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KRAKAUER, Siegfried De Caligari a Hitler Uma História Psicológica do Cinema Alemão [1947]

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DE CALIGARI A H}TLER
Urr Htfúd. Fhol,óglca do dn€mâ abírúo
Sôndo um clássico da bibllograla cinomato-
grffca intomaclonal, este llvÍo nb limitÁ seu in-
bÍe§ss à aúllsê do dnema alêínáo. Em varda-
do, elo visa a amdlar, ds modo especfico, o co-
nhsdrnsnb geral da Alemanha nos anos quê
procoderam o sulgknsnb de Hlller e as pofurF
das tendânclas pslcológlcâs que lnfluonclaÍam o
cuÍso dos aclnbciÍnontos quo culminarar com
a ascensáo do nazismo ao po(br, do táo trágicâs
ê bÍÍfu ois conseq0ências.
É opinlâo do aubr, constituindo mesmo a
tese fundaÍnental dests llvÍo, que os filmes dê
uma naçáo rellotsn a sua Ínentalldadê e do Ína-
nolra mals dlreta do que qualquer oütrc mdo aÍ-
úslico, 6 isso por duas pÍlnclpais razôss:
Em píÍnelÍo lugâÍ, os fllínos nunca sb plD-
duto do um único indlvÍduo, e sim rêsultâm de um
esÍoço coletvo. O dilEbr soviético Pudovkln
salienta essa caractoísüca da pÍodugáo clnê-
mâtográfrcq idenüfrcando-a com uma prcdução
hdustrial; tambárn Pabst o outros inportanles di-
rêbres europôus compaítilhavam dosse ponto
do vista o trabalhavam do acordr coÍn sle. Ern
sôgundo lugaÍ, oB ílmes sâo d$ünados - e inte-
lEssam - às multldões anônlÍnas. Fllmos popula-
res, ou, pâra rnalor predsão, tomas dê liknes po..
pulaÍos, sáo supostam€nte Ísibs para satisÍaz+
rem os d€ssjos das massas e, portantc, os ds-
seios do púUlco dotarminem a longo prâzo â
natureza dos ílÍnes.
O que os filíros reflstsÍn náo sâo tanlo cre-
dos oxplÍclbs, Íms dbpositlvos psicológicos -
ossas profundas camadas da Ínantalidadô cole.
üva que sê sltuam mais ou Ínonos âbalxo da di-
ÍTEnsáo da consclênch. Claro quo tamb6m ou-
tÍo8 pÍodubs sodknsntares da vlda culturâl do
um povo - Í€vlshs popularEs, pÍogramas do r&
dlo ou bhvlóÉo, àasr-eClaís, anúnclos, íDd8ÍÍros
na llnguegpm €tc. - tâmbârn íomocêm lnÍorÍna-
ç{es valloses Bobrô âlltude8 pí€doíÍ narta8 ou
bndânde8 htames dltundda8. MaB o clnema
sxoadc a bdra c!ra! outa! mídhs. Greçes à
rÍpbllldedc da o&nere e eoc lllmnados €(êlbs
.spccld3, os frlÍmr equadíÍ$em bdo o mundo
vlclvcl, rEeultândo íp que Pemtrky d€ínlu coím
De Caligari a Hitler
uma história psicológica do cinema alemão
Sumário
PreÍócio
Lista de ilustrações
Introdução
I. O Período Arcaico (1895-1918)
l. Guerra e paz
2. Presságios
3. Gênese da UFA
II. O Período do Pós4uerra (19f8-19%)
4. O choque da liberdade
5. Caligari
6. Procissão de déspotas
7 . Destino
8. Caos mudo
9 . Dilema crucial
10. Da rebelião à submissão
7
Título oÍiginal:
From Caligari to Hitler -A psychologicol histott ol lhe Germon lilm
TÉdução autorizâda da qujntâ edição norte-ameÍicana
publicada em 1974 por Princeton University press,
de Princeton, Nova Jersey, EUA
Copyrieht O 1947, Princeton UDiversity PÍess
Copyright @ l9E8 dâ edição em lingua portuguesa:
Jorye Zahar Editor Ltda.
rua México 31 sobrelojâ
20031 Rio de Janeiro, RJ
Todos os diÍeitos reservados.
A reFodução nâo-autorizâda desta publicaçáo, no todo
ou em parte, constitui violação do copyright. (Lej 5.988)
Produção editorial Revhãoi Carlos Augusto Nougué (copy);
Cirlos de Cárvalho, Corlos Nayfêld, NÂir Dametto (tip.);
Dhgomoção: Celso Bivar; Copo, loÁo da FÍança: Compoição
e Impre$iio, Tavates e Tristáo Gráf. c Edit. de Liv.os Ltda.
III,
11.
12.
13.
14.
15.
16.
O Período de Estabilidade (f9%-r929)
Declinio
Solo congelado
A prostituta e a adolescente
O novo realismo
Montagem
Breve despertar
9
15
27
42
50
t57
165
181
195
212
,'r,)
59
78
96
108
tt7
130
139
I§BN: 8Í7110-042-X
6 satuáÂo
IV. O Período Pré-Hitler (f930-I933)
L7. Canções e ilusões
18. Um assassino entre nós
L9. Tímidas heresias
20. Por um mundo melhor
21 . Épico nacional
Apêndice: Propaganda e o Filme de Guerra Nazista
1 . Pontos de Vista e Medidas Nazistas
2 . Recursos Cinematográficos
3 . O Mundo da Suástica
4 . Dramaturgia Cinematográfica
5. Conflito com a Realidade
Anólise Esttutural
Bibliogralia
Índice Remissivo
I Lustrações
237
251
261
272
293
3t9
i21
324
330
338
35r
377
389
409
Prefácio
O objetivo deste livro não é analisar os filmes alemães em si. Na
realidade, qle visa a ampliar, de um modo específico, nosso conheci-
mento sobre a Alemaúa pré-Hitler.
É minha opinião que, através de uma análise dos filmes alemáes,
pode-se expor as profundas tendênciâs psicológicas predominantes
na Alemaúa de 1918 a 193 3,/ tendências que influenciaram o curso
dos acontecimentos no período de tempo acima mencionado e que
terão de ser levadas em consideragão na era pós-Hitler.
Tenho razões para ac:,ediÍar que o uso aqui feito dos. filmes
como um meio de pesquisa pode ser proveitosamente estendido.aos
estudos sobÍe o atual comportamento das massas nos Estados Uni-
dos e em outÍos países. Também acredito que estudos deste tipo
podem ajudar na elaboÍação de filmes - sem falar nos outros meiosdc comunicação - que irão efetivamente colocar em prática os obje-tivos culturâis das Naçôes Unidas.
Devo muito à Srta. Iris Barry, Curadora da Filmoteca do Mu-
seu de Arte ModeÍna de Nova York, a quem meu livro, literalmen-
te, deve sua existência; ela não apenas sugeriu este estudo, mas as-
sessorou-me generosamente, e de vifuias maneiÍas, para sua realiza-
gão. Sou agradecido à Fundação Rockefeller, que me permitiu levar
avante esse empreendimento, e ao Sr. John Marshall, da mesma ins-
tituição, por seu constante inteÍesse no progÍesso da obra. Quero
expressar miúa profunda gratidão à Fundação John Simon Guggen-
heim, que honrosamente me concedeu duas bolsas de estudo, e ao
Sr'. Henry Allen Moe, secÍetário-geral da fundação, que jamais se
8 de Caligati a Hitlzr
cansou de me estimular. Entre as pessoas com que teúo um gran-
de débito pelos constantes conselhos e ajuda na orgânização do
material e em questões de estilo, cito expressâmente a Srta. Barbara
Deming, ex-analista da seção de cinema da Biblioteca do Congresso;
Srta. Margaret Mille4 Srta. Ruth Olson e Sr. Arthur Rosenheimer
Jr., funcionários do Museu de Arte Moderna. Agradecimentos sin-
ceros tâmbém ao bibliotecário do Museu de Arte Moderna, Sr. Ber-
nard Karpel, e aos funcionários da biblioteca que, paciente e com-
petentemente, ajudaram-me todas as vezes de que precisei e me fi-
zeÍam setrtir, na b.blioteca, como se estivesse em casa, facilitando-
me mateÍiâl valioso para o estudo dos filmes. Finalmente, queÍo
agradecer a miúa mulher, emboÍa tudo o que eu possa dizer para
agradecer-lhe seja insuficiente. Como sempre, ela ajudou-me na pre-
paração deste livro e, como sempre, beneficiei-me muito de sua fa-
culdade de p€rceber o essencial e de penetrar em seu âmago.
STEGFRTED KneceuBn
Maio, 1946
Nova York
Ilustrações
l Maoeur Du BARRY: A ameaga da dominagáo das massas.
2, O GABTNETE Do DR. CÀLrcÀRr: Autoridade insana
(Da Filmot€ca do Museu de Arte Moderna)
3. O GABTNETE Do DR. CALÍGARr: A imaginação do desenhista
(Da Filmoteca do Museu de Arte Modernâ)
4. O G.lsNrrr Do DR. CALrcAxr: Os três lances de escada Do
hospício simbolizam a posição do Dr. Caligari no topo da
hierarquia
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
-5 NoSFERATU, o VAMprRo: O vampiro, derrotado pelo amor,
dissolve-se no ar
(De Paul Rorha, fáe Film Till Now, lonathan Cape Ltd..
1930)
6. DR. MABUSE, o JocADoR: Ioterpenetração dos estilos realista
e expÍessionista, traindo a íntima relação entre Mabuse e Câ-
ligari
(Da coleção de Charles L. T\rrner)
7. O GABTNBTE DAs FrcuRÀs DE CER.À: Uma fantasmagoria _
Jâck, o Estdpâdor, perseguindo os amantes(Da coleção de Charles L. T\rrner)
8. 0 GAsrNerr DAs FrcuRAs or CsRA: Ivan, o Terrível, uma en-
camação de luxúria insaciável e crueldades inimagináveis
(Da Filmotecâ do Museu de A.te Moderna)
9. A MoRTB CANsADA: O imenso muro simbolizando a inaces-
sibilidade do Destino
(Da coleção de Charles L. Turner)
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10
10.
