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João Vitor Freire – MEDUNIME 2019.1 Tuberculose No Brasil, a notificação de casos de tuberculose e obrigatória, realizada por meio de fichas padronizadas a partir das Unidades Básicas de Saúde para as Secretarias Estaduais, que as consolidam. O Ministério da Saúde agrupa essas informações que são analisadas e divulgadas por relatórios e boletins. Este sistema, apesar das limitações na comparabilidade e qualidade entre as Unidades Federadas, encontra-se consolidado desde 1981, possibilitando analises mais confiáveis desde então. O Brasil ocupa o 17º lugar entre os 22 países responsáveis por 80% do total de casos de tuberculose no mundo. Vale lembrar que a OMS estima em 30% a taxa de subnotificação ou ausência de diagnóstico. A julgar pelo número de notificações ao Ministério da Saúde, nos últimos 17 anos, a tuberculose apresentou queda de 38,7% na taxa de incidência e 33,6% na taxa de mortalidade. A distribuição por faixas etárias evidencia a maior concentração de casos entre 20 e 49 anos. As taxas de incidência também foram mais elevadas nos grupos acima de 20 anos, perfil que se manteve praticamente por toda a década de 1980 e 1990. Tem sido observado um declínio da doença em todas as faixas etárias, sendo a queda maior na de 0 a 4 anos, provavelmente relacionada à boa cobertura vacinal com BCG em todo o país, além do impacto das ações de diagnóstico e tratamento. A menor redução relativa foi na faixa acima dos 60 anos, podendo-se especular que a reativação endógena tenha um papel determinante. O impacto da coinfecção TB-HIV/aids, que teve sua maior importância nas grandes capitais e nas regiões Sudeste e Sul, tende a diminuir pela boa qualidade do programa nacional de controle do HIV/aids. Mortalidade: A mortalidade por tuberculose ainda é relativamente alta em nosso meio. Como se observa, mesmo com o impacto da coinfecção TB-HIV/aids, não aconteceu no país nenhum aumento exagerado da taxa de mortalidade, devendo para isso ter contribuído as qualidades dos programas de controles da TB e do HIV/aids, especialmente deste último. Etiologia: A tuberculose é uma doença infecciosa de evolução crônica que compromete principalmente os pulmões. O gênero Mycobacterium, único da família Mycobacteriaceae, uma forma de transição entre as eubactérias e actinomicetos, é constituído por bacilos retos ou ligeiramente curvos com dimensões que variam entre 0,2 e 0,6 μ por 1 e 10 μ, imóveis e não formadores de esporos ou cápsulas. As bactérias desse gênero são caracterizadas principalmente por apresentarem um tempo de geração longo, 3 horas para as espécies de crescimento rápido e 18 horas, em média, para as espécies de crescimento lento e serem resistentes à descoloração por solução contendo álcool e ácido. Essa característica, evidenciada pelo método de Ziehl-Neelsen, deve-se ao alto teor de lipídeos presente na sua cápsula, aproximadamente 60% do peso seco de grande importância para o reconhecimento do gênero. Com seu metabolismo voltado especialmente para a construção da cápsula que o protege dos agentes químicos, o M. tuberculosis cresce lentamente. Aeróbio, duplica sua população em 18 a 48 horas, dependendo da maior ou menor oferta de oxigênio, do pH do meio e acesso a nutrientes. É, entretanto, facilmente destruído por agentes físicos, como o calor, os raios ultravioletas da luz solar e radiações ionizantes. O M. tuberculosis não se apresenta livre na natureza, dependendo do parasitismo; transmite-se principalmente por via aérea, facilitada pela aglomeração humana. Tem uma baixa morbidade que, associada ao crescimento lento, provoca principalmente doença de curso lento e crônico em indivíduos com baixa imunidade, com destaque para a subnutrição. Por ser um aeróbio estrito para a maior parte das suas populações, infecta os pulmões e aí se localiza preferencialmente – a presença de oxigênio favorece sua multiplicação e a ligação do órgão com o meio externo facilita sua transmissão. Transmissão: Modelos concomitantes in vitro e in vivo, de atomização artificial de escarro, revelam que partículas maiores tendem a se depositar no chão, misturando-se com a poeira, enquanto as menores levitam no ar. Das que levitam, nem todas são contagiantes, apenas as que se ressecam