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Didática do Ensino Superior Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Dr.ª Rita Maria Lino Tarcia Prof.ª Me. Jane Garcia de Carvalho Prof.ª Me. Júlia de Cássia Pereira do Nascimento Revisão Textual: Prof.ª Me. Selma Aparecida Cesarin 5 Nesta unidade, trabalharemos os seguintes tópicos: • Quem atua como docente no Ensino Superior? • O que é “DIDÁTICA”? • Para ensinar, basta só saber? • Exercício da Docência no Ensino Superior • Saberes Necessários aos Professores Fonte: iStock/Getty Im ages · Refletir sobre aspectos referentes à docência universitária e à Didática neste nível de ensino que deverão estar bem claros em seu futuro trabalho. Aqui estamos novamente com a disciplina Didática do Ensino Superior, para nesta unidade discutirmos o tema Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade. Esta unidade é muito importante, pois vamos refletir sobre aspectos referentes à docência universitária e à didática neste nível de ensino que deverão estar bem claros em seu futuro trabalho. Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade 6 Unidade: Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade Contextualização Quem é o docente do Ensino Superior? Por que falamos em identidade e não somente em formação? [...] Daí a necessidade – a urgência mesma – da análise de algumas destas condições no hoje brasileiro, ao discutirmos o papel do professor universitário como educador. Hoje, mais do que ontem, a sociedade brasileira reclama de seu professor universitário sua identificação com o educador. O professor se faz educador autêntico na medida em que é fiel a seu tempo e a seu espaço. Sem esta fidelidade, mesmo bem intencionado, se compromete sua atividade formadora. É que não pode haver formação do educando se o conteúdo da formação não se identifica com o clima geral do contexto a que se aplica. Seria antes uma deformação. [...] (FREIRE, in ROMÃO,2008, p. 140-141). Reflita sobre o trecho de um texto de Paulo Freire sobre o educador. Você acha que isto só se aplica aos professores da Educação Básica? Pense bem, será que o professor universitário não educa? Leia o texto na íntegra acessando o link a seguir. Disponível: http://goo.gl/aAkQhp 7 Quem atua como docente no Ensino Superior? O perfil do docente no Ensino Superior difere daquele encontrado entre professores que atuam na Educação Básica. A formação acadêmica de parte considerável dos professores do Ensino Superior não levou em consideração a possibilidade da docência, ao não discutir aspectos didático-pedagógicos importantes. Encontramos médicos, advogados, dentistas, engenheiros e outros profissionais que começam na docência superior após o preenchimento de uma ficha de identificação, passando assim a atuar simultaneamente no Ensino Superior e como profissional das áreas específicas. Segundo Pimenta e Anastasiou (2005), o título de professor Universitário acompanhado da profissão que exerce, traz a este profissional certo status social, o que não acontece quando o título “professor” aparece sozinho. Pimenta e Anastasiou (2005) relatam pesquisas que envolvem a profissionalização dos professores Universitários. O processo de socialização acontece de diversas formas, a indutiva é uma delas, ou seguindo a rotina de outros, ou mesmo a autodidata, o que apesar de positiva é insuficiente. Ao tratar de modelo de Ensino Universitário, é comum professores repetirem experiências vivenciadas em sua própria formação. Podemos afirmar por nossa experiência docente, tanto no Ensino Fundamental quanto no Ensino Superior, que a formação inicial e a continuada do professor são fatores importantes na definição da sua didática e prática pedagógica. Pesquisas internacionais como a da UNESCO apontam que a maioria dos professores que atuam na Educação Superior não estão preparados pedagogicamente. Procurando acompanhar esses profissionais em suas trajetórias, muitas Universidades investem na capacitação de seus docentes para atuação pedagógica. A didática e a prática de ensino construíram uma trajetória histórica e iremos brevemente recordar alguns conceitos importantes desse processo. O que é “DIDÁTICA”? O vocábulo “didática” deriva da expressão grega Τεχνή διδακτική (techné didaktiké), que se traduz por arte ou técnica de ensinar. A Didática é entendida como a arte ou técnica de ensinar. Difundiu-se com o aparecimento da obra de Jean Amos Comenius (1592 – 1670), “Didactica Magna”, ou “Tratado da Arte Universal de Ensinar Tudo a Todos”, publicada em 1657. Todo docente precisa conhecer esta Ciência, cujo objetivo fundamental é a reflexão sistemática do processo ensino-aprendizagem, as estratégias de ensino, as questões práticas relativas à metodologia e as estratégias de aprendizagem. Portanto, desenvolver a arte de ensinar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas ou habilidades. (FREIRE, Paulo) 8 Unidade: Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade Podemos encontrar diferentes definições para Didática. Didática Didática é uma re�exão sistemática sobre o processo de ensino-aprendizagem que acontece na escola e na aula, buscando alternativas para os problemas da prática pedagógica. Arte de ensinar e de fazer aprender. Conjunto de preceitos que tem por �m tornar o ensino prático e e�ciente. Ciência auxiliar da pedagogia que promove os métodos mais adequados para a aprendizagem. Didática é o estudo da situação instrucional, isto é, do processo de ensino e aprendizagem, e nesse sentido ela enfatiza a relação professor-aluno. http://michaelis.uol.com.br/ moderno/portugues/index.php? lingua=portuguesportugues &palavra=didática. Acesso em julho de 2009. http://www.priberam.pt/dlpo/ de�nir_resultados.aspx. Acesso em julho 2009. MASETTO, Marcos Tarciso. Didática: a aula como centro. 4. ed. São Paulo: FTD, 1997, p.13 Fonte: TARCIA, Rita, 2009. Má formação escolar Escolas negligentes que se preocupam com coisas super�ciais Estudo de coisas uteis para a vida Estudo completo de cada assunto sem separação Enraizar a ideia Despertar interesse e dar uma ideia geral antes de ensinar Fazer com que o aluno tire conclusões próprias e não decore opiniões alheias Separação do conteúdo em partes, melhorando o aprendizado Aperfeiçoamento dos conhecimentos anteriores. “Boa base” Que tudo seja ensinado a partir das causas. Todos os conteúdos interligados Progressão do mestre e treinamento dos alunos com problemas e exercícios Conteúdos interligados. Dependência entre as partes do início ao �m Esquecimento dos alunos que não possuem contato com o conteúdo SoluçõesCausas Fonte: TARCIA, Rita, 2009 Obs.: Com relação ao quadro acima, não nos responsabilizamos por erros gramaticais/ ortográficos. A escrita é de responsabilidade da autora do material. 9 Sintetizando, poderíamos dizer que ela funciona como o elemento transformador da teoria na prática. Comênio (1592) dedicou sua vida acadêmica inteiramente à promoção da paz e à igualdade de direitos de aprendizagem para todos, tornando-se o precursor do pensamento moderno sobre a Pedagogia (final do século XVII). Ele buscou um método para ensinar de forma mais rápida e segura, pois pretendia tornar a aprendizagem eficaz e atraente, mediante cuidadosa organização, em que ele próprio se empenhava na elaboração de manuais didáticos que iria uniformizar o conhecimento a ser transmitido, como também a língua em que esse fosse veiculado, o que é uma novidade na época. A ideia defendida é que o ponto de partida da aprendizagem deve ser o conhecido, do simples para o complexo, do concreto para o abstrato, em que o verdadeiro estudo parte do “livro da natureza”. Processo seguro e excelente de instruir, em todas as comunidades de qualquer reino Cristão, cidades, aldeias, escolas tais que toda juventude de um ou outro sexo, sem excetuar ninguém em parte alguma, possa ser formada nos estudos, educada nos bons costumes, impregnada depiedade, e desta maneira, possa ser, nos anos da puberdade, instruída em tudo que diz respeito à vida presente e futura, com economia de tempo e de fadiga, com agrado e com solidez (COMÊNIO, 1997, p.43). Jean-Jacques Rousseau (1712) Propõe uma nova concepção, baseada nas necessidades e interesses dos alunos, o que modi�ca o pensamento sobre a didática. As ideias de Comênio ajudam outros a pensar sobre novas alternativas. Com o desenvolvimento da sociedade, surge a necessidade do ensino, planejado e elaborado. Surge a instituição escolar Necessidade de pensar sobre o ensino Fonte: TARCIA, Rita, 2009 A necessidade de estabelecimento de caminhos constrói as bases para Herbart, no século XIX, criar a Pedagogia Científica, designando passos formais para o ensino. Segundo Pimenta (2005), Herbart, dando ênfase ao método, distancia-se de Rousseau, que dá ênfase ao sujeito que aprende. 