de Caligwi a Eitla
Os NIBELUNcoS: Triunfo do ornamental sobre o humano
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
Os NIBELUNGos: Os padrões dos Nibelungos são retomados
pela pompa nazista
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
O TtrIUNFo DA VoNTADE: Os padrões dos Nibelungos são rc-
tomados pela pompa nazista
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
Sylvssren: O suicídio do dono do bar
A úr,rrrrle GARGALEADA: Humilhação encarnada
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
A úLTrMÀ GARGALHADA: A porta giÍatória 
- algo entre umcarossel e uma roleta
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
UM Copo oB Ácul: Com sua ênfase na simetria, o cenário
respira nostalgia romântica
(Da coleção de Charles L. Turner)
A MoNTANHA Do DEsTtNo: Os alpinistas são devotos cum-
prindo os ritos de um culto
(Da colegão do Dr. Kurt pinthus)
Gor,ru: Golem, uma figura de barro, animada por seu mes_
tre, o rabino Irew
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
Sournas: Terapia mágica - o conde e seus convidados se-guem suas sombras no domínio do subconsciente
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
FruDERrcus Rex: O jovem rei
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
A RUA: Objetos inanimados adquirem vida
(Da Filmoteca do Museu de Arte Modema)
A RUA: Este gesto - 
que se repete em muitos filmes alemães
- é sintomático do desejo de volta ao útero materno(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
VARTEDADEs: A corcunda de Jannings desempenha um papel
importante na cena da prisão
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
VARIEDADEs: A câmara inquisitiva penetra no círculo mágico
da ação
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
ihltttaçõei 1l
25. O CAMTNHo pARâ A FoRçÀ E A BBLEZA: Tableau vivant d,e
um ginásio grego
(Da coleção d'o Dr. Kurt Pinúus)
26. TARTUFo: O maneirismo em grande estilo
27. MBrnópor,rs: A falsa aliança entÍe o trabalho e o capital
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
28. Mrrnópous: Desespero ornamental
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
29, A RuÁ sBru ALEGRTA: Asta Nielsen num dos papéis em que
rejeita as convenções sociais através de seu abundante amor
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
30. DER KAMPF DER TERTTA: Um dos inúmeros filmes de jovens
expressando saudade da adolescência
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
3L. A RÜe seÀ{ ALEGRTA: O horror da vida real
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
32 . A RUA sEM ALEGRTA: Realismo, não siÍhbolismo
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
33. SEcREDos oe uue Arue: Sonhos externados através da ima,
gem
34. O AMoR DE JEANNE NÊy: A orgia da soldadesca antibolche-
vique - uma cena extraída da vida real(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
35. O AMoR DE JB.trNo Nrv: O espelho quebrado, uma testemu-
rha silenciosa, fala de glamour e destruição
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
?6, O Arton DE JEANNE Nrv: ConÍiguraçóes casuais da vida
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
37, BERLM, STNFoNTA DE UMA Mrtnóporr: Padrões de movi-
mento
(Da Filmoteca do Museu de Arte ModeÍna)
38. BERLTM, SNFoNTA DE UMA METRóPoLE: O que outrora deno-
tava caos agora é apenas parte da história - um fato entrefatos
(Da Filmoteca do Museu de AÍte Modema)
39 . BERLM, SINFoNTA DE UMA METRóPoLE: Um primeiro plano
do esgoto ilustra a âspeieza da vida mecanizada
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
12.
11.
17.
l5
16.
13.
t4.
18.
19.
7ft
2l
n1
a1
24
t2 de Caligari a Eitla
40, ACDENTE: O uso de espelhos que distorcem as imagens aiuda
a se desafiarem convenções arraigadas
(Da coleção de Charles L. Turner)
41. O CAMTNHo Do PARÁÍso: Um sonho divertido feito com ele_
mentos da vida cotidiana
42, CeNçÃo oe VDA: Uma cena simbólica que glorifica a vitali
dade
43.
44.
(Da coleção de Herman G. Weinberg)
O HoprBu sEM NoME: Os pesadelos da máquina burocrática
O.VENCEDoR: Hans Albers, a personificação dos sonhos po_
pulares
O ANJo AzuL: Jamings como o professor ridicularizado por
seus alunos
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
O ANJo AzuL: Marlene Dietrich como Lola Lola _ pemas
provocantes e uma frieza total
(Dâ Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
M - O Varurrno DE DussELDoRF: Os gritos da mãe de Elsieenchem o vazio do vão da escadaria
(Da Filmoteca do Museu de ArÍe ModeÍna)
M - O VAiflrRo DE DussELDoRF: As facas refletidas emtorno do rosto de Lorre o definem como um prisioneiro de
seus desejos diabólicos
(Da Filmoteca do Museu de Arte Modema)
M - O VAMprRo DE DUSSELDoRF: O grupo de criminosos,mendigos e mulheres da rua assistem ao iulgamento do infan-
ricida
TERRÍVBL ARMADA: O ladrão, o inverso do Flautista de Ham-
Iyz, perseguido pelas crianças numa radiante manhã de sol
SENHoRTTÂS EM UNTFoRME: A diretoÍa - a versão femininade Frederico, o Grande
(Da coleção de Theodore Huff)
SENHoNTAS EM UNTFoRME: Para preparar o espectador para
esta cena, a escadaria é mostrâda ao longo de todo o filme
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
NADA DE Novo No FRoNT OcTDENTAT,: Hospital de campo
Íepleto de gemidos e gritos de agonia
(Da coleção de Herman G. Weinberg)
45
46.
4?
48.
ilutrações l3
54. A óPERA Dos TRÊs VrNTÉNs: Janelas de vidro translormam
o café cheio e .enfumaçado num confuso labirinto
(De Paul R.otha, Celluloid, Longmans, Green & Co. Inc.,
1933)
55. TnlcÉore NA MrNA: Os mineiros alemães prestes a removeÍem
a cerca de ferro colocada desde Versalhes
(Da cotegão de Herman G. Weinberg)
56. TRAGÉDrA NA MrNA: Mineiros alemães no bânho - o espec-tador penetra em um dos segredos da vida cotidiana
(De William }l:unger, Scrutiny ol Cinema, Wishart & Co.,
t932)
57. BARRIGÀS FRrAs: Jovens âtletas no festival de espoÍtes comu-
nista, que glorifica a vida coletiva
58. Orro Genor.ls NUM BARCo: Este filme retrata a afinidade sn-
tre o Movimento dâ Juventude, anterior ao nazismo, e o espí-
rito nazista
59. AVALÀNCHE: A ênfase dada ao conglomerado de nuvens in-
dica a suprema fusão do culto à montaúa com o culto a
Hitler
60. O TRluNFo DA VoNTADE: A ênfase dada ao conglomerado de
nuvens indica a suprema fusão do culto à montaúa com o
culto â Hitler
(Da Filmoteca do Museu de Arte Moderna)
61 , O REBELDE: Um hitlerista superficialmente mascarado
62. A Luz AzüL: Junta, uma encarnâção de poderes elementares
(Da coleção de Herman G. Weinberg)
63. O SALMo DE LEUTHEN: O velho rei
64, HERórs Do Men: O cheiro da guerra real
49.
50.
51.
52.
k
53
Introdução
Quando, a partiÍ de 1920, os filmes alemães começaram a romper
o boicote estabelecido pelos Aliados contra o ex-inimigo, chocaram
os espectadores de Nova York, Londres e Paris, deixando-os tão
perplexos quanto fascinados.l Arquétipo de todos os futuÍos filrnes
do pós-guerra, Das Cabinet der Dr. Caligari (O Gabinete d.o Dr. Ca-
Iigari) provocou discussóes apaixonadas. Enquarto um crítico o
definiu como "a primeira tentativa significativa de expressão de um
pensamento criativo no cinema",z outro afirmou: "Tem o cheiro de
comida estragada. Deixa um gosto amaÍgo na boca",s Ao expor a
alma alemã, os filmes do pós-guerra pareciam queÍeÍ torná-lâ ainda
mais misteriosa. Macabro, sinistro, mórbido: estes eram os adjetivos
favoritos usados para descrevê-los.
Com o passar do tempo, o cinema alemão mudou os temas e
os estilos de Íepresentação. Mas, apesar de todas as mudanças,
pÍeservou alguns traços típicos do seu extraordlnário início - mes-mo depois de 1924, tn ano considerado o início de um longo pe-
ríodo de declínio. Os cÍíticos norte-amüicanos e europeus foram
unânimes na avaliação destes tÍaços. O que eles mais admiram é
o talento com que, desde a época de Caligari, os diretores de cine-
ma alemães construíram todâ â atmosfera visual: sua franca pre-
Ierência por cenários impressionântes, sua virtuosjdadeno desenvol-
vimento da ação através da iluminação apropriada. Os críticos tam-
bém apreciam o papel importante desempenhado pela câmera nos
I
16 de Caligui a Hitlet
filmes alemães, os primeiros a deixá-la completamente móvel. Além
disto, não há especialista que não mencione o fatoÍ operâtivo orga-
nizacional destes filmes - uma disciplina co.letiva que revela a uni-dade da narrativa e a perfeita integração de luzes, cenáÍios e ato-
res.4 Graças a tais valores singulares, o filme alemáo exerceu in-
fluência mundial, principalmente depois da evolução dos recursos
de estúdio e de câmera, utilizados em Der Leízte Mann (A última
Gargalhada, 1924) e em Yariété (Variedades, 1925), "Foi o traba-
lho de câmera alemão (no completo sentido deste termo ) o que im-
pressionou mais profundâmente Hollywood.'5 Em uma manifestação
característica de respeito, Hollywood contratou todos os diretores,
atoÍes e técnicos alemães em que conseguiu colocar as mãos. A
França também se mostrou suscetível ao estilo cinematográfico da
outra maÍgem do Reno. E os filmes clássicos russos se beneficiaram
da técnica alemá de iluminação.o
Admiração e imitação, no entanto, não se baseiam necessaria-
mente em compreensão intrinseca. Muito se tem escrito sobre o ci-
nema alemão, numa contínua tentativa de analisarem suas excepcio-
nais qualidades e, se possível, Íesolverem os inquietantes problemas
estreitamente ügados a suâ existência. Mas essa literatuÍa, essen-
cialmente estética, trata dos filmes como se fossem estruturas autô-
nomas. Por exemplo, a pergunta sobre por que foi pdmeiramente
na Alemanha que a câmara alcançou a completa mobilidade nem
sequer foi formulada. Tampouco a evolução do cilema alemão foi
compreendida. Paul Rotha, qu€, com os colaboradores da Íevista de
cinema inglesa Close Up, logo reconheceu os méritos artísticos dos
filmes alemães, limita-se a um mero esquema cronológico. ,,Ao pes-
quisal o cinema alemão do fim da guerra âté o aparec:mento dos
filmes falados norte-amedcanos", diz ele, "pode-se, grosso modo.
dividir a produção em três grupos. Primeiro, a comédia de costu-
mes; segundo, o grande período intermediário dos filmes de arte
produzidos em estúdios, terceiro, o declínio do filme alemão de
modo a se equiparar à produção norte-americâna do'filme-senti-
do' ('picture-sensd )".f, Por que esses três grupos de filmes deviam
obedecer a essa seqüência, Rotha não tenta explicar. Tais avaliações
externas são a regra. Elas levam diÍetamente a equívocos perigosos,
Atribuindo o declínio após 1924 ao êxodo de importantes peÍsona-
lidades, do cinema alemão e à interferência norte-americana na in-
dÍrstria cinematográfiôa alemã, muitos autores qualificam os filmes
alemães da época de "americanizados" ou de "produtos internacio-
l?
nalizados".s Veremos que estes supostos filmes "americanizados" fo-
ram de fato expressões verdadeiras da vida alemã de seu tempo. E,
em geral, veremos qüe só se pode compreender totalmente a técni-
ca, o conteúdo da história e a evolução dos filmes de uma nação
relacionando-os com o padrão psicológico vigente nesta nação.
II
Os filmes de uma nação refletem a mentalidade desta, de uma ma.
neira mais dheta do que qualquer outÍo meio aÍístico, por duas
razões:
Primeiro, os filmes nunca sào produto de um indivíduo. O di-
retor de cinema soviético Pudovkin salienta o caráteÍ coletivo da
produção cinematográfica ao identificá-la com uma produção in-
dustrial: "O geÍente técnico nada consegue sem capatazes e traba-
lhadores e o esforço coletivo deles não dará bons resultados se cada
colaborador limitar-se apenas ao desempenho mecânico de sua fun-
ção. O trabalho de equipe é o que torna câda tarefa, mesmo a mais
insignificante, uma parte do trabalho vivo, vinculando-o organica-
nlente à taÍefa geral."e Importantes diretores alemães compartilha-
vam deste ponto de vista e tÍabalhâvam de acordo com ele. Obner-
vando as filmagens de uma película dirigida por G. W. Pabst nos
estúdios franceses de Joinville, notei que ele seguia imediatamette
as sugestões de seus técnicos com relação a detalhes dos cenários e
da distribuição da luz. Pabst contou-m€ que considerava contdbui-
ções deste tipo inestimáveis. Já que qualquer unidade de produção
cinematográJica engloba uma mistura de inteÍesses e inclinações- he-
terogêneas, o trabalho de equipe nesse campo tende a excluir o tra-
tamento arbitÍário do material de cinema, suprimindo peculiarida.
des individuais em favor de traços comuns a muitas pessoas.ro
Em segundo lugar, os filmes são destinados, e interessâm, às
multidões anônimas. Filmes populares - ou, para sermos mais precisos, temas de filmes populares - são 
supostâmente feitos para
saüsfazerem os desejos das massas. De vez em quando afirma-s€
que Holll'wood consegue vender filmes que não dão às massas o que
elas realmente querem. Segundo esta opinião, os filmes de Holly-
wood, mais freqüentemente do que se supõe, Íidicularizam e iludemF.
k
&":,
It
O que os filmes refletem não são tanto credos explícitos, mas dis_
positivos psicológicos 
- essas profundas camaclal da mentalidadecoletiva que se situam mais ou menos abaixo da dimensão da cons-
ciência. É claro que reüstas populares e programas de rádio. áest_
Jerle/s, anúncios, modismos na linguagem e outros produtos sedi_
rrentares da vida cultural de um povo também fornecem informa_
ções valiosas sobre atitudes predominantes, tendêocias internas di_
fundidas. Mas o cinema excede a todas essas outras mídias.