alcançando um tamanho entre 2 e 10 micras e apresentam características aerodinâmicas semelhantes a dos gazes, a partícula núcleo ou gotícula núcleo de Wells. Tais partículas, com um ou dois bacilos viáveis, alcançam os alvéolos, onde os germes se implantam. Outras não ressecadas, com grumos de bacilos, depositam-se no trajeto da árvore brônquica e são eliminadas pelo sistema mucociliar, digeridas e eliminadas pelo sistema digestivo. Foram também estabelecidas as relações da comunicabilidade do bacilo entre o foco transmissor e seus contatos. A maior transmissibilidade do foco se relaciona à doença pulmonar (ou laríngea); à presença de cavidades, comuns nas formas de reativação; à maior carga de bacilos no escarro, expresso pelo número de cruzes no exame baciloscópico. A quantidade, o vigor e as características da tosse interferem na comunicabilidade. Gravações noturnas documentando a quantidade de tosses de bacilíferos e estudos de contatos infectados mostraram que a maior quantidade de tosse se relacionava ao maior número de infectados. Pacientes em melhor estado geral e nutricional tendem a apresentar tosse vigorosa, atomizando partículas com maior capacidade de transmissão do que aqueles em pior estado. A atomização das João Vitor Freire – MEDUNIME 2019.1 secreções para formar partículas contagiantes correlaciona-se, também, com as características físico-químicas da secreção. Escarros espessos e aderentes produzem menor quantidade de partículas infectantes, ao contrário dos mais fluidos. O tempo de exposição necessário para uma infecção bem- sucedida foi calculado por probabilidade, entre 100 e 200 horas, dependendo das características do foco e a intensidade do contato: quanto mais demorada a convivência, maior a possibilidade de transmissão, daí a necessidade de investigar os contatos mais próximos no rastreamento da doença. A proximidade (mesma cama, mesmo quarto, mesma casa) e o parentesco (mãe, pai, irmãos e outros parentes) guardam uma relação direta e estatisticamente significante com a infecção. Aglomerados urbanos, especialmente condições precárias de moradia, favorecem a maior prevalência da tuberculose. Infecção e doença são mais frequentes entre os contatos de baixa idade, os idosos, os portadores de doenças ou em condições imunossupressoras e os tuberculino-negativos. Com o advento da quimioterapia, observou-se que o tratamento interfere no contágio. A transmissão de pacientes para cobaias, em estudos experimentais, reduzia-se acentuadamente nas duas primeiras semanas de tratamento. Essa redução da transmissibilidade se daria pelo fato de serem eliminados pelo escarro tanto os bacilos como os medicamentos; nas gotículas ressecadas, estes últimos interferem na sobrevida e multiplicação dos bacilos aí localizados, impedindo o contágio. Outra explicação tenta justificar a redução pela diminuição rápida e acentuada da carga bacilífera, que cai para 5% já no segundo dia e para cerca de 0,5% após o 12º dia de terapia. Quanto, ao tratamento, pode-se concluir que a descoberta precoce dos doentes bacilíferos entre os sintomáticos respiratórios e outros grupos de risco e a introdução de um tratamento eficaz, além de curar o doente, reduzem o tempo de transmissão e quebram a cadeia epidemiológica da doença. Essas medidas constituem as bases de um efetivo programa de controle da tuberculose. Lesão inicial e Resposta Imunológica: As vias respiratórias são a principal porta de entrada do Mycobacterium tuberculosis.Uma vez inalados, a maioria dos bacilos fixa-se no trajeto bifurcado da árvore traqueobrônquica, especialmente quando em grumos, sendo eliminados pelo sistema de defesa mucociliar. Algumas partículas núcleos que se comportam como gases vencem essa barreira e localizam-se no trato respiratório inferior, especialmente no interior dos alvéolos onde, facilitadas por ambiente propício, com temperatura, umidade e aporte de substâncias nutrientes, multiplicam-se livremente, caracterizando a fase simbiótica ou de crescimento livre. A capacidade de o agente infeccioso sobreviver no pulmão dependerá de fatores relacionados à sua virulência e à habilidade das células do hospedeiro em eliminá-lo. É conhecido o papel dos macrófagos como células de 1ª linha na defesa contra o Mycobacterium tuberculosis. Esta