10 Unidade: Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade Herbart (1776) – Pedagogia Científi ca Inspirador da Pedagogia Conservadora. A escola precisa introduzir ideias corretas na mente dos alunos; A moralidade é atingida por meio da educação; Aponta o caminho didático a ser seguido. Os interesses dos alunos são determinados por professores e instituição; Aquisição do conhecimento pela direção do professor; Fonte: TARCIA, Rita. 2009 Para Herbart, o professor deveria percorrer passos formais como: clareza na exposição, associação dos conhecimentos novos com os anteriores, sistema e método. Herbart retoma as ideias do método único de Comênio. As ideias de Rousseau, questionadas por Herbart e seus seguidores, é a base da “Escola Nova”, que questiona o método único, de acordo com Pimenta e Anastasiou: Amplamente desenvolvido na primeira metade do século XX, o movimento escolanovismo enfatizava o aprendiz como agente ativo da aprendizagem e a valorização dos métodos que respeitassem a natureza da criança, que a motivassem, que a estimulassem a aprender (Pimenta e Anastasiou, 2005, p. 45). Algumas vertentes apontavam para as diferenças individuais, tendo como referência a Psicologia. Uma das explicações para o fracasso escolar eram as diferenças individuais, ou seja, a criança não tinha sucesso em sua aprendizagem por sua própria natureza. Assim, a responsabilidade sobre a aprendizagem não recaía sobre a didática, os métodos, ou o relacionamento entre professores e alunos; podemos dizer que nesta perspectiva o professor cumpre seu papel e se os alunos não aprendem é uma questão de natureza individual. Segundo Libâneo (1990), a escolanovista está centrada na Psicologia e nas leis do desenvolvimento biológico. A Pedagogia é tratada como teoria da educação e a Didática refere-se à teoria do ensino, ligada à Pedagogia, ambas restritas a métodos e procedimentos. O desenvolvimento tecnológico dos anos 60 traz uma nova dimensão à Didática, que se resumiria em “formas de ensinar”. De acordo com Pimenta (2005), não cabe à Didática questionar os fins do ensino; trata- se de um instrumental impregnado nos cursos de licenciaturas, criando alguns mitos como: os alunos veem a Didática como uma forma de adquirir técnicas para ensinar bem seus alunos; muitos docentes concebem a Didática como a teoria do ensino, aquela que instrumentaliza para profissão; consideram a Pedagogia e a Didática como campos restritos a questões de aprendizagem de crianças e adolescentes. Pimenta e Anastasiou atribuem outras perspectivas à Didática. 11 Nessa perspectiva de ensino como fenômeno complexo e do ensinar como prática social, a tarefa da didática é a de compreender o funcionamento do ensino em situação, suas funções sociais, suas implicações estruturais... ajudar a criar respostas novas [...] (PIMENTA & ANASTASIOU, 2005, p. 49). Ao analisarmos a evolução da Didática, podemos notar que de acordo com o contexto, a sociedade e as ideias defendidas em cada época, muda-se o conceito de Educação e, portanto, também o de Didática. Em 1930, vivia-se o conservadorismo, a Didática utilizada focava a educação no professor e na aula, direcionando a exigência da aprendizagem apenas para o aluno. Utilizavam-se conteúdos tradicionais, com memorização e aplicação de provas para atribuição de notas. Em 1970, utiliza-se a Didática para garantir a aprendizagem, com ênfase na elaboração dos planos de ensino e seleção de conteúdos. Hoje, nosso compromisso educacional é com a qualidade cognitiva das aprendizagens. O professor deixa de ser transmissor de conhecimento para tornar-se mediador da preparação dos alunos para o pensar. Vamos discutir e analisar a importância da Didática na formação e na atuação como professor universitário. Segundo Pimenta (2005), pesquisadores de vários campos do Conhecimento acabam por adentrar no campo da docência no Ensino Superior. Como decorrência natural de suas atividades, traz