (FERREIRA FILHO, 2016, p. 73). Com esta harmonização, o reconhecimento do meio ambiente como direito fundamen- tal está relacionado à aplicação do § 2º do artigo 5º do texto constitucional. Referido dispositivo é reconhecimento como cláusula geral – conectada à ideia de bloco constitucional. Significa que outros direitos fundamentais: • Podem estar espalhados pelo texto constitucional, como o direito individual à anterioridade tributária (Constituição, artigo 150), a proteção constitucional da criança e do adolescente (Constituição, artigo 227), bem como o próprio direito ao meio ambiente ou • Podem estar em documentos internacionais nos quais a República Federativa do Brasil seja parte. Com isso, a cláusula geral do § 2º do artigo 5º da Constituição permite que o meio ambien- te seja reconhecido como direito fundamental. Estudo Complementar A metodologia de estudo do bloco constitucional pode ser acompanhada na leitura do texto “Diá- logo entre os juízes: bloco de constitucionalidade “ao avesso”? Ou bloco de normatividade interame- ricano?”, de André Pires Gontijo. A dimensão da proteção ambiental ainda comporta as outras duas dimensões dos direitos fundamentais. A proteção ambiental tanto pode ser considerada como direito fundamental de 1ª dimensão ou pode levar em consideração a 2ª dimensão. Veja os exemplos: 1ª dimensão - Determinado cidadão, via ação popular, pode requerer tutela ini- bitória em relação a determinado empreendimento que não observou os proce- dimentos ambientais; 2ª dimensão – As políticas públicas podem ser elaboradas para a proteção am- biental. Nestes dois exemplos, ainda podem ser conjugados alguns atributos dos direitos funda- mentais. O direito ambiental como direito fundamental pode se apresentar como proteção de eficácia vertical (relação do Estado com o particular – exemplo, o licenciamen- to ambiental) ou como eficácia horizontal dos direitos fundamentais (determinada empresa deixa de contratar certo produto por não contemplar exigências de prote- ção ao meio ambiente). Outros atributos importantes dizem respeito à perspectiva subjetiva dos direitos funda- mentais (quando a relação se dá entre a pessoa natural/jurídica e o Estado) e à perspectiva objetiva (uma relação institucional). Por fim, a formulação de políticas públicas ambientais (pelo Estado ou pelo particular, como a coleta seletiva de lixo ou a troca de uso do papel por dispositivos eletrônicos) constitui exemplo de como o direito ambiental leva o seu conteúdo jurídico até a realidade (efeito irradiante dos direitos fundamentais). Estes atributos vinculados aos direitos fundamentais se amoldam ao bloco constitucio- nal, o que permite levar estas características da norma de direito constitucional para o plano infraconstitucional. Tópico 3 - Relação do Bloco Constitucional com a Evolução Legislativa em Matéria Ambiental Como referido anteriormente, o bloco de constitucionalidade permite uma elasticidade da proteção constitucional (GONTIJO, 2014). Assim, o conteúdo essencial estabelecido pelo artigo 225 do texto constitucional pode irradiar para outras normas jurídicas, inclusive para a legislação infraconstitucional. Isto se verifica à forma como a proteção ambiental era tratada pela legislação. Antes, a proteção ambiental se restringia apenas ao Código Florestal – Lei 12.651/2012 – para a proteção à vegetação nativa. Agora, se fala em proteção à Diversidade Biológica, que inclui diversos instrumentos normativos. Dentre eles, destaca-se o artigo 225, § 1º da Constituição: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fisca- lizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus com- ponentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão per- mitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a in- tegridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impac- to ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio am- biente; VI - promover a educação ambiental em todos osníveis de ensino e a conscienti- zação pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. Para além do Código Florestal, o conteúdo essencial destes dispositivos são concretizados em diversos mecanismos de regulação infraconstitucional. Dentre eles, destacam-se: (i) a Convenção sobre Diversidade Biológica (Decreto Federal 2.519/1998); (ii) Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) que se desmembra do artigo 225, § 1º do texto constitucional para (ii.a) a Lei Federal 9.985/2000 – que regulamenta este dispositivo constitucional e o SNUC como um todo; (ii.b) Lei Federal 11.105/2005 – que estabelece a regulação sobre os Organismos Geneticamente Modificados (OGM) e a Política Nacional de Biossegurança; bem como (ii.c) a Lei Federal 13.123/2015 – acesso ao patrimônio genético, ao conhecimento tradicional e repartição de benefícios para conser- vação e uso sustentável da biodiversidade); (iv) Lei da Mata Atlântica (Lei Federal 11.428/2006); (v) normas estaduais e municipais de proteção aos bens anteriormente mencionados e (vi) normas destinadas à proteção desta ou daquela espécie da flora brasileira (artigo 38 e seguintes da Lei Federal 9.605/1998). Além de avançar para o patamar infraconstitucional, o bloco constitucional também avan- ça a nível federativo. Por exemplo, a regulação ambiental no Distrito Federal preocupa-se com a conexão do meio ambiente a diversos aspectos. Dentre eles, destacam-se: • A Lei Distrital 41, de 13/9/1989, que dispõe sobre a Política Ambiental do Distri- to Federal, a qual foi alterada pela Lei Distrital 1.399, de 10/3/1997; • A Lei Distrital 56, de 24/11/1989, que dispõe sobre normas para a proteção do meio ambiente e • Artigo 289 da Lei Orgânica do Distrito Federal que, em consonância com o inciso IV do § 1º do artigo 225 do texto constitucional, determina a exigência de estudo prévio de impacto ambiental. No âmbito de competências do Distrito Federal, re- ferido dispositivo é regulamentado pela Lei Distrital 1.869, de 10/3/1997, a qual dispõe de instrumentos de avaliação de impacto ambiental no Distrito Federal e pelo Decreto Distrital 19.176/1998, que regulamenta referida lei distrital. Encerramento A regulação da tutela ambiental ganhou uma gradação normativa ao longo dos anos. Das discussões no plano internacional à influência dos textos constitucionais, o direito am- biental está antenado às novas metodologias interpretativas adquiridas pelo direito cons- titucional. Com isso, o direito ambiental adere à metodologia do bloco constitucional e, por essa ra- zão, novas interpretações surgem a partir da leitura do texto constitucional. Para acompanhar esta leitura, é interessante iniciar o primeiro passo com a repartição de competências constitucionais em matéria ambiental. Agora que finalizamos, você está apto a realizar os exercícios desta aula. Fique atento a sua performance e frequência nas atividades!
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