resposta inicial, se completamente efetiva, causará a sua eliminação pela ação fagocítica de macrófagos alveolares. O bacilo poderá ser eliminado por vários mecanismos mediados por uma complexa interação entre macrófagos, linfócitos e citocinas. O processo envolvido na fagocitose inclui a ligação da bactéria ao macrófago, a internalização dentro do fagossoma e morte ou inibição do crescimento do bacilo. O controle sobre o crescimento bacteriano ou a lise do M. tuberculosis acontece com a fusão do lisossoma com o fagossoma, agora lisofagossoma, em que a bactéria sofre a ação dos grânulos liberados e de uma série de outros produtos tóxicos produzidos pelos macrófagos. Os mais importantes são o peróxido de hidrogênio, o ânio superoxido e óxido nítrico. A atividade do macrófago pode ser ampliada pela ação de citocinas que estimulam fagocitose, a capacidade lítica dos lisossomos e favorecem sua fusão ao fagossoma com destruição dos bacilos. Por seu lado, o M. tuberculosis desenvolve mecanismos de escape e defesa de maneira que possa romper a parede do fagossoma, crescendo livremente dentro do macrófago (parasitismo intracelular facultativo), inibir a fusão lisossomal e impedir novas fagocitoses. Um desses mecanismos estaria relacionado com a própria estrutura da parede bacteriana que produz substâncias que impedem a ligação do macrófago à bactéria. Se o macrófago alveolar não conseguir deter o microrganismo, por desconhecimento imunológico do bacilo ou depressão imunitária – definida pela resposta tuberculínica negativa –, haverá uma multiplicação bacilar com destruição celular e tecidual. Forma-se, então, uma resposta inespecífica com acúmulo local de polimorfos nucleares que fagocitam bacilos e, assim como chegam, retornam à corrente sanguínea com bacilos em seu interior estabelecendo uma disseminação hematogênica primária. João Vitor Freire – MEDUNIME 2019.1 Compreende-se aqui, uma das principais consequências da vacinação, qual seja, impedir o aparecimento de formas extrapulmonares da tuberculose, por estimular mecanismos imunológicos que evitam essa disseminação. Se os mecanismos de defesa iniciais não forem suficientes para conter o patógeno, a célula infectada rompe-se liberando os bacilos. Em indivíduos com sistema imunológico íntegro, ocorre um acúmulo de células, formado por macrófagos e linfócitos T ativados, na região do parênquima pulmonar em que os bacilos se instalaram, compondo o granuloma, responsável por conter a disseminação da bactéria. O mecanismo de formação do granuloma é muito importante nos primeiros dias após a infecção e resulta tanto da resposta do hospedeiro como pode ser estimulado pelo próprio agente agressor. A lesão inicial constitui o chamado cancro de inoculação. O sucesso desse mecanismo depende do número de macrófagos e de bacilos presentes no local da infecção. Se a resposta imunológica for ineficaz, os bacilos poderão deixar o interior dos macrófagos e disseminar para a corrente linfática até os linfonodos regionais. Os linfonodos hilares enfartam-se, constituindo o complexo primário tuberculoso, composto pelo cancro de inoculação, a linfangite e a adenomegalia hilar. Embora possa ser visível à radiografia de tórax, a maioria dos casos de infecção tuberculosa é clínica e radiologicamente inaparente, sendo um teste tuberculínico positivo o único indício da infecção bem-sucedida. A partir dos linfonodos hilares, os bacilos se disseminam para linfonodos paratraqueais e vertebrais e, via ducto torácico, alcançam a corrente sanguínea, podendo se alojar nas regiões superiores do pulmão ou em diversos órgãos, como rins, cérebro e ossos, ou onde encontrarem um ambiente favorável à sua implantação: satisfatória oferta de oxigênio associada a uma baixa perfusão local, dificultando o aporte de células de defesa. Indivíduos cuja resposta imunológica foi suficiente para conter o M. tuberculosis desenvolverão uma forma clínica de infecção caracterizada como infecção latente, em que os bacilos permanecerão nesse estado por tempo indeterminado (anos ou décadas), o que explicaria o aparecimento da tuberculose pulmonar ou extrapulmonar, quase sempre, como uma reativação de um foco primário contido em seu início. O risco do desenvolvimento da doença é maior nos primeiros dois anos