consigo enorme experiência e conhecimentos em suas áreas de atuação; porém, não há reflexão sobre o que vem a ser professor. Por outro lado, as instituições não se responsabilizam por esta adequação profissional, sendo assim, ela ocorre “naturalmente”, de acordo com experiências vivenciadas por estes professores, quando eram alunos ou mesmo pela influência de outros professores que já atuam neste nível de ensino. Que tipo de ensino desenvolvemos como docentes universitários? Devemos sempre nos lembrar das quatro perguntas básicas em relação ao ensino que vamos desenvolver e que nos permitem aplicar uma prática docente contextualizada e eficiente. • O que ensinar? • Como ensinar? • Para que ensinar? • Para quem ensinar? Dependendo da postura e da visão que o professor tem de Educação, de ensino e de seus alunos, ele desenvolverá uma Didática diferenciada. Por este motivo, é muito importante que você construa uma identidade docente que permitirá complementar sua formação, para além de conteúdos e técnicas. Esta postura fará de você um professor diferenciado. 12 Unidade: Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade A mudança de paradigma do professor, de transmissor para mediador do Conhecimento, pede-nos um trabalho mais elaborado, crítico e voltado para uma prática docente que se relacione com a prática social e promova a aprendizagem dos alunos em forma de descoberta, apreensão, modificação de comportamentos e aquisição de conhecimentos. Segundo Zaballa (1998), ensinar envolve estabelecer uma série de relações, que devem levar o aluno à própria elaboração de representações pessoais sobre o objeto de aprendizagem. Para o autor, a aprendizagem é pessoal; mesmo possuindo elementos compartilhados, ela não acontece de forma uniforme e por este motivo a atuação do professor deve ser diversificada. Para o autor, a atividade ou exercício “solto”, por melhor elaborado que seja, não tem propósito se não houver conexão com o que o aluno já sabe e o novo conteúdo. Atividades devem envolver um processo mental interno com o conhecimento já existente e o novo conteúdo. A atividade que gera um processo mental e que dá origem à aprendizagem com significado é aquela que mobiliza os alunos à necessidade de fazer perguntas. Assim, o conhecimento deixa de ser o principal elemento dentro da sala de aula, como acontece no ensino tradicional. A aprendizagem significativa do aluno passa a ser a principal tarefa a ser desempenhada pelo professor. Na análise social, muitas vezes as aulas não passam de “palestras”. O professor dirigindo a aula e os alunos ouvindo e procurando entender os elementos essenciais. Ao olharmos nesta perspectiva, devemos ter a consciência de que as aulas ministradas por professores na Universidade não podem ocorrer sem interação do estudante. A forma expositiva de “ensinar” leva o professor a ter sua tarefa cumprida após a exposição e fixação do conteúdo. Ensinando desta maneira não está conectada a ação de aprender. Na citação de Reboud, podemos confirmar esta prática. O aluno registra palavras ou fórmulas sem compreendê-las, repete-assimplesmente para conseguir boas classificações ou para agradar ao professor (...) habitua-se a crer que existe uma “língua do professor”, que tem de aceitar sem a compreender, um pouco como a missa em latim (...) O verbalismo estende-se até às matemáticas; pode-se passar a vida inteira sem saber por que é que se faz um transporte em uma operação; aprendeu-se, mas não se compreendeu; contenta- se em saber aplicar uma fórmula Mágica (REBOUL, 1992 apud PIMENTA, 2005, p. 208). Segundo Pimenta (2005), a ação de ensinar é definida na relação com a ação de aprender. Assim, a intencionalidade do ensino desencadeia necessariamente a ação de aprender. Libâneo (1990), na relação entre o ensinar do professor e o apreender do aluno, aponta como ação docente: • Clareza dos objetivos a serem alcançados; • Seleção e organização dos conteúdos; • Definição do nível de aprendizagem que seu aluno possui; • Definições metodológicas, que seriam os caminhos para chegar a determinado fim. Não podemos ter como parâmetro a nossa formação ou a formação que desejamos que o aluno tivesse, e sim a formação do aluno real. Se pensarmos nas aulas, podemos afirmar