Graças às diversas atividades da câmera, aos cortes e aos mui_
Íos recursos especiais, os filmes são capazes e, pol isso, obrigados
a esquadrinhar todo o mundo visível. Esse esforço Íesulta tro que
Erwin Panofsky, numa conferência memorável, definiu como ..di-
namização do espaço": "Numa sala de cinema... o espectadoÍ tem
um assento fixo, mas apenas fisicamente... Esteticamente ele está
€m constante movimento, a partir do momento em que seu olho se
identifica com as lentes da câmera, que mudam p€rmanentemente
em distância e direção. E o espaço apresentado ao espectador é tão
móvel quanto o próprio esl :tador. Não apenas corpos sólidos se
iltrodnۋo l0
movimentam no espaço, mas o próprio espago se move, mudando.
virando, se dissolvendo e se recristalizando . . . "14
Ao longo de süas conquistas espaciais, os filmes de ficção e
os documentários apreendem do mesmo modo inumeráveis compo-
nentes do mundo que espelham: grandes movimentagões de confi-
guragões casuais de corpos humanos e objetos inanimados, e uma
intindável sucessão de fenômenos discretos. Aliás, o cinema se mos-
tra particulaÍmente preocupado com o discreto, o normalmente ne-
gligenciado. Precedendo todos os outros recursos cinematogÍáficos,
os primeiros plalos apareceram logo no início do cinema e con-
tinuaram a ser usacios ao longo de sua história. ..euando comecei
a dirigir filmes", disse Erich von Stroheim a um jornalista, ..tra-
balhava dia e noite, sem comer, algumas vezes sem dormir, para
ter cada detalhe perfeito, até as descriçóes de como as erpressões
faciais deveriam mudar."m Os filmes parecem preencher una mis-
são inata de desentocar minúcias.
A vida interior se maDifesta em vários elementos e conglome-
3!o1 da vida exterior, especialmente naquelas informações supor-
ficiais quase imperceptíveis que formam uma parte essencial da lfur-
guagem do cinema. Ao gravar o mundo üsível _ não importa se
a realidade vigente ou um universo imaginário -, os filmes pro_porcionam a chave de processos mentais ocultos. pesquisando a era
do cinema mudo, Horace M. Kallen aponta a esclareiedora função
dos primeiros planos: "Ações superficiais, tais como a movimentagão
casual dos dedos, o abrir ou o apertar da mão, o deixar cair
um lenço, o mexer com alguns objetos aparentemente iÍrelevantes,
o tropeçar, o cair, o procuraÍ e não achar,, e coisas paÍecidas, tor_
nâram-se hieróglifos visíveis da dinâmica despercebida das relações
humanas..."10 Os filmes são particularmente abrangentes porque
seus "hieróglifos visíveis" suplementam o testemunho de suas es-
tórias peculiares.E, permeando ambos, as estórias e as imagens, a
"dinâmica despercebida das relações humanas" são mais ou menos
características da vida interior da nação da qual os filmes emergem.
O fato de os filmes paÍticulaÍmente sugestivos dos desejos das
massas coincidiÍem com enonnes sucessos de bilheteria poderia pa-
recer óbüo. Mas um sucesso podo atender,a apenas uma das inúmeras
exigências coexistentes, e não necessariamente a alguma muito espe-
cífica. Em seu trabalho sobre os métodos de seleção de filmes a serem
preservados pela Biblioteca do Congresso, Barbara Demirg discute
de Calígari a Hitl.cr
o público, que é persuadido a aceitáJos devido a sua própria pas-
sividade e a uma publicidade avassaladora. No entantq a influên-
cia distorcida do entÍetenimento de massa de Holllwood não deve
ser superestimada. O manipulador depende das qualidades inerentes
a seu matetial; mesmo os filmes de guerra oficiais nazistas, produ-
tos de propaganda como eram, espelharam algumas características
nacionais que não poderiam ser tabricadas.rl O que é verdade para
eles se aplica com muito rnais razão aos filmes de uma sociedade
competitiva. Hollywood não pode se dar ao luxo de ignorar a es-
pontaneidade do púbüco. O descontentamento gerâl se manifesta
através das bilheterias e a indústria do chema, vitâlmente intcÍes_
sada 
-no 
lucro, é levada a se ajustar, o mais possível, às mudaoças
do clima mental.z Em resumo, o espectadoi noÍte-americano re-
:Ebe. 
o q_ue Hollywood quer que ele receba; mas, a longo prazo, os
desejos do público determinam a natnÍeza dos filmes de úoliywooa.rr
III
$.
k.
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h.
bri
pr
h.
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m,
20 de Caügari a Hitlet
esta questão: "Mesmo que fosse possível descobrirem-se. . . quais
foram os filÍnes mais populaÍes, poderia acontecer que, ao se dar
prioridâde à sua preservação, se estivesse pÍeservando o mesmo soúo
várias vezes... e se perdessem outros sonhos que não apaÍeceram
nos filmes mais populares, mas que apareceram repetidas vezes em
um grande número de filmes menos populares.',u O que conta neo
é tanto a populaÍidade dos filmes estatisticamente mensurada, mas
a popularidade de seus temas pictóricos e narrâtivos. A persistente
reiteração destes temas marca-os como projeções externas de de-
sejos internos. E eles obviamente têm muito mais peso quando
ocorÍem tanto em filmes populares quanto em não-populares, em
filmes classe B ou em superproduções. Esta históda do cinema ale-
mão é uma história dos temas que permeiam filmes de todos os
niveis.
TV
Falar-se da mentalidade peculiar de uma nação de modo algum im-
plica o conceito de um caráter nacional fixo. Nosso interesse aqui
reside exclusivamente em tais dispositivos coletivos ou tendências
que prevalecem em uma nação num certo estágio de seu desenvol_
vimento. Que temores e esperanças vafferam a Alemaúa imedia-
tamente após a Primeira Guerra Mundial? perguntas deste tipo sâo
Iegítimas por causa de seu alcance limitado; incidentalmenti, elas
são as únicas que podem ser respondidas por uma análise dos filmes
da época. Em outras palawas, este livro não se pÍeocupa em esta-
belecer padrões de caráter nacional supostamente elevados acima da
históda, mas, sim, com o padrão psicológico de um povo numa de-
terminada época. Não faltam estudos abrangendo a história polí
tica, social, econômica e cultural das grandes nações. Meu propó-
sito é contribuir com uma história psicológica.
É sempre possível que alguns temas do cinema sejam rele-
vantes apenas para umâ parte da nação, mas o cuidado na ava-
liaçáo. não deve nos pred:spor contÍa a existência de tendências que
influenr sobre a nação como um todo. Elas são as menos questio-
náveis como tradições comuns e o permanente inter-relacionamento
;nttoduçào
entÍe diferentes extratos da populaçâo exerce uma influência unifi-
cadora no âmago da vida coletiva. Na Alemanha pré-nazista, as pro-
pensões da classe média penetravam em todas as camadas; compe-
tiam com as aspirações poÍticas da esquerda e também pÍeenchiam
o vazio da mente da classe alta. Isto explica o apelo de âmbito
nacional do cinema alemão - um cinema firmemente enraizado namentalidade da classe média. De 1930 a 1933, o atoÍ Hans AlbeÍts
desempenhou o papel de herói de filmes em que típicos sonhos bur-
gueses se realizavam plenamente; suas proezas agradavam aos tra-
balhadores e, em Miidchen in Unilorm (Senhoritas em Uniforrne),
vemos sua fotografia ser venerada pelas filhas das famÍlias aristo-
üáticas.
De acordo com a abordagem científica, na cadeia de motiva-
gões as características nacionais são efeitos, e não causas - efeitosde ambientes naturais, experiências históricas, condições econômi.
cas e sociais. E já que todos somos seres humanos, é de se esperar
que fatores extemos semelhantes provoquem reações psicológicas
análogas em toda parte. A paralisia das mentes, fato que se general!
zou por todâ a Alemanha enie 1924 e 1929, rlão era de modo algum
especificamente alemã. Seria fácil mostrar-se que, sob a influência
de circunstâncias análogas, uma paralisia coletiva semelhante ocorre
- e ocorreu - também em outÍos países.l0 No entanto, o fatode as atitudes mentais de um povo dependerem de fatores exter-
nos não justifica a freqüent€ negligência com relação a estâs at!
tudes. Efeitos podem, em qualquer época, se tornaÍ causas espon-
tâneas. Apesar de seu caráter derivado, tetrdências psicológicas fre-
qüentemente adquirem vida independente e, em vez de mudarem
automaticamente de acordo com as circunstânciag se tornam molas
essenciais da evolução histórica. Ao longo de sua história, toda nâ-
ção desenvolve dispositivos que sobrevivem a suas causas primá-
rias e passam por metamorfose própria. Eles não podem ser sim-
plesmente inferidos dos fatores externos vigentes, mas, reciproca-
mente, ajudam a determinar reações â estes fâtores. Somos todos
seres humanos, mesmo se algumas vezes de características distintas.
Estes dispositivos coletivos ganham impulso em casos de mudança
política radical. A dissolução de sistemas políticos resulta na de-
composição de sistemas psicológicos e, no tumulto subseqüente, ati
tudes inteÍnas tradicionais, agora liberadas, são impelidas a se toÍ-
narem manifestas, sejam elas combatidas ou apoiadas.
2l
22 de Caligti a Eblet i trod. çao
munistas € das estÍanhas Íeagões das massas alemãs.z0 Franz Neu.
mann é forçado a explicar o fracasso dos comunistas em parte como
conseqüência de "sua i-ncapacidade de avaliar coÍÍetamente os fa-
toÍes psicológicos e as tendências sociológicas que se opeÍaram entre
os trabalhadores alemães. . ." Depors ele concorda com a tese do
podeÍ político limitado do Reichstag, ao fazer z reveladora obsena-
ção: "A democracia poderia ter sobrevivido, apesar de tudo - masapenas se o sistema de valores democráticos estivesse firmemente en-
ruizado na sociedade..."21 Erich Fromm amplia o râciocínio ao
argumentar que as tendências psicológicas dos trabalhadores alemães
neutÍalizaram suas doutrinas políticas, o que precipitou o colapso dos
partidos socialistas e dos sindicatos.z
O comportamento de um amplo estrato da classe média também
parecia ser determinado por compulsões avassaladoras. Num estudo
publicado em 1930 salientei as proclamadas pretensões a "colarhhos
brancos" da massa de empregados alemães, cujo slaÍus econômico
e social na realidade se aproximava daquele dos operários, ou a
ele eÍa. até inferior,B Apesar de essa camada da baixa classe média
não poder mais aspirar à segurança burguesa, ela desprezou todas
as doutrinas e ideais mais em harmonia com sua condigão, manten-
do atitudes que haviam perdido qualquer base na realidade. A con-
seqüência foi o desamparo mental: eles persistiram Duma espécie
de vácuo que posterioÍmente contÍibuiu para sua obstinação Psico-
l6gSca. A conduta da própria pequena burguesia foi particularmente
impressionante. Pequenos comerciantes, homens de negócios e arte-
sãos estavam tão cheios de ressentimentos que recuaÍam, âjustando-
sc. Em vez de perceberem que poderia ser de seu interesse prático
ficar ao lado da democracia, preferiram,como os empÍegados, ouür
as promessas nazistas. Preferiram se Íender a eles baseados em fixs-
çóes emocionais, ao ;oyés de enfrentarem os fatos.