após a infecção. Imunidade Mediada por Células: Os macrófagos também exercem uma importante função como células apresentadoras de antígenos em resposta à infecção pelo M. tuberculosis. Macrófagos ativados apresentam a linfócitos T antígenos bacterianos expressos em associação com as moléculas do complexo de histocompatibilidade principal. Moléculas da classe I e II são reconhecidos por linfócitos T CD8+ e T CD4+, respectivamente. Consequentemente, citocinas produzidas por células T ativadas modularão a função dos macrófagos. Fenotipicamente, células Th1 são caracterizadas, sobretudo, pela produção de interferon-gama (IFN-γ) e interleucina-2 (IL- 2), e sua função seria a ativação de outras células inflamatórias e fagocíticas responsáveis pela inibição do crescimento bacteriano. Células Th2 produziriam citocinas como IL-4, IL-5 e IL-10. Tanto as células Th2 como linfócitos T CD8+ parecem também exercer um papel de defesa, estimulando a destruição de macrófagos infectados com atividade inibida pelos bacilos (apoptose?) como produzindo grânulos bacteriostáticos e bactericidas, respectivamente. Além do IFN-γ, citocinas como a IL-12 e o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α) são considerados importantes na imunopatogênese da tuberculose. Resposta Inflamatória Com o surgimento da hipersensibilidade do tipo retardado, macrófagos infectados no interior do granulomas morrem. Os bacilos tendem a se localizar no centro do granuloma e a periferia torna-se fibrótica e caseosa. A necrose tecidual que ocorre na tuberculose tem alto teor de gorduras liberadas pelo metabolismo bacilar, apresentando um aspecto denso e espesso, conhecido como necrose de caseificação. À microscopia, observa-se que o granuloma alcança alto teor de células epitelioides e células gigantes multinucleadas. Embora o bacilo não consiga se multiplicar dentro do cáseo, em virtude da escassez de oxigênio, ele poderá permanecer viável por décadas. A natureza da resposta imunológica determinará se a infecção será contida ou progredirá. Quando o processo de defesa é bem-sucedido, constitui-se um equilíbrio parasito/hospedeiro, com bloqueio da proliferação bacilar e da expansão da lesão, impedindo o aparecimento da doença. Segundo essa concepção, a doença acontece quando: - na infecção inicial, devido a um número excessivo de bacilos e/ou fatores que diminuem a capacidade de resposta imune do hospedeiro. Nesse caso, o equilíbrio não chega a ocorrer e se estabelece uma tuberculose primária; - posterior à infecção inicial, uma forma de tuberculose pós- primária, pela quebra do equilíbrio parasita versus hospedeiro. Por reativação endógena,com rebaixamento da resposta imune local ou sistêmica e/ou provável aparecimento de cepas mutantes de bacilos mais virulentas com maior capacidade de multiplicação. Por reinfecção exógena, com um número excessivo de bacilos, associada ou não à imunodeficiência. João Vitor Freire – MEDUNIME 2019.1 A doença propriamente dita: Se na ocasião da primoinfecção não acontece o equilíbrio imunológico, os bacilos recém-implantados no parênquima pulmonar ou nos linfonodos continuam a se multiplicar, dando origem a lesões sintomáticas – a tuberculose primária. Geralmente tal forma primária assoma antes que se estabeleça a maturidade das defesas imunológicas. Sendo assim, estes pacientes podem ainda não ter concluído sua resposta de hipersensibilidade, tendo resposta negativa ao teste tuberculínico (fase pré-tuberculínica), podendo apresentar viragem em um novo teste posterior, o que caracteriza claramente a tuberculose primária. A existência de tuberculose pós-primária significa que a infecção pode progredir, independentemente da existência da imunidade. Existem duas vias para o novo episódio de tuberculose: por inalação de novos bacilos ou, na maioria dos casos, por meio de reativação do foco primário. Na reinfecção, a hipersensibilidade é a resposta predominante, acompanhada de necrose e caseificação. Na primoinfecção, 95% dos indivíduos conseguem bloquear a propagação das lesões, permanecendo os bacilos em estado de latência. Na tuberculose pós-primária, a forma pulmonar é a mais comum. Disseminação linfática poderá ocorrer, mas, nesse caso, os linfonodos hilares não são afetados. A resposta à multiplicação dos