que, segundo Pimenta (2005), o aprender significa “tomar conhecimento de, reter na memória mediante o estudo, a 13 observação ou a experiência”, em direção do aprender do latim apprehendere, que significa: “segurar, agarrar, prender, pegar, assimilar mentalmente, entender, compreender”. A autora afirma: “É necessário rever o conceito de “assistir às aulas”, pois a ação de aprender não é passiva. Exige informar-se, exercitar-se, instruir-se”. A Didática é uma das áreas da Pedagogia, que investiga os fundamentos, as condições e os modos de realizar a Educação por meio do Ensino. Não podemos esquecer que o Ensino sempre está historicamente situado. Hoje não procura criar métodos e técnicas válidos para qualquer tempo e lugar. Ela nos ajuda a entender as novas demandas que a atividade de ensinar produz e assim aprender com elas, encontrar respostas, criar novos modos de atuar nos âmbitos escolares, auxiliando, assim, o trabalho dos professores. A Didática aponta para várias finalidades de Ensinar de diversos pontos de vista. Para ensinar, basta só saber? Você já ouviu falar de transposição didática? A transposição didática é entendida como um processo no qual “Um conteúdo do saber que foi designado como saber a ensinar sofre a partir daí, um conjunto de transformações adaptativas que vão torná-lo apto para ocupar um lugar entre os objetos de ensino. O trabalho que transforma um objeto do saber a ensinar em um objeto de ensino é denominado de Transposição Didática” (CHEVALLARD, 1991 apud PINHO, 2001, p. 174). É preciso que o docente do Ensino Superior pense no Ensino que vai desenvolver, com perguntas básicas como “Que matéria devo dar?”, “Qual programa devo seguir?” ou ainda “Quais critérios deverei utilizar para aprovar ou reprovar os alunos?”. Mas, muito importante é sua preocupação com a aprendizagem dos alunos, direcionando suas perguntas para outro foco: “Quais são as expectativas dos alunos?”; “Em que medida determinado aprendizado será significativo para os alunos?” ou “Que estratégias serão mais adequadas para facilitar o aprendizado desses alunos?”. Percebam que quando pensamos na aprendizagem, nossos questionamentos são diferentes e nossas ações serão diferentes. Verificamos que no “Processo de Ensino”, as ações estão centradas na figura do professor. Ele promove todas as ações para que o processo se complete e cabe ao aluno receber, absorver (ou não) e reproduzir. A não reprodução significaria que não houve aprendizagem. No “Processo de Aprendizagem”, o aluno é o sujeito do processo e o professor auxilia. O sujeito é, na verdade, o aprendiz, que pode ser tanto o aluno quanto o professor. Por isso, ensino é diferente de aprendizagem, porque as perspectivas e as ações são diferentes nos dois processos. 14 Unidade: Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade No Ensino Superior, além de focarmos na aprendizagem, devemos ter uma atenção especial ao “para quem”. Quem é este aluno? O aluno do Ensino Superior é um adulto. As características gerais de uma pessoa adulta são: o espírito independente e a capacidade de autogestão da aprendizagem; a necessidade de ver sentido prático naquele conteúdo a ser abordado e uma rica bagagem de experiências. Portanto, as estratégias didáticas ao se lidar com adultos devem ser elaboradas a partir da análise destas características. O docente do Ensino Superior deve desenvolver em sua formação competências que o permitam entender as especificidades do trabalho desenvolvido com adultos, sem esquecer a importância de sua postura e da didática por ele desenvolvida. Para os adultos, o motor da aprendizagem é a superação de desafios, a resolução de problemas e a construção do conhecimento novo, que se dá tomando por base todos os conhecimentos e experiências prévias dos indivíduos. Sendo assim, o processo de educação de adultos, visando à sua aprendizagem, pressupõe a utilização de metodologias ativas de ensino-aprendizagem que proponham concretamente desafios a serem superados, que lhes possibilitem ocupar o lugar de sujeitos na construção dos conhecimentos e que coloquem o professor como facilitador e orientador desse processo. Ou seja, a educação de adultos exige uma pedagogia basicamente interativa. Adultos se sentem motivados