Assim, por tÍás da história explícita das mudanças econômicas.
exigências sociais e rnaquinações políticas, existe uma história secre-
ta envolvendo os dispositivos intemos do povo alemão. A revela-
ção destes dispositivos através do cinema alemão pode ajudar a com-
pleender a ascensão e a ascendência de Hitler.
28
v
O fato de a maioria dos historiadores negligenciarem o fator psi_
cológico é demonstrado por supreendentes lacunas em nosso coúe_
cimento sobre a história alemã desde a prirneira Guerra Mundial
até o triunfo final de Hitler - o período abrangido neste livro. Econtudo, as dimensões do acontecimento, do ambiente e da ideo_
logia_ foram amplamente investigadas. Sabe-se que a ,,Revoluçã.o,,
alemá de novembro de 1918 não chegou a revólucionar a Alema_úa; que o então onipotente partido Social Democrata se provou
onipotente apenas para esmagar as forças revolucionárias, mas foi
incapaz de üquidar o exército. a burocracia. os grandes pÍoprietá_
rios rurais e as classes abastadas; que estes podús tradicionais na
realidade :o?lTuqu. a governar a_ Repúb[cà de Weimar, que en_trot em declínio depois de 1919. Sabe-se também quão duramente
a jovem RepÍblica foi pressionada pelas conseqüências políticas da
derrota e pelas artimanhas dos principais indústriais e'finaicistas
alemães, que âlimentavam desenfieadaÀente a inflação, o qr. 
"__pobreceu a velha classe média. Finalmente, sabe_se qo" âpOs o.
cinco anos do Plano Dawes - aquela abençoada era àe emprésti_mos 
-externos 
tão vantajosos para as grandes empresas _ u oia"
econômica mundial dissolveu a miragem da estabilidade, destruiu o
que ainda restava da experiência e da democracia da classe média.
e completou o desespero geral ao adicionar o desemprego em massa.
Foi nas ruínas do ,,sistema", que nunca havia sido uÃa verdadeira
estrutura, que o espírito nazista floresceu.re
Mas esses fatores econômicos, sociais e políticos não são su-
ficientes para explicar o tremendo impacto do iitleris-o e a inércia
crônica de seus opositores, Significativamente, muitos anâlistas ale-
mães se recusaram até o último momento a levar Hitler a sério, e
mesmo após sua ascensão ao poder consideraram o novo regime
uma ayentuÍa transitória. Tais opiniões indicam que haüa pelo me_
nos alguma coisa inexplicável na situação interna do país, alguma
coisa que, no campo normal de visão, não se podia inferir tlas cir-
cunstâncias.
Apenas umas poucas análises da República de Weimar dão uma
indicáção dos mecanismos psicológicos existentes por trás da fÍa-
queza inerente aos socialdemocratas, da conduta inadequada dos co_
a
r O filme dê @8tumes históricoe de Lubitsch, Madame Dt Barry _ a pÀmeiraproduçâo alemã eribida nos Estados Unidos _, íoi mostrado ã 'Nor" 
-yãrt, 
..1920._ Em ebril de 1921, se8uiu-lhe a apresentaçáo, em Nova yor\ de O Gabi-nete do Dt. CaligaÀ.z Rotha, I zr filL 
^,o11, 
p. tl}.s Á.Íoigrlet, Ciné o! Cinérna!, p. 17.
: tu-,h {'9 Till Now, pp. tjj-78; Berry, pro{d,n Not.j, Série I, programe4- e- Série lll,_-programa 2; potamkin, .Kino 
"nj Licht-<piá,,, CLu ír, nor.1929, p, 1a8; Vinccnt, Hittoire de [.4fi Ciaématographiquc, pp. tlg_4o.6 Barry, Ptogram .lVorcr, série I, progrema 4.0 Jahier, "42 Ans de Cinéma", Za Rôle iktêlL.tuel dt Cinéno, p. 86,7 Rotha, .&7nr Till Nou, p. 177, Deve-se r$leltaÍ que noth" ,ri.e..a o" poo_
tos de vista entáo vi8mtes sobre o cinema âlemáo entre 
", "ifrl.ã"- .l^._",.-gráficoe Iraacccer c inglcses, apesar de seu livro ... ."i. vigoro.o- " ie...ptiurdo que aqueles que o prccederam.
.8 . 
BeJqh:. ê^Pr.asillach, Hitory ol Motion pictbrer, p, 2r8 ss,; Vinceot, IíJr_tote dê .tl?t -C;nématoyaphiqte, 
pp. r6t4?; Rotha, .Filrz Till Niu, pp. t7Ç77;
Jeanoq "Le Cinéma Allemand", L',lft Cinénato1ro?hiql,e, ylll, aZ'ssl; etc,o PudovLin, Fihn Techn;ryê, p. tr6.r0 Balárz, Da Gàst des Fr7,rr, pp. lg7-€8,1r Ver a análire desses Íilmes no Apêndice.p Cf. Farrell, "Will úe Commercialization oÍ publi.shing Destroy C,ood Wri_titgl", Nao Directiotts, ), 1946, p. 26,
', Na Alemanha pré-Hitler, e indústria do cinemâ era menos concentrada do
que nos Estados Unidos. A UFA era preponderante sem ser onipotente, e com_
panhias menoree trabalhavam ao lado das maiores, Isto levou a uma diversidade
de produtos, o que intensiÍicou a Íunçâo reflexiva do cinema alemâo.1r Panoleky, "Style and Medium in the Moving picfires,,, tÍoiiçAo, t9r7,pp, 124-25.
r0 Lcwis, "Eriú von Stroheim...,,, Nett york Times, 22 de junho, 19,{1.16 Kallen, Áft and heedom, 11, BO9.rt, Deming, "The Library oÍ Contress Film proje.t: Exposition of a Method.,Libtary ol Coagres Quíte"ly, tg44, p. zo.lE De feto, tais similaridades nuoca ulrr"pass"m semelhanças superficiais. Cir_cunstânciÀ! €Írernes não são estritemente idênticas em p".t.'"fs;:-;,;; qr"rIor e tendênciâ psicológica que encerrem, ela se concretiza .. ,. .áriáio a.outras tendênciÂs que disfarçam seu significado,r0 Cf. Rosenberg, Ceschichte a,er ieutschea Repubüh; Schwarzschild, yottdin Trance; atc.
à Sobreasai êntrc essâs análises Horkheimer, ory., Studier, úber Á tor;tàt landtramilie; ver erpecialmente Horkheimer, ,,Theoretische f",*ti*. iii".- eiio.i,a,und Familie", pp, 3-76.
21 Nelrmann, Behtmoth, pp. rc.:-9, 25.2 Fromm, Etcalc lrotf, Frêedom, D. 2at.B CÍ. Kracauer, Dic ,laeestelltea.'
O Período Arcaico
(1895-1918)
NOTAS
a
ti
:{
i
Guerra e paz
Foi após a Primeira Guerra Mundial que o cinema alemão realmen'
te nasceu. Sua história até esta época foi pré-história, üm período
arcaico insignificante em si mesmo. No entanto, não deve ser negli-
genciado. Durante este período - princiPalmente duÍante a 
guerrà
- algumas condições materializaram o que contribüu PaÍa o 
eÍ-
traordinário poder do cinema alemão após 1918.
Teoricamente o cinerna alemão começou em 1895 quando, quase
dois meses antes da pÍimeta exibição pública de Lumiàre, os irháos
Skladanovsky mostÍaÍam seu "Bioscópio" no Wintergaiten de Ber-
lim - pedaços de cenas 
filmadas e projetadas com êquipamenlos
que eles haviarn fabricado.l Mas este início teve poucas conseqüên-
cias, pois até 1910 a Alemaúa não tinha, ürtuaLnente, uma indús-
tria cinematogática própria' Filmes de origem francesa, italiana e
norte-americaia - ãntrã 
eles os de Méliês - 
procuravâm atraiÍ
os espectadores dos prirneiros cinemas ambulantes (Vanlerk i,r.s)'
qu" d'.ruln origem aós nickelodeons (Ladenkinos), + após 1900, e
áepois às telas tlos primitivos cinemas propriamente ditos, que- vaga-
roiamente começaÍam a evoluir.2 Uma fita de celulóide de 1902, La
Noblesse d,u Mend.iant (A Nobreza do Mend.igo), mostra um orgu-
lhoso mendigo parisiense que, depois de salvar uma dama, recusa
desdenhosamente o dinheiro que ela lhe oferece porque antes ela o
havia confundido com um ladrão.3 Estes filmes, de alto valor moral,
I Niclcelod.eons eram ;ts primitivas salas de cinema que proPorcionâvâm entrete-
Dimento por iDgresso ao preço de cinco centavos de dólar. (N da T )
2S
28 o ieúodo arêa;co
competiam com películas pornográficas que, é óbvio, nunca cum.
pÍiam suas excitantes promessas. Entre 1906 e 1908, aumentou a
Curação dos filmes e os narradores deram lugar às legendas. Graças
a tais desenvolvimentos, estes anos foram marcados pela abertura
de muitas salas de exibição novas e pelo surgimento dos distribú-
dores alemães.a
Personagem destacada dentie os pbucos produtores alemães
do período foi Oskar Messter, que não fez nenhum esforço, em sua
autobiografia, para diminuir qualquer de seus méritos.s Messter co.
meçou trabalhando num modesto estúdio na Friedríchstrasse de
Bedim, mais tarde a sede de numerosos produtores de baixo nível
e questionável ética comercial. Ele tiúa a ânsia, como pioneiro, de
experimentar, de tentar usâr qualquer inovação. Numa época em
que os planos ainda eram pouco comuns, uma de suas priniéiras
comédias inteÍcalava com longâs cenas de várias ciclistas um pri-
meiro plano do movimento de suas pernas - umprocedimento 
que
antecipava um dos recursos favoritos da câÍrara alemã.6 Messter
também promoveu a moda de 'tilmes sonoros". Originário da Fran-
ça e dos Estados Unidos, este tipo de filme floresceu na Alemaúa
por volta de 1908-1909. Um tenor vestido a caráter e em pé diante
de uma tela pintada fingia cantaÍ, sincronizando os movimentos de
sua boca com um gramofone escondido. Além de árias de ópera,
cançôes folclóricas e paródias musicais, podia-se ouvir Otto Reutter,
o incomparável artista de cabaré, cujas câÍIções refletiâm amarga
e irônica crítica à vida. Filmes sonoros deste tipo já haviam sido
exibidos durante a Feira Mundial de Paris de 1900, mas se revela-
ram muito caros o compücados para sobreviverem. T O interesse par-
ticular que despertaram na Alemaúa sem dúvida resultou da ira-
dicional preocupação alemã com todas as formas de expressào
musical.