bacilos provoca necrose caseosa, que amolece e se liquefaz. Os mecanismos da liquefação, conforme referido, estão provavelmente relacionados às enzimas produzidas por estímulo da hipersensibilidade. De tal modo que, quanto maior a hipersensibilidade, maior a capacidade de liquefação das lesões e maior a destruição tecidual. Os bacilos até então inibidos no seu desenvolvimento pela formação do granuloma encontram condições favoráveis à sua multiplicação após liquefação do cáseo e o aparecimento da cavidade, com um rápido crescimento das populações bacilíferas em que se estima uma carga de mais de 108 bacilos. O desenvolvimento para a formação de lesões cavitárias pulmonares (caverna tuberculosa) caracteriza a tuberculose pós--primária e dela pode se propagar material infeccioso diretamente para dentro dos brônquios, resultando em contínua eliminação de escarro. Os limites entre a infecção e a doença: Haveria a tuberculose infecção marcada pela presença da resposta positiva ao teste tuberculínico e ausência de sintomas e/ou lesões progressivas que caracterizam a tuberculose. O tratamento da infecção latente, indicado para os recém- infectados, rastreados entre os grupos de riscos, protegeria o adoecimento primário, entendido como aquele que ocorre nos primeiros anos após a infecção, predominante nestes países. Para os portadores da doença, a indicação de esquemas quimioterápicos associando drogas potentes, além de curá-los, abortaria a transmissão dos bacilíferos nas primeiras semanas de tratamento. Diagnóstico: A abordagem do paciente com suspeita de tuberculose deve iniciar-se com anamnese completa em que se buscará a presença dos sintomas clássicos e de outros elementos que auxiliem no diagnóstico. O exame físico, além dos achados sugestivos da doença, permitirá a descoberta de sinais de possíveis doenças concomitantes, fato não raro na tuberculose. O auxílio diagnóstico laboratorial tem, no encontro do bacilo, sua mais importante contribuição, devendo ser sempre a preocupação primeira do médico. Provas indiretas, em especial a radiografia, são de grande valia quando o bacilo não pode ser encontrado. Através da coleta de escarro induzido, cultura de escarro e broncofibroscopia com biópsia transbrônquica tm-se como diagnosticar se o indivíduo possui ou não tuberculose. Métodos mais modernos, como a leitura radiométrica de culturas em meio líquido e a técnica da reação em cadeia da polimerase, têm se mostrado bastante úteis, mas ainda estão restritos a poucos centros. Quadro Clínico: Sendo a tuberculose uma doença de evolução crônica ou subaguda, os sintomas tendem a ser indolentes e de intensidade crescente, podendo apresentar períodos de remissão e relativo bem-estar. Assim, em aproximadamente 66% dos pacientes, a demora para a procura por assistência médica chega a até três meses. • Sintomas Respiratórios: - Tosse: Na tuberculose pulmonar, a tosse está presente em praticamente todos os pacientes. Resulta do estímulo causado pelo processo inflamatório alveolar ou pelo comprometimento granulomatoso das vias aéreas. No início, é seca, podendo tornar-se produtiva com expectoração mucosa ou purulenta, geralmente em pequena quantidade, e, às vezes, com sangue. É menos observada na forma pleural da doença. A recomendação programática para rastreamento da doença na comunidade é a de realização de exame baciloscópico em pessoas que apresentam tosse produtiva e persistente por três ou mais semanas. - Hemoptise: O volume do sangramento é variável, podendo manifestar-se tanto como estrias misturadas ao escarro (hemoptoicos), ou como hemoptise maciça, felizmente rara. As hemoptises volumosas aparecem, geralmente, na presença de cavidades decorrentes da existência dos aneurismas de Rasmussen, terminações livres de artérias dentro desses espaços. É possível haver sangramento, mesmo em pequenas lesões, durante a formação das cavidades, quando a hemoptise poderá ser a primeira manifestação da doença, - Dispneia: Em virtude da destruição global do parênquima pelo processo inflamatório da tuberculose, envolvendo alvéolos e vasos, não há grandes alterações na relação ventilação-perfusão, exceto nas atelectasias, nas grandes cavidades e nas lesões com grande componente inflamatório agudo. Dessa forma, a dispneia é um sintoma