a aprender quando entendem as vantagens e benefícios de um aprendizado, bem como as consequências negativas de seu desconhecimento. Devido a toda uma cultura de ensino na qual o professor é o centro do processo de ensino-aprendizagem, muitos adultos ainda precisam de um professor para lhes dizer o que fazer, mas a maioria deles prefere participar do planejamento e execução das atividades educacionais. As motivações mais fortes nos adultos são internas, relacionadas à satisfação pelo trabalho realizado, melhora da qualidade de vida, elevação da autoestima. Um programa educacional, portanto, terá maiores chances de bons resultados se estiver voltado para estas motivações pessoais e for capaz de realmente atender aos anseios íntimos dos estudantes. Para Freire (1999), o homem e a mulher são os únicos seres capazes de aprender com alegria e esperança, na convicção de que a mudança é possível. Aprender é uma descoberta criadora, com abertura ao risco e à aventura do ser, pois ensinando se aprende e aprendendo se ensina. A aprendizagem se processa nos adultos a partir de conexões com a realidade, suas necessidades e seus anseios e aplicabilidade do conteúdo aprendido. A partir das relações do homem com a realidade, resultantes de estar com ela e de estar nela, pelos atos de criação, recriação e decisão, vai ele dinamizando o seu mundo. Vai dominando a realidade. Vai humanizando-a. Vai acrescentando a ela algo de que ele mesmo é o fazedor. Vai temporalizando os espaços geográficos. Faz cultura (FREIRE, 1987, p.43). Segundo Oliveira (1999), uma das características do adulto é uma maior capacidade de reflexão sobre o mundo externo, sobre as outras pessoas, sobre si mesmo, sobre seu conhecimento e seu processo de aprendizagem. O adulto também tende a transferir mentalmente o conhecimento para a prática, conseguindo pensar onde poderá aplicar o que está aprendendo, ou seja, como utilizará o que foi aprendido no seu dia a dia, em sua realidade. 15 Nos Cursos Universitários, geralmente recebemos adolescentes como calouros e liberamos adultos como bacharelandos. Estamos, portanto trabalhando no terreno limítrofe entre a pedagogia e andragogia. Não podemos abandonar os métodos clássicos, de currículos parcialmente estabelecidos e professores que orientem e guiem seus alunos, nem podemos, por outro lado, tolher o amadurecimento de nossos estudantes através da imposição de um currículo rígido, que não valorize suas iniciativas, suas individualidades, seus ritmos particulares de aprendizado. Precisamos encontrarum meio termo, onde as características positivas da Pedagogia sejam preservadas e as inovações eficientes da Andragogia sejam introduzidas para melhorar o resultado do Processo Educacional (CAVALCANTI, 1999). O adulto é sujeito da Educação e não o objeto dela e o que faz com que ele aprenda é a motivação pessoal e a relação verificada entre os conteúdos aprendidos e sua vida pessoal e profissional. Aprende também quando se percebe participante principal do processo de aprendizagem, formulador de suas hipóteses, questionador e pesquisador, construtor do próprio conhecimento. Segundo Zacharias (2002): A importância do papel dos professores, enquanto agentes de mudança, é fundamental nesse processo. Eles têm um papel determinante na formação de atitudes, positivas e negativas, face ao processo de ensino – aprendizagem e a criação das condições necessárias para o sucesso da educação formal e da educação permanente, pois já não basta que se limitem a transmitir conhecimentos aos alunos, têm também que ensiná-los a pesquisar e a relacionar entre si diversas informações, revelando espírito critico. Devem despertar a curiosidade, desenvolver a autonomia, estimular o rigor intelectual, pois, só assim, estarão criando condições para o “saber aprender a aprender”, pilar fundamental para uma educação ao longo da vida. O que se espera então do docente do Ensino Superior? Em sua formação é importante que você perceba o tipo de docente que os alunos esperam encontrar no ES. Diferentemente da Educação Básica, o aluno espera participar ativamente de sua aprendizagem, com a mediação de professores participativos, que lhes proporcione uma aprendizagem significativa e os ajude a se prepararem para