Durante todo aquele período, o cinema teve as caractêísticas
de um moleque de rua; era uma criatura sem educação correndo
selvagemente pelo ma,is baixo estato da sociedade. Muitas pessoas
seduzidas pelo cinema nunca antes haviam assistido a espetáculos
artísticos; outras foram atraídas do palco para a tela. Por volta de
1910, o teatro da cidade provincial de Hildesheim anunciou ter
perdido cinqüenta por cento do público que anteriormente freqüen-
tava , os lugares mais baratos. Espetáculos de variedades e circos
Íeclamaram de perdas semelhantes.s Uma atração para jovens tra-
balhadores, vendedoras, desempregados, ociosos e párias sociais, as
salas de cinema tiúam má reputação. Elas proporcionavam urr
teto paÍa o pobre, um refúgio Para os narnorados. Eventualmente'
um intelectual louco entÍaria em uma'
Na França, a falta de \ínculos culturais e de preconceitos intê-
Iectuais com relação ao cinema toÍnou possível a artistas como
Georges Méliàs ou Émile Cohl prosperarem, mas na Alemalú1 não
pur""i t". vingado o sentido do cinema. Porém, apos 1910, em
iesposta a um movimento que come'çara na França, aquela. indepen-
àêi"iu d"sap-"cer. A 17 de novembro de 1908, a recém-criada
;;;;;;i" iinematográfica francesa Film d'Art lançou -z'lssassr'nàt
de àuc de Guise (õ Assassinato do Duque de Guise),* üma ambí-
.io* p-arçao interpretâda por membros da Comédie Françaíse e
""à.p'*f,roà 
de umã partituia musical de Saint-Saêns's Este foi o
o.ime.-iro de inúmeros filmes confundidos com bbras de arte que'
[súmotanOo potencialidades cinemâtográficas, imitavam -o 
palco e
adaptavam pioduçOes literfuias de sucesso' A Itália seguiu o exem-
flo'francês'e o "ir".u 
notte-americano favoreceu temPorâriamente
atores famosos de peças consagradas.
O mesmo o"oi."o n, Alemanha A elite dos diretoÍes' atoÍes
e escritores teatrais começou a mostrar interesse pelo cinéma depois
de terem-no desprezado como uma mídia inferior' Sua mudança de
opinião deve ."i d"bitudu, em parte, ao zelo missionário -de 
Paul
davidson, o grande promotor dos primeiros filmes alemães, que'
exploranáo o iascínio pela nova atriz de cinema dinamarquesa Asta
úi"1*r, pto"lu-ou eniaticamente o futuro artístico do cínema Ele
liderou a Proiektion-4. G Union, que Íapidamente se-toÍnou Pro-
o.i"tfuiu d. salas de cinema e começou a produzir fílmes mêsmo
arrtes du guerra. Para impulsionar o cinema, Daüdson fez conlato
com Max Reinhardt, o principal produtor teatrâl de Berlim, e, em
lgll ll9l2, participou dã fundação de uma espécie de corporação
destinada a iegutai as relações entre os produtores cinematogÍáficos
e os dramaturigos.ro Obviamente, â perspectiva de vantâgens tangí'
veis muito lez paru amennar a resistência de muitos que eram hostis
ao cinema. Jovens atores dos palcos berlinenses não reieitâvam o
dinheiro extra dos estúdios. DiretoÍ€s teatrais, poÍ sua vez, se bene-
* A data colocada ao lado da traduçáo do Íilme, entre pârênteses, semPre 6e
reÍere ao ano de lançamenro deste. Os {ilmes náo exibidos no Brasil q portanto'
sem tltulo oficial em poÍtu8nês, forâm traduzidos l;teralmente (N da T )
30 o ?êtio.lo orcai.o
ficiavam ao reduzirem os salfuios desses atoÍes; além do mais, eles
perceberam, não sem satisfação, que os teatÍos poderiam atrair es-
pectadores de cinema, ansiosos por adotarem ao vivo seus favoritos
da tela.tl
A admissão do cinema no campo das artes oficialmente sancio-
nadas ocorreu junto com a evolução da indústria cinematográfica
alemã. Durante os últimos quatÍos anos aDteriores à guerra, giandes
€stúdios cinematográficos haviam sido construídos .ri T".p-"lhof .
Nelbabelsberg, nas proximidades de Berlim _ estúdios cujas pa-
redes removíveis tornavam possível a combinâgão de trabalhó inter-
T e :Í9m9, preferido aa, época.12 Tudo parecia claro e promissor.O próprio Max Rehhardt engajou-se na direção de filmes. Hugo
von Hofrnannsthal estava escrevendo uma ..poga fantástica',, Das
Fremde Miidchen (A GaÍota Estanlu, 1913), um dos primeiros
filmes fantásticos que logo se tornariam uma instituigão aiemã. Da
comédia Liebelei, de AÍhur Schnitzler, à ultrapassada novela de
classe média Eva, de Richard Voss, poucas obras importantes foram
negligenciadas pela tela.
Mas esta vinculação do cinema à dramatuÍgia teatrâl provou
ser, como era de se esperar, uma asneira. Tradicionalmente ligado
ao-s caminhos do teatÍo, o pessoal dos palcos era incapaz de perceber
diferentes leis da nova mídia. Seu comportamento em relâçãã ao ci-
nema era de condescendência. Ela foi bem recebida por ser um meio
de se salientar a arte do ator e, em conseqüência, uma maravilhosa
oportunidade de se popularizarem produções teatrais. O que a tela
significava era, simplesmente, o palco novamente. No veÍão de 1910,a pantomima Swnwun de Reinhardt foi transformada num filme
que aborreceu os espectadores e desperdiçou dois mil metros de fita
com a exata reprodução da montagem teatral original.
Os chamados reformadores do cinema (Kinoreformbewegung),
que englobavam associações de professores. sociedades católicas e
todos os tipos d.e Vereine na busca de objetivos culturais, exerceram
uma^.influência análoga. A partir de 1912, estes grupos de pressão
justificaram sua existência ao oporem-se à imoratãadt dos filmes e
os denunciarem como fontes de corrupção da juventude. A seme-
lhança com as ligas puritanas norte-americanas é clara. porém, o
movimento alemão diferiu de outros estrangeiros, porque pÍovocou
situações cômicas devido ao descuido com que a maioria dãs filmes
tratavam obras-primas literárias.ra Aconteceu de, em 1910, o filme
Don Carlos suprimir dois dos principais personagens do árama de
grefro e oaz
Schiller. Para os reformadores do cilema, isto era um crir:re. Porque
qualquer filme "literário" tiúâ apenas um dever: pÍescÍever a total
integridade de seu modelo, Teria sido pelo bem da a e que estes
porta-vozes da classe média culta defenderaÍn Schiller tão ardente-
mente? Ao contrário, a liteÍatura clássica adquiriu uma inspiradora
autoridade intimidadora e, ao defendàla, os reformadores se subme-
teram ao verdadeiro desejo alemão de servir aos poderes estabelecidos.
Fustigando a indústria cinematográfica com suas exigências cultuÍâis,
os reformadores sobreviveram à guerra e continuaÍam a estipatizaÍ
o que consideravam lixo no cinema através de numerosos panfletos,
invariavelmente impressos em ternos metafísicos.
Afortunadamente, todos os esforços para que se enobrecesse o
ci-nema, mergulhando-o na esfera do palco e da literatura, pÍovoca-
ram o ceticismo dos especialistas em cinema e se chocaram com a
salutar indiferença das massas. A veÍsão cinematográfica de Swnu'
ran foi exprobrada por seus espectadores devido à completâ falta
de detalhes e de primeiros planos, oferecidos até pelos filmes mé-
dios. Desencorajado por tais reaçõesi Emst von Wolzogen, um poeta
alemão, desistiu de contribuir em futuros roteiros com o argume-nto
de que a multidâo sempre favorece o bânal. As pessoas preferiam,
às elevadas adaptações cinematográficas, a produção corrente de fil'
mes históricos e melodrâmas que tratavam de modo primitivo os
temas populares. Da maioria dos filmes da época só re.staÍam os
títulos, etalvez uns poucos; mas pode-se presumir que eles, de algu-
ma forma, pareciam exercíoios de um estudante que ainda nãtt
aprendeu a se expressar com facilidade.
Em 1913, surgiu o filme policial, um gênero obviamente ins-
pirado pelo ciné-rcm@B francês, adotado nos Estados Unidos du-
rante a guerra.1. O primeiro ator-detetive alemão a ser serializado
foi Emst Reicher, criando o perspicaz Stuart Webbs, que, com seu
chapéu pontudo e o inevitável cachimbo, tinha todas a§ marcas rê-
gistradas de Sherlock Holmes. Como ele, gozava de uma enorme
popularidade, e logo foi imitado por competidores que em vão ten-
taram superá-lo. Eles se chamavam "Joe Deebs" ou "Harry Higgs",
tinham excelentes relações com a Scotland Yard, e agiam de acordo
com seus nomes ingleses, parecendo exatamente cavalheiros sob
medida.ll
Deve-se notar que, enquanto os fÍanceses e norte-americânos
foram bem-sucedidos na criação de um sósia nacional do arquétipo
l!
32 Stilo ,crlodo araico
de Conan Doyle, os alemães sempre conceberam o grande detetive
com.um caráteÍ inglês. Isto pode ser explicado pela dependência do
detetive clássico à democracia liberal. Éle, o solitário' investigador
que faz a razão destruir a teia de aranha dos poderes irracionais e
a decência triunfar sobre instintos obscuros, é ô herói predestinado
de um mundo civilizado que acredita nas bênçãos do Iluminismo
e da liberdade individual Não é por acaso que o detetive soberano
estã. desaparecendo, hoje, tanto dos filmes quanto das novelas, dan-do lu_gar ao duro "investigador particular';: as potencíálidades do
Iiberalismo parecem ter, temporaÍiamente, se exâurido. Já que os
atemaes nunca desenvolveram um regime democrático, não estavàm
eles em condições de engendrar uma veÍsão nativa de Sherlock Hol_mes. Suas profundas suscetibilidades com relação a viaa iàra Oopaís-os tomou capazes, no entanto, de apreciaám o ,aoreu"f rnitodo detetive inglês.
^, 
Ap"rT da evolugão da produção doméstica, os filmes estran-
Seuos continuaram a inundar as salas de cinema alemãs, que tinhamaumentado consideravelmente de número desde l9l2.ii ú. ,ro"ocinema, o Lichtspiel, de Leipzig, foi inaugurado -i"^ gio" Voa*zuma representação medieval italiana tratada pela cíticã como sefosse peça reatÍat.r7 Ao final do peíodo d; ;;;:g;-";; ã'rit.".dinamarqueses obtiveram cada vez maior influên-cia. Em grandeparte devirto a Asta Nielsen, eles agradavam 
"o. 
.rp."iããà.._', .t"_mães por focalizarem conflitos psicólógicos desenuoiviàos 
"i un 
_
bientes naturais. O sucesso dos westerr$ norte_americânos foi parti-
cularmente avassalador. Broncho Bill e Tom Mix 
"on!uirür"_ 
,joveln Be-rac_a9 alemã, que haüa d_evorado, ,otu-" 
"pOu-uàiu*", 
u,novelas de Karl May 
- novelas baseadas nurn faroeste lmaginarioe cheias de fabulosos acontecimentos envolvendo tribos de ?ndios,
caüoçõ€s, comerciantes, caçadores, vagabundos e aventureiros. pâra
os adultos sérios e acomodados, o faÀcínio que este produto de se-
gunda categoria exercia sobre meninos na práadolescência era inex-
plicável; mas a juventude derramaria lágrimas comovidas quando o
majestoso chefe índio Winnetou, tendo se tomado um crisào, mor-
ria- nos braços de seu amigo Old Shatterhand, o mocinho Oos ban-
didos, e alemão, é claro. Devido a seu estilo simples e objetivos
descomplicados, à sua ação câracterística e à proi-zas heróicas, os
filmes de cowboy noÍe-americanos também atriíam muitos intelec_
tuais alemães carentes de objetivo. porque não eram mentâlmente
instigantes, a intele.tuâlidade deu as boas-vindas às simpüficêções
dos westerns, à vida em que o heÍói só tem um camiúo a seguir.