pouco comum, aparecendo, sobretudo, nas lesões avançadas como consequência à restrição causada pelo padrão fibrótico da doença, ou pela presença de derrame pleural ou pneumotórax. Na forma miliar, a dispneia é frequente em função do comprometimento intersticial difuso, com consequente hipoxemia. Padrão obstrutivo pode ser observado quando há doença das vias aéreas ou pela hiper-responsividade brônquica que parece acompanhar a tuberculose e suas sequelas. - Dor torácica: Surge quando há comprometimento da pleura. Como o processo patológico da tuberculose tem início no alvéolo, em situação muito próxima da superfície pleural, este João Vitor Freire – MEDUNIME 2019.1 sintoma é precoce e relativamente frequente. Em geral, de pequena intensidade, desaparece com o tratamento eficaz. - Rouquidão: Ocorre nas formas da doença com comprometimento de laringe, frequentemente associada à forma pulmonar, quase sempre despercebida e pouco relatada. • Sintomas Gerais: - Febre e Sudorese: Acredita-se que a multiplicação bacilar, fenômeno que pode acontecer dentro ou fora do macrófago, ocorra de forma mais intensa no pico plasmático do cortisol, ao redor das 11 às 12 horas (ritmo circadiano). As consequências são morte e ruptura do macrófago, seguidas da liberação do seu conteúdo para o tecido, com início do processo inflamatório. Provavelmente por isso, a característica da febre seja de ocorrência vespertina. Em função da lenta multiplicação do M. tuberculosis, quando comparada à dos germes inespecíficos, o processo inflamatório também não será muito intenso, determinando temperaturas não muito altas. A resposta orgânica à febre, para a manutenção da temperatura corpórea, é a sudorese noturna. Em circunstâncias em que há disseminação hematogênica maciça ou endobrônquica,a febre pode ser alta, acompanhada de calafrios e não respeitar o horário clássico. -Perda Ponderal: Anorexia e perda ponderal são fenômenos frequentes, aparecendo em cerca de 69% dos casos. A perda ponderal é proporcional ao tempo de existência e à extensão da doença. • Exame Físico: Os sinais físicos na tuberculose são proporcionais à extensão do processo, ao tempo de duração da doença e à sua forma de apresentação. Dessa maneira, quanto maior a duração da doença, mais serão evidentes os sinais de consumpção, como emagrecimento e palidez. Quanto aos sinais específicos, a extensão e a forma da doença no parênquima pulmonar serão os determinantes dos achados. Estertores na região das lesões, geralmente apicais e posteriores, sibilos e roncos no comprometimento brônquico, propedêutica de condensação nas formas de pneumonia caseosa, diminuição do murmúrio e da broncofonia quando o derrame pleural está presente, além do clássico sopro anfórico nas cavidades, formam o elenco de achados mais comuns. Hepatoesplenomegalia pode ocorrer nas formas disseminadas. Diagnóstico por imagem: A radiologia contribui de maneira fundamental para o diagnóstico de qualquer pneumopatia. Na tuberculose, a radiografia de tórax constitui-se no melhor preditor da doença. - Tuberculose Primária: Mais comumente encontrada na criança, pode se apresentar como: 1) opacidade parenquimatosa; 2) linfonodomegalia; 3) derrame pleural; 4) atelectasia; e 5) doença miliar. Caracteriza-se por consolidação, com mais frequência, nos lobos inferiores ou até mesmo atelectasia segmentar ou lobar. Costuma ser homogênea e, por vezes, contém broncogramas aéreos no seu interior, podendo ser confundida com pneumonia bacteriana. Nos adultos, esses padrões radiológicos superpõem-se com as apresentações da doença pós-primária, dificultando, na maioria das vezes, a distinção entre as duas formas. Em dois terços dos casos, a lesão parenquimatosa resolve-se sem sequelas radiológicas. No terço restante, uma cicatriz calcificada, conhecida como foco de Ghon, pode ser encontrada. Quando acompanhada por linfonodo hilar calcificado, forma o chamado complexo de Ranke. Focos pulmonares secundários calcificados e apicais são denominados focos de Simon. - Tuberculose pós primária: Nesta forma também conhecida como reativação, o quadro radiológico tem as seguintes apresentações: 1) opacidade parenquimatosa e cavidade; 2) doença de via aérea; 3) doença pleural; e 4) tuberculoma. Em nosso meio, um estudo demonstrou que