desenvolver o papel que lhes cabe na Sociedade e no mercado de trabalho. Podemos analisar três focos de professores universitários: • Os professores que temos: Hoje temos muitos professores que não dispõem de preparação pedagógica. Cultivam ainda a Educação tradicional, incentivando os alunos a desenvolverem habilidades de memorização e avaliando sua aprendizagem por meio da aplicação das provas e atribuição de notas. São especialistas na disciplina que ministram, centralizam o processo em si mesmos e em suas qualidades. Sua arte é a exposição e suas ações podem ser expressas pelos verbos: instruir, orientar, apontar, guiar, dirigir, treinar, amoldar, preparar, doutrinar; • Os professores que desejamos: Os alunos desejam professores que lhes permitam desenvolver a aquisição de mentalidade científica, o desenvolvimento das capacidades de análise, síntese e avaliação, bem como o aprimoramento da imaginação criadora. Esses são professores facilitadores de aprendizagem, que constroem e auxiliam na construção de conhecimentos, pois adotam estratégias de ensino diversificadas que permitem mobilizar menos a memória e mais o raciocínio. Os alunos desejam professores criativos, inventivos, curiosos, que utilizem conteúdo contextualizado, estabelecendo ligações entre a vida social, pessoal, cotidiana e universitária de seus alunos; 16 Unidade: Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade • Os professores que precisamos: Para atender a estes desejos, precisamos de professores que planejem estudos e trabalhos visando à formação do aluno; que orientem os alunos para verem e sentirem a realidade; que controlem os resultados dos estudos; que graduem dificuldades; que conheçam os alunos para estimulá-los para sua formação integral; que fomentem ideais e atitudes positivas diante da vida, da profissão e da sociedade e por fim que favoreçam a construção da autonomia intelectual. Exercício da Docência no Ensino Superior Uma das tarefas do professor é transformar os conteúdos científicos em conteúdos que o aluno consiga aprender. Não podemos confundir essa modificação do saber original em saber didático, como uma forma de simplificação. É importante que o professor conheça o que Chevallard chama de saber sábio, para que possa contextualizar uma situação parecida com a original para transformá-lo em saber didático. O objetivo do Ensino é sistematizar o saber científico, tomando-o ensinável, possibilitando a sua aprendizagem pelo aluno. Segundo Menezes (2006), os saberes podem ter origem: Epistemológica Porque diz respeito, essencialmente, a um saber produzido na comunidade científica, que deverá ser comunicado e socializado. O que o caracteriza, como ele se estrutura, de que forma ele foi desenvolvido; enfim, qual a sua epistemologia, quais são as questões centrais quando olhamos para o saber. Sociológica Porque é necessário considerar como o saber se constitui historicamente, qual a sua relevância em um determinado tempo e contexto históricos, quais os “desgastes” por ele sofrido, entre outros aspectos relevantes. Há pressão social para a comunicação dos saberes e para utilidade social deles. Psicológica Porque no universo da sala de aula o aluno deverá se apropriar desse saber e reconstruí-lo a partir das situações de ensino por ele vivenciadas. O saber a ensinar entrará em cena no jogo didático que envolve professor-aluno-saber e sofrerá, então, novas adaptações e deformações, passando a ser objeto de negociação dos parceiros da relação didática. 17 Saberes necessários aos Professores Aos professores não basta somente saber o conteúdo a ser ensinado. É preciso desenvolver outros saberes, tão importantes quanto o conhecimento específico. • Saberes na área do Conhecimento - São os saberes específicos da área de atuação. Ninguém ensina o que não sabe. • Saberes Pedagógicos - ensinar é uma prática educativa historicamente construída, que tem diferentes e diversas direções de sentido na formação humana. • Saberes Didáticos - Articulação da teoria com a prática social, ensinar em situações contextualizadas. • Saberes da Experiência - Em sua prática educativa, o professor terá condições de se aprimorar a cada dia. Porém, é preciso nos darmos conta de que ser professor vai além de