Do mesmo medo, com,a deflagração da guerra, nuBeÍosos e§tudan'
tes se apresentaram entusiasticamente ao exéÍcito como voluntádos.
Eles foram levados não tanto por patriotismo, mas poÍ seu apaixo-
nado desejo de escapar da liberdade vã e entrar para uma vida sob
pressão constrangedora. Eles queriam ser úteis
Além dos westerns, pequenas comédias com Max Linder, Fatty
e Tontolini eram moda naqueles anos. Todas as camadas de espec'
tâdores alemães davam alegres gargalhadas Por eles provocadas' Os
alemães gostavam daquele tipo de gÍaça visual. O mais surpreendente,
porém, é que eles próprios eÍam incapazes de pr-oduzir um cDDÊ
fu-t" popú.". la ém lSzt, um escritor alemão afirmou claÍamênte
que os ;iemães eram fracos de idéias para filmes ómicos - urn
àmpo, segundo ele, que os franceses, e depois os norte-americanos'
haviãm aprendido a explorar com mestria. 18
Esta'estranha defiãiência Pode €star ligada ao caráter das velhas
paüaçadas c.inematogÍáÍicas. Merecessem ou não o bastão do pa-
ihuçoi elus invariavelmente expunham seu heÍói â todo tiPo de arma-
tlilhas e perigos, de modo que ele dependia de um golpe de sorte
àpós ootio f*á "t"rp-. Quando 
ele atravessava umâ estÍadâ de
fár.o, o- tràm se aproximava ameaçando pegá-lo, e apenas- no últi-
áo momento, quand; o trem entÍava num desvio até então invisível'
sua vida seriá poupada. O herói - um 
indivíduo doce, desamparado'
que nunca fúa mal a ninguém - vivia num mundo 
goveÍnado
iela sorte. A comédia ajustóu-se, assim, às condições específicas do
àin"."; po.qr", lnais do que qualquer outra mídia, o fíIme. é. capaz
de apontr ai contingências da vida. Era um tiPo de comédia ver-
dadeiramente cinemaógráÍica. Teria uma moral a divulgar? Ela fi-
cava ao lado dos porquinhos contra o graade lobo mau ao tornaÍ
a sorte D aliado natural de seus heróis. E isto, incidentalmente, eÍa
conÍortador para o pobre. Porque se baseavam na sorte e num ingê'
nuo desejo aL feliciãaae, tais comédia§ se revelaram inacessíveis àos
alemães, cuja ideologia tradicional tende a não acreditar na noção
de sorte, favorecendo a noção de destino. Os alemães desenvolve-
ram um humor nativo em que comPetem razão e ironia e em que
não há lugar para figuras despreocupadas. O seu é um huoor emo'
cional que tenta reconciliar a humanidade com sua trágica condição
e que tenta fazer com que não apenas se ria das excentricidades da
vidà, mas também se perceba, através desse riso, quão sinistra ela
,'l
34 
o ?eiodo araico
é.. Tais dispositivos eram, é claro, incompatíve.is com as atitudessubjacentes aos desemDeníos de um Buster Keaton ou um HaroldLloyo' até- disso, exiiste uma inter-relação íntima entre os hábitosintelectuais e os movimentos corporais. Os atores alemães devemteÍ 
-percebido 
que, poÍ causa de suas 
".""d,1iü;;ã ,".,u_J_"1,:, p-T" piadas e gestos semelhantes 
"r, il ;"#-r*ui", no.r"_ameflcanos.
A guerra coEeçou. parte da juventude alemã e, também, a eli(edos 
--reformadores .do 
cinema. acieditavam ti..#ri"'l"r"Jlr" fi"rmpregnaÍ sua insípida vida ro]nú"i"õil'"ã#Ii,,}"",inrH",":r.TTJ#ff 
1J,fl 
,,"11111;
cultas é ilustrador a este ÍesDeito. ;""d;;;r;;#"a! i"sro, .r"enaltece a graaa" aomo u_',
desígnios d;r r;à;;;#rrnelo certo de se realizarem os nobrês
daqueres belicoso, airi."-uo.'-11'T-"- :' :o, seguida,. de'ama urrr.r"'t"e,o."i-püut;.ffi;;H;,ffi ::?'Jil:,lr,,ff l,,r""Tlcom a atmosfera. possa ela ,o. p"i.i i. !o" 
"i"ãããr 
'r"il'rii.r," 
"
que nos tornemos ansiosos oot
1.',e."-.!;;;;;il;;^.;"i*T'X'ü;rffi'"'?',,:ff 
":Tfl :H:::tável."re Hãfker e seus paÍes eshvam num frenesi.
:1n"iff ú-?1iitri,:HTüü,,?,;;'ffi ;,,Í"T""ix"#,1tr1X'JÍn{rcanje para comperir com os-filmes 
"rt 
_g"i.ã. ;;";;;1". ,.salas de cinema, que pareciam ter crescido com o único obretivo deabsorverem o fluxo do exrerior-. pÍoduções à* -p"úZ"rijJ"'j, 
" ouGaumont inundavam D mercado ur"o,à a-air"iirq""rr'"rio.oirtchegou a quase amrinar a projektion_A. c. üJ* i',]õru,à1""._
.. pr,u embaraçosa situação foi ,"u"àa"' o"üã.rí ,,11" ,,0*-tou abrupta.metrte a indústria alemã do ;;;""ü;;;.;ir#".*.un_geira. Depois de as fronteiras terem sido-fechad"., 
"ã".À"íã p".tenc€u aos pÍodutoÍes nacionais, que se viram ai"rt" ã;l*lt" o"satisfazer por sua própria conta toda " a".*au irã_ã iliu .roenorme. Além das salas de exibição regulares, o*".o*, ãr".a.nrititares, que proliferaram atrás das ri** a" ir"r,tq';;il;;"""_ ,.suprimento permanente de filmes novos. Os realizadorescinemato_gráficos se beneficiaram do fato de, pou"o ã,"rã-gràã", 
";;.rn",comptexos de estúdios terem sido *^r-la*- õ"oi.ã'l]Ã"àoo^,e novÍui companhigs cinematogÍáticÍts cresceÍam ,r_" u"io"iOrO"incrível. De acordo com uma pesquisa aparentemente confiável, o
81te77o e ?.tZ
número destas companhias cresceu de 28, em 1913, paru 245, em
1919. As salas de exibição também floresceram e se tornaÍam cada
vez mais luxuosas. Éoi um período de grandes dividendos. A classe
nédia comegou a prestaÍ um pouco de atenção ao cinema.2l
Assim, ao cinema alemão foi oferecida uma chance única: ele
se tornou autônomo; ele não mais precisava competir com produtos
estrangeiros para manter seu valor de mercado. Poder-se-ia pen-
sar que, sob tais auspiqiosas circunstâncias, a Aleman.ha conseguiu
criar um cinema próprio, de caráter verdadeiramente nacional. Outros
países o fizeram. Durantê os anos da guerra, D. W. Griffiú, Chaplin
e Cecil B. de Mille desenvolveram o cinema norte-americâno, € a
indústria sueca tomou forma.
Mas a evolução alemã não foi semelhante. De outubro de 1914
em diante, Messter substituiu os cine-jornais dos pathé Fràres,
Gaumont e Éclair, de antes da guerra, por filmes semanais que
mostravarn diversos eventos da guerra com a ajuda de cenas do-
cumentais. Filmados nos países neutros, assim como internamente,
estes boletins ilustrados eram complementados por filmes de propa-
ganda feitos em estúdio, nos quais extras vestidos com uniformes
britânicos se rendiam a valorosas tropas alemãs. O governo encora-
jou esforços deste tipo como uma forma de fazer as pessoas ..agüen-
tarem". Mais tarde, no curso da guera, o Alto Comando ordenou
que cinegÍaÍistas selecionados participassem de ações militares. O
obietivo era a obtenção de mateÍial pictórico impressionante, que
também servida como um registÍo históÍico. Um filme, feito a partir
de um submarino, mostrando em detalhes o âÍundamento de navios
Aliados, obteve uma ampla diwlgagão.:z Mas estas atividades não
eram de modo algum peculiares aos alemães. Os franceses únham
pÍaticamente as mesmas idéias sobre a utilidade de documentários
de guerra, e os produziram com igua.l competência.a
No campo dos filmes de ficção, grande número de dramas
patrióticos, melodramas, comédias e farsas se espalharam pelâs telas
- bobagens cheias até a borda de noivas de guerra, bandeiras es-voaçantes, oficiais, civis, sentimentos elevados e humor de caserna.
Quando, em meados de 1915, se tomou óbvio que a alegre guerra
de movimento havia se tÍansformado numa guerra de posição de
conseqüências inceÍtas, os espectadores aparentemente se recusaram
a continuar a engolir as balas patrióticas. Verificou-se uma acentua-
da mudança nos temas do entretenimento. Os muitos filmes que
exploravam o patriotismo foram superados por filmes que se con-
85
36
84dfa e ,pa,
A contribuição decisiva dos anos da guerra e dos anteÍioÍes foi
a preparação de ur4a geração de atores, cinegrafistas, dLetoÍes o
técnicos para as tarefas do futuro. Alguns destes veteratros conti-
nuaram sob Hitler; entrc eles Carl Froelich, um proeminente diretor
alemão que não se impoÍtou em ocupar um posto chave na i-ndústria
cinematográfica nazista. Ele entrou num dos primeiros estúdios de
Messter como eletricista, depois se tornou câmeÍa e, já em 1911 ou
1912, começou a dirigir filmes.z Mütos outros gaúaram prática
fazendo filmes primiüvos, que há muito estão no esquecimento. Eles
apÍenderam com seus próprios erros. Emil Jannings - ele tambémsubseqüentemente proeminente na Alemaúa nazista - escreve sobresua estréia como atoÍ de cinema durante a guerra: "Quando me vi
pela primeira vez na lela, a impressão foi esmagadora. Eu real-
mente tiúa uma aparência tão estúpida como aquela?',2o
Jannings foi apenas um dos numerosos atores que fizeram seu
t(einamento básico durante o período arcaico. Todos eles mais tarís
criariam uma espécie de compaúia de repeÍório. Na realidade, o
elenco de todo filme lançado na Alemanha incluiria membros desta
"associagão" que, mesmo adquirindo continuamente novos r€crutas,
mantiúa sua velha guarda intacta. Enquanto Hollywood cultiva
estrelas em vez de efeitos conjufltos, e o cinema Íusso freqüente-
mente usa figurantes, o cinema alemâo se baseia num corpo perma-
nento de atoÍes - 
profissionais altamente discipünados qúe se ajus-
tam a todas as mudanças de estilo e fonna.E
EncontraÍ atores familiaÍes aos espectadores num pãssado que
se tornou história é uma experiência estraúa: o que antes foi nossa
vida agora está guardado, e nós, de algum modo descoúecido,
seguimos em frente. Não os antecessores de Werner Krauss ou Albert
Bassermann, mas eles próprios, que passaram pela tela durante a
Primeira Guerra Mundial - figuras irremediavelmente separadas dohoie. Uma de suas companheiras foi llenny Porten que - uma Íaraexceção - começou sua caneira no cinema sem qualquer expe.riên-cia prévia no teatro. A partir dê 19lq esta talentosa loura, muito
elogiada como o tipo ideal de mulher alémã, se maoteve nb gosto
do público, desempenhando com igual naturalidade papéis cômicos
e trágicos, wlgares mulheres de fazendeiros e sensíveis damas.s
Outra figura daqueles primeiros anos foi Harry Piel, conhecido como
o Douglas Fairbanks alemão. Ele apareceu no meio da gueÍra como
o herói de Unter Heisser Sonne (Sob um Sol Quente), um filme
em que ele obrigava vários leões (do zoológ' r Hagenbeck do Ham-
o 2e odo araio 3?