o infiltrado pulmonar constitui-se na manifestação radiográfica mais frequente da tuberculose pulmonar. A cavidade é de raro aparecimento de modo isolado, geralmente associado às lesões do tipo infiltrado do parênquima pulmonar. O derrame pleural, nódulo isolado de pulmão, linfonodomegalia mediastinal e padrão miliar são manifestações menos comuns. As manifestações típicas radiológicas da reativação da tuberculose são as opacidades heterogêneas localizadas nos segmentos superiores e posteriores dos pulmões, com tendência à cavitação. Estas lesões típicas, como relatam os antigos tisiologistas, se organizam de forma piramidal com ápice apontado para a região hilar: “lesões que olham para o hilo”. Lesões cavitárias surgem como resultado da drenagem brônquica de material caseoso proveniente de necrose do parênquima pulmonar. Em geral, são múltiplas e o tamanho pode variar de poucos milímetros a vários centímetros de diâmetro. Tratamento: O tratamento da tuberculose é fundamentalmente quimioterápico. Quanto à farmacologia, dois pontos devem ser considerados: a farmacodinâmica, ou seja o mecanismo e o sítio de ação dos tuberculostáticos sobre o bacilo; e sua farmacocinética ou, como se processa a interação da droga com o organismo, como é administrada, absorvida, metabolizada, qual sua biodisponibilidade e como é eliminada. Em outras palavras, como a droga age sobre o organismo (farmacodinâmica) e como o organismo reage à droga (farmacocinética). De maneira geral, as drogas antituberculosas atuam por interferência no sistema enzimático ou no bloqueio na síntese proteica. Podem ser bactericida ou bacteriostática, intra ou extracelular dependendo de como agem sobre os bacilos, com um maior ou menor poder de esterilização, relacionado à rapidez e amplitude com que atuam sobre as diversas populações bacilíferas, destacando-se, nesse papel, a RF. Quanto ao sítio de ação, relacionado ao metabolismo celular, algumas drogas atuam no âmbito do DNA, como os quinolônicos que bloqueiam a DNA-girase responsável pelo enrolamento das cadeias, ou a RF que bloqueia a RNA- transferase, no momento da replicação do DNA, quando este informa por meio do RNA-mensageiro, o modelo de construção proteica para o ribosoma. A INH interfere na formação do ácido gama-aminobutírico (GABA), no ciclo de Krebs, durante a construção das proteínas, seja na formação do DNA como do RNA. A SM e outros aminoglicosídios, agem no setor 30S dos ribossomas, alterando a formação de proteínas da parede celular. O desejável é que se associem drogas com ação em diferentes momentos do metabolismo. João Vitor Freire – MEDUNIME 2019.1 De acordo com sua absorção, as drogas podem ser administradas por via oral ou parenteral, o que tem importância pela longa duração do tratamento e a comodidade de uso para uma boa adesão ao esquema. Drogas de uso oral como a RF, INH, PZA e ETH são mais cômodas que as injetáveis, como os aminoglicosídeos. Drogas mais bem absorvidas podem ser veiculadas por vias alternativas como intracavitária ou na forma de supositórios. À luz desses conhecimentos, define-se como indispensável no tratamento da tuberculose a dupla RF e INH. São as drogas bactericidas de maior potência, as mais segura e as de maior amplitude de ação. Administradas por um tempo adequado, evitam a falência do tratamento por germes resistentes e persistentes. A elas se devem acoplar uma ou mais droga como proteção contra bacilos resistentes, evitando a possibilidade de recaídas e recidivas. Assim, podem-se enumerar três regras fundamentais na quimioterapia antituberculosa: 1- Uma boa associação medicamentosa: usar quatro drogas, tendo sempre como base a associação RF+INH, sendo a PZA, até o momento, a mais indicada como terceira droga e o etambutol como quarta na fase intensiva do tratamento. Procurar combinar medicamentos de diferentes sítios de ação no metabolismo do bacilo. 2- Tempo de tratamento adequado: em relação aos esquemas associando RF+INH (com PZA e ETH na fase intensiva do tratamento), são suficientes seis meses para a maioria casos. 3- Regularidade no uso das drogas: seja o tratamento diário ou intermitente, as drogas devem ser tomadas de forma regular, evitando-se sua interrupção precoce (abandono).
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