dominar conhecimentos, saberes ou fazeres de determinado campo, envolve atitudes e valores que têm por meta o desenvolvimento do aluno como pessoa e profissional, tais como: • Sensibilidade frente ao aluno; • Valorização dos saberes da experiência; • Ênfase nas relações interpessoais; • Aprendizagem compartilhada; • Ensinar e aprender com os alunos. É preciso nos conscientizarmos de que a dimensão pedagógica envolve um processo interpessoal que nos permite, como grupo, construir conhecimento pedagógico compartilhado, envolvendo relações entre professores-professores, professores-alunos, instituição-comunidade. Além disso, é preciso entender a especificidade da Educação Superior. Nosso trabalho pressupõe fazermos a transposição didática, envolvendo a passagem do conhecimento científico para o acadêmico e deste para o profissional. Precisamos construir o mapa conceitual do conhecimento relativo a nossas disciplinas, aliado à sua aplicabilidade prática, a fim de que não seja trabalhado de forma fragmentada e mecânica, mas sim que possibilite aos alunos aplicá-lo em situações novas e imprevisíveis. Exercer a docência não é tarefa fácil. Daí a necessidade de formação e construção de uma identidade que nos dê bases cognitivas, ideológicas e socioculturais para exercê-la. A identidade é aquilo que nos diferencia das outras pessoas. É a nossa marca. Por isso, todo professor coloca em seu trabalho uma marca do que ele é, do que ele construiu ao longo de sua formação. Coloca um pouco daquilo que acredita, de suas concepções, ideologias, crenças, valores, atitudes. Não há como ser imparcial na Educação. Defendemos aquilo que acreditamos. Atenção, portanto, no exercício da docência. Atenção para o valor dado à sua formação, conhecimento e construção de sua identidade docente. É ela que vai marcar seu trabalho e permitir que você faça a diferença em sua vida e na vida e formação de seus alunos. 18 Unidade: Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade MaterialComplementar Livros: Competência Pedagógica do Professor Universitário Masetto, Marcos Tarciso. São Paulo. Editora Summus, 2003. Este livro nos traz informações e conhecimentos indispensáveis para o professor universitário. O autor, referência no assunto, mostra-nos de maneira clara as competências necessárias para o melhor desempenho da função docente. Leia todos os capítulos; porém, você também pode procurar assuntos específicos sobre o trabalho do docente no Ensino Superior. Sites: O site do MEC é um site de referência para o professor universitário. Procure conhecer os diferentes links, especialmente os links referentes à Educação Superior e a formação de professores. Acesse também o link sobre Legislação Educacional. www.mec.gov.br Leituras: Docência Na Universidade: Ensino E Pesquisa PIMENTA, Selma G. “A problemática profissional do professor do ensino superior precisa ser considerada tanto no que se refere à identidade, que diz sobre o que é ser professor, quanto no que se refere à profissão, que diz sobre as condições do exercício profissional. O que identifica um professor? E um professor universitário?” A autora inicia o artigo com o trecho acima, já chamando nossa atenção para sua proposta de nos levar a refletir exatamente sobre o assunto de nossa Unidade. http://goo.gl/80LcTu 19 Referências COMENIUS, J. A. Didática Magna: Tratado de Ensinar Tudo a Todos. (trad.) Ivone C. Beneditti. São Paulo: Martins Fontes, 1997. HOLANDA, Aurélio Buarque. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da Língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 1990. MENEZES, A. A.B. Tese de Doutorado - Inter-Relações entre os Fenómenos Didáticos. 2006. PIMENTA S.G.; Anastasiou L. G. C. Docência no ensino superior. São Paulo: Cortez, 2005. PINHO ALVES, J. Regras da Transposição Didática aplicada ao Laboratório Didático. Caderno Catarinense de Ensino de Física, v. 17. n° 2. Agosto 2000. SACRISTÁN, J. G. Poderes instáveis em educação. (trad.) Beatriz Affonso Neves. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999. ZABALA. A. A prática educativa - como ensinar. Porto Alegre: Artmed. 1998. 20 Unidade: Docente do Ensino Superior: Formação e Identidade Anotações .
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