::olr"n". em.assunto da época de paz. À medida que retomavamparte de seus inteÍesses normais, as pessoas se ulrrtuuu--à gu"rmde posição.
Inúmeras comédias apareceram, Ievando para a tela popularescomediantes de consagradas peças do t."iro Ur.fin"ri"I-Ér.,
:l1ti_Tiln figuras estereotip"à". *.o o t"o"ot"-p*1ri-à o, uaqorescente, e a maioria favoreceu a graça do sexo iibertino. ErnstLl9itclr cyeçou sua impressionantJ càrreira ;;i";-;;;;". ,r-perrlclars. Descontente com papéis menores em clássicos dramasteatrais, o ator Reiúardt encontrou uma saída para seu ágil talentoe ingenuidade no desempenho do papel ctmicá eà -i".rã 
"ir"rnr-tográficas. Em uma delas, ele é um âprendiz lrA.u ,urr-tju U.r_unense quq sempre na iminência de ser despedido, terminá comog.ll9 d9 patrão. Logo senriu prazer em dirigir ele 'mesmo às co_
lTÍgi"r- 
d.". 
"T rolo. Apêsar de, sob o n"riráo, iuttr.- ii'ã"rrr-claoo Lubrtsch por apresentar "uma ousadia totarmente estranha aonosso verdadeiro ser,,, o espectâdor alemão contemporânau a"-rnoAo
l1ryT f1"", escandatizado,' e muito peto cort.arij 
-s" 
ã-iu"].ti, sir_cerameDte com o ator e seus filmes.u
A guerra não provocou inovações vitais, nem engendrou tiposadicionais de filme, com a exceçâo, tutu"r, ã.'r_'e*;ãà" .".1"d*baratos promovendo atores populares como Feri ãraru ã rr",Morena.a Os realizadores 
"rã.n}", "ortiiru.". 
- 
"' "üiãrlJ rrr*abertas pelas atividades anteriores à guerra e, na _elh-or das hipó_teses, acrescentaram novas variações a ,*á. .*iá"r. ' Olãior"t-mente, um instinto certeiro criava uma UstOria que mais tãrõ seriaretomada várias vezes. As novelas ,lt apus.uàas-"- J n*". 
-"ro""
mente eferivadas de Sudermann Íoram iela pri."ir" o'"r'ãuàtor.pam a tela.2o EIas reuniam suspense dr-amáriào, Uoo, p"pÀJ! r.oa-parência 
.burguesa, eram repletas de detalhes ."uf.ã"ã., 
-"-."rru-
tavam mericulosamente a melancólica paisagem ao mtt 
-ãà 
infr.in
- qualidades que as tomaram atrativas paã o. proauiãi.-.ir"."_tográficos nos anos seguintes.
,^,,-.1:r:1"..1]:r?-.no tln da guerra bcoÍreram acontecimentos querevaram ao verdadeiro nascimento do cinema alemão: o fato deeles se provarem tão efetivos deveu-se ao seu desenvolvimento comoum todo, mais do que a sua intervengão. Apesar a" 
".t" 
ãrr"*ofvimento não rer tido forte imprlso 
" resriáaà.- Àp.[*iü-'*"_beleceu tradições que facilitaram a explosão final.
l
l
38 o ?erlodo dcaico
burgo) a obedecerem às suas ordens.sr Desde o início, piel parece
ter. sido fiel ao tipo que iÍia Íepresetrtar no futuro: o ãe um intré-pido cavalheiro que se distingue ao derrotar hábeis crimúosos e
ao salvar moças 
_inocentes.euando aparecia em traje d; ooit", ,.-sumia o soúo da menina imatura poi um cavalheiio perfeito, e o
ch.arme infantil que irradiava era tã; doce e colorido {ouoio o pi-rulito que, nos parques de diversões euÍopeus, são a delícia das cÍian_
ças e de estetas áIarás. Seus filmes eÍam no estilo preto_no-branco
das novelas baratas, em vez de matizados em seus conflitos psico_
lógicos; eles Ésolviam iluestões trágicas com finais felizes e, no-todo,
aPresentavam uma variação alemã do suspewe anp)o-americano.
Esta bobagem alege e agÍadável ocupa um lugar isoiado em meio
à massa de sombrios produtos ,,artísticos".
A personalidade mais fascinante da era primitiva foi a atriz
dinamarquesa Asta Nielsen. Em 1910, depois dâ aros d" i.iunto no
palco, ela fez sua estréia na tela em Afgntnden (Abismo), um filmeda Nordisk de Copenhague dirigi<lo por seu marido, úrtuo CuA.
11" lr]ry. que se distinguiu por sua ãuração, não comum à época,nao delxou nenhum traço, a não ser um comentário entusiâstico
soDr€ a quantidade de película gasta paÍa mbstÍar a atriz _ um
sinal. de que ela Íealmente fora predeitinada para o cinema. Con-velcido de que ela tinha futuro, paul Daüdson ofer"""u u Astu
Nielsen saltírios fabulosos e condições especiais de táúàúo se ela
concordasse em colocar seu talento à disposição de sua compaúia
cinematográfica, a Union. EIa concordou, foi morar em Beitim e,
a partir de l9ll, começou a apareceÍ em filmes que, duÍante 
" 
gu"rr",
levaram tanto soldados franceses quanto alemães a terem sü foto-
grafia em suas trincheiras. O que eles sentiam obscurameot", Crl-
Iaume Apollinaire o expÍessou Duma torrent€ de palavras: l,Ela é
tudo! Ela é a visão do bêbado e o soúo do homem solitário. Elari como uma menina totalmente feliz, e seus olhos sabem de coisas
tão cariúosas e tímidas que não se poderia falar deles,,, e daí por
diante.
Esta artista excepcional enriqueceu o cinema alemão de diver-
sas maneiras. Na época em que a maioria dos atores ainda se aferrava
a artifícios do palco, Asta Nielsên desenvolveu um inato senso cine_
matogÍáfico que só poderia inspirar seus parceiros. Seu conheci_
mento sobre. como produzir um efeito psicól6gico definido através
d'e um vestido- escolhido adequadamentj era áo profundo luantosua compreensão do impacto cinematográfico dos delahes. Diaz. seu
SAefrê e ?d,
primeiro biógrafo, surpreendeu-se com a confusão de objetos fúteis
empilhados em sua casa - uma coleção incluindo artigos do vestiáríomasculino semi-elegantes, instrumentos óticos, pequenas bengalas,
chapéus distorcidos o lengos extmvagantes. "Entro completamente
em meu papel", contou-lhe. "E gosto de teÍ uma idéia tão precisa
de meus personagens que pÍocuÍo coúeoer todos os seus detalhes,
que consistem exatamente nessas muitas bagatelas. Tais bagatelas são
mais reveladoras do que importunamente exageradas. Eu realmente
construo meus personagens - e aqui você encontra os elementosmais decorativos, mais efetivos com que compor a fachada." O mun-
do do cinema alemão seria incompleto sem os pÍsonagens que Asta
Nielsen criou durante a era do cinema mudo.u
30
l
i
li
I
l
-
8ten4 ê uoz
da Alemanha, e lempre será o modelo para qualquer seSmento do cinema que
trabalhe com bases psicológico-Íanústicas, para qualquer produção quê construâ
um ambiente total com 'elementos de estúdio ao invés de buocar um signiÍicado
ne mâtérie-prima da vida". - Lejenne, CinêiLa, p, 742,30 Kâlbus, Deutche F;ltuk nit, I. 1y2L.
8L Iüd.., pp. 89-90,
s2 Diaz, Ásta Niekar, p. 6t, Para a citação de Âpollinaire, ver Diaz, p. 7. Ver
tâmbém Môllhausen, ''Aufstie8 des Filmes", in Ula-Büittet; Kalbua, Deuttcha
Filmktnst, I, t3,
4l
NOTAS
I 9].*:k , l!!dl*t,t, p. 20; Kâtbus, Dê1lttchê Fít hrn t, I, tt.- urrmsay, lrtmv.wttchalt, p. 14; Kalbus, Daltrcbe Filnhun:t, I, 12.8 Mortrado por Hans RichteÍ numa conferência 
". N;;; ià;, 
'ii 
a, ^.de r94,t 
Y*t,.., Mthr lleg, p, 98; Boehmer e Reitz, Iilz in WirtschaJt @ú Recht,
PP.4-5.ó CÍ. Messter, Mcin IIes.6 Esta cena Ioi incluída na obra de S. Licot, Quarunte .4ns de Cinéma, \ertambém Messrer, Màn Weg, p.98,
?. 
^tkêrknecht, 
Lnhtspielhagm, p. rrl; Zaddach, Der lite?atüchc Filn, pp. t*16; Mes6!er, Meia 84, pp. 64_66, :,E_79.8. Zimmereimer, lilmzeasur, pp. 27_28; vcr também Alrerioh, Soziologie desKfiot.
0. Bardàhe e Brasillach, History o! Motion pitúer, p. 42,
10 ryehaler e Reitz- tilm ia y;rtschatt rna n"ri,'pl'S;'i^vidsohn, ,"!Vie dardelrschs LichtspieltheareÍ cnrrtaod ,, in Licttt Bü 'Aí;;;, ;:';:;:;" D;:, tu
!,r",t:,..rr, !-35i Z^ddach, Dct titcttische Filn, p. zl,'.1 Áâfbus, Dcttrch. liln*u$t, l, 11.r.z "2, Jahre FiLoatelier", ia p5 Jahte Kií.''.oto$a?h, p, 66-q rarâ um dscussão acerca dos lilmea com objetivos - anieticos e literárioe <dos^ reÍormadores do cinerna, ver Zaddach, oi ui._;riiíài"oi. 'ii,"uur.
áú-r1.
1. JehieÍ, "42 Aos de Cinéoa',, in Lc Rôlê i,úell.ct el dn Cixéma, p. 26,rõ Kalbus, Dêiatsthe lihnkü,Út, p t, 19,,€ Jasoo, "Zahleo 
".he, un" "i',,'in es lahre Kinenatogtaph, p. 67,1, Olimrky, Fitmwirtschalt, o. Zi.rE M5llhausen, ',Aufstieg des FilÍts,, iD Uld_Blàttet,re HàÍker, Der Kino *nd die Gebitdeten, p. 4.
20. Boehmet e Reitz, .F.r7zr in Whtschalt'uid Recht, p. 5; Kalbls, Deuttcltaiilmkunst, l, 21.
e1 Boehmer e Reiu, Filzr in /irts.halt ud Recht, pp, 5_6; Olimsky, Fítmwits_chalt, op. 21-24; Jason, ,,ãhten sehen 
-uns 
an,,,'in'pi j.í; 'tiil)íi"cr.pn,p. 67; Bardêche e Brasillach, Hitory ol Motion i;rtur"r, ip. Br_;à: 
'-'-'
zâ Rohde, "German propaganda Movies", in ,l-r;r"" 'Cíí"iííi.it et, janeiode t94-3,- 
-p. 
l0; Áckerknecht, i,ihtsgzeLlrogea, pp. 2t_22; Meaxer, Mein ytg,pp. 128-10.
28 Bardêche e Brasillach, Historg o! Motion p; &/êr, p. 9r.
:4- 
Y\alyus, Pa:tfth: Fitnhn:t, t, 14. Kalbus .r"," "ri.n.irrr.,,." dâ produçãooe 8ueÍra âtemâ; cl. pp. tA_19, 32_11.26 lUd' pp. 25-26.
20 Zaddach, Det liteaische Fitn, p. 14.2? Messter, Màn Yeg, pp. ,7, 99 §s.
28. Janaings, 'Mcin iVerdegang',, it tlJa-Ll4azia, t_7 de outubro de 1926.20.4 inglcsâ C. A. Leieune, tórica cle ciiema, .orn"n," 
",,"- 1.""u"-ã. ".r,odo interessente. A companhia de repertório âlemã, diz, .t. 
"a"q." "o ,..a.
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2.
Presságios
pretságios 4g
um mágico sinisho chamando as forças demoníacas da natureza
humana.
Wegener começou, já em 1913, com Der Student von Prag'
(O Estudante de Praga), um tabalho pioneiro porque foi o primeiro
a explorar antigas lendas. Hanns Heinz Ewers, que escÍeveu o rb-
teiro em colaboração com o próprrio Wegener, possuía um real senso
cinematográfico. Ele tiúa a boa sorte de ser um mau autoÍ com
uma imaginação fértil para sensacionalismo e sexo - um âliadonatural dos nazistas, paÍa os quais ele escreveria, ern 1933, o filme
oficial sobre Horst Wessel. Exatamente esta espécie de imaginàgão
o levou a eotrar em esferas ricas de acontecimentos tangíveis e ex'
periências sensuais - sempre bom mateÍial para a tela.Tomando emprestado de E. T. A. HoÍfmann a lendâ de Fausto
e a história "William Wilson", de Poe, Ewers nos apresénta o pobÍe
estudante Baldwin assinando um pacto com o estranho feiticeiro
Scapinelli. Esta encaÍnação de Satã promete a Baldwin um câsa-
mento vantajosb e ri.qu.eza inexaurível, com a condição de que elg
Scapinelli, se apossasse das imagens do estudante no espelho. Foi
uma brilhante idéia fazer com que o Íeflexo, atraído do espelhg pelo
bruxo, virasse uma pessoa independente. De acordo com o contrato,
Baldwin coúece uma bonita condessa e se apaixona poÍ ela; em
conseqüência, s€u pretendente oficial o desafia. Um duelo é inevi-
tável. A pedido do pai da condessa, o estudante, conhecido como
um excêlente esgrimista, concorda em poupaÍ a vida de seu âdver-
sário. Mas quando Baldwin corre paÍa o ponto de encontÍo - sendoincapaz, deüdo às maquinações de Scapinelli, de chegar na hora
combinada -, dê§cobre 
que seu paÍceiro fantasmagdrico haüa che-
gado primeiro e matado o infeliz pretendente. Baldwin cai em des-
gÍaça. EIe tenta convenceÍ a condessa de sua inocência; mas todas
âs tentativas de se reabilitar são cmelmentefrustradas por seu sósia.
Obviamente, este nada mais é do que uma projeção de uma das
duas almas que habitam em Baldwin. O ávido eu que faz com que
ele sucumba às tentaçôes demoníacas assrlme uma vida pr6pria e sc
prepara para destruir o outÍo eu, melhor, que ele hâvia tÍaído. No
final, D estudante desesperado atiÍa em seu reflexo no mesmo sótão
onde nascera. O tiro dado na aparição mata apenas ele mesmo. Então
Scapinelli entra e Íasga o pacto; ele se desfaz e seus pedaços cobrem
o corpo de Baldwin.3
A novidade cinematográfica de O Estudante de Praga parece
ter surpreendido os contemporâneos. Um crítico o comparou às pin-
Do arnontoado de sucata dos filmes do período arcaico, quatÍo exi_
gem atengão especial porque anteciparam impoÍtantes temas do pós-
guerra. Três espelharam mundos fantásticoi repletos de cÍiaturas
quiméricas; e isto se harmonizava com as teorias progressistas do
cinema alemão da época. Muitos escritores encoralaraÀ os realiza_
dores cinematográficos a concretizarem as possibilidades específicâs
de sua mídia apresentando não tanto objúos existentes, Áu. p.o-
dutos da pura imaginação. Hermann Háifker - que elogiou a guerracomo a salvação contra os demônios da paz - aconselhou oJ cria-dores cinematográficos a rnisturarem elementos reais e irreais. O
entusiasta da guerra, um amante de contos de fada: um fenômeno
verdadeiÍamente alemão. De modo semelhante, Georg Lukács, que
mais tarde mudaria de esteta burguês para pensador narxista (indo
ao extremo nos dois casos), escreveu em l9t3 que considerava o
filme o equivalente aos contos de fada e aos soúôs.r
O primeiro a colocaÍ em prática as doutrinas de seus contem-
porâneos foi Paul Wegener, um atoÍ de Reinhardt cuja face mon_
gólica revelava as estranhas visões que o acometiam.2 Seu desejo
de representá-las na tela resultou em filmes que foram verdadeiras
inovações. Eles fluíam em regiões governadas por leis diferentes das
nossas; mostravaltr acontecimentos que âpenas o cinema poderia fazer
parecerem reais. Wegener era impulsionado pela mesma paixâo ci_
nematográfica que havia inspirado Gearges Méliês a fazer filmes
como Voyage daw la Lune (Viagem à Lua) e Les euatre Cents
Coups du Diable (As Awbocentas Traveswras do »iabo1 . Vras
enquânto o delicado artista francês encantava todas as âlmas infan_
tis com seus brilhantes truques mágicos, o ator alemão se mostrava
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u o Tnlodo arcaico pressàgiot 45
de Baldwin reflete a profunda aversão de toda a classe média ale'
mã a relacionar seus dilemas mentais à sua ambígua condigão social.
Ela deixou de elaborár idéias ou experiências psicológicas a partir
de causas econômicas e sociais, temerosa que estava do modelo so'
cialista. Baseada no conceito idealista do indivíduo autônomo, sua
atitude estava em perfeita harmonia com seus interesses Práticos.
Como qualquer concessão ao Pensamento mateÍialista dos sociali§tas
podia minar estes interesses, ela instintivamente esquivava-se defen-
dendo com exagero a autonomia do indivíduo. Isto levou-a a con-
siderar duplicidades exteÍnaa dualidades internas, preferindo tais com-
plicaçóes psicológicas a questões que envolvessem a perda de seus
priülégios. No entanto, algumas vezes ela parece ter tido dúvidas
sobre se este recuo às profundezas da alma a salvaria de uma ca-
tastrófica ruptuÍa com a realidade social' O suicídio final de Baldwin
espelha suas premonigões.
Wegener produziu seu segundo filme, Der Golem (Golem;
"orno 
rJ, primeiro filme, foi refeito após a guerra), com a ajuda
de Henrik Galeen, um artista imaginativo que escreveu o roteiro'
dirigiu o filrae e também desempeúou um papel nele' T'angado no
inicL ae 1915, revelou mais uma 'tez a paixão genuína de Wegener
pelos efeitos cúematográficos de temas fantásticos Desta vez o filme
sê inspiÍou numa lenda medieval judaica na qual, o -rabino 
Loew
de Praga dá üda a um Golem - uma 
estátua de barro que ele
havia úo - 
colocaldo um sinal mágico em seu coração. No filme'
trabalhadores cavando um poço, numa velha sinagoga, descobrem
a estátua e levam-na a um comerciarte de antiguidades. O comer-
ciante descobre um Íelato sobre o trabalho do rabino Loew num
livro cabalístico e, seguindo suas instruções, obtém a metamorfose
milagÍosa. Agora a estória se torna psicologia modema Bnquânto
o Golem funciona como empregado do comerciant€, uma segunda
transformação ocore: o estúpido robô se apaixona pela filha do
patrão e se transforma em um seÍ humano com alma própria. A
amedrontada gaÍota tenta escapar de seu pretendente sinistro, e e1e
percebe seu teÍrível isolamento. Isto o enfurece. Um monstro rai-
voso, ele pentegue a jovem, destruindo cegamente todos os bbstá-
culos em seu camintro. No final ele morre ao cair de uma torre:
seu corpo é a estátua de ,barro quebrada.6
Os temas de Golem reaparecem em Homunculus (1916), um
suspense em seis paÍtes que obteve um enoÍme sucesso durante a
ruras de Rivera - um elogio que seria cruelmente contestado poroxtÍo, que, quando o filme foi novamente produzido em 1926-, oúamou de "incrivelnente ingênuo e muitas veies ridículo'.a O filme
T1í eltÍe os muitos perdidos. Mesmo que isso cause pera, seu sig.
nificado sem dúvida permanece, menos divido ao trabjho áe camerado que à pÍópria estória que, apesar de suas inspiraçáes *lo_ur.-ricanas, atraiu os alemães tão irre sistivelnent" 
"à*o 
," tiu"?e ,iOcextraída de fontes exclusivamente alemâs.
- O Estudan e de praga introduziu um tema que se toÍnaria uma
obsessão do cinema alemão: uma profunda 
" terrfu"t fi"*rp"ça"com os fundamentos do eu. Ao separar Baldwin de ,á, ."tt"*o ,ao colocar ambos frente à frente, o filrne de WegeneruiÃUofl" u*tipg :spTífigo de personaüdade diúdida. Em ":t à.-;;;; ,r"própria. dualidade, Baldwin, apavorado, percebe que 
"rtá".oi- 
o Oo-IIúuo de um antagonista que nada mais é do que ele mesmo. Eraum velho tema ceÍcado de urna auréola de significados. Mas não
terá sido também uma transcrigão fantasiosa do-que a ciasse-méaia
alemã na realidade experimentava em sua relação com a casta feu-
dal que governava a Alemaúa? A oposição aa turguesi; uo i"gi-.
imperial algumas vezes se tornou suficientemente ãguda para obs_
curecer sua- hostilidade para com os trabalhadores, que comparfi_llalaT da indignação geral conrra as instituições semi-absolutisras
da Prússia, as intÍomissões do escalão militar i o ridículo compor_
taoento do Kaiser. A expressão .,as duas Alemanlas,,, então cor-
rentg aplicâva-se particularmente às diÍerenças entre a'camada go_
vernante e a classe média - diferenças profundamente sentidas p;laúttima. No €ntarto, apesrr deste duaiismo, o governo i-p"ii"f ,"n-
rlru1a prmciplos econômicos e políticos que mesmo os Íberais não
relutavam em aceitar. Face a face com sua consci&rcia, eles tinham
de admitir que se identificavam com a classe dominant"- u [u. ,.opuúam. Eles representavam ambas as Alemaúas.
_ 
A determinação com a qual O Estudante de praga trata sua
estória de horror como um caso de psicologia individuàt é tamMm
reveladora. Toda a ação externa é 
"p"nu, 
uíu miragem queleflete
os acontecimentos na alma de Baldwin. Baldwin n_=ão é parte do
mundo; o mundo está contido em Baldwin. para descrevê_lã, então,
nada mais apropriado do que localizar o enredo numa esfera fan-
tástica onde a realidade social não tiúa de ser 
"onsiaeiÀàa- 
frto
explica, em.parte, a predileção do cinema alemão do pós_guerra por
temas imaginários. O significado cósmico atribuído á üà'a interior
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ltêtttiSiot
desenvolvimento histórico que provou ser prejudicial à autoconfian-
ça da classe média. DiÍerentes dos ingleses e dos franceses, os ale-
mães fracassaram em fazer sua revolução e, em conseqüência, nuo-
ca conseguiram estabelecer urra sociedade verdadeiÍamente demG.
crática. SiSriificativamente, a üteratuÍa alemã não oferece um único
trabalho que penetre no contexto sosial articulado ao modo de Bal-
zac ou Dickens. Na Alemanha nâo havia um contexto social

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